O TRABALHO PEDAGOGICO NO HOSPITAL PEQUENO PRINCIPE

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O TRABALHO PEDAGOGICO NO HOSPITAL PEQUENO PRINCIPE:
UM PROCESSO PAUTADO NA RELAÇAO DOS SUJEITOS
SANCHEZ, Eluane Miriam Santos1- SME Curitiba
MATTOS, Carolina Domingues de2 - SME Curitiba / HPP
PETERS, Itamara3 -SEED Paraná
Grupo de Trabalho - Educação Hospitalar.
Agência Financiadora: não contou com financiamento.
Resumo
O presente trabalho descreve a relação pedagógica entre crianças e adolescentes de 0 a 18
anos em tratamento de saúde no Hospital Pequeno Príncipe, que por esse motivo interrompem
seu processo educativo formal no ambiente escolar, e os educadores atuantes nesse mesmo
espaço. A prática do trabalho se dá em combate a uma educação simplificada e esvaziada de
questionamentos pouco condizentes com a realidade de crianças que, mesmo estando
hospitalizadas, não deixam de sentir necessidade de alimentar a mente com conhecimento,
ciência, cultura e arte. Tal proposta vem sido criada pelo Setor de Educação e Cultura
formado por professores e educadores contratados pelo hospital e conveniados das Secretarias
de Educação Municipal de Curitiba e Estadual do Paraná.
Palavras-chave: Educação hospitalar. Sujeito coparticipe. Metodologia diferenciada.
Introdução
O presente texto tem como foco principal a apresentação da fundamentação teórica
que orienta a proposta pedagógica e a prática dos professores/educadores4 nas atividades do
1
Educação Artística, Desenho pela UFPR. Professora da SME de Curitiba no Setor de Educação e Cultura do
Hospital Pequeno Príncipe. Email: [email protected]
2
Pedagogia pela UFPR. Professora da SME de Curitiba no Setor de Educação e Cultura do Hospital Pequeno
Príncipe e Educadora contratada pelo Hospital no mesmo setor. Email: [email protected]
3
Letras pela UTP e Pedagogia pela UFPR. Professora da SEED, Paraná no Setor de Educação e Cultura do
Hospital Pequeno Príncipe. Email: [email protected].
4
Utilizaremos aqui o termo professores para profissionais com diploma de licenciatura e educadores, para
profissionais de diversas áreas com ou sem ensino superior e que se dedicam ao trabalho docente. Utilizaremos
no corpo do texto a expressão professor/educador, por conter esses dois grupos atuando juntos no Setor de
educação e cultura.
27927
cotidiano da educação hospitalar. Sendo assim, descrevem-se os modos de proceder que vem
sendo criados, recriados e utilizados em dez anos de experiência no setor de Educação e
Cultura, apresentando uma pratica embasada e teorizada em suas próprias metodologias de
ensino e aprendizagem que constituem um projeto político-educacional em ambiente
hospitalar.
As crianças/adolescentes5 de 0 a 18 anos em tratamento de saúde e seus
acompanhantes6, no Hospital Pequeno Príncipe na cidade de Curitiba, PR, experimentam a
oportunidade de participar de um projeto de educação no próprio hospital. Estes chegam ao
hospital Pequeno Príncipe, vindos de vários lugares: Curitiba e região metropolitana, interior
do estado, estados vizinhos, demais regiões do Brasil, e ainda outros países. Essa pluralidade
cultural implica nas mais variadas situações escolares: crianças que pela continuidade,
distancia ou outra adversidade ocasionada pelo tratamento estão fora da escola ou a
frequentam pouco, comprometendo seu processo de aquisição de conhecimento. Observa-se
em algumas delas também um desinteresse pela escola, uma vez que o processo de inclusão
ainda não é um direito garantido em sua totalidade.
Dessa forma, para garantir o direito de crianças /adolescentes7 à educação sob seus
vários aspectos, no tocante a suas interfaces sociais, educacionais, individuais e coletivas.
