O TRABALHO PEDAGOGICO NO HOSPITAL PEQUENO PRINCIPE: UM PROCESSO PAUTADO NA RELAÇAO DOS SUJEITOS SANCHEZ, Eluane Miriam Santos1- SME Curitiba MATTOS, Carolina Domingues de2 - SME Curitiba / HPP PETERS, Itamara3 -SEED Paraná Grupo de Trabalho - Educação Hospitalar. Agência Financiadora: não contou com financiamento. Resumo O presente trabalho descreve a relação pedagógica entre crianças e adolescentes de 0 a 18 anos em tratamento de saúde no Hospital Pequeno Príncipe, que por esse motivo interrompem seu processo educativo formal no ambiente escolar, e os educadores atuantes nesse mesmo espaço. A prática do trabalho se dá em combate a uma educação simplificada e esvaziada de questionamentos pouco condizentes com a realidade de crianças que, mesmo estando hospitalizadas, não deixam de sentir necessidade de alimentar a mente com conhecimento, ciência, cultura e arte. Tal proposta vem sido criada pelo Setor de Educação e Cultura formado por professores e educadores contratados pelo hospital e conveniados das Secretarias de Educação Municipal de Curitiba e Estadual do Paraná. Palavras-chave: Educação hospitalar. Sujeito coparticipe. Metodologia diferenciada. Introdução O presente texto tem como foco principal a apresentação da fundamentação teórica que orienta a proposta pedagógica e a prática dos professores/educadores4 nas atividades do 1 Educação Artística, Desenho pela UFPR. Professora da SME de Curitiba no Setor de Educação e Cultura do Hospital Pequeno Príncipe. Email: [email protected] 2 Pedagogia pela UFPR. Professora da SME de Curitiba no Setor de Educação e Cultura do Hospital Pequeno Príncipe e Educadora contratada pelo Hospital no mesmo setor. Email: [email protected] 3 Letras pela UTP e Pedagogia pela UFPR. Professora da SEED, Paraná no Setor de Educação e Cultura do Hospital Pequeno Príncipe. Email: [email protected]. 4 Utilizaremos aqui o termo professores para profissionais com diploma de licenciatura e educadores, para profissionais de diversas áreas com ou sem ensino superior e que se dedicam ao trabalho docente. Utilizaremos no corpo do texto a expressão professor/educador, por conter esses dois grupos atuando juntos no Setor de educação e cultura. 27927 cotidiano da educação hospitalar. Sendo assim, descrevem-se os modos de proceder que vem sendo criados, recriados e utilizados em dez anos de experiência no setor de Educação e Cultura, apresentando uma pratica embasada e teorizada em suas próprias metodologias de ensino e aprendizagem que constituem um projeto político-educacional em ambiente hospitalar. As crianças/adolescentes5 de 0 a 18 anos em tratamento de saúde e seus acompanhantes6, no Hospital Pequeno Príncipe na cidade de Curitiba, PR, experimentam a oportunidade de participar de um projeto de educação no próprio hospital. Estes chegam ao hospital Pequeno Príncipe, vindos de vários lugares: Curitiba e região metropolitana, interior do estado, estados vizinhos, demais regiões do Brasil, e ainda outros países. Essa pluralidade cultural implica nas mais variadas situações escolares: crianças que pela continuidade, distancia ou outra adversidade ocasionada pelo tratamento estão fora da escola ou a frequentam pouco, comprometendo seu processo de aquisição de conhecimento. Observa-se em algumas delas também um desinteresse pela escola, uma vez que o processo de inclusão ainda não é um direito garantido em sua totalidade. Dessa forma, para garantir o direito de crianças /adolescentes7 à educação sob seus vários aspectos, no tocante a suas interfaces sociais, educacionais, individuais e coletivas. Constitui-se desde o ano de 2002 o Setor de Educação e Cultura, criado por esta instituição, vem trabalhando na perspectiva de estabelecer diálogo entre a escola e o hospital, promover ações culturais e valorizando o conhecimento humano produzido universalmente, seja ele popular ou cientifico. Pensar a Educação Pensar em educação e em especial na educação em um ambiente diferenciado no qual há inúmeros fatores conjugados exige uma concepção educativa que vá além dos domínios e das paredes da escola. E é com esta visão de educação que o modo Pequeno Príncipe de Fazer Educação propõe uma pratica educacional que fomente no sujeito, seu protagonismo, 5 Utilizaremos aqui a expressão criança/adolescente por não adotarmos uma forma muito rígida de separação, uma vez que os processos de maturação podem vir a ser alterados pelo quadro clinico do individuo. 