ENSINO DE CIÊNCIAS POR INVESTIGAÇÃO: DESAFIOS DA PRÁTICA PARA A ACULTURAÇÃO CIENTÍFICA E OS CONTEXTOS DE VULNERABILIDADE SOCIAL Wellington Alves dos Santos – [email protected] Instituto Federal do Espírito Santo/ EDUCIMAT Vitória – Espírito Santo Antônio Henrique Pinto – [email protected] Instituto Federal do Espírito Santo/ EDUCIMAT Avenida Vitória, 1729 – Jucutuquara Vitória – Espírito Santo Resumo: Num cenário de exigências de um ensino de Ciências direcionado para alfabetização/aculturação científica o trabalho apresenta uma revisão de literatura construída nos movimentos inicias de desenvolvimento do projeto de pesquisa de mestrado “Ensino de Ciências por investigação: os desafios do currículo e da prática em uma escola do contexto da vulnerabilidade social em Vitória/ES”. Uma pesquisa que objetiva a compreensão do currículo e da escola como instrumentos potencializadores de aculturação científica para a transformação da realidade de desigualdade nos contextos em vulnerabilidade social a partir das práticas investigativas. Na revisão das dissertações e artigos destacamos os desafios e as vantagens das práticas investigativas no processo de aculturação científica, destacando-as como importante metodologia para o ensino de Ciências nos contextos em vulnerabilidade social. Militando pela concretização efetiva da função social da escola nesses contextos, orientamo-nos pelas seguintes questões: Como essas práticas investigativas no contexto das escolas públicas em áreas em vulnerabilidade podem ser desenvolvidas? Quais as dificuldades encontradas para desenvolver um trabalho nessa perspectiva com esse público? Quais as contribuições que as atividades investigativas podem ofertar no sentido de instrumentar os sujeitos das classes populares que habitam esses espaços, para que possam agir maneira interventiva na transformação dessa realidade vulnerável? Como apontamento inicial, destacamos que as práticas investigativas nos trabalhos analisados, despontam como importante metodologia para o ensino de Ciências para a aculturação científica. Palavras-chave: Ensino de ciências por investigação, Aculturação científica, Vulnerabilidade social. 1 INTRODUÇÃO Vivemos em um mundo cada vez mais complexo, com um desenvolvimento econômico, tecnológico e informacional intenso e instantâneo, em que temos um contingente de sujeitos sem acesso, ou não são contemplados por esse desenvolvimento, que configura e legitima uma realidade desigual. Entendemos que o acesso democrático a esse desenvolvimento, como também seu questionamento, acontecerá com a progressiva instrumentalização das camadas populares para uma possível participação interventiva no processo decisão e de configuração de uma realidade diferenciada. Instrumentalização feita por intermédio da aquisição de saberes fundamentais sistematizados pela humanidade em seu percurso histórico, garantidos na escola (SAVIANI, 2012). Nesse contexto, tem-se buscado maneiras de reverter essa situação de desigualdade procurando promover ações em que seja possível um desenvolvimento que contemple a todos os sujeitos, principalmente os das classes populares, os primeiros vitimados por esse desenvolvimento genuinamente capitalista e opressor. É nesse cenário, configurado por intensas lutas, que há muito tem se travado lutas para se pensar e efetivar a função da escola e dos saberes por ela veiculados, uma vez que essa instituição social tem o dever de promover a formação dos cidadãos para que esses, possam agir de maneira crítica, informada e fundamentada no corpo da sociedade de modo interventivo. Buscando a articulação de movimentos que viabilizem a transformação da realidade em vulnerabilidade a que estão submentidos. Promover a reflexão sobre a função social da escola e instaurar ações que efetivamente contribuam para a instituição de uma educação preocupada com a superação do fenômeno da marginalidade, é umas das ações mais importantes, uma vez que a educação pode se constituir como um instrumento de reforço e legitimação da desigualdade, da exclusão e da dominação Assim, é preciso com um olhar histórico e social entender as ações da escola, a educação que promove, para ampliar e/ou devolver a sua função primeira perante a sociedade, que é a de garantir a aculturação dos sujeitos por meio dos saberes