Constitui-se desde o ano de 2002 o Setor de Educação e Cultura, criado por esta instituição,
vem trabalhando na perspectiva de estabelecer diálogo entre a escola e o hospital, promover
ações culturais e valorizando o conhecimento humano produzido universalmente, seja ele
popular ou cientifico.
Pensar a Educação
Pensar em educação e em especial na educação em um ambiente diferenciado no qual
há inúmeros fatores conjugados exige uma concepção educativa que vá além dos domínios e
das paredes da escola. E é com esta visão de educação que o modo Pequeno Príncipe de Fazer
Educação propõe uma pratica educacional que fomente no sujeito, seu protagonismo,
5
Utilizaremos aqui a expressão criança/adolescente por não adotarmos uma forma muito rígida de separação,
uma vez que os processos de maturação podem vir a ser alterados pelo quadro clinico do individuo.
6
Consideramos aqui o acompanhante como o responsável que está junto com a criança. Este participa do
processo ensino-aprendizagem, modulando sua ação hora auxiliando na construção do conhecimento, hora
aprendendo junto, e resignificando seus conceitos também.
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ensinando-lhes a ter voz, tornando-os coparticipes na construção do conhecimento.
Para Paulo Freire a educação é baseada no diálogo e na interação entre professor e
aluno. Desse modo, o educador tem um papel de destaque como mediador entre o mundo do
conhecimento e o próprio aluno. Surge assim a tríade reflexão-ação-reflexão, na qual cabe ao
educador ser agente de transformação social, articulando teoria e prática, possibilitando uma
reflexão da ação praticada e consequentemente refletir sobre o desdobrar desta ação. Sendo
assim: “a relação dialógica estabelece uma nova relação de formação capaz de incluir a
criança e o jovem em um contexto de saber/cultural sistematizado e torná-lo vivência de
consciência crítica” (FREIRE, 1996). O diálogo é uma questão determinante para o encontro
das vozes do educador e do educando, isto é, uma condição de ensinar e de aprender e de
constituir identidades.
Então, é preciso reconhecer e respeitar os diferentes tempos dos sujeitos, procurando
estabelecer relações necessárias à constituição de conhecimentos e valores. Isto se conquista
por meio da interação relacionada ao eu-outro e na mediação. Para (FREIRE, 1994):
O ato de aprender está diretamente relacionado à função social que o sujeito exerce
e às experiências individuais, intimamente relacionadas com o modo de pensamento
que o sujeito possui, portanto, aprender não é “repetir a lição” memorizada
mecanicamente, vai muito além (FREIRE, 1994, p. 33.)
Pensando nisto, Freire afirmou ainda que, os aspectos histórico-sociais e as diferenças
individuais do educando devem ser considerados, uma vez que ele é um ser histórico e se
constrói nas relações com os outros homens e com o mundo, partindo do pressuposto de que
cada sujeito possui uma configuração única das experiências vivificadas.
Posto que a educação só acontece por meio das relações sociais estabelecidas com a
comunidade vivida, acredita-se na educação hospitalar emancipada da escola. Que tenha
identidade própria, pois sendo assim, é capaz de refletir a voz dos participantes da ação. Isso
não significa negar a escola, mas sim reconhecer novos espaços de sistematização do
conhecimento. “As crianças e adolescentes, sejam elas com curto, médio ou longo tempo de
internamento, passam a atuar em um contexto multicultural, étnico, heterogêneo e itinerante”.
(HOSPITAL PEQUENO PRÍNCIPE, 2007) muito peculiar no ambiente hospitalar, fazendose necessária a readequação do tempo e do espaço do aprender.
Compreende-se também que além de diálogo e reflexão, o trabalho do
professor/educador, é comprometer-se com metodologia e planejamento, mas no sentido de
poder criá-los mediante contrato com o sujeito do diálogo e não impor sua forma de fazer
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como instrumento de poder. Como afirma Imbernón: “os professores podem ser verdadeiros agentes
sociais, capazes de planejar e gerir o ensino-aprendizagem, além de intervir nos complexos sistemas que
constituem a estrutura social e profissional” (IMBERNÓN, 2001, p.46).
