FarmacêuticoemFoco

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FarmacêuticoemFoco
Número 13 | Agosto 2011
Novidades Terapêuticas*
Material destinado exclusivamente aos profissionais de saúde
É
sempre uma grande
satisfação promover
atualização científica
e o jornal Farmacêutico em Foco tem buscado a cada
número assuntos variados e atuais,
com a participação de renomados
especialistas, a fim de divulgar novos
conhecimentos.
Na sequência, um grupo de farmacêuticos do Hospital Sírio-Libanês
fala sobre a atuação do farmacêutico
clínico na utilização racional de antimicrobianos. Assinam esse artigo
Jorge Augusto Siqueira, Maria Fernanda Salomão de Azevedo, Mayra
Carvalho Ribeiro e Débora Cecília
Mantovani Faustino de Carvalho.
Nesta edição trazemos um artigo
especial sobre artrite reumatoide:
uma perspectiva atual de diagnóstico
e tratamento. O Prof. Dr. Max Victor
Carioca Freitas, professor adjunto do
setor de Imunologia da Faculdade de
Medicina da Universidade Federal do
Ceará abordou o tema, desde características da doença até diagnóstico
e tratamento.
Ainda nesta edição, uma entrevista
com o Prof. Dr. Antonio Carlos
Carvalho, professor titular de Cardiologia da Universidade Federal de São
Paulo (Unifesp) e chefe da disciplina
de Cardiologia sobre a síndrome
coronariana aguda. O professor abordou o impacto da patologia quanto
a mortalidade e a terapêutica atual
disponível.
Pág. 2
Pág. 6
ARTRITE
REUMATOIDE
FARMACÊUTICO
CLINICO
Uma Perspectiva
Atual de
Diagnóstico e
Tratamento
Atuação do
Farmacêutico Clínico
na Utilização Racional
de Antimicrobianos
Pág. 9
ENTREVISTA
Síndrome Coronariana
Aguda: Impacto na
Mortalidade e Terapêutica
Atual
Finalizamos esta edição com Ronaldo Chalegre, Chefe de Suprimentos
do Hospital São Camilo Pompeia,
São Paulo, que aborda a implantação
do sistema Kanban, um método adotado no sistema de planejamento de
compras de medicamentos.
Confira ainda na seção Em Foco os
webmeetings recentemente realizados pela AstraZeneca. Boa leitura!
Cristiane Piva Peres Codinhoto
Camila Prince de C. Pereira
* Este jornal, também, será publicado
no site farmaceuticoemfoco.com.br
Pág. 13
PLANEJAMENTO
DE COMPRAS
Implantação do
Sistema Kanban
Pág. 16
EM FOCO
Webmeetings
Tratam a Respeito
de Síndrome
Coronariana Aguda
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Artrite reumatoide - Uma perspectiva atual
de diagnóstico e tratamento
Prof. Dr. Max Victor Carioca Freitas*
A
artrite reumatoide
(AR) é uma doença
crônica autoimune
que se caracteriza
por reação inflamatória em articulações, levando à sinovite.
Com a progressão, deformidades
articulares podem surgir, gerando incapacidade funcional, que
pode ser temporária ou irrever* Professor Adjunto do Setor de
Imunologia da Faculdade de Medicina
da Universidade Federal do Ceará.
Membro Titular da Sociedade Brasileira
de Reumatologia. Doutor em Ciências
Médicas pela Universidade de São Paulo
– Faculdade de Medicina de Ribeirão
Preto. CRM-CE 6338.
2
sível, a depender da extensão
do comprometimento articular.
Além do envolvimento articular
podem surgir manifestações extraarticulares em pulmões, nervos
periféricos, pele e vasos, entre outros. É descrita em cerca de 1,0%
da população mundial e em 0,2 a
1,0% da brasileira,(1) sendo mais
comum em indivíduos do sexo
feminino, com uma distribuição
de 6:1 no Brasil.(2)
Fatores imunológicos, genéticos e
ambientais são responsáveis pelo
surgimento da doença. É importante observar que nenhum destes
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fatores de forma isolada pode ser
apontado como responsável pela
doença. O processo inflamatório
da AR se caracteriza por expressiva ativação de células do sistema
imunológico, sobretudo linfócitos
T e B, levando à produção de citocinas pró-inflamatórias, dentre
elas TNF-a, IL-6 e IL-1. Estas
citocinas, por sua vez, induzem
à secreção de metaloproteinases
por células residentes da sinóvia,
como osteoclastos, fibroblastos e
condrócitos, além de promoverem
o recrutamento de mais células
inflamatórias para o tecido sinovial. (3) O resultado deste processo
é a presença de tecido rico em
células de inflamação como neutrófilos, linfócitos T, linfócitos B e
plasmócitos, com intensa angiogênese e espessamento sinovial,
chamado de pannus. Devido à
ativação de imunidade humoral
há produção de autoanticorpos,
como fator reumatoide e anticorpos contra peptídeos citrulinados
(ACPA), reforçando o componente autoimune da artrite reumatoide. Para que todo este processo
ocorra assume-se que seja necessária uma desregulação dos mecanismos fisiológicos de tolerância
imunológica e o componente
genético pode contribuir para isso.
É descrita uma maior incidência
de AR em indivíduos portadores
de alguns genes do HLA (human
leucocyte antigens). Ao conjunto
destes alelos de suscetibilidade
do HLA-DRB1* chamou-se de
epítopo compartilhado e sua presença implica maior chance de
ativação da resposta imunológica
autoimune na sinóvia, levando
ao surgimento da doença. Nos
últimos anos alguns estudos demonstraram um maior risco de
artrite reumatoide em indivíduos
tabagistas e portadores do epítopo
O diagnóstico da
artrite reumatoide
baseia-se em achados
clínicos, laboratoriais e
alterações encontradas
nos exames de imagem.
A principal manifestação
clínica é a presença
de artrite em mais
de três articulações,
predominantemente as
pequenas articulações de
mãos e pés
compartilhado. Aparentemente, o
tabagismo desencadearia a produção de autoanticorpos, ACPA, em
indivíduos portadores do epítopo
compartilhado, mas não naqueles que não expressam os alelos
de suscetibilidade. Desta forma,
podemos perceber que a associação de múltiplos fatores pode ser
responsável pela etiopatogenia da
artrite reumatoide.
