a estimativa da taxa livre de risco no modelo do fluxo de caixa

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ISSN 1984-9354
A ESTIMATIVA DA TAXA LIVRE DE RISCO NO MODELO DO
FLUXO DE CAIXA DESCONTADO E SUA ADEQUAÇÃO
AOS CONTRATOS DE CONCESSÕES RODOVIÁRIAS: UMA
ANÁLISE CRÍTICA À LUZ DA DOUTRINA FINANCEIRA
Fabiana Lopes da Silva
(UFF)
Julio Vieira Neto
(UFF)
Carlos José Guimarães Cova
(UFF)
Resumo: O Presente artigo apresenta uma critica aos procedimentos contidos nas notas técnica do Ministério dos
Transportes que orientam o estabelecimento da taxa interna de retorno (TIR) que deve ser considerada nos programas
de concessões de rodovias. A metodologia do Ministério dos Transportes é confrontada com os aspectos doutrinários
da moderna teoria financeira, de tal forma que a permitir evidenciar as suas inconsistências.Tais fatos podem
fragilizar o processo de tomada de decisão durante os leilões de concessões rodoviários.
Palavras-chaves: Custo de Capital , Concessões Rodoviárias.
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1. Introdução
Em razão do esgotamento da capacidade financeira do Estado, ocorrida ao longo da década dos
anos 1980, a adoção do Plano Nacional de Desestatização (PND), em 1990, no Governo Collor,
constituiu-se num importante marco para a recuperação da Finanças Públicas no Brasil.
Conforme assinalam Gomes et alii (2010)1, partir da década dos anos 1990, iniciou-se no Brasil
a primeira fase de concessão para exploração das Rodovias Federais e Estaduais por parte da iniciativa
privada, que assumiu mediante o estabelecimento de contratos de permissão ou concessão a
responsabilidade pela recuperação, manutenção, conservação, ampliação e operação de rodovias
concedidas.
Por sua vez, no ano de 2001, foi criada a Agencia Nacional de Transporte Terrestre (ANTT),
por meio da Lei nº 10.233 de 05 de junho de 2001. A ANTT é a agência federal responsável pelas
Concessões de Rodovias Federais, e tem a responsabilidade de gerir os contratos federais de concessão
de infra-estrutura rodoviária, tanto os novos quanto aos que existiam e estavam sob a responsabilidade
do extinto Departamento Nacional de Estradas de Rodagem - DNER. Em geral, na fese inicial das
concessões rodoviárias no Brasil, a concessionária recebia uma rodovia em funcionamento para ser
explorada por um período entre 25 a 30 anos. Constituída sob a forma jurídica de Sociedade de
Propósito Específico (SPE), a concessionária deveria investir em melhoramentos e manutenção para
proporcionar aos usuários uma maior segurança e manter a boa conservação das vias sob sua
responsabilidade.
Uma concessão de rodovias à iniciativa privada constitui-se em instrumento que permite aos
governos destinar um maior volume de recursos para atividades essenciais ao bem-estar da população,
tais como investimentos em saúde e saneamento básico. Outrossim, para que o objetivo a ser atingido a
concessão seja alcançado, o projeto deve atender os interesses de todos os envolvidos: a Administração
Pública, o Setor Empresarial e os usuários finais. Nesse sentido, a análise das variáveis e parâmetros
utilizados nos estudos de viabilidade econômico-financeira conduzidos pelos dois primeiros agentes
para avaliar o valor do projeto é de grande importância para o aperfeiçoamento dos modelos de
concessão.
1
GOMES, Ely do Carmo Oliveira et alii. Serviços de Concessão de Rodovias: o desempenho financeiro das
concessionárias que operam no mercado de ações. XIII SemeAd – Seminários em Administração, ISSN 21773866, setembro de 2010.
2
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Nestes modelos, emprega-se a metodologia do Fluxo de Caixa Descontado. Trata-se de uma
metodologia consagrada tanto pela doutrina financeira, quanto pelas Normas Contábeis brasileiras
(NCBr). O critério adotado pela agência reguladora (ANTT), na Segunda Etapa de Concessões
Rodoviárias Federais, expresso na Nota Técnica número 64 STN/SEAE/MF de 17 de maio de 2007
(STN, 2007), fixou para estimação da Taxa Interna de Retorno dos Estudos de Viabilidade
Econômico-Financeira um cálculo de custo de capital expresso pelo WACC.
