Visão neodesenvolvimentista - Instituto de Economia

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Estadão, 05 de agosto de 2016
Visão neodesenvolvimentista
Por: Fernando Dantas
O dólar fechou a R$ 3,19, a cotação mais baixa desde meados de
julho do ano passado. Se a valorização do real se mantiver ou se aprofundar,
talvez até seja possível para o Banco Central cumprir a promessa de levar a
inflação para a meta de 4,5% no final de 2017.
Existe, porém, um grupo de economistas que não vê com bons olhos
o real forte: os autointitulados novos desenvolvimentistas, como José Oreiro,
Luiz Carlos Bresser-Pereira e Nelson Marconi. Os três estão lançando um
livro de macroeconomia desenvolvimentista.
Oreiro, da UFRJ, que já lançara outro livro sobre o tema há poucas
semanas, tem sido um dos principais porta-vozes da sua corrente que,
diferentemente de outros economistas heterodoxos, leva a sério o problema
fiscal. A diferença entre os novos desenvolvimentistas e os economistas
ortodoxos e liberais, que hoje dominam a equipe econômica do governo,
aparece quando o tema é câmbio.
Para entender a divergência, é preciso recuar no tempo. Para os
ortodoxos, a grande crise atual tem como raiz mais profunda o crescimento
da despesa pública a um ritmo muito acima da expansão do PIB desde a
redemocratização. Oreiro não contesta esse diagnóstico, mas faz um
acréscimo. Segundo o economista, o tripé macroeconômico – o regime
introduzido em 1999 que combinava metas de inflação, câmbio flutuante e
expressivos superávits primários – “se mostrou historicamente incapaz de
lidar com dois problemas da economia brasileira, o crescimento da despesa
primária como proporção do PIB e a incapacidade de se manter a taxa de
câmbio num nível estável e competitivo no médio prazo”.
Assim, além dos problemas fiscais, a crise de hoje, para os novos
desenvolvimentistas, deve ser debitada ao fato de que, durante os bons anos
de Lula presidente na década passada, o governo deixou o real valorizar-se
demais. E com isso, foi-se embora a competitividade das manufaturas
brasileiras, levando a um processo de desindustrialização que inibiu
investimentos e estancou o crescimento econômico.
É complexo o argumento sobre o governo Lula “ter deixado o câmbio
se valorizar”. Afinal, a equipe econômica à época comprou dólares
maciçamente, taxou a entrada de capitais e o ex-ministro Guido Mantega
celebremente atacou a “guerra cambial” dos países ricos. Mas Oreiro explica
que esses instrumentos não bastam, pois é preciso reorientar toda a política
macroeconômica para trabalhar com uma “meta de câmbio real”
competitiva. Não se trata de câmbio fixo, pois a meta não é de uma cotação
nominal do dólar. A meta real é um parâmetro a ser mantido no médio prazo,
não um nível a ser obrigatoriamente perseguido a todo instante. “É um
câmbio administrado”, ele resume.
Fica mais claro quando o economista explica o que faria hoje. As
metas de inflação de 2016, 2017 e 2018 deveriam ser redefinidas para cima,
de forma a permitir uma convergência da inflação mais suave, que abrisse
espaço para uma queda mais rápida e intensa dos juros. Essa redução de
juros, por sua vez, diminuiria a diferença entre as baixas taxas internacionais
e as elevadas taxas domésticas, que atrai capitais e valoriza o real. A política
monetária levaria em conta não só o controle de inflação, mas também a meta
real de câmbio.
A política fiscal seria mais apertada quando a economia estivesse
crescendo, e mais relaxada quando houvesse desacelerações. Outra medida
seria um imposto de exportação sobre commodities como soja e minério de
ferro, com alíquotas variáveis dependendo do preço – de zero na baixa e
crescente a partir de certo nível.
“O que ocorre agora com esse câmbio abaixo de R$ 3,20 é que
voltamos a usar a âncora cambial, e pode estar indo por água abaixo todo o
ajuste macroeconômico do ano passado, que inclusive já está se refletindo
nos primeiros sinais de reação da indústria”, lamenta Oreiro.
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