O diagnóstico da artrite reumatoide baseia-se em achados clínicos,
laboratoriais e alterações encontradas nos exames de imagem. A
principal manifestação clínica é a
presença de artrite em mais de três
articulações, predominantemente
as pequenas articulações de mãos
e pés, mas também podendo ocorrer em articulações maiores como
joelhos, tornozelos e cotovelos.
Com o avanço da doença, ocorrem deformidades como dedos
“em pescoço de cisne”, dedos “em
botoeira”, “polegar em z”, desvio
ulnar de dedos, desvio radial de
punho e luxações. Sintomas gerais
como fadiga, mialgia e indisposição também são frequentes. A
rigidez matinal, em geral com
duração maior do que uma hora,
é outro sintoma característico da
doença e indica doença ativa.
Os testes laboratoriais mais úteis
para o diagnóstico são as provas
de atividade inflamatória, principalmente proteína C-reativa
(PCR) e velocidade de hemossedimentação (VHS), além dos testes
para detecção de autoanticorpos,
fator reumatoide e ACPA. O
VHS e a PCR são testes que demonstram a presença de processo
inflamatório e podem ser utilizados como auxílio no diagnóstico
e também no seguimento clínico,
mas são testes de especificidade
muito limitada, por que estão
alterados nas mais diversas doenças. Por outro lado, a pesquisa
de fator reumatoide e de ACPA,
ressaltando-se que ACPA se refere
ao que foi inicialmente descrito
como anticorpos anticitrulina
(anti-CCP), apresentam um bom
desempenho para o diagnóstico
da artrite reumatoide, conferindo
sensibilidade em torno de 80%,
mas especificidade de cerca de
65% para o fator reumatoide e
96% para o ACPA. (4) Por fim,
deve-se atentar para o aspecto de
que o diagnóstico de artrite reumatoide pode ser definido mesmo
na ausência destes testes. Quanto
à imagem é possível encontrar
alterações compatíveis com artrite
reumatoide em exames de raio
X, ultrassonografia e ressonância
magnética. O perfil de sensibilidade difere entre estes exames,
sendo maior para ressonância
magnética e ultrassonografia e
menor para o raio X.
3
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e os hormonais. Tanto os anti-inflamatórios convencionais quanto
os inibidores seletivos de COX-2
são úteis no controle da dor, sem
efeito sobre a progressão radiológica da artrite reumatoide. Há
benefícios do uso de inibidores de
COX-2 pela menor incidência de
eventos gastrointestinais. Por outro lado, os corticosteroides como
prednisona, quando utilizada em
dose de até 10 mg/dia, além do
efeito anti-inflamatório parecem
também trazer algum benefício na
inibição da progressão da doença,
sendo necessária uma prevenção
de osteoporose com reposição
combinada de cálcio e vitamina D
e/ou uso de bifosfonados.(5)
O tratamento da artrite reumatoide pode ser dividido em não
medicamentoso e medicamentoso. O primeiro inclui fisioterapia,
terapia ocupacional e medidas
educacionais. O consenso brasileiro de diagnóstico e tratamento
da artrite reumatoide destaca a
importância do tratamento multidisciplinar. Quanto ao tratamento
medicamentoso podemos incluir
as drogas que são utilizadas essencialmente no controle da dor
e da inflamação, com ação rápida
e efeito a curto prazo, como os
anti-inflamatórios não hormonais
4
O principal grupo
de drogas utilizadas
no tratamento da artrite
reumatoide é o das drogas
modificadoras do curso da
doença, chamadas DMCD.
Estas têm potencial para
retardar ou impedir a
progressão radiográfica da
doença
O principal grupo de drogas utilizadas no tratamento da artrite
reumatoide é o das drogas modificadoras do curso da doença,
chamadas DMCD. Estas têm potencial para retardar ou impedir a
progressão radiográfica da doença
e, consequentemente, impedir
as limitações funcionais. Dentre
estas temos: cloroquina, metotrexato, leflunomida, sulfassalazina,
azatioprina e ciclosporina. A
principal delas é o metotrexato,
que atualmente é considerado
padrão ouro para o tratamento. O
consenso brasileiro de diagnóstico
e tratamento indica o uso de uma
DMCD tão logo o diagnóstico
seja estabelecido, sendo priorizado o uso de metotrexato como
primeira opção. Quando ocorrer
falha a este tratamento estão indicadas a troca ou a associação
com outra DMCD, podendo ser
utilizada até a combinação de
três drogas. Os efeitos adversos
são comuns e cada uma destas
drogas tem um perfil de segurança
particular. A associação de drogas
é comum e interações medica-
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mentosas podem ocorrer, sendo o
papel do farmacêutico hospitalar
muito importante na orientação
e no supervisionamento destes
pacientes. Estudo brasileiro recente demonstrou polifarmácia
em 95,1% dos pacientes com AR
atendidos em farmácia escola de
Florianópolis.(6)
Nos últimos dez anos, um grupo
novo de DMCD, com perfil de
ação mais específico na cadeia inflamatória da artrite reumatoide,
tem sido utilizado com grande
benefício para pacientes refratários às DMCD sintéticas. Estas
novas drogas são chamadas genericamente de imunobiológicos
e incluem drogas com diferentes
mecanismos de ação: anti-TNF,
anti-CD20, anti-IL-6 e moduladores de coestimulação (tabela).
Os anti-TNF liberados para uso
no Brasil são: adalimumabe,
certolizumabe, etanercepte, golimumabe e infliximabe. A via
de administração é intravenosa
para o infliximabe e subcutânea
para os demais anti-TNF. No
Brasil, os anti-TNF estão indicados quando se configura falência
ao tratamento com as DMCD
sintéticas. Além de reduzirem a
atividade inflamatória da AR, os
anti-TNF podem induzir remissão em percentual considerável
de pacientes, assim como há
evidências claras dos benefícios a
longo prazo, com redução da progressão radiográfica, menor incapacidade funcional e interrupção
da progressão para deformidades
articulares.(7) Os principais efeitos
colaterais são as reações infusionais e o aumento de incidência
de intercorrências infecciosas.
Destaque especial para o risco de
reativação de tuberculose latente.