Verifica-se que os parâmetros empregados pela Agência Nacional de Transportes Terrestres
(ANTT), em suas metodologias para a avaliação de desempenho econômico e financeiro nos modelos
de concessões, são definidos pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN) em suas Notas Técnicas
(NT), que passam a funcionar com a imperatividade normativa nos estudos técnicos realizados.
Ocorre que os parâmetros que orientam as metodologias adotadas nos modelos de concessão
(WACC; CAPM; Rf; Rm; β; Ke; Rreg e outros) possuem características desejáveis, de acordo com os
fundamentos doutrinários de suas respectivas caracterizações. Não raro, a definição dos parâmetros
apresentados pelas Notas Técnicas, em especial a Nota Técnica nº 64 STN/SEAE/MF, possui
inconsistências sob o ponto de vista doutrinário, que podem comprometer sensivelmente a efetividade
de uma avaliação baseada neles. O presente trabalho faz um estudo sobre a adequação da Taxa Livre
de Risco proposta nos modelos de concessão rodoviários no Brasil.
1.2
Situação problema
Assim, o problema que este trabalho procura investigar é: a Taxa Livre de Risco fixada para o
cálculo da TIR nas Notas Técnicas adotadas pela ANTT, nas metodologias de EVTE nos modelos
de concessões é coerente?
A nossa suposição inicial aponta no sentido de que existem algumas violações de caráter
doutrinário, na fixação da taxa Livre de Risco para os estudos de EVTE, que podem comprometer a
eficácia do modelo adotado.
3
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1.3
Objetivo Geral
O objetivo final do presente estudo consiste em realizar uma avaliação crítica acerca da
proposição de Taxa Livre de Risco contida na Nota Técnica número 64 STN/SEAE/MF de 17 de maio
de 2007 (STN, 2007), que fixou para estimação da Taxa Interna de Retorno dos Estudos de
Viabilidade Econômico-Financeira um cálculo de custo de capital expresso pelo WACC. A referida
Nota Técnica fixou alguns elementos de definição do modelo CAPM (Capital Asset Pricing Model),
dentre os quais a Taxa Livre de Risco a ser empregada neste modelo. Ocorre que a forma de
estabelecimento da Taxa Livre de Risco adotada pela Nota Técnica nº 64 STN/SEAE/MF viola alguns
pressupostos doutrinários sobre a taxa livre de risco. Tais violações poderiam comprometer o resultado
final do cálculo da TIR nesses projetos de concessão, distorcendo a tomada de decisão dos agentes
envolvidos.
2. Revisão da Literatura
2.1 Aspectos normativos do emprego do Método do Fluxo de Caixa Descontado
Pretendemos apresentar algumas considerações de natureza doutrinária, que fragilizam a
adoção do conceito de TIR (taxa interna de retorno), na metodologia empregada pela ANTT para
orientar o Processo de Licitação da Segunda Etapa de Concessões Rodoviárias Federais, com base na
Nota Técnica nº 64 STN/SEAE/MF.
A referida Nota Técnica tinha por objetivo a análise crítica, dentre outros aspectos, dos
parâmetros empregados para a apuração do Custo Médio Ponderado de Capital (WACC), cujo
resultado serviu de referência para a determinação da Taxa Interna de Retorno do Projeto, utilizada
pela ANTT, no cálculo da tarifa de pedágio a ser considerada2.
Em uma rodada de Licitação para a oferta de Concessões de Serviços Públicos, é preciso
indagar acerca dos motivos que levam um grupo de investidores a comporem um consórcio para
operar a concessão. Dentre o conjunto de aspectos que devem ser considerados para a decisão de
investimentos de longo prazo, destaca-se que o objetivo principal é a geração máxima de valor para os
fornecedores de capital próprio, ou seja, seus acionistas, no caso de uma sociedade por ações.
2
Conforme disposição contida na Nota Técnica nº64 STN/SEAE/MF, de 17 de maio de 2007, folha 1.
4
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Para a aferição do valor de um investimento, em especial de um investimento com
características de projeto, como é o caso de uma concessão rodoviária, a literatura de economia
financeira consagrou há décadas o emprego dos fluxos de caixa descontados. Esta metodologia está
baseada nas projeções dos fluxos de caixa livres do empreendimento, que são trazidos para o seu valor
presente por meio de uma taxa que reflita o risco dos fornecedores de capital. Apesar de todas as
limitações desse modelo, ele é aceito como sendo um apropriado método de avaliação para orientar a
tomada de decisão de investimento.
