ACTA COMPORTAMENTALIA Vol. 23, Núm. 2 pp. 167-183 Transtorno de Estresse Pós-Traumático e Terapia comportamental: um estudo de caso (Post-traumatic stress disorder and behavioral therapy: a case study) Vagner Angelo Garcia*1 & Alessandra Turini Bolsoni-Silva** Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem - Unesp/Bauru ** Departamento de Psicologia Unesp/Bauru, Programa de Pós-Graduação em Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem (Brasil) * RESUMO O presente artigo descreve o caso de uma paciente vítima de abuso sexual na infância que desenvolveu um quadro de Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT). Questões relacionadas a abuso sexual, características do TEPT e formas de tratamento são discutidas. A intervenção foi conduzida na perspectiva da Análise do Comportamento, tendo como foco as queixas da cliente relacionadas ao transtorno, bem como outras demandas, tais como relacionamento com a mãe e a irmã, dificuldades de estudo (faculdade) e aumento de peso. Procurou-se através da intervenção conscientizar a cliente sobre o transtorno e seu tratamento (Psicoeducação), promovendo autoconhecimento, habilidades sociais, refletindo sentimentos e em paralelo foi trabalhada a dificuldade de estudo e o aumento de peso. Como medidas avaliativas da intervenção (pré/ pós-teste) foram utilizados instrumentos para rastreamento de TEPT e comorbidades. Conclui-se que a intervenção foi efetiva para o desaparecimento dos sintomas característicos de TEPT, bem como para a promoção de repertórios relacionados à queixa da cliente. Palavras-chave: abuso sexual; transtorno de estresse pós-traumático; terapia comportamental. ABSTRACT This article describes the case of a victim of sexual abuse in childhood who developed Post-Traumatic Stress Disorder (PTSD). Issues related to sexual abuse, PTSD characteristics and forms of treatment are discussed. The intervention was conducted from the perspective of Behavior Analysis, focusing on the patient complaints related to the disorder, as well as other issues such as her relationships with her mother and sister, difficulties to study at college and weight gain. During the intervention the client was educated about the disorder and its treatment (psycho-education); self-awareness, social skills and reflections about feelings were promoted. The difficulties to study and weight gain were treated in parallel. As evaluative measures of intervention (pre/post-test) were used screening instruments and comorbid PTSD. It was concluded that the intervention was effective for the disappearance of the characteristic PTSD symptoms, as well to promote repertoires related to the patient complaints. Keywords: sexual abuse; post-traumatic stress disorder, behavioral therapy. 1) E-mail: [email protected] 168 VAGNER ANGELO GARCIA & ALESSANDRA TURINI BOLSONI-SILVA2015 O abuso sexual infantil pode causar danos tanto a curto quanto em longo prazo, incluindo psicopatologias mais tarde na vida adulta (Hornor, 2013). Ele é apontado pela literatura como fator preditivo para o desenvolvimento de transtornos de ansiedade, sintomas depressivos e agressivos, problemas quanto ao seu papel na sociedade e funcionamento sexual e sérias dificuldades em relacionamentos interpessoais (Maniglio, 2009; Hornor, 2013). Alguns fatores podem contribuir para o agravamento do caso e consequente desenvolvimento de traumas, como por exemplo, a proximidade com o agressor, o uso de violência, o tipo de abuso, sendo que a procura por ajuda especializada só ocorre quando esses traumas psicológicos e emocionais vierem a se agravar (Passarela, Mendes & Mari, 2010; Serafim, Saffi, Achá, & Barros, 2011; Hornor, 2013) Peredaa et al. (2009) analisaram 65 estudos de investigação em um total de 22 países com o objetivo de fazer uma mapeamento global para o abuso sexual e descobriu que cerca de 7,9% dos homens e 19,7% das mulheres no mundo sofreram abuso sexual antes da idade de 18 anos. Complementando esse dado, um estudo de Amstadter et al. (2008) apresentou uma taxa de 36% de desenvolvimento do Transtorno do Estresse Pós-Traumático (TEPT) para as vítimas de abuso sexual. O abuso sexual de crianças e adolescentes, na maioria das vezes, é praticado por alguém próximo a vítima (Serafim et al., 2011). Numa pesquisa com 205 crianças/adolescentes, vítimas de abuso sexual, Serafim et al. (2011) descobriram que os principais abusadores eram os pais (38%) ou padrastos (29%), sendo que muitas vezes a criança encontrava dificuldades para denunciar o abusador, o que contribui para que o abuso se prolongue por anos e as consequências sejam ainda mais graves. Sendo o Transtorno do Estresse Pós-Traumático (TEPT) um dos transtornos mais comuns em vítimas de abuso sexual, o próximo tópico aborda algumas características a ele relacionadas. TEPT: SINTOMAS E CARACTERÍSTICAS GERAIS O Transtorno do Estresse Pós-Traumático (TEPT) foi observado pela primeira vez em estudos envolvendo veteranos de guerra nos Estados Unidos, onde se caracterizava pela revivência de um evento extremamente traumático, acompanhada por sintomas de excitação aumentado e esquivas de estímulos associados com o trauma (APA, 2000). Em 1980, o TEPT foi classificado no Diagnostic Statistical Manual (DSM-III). Com ligeiras modificações foi mantido no DSM-III-R (1987), no DSM-IV (1994) e na Classificação Internacional de Doenças, CID-10 (1992), sempre classificado como um dos transtornos de ansiedade (Sbardelloto, Schaefer, Justo & Kristensen, 2011). Recentemente, com o lançamento do DSM-V (APA, 2013) houve duas mudanças importantes nos critérios diagnósticos: a retirada da exigência de que o evento traumático fosse vivenciado ou testemunhado pelo próprio indivíduo aceitando que o TEPT seja desenvolvido por quem soube que um evento traumático que aconteceu com um familiar próximo ou amigo próximo; e o outro é relacionado a necessidade de que o evento fosse vivenciado com intenso medo, impotência, ou horror, a justificativa é que tais características não apresentava diferenças quanto ao diagnóstico e evolução do caso (Araújo & Neto, 2014). São considerados eventos potencialmente traumáticos aqueles em que a pessoa experiencia, testemunha ou se defronta com situações de ameaça à vida ou à integridade física (de si ou de outrem). São exemplos dessas situações os acidentes naturais, automobilísticos, assaltos, sequestros, ameaça com arma, violência sexual, morte súbita e inesperada de parente ou amigo muito próximo (Figueira & Mendlowiczb, 2003; O’Connor, 2005; Pulcherio, Vernetti, Strey & Faller, 2008; McLean & Foa, 2011, Hornor, 2013). Os sintomas são categorizados em três esferas: I) Revivência do acontecimento traumático (em pesadelos ou mesmo durante o estado de vigília); II) Evitação sistemática dos estímulos associados ao trauma e III) Sintomas de humor ansioso: taquicardia, respiração curta, constrição precordial, “formigamentos”, parestesias, sudorese, extremidades frias ou também cefaleias, tonturas, “peso no estômago”, insônia e irritabilidade, explosividade, hipervigilância e sobressalto (Câmara Filho & Sougey, 2001; Ximenes, Oliveira & Assis, 2009; Habigzang, Borges, Dell’Aglio & Koller, 