Assim, é obrigatório que os pa-
Além de reduzirem
a atividade
inflamatória da AR, os
anti-TNF podem induzir
remissão em percentual
considerável de
pacientes, assim
como há evidências claras
dos benefícios a longo
prazo, com redução da
progressão radiográfica,
menor incapacidade
funcional e interrupção
da progressão para
deformidades
articulares
cientes façam rastreamento com
teste tuberculínico e raio X de tórax, estando indicada a profilaxia
com isoniazida quando configurada tuberculose latente.(8)
Em resumo, pode-se observar
que muito progresso ocorreu ao
longo dos últimos anos quando
se discute o tratamento da artrite
reumatoide, com consolidação de
esquemas terapêuticos já conhecidos de longa data e inclusão de
novas drogas que atuam de forma
mais específica e com perfil de
segurança aceitável (tabela 1).
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arthritis in Brazilian population samples.
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6. Bagatini F, Blatt CR, Maliska G, Trespash GV, Pereira IA, Zimmermannn AF,
Storb BH, Farias MR. Potenciais interações medicamentosas em pacientes com
artrite reumatoide. Braz J Rheumatol
2011;51(1):20-39.
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management of rheumatoid arthritis
with synthetic and biological diseasemodifying antirheumatic drugs. Ann
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8. Conde FAB, de Melo FAF, Marques
AMC et al. III Brazilian Thoracic Association Guidelines on Tuberculosis. J
Bras Pneumol 2009;35(10):1018-1048.
Tabela 1. Esquemas terapêuticos
Medicamento
Mecanismo de ação
Via de administração
Adalimumabe
Anti-TNF
Subcutânea
Abatacepte
Modulador de coestimulação
Intravenosa
Certolizumabe
Anti-TNF
Subcutânea
Etanercepte
Anti-TNF
Subcutânea
Golimumabe
Anti-TNF
Subcutânea
Infliximabe
Anti-TNF
Intravenosa
Rituximabe
Anti-CD20
Intravenosa
Tocilizumabe
Anti-IL-6
Intravenosa
5
FarmacêuticoemFoco
Maria Fernanda Salomão
(à esq.), Jorge Augusto
Siqueira e Mayra Carvalho
Ribeiro.
Atuação do Farmacêutico Clínico na
Utilização Racional de Antimicrobianos
Jorge Augusto Siqueira1, Maria Fernanda Salomão de Azevedo2, Mayra
Carvalho Ribeiro3, Débora Cecília Mantovani Faustino de Carvalho4
N
as discussões sobre
medicamentos, o
uso de antibióticos
sempre é acompanhado por uma grande problemática, pois impacta não só para
o paciente como também para a
comunidade. Além disso, os antibióticos são os medicamentos
mais indevidamente utilizados
na área da saúde. Outro fato é
a escassez de pesquisas de moléculas inovadoras. Os novos
medicamentos apresentados ao
mercado pouco trazem de benefício quando comparados ao
arsenal terapêutico já existente.
Em suma, a situação apresenta-se
desfavorável e caminha para um
“beco sem saída”. O que se faz
necessário é aprimorar o uso dos
antimicrobianos já disponíveis.
1 - Farmacêutico Clínico da Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Sírio-Libanês.
CRF-SP 55.341.
2 - Farmacêutica Clínica da Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Sírio-Libanês.
CRF-SP 28.307.
3 - Farmacêutica do Centro de Informações sobre Medicamentos (CIM) do Hospital
Sírio-Libanês. CRF-SP 53.649.
4 - Gerente de Farmácia do Hospital Sírio-Libanês. CRF-SP 12.495.
6
O Hospital Sírio-Libanês (HSL)
busca estratégias para otimização
do uso destes medicamentos, e o
farmacêutico está frequentemente
envolvido nelas.
No processo de uso de um antibiótico, a primeira etapa é a prevenção da infecção, como no caso
de antibioticoprofilaxia cirúrgica.
O uso ou não do antibiótico profilático depende de fatores como
idade do paciente e tempo de
hospitalização pré-cirurgia. Hoje
há protocolos e estudos específicos para cada tipo de cirurgia.
O farmacêutico no HSL auxilia
a equipe multiprofissional e a
FarmacêuticoemFoco
CCIH no acompanhamento do
protocolo de antibioticoprofilaxia
cirúrgica institucional.
Um dos pontos importantes é a
avaliação do tempo de uso do antibiótico, pois em grande parte das
cirurgias a extensão da profilaxia
para além de 24 h aumenta o custo,
altera a microbiota do paciente e o
padrão de resistência microbiana
da instituição sem ganho clínico
evidente.(1) O farmacêutico pode
sugerir a suspensão do antibiótico
quando o paciente não apresentar
sinais de doença, através da análise
de parâmetros infecciosos.
Uma vez que a infecção esteja instalada, o tratamento é iniciado ou
modificado. Nesta etapa, o tempo
de início, o real reconhecimento
de uma infecção ativa e as escolhas antimicrobianas adequadas
são fatores determinantes para o
sucesso terapêutico. Os tratamentos empíricos devem ser embasados na etiologia e epidemiologia
da doença e nas características
microbiológicas da instituição.
A elaboração de protocolo para
diagnóstico e tratamento de sepse
com participação do farmacêutico
mostrou-se capaz de aumentar
a porcentagem de pacientes que
receberam o antibiótico adequado
precocemente quando comparados ao grupo anterior ao protocolo. Houve redução significativa da
mortalidade em 28 dias (61% vs.
33%, P=0,004).(2)
A Unidade de Terapia Intensiva
(UTI) do HSL possui equipe
de farmacêuticos clínicos que
realizam acompanhamento farmacoterapêutico utilizando a
metodologia desenvolvida por
Linda Strand.(3) Um dos critérios
Estudo clínico
envolvendo 1.044
pacientes hospitalizados
maiores de 80 anos revelou
necessidade de ajuste na
dose dos antimicrobianos
em 34% das prescrições
médicas. Desta forma, a falta
de correção para pacientes
com disfunção renal
torna-se fator determinante
para o aparecimento de
eventos adversos aos
antibióticos
de seleção de pacientes a acompanhar é a condição de choque séptico. A monitorização terapêutica
é uma questão de segurança no
contexto hospitalar, normalmente
os pacientes internados fazem uso
de muitos medicamentos, podem
estar acometidos por patologias
que alteram o metabolismo fisiológico, e que pode comprometer
a resposta desejada dos medicamentos. Nesse contexto, faz-se
necessário o monitoramento
de interações medicamentosas,
avaliação das incompatibilidades
físico-químicas e individualização
de dose dos medicamentos, especialmente dos antimicrobianos.