Assim, a condição necessária, mas não suficiente, para que um investimento seja realizado é a
expectativa de que ele gere um fluxo de benefícios, em termos de caixa, cujo valor presente seja
superior ao valor presente dos gastos exigidos. Não obstante, cumpre registrar também que, em
qualquer análise de valor de ativos, o que se pretende obter não é um valor absoluto, mas sim um
intervalo de possíveis valores dentre os quais o verdadeiro valor esteja inserido. Até porquê, num
mercado constituído, os valores refletidos nos preços estão em permanente oscilação. Sendo assim, é
preciso que os componentes da taxa de desconto do projeto sejam adequadamente estimados, sob pena
de comprometer-se o êxito da modelagem.
O emprego do método do Fluxo de Caixa Descontado está em conformidade com a boa técnica
contábil, conforme atestam as Normas Brasileiras de Contabilidade3, em seus Pronunciamentos. De
acordo com o CPC 12 – Ajuste a Valor Presente, sob determinadas circunstâncias, a avaliação de um
ativo ou um passivo a valor presente pode ser obtida sem maiores dificuldades, caso estejam
disponíveis fluxos de caixa contratuais com razoável grau de certeza e de taxas de desconto
observáveis no mercado. Por outro lado, pode ser que em alguns casos os fluxos de caixa tenham que
ser estimados com alto grau de incerteza, e as taxas de desconto tenham que ser obtidas por modelos
voltados a tal fim. O peso dado para a relevância nesse segundo caso é maior que o dado para a
confiabilidade, uma vez que não seria apropriado apresentar informações com base em fluxos
nominais. Conforme seja o caso, a abordagem tradicional ou de fluxo de caixa esperado deve ser eleita
como técnica para cômputo do ajuste a valor presente.
Uma outra norma contábil em vigor no Brasil, o CPC 01 – Redução ao Valor Recuperável de
Ativos4, estabelece que os Fluxos de caixa futuros estimados devem refletir premissas consistentes
com a maneira pela qual a taxa de desconto é determinada. Caso isto não seja observado, o efeito de
3
4
PRONUNCIAMENTO TÉCNICO CPC 12 - Ajuste a Valor Presente
PRONUNCIAMENTO TÉCNICO CPC 01 - Redução ao Valor Recuperável de Ativos.
5
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algumas premissas será contado duas vezes ou ignorado. Por exemplo, como o valor da moeda no
tempo é considerado no desconto de fluxos de caixa futuros estimados, esses fluxos de caixa excluem
as entradas ou saídas de caixa provenientes das atividades de financiamento. Analogamente, uma vez
que a taxa de desconto é determinada antes dos impostos, os fluxos de caixa futuros são também
estimados antes de impostos.
Por sua vez, para o estabelecimento da taxa de desconto, devem ser considerados aspectos tais
que reflitam as avaliações atuais de mercado, tanto do valor da moeda no tempo, bem como dos riscos
específicos do ativo para os quais as futuras estimativas de fluxos de caixa não foram ajustadas. Uma
taxa que reflita avaliações atuais de mercado do valor da moeda no tempo e os riscos específicos do
ativo é o retorno que os investidores exigiriam se eles tivessem que escolher um investimento que
gerasse fluxos de caixa de montantes, tempo e perfil de risco equivalentes àqueles que a entidade
espera extrair do ativo. Essa taxa é estimada a partir de taxas implícitas em transações de mercado
atuais para ativos semelhantes, ou ainda do custo médio ponderado de capital de uma companhia
aberta que tenha um ativo único, ou uma carteira de ativos semelhantes em termos de potencial de
serviço e de riscos do ativo sob revisão.
2.2 Análise da Nota Técnica nº 64 STN/SEAE/MF
O método fluxo de caixa descontado é um dos modelos de precificação de ativos mais
conhecidos. De acordo com Kobori (2011, p. 97)5, segundo uma pesquisa conduzida pelo professor
Roy Martelanc, da Associação de Analistas e Profissionais de Investimentos do Mercado de Capitais
(APIMEC), cerca de 88% dos avaliadores de ativos utilizam esse método. A técnica consiste,
basicamente, em projetar a futura geração de caixa da empresa ou empreendimento, com base em
ajustes a partir do valor do lucro líquido, trazendo os fluxos a valor presente utilizando uma
determinada taxa de desconto.