2010). Vol. 23, Núm. 2 TEPT E TERAPIA COMPORTAMENTAL169 Os sintomas do TEPT, em geral, iniciam-se nos primeiros três meses, porém pode ocorrer um lapso de meses ou mesmo anos após o trauma (Freitas et al., 2011). Freitas et al. (2011) relatam um caso que ocorreu 25 anos após o evento traumático. Nesse relato de caso, a cliente com 34 anos passou a apresentar os sintomas do TEPT após a exposição a um noticiário que relatava fatos semelhantes ao trauma vivenciado na infância. O próximo tópico discute possibilidades de intervenções para o TEPT. O TRATAMENTO PARA O TEPT Há diversas intervenções para o TEPT descritas na literatura, tais como Terapia Cognitivo-Comportamental (Walsh, 2002; O’Connor, 2005; Hinton et. al., 2011; Kar, 2011; McLean, & Foa, 2011; Cummings, Berkowitz & Scribano, 2012), Treino em Relaxamento (Knapp & Caminha, 2003; Bourne, 2005), Terapia de Exposição (Bourne, 2005; Foa et al., 2005; Rauch, Eftekhari & Ruzek, 2012), Terapia Cognitiva (Bourne, 2005), Treino em Habilidades Sociais (Walsh, 2002), Psicoeducação (Walsh, 2002; Passarela et al. 2010), Terapia em Grupo (Sloan, Bovin, & Schnurr, 2012). Wells (2010) propõe uma intervenção baseada na Terapia Metacognitiva que compreende três fases: a) conceitualização e socialização, em que o terapeuta expõe ao cliente que os sintomas que seguem ao trauma são fruto do mecanismo de adaptação para lidar com o trauma; b) analisar com o cliente as vantagens e desvantagens de se preocupar e ruminar e c) modificação atencional, onde o objetivo é que o cliente possa, sempre que se sentir ansioso, retornar a sua rotina de vida normal, dirigindo sua atenção para outros pontos, diferentes dele próprio e da ameaça. Esse tipo de intervenção é uma nova proposta dentro da perspectiva cognitiva (Wells, 2010), pois se apresenta como uma forma alternativa de não abordar exaustivamente o trauma. Segundo os autores a técnica pode ser muito útil em casos em que o cliente se recusa e/ou se esquiva de falar sobre o evento traumático em si. Na perspectiva da Análise do Comportamento, a intervenção descrita por Wells (2010) se assemelha a psicoeducação e análise funcional. No primeiro momento, o terapeuta deve informar ao paciente as características do transtorno e seu desenvolvimento. O segundo momento, quando são analisadas vantagens e desvantagens relacionadas à preocupações/ruminações, é semelhante ao procedimento de análise funcional, onde o terapeuta estimula o cliente a relatar fatos, condições antecedentes e consequentes, favorecendo prever consequências e tomar decisões. O que Wells (2010) chama de modificação atencional poderia ser entendido como orientar o cliente a emitir operantes alternativos de forma a produzir reforçadores positivos e reduzir aversivos, no caso a ansiedade e pensamentos desagradáveis (reforçador negativo), como destacado por Skinner (1974) ao descrever estratégias de autocontrole e a importância de usar/emitir comportamento concorrente. A Psicoeducação (Walsh, 2002; Martins, 2009; Passarela et al. 2010) consiste em esclarecer ao paciente sobre as características do TEPT, levando o cliente a compreender que os sintomas que apresenta não são diferentes dos apresentados por pessoas que foram expostas a estresses semelhantes, proporcionando um ambiente em que o cliente se sinta seguro, sabendo que o terapeuta compreende suas dificuldades, contribuindo para a eficácia da terapia. Na perspectiva da abordagem comportamental ao TEPT, o condicionamento clássico explica o emparelhamento que ocorre na associação dos sintomas com o trauma, onde as vítimas “... reagem ao evento traumático (estímulo incondicionado) com medo e ansiedade (resposta incondicionada) e passam a exibir a mesma resposta, agora condicionada, às dicas (estímulos condicionados) que foram pareados com a situação estressora” (Calais, Baptista & Dias, 2002, p.353). Dessa forma, seria esperada a extinção das respostas condicionadas com o passar do tempo, caso não houvesse nova exposição ao evento traumático. Porém, não é isso que ocorre e é possível buscar explicação através do modelo do condicionamento operante proposto por Skinner, onde as respostas de evitação/esquiva são aprendidas e reforçadas negativamente, tornando-se resistente a extinção (Knapp & Caminha, 2003). 170 VAGNER ANGELO GARCIA & ALESSANDRA TURINI BOLSONI-SILVA2015 A intervenção comportamental tem utilizado a análise funcional para definir objetivos comportamentais a serem atingidos durante o processo terapêutico (Calais & Bolsoni-Silva, 2008). Mais que um recurso, a análise funcional permite a avaliação, obtenção de informações e planejamento da intervenção, além de autoconhecimento (Sturmey, 1996; Costa & Marinho, 2002). Com ela é possível levantar hipóteses sobre como e porque ocorre o comportamento-problema do cliente (Calais & Bolsoni-Silva, 2008), e consequentemente o cliente passa a ter mais conhecimento sobre si, passando a identificar o conjunto complexo de variáveis que estão envolvidas no problema-queixa. Outro mecanismo utilizado pelo terapeuta comportamental que auxilia na construção do autoconhecimento pelo cliente é o treino discriminativo, onde o terapeuta busca promover um responder diferencial perante aspectos do ambiente (Borges & Cassas, 2011). Por exemplo, quando o cliente apresenta-se ansioso, ele pode optar por ficar ruminando (A), o que pode trazer algum reforçador (negativo no caso de conseguir encontrar alguma solução para o problema), mas pode acabar mantendo a ansiedade (punição). Por outro lado, o cliente pode sair e ir ao cinema (B), o que vai produzir reforçadores positivos (alegria) e reduzir aversivos (pensamentos desagradáveis e ansiedade). Nesse caso, o papel do terapeuta, ao analisar as contingências, consiste em aumentar o valor reforçador das consequências que mantém B (através de contingências verbais) e minimizar o valor aversivo das consequências de A. Dentro dessa perspectiva, no tratamento do TEPT, o terapeuta pode propor uma intervenção a partir das demandas do cliente, tratando de seus problemas de acordo com as dificuldades apresentadas, mas buscando compreender a ecologia comportamental (Goldiamond, 2002/1974), identificando classes de ações e classes de estímulos, para então, promover comportamentos funcionalmente equivalentes, de forma a obter, com operantes alternativos, reforçadores que mantém o(s) problema(s) relatado(s). Cloitre et al. (2002) apontam que o TEPT decorrente de abuso sexual na infância, quando apresentado por mulheres na idade adulta, pode exigir um tratamento mais complexo. A justificativa é que essas mulheres podem ter se desenvolvido com déficits de relacionamento interpessoal, como sequelas do abuso sofrido. Mulheres, vítimas de abuso sexual na infância, relataram menos satisfação com namoro e casamento, dificuldades de relacionamento com os pais, problemas de relacionamento no trabalho, maior isolamento social do que as mulheres sem história de abuso (Lamoureux, Palmieri, Jackson, & Hobfoll, 2012). A frequência e a extensão das dificuldades interpessoais, bem como o seu impacto na vida dessas pessoas indicam fortemente a necessidade de intervenções específicas a esses problemas. Para esses