A escolha dos antibióticos também deve ser pautada em critérios
intrínsecos ao fármaco que não o
seu espectro de ação. A literatura
apresenta alguns casos de interação medicamentosa com efeito
clínico significativo, como carbapenêmicos e valproato de sódio,
caspofungina e indutores de metabolismo hepático e interações dos
macrolídeos. Do ponto de vista de
eventos adversos, há antibióticos
que podem exacerbar arritmias,
afetar a função renal e hepática,
provocar distúrbios hematológicos,
causar rash cutâneo e intensificar
convulsões. A análise destas situações é realizada pelo farmacêutico,
e seu resultado é utilizado para embasar intervenções farmacêuticas e
avaliação de reações adversas.
O tipo de eliminação também é
um critério importante na escolha
do medicamento. Em pacientes
com insuficiência renal aguda
(IRA), por exemplo, o uso de antibióticos cuja eliminação ocorre
por outras vias é desejado, evitando as incertezas de nível sérico
adequado e ajustes de dose. Caso
isso não seja possível é necessário
o ajuste de dose do medicamento.
Estudo clínico envolvendo 1.044
pacientes hospitalizados maiores
de 80 anos revelou necessidade de
ajuste na dose dos antimicrobianos em 34% das prescrições médicas. Desta forma, a falta de correção para pacientes com disfunção
renal torna-se fator determinante
para o aparecimento de eventos
adversos aos antibióticos.(4)
Na UTI do HSL, pacientes com
alterações nos marcadores renais
são monitorados criteriosamente.
A individualização das doses segue
alguns critérios: escolha da fórmula de clearance de creatinina estimado adequada à situação clínica,
o horário de administração mais
indicado para o medicamento
nos casos de diálise intermitente,
cálculo da dose de ataque, monitoramento da concentração sérica
dos fármacos e da evolução do
paciente.(5) Os antimicrobianos são
os medicamentos avaliados em que
se contabiliza o maior número de
intervenções farmacêuticas para
7
FarmacêuticoemFoco
correção de dose, com média de
29 intervenções por mês.
Uma vez disponibilizados os resultados de culturas e antibiograma,
a terapia antimicrobiana deve ser
direcionada para o patógeno isolado e baseado nas suscetibilidades
obtidas. O farmacêutico da UTI
do HSL participa das discussões
clínicas e contribui na decisão da
escolha terapêutica mais adequada
à condição do paciente.
Mesmo com escolhas iniciais adequadas, a emergência de resistência microbiana pode ocorrer como
consequência de um processo de
seleção natural. Porém, escolhas
inapropriadas para infecções documentadas, uso desnecessário
em suspeitas de infecção não
sustentadas e tempo excessivo
de tratamento são os principais
fatores para o desenvolvimento
de resistência.
O farmacêutico pode contribuir
para minimizar esse processo ao
sugerir adequação do regime terapêutico, baseando-se em critérios
farmacocinéticos e farmacodinâmicos. Estratégias possíveis
são aumento de dose como para
ciprofloxacino, infusão prolongada para betalactâmicos e associação de medicamentos com
efeito farmacodinâmico aditivo
ou sinérgico.(6)
Durante o tratamento da infec-
A atuação do
farmacêutico clínico
torna-se imprescindível
para adequado manejo do
uso de antimicrobianos,
ao colaborar para escolha
adequada do medicamento,
adequação posológica,
monitoramento de reações
adversas e do tempo de
utilização dos antibióticos,
contribuindo para otimização
terapêutica e diminuição da
resistência bacteriana.
ção, o paciente pode apresentar
melhora clínica com possibilidade
de modificar o tratamento inicial
intravenoso para oral. Esta estratégia permite redução de custos,
evita o manuseio de cateteres e reduz volume de infusão de fluidos.
No entanto, é necessário considerar a funcionalidade do sistema
digestório, a disponibilidade de
formas farmacêuticas para administração oral, possibilidade de
sub ou sobredosagem em casos de
medicamentos com absorção oral
errática. Esses aspectos devem ser
considerados pelo farmacêutico
na sugestão de alteração da via
de administração.
A duração do tratamento antimicrobiano numa infecção documentada ainda é motivo de muita
A fórmula de Cockcroft-Gault é a mais comumente utilizada para cálculo de
clearence de creatinina e nos fornece o resultado não normalizado, isto é,
não corrigido para a superfície corporal. É importante destacar que para essa
fórmula deve-se utilizar o peso ideal para cálculo do clearance, que pode ser
obtido através do Índice de Massa Corporal (IMC) do limite superior de eutrofia
(IMC = 24,9 para pacientes com idade inferior ou igual a 64 anos e IMC = 27
para maiores de 65 anos). Algumas situações invalidam o uso desta fórmula
como: função renal instável; pacientes submetidos a tratamento dialítico e
presença de anormalidades musculares, como caquexia e distrofias musculares.
8
discussão. Para doenças em que a
penetração do antibiótico é desfavorecida, os tempos de tratamento são extremamente longos, e
mostram-se necessários, como na
endocardite e osteomielite. Pneumonias por Pseudomonas aeruginosa e bacteremia por Staphylococcus
aureus não respondem bem a terapia curtas; mas em outros casos é
possível que um período curto de
tratamento seja tão efetivo quanto
um longo. Avaliando as condições
e evoluções do paciente, o farmacêutico deve sugerir a suspensão
precoce do tratamento.(6)
A atuação do farmacêutico clínico torna-se imprescindível para
adequado manejo do uso de antimicrobianos, ao colaborar para
escolha adequada do medicamento, adequação posológica, monitoramento de reações adversas e
do tempo de utilização dos antibióticos, contribuindo para otimização terapêutica e diminuição da
resistência bacteriana.
Referências
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antibiotic prophylaxis. In: Textbook of Therapeutics: Drug and Disease Management.
Lippincott Williams, cap. 89, 2006.
2. Gurnani PK et al. Impact of the implementation of a sepsis protocol for the management of fluid-refractory septic shock: A
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patients. Am J Med Sci 2001;322:3:133-6.
5. Homsi E, Paloma H. Injúria renal aguda
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20, p. 237-242, 2010.
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Filtração Glomerular e Ajuste de Fármacos em Insuficiência Renal. J Bras Nefrol
2008;30(1):6-14.