construídos historicamente pela sociedade, que são fundamentais para a ação crítica (SAVIANI, 2012).. Nesse sentido, buscamos no contexto da Educação em Ciências desenvolver um trabalho que evidencie um ensino de ciências centrado na apropriação dos conteúdos e conceitos científicos, em que os alunos direcionados pelo professor sejam considerados sujeitos ativos em seu processo de apropriação e construção de conhecimento. Um trabalho que privilegie a promoção de um ambiente para a aprendizagem dos saberes científicos importantes e construídos historicamente, aprendizagem dos próprios princípios do fazer e saberes da ciência, em um ambiente em que seja possível refletir sobre as implicações, interesses e limites por trás da produção científica. Num movimento de evidenciar a importância social da ciência, sem deixar de lado a explicitação das forças e interesses que a condicionam. Para colocar em prática um ensino de ciências capaz de promover aculturação científica e ainda contribuir para a construção de uma visão diferenciada do fazer científico, em que a ciência se constitui como um instrumento forjado de acordo com interesses históricos e sociais, acreditamos em uma educação científica pautada nas orientações do ensino e da aprendizagem investigativa. Com essas orientações do fazer investigativo defendemos a possibilidade da promoção de uma ciência passível de ser compreendida por todos e não apenas por uma parcela restrita da sociedade. Neste trabalho o termo aculturação chama a atenção para um ensino de Ciências que privilegie a aprendizagem num processo ativo de construção de conhecimento pelos alunos, “dando oportunidade de aprenderem a argumentar e exercitar a razão, em vez de fornece-lhes respostas definitivas ou impor-lhes seus próprios pontos de vista transmitindo uma visão fechada das ciências” (CARVALHO, 2010, p.3). Desse modo, uma aculturação distante do sentido de levar conhecimentos, de uma “educação bancária”. Uma aculturação que promove a apropriação dos conhecimentos das Ciências de forma a compreendê-la como determinada histórica e socialmente. Toda essa discussão debuta no quadro de um projeto de pesquisa de mestrado do Programa de Pós- Graduação em Educação em Ciências e Matemática (Educimat) do Instituto Federal do Espirito Santo (IFES) - Campus de Vitória/ES, intitulada “Ensino de Ciências por investigação: os desafios do currículo e da prática em uma escola do contexto da vulnerabilidade social em Vitória/ES”, em desenvolvimento. Assim, neste trabalho, apresentamos alguns apontamentos sobre o ensino de ciências por investigação construídos no processo da revisão de literatura do campo de pesquisa, delineando a relação do campo de pesquisa “ensino de ciências por investigação” e suas elucubrações em articulação com as temáticas “vulnerabilidade social” e “classes populares”, focalizando o processo de transformação das realidades sociais. 2 PERCURSO METODOLÓGICO Neste trabalho, como sinalizamos, apresentamos uma revisão literária construída no processo inicial de desenvolvimento do projeto de pesquisa de mestrado “Ensino de Ciências por investigação: os desafios do currículo e da prática em uma escola do contexto da vulnerabilidade social em Vitória/ES”, no quadro do Programa de Pósgraduação em Educação em Ciências e Matemática (Educimat). O objetivo intencionado por esse estudo é apresentar possibilidades de implementação do ensino de ciências na perspectiva da investigação em uma escola presente numa área em vulnerabilidade social da Grande Vitória/ES. Através de proposições de práticas investigativas no ensino de Ciências buscaremos pensar o currículo prescrito olhando-o a partir de uma perspectiva ampla. Seu dialogo com o contexto socioeconômico da escola (se o diálogo é possível e como tem se constituído e se pode constituir-se de outras maneiras), com a aprendizagem e com as concepções de educação que circulam no ambiente escolar. Concepções essas, que acreditamos implicar no interesse/desejo dos alunos em aprender e viver a escola. O empreendimento das práticas nos auxiliará ainda, a identificar e refletir sobre as dificuldades de efetivação de um ensino de Ciências pautado na abordagem investigativa, no contexto da vulnerabilidade social. Os dados apresentados, neste trabalho (dissertações e artigos), foram