Por sua vez, de acordo com Damodaran (2007, p.54)6, o fluxo de caixa pode ser classificado em
fluxo de caixa de patrimônio líquido e fluxo de caixa da empresa. O primeiro representa o fluxo de
5
KOBORI, José. Análise Fundamentalista. – Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. 156p.
6
DAMODARAN, Aswath. Avaliação de Empresas. – São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007.
6
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caixa apenas para os investidores acionistas e inclui, portanto, todos os fluxos de caixa associados à
dívida (pagamentos de juros e principal e novas emissões de dívida).
Em seus aspectos principais, a metodologia da ANTT, conforme a revisão apresentada na Nota
Técnica nº 64 STN/SEAE/MF, envolve a estimação da taxa interna de retorno de equilíbrio de uma
concessão por meio da estimação de seu custo de oportunidade do capital, o qual é, por sua vez,
determinado pelo valor estimado de seu custo médio ponderado de capital (WACC). Os componentes
do WACC são calculados como abordado a seguir.
Para o estabelecimento do Custo de capital próprio, recorre-se ao CAPM, ou seja, à equação:
ke = rf + β(rm – rf) + rb
em que:
ke = retorno exigido do capital próprio;
rf = taxa de juros do ativo livre de risco, representado por US T-bonds com prazo de dez anos;
β = beta estimado do capital próprio;
rm – rf = prêmio estimado por risco da carteira de mercado;
rb = prêmio por risco país.
O valor da taxa de juros livre de risco é obtido calculando--se a média de uma série histórica
anual cobrindo o período de dez anos anteriores à data para a qual a determinação da TIR é desejada.
Com relação à inadequação da forma pela qual são estimados os parâmetros do CAPM, em
especial a Taxa Livre de Risco, objeto do presente estudo, verificamos em Sanvicente (2012) 7 que há
um problema nas estimativas das taxas que compõe o referido modelo. Ele afirma que empregar
médias históricas para estimar a taxa livre de risco, o prêmio por risco do mercado de ações, o prêmio
por risco país, em lugar de usar cotações correntes desses componentes do custo de capital próprio,
compromete a sua eficácia. Não obstante, passemos a verificar o que diz a Moderna Teoria Financeira
sobre este caso.
7
SANVICENTE, Antônio Zoratto. Problemas de estimação de custo de capital de empresas concessionárias no Brasil: uma
aplicação à regulamentação de concessões rodoviárias. Revista de Administração, São Paulo, v. 47, n.1, p.81-95,
jan./fev./mar.2012.
7
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2.3 Estimação da Taxa Livre de Risco
De acordo com a Nota Técnica nº 64 STN/SEAE/MF, a Taxa Livre de Risco (rf) para referência da
ANTT consistiu de uma estimativa obtida a partir da taxa de juros média anual dos títulos do Tesouro
Americano (T-bond), com prazo de vencimento de 10 anos, no período de janeiro de 1995 a junho de
2005. Esta média foi adotada como parâmetro de rentabilidade sem risco. Como a Nota Técnica foi
elaborada em 2007, havia inclusive a sugestão de atualização da série para dezembro de 2006. O valor
encontrado foi de 5,30%.
Passemos a analisar os aspectos doutrinários relativos ao ativo livre de risco e à taxa livre de
risco. De acordo com Berk&DeMarzo (2009, p. 88)8, é possível definir uma taxa de juros livre de
risco (Rf) como sendo a taxa, para um dado período, pela qual se pode contrair ou receber empréstimos
de forma livre de risco, para aquele mesmo período. Outra definição é encontrada em Brigham et alii
(2001, p. 148) destacando o aspecto da taxa nominal e da taxa real. Conforme esses autores, há a
definição de taxa real de juros livre de risco (com notação k∗), que representa a taxa de juros que
referenciaria um título sem risco se nenhuma inflação fosse esperada. Esta taxa não seria estática, pois
dependeria tanto das taxas de retornos que os tomadores de fundos esperariam obter sobre ativos
produtivos (o que implica um teto nas taxas estarão dispostos a pagar), bem como das preferências dos
agentes econômicos com relação ao consumo atual confrontado com o consumo futuro (o que
determinara o volume total disponível para ser emprestado).