problemas de relacionamento interpessoal, o campo do Treinamento de Habilidades Sociais (THS) pode contribuir. Os comportamentos emitidos nas interações sociais são descritos em comportamento habilidoso, não habilidoso passivo e não habilidoso ativo (Del Prette & Del Prette, 2010). Do ponto de vista da Análise do Comportamento todo comportamento se mantém porque produz reforçadores, então, ainda que os comportamentos não habilidosos gerem punições e sentimentos negativos associados, eles se mantêm porque produzem reforçadores, ainda que negativos (Bolsoni-Silva & Carrara, 2010). No caso de uma pessoa que passou por uma experiência traumática e que passou a apresentar sintomas de TEPT, não raro pode-se observar a emissão de comportamentos de isolamento social, o que, somado a um histórico de vida com dificuldades no relacionamento interpessoal, devido a excesso de comportamento não habilidoso, maior poderá ser a dificuldade de interagir com pessoas, sair de casa, ou seja, o indivíduo terá mais dificuldade em emitir operantes que poderiam produzir reforçadores que concorreriam com os pensamentos desagradáveis e ansiedade. Justifica-se, assim, o Treinamento em Habilidades Sociais (THS) na intervenção ao TEPT, pois se a pessoa tiver acesso a reforçadores por meio de algumas classes de respostas (as respostas habilidosas), poder-se-á diminuir a probabilidade de emissão de respostas controladas por reforçamento negativo. Ehlers et al. (2010), em revisão de diversos estudos de meta-análise sobre a eficácia de procedimentos de intervenção para o TEPT, apontam que as diretrizes de tratamento internacionais recomendadas ao TEPT, são aquelas que envolvem uma intervenção com foco no trauma como tratamento de primeira linha. Vol. 23, Núm. 2 TEPT E TERAPIA COMPORTAMENTAL171 Os autores também apontam que para avançar na compreensão do tratamento ideal para TEPT, deve ocorrer maior investigação sobre os mecanismos ativos de mudança terapêutica, incluindo elementos do processo terapêutico. Por exemplo, enquanto o estado atual da literatura de TEPT sugere que abordar diretamente memórias traumáticas em seu tratamento tem uma vantagem sobre os fatores não específicos, novas pesquisas com medidas de processo podem contribuir para a descoberta de outros pontos de intervenção. McDonagh et al. (2005) realizaram um estudo comparativo entre a terapia cognitivo-comportamental e a terapia de resolução de problemas com mulheres diagnosticadas com TEPT decorrente de abuso sexual na infância. Os participantes foram encaminhados aleatoriamente, e em igual número, para cada uma das terapias e para uma lista de espera. O tratamento consistia de 14 sessões com duas horas de duração média para ambas as terapias. Na abordagem cognitivo-comportamental, o procedimento consistia em exposição ao trauma, reestruturação cognitiva, psicoeducação e realização de tarefas de casa. Na perspectiva da terapia de resolução de problemas, a intervenção não foi focada no trauma, mas sim em ajudar o cliente a reconhecer o impacto de sua história de trauma em seu padrão de relacionamentos e ensinando-lhe uma abordagem sistemática para a resolução de problemas, refletindo sobre os efeitos comuns de traumas na infância. Os resultados demonstram que ambas as terapias apresentaram remissão nos sintomas de TEPT, entretanto, a terapia cognitivo-comportamental evidenciou maior efetividade (maior proporção na redução de sintomas) enquanto que a terapia de resolução de problemas apresentou maior adesão ao tratamento. Outra intervenção ao TEPT em mulheres que sofreram abuso sexual na infância foi descrita por Cloitre et al. (2002), onde 68 mulheres foram submetidas a uma intervenção em terapia cognitivo-comportamental. Cloitre et al. (2002) aplicaram um procedimento em duas fases, onde primeiramente foram tratadas as dificuldades no relacionamento interpessoal e num segundo momento houve a terapia de exposição ao trauma e a reestruturação cognitiva. Os resultados apontam uma melhora significativa nos sintomas do TEPT, bem como maior adesão ao tratamento. A questão da adesão ao tratamento discutida nos dois últimos estudos, bem como seus resultados enfatizam a complexidade do TEPT quando de desenvolvimento tardio em pessoas vítimas de abuso sexual na infância. A maior aderência descrita nos estudos de McDonagh et al. (2005) com o grupo que passou por terapia de resolução de problemas, e por Cloitre et al. (2002) com o treinamento em habilidades sociais, evidenciam a necessidade de se trabalhar as habilidades sociais desses clientes com TEPT de desenvolvimento tardio, como forma de garantir a permanência desses pacientes em terapia, visto a dificuldade que apresentam nessa área. Martins (2009) aplicou um protocolo de tratamento numa amostra de pacientes com TEPT resistentes à medicação avaliando a eficácia da TCC ao ser adicionado ao tratamento medicamentoso. O protocolo inclui técnicas de reestruturação cognitiva, exposição imaginária, exposição in vivo, psicoeducação, treino de respiração e relaxamento, administradas ao longo de quatro meses, num total de 16 sessões com terapeuta principal e 45 sessões com co-terapeuta. A eficácia do protocolo foi avaliada pelos escores (pré e pós-teste), dos questionários: Inventário para o TEPT - Civil (PCL-C), o Inventário Beck de Depressão (BDI) e Inventário Beck de Ansiedade (BAI). Os sintomas do TEPT apresentaram melhora significativa em quatro dos cinco pacientes do grupo de intervenção, o que não ocorreu no grupo controle, sugerindo que o programa de tratamento mostrou-se eficaz na amostra estudada. Como descrito anteriormente, o desenvolvimento tardio do TEPT em mulheres vitimas de abuso sexual na infância, pode exigir do terapeuta uma intervenção que enfoque as diversas queixas em face da complexidade que o transtorno pode acarretar nesta fase. Há poucos estudos na literatura, sendo que não foi encontrado nenhum estudo na perspectiva da Análise do Comportamento, que apresentaram intervenções com esta população proporcionando um treinamento de habilidades sociais, com o objetivo de melhorar o relacionamento interpessoal destes clientes que apresentavam muitas dificuldades, além dos sintomas característicos do TEPT. Assim, o objetivo do presente trabalho consiste em descrever um estudo de caso de 172 VAGNER ANGELO GARCIA & ALESSANDRA TURINI BOLSONI-SILVA2015 uma cliente com TEPT de desenvolvimento tardio devido a abuso sexual, que participou de uma intervenção analítico comportamental, incluindo treino de habilidades sociais. MÉTODO Local, participante e aspectos éticos Este trabalho foi desenvolvido em uma clínica-escola de uma universidade pública do interior do estado de Estado de São Paulo. Taine (nome fictício) de 25 anos, estudante universitária, participou de uma pesquisa que avaliava ansiedade social em universitários, realizada sob supervisão da coautora do presente texto. Após responderem a pesquisa, os participantes foram perguntados se gostariam de participar de intervenção psicoterapêutica. Apesar de não preencher os critérios para Ansiedade Social, a cliente relatou interesse em receber atendimentos psicológicos devido a problemas pessoais: dificuldades