levantados a partir de uma busca exploratória no banco de dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e de artigos publicados nos anais do Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências (Enpec). A pesquisa contempla dissertações e artigos publicados no período de 2006 a 2013. Salientamos que as dissertações e artigos apresentados aqui, compondo o corpo do texto da revisão, estão condicionados a temática do ensino de Ciências por investigação abordando aspectos da prática e de sua vinculação a perspectiva da alfabetização/aculturação científica no atendimento da educação escolar aos sujeitos das camadas populares submetidos às condições de vulnerabilidade social. No processo de busca das dissertações e artigos nos bancos de dados mencionados utilizamos como principal descritor direcionador “ensino de ciências por investigação”, às vezes sozinho e em outras tentativas em associação com os descritores “vulnerabilidade social” e “classes populares”. A busca, nesses bancos, orientada pela perspectiva do ensino de Ciências por investigação, sua importância no contexto da aprendizagem dos conteúdos na disciplina e a sua vinculação à temática vulnerabilidade social, colocou-nos diante de um quantitativo de catorze (14) dissertações que após leitura e verificação de adequação ao tema de interesse dos pesquisadores foram reunidas em um número de quatro (4) dissertações e um (1) artigo no banco da Capes. No processo de seleção dos artigos nos anais do Enpec encontramos dificuldades no acesso de alguns, com isso na exploração feita a esse banco conseguimos reunir um total de três (3) artigos. Após a seleção dos trabalhos olhando a relação com nossos interesses temáticos, aprofundamos a leitura das dissertações e artigos conferindo os objetivos, o processo metodológico, os resultados obtidos e as considerações sobre o ensino de Ciências por investigação na aprendizagem dos conteúdos nessa disciplina. Observando também a proximidade com a temática ensino por investigação e os contextos em vulnerabilidade social. Com essas considerações, na continuidade do presente texto compartilhamos os apontamentos e reflexões estruturadas a partir da revisão literária acreditando que essa ação, do debruçar-se sobre a produção do campo é fundamental para a familiarização com o cenário de pesquisa, a configuração do processo metodológico e para o encontro com os sujeitos da pesquisa, vislumbrando uma captação efetiva dos fatores que condicionam a temática nos diferentes contextos (MOREIRA, 2014). 3 ENSINO DE CIÊNCIAS POR INVESTIGAÇÃO: APONTAMENTOS DE UMA REVISÃO LEITERÁRIA Delizoicov, Slongo e Lorenzetti (2013) apresentam um panorama da pesquisa em Educação em Ciências no Brasil a apartir de uma investigação exploratória dos trabalhos apresentados como comunicação oral no Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências (ENPEC) no período de 1997 a 2005. Os autores destacaram, no contexto da educação em ciências no ENPEC, a prevalência de trabalhos abordando o ensino de Física, ainda que outras áreas aparecessem de maneira significativa no bojo dos trabalhos (Ensino de Biologia, Ensino de Ciências e Ensino de Química). Num panorama geral os estudos a respeito de conteúdos e métodos de ensino debutaram como centrais no contexto da educação em ciências, o trabalho evidenciou também que no período estudado o Ensino Médio esteve entre as preocupações das pesquisas, seguido do Ensino Superior e Fundamental. Um dado que nos interessa, nesse trabalho, é “o maior volume de trabalhos apresentados no evento concentrando-se no foco Conteúdo-método, ou seja, no recorte temporal específico, prevaleceram estudos que se ocuparam, prioritariamente, “com o que e como ensinar” (idem, 2013, p. 471). Uma vez que estamos nos debruçando em proporcionar a apropriação de conteúdos no contexto do ensino de ciências (o que) em escolas de áreas em vulnerabilidade social por meio das práticas investigativas (como), com vistas à formação de sujeitos instrumentalizados cientificamente para agir crítica e interventivamente na realidade em que estão inseridos, esse dado nos indica, portanto, que estamos na busca por endossar um caminho em ascensão, em que o saber escolar é fundamental para um desenvolvimento pautado nos interesses e nas necessidades