6 Consideramos aqui o acompanhante como o responsável que está junto com a criança. Este participa do processo ensino-aprendizagem, modulando sua ação hora auxiliando na construção do conhecimento, hora aprendendo junto, e resignificando seus conceitos também. 27928 ensinando-lhes a ter voz, tornando-os coparticipes na construção do conhecimento. Para Paulo Freire a educação é baseada no diálogo e na interação entre professor e aluno. Desse modo, o educador tem um papel de destaque como mediador entre o mundo do conhecimento e o próprio aluno. Surge assim a tríade reflexão-ação-reflexão, na qual cabe ao educador ser agente de transformação social, articulando teoria e prática, possibilitando uma reflexão da ação praticada e consequentemente refletir sobre o desdobrar desta ação. Sendo assim: “a relação dialógica estabelece uma nova relação de formação capaz de incluir a criança e o jovem em um contexto de saber/cultural sistematizado e torná-lo vivência de consciência crítica” (FREIRE, 1996). O diálogo é uma questão determinante para o encontro das vozes do educador e do educando, isto é, uma condição de ensinar e de aprender e de constituir identidades. Então, é preciso reconhecer e respeitar os diferentes tempos dos sujeitos, procurando estabelecer relações necessárias à constituição de conhecimentos e valores. Isto se conquista por meio da interação relacionada ao eu-outro e na mediação. Para (FREIRE, 1994): O ato de aprender está diretamente relacionado à função social que o sujeito exerce e às experiências individuais, intimamente relacionadas com o modo de pensamento que o sujeito possui, portanto, aprender não é “repetir a lição” memorizada mecanicamente, vai muito além (FREIRE, 1994, p. 33.) Pensando nisto, Freire afirmou ainda que, os aspectos histórico-sociais e as diferenças individuais do educando devem ser considerados, uma vez que ele é um ser histórico e se constrói nas relações com os outros homens e com o mundo, partindo do pressuposto de que cada sujeito possui uma configuração única das experiências vivificadas. Posto que a educação só acontece por meio das relações sociais estabelecidas com a comunidade vivida, acredita-se na educação hospitalar emancipada da escola. Que tenha identidade própria, pois sendo assim, é capaz de refletir a voz dos participantes da ação. Isso não significa negar a escola, mas sim reconhecer novos espaços de sistematização do conhecimento. “As crianças e adolescentes, sejam elas com curto, médio ou longo tempo de internamento, passam a atuar em um contexto multicultural, étnico, heterogêneo e itinerante”. (HOSPITAL PEQUENO PRÍNCIPE, 2007) muito peculiar no ambiente hospitalar, fazendose necessária a readequação do tempo e do espaço do aprender. Compreende-se também que além de diálogo e reflexão, o trabalho do professor/educador, é comprometer-se com metodologia e planejamento, mas no sentido de poder criá-los mediante contrato com o sujeito do diálogo e não impor sua forma de fazer 27929 como instrumento de poder. Como afirma Imbernón: “os professores podem ser verdadeiros agentes sociais, capazes de planejar e gerir o ensino-aprendizagem, além de intervir nos complexos sistemas que constituem a estrutura social e profissional” (IMBERNÓN, 2001, p.46). Dessa forma, o que aprender então? “É infinita a quantidade de coisas a se saber, de sentidos a se dar ao mundo.” (HPP, PROJETO POLÍTICO EDUCACIONAL, 2007.). Um conhecimento de ordem universal que lance mão da comunhão de sermos humanos, vem ao encontro da possibilidade de permitir-se participar do processo de democratização do saber. Saber para estar atuante no mundo. Encontrar as vias de acesso e decifrar os