Dessa forma, o que aprender então? “É infinita a quantidade de coisas a se saber, de
sentidos a se dar ao mundo.” (HPP, PROJETO POLÍTICO EDUCACIONAL, 2007.). Um
conhecimento de ordem universal que lance mão da comunhão de sermos humanos, vem ao
encontro da possibilidade de permitir-se participar do processo de democratização do saber.
Saber para estar atuante no mundo. Encontrar as vias de acesso e decifrar os códigos para
então estar em constante processo de inclusão na sociedade.
Assim, propõem-se ações pedagógicas de trocas mútuas, para que a aprendizagem seja
significativa: a proposta é oferecer a cada aluno em situações de aprendizagem oportunidades
de construir aquilo que está dentro das suas possibilidades cognitivas e físicas.
Para Perrenoud, 1999, a abordagem está centrada no aprendiz e em seu itinerário de
aprendizagem, na individualização do percurso de formação. Para o autor diferenciação é
romper com a pedagogia magistral, e é, sobretudo, uma maneira de por em funcionamento
uma organização de trabalho que integre dispositivos didáticos de forma a colocar cada aluno
perante a situação mais favorável de aprendizagem. Diante disto, programar uma “educação
sob medida” é, conforme Perrenoud (2000, p.9), “... um sonho de todos aqueles que acham
absurdo ensinar a mesma coisa no mesmo momento, com os mesmos métodos, a alunos muito
diferentes”.
Colaborando com a ideia Marquezam afirma que: “Adequar o ensino às características
de cada aprendiz, não é só uma questão de bom senso pedagógico, se não uma questão de
respeito à pessoa, faz parte da exigência inadiável de igualdade” (MARQUEZAM, 2005,
p.06).
Nessa perspectiva o ambiente hospitalar é também um local de educação. Para a
diretora executiva do Hospital Pequeno Príncipe, o hospital é: “Um local onde o ser humano é
visto como um ser integral, que vive em sociedade e está inserido em um ambiente. Um ser
que precisa de cuidados, que têm direitos, possui uma cultura e muitos sonhos! Pequeninos
que representam o futuro do nosso país.” (CARNEIRO in Colorindo as flores os bichos e as
paisagens de Curitiba, 2010, p.03).
Dessa forma, a educação é acolhida pelo Hospital Pequeno Príncipe que a vê como
parte integrante e constituinte do ser humano que na sua complexidade e fragilidade alimentase do fluxo da vida, buscando no trabalho do professor/educador alimento para sua parte não
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comprometida pela doença, afirmando-se sujeito de direito e de fato na sociedade. Na
perspectiva de ultrapassar a assistência a saúde e ir além do cuidado, exercem um importante
papel no que diz respeito à garantia dos direitos da criança e do adolescente em sintonia ao
estatuto da Criança e do Adolescente, fruto do processo de democratização brasileiro.
Diante de tais afirmações, procuramos descrever como crianças/adolescentes em
conjunto com os professores/educadores do Hospital Pequeno Príncipe utiliza o tempo do
tratamento de saúde para produzir conhecimento. Apresentando a prática do grupo de
professores/educadores que ao longo de 10 anos vem fazendo educação em ambiente
hospitalar, fundamentando teoricamente a construção de sua metodologia própria de trabalho
e reconhecer o ambiente hospitalar como um espaço pedagógico, cultural e criativo.
O Processo de Ensino no Setor de Educação e Cultura
Ao chegar para seu turno de trabalho o professor/educador atuante no Hospital
Pequeno Príncipe, tem como primeira tarefa a higienização das mãos para depois manusear os
materiais a serem utilizados naquele dia. Para levar o material selecionado até as
crianças/adolescentes utilizam-se carrinhos, ou cestinhas do tipo de supermercados. Esse
material fica guardado nos armários da sala do Setor de Educação e Cultura e compreende-se
uma variedade enorme de itens que fomentam as propostas articuladas diariamente: tintas,
livros de literatura e de conhecimentos gerais, computadores portáteis, jogos de vários lugares
do mundo, lápis de cor e grafite, borracha, apontador, giz de cera, canetas hidrográficas
coloridas, réguas, compasso, papéis A4 e A3 de diferentes cores e texturas, materiais
artísticos como carvão, rolos e goivas para gravura, cola, materiais alternativos como arame,
corantes barbantes e lãs, etc.
