SANDRA PENKAL A INTER-RELAÇÃO DA ARTE, DESIGN E MARCA: TARSILA, A ARTISTA E O PERFUME Dissertação apresentada à Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação, Arte e História da Cultura. Orientador: Prof. Dr. MARCOS RIZOLLI São Paulo 2006 A INTER-RELAÇÃO DA ARTE, DESIGN E MARCA: TARSILA, A ARTISTA E O PERFUME SANDRA PENKAL A INTER-RELAÇÃO DA ARTE, DESIGN E MARCA: TARSILA, A ARTISTA E O PERFUME Dissertação apresentada à Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação, Arte e História da Cultura. Aprovada em de 2006 BANCA EXAMINADORA _________________________________________________________ Prof Dr. Marcos Rizolli Universidade Presbiteriana Mackenzie _________________________________________________________ Prof Dr. Universidade _________________________________________________________ Prof Dr. Universidade Dedico este trabalho a meus queridos e saudosos pais À minha mãe Maria Aparecida por sua inteligência, generosidade e dignidade, e Ao meu pai Segismundo Penkal pelo seu talento, determinação e sensibilidade. À minha filha Gabriela por ter me ensinado a amar da maneira mais pura e incondicional. Razão da minha vida. Ao Marco Antônio, o meu esposo, melhor companheiro e amigo. Meu amor, minha gratidão e admiração eterna.... Aos meus irmãos, Sônia e Edmundo, meu respeito e muita gratidão. À minha irmã Sônia agradeço por todo apoio, dedicação. AGRADECIMENTOS Agradeço Em primeiro lugar, a Deus que me deu o dom da vida. À Universidade Presbiteriana Mackenzie pela oportunidade de poder avançar em meus conhecimentos que serão aplicados em meu caminho profissional. Ao meu orientador Prof. Dr. Marcos Rizolli pelo apoio e dedicação, por sua imensa inteligência intelectual e emocional. Ao Prof. Dr. Pinatti meu grande incentivador e mestre, minha gratidão e respeito. Ao Prof. Dr. Sergio Bairon, meu reconhecimento, consideração e admiração. Ao Prof. Dr. Jose Ribeiro da Universidade Aberta de Portugal, pela amizade e incentivo no Seminário Internacional em Múrcia, Espanha, em abril de 2006. À Silvana Cassol que a época era Diretora de Marketing de “O Boticário” e ao Rodolfo Fonseca de Melo, Gerente do Segmento de Perfumaria da mesma empresa, que desenvolveram o conceito e a linha do perfume Tarsila de “O Boticário” pelas informações, incentivo e amizade. Ao Sr. Luiz Seabra, Presidente Fundador e Alessandro Carlucci Presidente da Natura de Cosméticos, que durante os 13 anos de minha passagem pela Natura sempre me ensinaram e incentivaram quanto a importância dos conceitos dos produtos e a magia do universo da Perfumaria. Ao Centro Universitário Belas Artes de São Paulo pelo incentivo intelectual e financeiro. À minha grande amiga Isabel Meister pelo trabalho com as imagens e design, minha admiração e gratidão. Ao apoio de todos os meus amigos. Sem eles eu não sou completa. Graças a Deus são muitos e a todos meu carinho, amizade e admiração. À Dra. Barbara Rzyski pela revisão, por todo apoio e carinho. Minha admiração e respeito. A todos meu muito obrigada RESUMO A dissertação propõe um estudo e uma reflexão sobre a inter-relação entre a arte, o design de produtos e as marcas comerciais da atual Indústria Cultural. Como objeto de pesquisa, é considerada a dimensão sígnica da obra Manacá/1927, da pintora Tarsila do Amaral, aplicada a marcas de produtos de uma empresa no setor de cosméticos e perfumaria do mercado brasileiro (“O Boticário”). Entende-se que em todos os tempos, grupos humanos sempre usaram modos de expressão, de manifestação de sentido e de comunicação social e outras formas de linguagem. Destarte, a estrutura desta dissertação está baseada numa visão semiótica e da construção de uma marca comercial, através da utilização de fontes artísticas como elementos simbólicos que agregam e ampliam o seu valor. Pois, fortes símbolos conferem maior unidade e estrutura a uma identidade de marca, tornando-a mais fácil e rápida de ser reconhecida e lembrada. Grande parte das indústrias brasileiras, nos mais distintos setores, ainda não possui uma tradição na utilização de um design fundamentado em elementos tipicamente nacionais, resultando, assim, na reprodução de conceitos desenvolvidos por outros países. Contudo, recentemente alguns segmentos já vêem utilizando recursos e dados nacionais na conceituação, criação e desenvolvimento de produtos de consumo. Deste modo, a partir do “trânsito” entre Arte X Design para o Design X Arte, abrangendo o processo de decodificação da obra, pode-se aproximar um pouco mais o público da cultura artística e solidificar o design nacional com investimentos na criação e produção de produtos, conforme demonstrado neste trabalho. PALAVRAS-CHAVE: Arte (Tarsila do Amaral), Design, Marca e Semiótica ABSTRACT The aim of this work is to study and make a reflection about the interrelation among the art, the design of products and the commercial marks of the current Cultural Industry. As a research object, the signic dimension of the Manacá/1927 image of the painter Tarsila do Amaral is considered, applied to the product marks of a company of cosmetics and perfumery section of the Brazilian market (“O Boticário”). It can be understood that in all of the times, human groups always used expression behaviors, sense manifestation and social communication, and other language ways. Therefore, the structure of this dissertation is based on a semiotic vision and of the construction of a commercial mark, through the use of artistic sources as symbolic elements that join and enlarge its value. Strong symbols confer a larger link and structure to a mark identity, giving it an easier and fast of being recognized and reminded. Great part of the Brazilian industries, in the most different sections, still doesn’t possess a tradition in the use of a design based in elements typically national, resulting, this way, in the reproduction of concepts developed by other countries. Recently, however, some segments already use resources and national data in the conception, creation and development of consumption products. This way, starting from the “interchange” among Art X Design to the Design X Art, including the process of decoding of the work, the public can be moved toward the artistic culture and the national design can be solidified with investments to create and produce products, as demonstrated in this work. KEY-WORDS: Art (Tarsila do Amaral), Design, Mark and Semiotics. SUMÁRIO Lista de Figuras Algumas palavras ... 1 INTRODUÇÃO ..... ................................................................................. 17 2 ARTE BRASILEIRA ... ........................................................................... 22 2.1 ARTE-CULTURA BRASILEIRA:TARSILA DO AMARAL ........................ 23 2.2 MOVIMENTO MODERNISTA NO BRASIL.............................................. 29 2.2.1 MANIFESTO ANTROPÓFAGO .............................................................. 31 2.3 O ESTILO CUBISTA .............................................................................. 34 2.4 PINTURA MANACÁ: UMA ANÁLISE SOB O PONTO DE VISTA ESTÉTICO ............................................................................................. 38 3 A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM ........... 46 3.1 ANÁLISE SEMIÓTICA ............................................................................ 48 3.2 ANÁLISE DE DESIGN ............................................................................ 57 3.3 DESIGN DE EMBALAGEM .................................................................... 63 3.3.1 Análise do frasco do perfume Tarsila .................................................... 65 3.3.2 Análise da tampa do perfume ................................................................. 70 3.3.3 Análise do cartucho do perfume Tarsila ................................................. 72 3.3.4 Perfume Tarsila: análise olfativa ............................................................ 74 4 MARCA E MARKETING ........................................................................ 85 4.1 MARCA (BRANDING) COMO ELEMENTO DE MARKETING ............... 85 4.2 CONDIÇÕES MERCADOLÓGICAS: EMPRESA O BOTICÁRIO E LINHA DE PERFUMARIA FEMININA TARSILA ................................... 95 4.2.1 Empresa “O Boticário” .......................................................................... 95 4.2.2 Linha de Perfumaria Feminina Tarsila .................................................. 99 4.2.2.1 Público Alvo .......................................................................................... 99 4.2.2.2 Produto: Linha Tarsila .......................................................................... 100 4.2.2.3 Preço ..................................................................................................... 105 4.2.2.4 Praça (Distribuição) ............................................................................... 106 4.2.2.5 Promoção .............................................................................................. 107 4.2.2.6 Marca/branding..................................................................................... 110 5 CONCLUSÕES .................................................................................... 112 REFERÊNCIAS .................................................................................... 117 Então... 121 ............................................................................................... LISTA DE FIGURAS Tarsila do Amaral "Auto-retrato – Le manteau rouge", 1923, óleo sobre tela, 73 x 60,5 cm........................................................................................................ 23 "Abaporu", 1928, óleo sobre tela, 85 x 73 cm. Coleção Eduardo Costantini, Buenos Aires....................................................................................................... 26 “Operários”, 1933, óleo sobre tela 15 X 205cm, Assin.:"Tarsila1933" - Col. do Gov. do Estado de São Paulo............................................................................. 27 Les Demoiselles d'Avignon. Pablo Picasso, 1907. Óleo sobre tela. The Museum of Modern Arts, New York, USA………………………………………… 34 “Mulher”, Victor Brecheret, 42 cm de altura, feito em bronze, década dos 30, séc 20................................................................................................................ 36 Sem Título (Cabeça de Cristo), Antonio Gomide c. 1925. Óleo sobre tela, 35,5 x 27,5cm.................................................................................................... 37 “Manacá“, Tarsila do Amaral, Óleo sobre tela, 76 x 63,5cm, 1927. Assinado e datado c.i.e. “Tarsila 1927”, Coleção Simão Mendel Guss, São Paulo............. 38 Análise dos planos 1 a 4 que compõem a obra de Tarcila do Amaral, “Manacá”............................................................................................................. 40 Na obra de Tarcila do Amaral, “Manacá”, observa-se direcionamento pictórico na verticalidade, tanto dos cactos, como das flores, no sentido de baixo para cima..................................................................................................................... 42 Grupos de tonalidades de cores usadas na obra “Manacá” de Tarsila do Amaral................................................................................................................. 