na faculdade e no relacionamento com a namorada. Ao iniciar a intervenção a cliente autorizou por meio de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) a utilização das sessões para fins de pesquisa, respeitando os aspectos éticos conforme resolução do CNS 196/96 sendo a pesquisa autorizada pelo Comitê de Ética da universidade a qual estava vinculado. Histórico dos atendimentos A cliente passou por dois períodos de atendimento. No primeiro deles, em 2010, ela frequentou 18 sessões, sendo atendida por uma estagiária do curso de psicologia e, no segundo período, em 2011, foram conduzidas 21 sessões, em trabalho desenvolvido por outro estagiário, um ano após o primeiro atendimento. O caso da cliente sempre esteve vinculado ao Estágio em Terapia Comportamental, sendo supervisionado pela coautora do presente trabalho. Instrumentos Como medida de pré-teste do primeiro atendimento, a cliente foi avaliada em relação ao repertório de habilidades sociais através do IHS-DEL PRETTE (Del Prette & Del Prette, 2001). Outra medida refere-se à aplicação de um questionário validado (instrumento foi cedido pelas autoras a pedido) que avalia habilidades sociais e dificuldades de interação social em diferentes contextos, obtendo informações que favorecem descrever análises funcionais (Bolsoni-Silva & Loureiro, no prelo). No início do segundo período de atendimento (terceira sessão), foi aplicada a Escala PCL-C, conhecida como PTSD Checklist – Civilian Version (PCL-C) desenvolvida por Weathers e cols. (1993) e traduzida e validada no Brasil por Bringhenti, Luft e Oliveira (2010). A escala é utilizada para o rastreamento do Transtorno do Estresse Pós-Traumático (TEPT). Como a literatura da área aponta a existência de comorbidades, e cogitou-se essa hipótese, também foram aplicadas as Escalas Beck – BDI e BAI (Cunha, 2001), para avaliar sintomas de depressão e de ansiedade. Todos os instrumentos citados foram reaplicados ao final do segundo período de atendimento (vigésima sessão, quatro meses após o pré-teste). Tratamento e análise dos dados Nos dois períodos de atendimento, os dados coletados com os instrumentos, bem como aqueles obtidos nas primeiras sessões através do relato da cliente foram organizados na forma de um estudo de caso. Esse estudo Vol. 23, Núm. 2 TEPT E TERAPIA COMPORTAMENTAL173 foi estruturado com as informações sobre a história de vida, déficits, excessos e reservas comportamentais, análise funcional e objetivos. Assim, foi possível selecionar de modo apropriado e, de comum acordo com a cliente, os objetivos a serem trabalhados nas sessões. Nas sessões foram utilizadas diversas técnicas comportamentais descritas na literatura (Calais & Bolsoni-Silva, 2008). A Tabela 1 apresenta a frequência com que cada técnica foi utilizada, sendo que está dividida cronologicamente em cinco períodos de quatro sessões. Essa divisão em períodos iguais busca evidenciar como as técnicas foram utilizadas em cada momento da intervenção, possibilitando ao leitor uma maior compreensão do seu uso e em quais momentos ocorreu. O uso de determinada técnica era condizente ao relato que a cliente trazia para cada sessão, levando-se em consideração os objetivos propostos (Tabela 2): treino discriminativo, ampliar respostas funcionalmente equivalentes (treino de habilidades sociais), promover autoconhecimento, refletir sentimentos e psicoeducação referente a aspectos do TEPT. Observando as Tabelas 1 e 2 o leitor pode relacionar quais técnicas eram aplicadas de acordo com cada objetivo proposto. Tabela 1 Técnicas utilizadas durante as sessões: 2º Atendimento Técnicas Acolhimento Elogio Ensaio Comportamental Fazer perguntas e/ou Descrever relações funcionais. Feedback (positivo e negativo) Instrução Modelação Parafrasear Reforçamento/Modelagem Relatar eventos/aspectos relacionados ao abuso (trauma) 01-04 4 3 0 24 1 4 0 2 4 10 05-08 1 7 0 26 5 6 1 3 6 4 Sessões 09-12 5 9 0 24 3 1 0 2 8 4 13-16 1 9 1 37 0 4 0 7 8 3 17-20 3 4 0 30 2 2 1 0 5 3 Tabela 2 Objetivos trabalhados durante as sessões (2º Atendimento) Objetivos Treino Discriminativo Treino de Habilidades Sociais Autoconhecimento Psicoeducação relacionado ao TEPT Refletir sentimentos 01-04 3 2 6 2 15 05-08 5 6 8 5 17 Sessões 09-12 11 4 14 4 9 13-16 5 5 16 1 18 17-20 1 3 16 0 13 174 VAGNER ANGELO GARCIA & ALESSANDRA TURINI BOLSONI-SILVA2015 RESULTADOS E DISCUSSÃO A seção de resultados apresenta dados sucintos da primeira intervenção realizada, bem como resultados gerais obtidos. Em seguida são apresentados os resultados condizentes ao segundo atendimento, foco deste trabalho, quando após o diagnóstico de TEPT, foi proposto para a cliente uma intervenção com o objetivo de minimizar/eliminar os sintomas do transtorno, trabalhando aspectos do relacionamento com a mãe e a irmã, que ocasionavam dificuldades para a cliente, e que a literatura aponta como característicos do TEPT em vitimas de abuso sexual na infância (Cloitre et al. 2002; Lamoureux et al., 2012). Outros objetivos da intervenção referem-se a queixas secundárias, como aumento de peso, dificuldades em estudar e fazer provas discursivas na faculdade. 1. Primeira intervenção: informações sobre o caso e resultados alcançados Nas primeiras sessões, conheceu-se a história de vida da cliente e buscou-se ouvir e refletir sobre o trauma, algo que a cliente se esquivava bastante. A cliente apresentava um padrão de comportamento não-habilidoso ativo (agressivo) e não-habilidoso passivo (inassertivo). No primeiro ano de atendimento sua queixa foi relacionada à sua relação com a família, relatando que foi vítima de abuso sexual, sendo molestada pelo padrasto durante a infância e adolescência por oito anos (entre os sete e quinze anos). Serafim et al. (2011) apontam que o abuso sexual praticado por pais/padrasto é um dos mais frequentes descritos na literatura da área, e que o fato de ser alguém da própria convivência da criança é um fator que dificulta para ela pedir ajuda, prolongando-se a situação por muitos anos, como evidenciado neste caso. Outras queixas relacionadas pela cliente, nesse primeiro atendimento, diziam respeito à dificuldade em continuar o curso universitário (a cliente estava com medo de ter que abandonar o curso), e ao seu relacionamento amoroso, pois Taine morava com a namorada e ocorriam muitas brigas. A história de vida relatada por Taine foi conturbada. Sua mãe engravidou do namorado quando morava na casa da irmã na capital do estado. Após descobrir que era traída pelo namorado (ele era casado e tinha outra família) a mãe de Taine a deixou na casa da irmã, vindo para o interior do estado, só voltando para buscá-la quando ela já estava com cinco anos. Nesse período, a mãe da cliente estava morando com outro companheiro, e Taine passou a viver com a mãe e o padrasto. Morando no interior com a mãe e o padrasto, a cliente conta que quando tinha sete anos passou a sofrer abuso sexual, praticado pelo padrasto, que perduraram até os quinze anos. A cliente não havia contado a ninguém sobre o abuso e quando o fez, foi por temer que o padrasto repetisse o ato com sua irmã mais nova. Taine relata que nessa época não se sentiu acolhida pela família, o que