Discurso proferido Deputado pelo MANOEL SALVIANO na ordinária Câmara Deputados, da no dia sessão 26 dos de março de 2012. Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, O motivo principal de ocupar a Tribuna desta Casa é demonstrar que houve um grande equívoco há alguns anos. Naquela oportunidade, os debates foram pautados no fato de que as privatizações fizeram mal à saúde financeira do País, isto é, tivemos a defesa de um conceito duplo: de um lado a estatização, e do outro lado, a privatização. Como forma de rever o passado, devo lembrar que existiu naquela oportunidade uma discussão onde se abordava de um lado a “estatização”, e de outro a “privatização”. Durante o período eleitoral foi difundido “que o interesse público somente seria preservado por meio da expansão da atuação estatal sobre a atividade produtiva do País”. O processo de privatização iniciado com o Programa Nacional de Desestatização, em 1990, foi um dos pilares para o cenário econômico e social observado hoje no Brasil. O atual processo de desenvolvimento tem, na atuação de ex-estatais, entre as quais Usiminas, CSN, Embraer, Vale do Rio Doce e as 1 companhias de telecomunicações, um dos sustentáculos para que a economia cresça, gerando empregos e o governo possa manter os programas de seguridade social. Ao avaliar esses dados, e considerando a sua continuidade nos governos seguintes, podemos constatar que algo de bom existe nas privatizações, pois elas representam melhor desempenho das exempresas públicas. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse certa vez: “Só o oportunismo eleitoral pode explicar por que insistem num tolo debate que sustenta ser patriótico, manter sob controle estatal um serviço público, ao passo que concedê-lo à iniciativa privada, com ou sem a venda da propriedade, é coisa de entreguista”. Após a regulamentação, em lei, a partir da década de 1990, as privatizações ganharam corpo. Ninguém pode esconder este fato. De acordo com Anuatti-Neto et alli (2005), no estudo Os efeitos da privatização sobre o desempenho econômico e financeiro das empresas privatizadas, “entre os anos 1991 e 2001, o governo brasileiro transferiu ao setor privado o controle de muitas empresas estatais e participações minoritárias em várias companhias. Anuatti-Neto et alli destacaram, na literatura nacional sobre privatização e desempenho das empresas estatais, três estudos. O primeiro, de Pinheiro e Gianbiagi, realizou avaliação completa do desempenho no período 1981-1994, anterior, portanto, à privatização. Os números foram considerados “decepcionantes, tanto em termos de lucratividade quanto de dividendos recebidos pelo Tesouro”. 2 Ao longo de todo o período, a taxa de lucros relativamente ao patrimônio líquido foi negativa, -2,5% em média. Além disso, de 1988 a 1994, anos para os quais os dados estavam disponíveis, os dividendos foram de apenas 0,4% do valor das ações de propriedade do governo federal”. O segundo estudo, de Macedo, apontou, Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, como uma das causas para o desempenho nada satisfatório, a política salarial das estatais. Análise entre os salários dessas empresas e os da iniciativa privada aponta significativa diferença em favor dos trabalhadores das primeiras. O terceiro estudo, de Pinheiro, comparou desempenho pré e pósprivatizações, concluindo que as empresas aumentaram “a produção, a eficiência, a lucratividade e a propensão a investir”, além de apresentarem melhora nos indicadores financeiros. Afirma o estudo de 2005, que, “em termos financeiros, a perda do suporte creditício governamental forçou as empresas a uma reestruturação por meio da elevação da liquidez corrente e redução do endividamento de longo prazo”. Ainda de acordo com esse mesmo estudo, há três fases no programa brasileiro de privatizações: Programa Nacional de Desestatização (PND), de 1991; programas similares no âmbito estadual, de 1996; programa de privatização do setor de telecomunicações (Telecom), federal, de 1997. A composição total do programa por setores mostra que a privatização do setor elétrico foi responsável por 31% do valor total dos leilões; telecomunicações, 31%; aço, 8%; mineração, 8%; óleo e gás, 7%; petroquímica, 7%; financeiro, 6%; e outros, 2%. 3 Impulsionada pelo programa Telecom, a privatização atingiu seu pico entre 1997-98, período responsável por 69% do valor total até julho de 2001. O programa progrediu pouco depois de 1998. Entre as razões está o fato de que as privatizações e outras medidas de liberalização coincidiram com um período de lento crescimento da economia, o que enfraqueceu o apoio político ao programa. (...) “Na segunda metade dos anos 90, quando se tratou de atrair o capital privado para os investimentos que o Estado já não podia fazer na oferta de telecomunicações, energia, petróleo, etc, flexibilizaramse monopólios estatais e se criaram as agências reguladoras para assegurar a competição nesses setores, evitando o surgimento de monopólios privados.