Não obstante, os mesmos autores registram que uma taxa de juros livre de risco deve ser aquela
proporcionada por um ativo totalmente livre de risco (krf), que evidenciasse as seguintes
características: não possui risco de inadimplemento; não possui risco de vencimento; não tem risco de
liquidez e, por fim, também não possui risco de perda, se a inflação efetiva exceder a inflação esperada
no período. Em geral, a taxa livre de risco mais usual é a taxa de juros livre de risco nominal ou
cotada, que pode ser definida como sendo a composição da taxa real livre de risco mais um prêmio
pela inflação esperada (IP), conforme a expressão a seguir:
8
BERK, Jonathan & DEMARZO, Peter. Finanças Empresariais / Jonathan Berk, Peter DeMarzo; tradução Christiane de
Brito Andrei. – Porto Alegre: Bookman, 2009.
8
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krf = k* + IP
Em linha com os autores citados, Damodaran (2009, p. 159)9 afirma que um ativo será livre de
riscos se o agente econômico conhecer o seu retorno esperado com certeza, ou seja, o retorno real
verificado será sempre igual ao retorno esperado. Para que o ativo tenha esta característica é preciso
atender a duas condições simultaneamente: inexistência de risco de inadimplência e ausência de risco
de reinvestimento.
Com relação à primeira condição, a rigor, qualquer título emitido por uma empresa privada
possui algum grau de risco de inadimplência. Assim, os únicos títulos que não sofrem essa restrição
são os títulos governamentais, porque um governo soberano é capaz de emitir moeda para saldar seus
títulos.
Para atender à segunda condição, é necessário mitigar todos os efeitos de eventuais
reinvestimentos ao longo do período de manutenção do título. Uma forma de eliminar este problema
consiste em se exigir que o título não tenha pagamento de cupons ao longo de seu prazo de
vencimento. Assim, se o agente econômico está envolvido numa tomada de decisão com um prazo de
10 anos, a taxa livre de risco requerida deve ser a de um título do governo (supostamente livre de
inadimplência), com cupom zero (sem pagamentos intermediários).
Em se tratando de empresas, que podem ser analisadas por horizontes de tempo que podem
variar entre 1 ano e 10 anos ou mais, o correto é empregar como taxa livre de risco a taxa de um título
do governo com vencimento em prazo equivalente. Outra técnica é fazer com que a duration do titulo
seja equivalente à duration dos fluxos de caixa sob análise. Com base na estrutura a termo das taxas de
juros, em que se pode assumir um taxa de juros para cada prazo de vencimento, é possível promover
este alinhamento entre os prazos requeridos. Em geral, essas estruturas evidenciam que, para prazos
mais longos, são exigidas taxas maiores (são curvas consideradas normais com rendimentos
ascendentes). Damodaran (2009, p. 160) registra que as taxas de longo prazo nos EUA são em média
entre 2% e 3% maiores do que as taxas de curto prazo.
Ainda com relação às taxas livres de risco empregadas em modelos de avaliação, é preciso
manter a coerência entre a moeda dos fluxos de caixa projetados com a moeda em que são
denominados os títulos que servirão de referência para os ativos livres de risco. Por fim, Damodaran
9
DAMODARAN, Aswath. Introdução à Avaliação de Investimentos: ferramentas e técnicas para a determinação do valor de
qualquer ativo/ Aswath Damodaran; tradução Kleber Nunes. 2ª ed. – Rio de Janeiro: Qualitymark, 2009.
9
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(2009, p. 160) recomenda que, sob condições de inflação elevada e instável, caso os fluxos de caixa
projetados sejam estimados em valores reais, a taxa livre de risco deve observar o mesmo
procedimento para que a coerência seja mantida.
Merece destaque também a hipótese de que não existam entidades livres de inadimplência
disponíveis, como no caso de países em que os governos não são tomadores de empréstimos de longo
prazo. Nestes casos, é possível adotar uma acomodação que gera estimativas razoáveis para a taxa
livre de risco. A solução proposta consiste em verificar a taxa que as empresas mais seguras e estáveis
pagam por seus empréstimos e subtrair um pequeno spread deste valor. Damodaran (2009, p. 160),
intuitivamente, sugere que se reduzam em 1% a taxa que as empresas sólidas pagam por seus
empréstimos, para usar como estimativa da taxa livre de risco.