favoreceu sua decisão de sair de casa aos dezesseis anos, indo morar em outro estado, com o consentimento da mãe, em uma instituição educativa de cunho religioso. Após voltar, Taine prestou e passou no vestibular de uma universidade pública em cidade distante da família. Contudo, por circunstâncias adversas e muitas dificuldades a cliente teve que abandonar o curso. Taine realizou novamente o vestibular para o mesmo curso (mas outra universidade/cidade) aonde veio a conhecer a atual namorada, com a qual mora há três anos. Dessa forma, a cliente, ao procurar pelo primeiro atendimento (após participar da pesquisa), estava no terceiro ano da faculdade, prestes a abandonar pela segunda vez o curso (pois a cliente já havia trancado por um semestre) e relatou estar com muitas dificuldades tanto na vida pessoal (dificuldades de relacionamento com a namorada, mãe e irmã) quanto na vida acadêmica (baixo aproveitamento, com sério comprometimento do curso, pensando em abandonar). Nos instrumentos aplicados como medida de pré-teste (durante o estudo já mencionado) Taine obteve um percentil de 96 no IHS (Del Prette e Del Prette, 2001), demonstrando um repertório altamente elaborado em habilidades sociais, com resultados acima da média para alguns itens. Na aplicação do questionário que avalia habilidades sociais e dificuldades de interação social com diferentes interlocutores do universitário Vol. 23, Núm. 2 TEPT E TERAPIA COMPORTAMENTAL175 (Bolsoni-Silva & Loureiro, no prelo) a cliente não apresentou classificação clínica para potencialidades (expressão de sentimentos, opiniões, lidar com críticas, contexto, comportamento habilidoso, consequência positiva), mas teve um escore elevado, classificado em clínico, para dificuldades de falar em público, comportamento não habilidoso e consequência negativa. Após o relato de suas dificuldades, queixas e história, foram acordadas com a cliente os objetivos para a terapia. A cliente optou por trabalhar o relacionamento com a namorada, com a mãe e a irmã e as dificuldades em relação à universidade, em detrimento de refletir sobre o trauma, pois não o julgava como algo que prejudicasse a sua vida nesse momento. Essa esquiva do tema recorrente ao trauma é descrito na literatura relacionada ao TEPT e abuso sexual, sendo esse um dos fatores que justificam a intervenção proposta por Wells (2010) em que abordar exaustivamente o trauma pode não ser benéfico para o cliente. Sendo assim, foi desenvolvido um Treinamento em Habilidades Sociais - THS na perspectiva analítico comportamental, com foco nas interações com a namorada, mãe e irmã, bem como nos contextos da vida acadêmica e profissional. Utilizou-se de um procedimento semi-estruturado para universitários, onde de acordo com a problemática da cliente, eram trabalhadas suas dificuldades, utilizando-se de diversas técnicas (análise funcional, reforçamento diferencial, modelagem, role-play, tarefas de casa, etc.). Como resultados alcançados (Tabela 3), a cliente permaneceu na universidade, conseguindo um emprego e passou a sentir-se valorizada, sendo que utilizará as informações e dados do seu trabalho remunerado para a monografia final de seu curso. Em relação ao relacionamento com a namorada/esposa, as brigas diminuíram próximas a zero. A cliente desenvolveu e aprimorou repertório de resolver problemas, expressar afeto, sentimentos negativos, opiniões, além de discriminar as situações em que apresentava padrão de comportamento não-habilidoso ativo (agressivo) e inassertivo, exercitando o autocontrole e a assertividade. Contudo, ao final do primeiro ano de atendimento, o relacionamento com a mãe e a irmã ainda se mostrou conturbado e difícil para a cliente, sendo assim, foi proposto a Taine que continuasse na terapia no ano seguinte, após o recesso, com outro estagiário. Tabela 3 Descrição de queixas, superações/aquisições e dificuldades (1º e 2º Atendimentos) Período Queixas Superações/ Aquisições 1º Melhora no relacionamento com a namorada e a sogra Superação das dificuldades e motivação para continuar o curso, com planejamento de metas Padrão de comportamento habilidoso (assertivo) Diminuição gradual até total de sonhos, pesadelos e flashbacks relacionados ao abuso Acompanhamento com nutricionista e perda de peso Sem preocupações referentes ao relacionamento com a mãe e a irmã Autoconhecimento sobre formas de estudar e influência do ambiente 2º Relacionamento com a namorada e família (mãe e irmã) Dificuldades em continuar no curso, desejo de abandonar Padrão de comportamento nãohabilidoso ativo (agressivo) Vítima de abuso sexual na infância Sonhos, pesadelos relacionados ao abuso Flashbacks relacionados ao abuso Aumento excessivo de peso Relacionamento com a família (mãe/irmã) Dificuldades em estudar, em fazer avaliações Manutenção dificuldades Relacionamento com a família (mãe/irmã) --------- 176 VAGNER ANGELO GARCIA & ALESSANDRA TURINI BOLSONI-SILVA2015 2. Segunda intervenção: TEPT e queixas secundárias Seis meses após a primeira intervenção, a cliente foi novamente contactada e mostrou interesse em continuar com a terapia. As primeiras sessões foram destinadas a estabelecer um vínculo entre o novo terapeuta e a cliente, bem como a avaliação do caso, além da discussão dos objetivos para o período. Assim, Taíne relatou novamente sua história e foram discutidos os objetivos do atendimento anterior e diante da constatação da manutenção dos bons resultados alcançados, referentes ao relacionamento com a namorada, a universidade e ao trabalho (ver Tabela 3), cogitou-se continuar a promoção de melhores interações com a mãe e com a irmã. Outros objetivos discutidos e acordados referiram-se a uma dificuldade da cliente em realizar provas discursivas na faculdade e a um aumento de peso, onde ela relata que engordou 23 quilos em três anos. Além dessas queixas, verificou-se que a cliente apresentava alguns sintomas que são característicos do Transtorno do Estresse Pós-Traumático (TEPT), como pensamentos perturbadores (flashbacks) relacionados ao abuso sexual, bem como sonhos angustiantes e aflitivos (Câmara Filho & Sougey, 2001; Ximenes et al., 2009; Habigzang et al., 2010). Esses sintomas apareceram após Taine se deparar na escola onde trabalhava, com uma criança com sinais de abuso sexual. O desencadeamento do TEPT após a exposição a eventos semelhantes ao trauma já havia sido apontado em outros estudos (Freitas et al., 2011). Para avaliar a possibilidade acima levantada, bem como comorbidades, foram aplicados os instrumentos descritos no método, como pré-teste da segunda intervenção: PCL-C, BAI e BDI. Os resultados demonstram que Taine preencheu os critérios para o TEPT, tanto na pontuação da escala (PCL-C), com 70 pontos, quanto nos critérios do DSM-IV (APA, 2000). Em relação à depressão, a cliente não preencheu os critérios. Em relação a ansiedade, apresentou ansiedade leve, o que poderia estar influenciando também o aumento de peso. Assim, foi proposta uma intervenção sobre o TEPT, com o objetivo de diminuir/eliminar os sentimentos/comportamentos relacionados ao transtorno. Para esse aspecto, o tratamento proposto, de acordo com a abordagem comportamental, seguiu procedimentos