43 Divisão da obra “Manacá” de Tarsila do Amaral para uma análise de seu cromatismo........................................................................................................ 43 Detalhes da obra “Manacá” de Tarcila do Amaral em função do cromatismo. 1: Flores Rosas; 2: Flores Roxas; 3: Vegetação Verde; 4: Montanhas Azuis... 44 Design da Linha de Produtos de Perfumaria “Tarsila”, desenvolvida, em 2002, pela Empresa “O Boticário”, em Curitiba/Brasil....................................... 47 Figura 14 Andy Warhol - Auto-retrato. Arte Contemporânea em Fotografia, 1966............ 50 Figura 15 Três garrafas de Cola (Three Coke Bottles). Andy Warhol. Tipo: Lamina / Tamanho: 61x 81 cm.......................................................................................... 50 Tríade semiótica peirceana em que se observa a distribuição do Signo, Objeto e Interpretante nos vértices do triângulo................................................ 56 Perfume Tarsila de “O Boticário” criado pelo designer Leonardo Alves Cordeiro............................................................................................................. 61 Relação dos eixos estruturais: 1) na arte de Tarsila do Amaral, Manacá e no 2) no perfume Tarsila de “O Boticário”............................................................... 66 Figura 1 Figura 2 Figura 3 Figura 4 Figura 6 Figura 5 Figura 7 Figura 8 Figura 9 Figura 10 Figura 11 Figura 12 Figura 13 Figura 16 Figura 17 Figura 18 Figura 19 Frasco do perfume Tarsila de “O Boticário”........................................................ 67 Figura 20 Equilíbrio na equivalência entre: 1) perfume Tarsila de “O Boticário”, em cada parte do frasco e 2) a obra de Tarsila do Amaral, Mancá.................................. 68 Análise simbólica do frasco do perfume Tarsila de “O Boticário” – indexicalidade na conexão dinâmica da obra com o frasco de perfume ........... 69 Análise da tampa e anel do perfume Tarsila de “O Boticário”: 1) tampa com flores; 2) tampa com flores e anel; e, 3) anel..................................................... 70 Análise da tampa do frasco de perfume Tarsila de “O Boticário” quanto a relação secundidade e índice............................................................................. 71 Assinatura gestual “Tarsila” no anel metálico do frasco de perfume de “O Boticário”............................................................................................................. 72 Parte frontal do cartucho do perfume Tarsila. Assinatura gestual do nome do perfume no meio da altura e a marca “O Boticário” estampada em dourado na parte inferior........................................................................................................ 73 Duas faces do cartucho do perfume Tarsila de “O Boticário”. Em uma face o nome e a marca e na outra a representação da obra de Tarsila do Amaral – Manacá................................................................................................................ 74 Perfumistas Harry Fremont e Jean-Claude Delville que criaram a fragrância do perfume Tarsila de “O Boticário”.................................................................... 79 Figura 28 Composição das três notas olfativas do perfume Tarsila de “O Boticário” ....... 80 Figura 29 Notas de saída, corpo e fundo de um perfume.................................................. 81 Figura 30 Relações de Primeiridade (monádica), Secundidade (diádica) e Terceiridade (triádica) de um perfume e suas notas respectivas........................................... 83 Figura 31 Logotipo da marca “O Boticário” ....................................................................... 96 Figura 32 Exemplo de loja franqueada de “O Boticário”.................................................... 98 Figura 33 Perfume Tarsila da linha de fragrâncias femininas de “O Boticário”.................. 101 Figura 34 Emulsão Perfumada Tarsila 200mL da mesma linha do perfume Tarsila de “O Boticário”............................................................................................................. 102 Linha Rouge de “O Boticário” foi inspirada na pintura de Tarsila do Amaral intitulada Manteau Rouge, pintada em 1923...................................................... 103 Figura 36 Batom da linha Tarsila Rouge de “O Boticário” lançado em março de 2006..... 105 Figura 37 Signos da publicidade na mídia eletrônica para lançamento do perfume Tarsila de “O Boticário”....................................................................................... 108 Figura 38 Propaganda impressa em diversas revistas de circulação nacional para lançamento do perfume Tarsila de “O Boticário”................................................ 108 Figura 39 Folder com a propaganda do perfume Tarsila de “O Boticário”......................... 109 Figura 40 Cartela com amostras, com um flaconete do perfume Tarsila de “O Boticário”. 109 Figura 21 Figura 22 Figura 23 Figura 24 Figura 25 Figura 26 Figura 27 Figura 35 Figura 41 Figura 42 Perfume Tarsila 100mL. Na promoção de lançamento o consumidor ao comprá-lo e pagar mais R$ 1,80 ganhava um porta-retrato............................... 110 Identidade do perfume Tarsila de “O Boticário” que é representada pela assinatura da Tarsila do Amaral........................................................................ 111 Algumas palavras ... Entendo que as escolhas que fazemos no decorrer de nossa existência estão intimamente associadas à nossa história, cultura, educação, enfim ao nosso repertório e a nossa forma de olhar o mundo. Neste sentido, posso dizer que na evolução dos meus interesses, naturalmente, me identifiquei com o universo artístico, cognitivo e sensível desde muito cedo. A escolha do tema: “A inter-relação da arte, design e marca: Tarsila, a artista e o perfume” tem suas origens nas salas do tradicional e saudoso Colégio Sacre Coeur de Marie – São Paulo nas décadas 70 e 80 e, principalmente, nas aulas de História da Arte do Professor Rubens. Para quem começou a se interessar pelas artes, desde criança, e pelo estudo da linguagem, cognição e marca no curso de graduação da Faculdade de Comunicação Social (FAAP - Fundação Armando Álvares Penteado / 1987) e no curso de Pós-graduação em Marketing (ESPM - Escola Superior de Propaganda e Marketing / 1992), a opção pelo caminho das artes, como forma de linguagem, foi inevitável. Nesta busca constante pelo aperfeiçoamento e diante deste conjunto de interesses, surgiu a oportunidade de trabalhar em uma grande empresa de cosméticos, onde a linguagem, o sensorial, e os signos tornam-se fundamentais na criação dos conceitos dos produtos. Da sala de aula para as reuniões durante muitos anos do Comitê de Desenvolvimento de Produtos, da empresa Natura de Cosméticos – época em que minha função era de Gerente de Produtos, responsável pela gestão e lançamento das Linhas de Perfumaria, Corpo e Proteção Solar, com destaque ao lançamento dos premiados perfumes Shiraz e Sève; e também, como Gerente de Planejamento Promocional e Gerente de Mercado das Regiões Sudeste e Centro Oeste do Brasil, tive a responsabilidade da gestão do Composto de Marketing da Empresa (Gestão da Marca, Promoções, Campanhas de Incentivo, Ações Regionalizadas, Preços, Comunicação e a Gestão da imagem e valores da Marca e da Empresa Natura nestas regiões), - a identidade das marcas passou a ser meu grande objeto de estudo, considerando a semiótica, que se propõem a fazer uma análise do discurso marcário dos signos usados na construção de suas estruturas de linguagem e significação. No desenvolvimento das estruturas marcarias os aspectos sensoriais assumem um papel fundamental para a construção da identidade dos produtos. Neste contexto, a minha experiência profissional como Gerente de Produtos da Perfumaria na Empresa Natura foi fundamental, pois por meio do perfume acontece uma das maiores experiências sensoriais, nas quais muitos sentimentos e sensações, de difícil tradução para a linguagem verbal, estão envolvidos ao escolher a marca de um perfume. Também tive o privilégio de aprimorar a vivência no universo do perfume, com participação no Curso de Perfumaria Internacional na Empresa Firmenich - Suíça / Genebra, em 1993, o que muito me honra. Passei por muitos momentos de reflexão sobre as transformações profundas pelas quais passa boa parte da sociedade, e também sobre a crescente competição de produtos e mensagens, nas quais o grande desafio para as empresas e instituições é promover seus produtos/serviços para que se destaquem neste mercado competitivo. Neste cenário atuo em consultoria, desde 2001, no cargo de Diretora de Marketing/ Comunicação – Empresa Companhia e Negócios – e como docente de Comunicação e Marketing, em algumas Instituições de Ensino Superior como: • Centro Universitário Belas Artes de São Paulo - Cursos de Design de Moda , Gráfico e Produtos. Ministro as seguintes Disciplinas: Curso de Moda: Moda e Mercado I; Marketing e Moda I, Marketing e Moda II e Marketing e Moda III e Estratégia Empresarial; Curso de Design: Marketing e Planejamento Estratégico; Empreendedorismo. • UniFMU - Faculdades Metropolitanas Unidas - Cursos de Design Gráfico e Produtos - disciplinas: Teoria do Consumo I e II, Comportamento do Consumidor. Curso Seqüencial de Editoração / disciplinas: Marketing Editorial e Divulgação e Comercialização. • UNISA - Universidade Santo Amaro - Curso de Pós-Graduação Marketing / Lato Sensu - disciplinas: Gerência Estratégica de Produtos e Estratégia Mercadológica. INTRODUÇÃO 17 1 INTRODUÇÃO “Não importa como as pessoas se aproximem da arte. Ela é imprescindível na vida do ser humano, desde que o homem existe. Para se comunicar o homem usou, antes da linguagem escrita, sons guturais e o desenho.” (RIZOLLI,1999) O início do século 21 surge assinalado por múltiplas ocorrências que determinaram transformações relevantes nos mais diferentes setores, sobretudo no universo da tecnologia e comunicação. Símbolos extraídos da indústria cultural e da cultura visual compõem de maneira estratégica, a comunicação, a exposição comercial das marcas e as relações de compra e consumo em um mercado altamente competitivo. Assim sendo, esta dissertação vem investigar o desenvolvimento das marcas comerciais, tendo como eixo central a arte e sua relação com o design, por meio de uma estrutura sígnica apoiada pela teoria semiótica Peirceana. A produção artística sempre foi entendida como processo de conhecimento, uma vez que envolve ações e intervenções conectadas ao mundo, que relaciona, ordena, classifica, transforma e cria. Sob este ponto de vista, as estruturas sígnicas se apresentam completas de possibilidades na relação arte e design, tornando-se um novo referencial para a construção da marca. Neste contexto a teoria semiótica passou a ser o grande instrumental de estudo desta dissertação, por meio da análise do discurso marcário e dos signos usados na construção de suas estruturas de linguagem e significação. Neste contexto a teoria semiótica passou a ser o grande instrumental de Sandra Penkal INTRODUÇÃO 18 estudo desta dissertação, por meio da análise