(...) No caso do petróleo, depois da quebra do monopólio, em 1997, a Petrobrás transformou-se numa empresa moderna, menos sujeita a influências políticas. Mantida sob o controle da União, mas submetida à competição, tornou-se uma das cinco maiores petrolíferas do mundo.(...) Nas telecomunicações houve uma combinação de privatização e concessão de serviços.(...) Hoje existem no Brasil mais celulares do que habitantes.(...) Na privatização do Grupo Telebrás houve transferência de ativos. A divisão da holding em várias empresas pretendia assegurar a competição no setor. Graças a esse novo ambiente e às regras estabelecidas pelo governo, as empresas privatizadas foram obrigadas a fazer pesados 4 investimentos para acompanhar os avanços tecnológicos e ampliar o acesso às linhas, inclusive à internet, deixando-nos sem saudades do antiquado sistema de telefonia pré-privatização. Já no caso da Vale do Rio Doce, assim como da Embraer, houve privatização pura e simples, com a ressalva de que, nesta última empresa, o Governo manteve uma golden share, com direito a veto; e o BNDES adquiriu e manteve uma posição importante, de cerca de 20% no controle da mineradora. Para não falar na participação dos fundos de pensão das empresas estatais. Na privatização da Vale, os críticos diziam que o governo estava alienando o subsolo nacional – uma afirmação descabida, já que este era e continuou a ser propriedade da União, conforme manda a Constituição. Falavam também que a empresa terminaria ‘desnacionalizada’, com número menor de empregos – retórica que os fatos posteriores desmentem sem margem à contestação. Em matéria publicada pela Revista Veja em fevereiro deste ano, “o lucro da Vale em 2011 foi de 37,8 bilhões de reais, sendo o maior já registrado por uma empresa brasileira de capital aberto (...). Com o resultado, a mineradora aparece no topo da lista das 20 companhias mais lucrativas da história”. Cabe ainda relembrar o caso dos bancos estaduais, tidos como instituições que só geravam prejuízos aos seus respectivos governos, mas que, ao passarem para o controle da iniciativa privada, consequentemente, se tornaram superavitários. 5 Por intermédio dos avanços tecnológicos ocorridos nos últimos anos, e com o sucateamento inegável de alguns setores da economia pública, nos deparamos com o ideal de privatização, que é utilizado em todo o mundo moderno. A privatização tem como principal fim a prestação de serviço, que em sua essência seria público, por uma concessionária privada”, dona de “um capital de investimento alto, visto que em sua grande maioria pertencem a grupos econômicos com abrangência em vários mercados mundiais.” Os que criticam as privatizações são os mesmos que se gabam dessas empresas e de sermos hoje a sexta economia do mundo. Esquecem-se de que isso se deve em muito ao que sempre criticaram: além das privatizações, o Plano Real, o Proer, a Lei de Responsabilidade Fiscal, enfim, a modernização do Estado e da economia. Não basta fazer concessões e privatizações. É preciso fazê-las com critérios predefinidos, elaborar editais claros, exigir que se cumpram as cláusulas das licitações e assim evitar que as agências reguladoras se transformem em balcões partidários. Resumidamente, podemos afirmar que as ineficientes estatais sufocavam as contas públicas, serviam como moeda de troca para obtenção de favores políticos e seus serviços se caracterizavam pela qualidade medíocre. Privatizadas, elas geram lucros e impostos, trazem divisas para o país e têm a obrigação de serem eficientes para atender consumidores e acionistas. 6 A ideia difundida de que o poder público deve atuar forte como produtor para preservar o interesse público foi uma forma de confundir a sociedade. Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, para colocar em prática o conceito duplo do tema desse meu pronunciamento, passo a citar os fatos recentes. O governo atual recentemente fez concessão a particulares de três grandes aeroportos do País – Guarulhos, na Grande São Paulo; Viracopos, em Campinas, também em São Paulo; e o JK, de Brasília – , em leilão realizado na Bolsa de Valores de São Paulo. Os interessados, que eram em número de 11 empresas, apresentaram 22 propostas durante a licitação dos três terminais, que são, ao todo, responsáveis por 30% do fluxo de passageiros em nosso território. Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, essas concessões, quer queiram, quer não, reacenderam o debate sobre privatização e concessão, e é justamente isso que estou fazendo nesta oportunidade. É preciso que fique claro que “o fator determinante para a transferência desses terminais para a iniciativa privada” não foi outro a não ser a constatação de que houve um “colapso dos serviços aeroportuários”, aliada a “baixa capacidade financeira e gerencial do poder público para tocar os investimentos necessários, sobretudo agora que o país está prestes a sediar dois megaeventos esportivos”, o Mundial, em 2014, e os Jogos Olímpicos dois anos depois. 7 O que ocorreu nessas concessões foi apenas uma questão pragmática para que o Brasil não ficasse tão vulnerável quanto à possibilidade de um enorme vexame internacional durante esses eventos que estão tão próximos. Nos tempos atuais, os conceitos de força e grandeza se aplicam mais adequadamente às empresas particulares do que ao setor público. Tanto no Brasil como em outros países, há setores privados capitalizados e prontos para investir. Já para o setor público, o conceito chave é o da eficiência, e não o da potência bruta. Hoje, para alavancar o desenvolvimento, compete ao Estado um papel supletivo: o da indução e da regulação. Estados grandes e fortes, em geral, tornam-se opressores em termos fiscais, endividam-se em excesso, extraem cargas tributárias muito além da capacidade contributiva do setor privado. Tentam exercer um papel para o qual não possuem nem recursos e menos ainda, habilidades, comparativamente aos capitais privados. Senhor Presidente, Senhora e Senhores Deputados, não nos cabe avaliar se ocorreram fatores que desencadearam o atual ciclo de desenvolvimento vivido pelo País, ou se, simplesmente todos os louros são frutos de uma terra cultivada em um passado recente. Esses serviços de natureza pública não são passados em definitivo para a iniciativa privada, mas, sim, pelo instituto da concessão, dada a importância da boa prestação das necessidades fundamentais da população. O Estado, por sua vez, fica com a responsabilidade de regular e fiscalizar tais fornecimentos de serviços. 8 É inquestionável o fato de que hoje em dia, em alguns segmentos da economia, a prestação de serviços tais como telefonia, energia, rodovias, entre outros, torna-se mais eficaz por grupos que possuem capital para altos investimentos, já que é destes negócios que são especializados para prestar bons serviços como, também, obter dividendos. Dessa forma, a busca pela eficiência do Estado tem na concessão uma saída viável, porém o acompanhamento deve continuar sendo feito, devido à responsabilidade pelo serviço social. Para a devida finalidade, as agências reguladoras são o principal elemento da fiscalização dos contratos entre o Governo e a iniciativa privada. As agências reguladoras são órgãos criados pelo Governo para regular e fiscalizar os serviços prestados por empresas privadas que atuam na prestação de serviços que em sua essência seriam públicos. Como estes serviços são de relevante valor social, e que primordialmente cabia ao Estado o seu fornecimento, sua fiscalização deve ser feita através de algum órgão que se manifeste imparcial em relação aos interesses do Estado, da concessionária e dos consumidores. A imparcialidade em relação ao Estado se faz necessária porque sem esta, as concessionárias de serviços sairiam prejudicadas com as cobranças de tributos elevados, bem como no momento em que fosse feita uma punição esta poderia se tornar abusiva. Por outro lado, a cobrança de taxas dos serviços e a má prestação por parte da concessionária, devem ser fiscalizadas também. 9 É importante ressaltar que temos uma sociedade cada vez mais exigente com o mercado, isto em decorrência da facilidade de informação em relação aos seus direitos. Tal fato pode ser facilmente comprovado nos cartórios dos Juizados Especiais, com o elevado número de processos ajuizados, que têm no pólo passivo essas concessionárias. Em relação à formação do órgão fiscalizador, acreditamos que a sua característica principal seja a da imparcialidade. Essa imparcialidade se dá por meio da independência funcional. Consideramos que é de fundamental importância a presença das agências reguladoras no atual sistema político adotado em nosso País, pois elas têm como objetivos principais a maneira de regular as concessionárias, a fiscalização, a estipulação de multas, assim como a retirada da concessão, se as metas não forem cumpridas. Vale salientar que, por se tratar de serviços de natureza pública, as agências têm o dever de zelar pelo bom funcionamento das concessionárias, resguardando, dessa forma, um serviço que pertence à sociedade. Era o que tinha a dizer, Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados! Fontes de referência: Professor Marcos Cintra Ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso Anuatti-Neto Revista Veja Paulo Eduardo de Figueiredo Chacon 10