códigos para então estar em constante processo de inclusão na sociedade. Assim, propõem-se ações pedagógicas de trocas mútuas, para que a aprendizagem seja significativa: a proposta é oferecer a cada aluno em situações de aprendizagem oportunidades de construir aquilo que está dentro das suas possibilidades cognitivas e físicas. Para Perrenoud, 1999, a abordagem está centrada no aprendiz e em seu itinerário de aprendizagem, na individualização do percurso de formação. Para o autor diferenciação é romper com a pedagogia magistral, e é, sobretudo, uma maneira de por em funcionamento uma organização de trabalho que integre dispositivos didáticos de forma a colocar cada aluno perante a situação mais favorável de aprendizagem. Diante disto, programar uma “educação sob medida” é, conforme Perrenoud (2000, p.9), “... um sonho de todos aqueles que acham absurdo ensinar a mesma coisa no mesmo momento, com os mesmos métodos, a alunos muito diferentes”. Colaborando com a ideia Marquezam afirma que: “Adequar o ensino às características de cada aprendiz, não é só uma questão de bom senso pedagógico, se não uma questão de respeito à pessoa, faz parte da exigência inadiável de igualdade” (MARQUEZAM, 2005, p.06). Nessa perspectiva o ambiente hospitalar é também um local de educação. Para a diretora executiva do Hospital Pequeno Príncipe, o hospital é: “Um local onde o ser humano é visto como um ser integral, que vive em sociedade e está inserido em um ambiente. Um ser que precisa de cuidados, que têm direitos, possui uma cultura e muitos sonhos! Pequeninos que representam o futuro do nosso país.” (CARNEIRO in Colorindo as flores os bichos e as paisagens de Curitiba, 2010, p.03). Dessa forma, a educação é acolhida pelo Hospital Pequeno Príncipe que a vê como parte integrante e constituinte do ser humano que na sua complexidade e fragilidade alimentase do fluxo da vida, buscando no trabalho do professor/educador alimento para sua parte não 27930 comprometida pela doença, afirmando-se sujeito de direito e de fato na sociedade. Na perspectiva de ultrapassar a assistência a saúde e ir além do cuidado, exercem um importante papel no que diz respeito à garantia dos direitos da criança e do adolescente em sintonia ao estatuto da Criança e do Adolescente, fruto do processo de democratização brasileiro. Diante de tais afirmações, procuramos descrever como crianças/adolescentes em conjunto com os professores/educadores do Hospital Pequeno Príncipe utiliza o tempo do tratamento de saúde para produzir conhecimento. Apresentando a prática do grupo de professores/educadores que ao longo de 10 anos vem fazendo educação em ambiente hospitalar, fundamentando teoricamente a construção de sua metodologia própria de trabalho e reconhecer o ambiente hospitalar como um espaço pedagógico, cultural e criativo. O Processo de Ensino no Setor de Educação e Cultura Ao chegar para seu turno de trabalho o professor/educador atuante no Hospital Pequeno Príncipe, tem como primeira tarefa a higienização das mãos para depois manusear os materiais a serem utilizados naquele dia. Para levar o material selecionado até as crianças/adolescentes utilizam-se carrinhos, ou cestinhas do tipo de supermercados. Esse material fica guardado nos armários da sala do Setor de Educação e Cultura e compreende-se uma variedade enorme de itens que fomentam as propostas articuladas diariamente: tintas, livros de literatura e de conhecimentos gerais, computadores portáteis, jogos de vários lugares do mundo, lápis de cor e grafite, borracha, apontador, giz de cera, canetas hidrográficas coloridas, réguas, compasso, papéis A4 e A3 de diferentes cores e texturas, materiais artísticos como carvão, rolos e goivas para gravura, cola, materiais alternativos como arame, corantes barbantes e lãs, etc. As propostas criadas pelo grupo de professores/educadores são ferramentas de trabalho, usadas cotidianamente em todas as intervenções feitas com as crianças e adolescentes. São elas: Jogos: convite a jogar de acordo com a fase no qual se encontra e o nível de domínio. Iniciante, já conhece jogo, reconhece as estratégias. Citamos então alguns jogos utilizados: fecha a caixa, mancala, xadrez, damas, gamão, memória, pentaminós, torre de Hanoi, entre outros que são utilizados com cunho educativo e explorados nas suas mais variadas possibilidades. 