FarmacêuticoemFoco
ENTREVISTA
Síndrome Coronariana Aguda: impacto na
mortalidade e terapêutica atual
Prof. Dr. Antonio Carlos Carvalho*
D
ando continuidade à entrevista do
Professor Titular
de Cardiologia da
Unifesp, Prof. Dr. Antonio Carlos
Carvalho, a respeito do tema Síndrome Coronariana Aguda, publicada na edição anterior do Jornal
Farmacêutico em Foco, o médico
comenta nesta segunda parte as
principais indicações cirúrgicas
da doença e a importância das diretrizes para a escolha da melhor
abordagem farmacológica. “As
diretrizes são importantes, porque
elas servem como guia de orientação para determinados tratamentos e foram criadas por um grupo
de especialistas que analisam um
conjunto de trabalhos para dar
respaldo na utilização ou não
de um medicamento”, salienta o
cardiologista.
Outro assunto importante abordado na entrevista diz respeito
ao Estudo PLATO, publicado no
New England Journal of Medicine,
em 2009, o qual comparou o
novo antiagregante plaquetário
ticagrelor versus clopidogrel no
tratamento de pacientes com Síndrome Coronariana Aguda, e que
trouxe resultados impactantes,
* Professor Titular de Cardiologia da
Universidade Federal de São Paulo
(Unifesp) e Chefe da Disciplina de
Cardiologia.
9
FarmacêuticoemFoco
paço muito grande de indicação
cirúrgica. E quando existem alguns tipos de complicações após
o infarto, como por exemplo,
quando há uma perfuração na
parede que separa um ventrículo
do outro e fica uma comunicação
entre essas cavidades, ou quando
o infarto atinge a região da válvula mitral e de repente para de
funcionar; aí o coração não tem
condição de bombear o sangue
efetivamente para o corpo e esse
sangue retorna para o pulmão.
Situações deste tipo têm indicações de cirurgia.
J. F. - Quais são os critérios para a
escolha da melhor abordagem farmacológica? Essa escolha se baseia em diretrizes estabelecidas por especialistas?
demonstrando uma superioridade
do ticagrelor em comparação ao
clopidogrel. Além de uma diminuição bastante significativa na
taxa de evento composto (óbito,
acidente vascular cerebral (AVC)
e infarto), o estudo revelou que
houve diminuição da mortalidade
do grupo do ticagrelor, um dado
que não se observava há muito
tempo em estudos de cardiologia.
“Em vários estudos, inclusive
o que aprovou o clopidogrel e
mostrou que ele era efetivo, o
objetivo composto foi alcançado,
mas não à custa de diminuição
de mortalidade, enquanto no
PLATO o objetivo composto foi
alcançado incluindo também uma
diferença significativa na redução
da taxa de mortalidade”, explica
Dr. Carvalho.
10
Jornal Farmacêutico em Foco Quais são as indicações cirúrgicas na
Síndrome Coronariana Aguda?
Prof. Dr. Antonio Carlos Carvalho - Com relação à cirurgia,
a indicação indiscutível é para os
casos de lesão das três artérias,
então ela está indicada para o indivíduo que tem uma doença difusa ou que está com o ventrículo
já com um grau de sofrimento
grande, ele não está trabalhando
normalmente, ou ainda naquele
grupo que tem lesão de tronco
de coronária. No tronco, por ser
a área que vai originar toda a
irrigação principal do ventrículo
esquerdo, uma obstrução dessa
região coloca em risco o ventrículo inteiro, sendo assim, essa é
uma área que também tem um es-
Dr. Carvalho - Como regra, os
especialistas seguem as diretrizes,
mas existe sempre um espaço
para uma indicação personalizada e o médico que está atendendo
o paciente tem sempre que avaliar se ele se encaixa na diretriz
ou não. As diretrizes valorizam
muito os estudos randomizados,
realizados de modo cego, porém
esses estudos, para poderem ser
feitos, excluem uma parcela da
população, como por exemplo,
indivíduos com doença pulmonar, insuficiência renal, população idosa, pessoas com alteração
endócrina ou hepática, etc. Só
que na vida real esse paciente
existe e podemos nos deparar
com um indivíduo que não necessariamente é contemplado
pela diretriz. Neste caso, temos
que fazer uma escolha da melhor
abordagem para esse paciente
baseado no conjunto de informações que temos. As diretrizes
são importantes, porque elas
servem como guia de orientação
FarmacêuticoemFoco
para determinados tratamentos
e foram criadas por um grupo
de especialistas que analisam um
conjunto de trabalhos para dar
respaldo na utilização ou não de
um medicamento. A diretriz não
é só para dizer que a droga está
indicada, mas também para dizer
“esse tipo de paciente não pode
fazer uso desse medicamento”, e
isso também é muito importante.
Em Síndrome Coronária Aguda,
as diretrizes europeias, americanas e brasileiras têm poucas
diferenças, de um modo geral elas
se baseiam nos mesmos estudos.
Os resultados de alguns trabalhos
não são muito claros e permitem
interpretações um pouco ambíguas, daí a indicação ou não de
um determinado medicamento
fica a critério de cada grupo.
Mas os estudos que são absolutamente conclusivos não deixam
nenhuma dúvida a respeito do
benefício do medicamento em
questão. As diretrizes são normalmente refeitas a cada dois
a quatro anos e, como eu disse,
não existem grandes diferenças
entre a diretriz brasileira e a de
outros países; o problema maior,
na verdade, está no número de
profissionais que não leem essas
orientações e não se atualizam
em relação às novas condutas
terapêuticas. Educação médica
continuada é fundamental, porque a medicina avança a passos
rápidos e o profissional que não
se atualiza não sabe direito o que
pode ser utilizado, como deve ser
utilizado, o que está disponível de
novo e o que está ultrapassado.
Dessa maneira, o efeito da desatualização, especialmente em
uma área como a medicina, que
muda constantemente e evolui
muito rápido, é desastroso.
Os resultados
mostraram uma
superioridade do ticagrelor
em comparação ao
clopidogrel. Houve uma
diminuição bastante
significativa na taxa de evento
composto, que é a soma dos
três eventos principais (óbito,
AVC e infarto) da ordem de
16% favorável ao ticagrelor.
E outro dado extremamente
importante e que não se
via há muito tempo em
estudos de cardiologia é
que houve uma diminuição
da mortalidade do grupo do
ticagrelor
J. F. - O que foi o Estudo PLATO e
quais foram os resultados mais impactantes desse trabalho?