A conclusão que podemos inferir do que foi apresentado por Damodaran é o fato de que o
emprego de uma série histórica do mercado norte-americano não é uma medida apropriada, uma vez
que o ativo livre de risco de referência possui os seguintes inconvenientes:
1º - Não está expresso na mesma moeda dos fluxos de caixa projetados.
2º - Não possui a mesma duração que o fluxo de caixa projetado da concessão.
Assim, podemos verificar que existem elementos de convicção suficientes para sugerirmos que
o emprego de uma estimativa obtida a partir da taxa de juros média anual dos títulos do Tesouro
Americano (T-bond), com prazo de vencimento de 10 anos, no período de janeiro de 1995 a junho de
2005, para orientar os contratos de Concessões Rodoviárias no Brasil não foi uma medida apropriada.
3. Metodologia Científica.
Neste estudo foi utilizado o método hipotético-dedutivo, segundo o qual a suposição foi testada,
buscando-se compreender a relação entre os elementos abordados. Segundo Vergara (2007, p. 12) “O
método hipotético dedutivo (...) vê o mundo como existindo, independentemente da apreciação que
alguém faça dele, independentemente do olho do observador.”
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3.1 Tipo de Pesquisa
3.1.1 Quanto aos Fins
Este trabalho pode ser definido como uma pesquisa descritiva e explicativa, pois procura
descrever e explicar conceitos relativos ao emprego do método do Fluxo de Caixa Descontado nos
projetos de Concessões Rodoviárias e as eventuais violações de princípios da Moderna Teoria
Finaceira, que poderia comprometer a eficácia dos resultados obtidos, e, consequentemente, atrapalhar
o processo de tomada de decisão dos agentes envolvidos.
Esta escolha corrobora com Gil (1999) que disserta a Pesquisa descritiva como sendo a
descrição das características de determinada população, ou fenômenos, ou o estabelecimento de
relações entre variáveis. Acionalmente o autor afirma que a Pesquisa explicativa é caracterizada pela
preocupação em identificar as causas que contribuem para a ocorrência do fenômeno.
3.1.2 Quanto aos Meios
Quanto aos meios a pesquisa pode ser classificada como documental e bibliográfica, pois se
vale de documentos públicos (Notas Técnicas da STN/SEAE/MF adotadas pela ANTT), bem como
lança mão de bibliografia relativa ao tema em estudo.
3.2 Universo e amostra
O Universo da pesquisa compreende os aspectos normativos introduzidos pelos Órgãos
Governamentais no marco regulatório do Regime de Concessões no Brasil, e e suas implicação para os
agentes envolvidos. Os elementos selecionados para a análise não foram objeto de qualquer tratamento
estatístico, por isso dizemos que a amostra desses foi selecionada pelo critério da acessibilidade.
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3.3 Coleta de Dados
Os dados foram coletados através de pesquisa bibliográfica e documental usando como
subsídio materiais publicados em livros, artigos, revistas e legislação.
3.4 Tratamento dos Dados
Todos os dados levantados, quer sejam por pesquisa bibliográfica ou documental, foram
tratados de forma qualitativa. Neste sentido Neves (1996), afirma que a pesquisa qualitativa não
emprega técnica estatística, ela geralmente é direcionada mediante a coleta de dados através de
documentos ou pelo contato direto do entrevistador com o objeto de estudo, onde o pesquisador busca
a compreensão do caso, através dos participantes da situação estudada.
3.5 Limitações do Método
A pesquisa ficou limitada à subjetividade e interpretação dos pesquisadores. Embora seja
desejável buscar a neutralidade na análise, é uma limitação do próprio ser humano a ausência de total
imparcialidade diante dos fatos.
4. Análise dos Resultado
A partir das evidências contidas na doutrina, bem como no cotidiano do mercado, podemos
inferir que o procedimento adotado na Nota Técnica nº 64 STN/SEAE/MF viola pressupostos de
definição de uma taxa livre de risco.
Vimos que, para que um ativo tenha a característica de ser livre de risco, é preciso atender a
duas condições simultaneamente: inexistência de risco de inadimplência e ausência de risco de
reinvestimento.