27931 Leitura: Convite a ler, considerando as necessidades para tal. O professor/educador acompanha a leitura, lê junto, lê para... Utilizando livros de literatura brasileira, de outros lugares do mundo, em outros idiomas, poesia e prosa, livros para a primeira infância, de conhecimento geral, atlas, de assuntos diversos (dinossauros, flores, estações do ano, curiosidades do mundo, folclore, e outros.). Incentivando a criança a ler e despertando tanto o gosto e o prazer de ler como a necessidade da leitura em uma sociedade letrada. Cirandas do Conhecimento: atividade grupal em roda, usando um projetor para explanar um assunto em Power Point, e organizado em conjunto com uma criança/adolescente ou somente pelo professor/educador. A ciranda independe do material ou da tecnologia, há vários recursos que podem ser envolvidos e com eles reunir as pessoas em espaços menores. Experiências Curiosas: É uma proposta que visa realizar experimentos científicos com crianças e adolescentes. Acontece em roda na uma pergunta é lançada. (Como é possível voar? Porque o barco não afunda?) E a partir da pergunta alguns conceitos vão sendo discutidos e produzidos, a principal função da atividade é fomentar o pensamento analítico. Arte: O domínio estético e artístico é desenvolvido em forma de oficinas, nas quais a criança exercita o olhar estético, sob a perspectiva da arte visual, musical, teatral ou circense. Nela os conceitos se constroem por meio da apreciação e da interação com o objeto artístico e seus materiais. Oficinas Culturais8: Em 2011 aconteceram às oficinas de Arte e Consumo; Musica para bebê, crianças e adolescentes; Colorindo a fauna e a flora do Paraná; Brincando de teatro; Histórias de bolso e outros. Como as outras atividades já citadas as oficinas também envolveram as crianças em diversos conceitos que foram discutidos, pensados e recriados. Elevando o pensar sobre si e suas ações no mundo. Projetos de Pesquisa: O trabalho com projetos de pesquisa se constitui em uma proposta feita a criança ou adolescente de delinear os rumos do seu trabalho, escolhendo campos de estudo. Um desses projetos recebe o nome de Projeto Identidade que trabalha questões do individuo e suas descobertas e desejos, com questões do tipo: Quem é você, Onde você mora, Eu por dentro, com sou? Do que você gosta? O que é necessidade e vontade, entre outros. Cujo objetivo é levar a criança a pensar sobre si e sobre o que quer descobrir. As 8 As Oficinas Culturais são projetos realizados por artistas, profissionais ligados a cultura, e são convidados pelo hospital a trabalharem com as crianças/adolescentes. Esses projetos são financiados pela captação de recursos através de leis de incentivo à cultura, do Fundo Municipal da Criança e do Adolescente e através de apoio diretor de empresas e pessoas. 27932 pesquisas também acontecem com outros temas, são muito frequentes as pesquisas sobre animais e lugares, bem como sobre, brinquedos, alimentos, etc. Tais propostas são ofertadas às crianças/adolescentes, com a mediação direta do professor/educador que irá adequar o tempo de aprendizagem, bem como o currículo para atender as necessidades de descobertas suscitadas naquele momento. Outra possibilidade neste campo é a utilização de um elemento disparador de questionamento trazido pelo professor. Como por exemplo: Você sabe jogar mancala? Quer ler um livro? Quer fazer uma pintura?... Do que você gosta?, Qual desses materiais você quer usar? E a partir da resposta de criança encaminha-se a atividade e abre-se um campo de pesquisas ou possibilidades de discussão. A abordagem irá depender sempre do material selecionado pelo professor para levar e naquele turno de trabalho. Cabe ressaltar que, a variedade de opções é bem vista, uma vez que as