Dr. Carvalho - O PLA TO foi
um grande estudo que contemplou 18 mil pacientes de vários
centros de diferentes países. Foi
um estudo extremamente interessante, porque fizeram uma
comparação head-to-head contra
o que era o gold standard de uso
em Síndrome Coronária Aguda,
o clopidogrel. O clopidogrel foi
o medicamento que na última
década trouxe uma melhora nos
resultados, muito embora não
tenha resolvido todos os problemas. O PLATO randomizou
indivíduos com SCA, no qual
englobou todo o espectro da
patologia, o que é muito bom,
porque estamos falando de um
espectro da população muito
mais amplo que selecionar apenas um subgrupo de pacientes.
Eles compararam, então, indivíduos com SCA para receber
clopidogrel versus ticagrelor. A
dose do clopidogrel era adequada, dentro do melhor prazo, e
mesmo pessoas que já estavam
com o clopidogrel não eram excluídas, elas podiam receber um
reforço ou não. E se o indivíduo
não estivesse tomando o clopidogrel, podia tomar a dose máxima
da droga. Foram analisados os
resultados de óbito relacionado
ao evento cardiovascular, de
reinfarto e de AVC, além dos aspectos de sangramento, porque a
finalidade era obter um benefício
na eficácia sem que isso estivesse associado com um índice de
sangramento maior.
Os pacientes foram acompanhados por um período de seis meses
a um ano e quem teve que fazer
cateterismo, o fez, quem teve que
fazer angioplastia, a fez, quem
teve que fazer cirurgia cardíaca
convencional, a fez; portanto,
não houve nenhum tipo de exclusão terapêutica ou de proibição
de um procedimento ou outro.
Os resultados mostraram uma
superioridade do ticagrelor em
comparação ao clopidogrel.
Houve uma diminuição bastante
significativa na taxa de evento
composto, que é a soma dos três
eventos principais (óbito, AVC e
infarto) da ordem de 16% favorável ao ticagrelor. E outro dado
extremamente importante e que
não se via há muito tempo em estudos de cardiologia é que houve
uma diminuição da mortalidade
do grupo do ticagrelor. Em vários
estudos, inclusive o que aprovou
11
FarmacêuticoemFoco
o clopidogrel e mostrou que ele
era efetivo, o objetivo composto
foi alcançado, mas não à custa
de diminuição de mortalidade,
enquanto no PLATO o objetivo composto foi alcançado incluindo também uma diferença
significativa na redução da taxa
de mortalidade. Isso não deixou
de ser uma surpresa agradável,
porque em vista de tanto tempo
sem diminuição de mortalidade
não se esperava que fosse haver
uma diferença tão expressiva
nesse sentido.
Não houve uma
taxa maior de
sangramento importante
com o uso do ticagrelor;
dessa maneira, ele foi
mais eficiente que o
clopidogrel sem causar
complicações em termos
de hemorragia para o
paciente
J. F. - E quanto a complicações relacionadas a sangramento?
Dr. Carvalho - Esse foi outro
aspecto interessante do estudo;
não houve uma taxa maior de
sangramento importante com o
uso do ticagrelor; dessa maneira, ele foi mais eficiente que o
clopidogrel sem causar complicações em termos de hemorragia
para o paciente. Sendo assim, o
resultado foi ainda melhor, porque a soma do benefício não foi
significantemente prejudicada
pelo número de complicações.
Esse foi um estudo de grande
repercussão internacional e que
trouxe uma série de contribuições importantes para a cardiologia. Recentemente, no último
American College of Cardiology,
realizado em Nova Orleans, foi
apresentada uma parte do estudo
PLATO somente em pacientes
bem idosos, que é aquele grupo
em que tudo é mais complicado,
e o resultado foi o mesmo do
que no estudo geral. A curva do
grupo de pacientes idosos contra
a curva da população geral não
mostrou nenhuma diferença e
isso representa uma segurança
enorme, porque os idosos são
12
os que mais têm problemas de
coronária associados a outras
doenças, são uma população
crescente e com uma série de restrições para o uso de vários desses agentes utilizados em SCA.
Isso significa que o ticagrelor,
provavelmente, terá um espaço
muito grande no tratamento de
indivíduos mais idosos.
J. F. - O que o PLATO representa hoje
para a cardiologia?
Dr. Carvalho - Podemos dizer
que o PLATO é um divisor de
águas na cardiologia, porque ele
é um definidor de novos paradigmas ou de novas condutas. Estudos que entram nessa categoria
acabam tendo uma importância
muito grande, porque isso se
traduz em melhores resultados,
em menos complicações. E um
aspecto extremamente relevante
e que temos sempre de lembrar
é que o objetivo não é só evitar
a morte do paciente, mas lhe dar
uma boa qualidade de vida. O
indivíduo que faz o tratamento
da SCA quer ficar saudável, quer
ter uma qualidade de vida normal.
E à medida que temos melhores
resultados, isso melhora também
o próprio sistema de saúde, pois
ele gasta menos com o paciente
crônico, economiza em internações, insuficiência cardíaca e em
transplante.
J. F. - Qual a indicação do ticagrelor
e quando ele chega ao mercado?
Dr. Carvalho - O ticagrelor já foi
aprovado pela Anvisa e lançado
no mercado em junho deste ano.
Como o estudo foi em SCA, ele
está indicado na população que
apresenta esse quadro de desconforto coronariano. A única
área que não foi testada dentro
do PLATO é o paciente após
uso de fibrinolíticos, esse foi um
grupo que não foi contemplado
no estudo, então por enquanto
não terá essa indicação. Ele está
indicado, de um modo geral, nos
indivíduos de risco moderado a
grave, como os do estudo PLATO. A expectativa é de que ele
tenha uma grande penetração
em relação ao número de casos
que temos atualmente, sobretudo nos pacientes mais complicados, que são aqueles que acabam
evoluindo mal. Acreditamos que
esse é o grupo que mais irá se
beneficiar do medicamento. O
ticagrelor é, sem dúvida, uma
evolução farmacológica em
SCA, tendo em vista um resultado tão favorável na diminição
da taxa de mortalidade quando
comparado com o clopidogrel.
Uma droga que promove redução na taxa de mortalidade
tem realmente um valor considerável, especialmente em um
estudo de grande porte como
foi o PLATO. Evidente que seu
uso em maior escala dependerá
também de seu custo.
FarmacêuticoemFoco
Utilização do Sistema Kanban
na farmácia hospitalar:
incorporação de
ferramenta prática e de
baixíssimo custo na gestão
de estoques
Ronaldo Chalegre*
E
m busca do aperfeiçoamento da difícil
tarefa de gestão de
estoque de medicamentos, cada vez mais hospitais
estão utilizando uma nova ferramenta para a área hospitalar: o
sistema Kanban, um mecanismo
simples e prático, de custo inicial baixíssimo e que não possui
gastos para ser mantido. Ele une
gestão visual e redução de valor
estocado, permitindo inclusive um
aumento de giro.