humanas. Nesse sentido, Silva e Gonzaga (2014) a partir das narrativas de mestrandos do Programa de Pós-Graduação em Ensino de ciências na Amazônia, refletem sobre a necessidade de transformações no currículo instituído no ensino de Ciências. Por meio dos dizeres dos sujeitos entrevistados os autores argumentam sobre a vigência da instituição de um currículo em Ciências com vistas à educação e a alfabetização científica potencializando os sujeitos a uma leitura mais integral da realidade. Apontam a fragilidade como se constituiu e tem se constituído o ensino de Ciências e alertam para a necessidade de transformações essenciais no currículo, abandonando ranços do positivismo e da prática da aprendizagem encerrada no processo de memorização mecânica de conceitos. É oportuno destacar, nesse contexto, a perspectiva investigativa e a sua relação com o currículo, exigindo [...] agora que o ensino consiga conjugar harmoniosamente a dimensão conceptual da aprendizagem disciplinar com a dimensão formativa e cultural. Propõe-se ensinar Ciências a partir do ensino sobre Ciências. O conteúdo curricular ganha novas dimensões ao antigo entendimento do conceito de conteúdo. Passa a incluir, além da dimensão conceitual, as dimensões procedimentais e atitudinais, esta representada pela discussão dos valores do próprio conteúdo. (CARVALHO, 2010, pp. 2-3) A partir dessas reflexões e da indicação para onde tem se direcionado as pesquisas no ensino de Ciências e da defesa pelas práticas investigativas, podemos destacar o trabalho de Diogo (2012) que encontrou na metodologia qualitativa os pressupostos necessários para investigar o efeito das atividades de cunho investigativo sobre a aprendizagem em 30 alunos de 9o ano. O sistema cardiorrespiratório subunidade de uma temática maior que tratava do organismo humano e o equilíbrio (componente curricular do 3º ciclo do ensino básico, em Portugal) foram pilares para a construção e implementação dessas atividades. Nesse processo, articulando diferentes instrumentos de coleta de dados como a observação, questionários, documentos diversos produzidos pelos alunos, documentos oficiais e ainda, notas de caderno de campo a autora identificou as competências desenvolvidas, as dificuldades reveladas e a avaliação feita pelos alunos quando imersos nessas atividades. Nas competências desenvolvidas, Diogo (2012) registrou a aquisição de conhecimento científico, a identificação e a resolução de problemas, a formulação de hipóteses e a pesquisa de informação. Além disso, os alunos também adquiriram competências de atitudes (cooperação, trabalho em grupo etc.). A autora destacou que não houve dificuldades significativas, ainda que o pouco tempo para o cumprimento das atividades emergiu como um problema. A avaliação dos alunos sobre as atividades investigativas foi positiva, destacando que “os alunos referem-se a uma melhor compreensão, ao esclarecimento de dúvidas, à colaboração entre os colegas, à atitude responsável de saber ou aprender a ouvir a opinião dos colegas e à vantagem da divisão de tarefas”. (idem, 2012, p. 96) Diogo (2012) ainda destaca, a importância das atividades investigativas para a literacia científica com vistas a formação de um cidadão que se adapte a realidade dinâmica pautada em orientações científicas. A menção a formação de um sujeito capaz de selecionar e decidir de maneira embasada na sociedade é umas das defesas para um ensino de Ciências na perspectiva investigativa. Chamamos a atenção para a não inclusão das premissas da transformação social, a orientação de sujeitos capazes de selecionar, decidir e intervir, no sentido de transformar agindo de forma crítica e fundamentada, nesse trabalho. As atividades investigativas assumem centralidade no processo de instituição de uma educação em Ciências como instrumento para formar um cidadão capaz de tomar decisões, intervir crítica e fundamentadamente sobre a realidade constituída, que muitas das vezes é composta por interesses que divergem do consenso e do desejo da maioria, maioria representada principalmente pelas classes populares. Segundo Capecchi (2013) no processo educativo de cunho investigativo “[...] é preciso criar condições a fim de que o cotidiano seja problematizado em sala de aula – para que novas questões sejam criadas e ferramentas