crianças/adolescentes podem até estarem agrupadas, mas terem interesses distintos. E a preocupação de atender a todos em suas necessidades é uma premissa do setor de educação. Outro detalhe importante refere-se à organização dos atendimentos do professor/educador com as crianças e adolescentes que se dá mediante prévio acordo entre estes profissionais que recebem uma lista diária com os nomes e leitos onde estas se encontram. Processo este que denominamos “busca ativa”. Tal lista pode ser realimentada diariamente, ou repetida, ou seja, podem-se atender as mesmas crianças da lista até que isso não seja mais necessário, ou em contraste, pode ser que novas crianças estejam na demanda do dia. O retorno do professor depende do contrato entre este e a criança/adolescente, porém é comum que no início do período de trabalho, o professor tenha a informação pela “busca ativa” que por motivos do tratamento de saúde não poderá atender tal criança. Essa informação também pode ser dada no momento da entrada no leito, e situações mais delicadas podem acontecer como a criança/adolescente não estar disposto dedicar-se aos estudos, dessa forma nesse momento o professor/educador administra seu tempo de trabalho, acrescentando novas crianças a sua lista de atuação diária. Feita a abordagem com uma criança disposta a trabalhar com construção de conhecimento, professor/educador e criança/adolescente firmam seu contrato, adequando o espaço para o processo pedagógico. Em algumas situações o professor/ educador percebe que será mais conveniente desligar a TV, observa-se onde será melhor sentar-se, onde deixar o 27933 material, ou se é oportuno ir para outro ambiente como a sala do Setor de Educação e Cultura o ainda o espaço do jardim ou dos andares. As crianças/adolescentes ainda têm a oportunidade de emprestarem alguns dos materiais para realizarem suas tarefas e darem continuidade às descobertas nos seus horários disponíveis. Para apresentar de modo mais concreto como o processo de educação e descobertas acontece. Citamos abaixo o relato de algumas atividades desenvolvidas com as crianças e adolescentes e que compõe o parecer descritivo encaminhado às escolas que as crianças frequentam. A historia vivida, contada e escrita: Com o livro dos dinossauros na mão Felipe - 10 anos reconhece seu mais adorável réptil pré-histórico: Um Tiranossauro rex. Após descobrir e medir o tamanho estimado da sua mordida, comparando-a ao tamanho da sua cama e admirando suas garras e dentes, o menino identifica no canto da página um dragão chinês. No pequeno texto descobre que os dragões são uma lenda que surgiu após a descoberta de um fóssil do mais temido dos dinossauros. Felipe se engrandece ainda mais. Josnei que estava na outra cama da enfermaria escuta com surpresa a descoberta e instigado a falar sobre as lendas que conhece relata alguns episódios da mula sem cabeça e do saci vivenciadas por seu pai e recontadas pela família. Terezinha, mãe de Josnei, começa a relembrar lendas e causos recontados por seu avô, nos momentos da infância. Da história da “panela de ouro” Terezinha e Josnei começam a relatar histórias de seu avô e bisavô com jagunços e coronéis da Guerra do Contestado. Nos relatos, nas pesquisas nos livros, as informações vão se confirmando e Josnei e Terezinha trazem a tona a criação da ferrovia São Paulo – Rio Grande do Sul que passou pela região sudoeste do Paraná, cidades natais de mãe e filho, as lutas dos caboclos e seu líderes, os monges, nas disputas de terras e conflitos com os militares. Com a confirmação de seus conhecimentos históricos e da descoberta de novos, Josnei e Terezinha escrevem juntos, um texto sobre a Guerra do Contestado segundo sua família. (MATTOS, 2012.) O Coelho Dino: Larissa – 7 anos, escolhe da cesta de materiais, um livro sobre Animais. Li para ela o sumário e perguntei quais tipos de animais vamos ver? Mamíferos terrestres, ela me responde. Folhando o livro, a menina juntava as sílabas e lia o nome dos animais que não conhecia. Então perguntei. Qual é seu animal preferido? Coelho. Ela