Recife, 25 de outubro de 2010 Prezados Amigos, Desculpem-me se estou excedendo o direito que nossa amizade oferece para falar de um assunto tão polêmico. A escolha do candidato a presidente é muito pessoal e entendo que no nosso nível cultural, as dificuldades são ainda maiores, pois de regra, todos têm muito acesso a informação. No entanto, preciso correr o risco de parecer impertinente, para compartilhar com vocês algumas reflexões. Aos que me questionaram sobre em quem eu votaria no primeiro turno, respondi que votaria na Marina mesmo discordando em parte de suas propostas. Neste segundo turno muitos tem questionado agora a minha posição e tenho dito que minha opção não é pelo candidato, nem por suas propostas, mas, e principalmente, por não mais acreditar no PT como partido em que a ÉTICA, seja um compromisso inabalável. Você pode não acreditar, você pode duvidar, pode até não entender de economia assim como eu. Não quero que você mude de opinião. Peço apenas que leia este texto que não é fruto da mentira, da invencionice, ou qualquer outro factóide como muitos que partem de lado a lado. Simplesmente peço que leia, pois consegui com ele entender a verdadeira razão do meu voto. O texto da professora de Economia da PUC e da FGV, Nora Zygielszyper, é muito esclarecedor sobre a economia do país. Leia e reflita sobre os efeitos, como muitos têm dito: “da herança maldita de FHC” e os notáveis avanços do governo Lula. O texto explica o porquê das conquistas que “nunca na história desse país haviam sido alcançadas”. Não se trata de votar apenas contra os escândalos que todos os dias são divulgados. Não se trata de votar a favor da democracia que já está ameaçada com a distribuição política que se instalou nas casas legislativas. Não se trata de votar apenas no mais competente. Acredito sinceramente, que se nós queremos que os mais carentes continuem a melhorar de vida é necessário o país continuar crescendo e, portanto, votar em Serra significa, antes de tudo, o verdadeiro compromisso para o país seguir mudando. Rogério Zimmermann TEXTO DA PROFESSORA NORA RAQUEL ZYGIELSZYPER “Crescimento econômico se constrói ao longo do tempo. Em economia as causas e conseqüências não são absolutamente imediatas. Um exemplo: o Obama está passando o maior aperto pelo desajuste econômico que herdou de gestões anteriores. Ele não tem culpa, mas está sendo muito cobrado politicamente. A abertura da economia, o plano Real (que o PT votou contra), as privatizações, a lei da responsabilidade fiscal, a reforma da previdência (pouca, mas feita parte pelo FHC e parte pelo Lula no primeiro mandato), mudanças na lei de empresas estrangeiras, bolsa escola que virou bolsa família e o ajuste das contas públicas implementadas pelo governo (FHC 2 e LULA1), tornaram este país mais competitivo. Com uma ajuda do crescimento mundial de 2003 a 2007(o maior desde a segunda guerra), que impulsionou nossas exportações e trouxe dólares para o Brasil, o governo Lula viveu anos de mais crescimento. O governo FHC precisou consolidar o plano Real em anos terríveis (crise do México 1995, crise da Ásia em 1997 crise da Rússia em 1998 , crise aqui no Brasil em 1999 , crise da Argentina em 2001 e finalmente crise eleitoral em 2002, que ocorreu por medo que o Partido dos Trabalhadores desse o calote que sempre pregara). Era necessário manter o câmbio fixo (1 para 1) para que os produtos importados e cotados em dólares permanecessem baratos, trazendo a inflação para baixo e quebrando aquela mania de indexar tudo que nós brasileiros tínhamos. Para manter o câmbio fixo , o país precisava ter reservas em dólares para poder vender se houvesse pressão de compra. Em cada crise mencionada acima, havia uma fuga de dólares e o Banco Central tinha que subir os juros para atrair reservas de volta, sob pena de ter que desvalorizar o Real, o que traria a inflação de volta. Os juros altos quebravam o governo por duas vias: 1) o governo pagava mais juros nos títulos públicos. 