Kanban é uma palavra de origem
japonesa que significa registro ou
placa visível. Em Administração
da Produção isso se traduz por
um cartão de sinalização ou outro sistema visual que controle
os fluxos de produção em uma
indústria. Emprega-se o Kanban
em peças ou partes específicas de
uma linha de produção, para indicar a entrega de uma determinada
quantidade. Quando se esgotam
todas as peças, o mesmo aviso é
levado ao seu ponto de partida,
onde se converte num novo pedido para mais peças. Quando for
recebido o cartão ou quando não
há nenhuma peça na caixa ou no
Os kanbans físicos (cartões ou
caixas) transitam entre os locais
de armazenagem e produção
substituindo formulários e outras
formas de solicitar peças, permitindo enfim que a produção se
realize just in time - metodologia
desenvolvida e aperfeiçoada por
Taiichi Ohno e Toyota Sakichi,
conhecida como Sistema Toyota
de Produção.(1)
O sistema de gestão Kanban
funciona dentro de uma lógica
de reposição de materiais, onde
são controlados dois parâmetros:
consumo (ou saída) e tempo de
reposição, também conhecido
como lead time.(1)
local definido, então deve-se movimentar, produzir ou solicitar a
produção da peça.(1)
O método permite agilizar a entrega e a produção de peças. É
usualmente empregado em indústrias montadoras, porém pode ser
aplicado em quaisquer atividades
de movimentação ou estocagem
de materiais, seja em aplicações
industriais ou comerciais.(1)
É, resumidamente, um sistema
de gestão visual pertencente à
metodologia Lean Six Sigma, que
faz uso de cartões para gerenciar
o estoque.
Para exemplificar o método, podese imaginar um estoque do com* Chefe do Departamento de Suprimentos.
Hospital São Camilo Pompeia. Formado
em Logística pela Faculdade EniacFAPI, Guarulhos, São Paulo. CRA-SP
6-000575.
13
FarmacêuticoemFoco
primido A cuja dispensação diária
é de 50 unidades, como na figura
1. Se o estoque inicial era de 500
unidades no dia 0, consumindo
50 unidades por dia, o estoque
chegará a zero no dia 10.
Considerando que o fornecedor
do comprimido A demora 2 dias
úteis para entregar o pedido de
reposição, a contar da data de
emissão da sua ordem de compra,
e o hospital faz um pedido por
semana, tem-se o seguinte gráfico:
Conforme demonstrado na figura
2, o pedido é emitido no dia 05 e
o material é recebido no dia 07.
Esse movimento de consumo e
reposição é conhecido entre os
profissionais de logística como
“dente de serra” do item.(1)
O objetivo principal da implantação desse método em um hospital
é eliminar as oportunidades de
faltas de medicamentos padronizados e manter um nível de
atendimento satisfatório.
Fonte: VH2C Consultoria Empresarial.
Figura 1.
Geralmente o planejamento para
reposição do estoque de medicamentos em hospitais é feito com
base no “ponto de pedido”, um
sistema baseado em previsões de
demanda e que por assim ser está
sujeito a vulnerabilidade.
Já com a introdução do Kanban,
a “previsão da demanda” gerada por sistemas informatizados
baseados em consumo x estoque
disponível x tempo de reposição
(também conhecida como “sistema empurrado”) é substituída
pela “demanda real” (“sistema
puxado”) do produto. Assim, deixa-se de comprar medicamentos
que não têm demanda e passa-se a
comprar somente os produtos que
têm demanda. Com isso o nível de
serviço melhora muito por que se
passa a fazer a gestão visual dos
produtos. Com a implantação da
metodologia é possível repor os
medicamentos no estoque muito
antes do risco de faltas nas unidades assistenciais.
ciona da seguinte forma em uma
farmácia hospitalar: a partir de
um histórico de consumo dos medicamentos que forneça dados de
um período confiável (costuma-se
utilizar um intervalo mínimo de
12 meses para que o valor obtido
reflita de maneira mais fidedigna
possível a realidade, contemplando
as oscilações e sazonalidades existentes) é possível calcular o consumo médio de um determinado medicamento, com base na demanda
real, ou seja, no consumo diário.
É realizado esse cálculo de todos
os medicamentos padronizados,
obtendo-se os valores a serem
considerados no armazenamento
dos produtos no estoque.
Assim, os medicamentos são
armazenados na prateleira do
estoque dividindo a quantidade
total de cada produto em três
faixas coloridas:
Verde – faixa de consumo, equivalente a um período de consumo
sem compra.
Em linhas gerais, o Kanban funAmarela – precisa ser solicitada
a compra do medicamento, é o
Lead Time. Conhecida na gestão clássica de materiais como
ponto de pedido, a faixa amarela
contempla a quantidade que será
consumida desde o momento em
que se faz um pedido ao fornecedor ou a produção ate o momento
do recebimento desses produtos
no estoque;
Vermelha – estoque de segurança
equivalente a um período de estoque; utilizar esta faixa significa
que o produto está com pico de
consumo ou o fornecedor atrasou
a entrega.
Figura 2.
14
O período a ser utilizado em cada
FarmacêuticoemFoco
faixa do Kanban depende do
que é preconizado pelo hospital.
Pensando em manter-se o menor
estoque seguro possível, é usual
considerar que a faixa verde conterá o consumo previsto de um
dia, a faixa amarela por sua vez
três dias e por último a faixa vermelha armazenará mais um dia de
estoque, considerando o consumo
médio diário e o Lead Time.
Após o cálculo de consumo de
cada produto e definição da quantidade para cada faixa, o maior
desafio é encontrar uma configuração de armazenagem que atenda
à particularidade de cada item,
uma vez que na área hospitalar
existe um grande número de itens
padronizados e de tamanhos variados, o que dificulta um pouco a
disposição visual dos produtos. O
controle de saldo de estoque com
inventário rotativo atuante e a manutenção da acuracidade também
são fatores relevantes para a realização dos cálculos de cada faixa.