me responde prontamente. Então quis saber um pouco mais da onde vinha esse gosto. A mãe entreviu falando que era fato, que uma vez ela teve que comprar um coelho para a Larissa, mas que a relação dele com a casa não foi muito pacífica. E com o tempo ela e marido resolveram que o coelho 27934 precisava de mais espaço e deram-no a uma cunhada que mora no sítio. Larissa concordava com a cabeça, num tom de atenção ao comentário da mãe. Então quis saber da Larissa: E o coelho estaria nesse livro no grupo dos mamíferos terrestres? Ela não soube dizer. Aos poucos fomos criando classificações por meio da observação e da comparação aos outros animais já vistos: Veja como todos esses animais têm pêlos, o coelho também tem? Como nascem os leões e cachorrinhos, seria do mesmo jeito os coelhos? Ou seria do tipo da galinha? Em ovos. Coelho bota ovos? Depois que nascem, os coelhos também mamam? Larissa chegou a hipótese de que os coelhos também pertenciam ao grupo de mamíferos. Larissa escreveu COELO DINLO. (COELHO DINHO) Pedi para ela ler, e assim acentuei a necessidade de melhor compreensão do fonema lho e nha. Separamos as palavras com palmas, Larissa reescreveu usando alfabeto móvel, e como ela não tinha nenhuma hipótese para a construção dos fonemas em questão, recorri ao livro e as palavras já escritas: “velho” e “ninho”. Experimentamos o uso do lh e nh com as vogais. Larissa escreveu esse estudo e reescreveu na forma correta coelho Dinho. Enquanto atendi outra criança Larissa fez uma pintura representando seu coelho Dinho e ao final escreveu “a minha casa no dia de sol.” No dia seguinte continuamos a trabalhar com pintura e o conceito de paisagem, a pesquisar sobre o lugar onde mora, como é e que flores e árvores têm lá e com escrita para a expressão de tais idéias. (SANCHEZ, 2012.) Matheus e sua ação voluntaria: Matheus -10 anos, estava para ter alta no dia seguinte. Muito sensibilizado com tudo que vira dentro do hospital, perguntava para a mãe se ele poderia se tornar um voluntário quando crescesse. A mãe atendendo ao pedido do filho recorreu a mim para saber (muitos nos confundem com departamento de voluntariado). Sabendo do que se tratava, perguntei se ele iria conseguir esperar a vida adulta para tal. Então lhe lancei a proposta. Uma Ciranda do Conhecimento para as crianças menores no dia seguinte, antes de sua alta. Matheus, muito entusiasmado aceitou, faltando somente definir o tema. Do que você gosta? Sugeri: Ciências, Artes... Esportes... Ciências! Professora, eu gosto de ciências. Então podemos falar sobre o corpo humano ou sobre os planetas... – Planetas! Pegamos um livro, em meia hora, Matheus concluiu a relação entre o planeta Terra e o Sol. Foi para o quarto com o livro e no dia seguinte, Matheus havia feito um resumo, e revendo juntos os conceitos decidiu que também falaria da Lua em sua Ciranda do Conhecimento. Em um dos espaços dos andares, nos reunimos com mais cinco crianças convidadas e que podiam sair do leito, e Matheus realizou sua primeira ação voluntaria, dialogando com as demais crianças. A proposta inicial em que seriam apenas as crianças menores, foi suprimida, pois ao convidá-las, outras maiores se 27935 interessaram pela proposta. Fato este que enriqueceu todo o processo, fazendo com que o assunto se estendesse. Falamos sobre posição do Sol e dos planetas, movimento do planeta Terra, dia e estação do ano. O que e o sol, como é formado, sobre o universo e o espaço. Ao final, mais crianças sentiram vontade de fazer a mesma atividade, e me despedi do grupo sugerindo a eles que sempre que possível podemos sentar com nossos pares e compartilhar dos assuntos que gostamos. (SANCHEZ, 2012.) O Conhecimento dos Adolescentes - Já no caso dos adolescentes há muitas possibilidades de aprendizagem e uma delas desenvolvida com um menino de 15 anos, Matheus, com qual foram utilizados diferentes recursos pedagógicos, iniciamos as atividades com o jogo mancala, a partir dele estudamos aspectos culturais da origem do jogo, novas regras do jogo e histórias do continente, bem