que promoveram a análise funcional (Calais & Bolsoni-Silva, 2008), a psicoeducação quanto ao TEPT (Passarela et al.; Martins, 2009; Wells, 2010), o treino de habilidades sociais (referencia suprimida para evitar identificação dos autores) quanto às interações sociais (mãe e irmã, associadas ao trauma) bem como o treino discriminativo, com o objetivo de possibilitar a cliente responder de maneira operante a outros estímulos de forma a produzir reforçadores. O diagnóstico do TEPT foi realizado na sessão 3, sendo que na sessão seguinte a cliente foi informada, e recebeu explicações sobre o transtorno. Foi exposto para a cliente que os sintomas que se seguiam ao estresse eram normais e faziam parte do mecanismo de adaptação para lidar com o trauma (Wells, 2010). Diante disso, sessão a sessão, o terapeuta foi explicando para a cliente sobre as características do TEPT, realizando a Psicoeducação (McDonagh et al. 2005; Martins, 2009; Passarela et al. 2010; Wells, 2010), e através dessa reflexão, era solicitado para a cliente pensar em alternativas, promovendo análises das situações que traziam desconforto, como por exemplo, a mudança de foco quando os pensamentos, flashbacks relacionados ao trauma apareciam (treino discriminativo e proposição de novos operantes). É importante ressaltar que no primeiro ano de atendimento havia sido proposto à cliente falar sobre o trauma, buscando quebrar o pareamento, contudo Taine se recusou, e como ela não apresentava outros sintomas do TEPT (sonhos, flashbacks, pensamentos angustiantes), optou-se por outros objetivos (relacionamento com a namorada e vida acadêmica). Nesse segundo atendimento, apesar da cliente estar disposta, optou-se por seguir o caminho proposto por Wells (2010) que afirmava que falar recorrentemente sobre o evento em si, poderia ser aversivo e nem sempre necessário. Dessa forma, o caminho de intervenção adotado se propôs a não abordar o trauma em si, uma vez que o transtorno se desenvolveu muitos anos após o abuso (desenvolvimento tardio), e sim realizar uma discussão do impacto da sua história de trauma em seu padrão de relacionamento que também é apontado como eficaz pela literatura (McDonagh et al., 2005). Vol. 23, Núm. 2 TEPT E TERAPIA COMPORTAMENTAL177 Taine relatava sonhos/pesadelos que lhe eram perturbadores. Nas sessões esses sonhos eram comentados e procurava-se refletir, discutir sobre seus conteúdos, procurando fazer relações funcionais com sua história pregressa e atual (Objetivo: autoconhecimento/psicoeducação; Técnicas: fazer perguntas/descrever relações funcionais, parafrasear – Tabelas 1 e 2). Tais sonhos iniciaram-se, como já informado, após a cliente descobrir, a partir de evidências físicas e de comportamentos, que uma menina do projeto em que trabalhava sofreu abuso sexual por parte de seu pai. O aparecimento dos sintomas do TEPT após a exposição da cliente perante esse fato corrobora com a literatura que diz que eventos semelhantes podem desencadear a reexperiência do trauma e desencadeamento do transtorno (Freitas et al., 2011). Durante as sessões, procurava-se refletir com a cliente sobre aspectos desencadeados pelo trauma (Knapp & Caminha, 2003). Taine culpava a mãe por não a ter acolhido quando soube do abuso, bem como de ainda ter continuado casada com o padrasto, mesmo sabendo tudo que ele lhe fez. Nesse sentido, refletiuse com a cliente sobre essa culpa que ela direcionava para a mãe, relembrando a história e as dificuldades vivenciadas por ela (mãe) e discutindo estes aspectos com as tentativas que a mãe fazia para se aproximar, mesmo que a cliente as julgasse de forma inadequada ou insatisfatória (Objetivo: Refletir sentimentos/autoconhecimento; Técnica: Fazer perguntas/parafrasear – Tabelas 1 e 2). Essas reflexões objetivavam intervir tanto nos sintomas do TEPT quanto no relacionamento com a mãe, pois isto estava diretamente associado ao abuso e ao trauma desenvolvido. O fragmento seguinte relata como era conturbado o relacionamento com a mãe e a irmã, pois a cliente dizia que “eu não sinto vontade de vê-la e não tenho saudades, e não queria que fosse assim... Eu tenho muito mais contato, e bom relacionamento com minha sogra.” (sessão 1). Essa dificuldade de relacionamento com e mãe e com a irmã é apontada pela literatura como comum a mulheres vitimas de abuso sexual durante a infância e que desenvolveram TEPT na vida adulta, sendo de fundamental importância a discussão de aspectos deste relacionamento como parte da própria intervenção para o TEPT (Cloitre et al. 2002; Horonor, 2002; Maniglio, 2009; Lamoureux et al., 2012; Hornor, 2013). Assim, a cada sessão que a cliente relatava situações do passado, que em sua opinião demonstravam abandono e/ou desinteresse da mãe em relação ao seu caso, o terapeuta fazia perguntas para a cliente, objetivando descrever relações funcionais, bem como parafraseava o que ela dizia, questionava, fazendo com que a cliente refletisse (Tabelas 1 e 2). Essa reflexão de sentimentos objetivava levar a cliente se colocar no lugar da mãe, entender suas decisões e atitudes. Como parte desse processo, Taíne relatou as dificuldades que a mãe teve na vida, procurando entender algumas situações, como por exemplo, continuar com o marido após o conhecimento do abuso, outra filha para criar, situação financeira, questões religiosas, etc. Com isso buscou-se levar a cliente a uma compreensão das atitudes da mãe, refletindo e entendendo ao invés de culpando e acusando. Também foi discutido junto com Taine sobre comportamentos da mãe que denotavam cuidados e apoio para com ela, por exemplo, oferecer mantimentos, oferecer uma casa para acolhê-la quando saiu de casa, visitá-la, ligar para saber como estava. Inicialmente, a cliente aparentava não aceitar o diagnóstico de TEPT, pois apenas ouvia o que o terapeuta dizia sobre o transtorno (psicoeducação), mas não fazia muitas reflexões, sendo mais passiva em relação à sua aceitação. Contudo essa passividade se relacionava apenas ao aceitar e discutir sobre o diagnóstico, pois em relação aos sonhos/pesadelos e pensamentos aflitivos, a cliente se mostrou muito sensível as instruções e sempre procurou colocar em prática as sugestões e instruções de manejo recebidas no que se referia ao treino discriminativo e emissão de novos operantes. Essa “não-aceitação” do diagnóstico perdurou até a nona sessão, onde na décima a cliente relatou alguns acontecimentos que foram chaves para o processo terapêutico. Primeiramente, a cliente aceitou sua condição face ao TEPT. Um evento que demonstra tal fato foi Taine procurar por informações na internet, sem que tenha havido a sugestão do terapeuta, vindo a discutilas com estagiário na sessão 10. Taine encontrou relatos na internet sobre abuso sexual e histórias de abuso 178 VAGNER ANGELO GARCIA & ALESSANDRA TURINI BOLSONI-SILVA2015 semelhantes à dela, e o estagiário teve o cuidado de discuti-las com a cliente, informando sobre os sintomas e natureza de tais acontecimentos. Esse movimento da cliente em procurar informações (ainda que na internet) promoveu mudanças em sua forma de encarar sua situação, saindo da passividade inicial frente ao diagnóstico. Outro ganho apresentado