As propostas criadas pelo grupo de professores/educadores são ferramentas de
trabalho, usadas cotidianamente em todas as intervenções feitas com as crianças e
adolescentes.
São elas: Jogos: convite a jogar de acordo com a fase no qual se encontra e o nível de
domínio. Iniciante, já conhece jogo, reconhece as estratégias. Citamos então alguns jogos
utilizados: fecha a caixa, mancala, xadrez, damas, gamão, memória, pentaminós, torre de
Hanoi, entre outros que são utilizados com cunho educativo e explorados nas suas mais
variadas possibilidades.
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Leitura: Convite a ler, considerando as necessidades para tal. O professor/educador
acompanha a leitura, lê junto, lê para... Utilizando livros de literatura brasileira, de outros
lugares do mundo, em outros idiomas, poesia e prosa, livros para a primeira infância, de
conhecimento geral, atlas, de assuntos diversos (dinossauros, flores, estações do ano,
curiosidades do mundo, folclore, e outros.). Incentivando a criança a ler e despertando tanto o
gosto e o prazer de ler como a necessidade da leitura em uma sociedade letrada.
Cirandas do Conhecimento: atividade grupal em roda, usando um projetor para
explanar um assunto em Power Point, e organizado em conjunto com uma criança/adolescente
ou somente pelo professor/educador. A ciranda independe do material ou da tecnologia, há
vários recursos que podem ser envolvidos e com eles reunir as pessoas em espaços menores.
Experiências Curiosas: É uma proposta que visa realizar experimentos científicos
com crianças e adolescentes. Acontece em roda na uma pergunta é lançada. (Como é possível
voar? Porque o barco não afunda?) E a partir da pergunta alguns conceitos vão sendo
discutidos e produzidos, a principal função da atividade é fomentar o pensamento analítico.
Arte: O domínio estético e artístico é desenvolvido em forma de oficinas, nas quais a
criança exercita o olhar estético, sob a perspectiva da arte visual, musical, teatral ou circense.
Nela os conceitos se constroem por meio da apreciação e da interação com o objeto artístico e
seus materiais.
Oficinas Culturais8: Em 2011 aconteceram às oficinas de Arte e Consumo; Musica
para bebê, crianças e adolescentes; Colorindo a fauna e a flora do Paraná; Brincando de
teatro; Histórias de bolso e outros. Como as outras atividades já citadas as oficinas também
envolveram as crianças em diversos conceitos que foram discutidos, pensados e recriados.
Elevando o pensar sobre si e suas ações no mundo.
Projetos de Pesquisa: O trabalho com projetos de pesquisa se constitui em uma
proposta feita a criança ou adolescente de delinear os rumos do seu trabalho, escolhendo
campos de estudo. Um desses projetos recebe o nome de Projeto Identidade que trabalha
questões do individuo e suas descobertas e desejos, com questões do tipo: Quem é você, Onde
você mora, Eu por dentro, com sou? Do que você gosta? O que é necessidade e vontade, entre
outros. Cujo objetivo é levar a criança a pensar sobre si e sobre o que quer descobrir. As
8
As Oficinas Culturais são projetos realizados por artistas, profissionais ligados a cultura, e são convidados pelo
hospital a trabalharem com as crianças/adolescentes. Esses projetos são financiados pela captação de recursos
através de leis de incentivo à cultura, do Fundo Municipal da Criança e do Adolescente e através de apoio diretor
de empresas e pessoas.