para respondê-las sejam apresentadas e experimentadas”. Dando-se ênfase, assim, as dimensões sociais e culturais dos saberes da Ciência, firmando a concepção da mesma como forma de cultura. Nesse cenário, Veiga (2012) buscou conhecer qual influência as atividades investigativas mantém sobre o desenvolvimento de competências em 24 alunos em sala de aula, tendo como unidade de ensino o tema “Das estrelas ao átomo”. Para responder a questão principal de seu trabalho, a autora formulou outras três questões direcionadoras, a primeira questão procurou delinear as dificuldades com que os alunos se deparam ao realizarem as atividades de investigação e como superam essas dificuldades, a segunda questão intencionou identificar as estratégias que os alunos utilizaram para resolverem as atividades de investigação e na terceira questão apresentou a avaliação feita pelos alunos no uso das atividades de investigação. Investigando sua própria prática, Veiga (2012) por meio dos pressupostos qualitativos de investigação, de cunho interpretativo, evidenciou os significados e sentidos produzidos pelos alunos no desenvolvimento das atividades investigativas. Identificou dificuldades nas competências conceituais (na colocação de questões, na formulação de hipóteses, no planejamento de experiências e na comunicação escrita), nas competências processuais (na pesquisa/seleção de informações e na seleção de material de laboratório) e na competência atitudinal/social/axiológica (dificuldades para o trabalho em grupo, usar tecnologia como o ‘computador’, na comunicação de resultados e organização do tempo para realizar as atividades). As dificuldades registradas foram superadas com as intervenções da professora-pesquisadora e na medida em que os alunos foram se habituando ao fazer investigativo. Como estratégias de aprendizagem usadas pelos alunos durante as atividades investigativas Veiga (2012) registrou a tentativa e o erro, a busca pela orientação do professor, o trabalho na própria tarefa, planejando, questionando e pesquisando e o trabalho em grupo. A avaliação dos alunos a respeito do estudar a partir da perspectiva investigativa evidenciou o reconhecimento dessas atividades para a realização de aprendizagens, principalmente quando articula conceitos/teorias ao cotidiano. Entre as aprendizagens emergiu o “trabalhar em grupo, a dividir as tarefas, a repeitar a opinião uns dos outros, a formular questões, a formular hipóteses, a planejar, a realizar experiências, a utilizar ferramentas informáticas e conteúdos” (Idem, p. 84, grifo nosso). Veiga (2012) finaliza a redação de seu trabalho destacando os contributos da condução do processo de ensino e aprendizagem pelos caminhos da investigação que vão para além da aprendizagem significativa dos alunos, antes coloca o professor em processo de (re)construção do seu fazer, do seu papel nessa engrenagem educativa, dando um salto qualitativo na formação/constituição profissional. Acreditamos na relevância desse trabalho na defesa pelas atividades investigativas por desvelar dificuldades no/do empreendimento tanto por parte dos alunos quanto dos professores e sinalizar que essas dificuldades são superadas no acontecer do trabalho, quando todos se engajam e se habituam a ele. Pensamos que alguns aspectos do trabalho científico poderiam ter sido destacados pela professora no desenvolvimento das atividades quando as dificuldades apareceram, demonstrando o próprio caráter de busca, de incertezas, de tentativas e erros que possui o fazer científico. Contribuindo, assim, para que os alunos pudessem construir uma visão de ciência desencarcerada do dever de produzir uma verdade absoluta, acabada. O conhecimento científico é um constante jogo de hipóteses e expectativas lógicas, um constante vaivém entre o que pode ser e o que "é", uma permanente discussão e argumentação/contrargumentação entre a teoria e as observações e as experimentações realizadas. (PRAIA; CACHAPUZ; GILPÉREZ, 2002, p. 255). Castro (2010, p.111) chama-nos ao exercício de marcar, no contexto da metodologia do ensino de ciências por investigação, os aspectos da história da ciência (os sujeitos e os entraves em que os conceitos e saberes são forjados) já que “identificar os sujeitos, as causas e os condicionantes de suas investigações ajuda a fazer com que