2) desacelerava a economia, diminuindo a arrecadação de impostos. O governo FHC teve que administrar caixa baixa e a prioridade era controlar a inflação. Sem a inflação baixa nada disso que se discute sobre crescimento hoje em dia estaria sendo discutido. Além disso, o maior beneficiado pela inflação baixa é o mais pobre que perde valor do seu salário e não participa da ciranda financeira. O plano Real foi importantíssimo socialmente. No meu modesto ponto de vista, o maior mérito do Lula foi ter tido a coragem de romper com que era pregado pelo seu partido e continuado o que foi iniciado pelo FHC tanto no controle da inflação (quando surpreendentemente colocou o Henrique Meirelles no Banco Central), e ter continuado o ajuste necessário nas contas públicas. Recomendo o livro que o Palocci escreveu depois que caiu do governo naquele lamentável episódio. Se chama Sobre Cigarras e Formigas e conta tudo o que aconteceu em termos econômicos naquela época. Ele se cercou de economistas apartidários da maior qualidade. Infelizmente, no final do primeiro governo, com o país e a arrecadação crescendo, o governo estava ideologicamente rachado: o Palocci, o Paulo Bernardo do Planejamento e o Henrique Meirelles gostariam de continuar com a seriedade nos gastos públicos, fazendo pelo social e aumentando o nível de investimento do governo para podermos crescer ainda mais. O lado da Dilma e do Mantega queria aumentar os gastos de custeio do governo, visando principalmente reeleger o Lula. Em especial a Dilma se opunha frontalmente a “mania “do Palocci em ter seriedade com gastos públicos. Sabemos qual lado prevaleceu. As contas brasileiras estão se deteriorando. Fizeram artifícios contábeis para esconder isto, como lançar o que o BNDES (que é governo) deve para o Tesouro como receita do governo. Sabemos que se este dinheiro for pago será num tempo que tende ao infinito. No IPEA, órgão do governo que deveria ser técnico e fazer pesquisas econômicas, os economistas que botam o dedo nesta ferida foram postos na geladeira. É a primeira vez que vejo o IPEA com conotação política. Em suma, se continuar assim, daqui a alguns anos poderemos estar quebrados de novo. Neste ano de crescimento forte e recorde de arrecadação estamos conseguindo a proeza de aumentar o déficit público! Sou filha da dona Frida e quando a matemática diz que assim não vai dar certo, pode acreditar que não vai. Podemos estar perdendo a chance de crescer muito mais e construir um país melhor. O governo tem uma arrecadação de cerca de 38% do PIB e pede emprestado mais 3,5% para cobrir o déficit. O governo só investe ( infra-estrutura , tecnologia etc...) cerca de 1% do PIB( com PAC e tudo)! Sem investimento é impossível crescer no longo prazo! Este ano o PIB vai crescer perto de 8% e os gastos de custeio do governo (funcionalismo, máquina etc..) aumentaram 17% tudo pela eleição da Dilma. O próximo governo, seja qual for, vai ter que fazer um ajuste nas contas públicas depois desta farra eleitoral e provavelmente vem imposto aí. A Grécia não quebrou da noite para o dia. Muitos governos concederam benefícios, ganhando votos com isso, e um dia se descobriram quebrados. A Dilma hoje anda com o Palocci a tiracolo para atrair credibilidade e os votos dos que se preocupam com as contas públicas. Mas ela atirava contra as idéias dele. Quando o Lula diz que “nunca dantes neste país” e faz o FHC ser o que entregou a “herança maldita”, ele está mentindo e sabe disso. Isto é não ser estadista e qualquer historiador honesto mostra e mostrará isto. É injusta, e como brasileira, fico extremamente triste. O FHC é um grande injustiçado. O Lula não usou a sua grande popularidade para mandar sequer um projeto de reforma (tributária, trabalhista, política etc...). Perdemos uma oportunidade de ouro de tornar o país mais moderno e eficiente. Reformas são difíceis e o Lula não teve vontade política de implementá-las. Preferiu focar seu capital político na eleição da Dilma e se manter no poder. Não é um estadista! Existe uma ala poderosa no partido dos trabalhadores que tem um projeto de poder e não de país. Não são todos, mas pelo que a Dilma dizia no passado recente, tenho receio que esta parte prevaleça. Pode ser que ela resolva dar uma de estadista, mas tenho cá minhas profundas dúvidas. Não vou lhe aborrecer mais com aulas de economia. Nora Raquel Zygielszyper