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pesquisas também acontecem com outros temas, são muito frequentes as pesquisas sobre
animais e lugares, bem como sobre, brinquedos, alimentos, etc. Tais propostas são ofertadas
às crianças/adolescentes, com a mediação direta do professor/educador que irá adequar o
tempo de aprendizagem, bem como o currículo para atender as necessidades de descobertas
suscitadas naquele momento.
Outra possibilidade neste campo é a utilização de um elemento disparador de
questionamento trazido pelo professor. Como por exemplo: Você sabe jogar mancala? Quer
ler um livro? Quer fazer uma pintura?... Do que você gosta?, Qual desses materiais você quer
usar? E a partir da resposta de criança encaminha-se a atividade e abre-se um campo de
pesquisas ou possibilidades de discussão.
A abordagem irá depender sempre do material selecionado pelo professor para levar e
naquele turno de trabalho. Cabe ressaltar que, a variedade de opções é bem vista, uma vez que
as crianças/adolescentes podem até estarem agrupadas, mas terem interesses distintos. E a
preocupação de atender a todos em suas necessidades é uma premissa do setor de educação.
Outro
detalhe
importante
refere-se
à
organização
dos
atendimentos
do
professor/educador com as crianças e adolescentes que se dá mediante prévio acordo entre
estes profissionais que recebem uma lista diária com os nomes e leitos onde estas se
encontram. Processo este que denominamos “busca ativa”.
Tal lista pode ser realimentada diariamente, ou repetida, ou seja, podem-se atender as
mesmas crianças da lista até que isso não seja mais necessário, ou em contraste, pode ser que
novas crianças estejam na demanda do dia. O retorno do professor depende do contrato entre
este e a criança/adolescente, porém é comum que no início do período de trabalho, o professor
tenha a informação pela “busca ativa” que por motivos do tratamento de saúde não poderá
atender tal criança. Essa informação também pode ser dada no momento da entrada no leito, e
situações mais delicadas podem acontecer como a criança/adolescente não estar disposto
dedicar-se aos estudos, dessa forma nesse momento o professor/educador administra seu
tempo de trabalho, acrescentando novas crianças a sua lista de atuação diária.
Feita a abordagem com uma criança disposta a trabalhar com construção de
conhecimento, professor/educador e criança/adolescente firmam seu contrato, adequando o
espaço para o processo pedagógico. Em algumas situações o professor/ educador percebe que
será mais conveniente desligar a TV, observa-se onde será melhor sentar-se, onde deixar o
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material, ou se é oportuno ir para outro ambiente como a sala do Setor de Educação e Cultura
o ainda o espaço do jardim ou dos andares.
As crianças/adolescentes ainda têm a oportunidade de emprestarem alguns dos
materiais para realizarem suas tarefas e darem continuidade às descobertas nos seus horários
disponíveis.
Para apresentar de modo mais concreto como o processo de educação e descobertas
acontece. Citamos abaixo o relato de algumas atividades desenvolvidas com as crianças e
adolescentes e que compõe o parecer descritivo encaminhado às escolas que as crianças
frequentam.
A historia vivida, contada e escrita: Com o livro dos dinossauros na mão Felipe - 10
anos reconhece seu mais adorável réptil pré-histórico: Um Tiranossauro rex. Após
descobrir e medir o tamanho estimado da sua mordida, comparando-a ao tamanho
da sua cama e admirando suas garras e dentes, o menino identifica no canto da
página um dragão chinês. No pequeno texto descobre que os dragões são uma lenda
que surgiu após a descoberta de um fóssil do mais temido dos dinossauros. Felipe
se engrandece ainda mais. Josnei que estava na outra cama da enfermaria escuta
com surpresa a descoberta e instigado a falar sobre as lendas que conhece relata
alguns episódios da mula sem cabeça e do saci vivenciadas por seu pai e recontadas
pela família. Terezinha, mãe de Josnei, começa a relembrar lendas e causos
recontados por seu avô, nos momentos da infância. Da história da “panela de
ouro” Terezinha e Josnei começam a relatar histórias de seu avô e bisavô com
jagunços e coronéis da Guerra do Contestado. Nos relatos, nas pesquisas nos
livros, as informações vão se confirmando e Josnei e Terezinha trazem a tona a
criação da ferrovia São Paulo – Rio Grande do Sul que passou pela região sudoeste
do Paraná, cidades natais de mãe e filho, as lutas dos caboclos e seu líderes, os
monges, nas disputas de terras e conflitos com os militares. Com a confirmação de
seus conhecimentos históricos e da descoberta de novos, Josnei e Terezinha
escrevem juntos, um texto sobre a Guerra do Contestado segundo sua família.