Toda vez que o medicamento
entrar na faixa amarela, o responsável pela separação dos pedidos
deve retirar o cartão de solicitação
do medicamento localizado na
prateleira e depositá-lo no espaço
de solicitações do Painel de Compras Kanban (painel calendário
fixado na parede). Uma vez por
dia, ou em uma frequência que seja
considerada segura, o responsável
pelo planejamento de compras na
farmácia deve retirar os cartões e
fazer a solicitação dos medicamentos cujo ponto de pedido (faixa
amarela) foi alcançado. Os cartões
trazem a descrição do medicamento, código e quantidade a ser comprada, de forma a agilizar o pedido
de compra. Assim que o pedido for
efetuado, o cartão é então coloca-
Com a aplicação do
Kanban o estoque
torna-se minimizado,
evitando altos valores
estagnados. Isso permite
inclusive que sejam
adquiridos medicamentos
de melhor qualidade, sem
que o impacto no saldo de
estoque seja significativo,
visto que não se compra
em excesso e evitam-se
desperdícios
do na data estipulada para o recebimento do medicamento no Painel
de Compras Kanban. Quando o
medicamento chegar, após todo
o processo de identificação para
garantia da rastreabilidade, esse
cartão retornará à prateleira junto
com o medicamento, respeitando
sempre a quantidade de cada faixa
do Kanban. Este sistema permite
um controle visual eficiente sobre o
trabalho de entrega do fornecedor
externo. Na data prevista para o recebimento do medicamento, caso
o produto não tenha chegado, verifica-se através do cartão (Kanban)
qual fornecedor fechou o pedido
e efetua-se o contato telefônico de
cobrança da entrega, evitando que
ocorra a falta do produto.
A utilização da metodologia Kanban apresenta muitos benefícios,
dentre os quais pode-se citar: o
uso racional do espaço, a gestão
visual que facilita o acompanhamento da demanda e a organização do estoque seguindo um
padrão de armazenagem.
É importante enfatizar o ganho
financeiro gerado pela utilização
do Kanban, que anualmente chega
a aproximadamente dois meses
de redução de estoque de medicamentos, o que representa um valor
muito expressivo e importante
quando se pensa em uma unidade
de farmácia hospitalar, que estoca
permanentemente quantidades
grandes de medicamentos e materiais previamente padronizados,
gerando sempre um valor financeiro residual alto de um mês para o
outro, o que preocupa os gestores
e a alta administração do hospital,
visto que essa importância econômica não pode ser investida em
ampliações ou melhorias à Instituição. Com a aplicação do Kanban
o estoque torna-se minimizado,
evitando altos valores estagnados.
Isso permite inclusive que sejam
adquiridos medicamentos de melhor qualidade, sem que o impacto
no saldo de estoque seja significativo, visto que não se compra em
excesso e evitam-se desperdícios.
A diminuição das oportunidades
de faltas também é outro grande
benefício; o nível de atendimento
pode superar os 99%, tudo isto
atrelado a um ótimo giro de estoque. Antes do Kanban entrar em
funcionamento, o estoque usualmente está superlotado, o espaço
físico é insuficiente e precisa ser
ampliado. Com a implantação do
Kanban eliminam-se os problemas
de falta de medicamentos padronizados e o estresse entre a farmácia
e as unidades assistenciais.
A utilização do Kanban aprimora também o fluxo da Farmácia
(recebimento – unitarização –
estocagem – dispensação) e possibilita o uso racional de espaço e
equipamentos.
Pensando na implantação da metodologia e das dificuldades iniciais existentes, é indicado iniciar
15
FarmacêuticoemFoco
Referência
1. VH2C Consultoria Empresarial em Estratégia, Organização e Supply Chain,
disponível em www.vh2c.com.br.
Webmeetings tratam a respeito
da Síndrome Coronariana Aguda
C
om o intuito de aprimorar os
conhecimentos em
torno da Síndrome
Coronariana Aguda (SCA), a AstraZeneca promoveu
nos meses de junho,
julho e agosto de
2011 uma série de
webmeetings relacionados à doença,
ressaltando também a importância dos farmacêuticos no tratamento dos
pacientes cardiopatas hospitalizados.
A primeira aula foi apresentada pelo especialista Dr. Carlos Gun (Instituto
Dante Pazzanese de Cardiologia - SP), que entre outros assuntos tratou
a respeito da definição, fisiopatologia e diagnóstico da SCA.
As principais opções de tratamento para a doença foram o tema da
conferência seguinte, realizada pelo Dr. Rui Fernando Ramos (Instituto
Dante Pazzanese de Cardiologia – SP).
O estudo PLATO e seus subestudos foram abordados respectivamente
pelos Drs. José Roberto Tavares (UNIFESP - SP) e Felipe Gallego
Lima (INCOR).
Por fim, “A difícil tarefa de aliar custos com qualidade e responsabilidade” foi o tema da aula realizada por Juliana Fonseca Sad (Hospital
Odilon Behrens - MG), no qual importantes informações e estratégias
práticas foram ressaltadas para auxiliar nesse importante desafio.
Acesse: www.farmaceuticoemfoco.com.br
O Jornal Famacêutico em Foco é uma publicação da Office Editora e Publi­cidade Ltda. patrocinada pela AstraZeneca do Brasil Ltda. - Diretor Respon­sável: Nelson dos
Santos Jr. - Diretor de Arte: Roberto E. A. Issa - Diretora Executiva: Waléria Barnabá - Publicidade: Adriana Pimentel Cruz, Rodolfo B. Faustino e Denise Gonçalves
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Produzido em Agosto/2011
Trata-se de uma mudança de método significativa, que necessita
da adesão da equipe envolvida e
previamente treinada. Por se tratar
de um método visual e que pode
falhar se não for corretamente
utilizado, é necessário que todos
entendam a importância do processo e o executem com seriedade
e comprometimento. O ideal é
que haja um responsável para
realizar verificações periódicas,
também visuais, no estoque existente, evitando assim que possíveis
falhas humanas causem impacto
negativo no objetivo final de todo
o cuidado envolvido com a cadeia
de medicamentos: o paciente.
EM FOCO
1621646 -
o processo de maneira gradativa,
começando com itens de maior
impacto financeiro, por exemplo.
Pensando na divisão dos produtos em estoque por curvas (A, B
e C) de Vilfredo Pareto, é mais
interessante iniciar a implantação
com itens de curva A, mais especificamente aqueles que têm baixo
ou médio consumo, porém alto
custo unitário. Isso evidencia uma
redução importante no saldo final
de estoque, motivando inclusive
a administração do hospital na
continuidade da implementação.
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