a ciência seja reconhecida como passível de reconstrução, como objeto de estudo possível de ser estudado por todos e não apenas por alguns privilegiados”. Nessa perspectiva, Veríssimo (2011) buscou identificar as reações de alunos imersos em tarefas investigativas, tendo como conteúdo a ser lecionado a temática “Materiais”, é importante destacar que essa temática faz parte do currículo português (Lisboa), país de origem do trabalho, a “qual tem como objectivo que os alunos adquiram conhecimentos relacionados com os elementos constituintes da Terra e com os fenómenos que nela ocorrem” (Idem, p. 36). O estudo de ordem qualitativa teve como participantes nove (9) alunos de uma turma de 7o ano de escolaridade, a autora, que pesquisou sua turma, destacou as dificuldades reveladas, as aprendizagens realizadas e as opiniões dos alunos a cerca das atividades de investigação. Nesse contexto, Veríssimo (2011) em sua interpretação sobre os dados produzidos a partir da observação participante, dos registros de documentos escritos pelos alunos, dos registros de áudio e das notas de campo inferiu a importância das atividades investigativas para a mobilização de competências preconizadas no currículo, para a motivação na realização das atividades propostas, para a evolução no processo de comunicação - principalmente na forma escrita, fato constado na crescente melhora das respostas escritas aos problemas/atividades propostas. Destacou no trabalho a significativa contribuição das atividades investigativas para a apropriação, por parte dos alunos, dos conceitos científicos. Essas atividades, de cunho investigativo, ainda se encontram distantes da realidade de muitas escolas, a sua implementação revela as dificuldades tanto do espaço físico das escolas, quanto dos alunos que não estão habituados à metodologia investigativa, que no limiar revela gargalos do sistema educacional num quadro geral. Veríssimo (2011) apresentou algumas das dificuldades relacionadas aos alunos registradas no desenvolvimento de seu trabalho, a saber, dificuldades de ordem atitudinais no que diz repeito a autonomia para a realização das atividades propostas; de ordem cognitivas como formular questões, tirar conclusões, pesquisar e interpretar; de ordem procedimental como planejar e realizar experimentações e, sem muita importância, mas apresentada, a dificuldade de alguns alunos no uso de recursos didáticos (computador), dificuldade essa superada na continuidade do trabalho. Militantes na defesa pela presença das atividades investigativas, no ensino de Ciências em escolas presentes nas áreas em vulnerabilidade social, como instrumento para o processo de alfabetização científica, como forma de preparar os alunos para participarem ativamente no processo de transformação da realidade desigual, da qual somos integrantes, salientamos que Veríssimo (2011) contribui para reforçar a eficácia das práticas investigativas no processo de reabilitação do papel social da escola na formação crítica por meio dos conceitos e conteúdos científicos. O trabalho destacou a consonância entre essas práticas, a aquisição de conceitos e as orientações curriculares voltadas para a formação de um cidadão conhecedor do trabalho científico. Acreditamos que o trabalho poderia ter dado destaque para os condicionantes sociais e históricos do conhecimento científico, contribuindo para a construção de uma perspectiva mais aberta do trabalho e dos saberes das ciências. Apresentamos, nesse víeis, num contexto de mudanças organizacionais e curriculares no âmbito do ensino de ciências (Biologia e Geologia) em Portugal, uma professora pesquisadora reflexiva de sua prática, que apresenta em sua dissertação um trabalho que destaca a importância da prática pedagógica na perspectiva da investigação para a promoção da aprendizagem, da motivação para a aprendizagem e o desenvolvimento das orientações preconizadas no currículo. Pesquisando sua própria turma, alunos do 10º ano de escolaridade, a autora destacou como questão orientadora do trabalho “Qual a influência das práticas de investigação para a aprendizagem em Ciências?” (CARVALHO, 2010, p. 7). Nesse contexto, utilizou uma abordagem metodológica classificada como mista abarcando a perspectiva quantitativa como a principal e a qualitativa como subjacente, justificando, assim, a