(MATTOS, 2012.)
O Coelho Dino: Larissa – 7 anos, escolhe da cesta de materiais, um livro sobre
Animais. Li para ela o sumário e perguntei quais tipos de animais vamos ver?
Mamíferos terrestres, ela me responde. Folhando o livro, a menina juntava as
sílabas e lia o nome dos animais que não conhecia. Então perguntei. Qual é seu
animal preferido? Coelho. Ela me responde prontamente. Então quis saber um
pouco mais da onde vinha esse gosto. A mãe entreviu falando que era fato, que uma
vez ela teve que comprar um coelho para a Larissa, mas que a relação dele com a
casa não foi muito pacífica. E com o tempo ela e marido resolveram que o coelho
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precisava de mais espaço e deram-no a uma cunhada que mora no sítio. Larissa
concordava com a cabeça, num tom de atenção ao comentário da mãe. Então quis
saber da Larissa: E o coelho estaria nesse livro no grupo dos mamíferos terrestres?
Ela não soube dizer. Aos poucos fomos criando classificações por meio da
observação e da comparação aos outros animais já vistos: Veja como todos esses
animais têm pêlos, o coelho também tem? Como nascem os leões e cachorrinhos,
seria do mesmo jeito os coelhos? Ou seria do tipo da galinha? Em ovos. Coelho
bota ovos? Depois que nascem, os coelhos também mamam? Larissa chegou a
hipótese de que os coelhos também pertenciam ao grupo de mamíferos. Larissa
escreveu COELO DINLO. (COELHO DINHO) Pedi para ela ler, e assim acentuei a
necessidade de melhor compreensão do fonema lho e nha. Separamos as palavras
com palmas, Larissa reescreveu usando alfabeto móvel, e como ela não tinha
nenhuma hipótese para a construção dos fonemas em questão, recorri ao livro e as
palavras já escritas: “velho” e “ninho”. Experimentamos o uso do lh e nh com as
vogais. Larissa escreveu esse estudo e reescreveu na forma correta coelho Dinho.
Enquanto atendi outra criança Larissa fez uma pintura representando seu coelho
Dinho e ao final escreveu “a minha casa no dia de sol.” No dia seguinte
continuamos a trabalhar com pintura e o conceito de paisagem, a pesquisar sobre o
lugar onde mora, como é e que flores e árvores têm lá e com escrita para a
expressão de tais idéias. (SANCHEZ, 2012.)
Matheus e sua ação voluntaria: Matheus -10 anos, estava para ter alta no dia
seguinte. Muito sensibilizado com tudo que vira dentro do hospital, perguntava para
a mãe se ele poderia se tornar um voluntário quando crescesse. A mãe atendendo
ao pedido do filho recorreu a mim para saber (muitos nos confundem com
departamento de voluntariado). Sabendo do que se tratava, perguntei se ele iria
conseguir esperar a vida adulta para tal. Então lhe lancei a proposta. Uma Ciranda
do Conhecimento para as crianças menores no dia seguinte, antes de sua alta.
Matheus, muito entusiasmado aceitou, faltando somente definir o tema. Do que você
gosta? Sugeri: Ciências, Artes... Esportes...