foi em relação ao relacionamento com a mãe. A cliente após aceitar o diagnóstico, procurou sensibilizar sua mãe frente às suas dificuldades e, de maneira assertiva, expôs para a mãe o que lhe aconteceu, o porquê do relacionamento conflituoso entre elas, relacionando o trauma com as circunstâncias atuais. Dessa forma, mobilizou a mãe para auxiliá-la no tratamento, pois sua mãe tinha comportamentos que lhe causavam sofrimento e remetiam ao seu trauma, como por exemplo, falar do abusador na presença da cliente. Após essa conversa, a mãe e a irmã de Taine vieram visitá-la, sendo que sua mãe se mostrou sensível com o processo terapêutico e passou a acatar algumas solicitações da filha. Assim, o comportamento de Taine produziu consequências esperadas, o que foi discutido na sessão, com o objetivo de fortalecer esse comportamento da cliente, promovendo assertividade no relacionamento com a mãe e refletindo sentimentos (Objetivos: habilidades sociais/discriminação/ autoconhecimento/refletir sentimentos; Técnicas: elogio/ feedback/reforçamento - Tabela 1 e 2). Esses avanços possibilitam visualizar como a intervenção em habilidades sociais e resolução de problemas permitiu a melhora no relacionamento com a mãe e a irmã, confirmando os dados apresentados por Cloitre et al. (2002) que apontava como extremamente necessário trabalhar as dificuldades de relacionamento que a pessoa com TEPT vitima de abuso sexual pode apresentar. Outro ponto de realce, é que a descrição pormenorizada da intervenção, além de permitir a visualização de como transcorreu o processo terapêutico, contribui para a lacuna apontada por Ehlers et al. (2010) sobre o déficit em pesquisas que descrevam a intervenção sobre o TEPT com desenvolvimento tardio, em vitimas de abuso sexual. Em relação aos pensamentos relacionados ao trauma, lembranças (flashbacks do passado), devido à discussão e análises propostas a partir do relato da cliente, eles diminuíram de frequência, vindo a cessarem por completo (sessão 8). A partir da décima sessão, os sonhos/pesadelos também diminuíram de frequência e ao término dos atendimentos a cliente não apresentava mais relatos. Como discutido por McDonagh et al. (2005), os dados aqui apresentados, evidenciam que uma intervenção não precisa focar essencialmente o trauma, sobretudo em TEPT de desenvolvimento tardio, mas sim ajudar o cliente a reconhecer o impacto de sua história de trauma em seu padrão de relacionamentos e ensinando-lhe alternativas para a resolução de problemas (habilidades sociais), refletindo sobre os efeitos comuns de traumas na infância. No pós-teste, a reaplicação da Escala PCL-C (Weathers e cols., 1993) ao final dos atendimentos, evidenciou que Taine não preenchia mais os critérios para TEPT, obtendo apenas 14 pontos, o que também ficou evidenciado em relação ao DSM-IV (APA, 2000), em que a cliente não mais se enquadrava nos critérios diagnósticos. No pós-teste, a cliente também respondeu ao IHS (Del Prette e Del Prette, 2001) e ao Questionário de Habilidades Sociais e Contextos (Bolsoni-Silva & Loureiro, no prelo). Com relação ao primeiro instrumento, a cliente atingiu 100%, melhorando ainda mais seu repertório em habilidades sociais, com todos os fatores acima da média populacional. Em relação ao questionário a cliente manteve escore elevado, apesar de pequena redução, para Potencialidades (58 no pré-teste e 49 no pós-teste, sendo clinico abaixo de 36,4), e em relação às Dificuldades, a cliente saiu do escore clínico para o não clínico (12 no préteste e 4 no pós-teste, sendo clinico acima de 5,5). Apesar da significativa melhora no relacionamento com a mãe, Taíne ainda relatava sofrimento nesse sentido. Ela continuava culpando a mãe por não tê-la acolhido no passado, dizia que sua mãe não agiu como deveria, continuando com o marido, mesmo sabendo que ela foi abusada por ele. Diante da aproximação da mãe, quando a cliente a sensibilizou para o TEPT e para seu sofrimento (sessão 10), a situação melhorou um pouco, mas logo a cliente passou a relatar angústia e sofrimento de novo, pois segundo ela a sua mãe agora a Vol. 23, Núm. 2 TEPT E TERAPIA COMPORTAMENTAL179 sufocava: “essa perseguição dela, de querer saber como está, me incomoda... poderia ser algo normal, ela já entendeu que não precisa largar, mas não precisa ficar...” (sessão 12). Diante da aproximação relatada, com base nos sentimentos vivenciados pela cliente, ela optou por evitar o relacionamento com a mãe, possivelmente porque lhe exigia um repertório de afeto que ela não tinha e que estava com pouca motivação para desenvolvê-lo. Sendo assim, ligou para a mãe e disse que não dava para continuar da forma como estava, pois ela ainda sofria perante a presença da mãe e lhe disse para procurar um psicólogo, pois somente com a mãe procurando ajuda ela poderia voltar a falar com ela. A partir de então, a cliente relatou se sentir melhor: “O ponto fundamental, era relacionado ao meu sofrimento com a minha mãe, as lembranças que isso causavam, pois eu sofria demais, e hoje não... eu refleti, compreendi melhor e deixei de me sentir culpada em relação a isso” (sessão 17). A hipótese que se levanta é que ainda que a mãe lhe fizesse falta, ela funcionava como estímulo que evocava lembranças do trauma, o que lhe era aversivo, ainda que não de maneira intensa a ponto de fechar os critérios diagnósticos para TEPT. Quando a cliente se afastava da mãe, suspendia tais aversivos e, então, afastar-se da mãe era mantido por reforçador negativo. Até então, Taine relatava que se sentia mal em não ter um relacionamento com a mãe e a partir da reflexão promovida na terapia, onde a cliente era levada a descrever relações funcionais, refletir sentimentos, compreender as decisões que tomou na vida, as dificuldades que passou, ela passou a compreender melhor as atitudes da mãe. Um ponto importante destacado pela cliente (sessão 18) é que a sua decisão de evitar um relacionamento com a mãe foi muito bem refletida por ela, pois buscou uma aproximação e a partir dessa experiência pôde decidir qual caminho seguir, sem culpa. Para Skinner (1974) autocontrole refere-se a escolher entre dois cursos de ação que sejam conflitantes. Tal decisão se expressa de maneira mais satisfatória quanto maior o autoconhecimento, de forma que ao decidir qual caminho seguir, se escolha aquele que produzirá mais reforçadores positivos e negativos. No caso da cliente acredita-se que nesse ponto da terapia ela já tinha bastante autoconhecimento que lhe fez tomar tal decisão. No entanto, escolher se afastar da mãe, a qual ela relatava como sendo importante fonte de afeto, parecia, aos olhos do terapeuta e supervisora, que poderia trazer dificuldades na sequencia, como a volta dos sentimentos de abandono. Felizmente, a decisão tomada pela cliente promoveu uma mudança no comportamento da mãe. Apesar dela não ter procurado um psicólogo, como Taine havia solicitado, sua mãe fez algo que significou muito para a cliente. Ela ligou para a filha e disse que se preocupava com ela e que iria ajudá-la até terminar a faculdade, pois era sua mãe e tinha por obrigação fazer isso. Diante disso a cliente relata que o fato da sua mãe se preocupar com a