possibilidade de uma captação mais fiel dos dados do/no contexto estudado. Como instrumentos de coleta de dados a pesquisadora fez uso de diferentes estratégias, desse modo utilizou questionários com questões com respostas chaves para produzir os dados quantitativos, sendo que algumas dessas questões requeriam respostas complementares abertas. Todas as questões tinham como objetivo delinear o desenvolvimento dos alunos com relação a aquisição e aumento dos conhecimentos, as impressões e opiniões sobre o aprender com o fazer investigativo a partir das atividades propostas. Outro instrumento usado foi a observação naturalista, produzindo os dados com notas de campo, durante a implementação das atividades. Carvalho (2010) concluiu que as práticas investigativas influenciaram positivamente as variáveis dependentes do estudo, a saber, “a motivação dos alunos para a aprendizagem de Biologia, o desenvolvimento das competências preconizadas no currículo, o desenvolvimento do pensamento científico e a aprendizagem dos alunos em Ciência” (idem, p. 131). A autora destacou ainda, que o estudo dos fenômenos científicos por meio de situações do cotidiano contribuiu para o aumento dos conhecimentos dos alunos sobre os conteúdos abordados e que as atividades desenvolvidas em “ambiente laboratorial/experimental” foram importantes na articulação dos conhecimentos teóricos e da prática, “permitindo a compreensão dos conteúdos leccionados e a estruturação de novos saberes” (idem, p. 131, grifos nossos). Assim, o estudo contribui com a nossa defesa pelas práticas investigativas como um instrumento importante para a promoção da motivação dos alunos das classes populares ao ato de estudar. Acreditamos que essa motivação se constitui, num contexto de desigualdade, como uma ferramenta importante na aquisição dos conteúdos tão necessários à transformação da realidade desigual a que estão submetidos. Nesse cenário, Vieira e Zuliani (2014) por meio da prática investigativa na aprendizagem de conceitos de Química evidenciaram as vantagens (interatividade, participação ativa, apropriação de conceitos, entre outras) no desenvolvimento do fazer investigativo no ensino de Ciências. A pesquisa traz importantes contribuições no sentido de organizar um estudo com base na investigação. Destaca o papel do professor como mediador do processo, sendo figura importante na ação de incitar o diálogo, o debate e as discussões acerca das hipóteses/explicações construídas para que posteriormente os alunos desenvolvam e realizem ações/experimentos em que evidenciem suas suposições. Com esses apontamentos reafirmamos, que neste trabalho, assumimos o entendimento de que: Um ensino que vise à aculturação científica deve ser tal que leve os estudantes a construir o seu conteúdo conceitual participando do processo de construção e dando oportunidade de aprenderem a argumentar e exercitar a razão, em vez de fornece-lhes respostas definitivas ou impor-lhes seus próprios pontos de vista transmitindo uma visão fechada das ciências (CARVALHO, 2010, p. 03). Um trabalho que possibilite aos alunos questionar e refletir criticamente sobre esses saberes, colocando-os como capazes e responsáveis por fazer esses questionamentos. Uma ação que, antes, tem como papel desconstruir a postura inquestionável da ciência e de seus saberes que habita em nós. Um passo importante para que os alunos possam entender a realidade e sobre ela agir de forma a dar novos sentidos, a compreender certas posturas e ações inquestionáveis que permeiam nosso cotidiano. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Os trabalhos destacam um caminhar em direção à instituição de práticas no ensino de Ciências que tomam os educandos como centro do fazer escolar, garantindo a eles uma aprendizagem significativa e uma alfabetização/aculturação científica. Nesse caminho, as práticas investigativas emergem como umas das principais abordagens para assegurar essa formação. As dissertações envolvendo atividades investigativas, em sua maioria desenvolvidas por professores pesquisadores que laçam mão de sua própria prática, são desenvolvidas com o objetivo de melhorar sua atuação diante de uma realidade complexa e da necessidade de formação de sujeitos literados ou aculturados, ou ainda alfabetizados cientificamente