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Com relação à primeira condição, os únicos títulos que não sofrem essa restrição são os títulos
governamentais, porque um governo soberano é capaz de emitir moeda para saldar seus títulos. Para
atender à segunda condição, é necessário mitigar todos os efeitos de eventuais reinvestimentos ao
longo do período de manutenção do título. Uma forma de eliminar este problema consiste em se exigir
que o título não tenha pagamento de cupons ao longo de seu prazo de vencimento. Além disso, é
necessário que o prazo do vencimento do título livre de risco seja equivalente ao prazo do projeto que
será avaliado empregando-se aquele parâmetro. Por fim, a tomada de decisão em finanças leva em
consideração os valores correntes de mercado, e não os valores passados.
A conclusão que podemos inferir do que foi apresentado, tanto por Sanvicente, quanto por
Damodaran é o fato de que o emprego de uma série histórica do mercado norte-americano, com o uso
do T bond de 10 anos (Título do Tesouro Americano de 10 anos), não é uma medida apropriada, uma
vez que o ativo livre de risco de referência possui os seguintes inconvenientes:
1º - Não está expresso na mesma moeda dos fluxos de caixa projetados.
2º - Não possui a mesma duração que o fluxo de caixa projetado da concessão.
3º - Não se refere a valores correntes de mercado, na ocasião da tomada de decisão.
Estas considerações podem gerar consequências bastante desagradáveis, na hipótese do modelo
de avaliação pelo método do Fluxo de Caixa Descontado constitui-se num elemento determinante na
tomada de decisão corporativa. A inadequada calibração do risco, e, consequentemente, a incorreta
precificação desse risco, podem levar à consequências desastrosas, numa eventual alocação de recursos
derivada da decisão equivocada de investir.
5. Conclusões
Com base no que foi apresentado, podemos responder a pergunta formulada na
problematização, arguindo que os procedimentos adotados na estimativa dos componentes do CAPM,
que por sua vez servirão de base para o cálculo da TIR nos projetos de Concessões Rodoviárias no
Brasil, são conflitantes com a boa doutrina financeira e com a prática corrente de tomada de decisão no
mercado brasileiro.
Uma das consequências derivadas desse tipo de conflito doutrinário e metodológico pode ser
uma ausência de interessados nos leilões de infraestruturas, promovidos pelo Governo Federal no bojo
de suas políticas de estímulo às Parcerias Público Provadas (PPPs). Tal cenário, se materializado,
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poderá atrasar bastante a provisão de infraestrutura logística no Brasil e a consequente superação dos
gargalos para a redução dos custos de nossa economia.
Referências Biliográficas
BERK, Jonathan & DEMARZO, Peter. Finanças Empresariais / Jonathan Berk, Peter DeMarzo; tradução
Christiane de Brito Andrei. – Porto Alegre: Bookman, 2009.
DAMODARAN, Aswath. Introdução à Avaliação de Investimentos: ferramentas e técnicas para a determinação
do valor de qualquer ativo/ Aswath Damodaran; tradução Kleber Nunes. 2ª ed. – Rio de Janeiro: Qualitymark,
2009.
DAMODARAN, Aswath. Avaliação de Empresas. – São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007.
GIL, A. C. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. São Paulo: Atlas, 1999.
GOMES, Ely do Carmo Oliveira et alii. Serviços de Concessão de Rodovias: o desempenho financeiro das
concessionárias que operam no mercado de ações. XIII SemeAd – Seminários em Administração, ISSN 21773866, setembro de 2010.
NEVES, J.L. Pesquisa Qualitativa – Característica Usos e Possibilidades. Caderno de Pesquisa de
Administração, v.1. n. 3, 2 sem.. São Paulo, 1996.
KOBORI, José. Análise Fundamentalista. – Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. 156p.
SANVICENTE, Antônio Zoratto. Problemas de estimação de custo de capital de empresas concessionárias no
Brasil: uma aplicação à regulamentação de concessões rodoviárias. Revista de Administração, São Paulo, v. 47,
n.1, p.81-95, jan./fev./mar.2012.
Nota Técnica nº64 STN/SEAE/MF, de 17 de maio de 2007
PRONUNCIAMENTO TÉCNICO CPC 01 - Redução ao Valor Recuperável de Ativos.
PRONUNCIAMENTO TÉCNICO CPC 12 - Ajuste a Valor Presente.
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