como das sementes que envolvem o mistério do jogo e suas regras. Após essa discussão inicial enfatizamos a pesquisa sobre a Arte africana e sua influencia na cultura brasileira. Na apresentação que criou espontaneamente, Matheus definiu conceitos de artes, apresentou diferentes representações artísticas presentes no continente africano e fez grandes descobertas sobre um conteúdo que não estava em seu programa inicial e que surgiu a partir da apresentação de um jogo. Além das atividades centradas na arte o adolescente desenvolveu outras pesquisas e atividades que com certeza marcaram seu processo de conhecimento, interação e aprendizagem. (PETERS, 2012.) Ao inserir os relatos acima descrevendo na integra o modo como às atividades são desenvolvidas tem-se a intenção de demonstrar de modo verídico como cada proposta de estudo e descoberta é realizada e construída com crianças e adolescentes no ambiente hospitalar. Considerações finais Ao descrever a prática pedagógica em ambiente hospitalar o texto procura fazê-la mostrando como o processo educativo vem sendo acolhido pelo Hospital Pequeno Príncipe e o modo como o professor/educador se configura no profissional do Hospital que vem oferecer alimento para a parte não comprometida pela doença, ultrapassando a assistência à saúde e exercendo um importante papel no desenvolvimento de crianças e adolescentes. Sendo assim, concluímos que as pedagogias diferenciadas incluem-se no objetivo da educação, que continua sendo o de oferecer o contato com o conhecimento universalmente produzido. 27936 Além disso, o texto busca ressaltar a importância de elementos lúdicos e diversificados para motivar e despertar o interesse em conhecer, pesquisar, descobrir e produzir conhecimento. Sem renunciar à diversificação, e o desenvolvimento cognitivo a proposta de educação do setor de Educação e Cultura do Hospital Pequeno Príncipe afirma que seu desafio vai além da educação a meta é conseguir que todos os alunos tenham acesso a esse conhecimento e dele se apropriem independente da sua condição física. A compreensão de que o fluxo da vida vem daquilo que nos alimenta a mente, o que permeia o trabalho do professor/educador que para tal, é a dinâmica de criar e recriar sua metodologia de trabalho para o contexto hospitalar. A pluralidade cultural, o fluxo contínuo de entrada e saída das crianças/adolescentes, as mais variadas situações escolares, tudo isso acena para que o processo de inclusão torne-se real de fato, garantido o direito em sua totalidade. REFERÊNCIAS CARNEIRO, E. In: Colorindo as flores os bichos e as paisagens de Curitiba. Curitiba, Hospital Pequeno Príncipe, 2010. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e. Terra, 1996. ____________ Pedagogia da Esperança: Um reencontro com a Pedagogia do oprimido. 3ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1994. FREIRE, Paulo, FAUNDEZ Antônio. Por uma pedagogia da pergunta. 7ª ed. - São Paulo: Paz e Terra, 2011. FREIRE, Paulo. Educação e Mudança. 34ª ed. - São Paulo: Paz e Terra, 2011. IMBERNÓN, Francisco. Formação docente e profissional: formar-se par a mudança e a incerteza. 9ª ed. - São Paulo: Cortez, 2011. MARQUEZAN, Reinaldo. Aprendizagem: explicações para as Dificuldades. Revista de Educação Especial. Universidade Federal de Santa Maria, RS. Centro de Educação. Departamento de Educação Especial . N° 27. 2005. MATTOS, Carolina. Parecer Avaliativo de Acompanhamento Individual. Curitiba: Hospital Pequeno Príncipe, 2012. PERRENOUD, Philippe. As competências para ensinar no século XXI: a formação dos professores e o desafio da avaliação. Porto Alegre: Artmed, 2002. 27937 PERRENOUD, Philippe. MAGNE, B. C. Construir: as competências desde a escola. Porto Alegre: Artmed, 1999. Setor de Educação e Cultura. Projeto Político Educacional. Curitiba: Hospital Pequeno Príncipe, 2007. PETERS, Itamara. Parecer Avaliativo de Acompanhamento Individual. Curitiba: Hospital Pequeno Príncipe, 2012. SANCHEZ, Eluane. Parecer Avaliativo de Acompanhamento Individual. Curitiba: Hospital Pequeno Príncipe, 2012.