Ciências! Professora, eu gosto de
ciências. Então podemos falar sobre o corpo humano ou sobre os planetas... –
Planetas! Pegamos um livro, em meia hora, Matheus concluiu a relação entre o
planeta Terra e o Sol. Foi para o quarto com o livro e no dia seguinte, Matheus
havia feito um resumo, e revendo juntos os conceitos decidiu que também falaria da
Lua em sua Ciranda do Conhecimento.
Em um dos espaços dos andares, nos reunimos com mais cinco crianças
convidadas e que podiam sair do leito, e Matheus realizou sua primeira ação
voluntaria, dialogando com as demais crianças. A proposta inicial em que seriam
apenas as crianças menores, foi suprimida, pois ao convidá-las, outras maiores se
27935
interessaram pela proposta. Fato este que enriqueceu todo o processo, fazendo com
que o assunto se estendesse. Falamos sobre posição do Sol e dos planetas,
movimento do planeta Terra, dia e estação do ano. O que e o sol, como é formado,
sobre o universo e o espaço. Ao final, mais crianças sentiram vontade de fazer a
mesma atividade, e me despedi do grupo sugerindo a eles que sempre que possível
podemos sentar com nossos pares e compartilhar dos assuntos que gostamos.
(SANCHEZ, 2012.)
O Conhecimento dos Adolescentes - Já no caso dos adolescentes há muitas
possibilidades de aprendizagem e uma delas desenvolvida com um menino de 15
anos, Matheus, com qual foram utilizados diferentes recursos pedagógicos,
iniciamos as atividades com o jogo mancala, a partir dele estudamos aspectos
culturais da origem do jogo, novas regras do jogo e histórias do continente, bem
como das sementes que envolvem o mistério do jogo e suas regras. Após essa
discussão inicial enfatizamos a pesquisa sobre a Arte africana e sua influencia na
cultura brasileira. Na apresentação que criou espontaneamente, Matheus definiu
conceitos de artes, apresentou diferentes representações artísticas presentes no
continente africano e fez grandes descobertas sobre um conteúdo que não estava em
seu programa inicial e que surgiu a partir da apresentação de um jogo. Além das
atividades centradas na arte o adolescente desenvolveu outras pesquisas e
atividades que com certeza marcaram seu processo de conhecimento, interação e
aprendizagem. (PETERS, 2012.)
Ao inserir os relatos acima descrevendo na integra o modo como às atividades são
desenvolvidas tem-se a intenção de demonstrar de modo verídico como cada proposta de
estudo e descoberta é realizada e construída com crianças e adolescentes no ambiente
hospitalar.
Considerações finais
Ao descrever a prática pedagógica em ambiente hospitalar o texto procura fazê-la
mostrando como o processo educativo vem sendo acolhido pelo Hospital Pequeno Príncipe e
o modo como o professor/educador se configura no profissional do Hospital que vem oferecer
alimento para a parte não comprometida pela doença, ultrapassando a assistência à saúde e
exercendo um importante papel no desenvolvimento de crianças e adolescentes. Sendo assim,
concluímos que as pedagogias diferenciadas incluem-se no objetivo da educação, que
continua sendo o de oferecer o contato com o conhecimento universalmente produzido.
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Além disso, o texto busca ressaltar a importância de elementos lúdicos e diversificados
para motivar e despertar o interesse em conhecer, pesquisar, descobrir e produzir
conhecimento. Sem renunciar à diversificação, e o desenvolvimento cognitivo a proposta de
educação do setor de Educação e Cultura do Hospital Pequeno Príncipe afirma que seu
desafio vai além da educação a meta é conseguir que todos os alunos tenham acesso a esse
conhecimento e dele se apropriem independente da sua condição física. A compreensão de
que o fluxo da vida vem daquilo que nos alimenta a mente, o que permeia o trabalho do
professor/educador que para tal, é a dinâmica de criar e recriar sua metodologia de trabalho
para o contexto hospitalar.
A pluralidade cultural, o fluxo contínuo de entrada e saída das crianças/adolescentes,
as mais variadas situações escolares, tudo isso acena para que o processo de inclusão torne-se
real de fato, garantido o direito em sua totalidade.
REFERÊNCIAS
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