sua faculdade foi algo novo e relevante para ela, momento em que relata que está “muito feliz e isso foi importante para mim” (sessão 21), confirmando a hipótese do terapeuta de que o afeto da mãe era muito importante e que ela rompeu relacionamento com a mãe com a função de produzir mudanças até então não obtidas. Assim, a cliente disse que não sentia mais culpa em relação à mãe e que estava disposta a tentar um relacionamento com ela. Com relação a queixa de aumento de peso, o terapeuta trabalhou com a cliente procurando fazer a descrição de relações funcionais (Tabela 1), objetivando o autoconhecimento e a psicoeducação (Tabela 2), que possibilitaria a cliente a entender e discriminar por que se alimentava inadequadamente, em quais momentos e refletir sobre prática de exercícios. Assim, a cliente passou a notar a relação entre aumento de peso e ansiedade. O terapeuta aconselhou a cliente a procurar um profissional da área para auxiliá-la na perda de peso, e ela fez acompanhamento com uma nutricionista, concomitante aos atendimentos, conseguindo programar uma reeducação alimentar. Paralelamente aos outros objetivos propostos, o terapeuta investigava como caminhava esse processo de dieta com a cliente (monitorava), elogiando ganhos e reforçando/modelando novos operantes, que em conjunto com as reflexões produzidas na terapia, proporcionaram perda de peso, gradual e constante. 180 VAGNER ANGELO GARCIA & ALESSANDRA TURINI BOLSONI-SILVA2015 Com a diminuição dos sintomas característicos do TEPT e paralelo à intervenção no relacionamento com a mãe, foi discutida com a cliente a sua dificuldade acadêmica com as provas, onde o terapeuta através de perguntas para a cliente objetivou uma análise das situações em que ela fazia as provas (momento, tipo de prova, forma de resposta, ansiedade durante a prova, leitura de questões, estudo antecipado, etc.), bem como do tempo dispensado para isso, conversando sobre a qualidade desse tempo e do ambiente em que isso ocorria. O objetivo era o de produzir autoconhecimento, conduzir treino discriminativo e promover novos operantes de forma a discriminar sobre as circunstâncias em que fazia a prova e perceber que quando conseguia estudar com antecedência, ia melhor nas provas e assim a cliente passou a se preparar melhor. Esses resultados, os dados dos instrumentos, bem como a avaliação da terapia foram discutidos com a cliente na sessão 21 (sessão devolutiva), onde através dos ganhos destacados e da superação das queixas pela cliente (ver Tabela 3), foi realizada a alta da paciente. Assim, o procedimento aqui desenvolvido, baseado em intervenções para o TEPT, foi adaptado para a interface da Análise do Comportamento, se mostrando altamente eficaz na eliminação do transtorno e na resolução de queixas secundárias. Em linhas gerais, foi realizado a psicoeducação (Walsh, 2002; McDonagh et al., 2005; Martins, 2009; Passarela et al. 2010), o treinamento em habilidades sociais para melhora no relacionamento interpessoal (Cloitre et al., 2002; Walsh, 2002), a discussão de aspectos relacionados ao trauma, sem contudo abordar exaustivamente o trauma em si (McDonagh et al., 2005; Wells, 2010), promovendo autoconhecimento, refletindo sentimentos e em paralelo trabalhando a dificuldade de estudo e o aumento de peso (queixas secundárias), utilizando-se diversas técnicas comportamentais (Tabela 1). Outra contribuição do presente estudo se relaciona a descrição do modelo de intervenção para o TEPT na perspectiva da Análise do Comportamento, com medidas de resultado e também processuais, que são uma lacuna na literatura de TEPT com desenvolvimento tardio (Ehlers et al. 2010). A descrição deste caso reafirma importantes considerações sobre o TEPT decorrente de abuso sexual. Um deles é a questão referente às dificuldades de relacionamento em que a vitima de abuso na infância pode apresentar ao longo de seu desenvolvimento (Horonor, 2002; Maniglio, 2009; Cloitre et al. 2002). O desenvolvimento de sintomas após a exposição a eventos que lembrem ao trauma, também já havia sido apontado na literatura e confirmados aqui (Freitas et al. 2011). McDonagh et al. (2005) em seu estudo de meta-análise apontaram como tratamento de primeira linha o foco no trauma. Entretanto, Taine já havia preterido essa discussão no primeiro ano de atendimento, e como exposto por Cloitre et al. (2002), a complexidade do tratamento de TEPT de inicio tardio, emana uma intervenção inicial em diversas frentes. Assim, como forma de proporcionar maior adesão da cliente ao processo terapêutico, o treinamento em habilidades sociais, focando as dificuldades de relacionamento da cliente, e a discussão de aspectos relacionados ao trauma (não o trauma em si) se apresentam como uma alternativa de melhor condução da terapia para os casos de TEPT de desenvolvimento tardio, em que falar exaustivamente sobre o trauma pode ser aversivo e dificultar a adesão do cliente. CONSIDERAÇÕES FINAIS Em síntese, a estratégia de intervenção descrita acima para o TEPT procurou desfazer a associação existente entre o trauma e eventos pareados a ele. A psicoeducação proporcionou a cliente conhecimentos sobre a origem dos pensamentos angustiantes, os sonhos aflitivos, promovendo reflexão e autoconhecimento essenciais para a mudança. A análise funcional realizada sessão a sessão também contribuiu para o autoconhecimento da cliente, proporcionando a ela melhores condições na tomada de decisões, bem como a compreensão dos fatos que estavam ocorrendo, e assim, foi possível o desenvolvimento e/ou ampliação de respostas operantes funcionalmente equivalentes, onde algumas delas envolvem a área de habilidades sociais. Vol. 23, Núm. 2 TEPT E TERAPIA COMPORTAMENTAL181 Assim, em relação às queixas apresentadas e aos objetivos propostos, a cliente superou suas dificuldades. Como Taine não apresentou mais os sintomas característicos do TEPT, conclui-se que a intervenção proposta se mostrou eficaz. A proposta de intervenção aqui descrita se apresenta como uma alternativa ao tratamento do TEPT em vitimas de abuso sexual com desenvolvimento tardio na abordagem da Análise do Comportamento. Entretanto, o procedimento proposto carece de novos estudos para verificar se mantém sua efetividade frente a outros clientes que apresentem as mesmas características (TEPT – abuso sexual/desenvolvimento tardio, sem comorbidades), ou ainda se apresenta a mesma eficácia sobre o TEPT desenvolvido sequencialmente ao trauma, bem como desencadeados por outros eventos que não o abuso sexual. REFERÊNCIAS Amstadter, A., McCauley, J., Ruggiero, K., Resnick, H., & Kilpatrick, D. (2008). Service utilization in a representative sample of female rape victims. Psychiatr. Serv., 59, 1450-1457. American Psychiatric Association (2000). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 4ª edição/Texto Revisado. Porto Alegre: Artmed. American Psychiatry Association (2013). Diagnostic and Statistical Manual of Mental disorders - DSM-5. Washington: American Psychiatric Association. Araújo, A. A., & Neto, F. L. (2014). A nova classificação americana para os transtornos mentais – o DSM-5. Rev. 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