para agir de maneira consciente e crítica. Nessas dissertações as dificuldades, as estratégias de aprendizagem, as interações agenciadas, a aquisição de conceitos/conteúdos são evidenciadas de maneira a legitimar as práticas investigativas como importantes para a promoção de um ensino de Ciências com vistas a instrumentalização dos sujeitos com os saberes e fazeres da ciência. A análise dos trabalhos, principalmente das dissertações, faz-nos destacar a falta de uma abordagem que contemple alunos e escolas de áreas em vulnerabilidade social, destacando a função social da escola. Desse modo, questionamo-nos: Como essas práticas investigativas no contexto das escolas públicas em áreas em vulnerabilidade podem ser desenvolvidas? Quais as dificuldades encontradas para desenvolver um trabalho nessa perspectiva com esse público? Quais as contribuições que as atividades investigativas podem ofertar no sentido de instrumentar os sujeitos das classes populares que habitam esses espaços, para que possam agir maneira interventiva na transformação dessa realidade vulnerável? Com esses questionamentos, no bojo do projeto de pesquisa, intentamos evidenciar uma escola que cumpre/assume a sua função social, em que o currículo deve expressar e ser instrumento de garantia de que os educandos terão acesso e se apropriarão dos saberes necessários ao desenvolvimento crítico e político, potencializando a transformação da realidade em que estão inseridos. Nesse sentido, um currículo para as classes populares deve reunir, assim, todos os esforços necessários para que os sujeitos dessas classes por meio da apropriação, cada vez mais crítica e integral, dos saberes sejam colocados no exercício de leitura do mundo e, entendendo-o, instaurar e inserir-se em movimentos em que possam assumir novas perspectivas de vida e reestruturação da realidade e da base social vigente. Assim, constituídos pelos pressupostos do fazer investigativo, lembramos de MÉSZÁROS (2008), quando destaca a necessidade da escola/educação sofrer transformações essenciais, que abarquem toda a sua estrutura de internalização. É preciso transformar a essência, abandonar a essência capitalista opressora, que habita os processos educativos e dar a eles novos objetivos, novos métodos, novas estruturas que possibilite a democratização dos saberes e da sociedade. O que exige novas filosofias de aprendizagem, de homem e mesmo de sociedade. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CAPECCHI, M. 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TEACHING SCIENCE IN RESEARCH: CHALLENGES OF PRACTICE FOR ACCULTURATION SCIENTIFIC AND SOCIAL CONTEXT OF VULNERABILITY Abstract: In a requirements of a science teaching scenario directed to literacy/science acculturation work presents a literature review built in the initial movements of project development MSc Research "Teaching Science by research: the challenges of curriculum and practice in a school context of social vulnerability in Vitória/ES." A survey aimed at understanding the curriculum and school instruments as boosters of scientific acculturation to the changing reality of inequality in social contexts where vulnerability from investigative practices. When reviewing dissertations and articles highlight the challenges and advantages of investigative practices in science acculturation process, highlighting how important the methodology for the teaching of science in social contexts where vulnerability. Militating for the effective implementation of the social function of the school in these contexts, we look for the following issues: As these investigative practices in the context of public schools in areas where vulnerability can be developed? What are the difficulties encountered in this work to develop a perspective with this audience? What are the contributions that can offer investigative activities in order to instrument the subject of the popular classes who inhabit these spaces, so that they can act interventional vulnerable way in transforming this reality? As an initial appointment, we emphasize that the investigative practices in the analyzed studies, emerge as important methodology for teaching science for scientific acculturation. Key-words: Teaching science by inquiry, Scientific acculturation, Social vulnerability.