do discurso marcário e dos signos usados na construção de suas estruturas de linguagem e significação. Como suporte teórico é empregada a semiótica de Charles Sanders Percie1 e de Lúcia Santaella2. O design permitiu múltiplas análises, apresentando em seu processo de produção o trânsito entre a sensibilidade e a funcionalidade/razão. Precisamente, deste modo, nesta mobilidade entre o sensível e o racional/funcional é que reside o potencial transformador e diferenciador da estrutura sígnica no desenvolvimento de marcas comerciais. Em um cenário globalizado, onde não existe extensão que institua barreiras para a concorrência, a estrutura de marketing foi expandida, também, pela força criada pelas marcas e seus aspectos culturais e comportamentais. A todo o momento o mercado se torna mais integrado e pessoas de diferentes partes do mundo consomem os mesmos produtos, o que faz com que todos disputem os mesmos mercados. Neste contexto o marketing, a marca e a comunicação, por meio da sua composição, amolda as necessidades e desejos dos consumidores, e ainda amplia e reforça quando o consumidor associa produção artística a produtos de design. A demanda por marcas diferenciadas e com valor agregado, se coloca na arena mais ampla e complexa da comunicação e do marketing, e este é o recorte 1 2 Charles Sanders Peirce (1839-1914) foi um filósofo, cientista e matemático estado-unidense. Era filho de um matemático conhecido, Benjamim Peirce, na época, um dos mais importantes matemáticos de Harvard. Licenciou-se em Ciências e doutorou-se em Química em Harvard. Ensinou filosofia nesta universidade e na Universidade de Johns Hopkins. Foi o fundador do pragmatismo e da ciência dos signos, a semiótica. Lúcia Santaella semioticista e é professora titular da PUC-SP e diretora do CIMID (Centro de Investigação em Mídias Digitais, da PUC-SP]. Sandra Penkal INTRODUÇÃO 19 que se propõe para discutir arte e design como intercessores no processo de construção de imagem de marca. Nesta perspectiva, toma-se a arte, também, como expressão, por excelência, da subjetividade e da significação. Aplicam-se estas hipóteses, na compreensão da arte como linguagem, mediadora do design, porque o valor agregado dos produtos não se resume às funções operacionais, mas também por meio da dimensão sensível, que deslumbra o mundo, que se relaciona com o intangível, com o cultural e com percepções estéticas, a despeito das implicações praticas e mercadológicas. Para a compreensão mais aprofundada dos fenômenos de marketing e das marcas, esta dissertação se apoiou em várias literaturas, entre elas as de: Aaker (2002) Marcas: Brand Equity gerenciando o valor da marca; Gobé (2002) A emoção das marcas: conectando marcas às pessoas; Kotler e Peter (1998) Administração de Marketing: análise, planejamento, implementação e controle; Perez (2004) Signos da Marca: Expressividade e Sensorialidade; Rizolli (1999) Artista-CulturaLinguagem (Um Estudo sobre Metodologias Pictóricas), etc. As marcas apresentam-se como uma forte ferramenta estratégica do marketing e da comunicação visual. Personalidades como Salvador Dali, Tarsila do Amaral e Candido Portinari, por si só são marcas que carregam um significado forte e expressivo. Os elementos simbólicos, representados pelo universo artístico, serão acessíveis em todo lugar onde forem conectados. Principalmente na arte as significações e a ressignificação se manifestarão com freqüência, até mesmo nas embalagens aplicadas a marcas de produtos, por uma interpretação semiótica. Sandra Penkal INTRODUÇÃO 20 Como explica Lúcia Santaella: “No nosso estar-no-mundo, como indivíduos sociais, é mediado por uma rede plural de linguagem” (SANTAELLA, 1995). Vale ainda dizer, que no desenvolvimento das estruturas marcarias os aspectos sensoriais assumem um papel fundamental para a construção da identidade e valor criado nos produtos. Principalmente no mundo do perfume, que oferece uma linguagem e um alfabeto próprio capaz de promover as mais diversas reações físicas e emocionais, conectando e explorando os espaços mais profundos da alma. Os cinco sentidos – olfato, paladar, visão, tato e audição – são assim despertados, direta ou indiretamente, pelo universo da perfumaria. Esse sentimento é traduzido por Patrick Süskind (1985) no livro O Perfume : “As pessoas podem fechar os olhos diante da grandeza, do assustador, da beleza; podem tapar os ouvidos diante de uma melodia ou de palavras sedutoras. Mas não podem escapar ao aroma. Ele é o irmão da respiração, penetra nas pessoas – elas não podem escapar-lhe, caso queiram viver. Bem dentro delas vai o aroma, diretamente para o coração – que faz a distinção entra atração e repulsa, horror e prazer, entre amor e ódio. Quem dominasse os odores dominaria o coração das pessoas.” (SÜSKIND, 1985 Prefácio) O poder e a magia do perfume podem ser explicados pela forma como as fragrâncias atuam. Freqüentemente os aromas aguçam os outros sentidos e funcionam como trampolins para uma série de lembranças, estas classificadas como memória olfativa . A abordagem da dissertação, deste modo, acontece com a investigação do desenvolvimento das marcas comerciais, apresentando a dimensão simbólica da Sandra Penkal INTRODUÇÃO 21 obra Manacá/1927, da pintora e maior representante da arte moderna brasileira Tarsila do Amaral, aplicada a marcas de produtos da Empresa “O Boticário”, com uma interpretação semiótica e sensorial. No Brasil a maioria das indústrias, nos mais diferentes segmentos, ainda não possui uma tradição na utilização de um design fundamentado em elementos caracteristicamente nacionais, derivando assim na reprodução de conceitos desenvolvidos por outros países, processo esse já experenciado no âmbito cultural e artístico antes do movimento modernista. Recentemente, contudo, alguns setores já vêem utilizando recursos e dados nacionais na conceituação, criação e desenvolvimento de produtos de consumo brasileiros. Pode-se aproximar um pouco mais o público da cultura artística e solidificar o design nacional com investimentos na criação e produção de produtos, conforme demonstrado pela empresa “O Boticário” sob análise neste trabalho. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 22 2 ARTE BRASILEIRA O capítulo expõe a conceituação dos múltiplos pensamentos modernos no Brasil, nas primeiras décadas do século passado. Neste cenário, a década de 20 indica a imagem de transformação da cultura nacional, uma vez que além do surgimento da arte moderna no panorama nacional, libertando o Brasil das antigas raízes, inicia-se o processo de edificação da cultura e das aspirações nacionais. A estrutura da cultura brasileira vinha sendo apresentada nas primeiras décadas do século 20, contudo, com a proclamação da República, o Brasil atravessou uma fase tumultuada de afirmação do Estado nacional. Desta maneira, surgiram várias manifestações sobre a configuração da nação brasileira, norteadas por sua tradição e suas revelações artísticas. Indiscutivelmente, os novos ideais representam os aspectos da modernidade do país e de sua sociedade. A década de 20 no Brasil, sobretudo em São Paulo, foi, decisivamente, a era das vanguardas, da inovação, da anulação com o passado e da experiência de uma arte brasileira inédita. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 23 2.1 ARTE - CULTURA BRASILEIRA: TARSILA DO AMARAL Reconhecida como uma das artistas brasileiras mais importantes do século 20, Tarsila do Amaral (1886-1973) natural de Capivari, interior do Estado de São Paulo, Figura 1, foi uma das precursoras do modernismo no Brasil. Vanguardista, revolucionou os conceitos artísticos e, como mulher, representou uma nova geração que apelou pelo espaço feminino, lutando contra a estagnação e o conformismo. De temperamento marcante e espírito inquieto encarou vários preconceitos, na sua vida sentimental e profissional. Figura 1 – Tarsila do Amaral "Auto-retrato – Le manteau rouge", 1923, óleo sobre tela, 73,0 x 60,5cm. (http://www.mnba.gov.br) Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 24 Tarsila foi uma mulher intensa e muito vaidosa, sempre era vista com vestidos elegantes, acessórios exóticos, criando estilo e antecipando. Em seus auto-retratos contínuos, puderam ser registradas a mulher e a pintora nas várias fases da sua vida. Foi uma figura emancipada, viajada, de muitas relações sentimentais, de vários casamentos e separações, uma alma inquieta. O perfil da mulher e da artista Tarsila, deste modo, contribuiu muito para inclusão dos papéis femininos no processo de promoção social das mulheres no Brasil. A originalidade de Tarsila deve-se as suas experiências desde sua meninice, pois que cresceu de forma requintada, porém, em meio a paisagens do campo e gente simples. Teve uma infância muito intensa: vivia na fazenda, convivendo com bichos e plantas, contudo, tinha uma vida rica influenciada pela cultura e consumo Europeu, pois era de família aristocrática. Vários historiadores se dedicam a apresentar a vida da Tarsila, especulando tudo sobre suas fases, tais como a professora Aracy do Amaral, que escreveu três livros sobre a Tarsila, a pesquisadora Nádia Batella Gotilib e uma sobrinha-neta da pintora, que até mesmo tem o seu próprio nome Tarsila do Amaral. A vida artística de Tarsila começou de fato em 1917, porém, em Paris três anos depois, identificou-se com as obras cubistas, dadaístas e futuristas que influenciariam decisivamente na sua obra. Retornando ao Brasil, em 1922, a amiga e também pintora, Anita Malfatti, apresenta Tarsila a amigos intelectuais vanguardistas, que participam da Revista Klaxon: Oswald de Andrade , Mário de Andrade, Menotti Del Picchia, Sérgio Buarque de Holanda e Graça Aranha. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 25 Aproximando-se das idéias modernistas, envolve-se com os novos amigos e integra-se ao famoso Grupo dos Cinco. Com um estilo particular que associa as técnicas do cubismo à temática e cromatismo fortemente próximos com a cultura brasileira, a atuação de Tarsila do Amaral foi admirável. Ao utilizar tintas fortes e alegres, registrou a descoberta de um Brasil interiorano e rural das fazendas onde atravessou sua infância, com muita alegria, naturalidade e simplicidade, na forma de ampliar com cores intensas o cenário interiorano Paulista que Carlos Drummond claramente determinou: “O amarelo vivo, o rosa violáceo, o azul pureza, o verde cantante”. Em todas as fases artísticas de Tarsila, a influência da arte européia é intensa, principalmente dos cubistas como Fernand Léger, André Lothe e Pablo Picasso, porém, assim mesmo, conseguiu incorporar uma alma fascinante de brasilidade à sua obra, repleta de cores e objetos, predominantemente, brasileiros. Neste sentido, a cor é elemento relevante na obra tarsiliana, um fenômeno estudado por especialistas de diversas áreas, porém para a artista sua apropriação ao seu conteúdo sensível e seu potencial expressivo. Segundo o registro da historiadora e crítica de arte Aracy Amaral: "Criada na fazenda, a menina Tarsila tinha natural predileção pelas cores que lhe falavam do calendário das festas populares do interior paulista"... “Ensinaram-me depois que eram feias e caipiras. Segui o ramerrão do gosto apurado... Mas, depois vinguei-me da opressão, passando-as para as minhas telas: azul puríssimo, rosa violáceo, amarelo vivo, verde cantante, tudo em gradações mais ou menos fortes, conforme a mistura do branco. Pintura limpa, sobretudo sem medo de cânones convencionais”. (AMARAL, 1975) Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 26 A pintura de Tarsila chamada “Pau-Brasil", começou com seu professor Fernand Léger, tendo o cubismo como técnica, porém, com uma temática brasileira que apresentou em suas telas fatos e cores do Brasil. A denominação Pau-Brasil foi indicada por Oswald de Andrade porque esta madeira foi o primeiro produto brasileiro a ser exportado. Neste contexto, o movimento sugeria uma qualidade verdadeiramente brasileira e em nível internacional, ou seja, de “exportação”. O conceito de brasilidade, criado por Tarsila por intermédio das formas, cores, grafismo e temática genuinamente brasileira, pode ser apreciado nos quadros "Carnaval em Madureira", 1924; "A Cuca", 1924; "Auto-Retrato", 1924; "O Pescador", 1925; "Religião Brasileira", 1927 e "Manacá", 1927, entre outros. Para presentear Oswald de Andrade, seu marido na ocasião, em 1928, pintou o “Abaporu”, Figura 2. Este ficou impressionado com a obra e foi motivado a criar o Movimento Antropofágico. Figura 2 - "Abaporu", 1928, óleo sobre tela, 85 x 73 cm. Coleção Eduardo Costantini, Buenos Aires. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 27 Pela primeira vez no Brasil, em 1929, expôs individualmente; em 1933, deu início à pintura social com a obra “Operários”, Figura 3. No ano seguinte participou do I Salão Paulista de Belas Artes e trabalhou, de 1936 a 1952, como colunista nos Diários Associados. Nos anos 50 voltou ao tema “Pau-Brasil” e participou, em 1951, da I Bienal de São Paulo. Na VII Bienal de São Paulo, em 1963, recebeu um espaço especial e no ano seguinte uma participação especial na XXXII Bienal de Veneza, Itália. Figura 3 – “Operários”, 1933, óleo sobre tela 15 X 205cm, Assinado "Tarsila 1933" - Col. do Gov. do Estado de São Paulo. (http://www.pinturabrasileira.com) Com a morte de Tarsila do Amaral, aos 86 anos, em 17 de janeiro de 1973 a sociedade herdou uma coleção preciosa, com mais de duzentos quadros, desenhos e esculturas. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 28 O alcance da obra de Tarsila do Amaral oferece um valor além do exame artístico. Por meio da sua obra e de seu desempenho no setor da política e da arte, Tarsila do Amaral foi uma referência da sociedade brasileira no século 20, conjeturando as incoerências, as vulnerabilidades e a energia do movimento modernista Brasileiro. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 29 2.2 MOVIMENTO MODERNISTA NO BRASIL O começo do século 20 foi caracterizado por múltiplos fatos, em específico a Primeira Guerra Mundial, com início em 1914, transformando toda a estrutura social e cultural do mundo ocidental. Com o novo cenário pós-guerra, atacado pela urbanização, pela velocidade e pelo imediatismo, surge a necessidade de uma nova linguagem e forma de expressão em todos os setores da cultura. No Brasil, além dessa influência, existia ainda a necessidade de uma forma de expressão que elucidasse a particularidade brasileira, a identidade de um povo nascido da mescla entre negros, índios e portugueses, e que congregasse, naquele instante, por meio do grande movimento imigratório, outras culturas, sobretudo a italiana. Deste modo, nas primeiras décadas do século, o movimento modernista inseriu no Brasil maneiras inéditas de produzir arte e de se pensar, inovando desde as artes plásticas até o teatro, passando pela arquitetura e pela música. A cidade de São Paulo teria impulsionado os modernistas na busca por esta identidade em razão da fusão de sotaques e costumes trazidos pelos imigrantes, do novo jeito de falar português e suas peculiaridades. A busca de um caminho próprio, de expressão e de identidade brasileira, aberta para o novo e para os povos que aqui chegavam, marcava a superação da forma de expressão que se passava na Europa, o academismo, e diferenciava as motivações do modernismo brasileiro e do europeu. No Brasil, ao contrário da Europa, os modernistas queriam exaltar as tradições locais, indo na direção do popular, da arte colonial. Os modernistas Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 30 brasileiros também ansiavam por novos caminhos estéticos, que remetessem de maneira mais próxima a nossa nova realidade, aliando informações das vanguardas, como: o Cubismo, o Futurismo e o Expressionismo. As principais cidades brasileiras, em especial a cidade de São Paulo, presenciaram, contudo, uma mudança acelerada em função do contexto industrial. Na época da 1ª Guerra Mundial (1914-1918), iniciou-se o impulso da industrialização e da urbanização. Como conseqüência, o país presenciou o nascimento de uma burguesia industrial potente, porém marginalizada pela política econômica do governo Federal, orientada para a produção e exportação do café. Simultaneamente, crescia admiravelmente o número de imigrantes europeus (especialmente italianos) que eram encaminhados para as regiões economicamente prósperas, seja para a zona rural onde existiam plantações de café, seja para a zona urbana onde se encontravam as indústrias. Como resultado, em São Paulo, podiam ser observadas várias raças e culturas, panorama propício para a realização de um acontecimento que divulgasse uma arte original, contra o conservadorismo. Mário de Andrade afirmou: "São Paulo era espiritualmente muito mais moderna, porém fruto necessário da economia do café e da industrialização conseqüente. São Paulo estava, ao mesmo tempo, pela sua atualidade comercial e sua industrialização em contato mais espiritual e mais técnico com a atualidade do mundo". (ANDRADE, 1922) A Semana de Arte Moderna de 1922, entre os dias 11 e 18 de fevereiro, com a exposição de artes plásticas e três espetáculos, sessões de dança, literatura e Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 31 música, foi um marco do movimento modernista brasileiro. As idéias revolucionárias, o movimento representado por Mário de Andrade, Anita Malfatti, Tarsila do Amaral, Oswald de Andrade e Manuel Bandeira, entre outros, balançou as estruturas da cultura em vigor, mudando decisivamente os rumos da arte brasileira no século 20. A investigação modernista de combinar e aspirar o novo e o antigo, para desvendar a realidade e a identidade brasileira, foi resumida no Manifesto Antropológico de Oswald de Andrade que ganhou cores com a obra “Abaporu” de Tarsila do Amaral e tornou-se literatura em “Macunaíma” de Mario de Andrade. 2.2.1 Manifesto Antropófago O Manifesto Antropófago, reúne frases de Oswald de Andrade como: ...”Só a antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente. Única lei do mundo. Expressão mascarada de todos os individualismos, de todos os coletivismos. De todas as religiões. De todos os tratados de paz. Tupy, or not tupy: that is the question. Contra todas as catequeses. E contra a mãe dos Gracos. Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago. ...... Foi porque nunca tivemos gramáticas, nem coleções de velhos vegetais. E nunca soubemos o que era urbano, suburbano, fronteiriço e continental. Preguiçosos no mapa-múndi do Brasil. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 32 Uma consciência participante, uma rítmica religiosa. Contra todos os importadores de consciência enlatada. (OSWALD DE ANDRADE - Em Piratininga Ano 374 da Deglutição do Bispo Sardinha."3 ) A aceitação do público não foi totalmente favorável ao movimento, uma vez que as pessoas estavam mais acostumadas com a arte em moldes tradicionais e acadêmicos. A despeito do choque de 1922, o processo de consolidação dos novos imaginários estéticos foi gradativo, extremamente vinculado às viagens dos artistas ao continente europeu. A situação do pós-guerra provocou nos europeus uma obrigação pela desconstrução das estruturas, pelo desligamento com o tradicional. O clima era propício ao estouro do movimento, em 1922, visto que a preparação modernista calhou com os preparativos do centenário da Proclamação da República. Inversamente, as comemorações oficiais do centenário da Independência, os modernistas organizavam um evento próprio. Os recursos para a festa da revolução partiram da burguesia paulista como de Paulo Prado e Graça Aranha. Diplomata e membro da Academia Brasileira de Letras, Graça Aranha emprestava sua reputação ao movimento. O Correio Paulista, organismo praticamente oficial do Partido Republicano Paulista (PRP), difundia o ideal do movimento, uma vez que tinha Menotti del Picchia como chefe de redação. O poema de Manuel Bandeira "Os Sapos", lido por Ronald de Carvalho, caçoando dos parnasianos ocasionou a gritaria de grande parte dos presentes. A apresentação de Villa-Lobos foi atribulada, especialmente porque se avaliou que fosse ‘futurismo’ o artista se apresentar de casaca e chinelo, porém o compositor 3 Andrade, O. Revista de Antropofagia, São Paulo, n.1, ano 1, maio de 1928. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 33 estava apenas com um calo arruinado. A revolta maior dos conservadores, contudo, era contra as novas manifestações da arte plástica e da nova literatura. No transcorrer dos anos, contudo, as considerações definidas pelos modernistas passaram a não assombrar mais, e foram, abertamente, aceitos. Na segunda fase do Modernismo, recheadas pelas circunstâncias históricas, os artistas e os intelectuais foram forçados a declarar disposição política diante aos grandes temas daquele momento. As promoções dos extremos políticos foram grandes e alguns optaram pela esquerda, outros pela direita e alguns ficaram no meio do caminho. Neste cenário brotou o conto social, especialmente no Nordeste, com grande carinho esquerdista. A segunda fase do Modernismo (1930 a 1945) solidificou-se por meio de uma percepção modernista com escopo social e introspectiva, sem a necessidade de contestação, manifestos e movimentos de rebeldia contra o existente. Neste momento os modernistas apropriaram-se do direito à pesquisa e à liberdade estética, expondo, assim, as correntes de vanguarda, como: o Cubismo, o Futurismo, o Dadaísmo e o Surrealismo. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 34 2.3 O ESTILO CUBISTA O Cubismo respeitado como um marco da arte ocidental, rejeita o conceito de arte como reprodução da natureza, recusando dados como perspectivas e modelagem, assim como qualquer condição de efeito ilusório. Formas que se mostram em planos geométricos, cubos e volume restabelecem, concomitantemente, por diversos ângulos na obra. Nesta ambiência são contemplados elementos como instrumentos musicais, garrafas, frutas, paisagens e corpos. As origens do cubismo encontram-se na Paris de 1907, ano em que Pablo Picasso, artista espanhol (1881-1973), pintor, escultor, artista gráfico e ceramista, expôs o quadro extraordinário denominado “Les Demoiselles d`Avignon”, Figura 4. Figura 4 - Les Demoiselles d'Avignon. Pablo Picasso, 1907. Óleo sobre tela. The Museum of Modern Arts, New York, USA. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 35 "A Arte não é a verdade. A Arte é uma mentira que nos ensina a compreender a verdade". Pablo Picasso Algumas das marcas essenciais do Cubismo são as figuras divididas em planos e contrariando a perspectiva convencional. Instituem-se configurações geométricas como cubos e cilindros, que agregam a composição de figuras humanas e objetos. Genericamente, as cores limitam-se ao marrom, ocre, preto e cinza. Ao mesmo tempo, o cubismo pode ser caracterizado por duas particularidades básicas: nesta arte não é aceitável marcar o que é imagem principal e o que é o fundo da tela; e, a figura é apresentada por diversos pontos de vista. Deste modo, uma figura pode apontar, ao mesmo tempo, um homem de frente e de perfil. O cubismo rompeu com a idéia de perspectiva. O pintor francês Henri Matisse (Henri Émile Benoît Matisse), também desenhista e escultor, em 1908, aplicou e denominou a arte como “cubismo”. O cubismo pode ser dividido em duas fases consecutivas e distintas: a Analítica, de 1907 a 1912, quando predominaram as formas geométricas e as obras mostravam uma ponderação meticulosa da composição dos elementos e sua afinidade com o ambiente ao seu redor; e, a Sintética, após 1912, quando foram utilizados pedaços de jornal para compor a obra. Pablo Picasso e Georges Braque (1882-1963), um pintor e o outro escultor francês, foram os precursores das novas formas cubistas de representação e tiveram grande influência da produção de Paul Cézanne, pintor francês (1839-1906) aplicava figuras geométricas quando pintava a natureza, por descobrir nesta o cilindro, o cone e a esfera. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 36 O movimento cubista no Brasil influenciou vários artistas, entre eles Tarsila do Amaral, Di Cavalcanti e Brecheret , Figura 5. Figura 5 - “Mulher”, Victor Brecheret, 42 cm de altura, feito em bronze, década dos 30, séc 20 (http://www.pinturabrasileira.com) O Cubismo brasileiro foi apreciado em obras de alguns dos artistas ligados no modernismo de 1922, em determinadas obras de Antonio Gomide (1895 - 1967), Figura 6, Vicente do Rego Monteiro (1899 - 1970) e, principalmente, na obra de Tarsila do Amaral (1886 - 1973). Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 37 Figura 6 - Sem Título (Cabeça de Cristo), Antonio Gomide c. 1925. Óleo sobre tela, 35,5 x 27,5cm. (http://www.pinturabrasileira.com) O Cubismo propõe a concepção dos objetos com todas as suas partes num mesmo plano. É como se eles estivessem abertos e apresentassem todos os seus lados no plano frontal em relação ao espectador, de tal modo, esta maneira de alterar os elementos não tinha qualquer combinação de fidelidade com o aspecto fidedigno das coisas. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 38 2.4 PINTURA MANACÁ: UMA ANÁLISE SOB O PONTO DE VISTA ESTÉTICO A obra “Manacá” (1927), Figura 7, é uma das principais do movimento modernista brasileiro e da produção de Tarsila do Amaral. Com aspectos cubistas dos anos 20, esta pintura apresenta algumas influências do cubismo europeu, não na temática, mas no aspecto pictórico, lembrando algumas vezes Léger: o pintor cubista francês, internacionalmente famoso como um dos mestres do século 20 e um dos mais reconhecidos cubistas. Figura 7 - “Manacá“, Tarsila do Amaral, óleo sobre tela, 76,0 x 63,5cm, 1927. Assinado e datado c.i.e. “Tarsila 1927”, Coleção Simão Mendel Guss, São Paulo Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 39 Caracterizado por um arbusto (tipo cactus) ornamental brasileiro conhecido, a obra é retangular, mede 76 x 63,5 cm, e é uma pintura que representa: um manacá no centro, no primeiro plano cactos e flores e no segundo plano, ao fundo, duas montanhas. Apesar de sugerir planos, a pintura tem característica “chapada”, mais plana, com pouco volume e sombreados. Tarsila busca o tema das raízes brasileiras, em suas viagens pelo interior do Brasil, sob o seu “olhar artístico” : nas paisagens, no aroma das flores, nas bandeirinhas coloridas e do povo caipira em suas casas. A obra “Manacá” é assimetricamente equilibrada, bidimensional em sua essência, possui ligeiras alterações na inclinação das pétalas e das corolas, em um sutil equilíbrio entre repetição e variação, criando uma espécie de "simetria irregular", que confere ao conjunto um delicado equilíbrio dinâmico, e o ponto de equilíbrio pode ser encontrado exatamente na parte central do quadro. Para análise gráfica da composição, propõe-se o traçado de dois eixos sobre a pintura: horizontal e vertical, que facilita a análise em quatro quadrantes, Figura 8. O eixo horizontal divide a pintura em duas metades e suas formas são orgânicas. Na parte superior predominam linhas curvas, nas montanhas e na copa quase circular. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 40 Figura 8 – Análise dos planos 1 a 4 que compõem a obra de Tarcila do Amaral, “Manacá”. O formato das flores na copa confere leveza, a copa possui quatro flores no centro com oito folhas ao redor, o tronco foi reduzido a uma forma retangular verde, com um sombreado que sugere volume cilíndrico. A flor central, rosa é formada por seis pétalas com forma de gota, que convergem para um mesmo ponto central do eixo vertical. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 41 Além da representação bastante estilizada, destaca-se uma outra licença poética, ou melhor, pictórica: O “Manacá” de Tarsila tem uma flor rosa e três roxas, que confere uma estilização ainda maior, pois na natureza só encontramos manacás com flores de uma só cor, rosa ou roxo. O mesmo ocorre com os cactos: eles são livremente coloridos como as flores. As flores que ficam atrás da flor central, seguem o mesmo padrão anterior. Parece, que se estivessem descobertas, também teriam oito folhas. Os elementos da parte inferior, algum tipo de planta, são estilizados: é a liberdade que tanto se vê na obra de Tarsila. Ponto marcante que caracteriza a obra de arte. Ela se afasta da descrição e cria novos significados. As flores possuem o mesmo padrão, e as folhas têm inclinação variada, sugerindo movimento, evitando a simetria estática. As do lado esquerdo obedecem a seguinte regra: uma folha e uma pétala sucessivamente e a do lado direito tem outras variações: uma folha a cada duas pétalas e uma folha atrás de uma pétala rosa e duas roxas. As formas não são totalmente planas. Elas possuem certo volume, mas Tarsila não se preocupou em demonstrar uma tridimensionalidade. Percebe-se o direcionamento pictórico na verticalidade, tanto dos cactos, como das flores, no sentido de baixo para cima, Figura 9. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 42 Figura 9 - Na obra de Tarcila do Amaral, “Manacá”, observa-se direcionamento pictórico na verticalidade, tanto dos cactos, como das flores, no sentido de baixo para cima. Ao considerar a análise cromática da obra “Manacá”, a escala tonal expressa luz e sombras, nota-se que ambas possuem variedades de intensidade. Tanto forte como mediana até intensa, fato este importante para que se possa dar um clima ideal à obra. De um modo particular, Tarsila não usou cores primárias nesta obra, enfatizou apenas as cores secundárias e terciárias. Interpreta-se essa variedade de tons em um gráfico chamado escala tonal, utilizado tantos os tons mais claros para dar ênfase numa cena, como tons variados e cheios de graduações até os opostos, ou melhor, tons claros e escuros totais: o alto contraste. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 43 A escala cromática da obra “Manacá” pode ser analisada na Figura 10 que apresenta os tons claros, medianos e escuros. Figura 10 – Grupos de tonalidades de cores usadas na obra “Manacá” de Tarsila do Amaral. Para efeito de análise dividiu-se a obra em detalhes, Figura 11, de acordo com o seu cromatismo. Figura 11 – Divisão da obra “Manacá” de Tarsila do Amaral para uma análise de seu cromatismo. Cada um dos detalhes, assinalados na Figura 11, pode ser evidenciado como mostra a Figura 12. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 44 1 2 3 4 Figura 12 – Detalhes da obra “Manacá” de Tarcila do Amaral em função do cromatismo. 1: Flores Rosas; 2: Flores Roxas; 3: Vegetação Verde; 4: Montanhas Azuis. Sandra Penkal ARTE BRASILEIRA 45 Pode-se descrever o “Manacá” como uma obra figurativa que expressa calma, equilíbrio e tem uma fruição tranqüila buscando um clima bucólico do campo. Foi o resultado de investigação de temas que representassem as raízes brasileiras, de forma estilizada, concebida por meio de uma flor típica do interior do Brasil. Planos mais geométricos e volumes compõem a obra que se revela, ao mesmo tempo, por múltiplos ângulos na tela. A apreciação de brasilidade, agregado por Tarsila por meio das formas, cores, grafismo e temática genuinamente brasileira, registrou a descoberta de um Brasil interiorano e rural com muita naturalidade e simplicidade. Esta proposta vinha ao encontro do movimento cubista modernista, em vigor no período, que cedeu o conceito de arte não como reprodução que perfizesse a própria natureza, mas sim que abrisse uma característica para o efeito ilusório. Também, por meio desta temática artística e nacionalista, atualmente estão fundamentados alguns conceitos de design e posicionamento de produtos. Este assunto, entretanto, será abordado no próximo capítulo, com mais detalhes, analisando-se a inter-relação entre a arte, o design de produtos e algumas marcas comerciais, sob uma perspectiva semiótica. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 46 3 A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM Neste capitulo é feita uma análise sobre a inter-relação entre a arte, o design de produtos e algumas marcas comerciais, sob um olhar semiótico. Segundo Winfried Nöth “Semiótica é a ciência dos signos e dos processos significativos (semiose) na natureza e na cultura”. (NÖTH, 1995 p. 19). O design pode ser estudado por múltiplas áreas e ângulos teóricos e práticos de investigação distintos, entre outros: antropológicos, históricos, filosóficos, psicológicos, sociais, econômicos, políticos e culturais. Propõe-se, contudo, uma análise dos aspectos do design por meio da relação triádica: Arte - Design - Marca. Faz-se aqui uma breve introdução à semiótica peirceana aplicada ao design, como um dos referenciais teóricos atualmente indispensáveis para o desenvolvimento tanto de produtos como de peças de programação visual. A reflexão da interdisciplinaridade para o estudo no design vem apresentando um grande potencial de investigação, uma vez que as informações existentes são muito recentes e escassas. Como objeto de estudo avalia-se a utilização da obra “Manacá”/1927, da pintora Tarsila do Amaral, com o emprego de símbolos na marca como parte integrante da identidade do produto, por meio da conexão existencial entre imagem e objeto, expressa no design da Linha de Produtos de Perfumaria “Tarsila”, desenvolvida, em 2002, pela Empresa “O Boticário”, em Curitiba/Brasil, Figura 13. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 47 Figura 13 – Design da Linha de Produtos de Perfumaria “Tarsila”, desenvolvida, em 2002, pela Empresa “O Boticário”, em Curitiba/PR. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 48 3.1 ANÁLISE SEMIÓTICA A sociedade sempre se valeu de formas de expressão e linguagem no processo de comunicação social. A estrutura de desenvolvimento do produto “Tarsila”, assim sendo, apresenta uma base semiótica, com o emprego de referências artísticas como dados simbólicos que acrescentam e potencializam o valor comercial como marca de produto. Hoje, grandes artistas e suas obras são referenciadas como elemento de design em mercadorias e produtos, montados em vitrines de lojas, shoppings e sites. Os frutos destes artistas tornam-se uma fórmula e apresentam características que serão utilizadas pelo design e vestir, comunicar e diferenciar a marca de produtos, e campanhas publicitárias. Usar obras de artistas como símbolos - meios complementares da identidade da marca e do produto - expandem também o apelo mercadológico no contexto comercial. Reforça-se a marca com símbolos potentes que atribuem associação e estrutura à sua identidade, maior revestindo-a, deste modo, com uma atitude mais fácil e instantânea de ser reconhecida e lembrada. Esta apresentação simbólica torna-se essencial na criação da marca. Lúcia Santaella cita no prefácio do livro Signos da Marca de autoria de Clotilde Perez (2004): “Os efeitos pragmáticos da marca são emocionais, afetivos, reativos e cognitivos e são capazes de produzir reação no consumidor (...). Os signos são valores agregados às marcas e mercadorias - valem mais do Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 49 que elas -, sendo o produto medido pelo valor de coeficiente de fantasia corporificado”. (SANTAELLA apud PEREZ, 2004 p. 25) A marca representa uma ferramenta potente na comunicação mercadológica, na identidade institucional e nos valores do bem simbólico e do signo social que idealiza e representa. O desenvolvimento e estudos de comunicação tomaram impulso a partir da Revolução Industrial, em meados do século 19, neste sentido consideram o olhar semiótico que amplia a consciência semiótica. No processo de ressignificação da obra, a marca pode aproximar o consumidor comum do mundo artístico, difundir suas obras e acessar sua interpretação. Observa-se também uma ressignificação invertida no trabalho de criadores como Andy Warhol (1928-1987), Figura 14, artista plástico da Arte Pop e iconógrafo norte-americano que reproduziu imagens de latas de Coca-Cola, Figura 15, e de personalidades famosas, sentindo-se interessado na sedução que as marcas provocavam no público. Sua competência de fusão amolda os desejos dos consumidores, potencializando-se quando o consumidor associa a produção artística aos produtos de design. No mundo atual, os princípios de marketing foram expandidos não só pela orientação da venda de produtos/serviços, mas pela força conquistada pelas marcas nas convergências culturais e comportamentais. Sua competência de fusão adapta os desejos dos consumidores, expandindo igualmente quando o consumidor associa a produção artística aos produtos de design. Tais reflexões de marketing e marcas, entretanto, serão abordadas com maior profundidade no próximo capítulo. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 50 Figura 14 - Andy Warhol - Auto-retrato. (http://www.warhol.org) Arte Contemporânea em Fotografia, 1966. Figura 15 - Três garrafas de Cola (Three Coke Bottles). Andy Warhol. Tipo: Lamina / Tamanho: 61x 81 cm (http://www.warhol.org) Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 51 Produtores, designers, anunciantes e consumidores promovem a circulação e a transformação de significados culturais entre várias esferas do mundo social, pois vivem em um ambiente no qual as mídias estão, a cada dia, mais presentes e agressivas. As significações e ressignificações manifestam-se com freqüência por intermédio da arte, inclusive nas embalagens de produtos. Pode-se observar, deste modo, o trânsito entre Arte × Design para o Design × Arte. Evidencia-se nesta situação, como as revelações da marca influenciam os consumidores e constituem signos poderosos de produtos, dinâmica que serve para ilustrar as principais concepções clássicas sobre a mente e a cognição humana, que se apóiam na estrutura geral dos signos e nas condições elementares da significação. Segundo apostilado por Clotide Perez (2004): “Aplicando uma carga simbólica: a marca é uma conexão simbólica e afetiva estabelecida entre uma organização, sua oferta material, intangível e aspiracional, e as pessoas para as quais se destina”. (PEREZ, 2004 p. 10). Na sociedade comercial as marcas reforçaram seu poder como signos complexos de posicionamento social. Sua força provoca e permite sua adaptação à representação do desejo de cada consumidor (ressignificação). Um símbolo forte pode reunir, dessa maneira, a associação, a ligação, a coesão e a estrutura a uma identidade, possibilitando que a marca se torne facilmente distinguida e lembrada. Neste sentido, o consumidor acessa e faz escolhas baseadas em produtos que combinam com seu estilo de vida ou que representam um novo conceito estimulante, uma experiência desejável. A cultura visual, deste modo, passa a ser entendida como exemplo abrangente das tendências mais avançadas da chamada Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 52 sociedade pós-industrial, que conecta e reelabora o passado ao presente atual, sem resolver um no outro, mas visualizando a atração recíproca. Acredita-se que, em todos os tempos, os humanos sempre apelaram a formas de demonstração, de manifestação de sentido e de comunicação social e outras formas de linguagem. Observa-se, assim, que esta abordagem sinestésica surge na constituição de marcas comerciais, nas quais os sentidos e a percepção se processam diretamente entre as sensações de estilo distinto, contudo intensamente conectadas na aparência. Na intersecção de sensações, nas associações de palavras ou expressões, é que acontecem os ajustes de sensações distintas numa só impressão, que conduzem a um fenômeno de associações constantes de impressões derivadas de comandos sensoriais diversos. Para a formação e o aperfeiçoamento do design, presta-se a teoria semiótica de Peirce aplicada ao design, como um dos referenciais teóricos atualmente indispensáveis para o desenvolvimento tanto de produtos, conceitos como peças de programação visual. Neste sentido, a cultura atual também pode ser interpretada como uma rede de conversações, e entendida por meio de discursos que nela são expressos e que se iniciam nas conversações entre indivíduos, estendem-se às comunidades e, por fim, a todo o âmbito cultural e conceitual. Décio Pignatari3 cita: “Marca do tempo, tempo da marca (...). Signo icônico-simbólico da identidade visual da empresa ou instituição, a marca é a clicagem-mestra 3 Décio Pignatari. Poeta, advogado, professor e publicitário. Nascido em Jundiaí, SP, formado pela Faculdade de Direito da Universidade de SP. Doutorou-se em 1973 e tornou-se professor de Teoria Literária no curso de pós-graduação da PUC-SP. Vive e trabalha em São Paulo. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 53 inicial do seu hipertexto informal e comunicacional, no que respeita os produtos e serviços que se inserem nas redes dos processamentos mercadológicos, incluindo os culturais”. (PIGANTARI apud CAUDURO; MARTINO, 2005 - Prefácio) A relação comunicação/imagem tornou-se uma área potencial da semiótica, e pode ser resultado da imaginação consciente ou inconsciente, que segundo Clotilde Perez (2004) apresenta o conceito de imagem, “Poderíamos afirmar ainda que a imagem diz respeito a um conjunto de experiências, impressões, posições e sentimentos que as pessoas apresentam em relação a sua empresa, produto, personalidades etc. Imagem é um conjunto de signos distribuídos em um espaço concreto, virtual ou no pensamento.” (PEREZ, 2004 pg.147) Neste sentido, Santaella e Nörth (1998) apresentam o conceito de imagem por intermédio do aspecto visual e mental. “O mundo das imagens se divide em dois domínios. O primeiro é o domínio das imagens como representações visuais: desenhos, pinturas, gravuras, fotografias e as imagens cinematográficas, televisivas, holo e infográficas pertencem a esse domínio. Imagens, nesse sentido, são objetos materiais, signos que representam o nosso meio ambiental e visual. O segundo é o domínio imaterial das imagens na nossa mente. Neste domínio, imagens aparecem como visões, fantasias, imaginações, esquemas, modelos ou, em geral, como representações mentais." (SANTAELLA; NÖRTH, 1998 p. 15) Pode-se dizer que a configuração de uma imagem é constituída por similaridade com o objeto representado, entretanto, em alguns momentos a sua representatividade não está assegurada apenas pela semelhança. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 54 Para entender a multiplicidade de signos que existem em nossa sociedade, pode-se utilizar os conceitos de Peirce, com a concepção das formas de classificação. Esta categorização tem como objetivo entender como o signo aparece; a que ele se refere e que tipo de efeitos pode causar em uma mente interpretadora. Surgiram desta maneira as chamadas tricotomias: quali-signo, sin-singo e legissigno (como o signo aparece); ícone, índice e símbolo (a que ele se refere); rema, dicente e argumento (que efeito causa). Na teoria dos signos de Peirce, quando o signo é sensivelmente semelhante ao objeto que representa, ou seja, quando o signo afeta um ou mais sentidos de um modo parecido como o objeto representado afeta um ou mais sentidos, este signo é denominado índice. Na categoria sígnica o índice é um signo que representa um objeto porque é a conseqüência natural de si mesmo, assim como a realidade de um objeto é um índice de todo o trabalho envolvido em sua produção. O terceiro elemento dessa tríade classificatória da teoria de Peirce é o símbolo, signo que representa um determinado objeto, graças a uma convenção, geralmente determinada por algum processo cultural, teórico ou arbitrário. Ao se comunicar, o homem emprega códigos ordenados na base de todos os canais sensíveis existentes do corpo: códigos visuais, sonoros, táteis, olfativos e gustativos; códigos que se manifestam em mais de uma destas bases sensíveis; códigos que usam concomitantemente mais de uma base sensível para se transformar em enunciados; e, códigos que podem ser explicados de uma base Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 55 sensível para outra. Estes códigos são formados por signos e organizados por certas leis de combinação (que de algum modo são, também, signos de procedimentos). Conforme o discutido, o embasamento da semiótica peirceana encontra-se na teoria geral dos signos, deste modo, a teoria triádica do signo, elaborada por Peirce, fundamenta-se no signo e suas relações com aquilo que representa o objeto/ referente e com suas conseqüências, entendidos como interpretantes. O resultado desta relação/comunicação é a inquietação que essencialmente brota em forma de sentimento e emoção, posteriormente retorna como pensamento, e finalmente é revelado em conceitos racionais. Para fins desta dissertação os aspectos mercadológicos , como o design e a marca, são essenciais. Quando entendida como figura de representação, a linguagem visual sempre se corporifica; desta forma o índice aponta para algo do qual é uma parte no seu aspecto existencial. Como já mencionado, no perfume Tarsila o objeto imediato do índice é a maneira como é capaz de indicar aquele outro existente, no caso a obra Manacá, seu objeto dinâmico, com o qual ele mantém uma conexão existencial, tornando-se Índice (Signo Indexical). Para Tarsila, no entanto, o outro existente é a flor do manacá em um cenário interiorano, e o índice se corporifica com a obra “Manacá”, Figura 16. Neste aspecto, qualquer ser existente é uma síntese de múltiplas determinações, pois existir é ocupar um lugar no tempo e no espaço e reagir em relação a outros seres existentes, por isto apontam para infinitas direções, e cada direção é uma de suas referências possíveis. No próximo tópico, contudo, o Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 56 perfume Tarsila será analisado de maneira mais detalhada, e com a análise semiótica aplicada ao seu design. Tríade Semiótica Peirceana SIGNO ou REPRESENTAMEN Ícone – Primeiridade Notas olfativas = Elementos Sensoriais OBJETO Índice - Indica Secundidade Referencia obra Manacá Perfume INTERPRETANTE Interpretante Funcional Qualidade,Garantia, Ergonomia Marca Símbolo Terceridade Interpretante Emocional Poder, Elegância, Charme, Status Figura 16 – Tríade semiótica peirceana em que se observa a distribuição do Signo, Objeto e Interpretante nos vértices do triângulo. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 57 3.2 ANÁLISE DE DESIGN A história do design traça as suas origens no apogeu da Revolução Industrial, embora o homem sempre esteja produzindo, artesanalmente, produtos para seu uso e comunicação. A produção em série de produtos para consumo das massas exigiu rigor no projeto e raciocínio inédito, de modo que surgissem novos profissionais que, apesar de não executarem os produtos, projetavam-nos. Neste sentido, Wilton Azevedo, brasileiro, professor universitário, semioticista, poeta e autor de vários livros, argumenta: “ A estética do final do século passou a ser uma ferramenta que tenta lapidar tudo que já foi discutido e realizado pelo homem. O design surge no mundo quando o homem começa a fazer suas primeiras ferramentas, e o designer continua a lidar com ferramentas. A diferença é que sua ferramenta hoje é o prório ato de gerar informação”. (AZEVEDO, 2005 p. 11) O termo “design” tem sua origem na língua inglesa e refere-se a um certo esforço criativo, seja bidimensional ou tridimensional, segundo o qual se projetam diversos objetos ou meios de comunicação para uso humano. Desta maneira, ele pode ser traduzido como desenho, mas não se refere diretamente ao ato de desenhar. O termo é de tradução, por isto nos países de língua portuguesa costumase adotar a palavra original. O profissional que trabalha na área de design é denominado designer. O surgimento formal do design ocorre com as experiências da escola alemã Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 58 Bauhaus4. O design como projeto, divide normalmente a disciplina em algumas áreas: Design Grafico , Produtos, Embalgem, Web e outras. O entendimento e a reflexão da distinção do design como atividade ou como área de conhecimento, tem acarretado muitos questionamentos, como o próprio conceito de design, questões metodológicas em design, natureza do design, entre outras. Além destes o design foi enriquecido com as áreas como a Psicologia e Psicanálise. Ponderando a relação triádica Arte-Design- Marca, defende-se a idéia de que o Design está ligado ao mundo da estética, mas não necessariamente ao mundo da Arte. O designer se comporta como um sujeito racional e sistemático, capaz de explicitar, passo a passo, o método utilizado na resolução de um determinado problema. Conforme Gui Bonsiepe5 (1983), a relação de conflito entre os conceitos intuitivo e sistemático levam à dualidade entre arte e função, assim, vale advertir que a arte transporta uma aura do artista intimista, da liberdade de expressão e da espontaneidade. A proposta da função, portanto, demanda precisão, controle e planejamento. A polemica dentro da alma de atuação do designer, reforça a idéia do Design ora como Arte, ora como Ciência, pois a relação entre Design e Ciência é um tema que tem sido discutido com grande ênfase. 4 Bauhaus: foi uma das mais influentes escolas de design do mundo. Sua forte inspiração modernista tentou unir, de forma definitiva, a arte com a indústria. Fundada a partir do manifesto de Walter Gropius, em 12 de abril de 1919, a Bauhaus tem suas origens na fusão entre a Academia de Artes e a Escola de Artes e Ofícios da Alemanha. 5 Gui Bonsiepe, é um dos maiores teóricos do Design da atualidade. Nascido na Alemanha, em 1934, Bonsiepe formou-se designer pela Universidade de Design de Ulm (HfG). Trabalhou como docente e pesquisador na área. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 59 O design pode ser estudado à luz da ciência, entretanto ele não pode ser entendido ou estabelecido como tal, pois apresenta um processo dinâmico, orientado para um objetivo definido. A Ciência, por seu lado tem como objetivo a concepção do conhecimento. A relação entre Design e Arte foi também debatida por Albert Alessi, designer italiano de importância internacional, que abordou esta relação considerando não a apenas a Ciência, mas a tecnologia e o mercado. Conforme Alessi, existem duas abordagens fundamentais para o design que são distintas e, até certa medida, conflitantes. Como primeira abordagem o design é associado ao processo industrial de produção em massa, no qual figura a tecnologia e o mercado. Este olhar restritivo do Design o reduz ao plano de instrumento tecnológico, que contribui apenas com a indústria de modo a produzir mais e impulsionar as ações de marketing e vendas. Na segunda abordagem o design aproximas-se da Arte e da Poesia. Alessi (1992) cita que, em nossa sociedade, os objetos tornaram-se um canal de comunicação importante, pelo qual os indivíduos expressam valores, status e personalidade. Cada dia, os indivíduos adquirem mais produtos por deleite intelectual ou espiritual. Utilitários e objetos que congregam Arte e Design não são utilizados, fundamentalmente, na sua função primária, mas para outros usos e por outras razões. Conforme Alessi (1992), a sociedade, tem necessidade crescente de consumir Arte e Poesia e esta necessidade não pode ser satisfeita apenas pelas formas estéticas clássicas que são oferecidas pela Arte em museus e pela Poesia em livros. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 60 O design, para Alessi (1992), tende a tornar-se uma disciplina criativa global que propiciará o nascimento de objetos totalmente novos, de coisas destinadas a serem valorizadas de forma diferente do valor de uso ou de troca. Esta disciplina seria responsável pela transformação de um imenso potencial criativo em objetos reais e viria ao encontro do crescimento dramático da necessidade de Arte e Poesia na sociedade. Ampliando um pouco mais o foco de discussão em torno da tríade Arte-Design-Ciência, as implicações da criatividade sobre a atividade de projeto, as fronteiras entre os vários campos da Arte e entre os vários campos da Ciência, na maioria das vezes, são longas e em muitos casos os caminhos se justapõem. Sob este foco, chega-se à conclusão que o design é tanto uma área do conhecimento humano como uma arte ou ciência aplicada. O design contém uma parte subjetiva e outra objetiva, sendo esta ligada à consciência à ciência e a parte subjetiva da imaginação e criatividade. Estes dois aspectos aliados formam o conceito de design. Conforme reflete Wilton Azevedo (2005): “A palavra design vem do inglês e quer dizer projetar, compor ou colocar em prática um plano intencional. É muito fácil imaginar que Van Gogh compôs visualmente seus quadros, e não podemos descartar que, para um dos maiores pintores do impressionismo, tenha havido intenção ou um plano a priori de uma pintura em forma de esboço ou rough. Então por que Van Gogh não era um designer ? Se, ao pintar seus girassóis, ele estava tentando comprovar que a luz emitida pelo quadro se faz através de pontos contínuos e suas cores complementares, estava pensando como pintor. Mas se ele vivesse para ver a reprodução de massa, e ao pintar os girassóis quisesse que o quadro estivesse nas bancas de jornais, ele seria um designer”. (AZEVEDO, 2005 p. 9) Como objeto de pesquisa, não obstante, tem-se a obra “Manacá”/1927, da pintora Tarsila do Amaral, na qual o design é valorizado com a criação da linha Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 61 de produtos Tarsila - maio 2002, aplicada a marcas de produtos da empresa “O Boticário”, conhecida no setor de cosméticos e perfumaria do mercado brasileiro e criada pelo designer Leonardo Alves Cordeiro, Figura 17. O designer curitibano Leonardo Alves Cordeiro, mostrou extrema sensibilidade e talento para traduzir, na embalagem, a essência da alma da obra Manacá de Tarsila do Amaral, na criação da linha Tarsila. Figura 17 – Perfume Tarsila de “O Boticário” criado pelo designer Leonardo Alves Cordeiro. O papel do designer foi ampliado nos últimos tempos, e o design tornou-se, entre outros, um meio cultural poderosíssimo no contexto social e ambiental. A função social do designer é se relacionar com as pessoas, criando informações visuais, elaborando o olhar no sentido de aumentar o repertório em todos os Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 62 sentidos. É fundamental que um designer transmita, em seus trabalhos, seus valores e sua identidade. O Brasil é um país com composições étnicas/sociais/culturais muito diversas, assim o design brasileiro é concebido de maneira a refletir nossa característica principal que é a diversidade. A herança cultural brasileira é muito distinta, assim a diversidade tem se fundamento em algumas características singulares que diferenciam esse design de outros designes do mundo. Fato este observado no trabalho do designer Leonardo no projeto Tarsila do Boticário. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 63 3.3 DESIGN DA EMBALAGEM Desde o surgimento das primeiras embalagens, há mais 10.000 anos, as civilizações da época tinham a necessidade de transportar, condicionar e armazenar alimentos. Desta maneira nasceram as primeiras embalagens de um produto desempenhando suas três funções: proteger, transportar e vender o produto. Para agregar estas três funções, todavia, são imprescindíveis os dados dos materiais utilizados, sua resistência, o tipo de produtos que podem transportar sem provocar alterações químicas em sua composição e os processos de impressão e rotulação para cada caso. Além disto, especialmente o domínio do mercado, da forma como o produto é selecionado para compra e utilizado por cada consumidor são essenciais para torná-lo acessível, atraente e competitivo. Com a concorrência crescente, as empresas estão constatando que necessitam ter produtos diferenciados, portanto, investem em desenvolvimento do design gráfico das embalagens, para agregar e potencializar seus diferenciais e conceitos. O design de embalagens, é uma das muitas vertentes do design, assim como o design gráfico, ou o web design. Trata-se do projeto e identidade da forma final de toda e qualquer maneira de embalar um produto por meio de uma linguagem de simbologias estéticas e visuais, oferecendo aos consumidores uma relação emocional, para que sejam seduzidos pela embalagem. Estas embalagens expressam valores que vão elevar, no produto: status, ousadia , moda, confiança, prestígio e tradição. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 64 No desenvolvimento de uma embalagem, deve-se eleger os dados do projeto técnico, como: processos produtivos, matérias-primas, economias na fabricação, transporte, etc, associados sempre com a qualidade do produto. As embalagens vêm sendo consideradas como o maior veículo de venda e de construção da marca e da identidade de um produto. Alguns especialistas no assunto consideram que uma embalagem corresponde a um comercial de cinco minutos de produto na gôndola do supermercado. Existem dois tipos de embalagens: Embalagens de Consumo, que têm papel persuasivo, e as Embalagens de Transporte, que transportam, protegem e conservam os produtos. Além disso, pode-se classificá-las em: • Embalagem Primária: Frasco + Tampa; • Embalagem Secundária: Cartucho + Berço Protetor; • Embalagem Terciária: Caixa Transporte. A embalagem ideal pode ser representada pelo trinômio: qualidade real, imagem e preço. No presente trabalho o design de embalagem envolve estudos que representam além de estética e função, fatores sociais, culturais, de fabricação, de custos e de seleção de materiais que vão determinar mensagens qualitativas e quantitativas. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 65 3.3.1 Análise do Frasco do Perfume Tarsila O design do Perfume Tarsila é extremamente sofisticado concebido de forma elegante, transparente e delicada, características estas já destacadas na personalidade e na obra Tarsila do Amaral. A embalagem traduz a essência da alma tarsiliana na obra Manacá. Para uma análise formal da composição do frasco do Perfume Tarsila, propõe-se o traçado de dois eixos: horizontal e vertical sobre o frasco, como na pintura, o que facilita a análise nos quadrantes. O design se apresenta assimétrica e tridimensionalmente equilibrado em sua essência. Os aspectos formais do frasco e as relações dos eixos estruturais, Figura 18, podem ser transportados para o design do frasco com simetria e de maneira bem comportada. Neste contexto, a composição determinou o objeto, porém não sem regras absolutas. Apresenta linhas formais, com corpo em forma geométrica icônica / piramidal. De acordo com Dondis6 (2003) a referência horizontal/vertical, constitui a referência primária do homem no que respeita o seu bem estar, portanto, o equilíbrio é tão fundamental na natureza assim como no homem: “Na expressão ou interpretação visual, existe um processo de estabilização que se impõe a todas as coisas vistas e planejadas, um “eixo” vertical, com um referente horizontal secundário, os quais 6 Donis A. Dondis é professora de comunicação na Boston University School of Communication e diretora do Summer Term Public Communication Institute, dessa mesma instituição. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 66 determinam, em conjunto, os fatores estruturais que medem o equilíbrio”. (DONDIS, 2003 p. 33) 1 2 Figura 18 - Relação dos eixos estruturais: 1) na arte de Tarsila do Amaral, Manacá e no 2) no perfume Tarsila de “O Boticário”. Ressalta-se o aspecto bidimensional, delicadamente impresso por meio da gravação “Hot Stamp” (estampa quente), na cor branca, dos cactos e marca “O Boticário” no frasco, Figura 19. Esta gravação é vista por transparência, com aspectos lineares. A gravação do vidro também remete a outro aspecto estético e faz uma analogia ao movimento modernista que representa uma subversão Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 67 estética, pela conversão da gravação no frasco de maneira invertida que suscita a leitura no momento em que se posiciona o frasco n aposição frontal. Figura 19 – Frasco do perfume Tarsila de “O Boticário”. (http://www.boticario.com.br) Os aspectos ergonômicos também foram considerados e muito valorizados no projeto com um sistema eficiente de “pega” e “uso”, agregando valor à sua funcionalidade. Para Dondis (2003), cria-se um objeto/design a partir de inúmeras cores, formas, equilíbrio, tensão, pontos, linhas, texturas, tons e proporções relativas, e ao relacionar inteiramente esses elementos alcança-se um significado. A Figura 20 mostra a equivalência entre o frasco de perfume Tarsila e a obra da artista Tarsila do Amaral, Manacá. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 68 Pelo caráter tridimensional a tonalidade é um dos instrumentos mais importantes para expressar a dimensão no produto. Segundo Dondis, um bom designer selecionará intuitivamente aquela relação colorística que mais se identifica com suas necessidades expressivas. As cores possuem um efeito subliminar muito forte e interferência no resultado final. Para o autor: “A cor está de fato impregnada de informação, e é uma das mais penetrantes experiências visuais que temos todos em comum”. (DONDIS, 2003 p. 54) 1 2 Figura 20 – Equilíbrio na equivalência entre: 1) perfume Tarsila de “O Boticário”, em cada parte do frasco e 2) a obra de Tarsila do Amaral, “Mancá”. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 69 A análise simbólica do frasco do perfume Tarsila, passa por um olhar semiótico, pois a linguagem visual, como forma de representação, sempre se corporifica. O índice, desta forma, assinala para algo do que é uma parte no aspecto existencial. O objeto imediato do índice é a maneira como é capaz de indicar aquele outro existente, seu objeto dinâmico, com o qual ele mantém uma conexão existencial. Neste sentido, observa-se um índice forte na decodificação dos cactos, aspecto bidimensional identificado com a gravação no frasco, se tornado índice, um signo indexical, Figura 21. Correspondem, no universo da linguagem visual, as manifestações mais próximas da indexicalidade, ou seja, registro de objetos ou situações existentes. Frasco Indexicalidade - Conexão dinâmica Índice Obra Manacá Signo do Fenômeno Frasco de Perfume Tarsila Signo de Análise Figura 21 - Análise simbólica do frasco do perfume Tarsila de “O Boticário” – indexicalidade na conexão dinâmica da obra com o frasco de perfume Tarasila. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 70 O protótipo desta modalidade está no design do frasco do perfume Tarsila, no qual a conexão entre imagem e objeto é existencial, e também uma relação existencial de secundidade, na qual o índice é genuíno. 3.3.2 Análise da tampa do perfume Tarsila Na análise formal da tampa do produto, evidencia-se o aspecto trimendisional da flor do Manacá, genuinamente esculpida em forma de tampa orgânica. Como matéria prima foi utilizada resina transparente e fosca e resultou em uma forma funcional e delicada, Figura 22. 1 2 3 Figura 22 – Análise da tampa e anel do perfume Tarsila de “O Boticário”: 1) tampa com flores; 2) tampa com flores e anel; e, 3) anel. O anel metalizado dourado com a marca/assinatura:Tarsila cria uma ruptura muito sutil e equilibrada com o corpo do vidro, tornando-se um elemento de junção com a tampa. Neste anel se encaixa uma válvula PUMP (válvula spray) para a Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 71 saída do produto. Apresenta um aspecto nobre, pela cor ouro e assinatura Tarsila. Neste sentido Rudolf Arnheim, psicólogo e historiador de arte afirma: “Forma é a configuração visual do conteúdo (...), serve antes de tudo para nos informar sobre a natureza das coisas através de sua aparência externa”. (ARNHEIM, 2000 p. 89) O olhar semiótico faz também parte da análise simbólica da tampa e anel, Figura 23. Observa-se, um índice forte na decodificação da flor do Manacá, aspecto tridimensional identificado na tampa, se tornado um índice, um signo indexical. Tampa - Conexão dinâmica Índice - Secundidade Obra Flor Manacá Tampa Signo do Fenômeno Signo de Análise Figura 23 – Análise da tampa do frasco de perfume Tarsila de “O Boticário” quanto a relação secundidade e índice. Na tampa se percebe, também, que a conexão entre a imagem e o objeto é existencial, por meio de uma relação existencial de secundidade e índice é genuíno. Vale sinalizar, contudo, que outro fator simbólico de grande relevância é a assinatura gestual “Tarsila” no anel metálico do frasco de perfume, Figura 24. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 72 Gestual de Secundidade Assinatura Tarsila Marca Tarsila - Símbolo Figura 24 – Assinatura gestual “Tarsila” no anel metálico do frasco de perfume de “O Boticário”. Esta configuração ofereceu uma qualidade de símbolo pela assinatura Tarsila. Observa-se que cada detalhe foi harmoniosamente projetado e contextualizado. 3.3.3 Análise do cartucho do Perfume Tarsila Conforme já mencionado, as embalagens secundárias, cartucho e protetor interno, apresentam uma função de sedução e persuasão, porém, devem, inicialmente, ter a função de proteger o produto e oferecer informações quantitativas tais como: composição, validade , forma de uso, etc. Considerando o cartucho do perfume Tarsila, todos os critérios de funcionalidade e de comunicação foram utilizados, inclusive, em mais de um idioma (português, espanhol e inglês). Ao considerar a análise formal do cartucho, observa-se a utilização de papelão no caixa/cartucho e no protetor (micro-ondulado). O aspecto bidimensional é representado pela gravação “Hot Stamp” dourada das Marcas “Tarsila” e “O Boticário”, que oferece sofisticação à embalagem. A identidade do cartucho é Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 73 percebida por meio de uma proposta moderna e elegante, com a aplicação estilizada do Manacá em tons delicados de aquarela, Figura 25. Figura 25 – Parte frontal do cartucho do perfume Tarsila. Assinatura gestual do nome do perfume no meio da altura e a marca “O Boticário” estampada em dourado na parte inferior. A reflexão semiótica do cartucho do perfume Tarsila é a existência de conexão entre a imagem e o objeto, com as manifestações da indexicalidade no registro representado no cartucho. Este, porém, vem colocado de forma degenerada, e é considerado, assim, uma secundidade degenerada, Figura 26. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 74 Figura 26 – Duas faces do cartucho do perfume Tarsila de “O Boticário”. Em uma face o nome e a marca e na outra a representação da obra de Tarsila do Amaral, “Manacá”. A linguagem visual, como forma de representação, sempre se corporifica. E de acordo com Lucia Santaella (2001) o índice aponta para algo do qual ele é uma parte no seu aspecto existencial: “(...) corresponde no universo da linguagem visual às manifestações mais próximas da indexicalidade, ou seja, registro de objetos ou situações existentes.” 3.3.4 Perfume Tarsila: análise olfativa Acredita-se que por meio do perfume acontece uma das maiores experiências sensoriais, tendo o olfato como aliado. Muitos sentimentos e sensações, de difícil Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 75 tradução para a linguagem verbal, estão envolvidos ao escolher uma fragrância. O estilo, a personalidade e, até mesmo, um pouco da história de cada pessoa, pode ser revelada pelo perfume, entendido quase como uma segunda pele. O olfato é um elemento fundamental na interpretação do mundo que nos cerca e tudo leva a crer que o Homem aprendeu, desde as suas origens, a avaliar os odores. Apesar das experiências com os aromas terem começado muito mais tarde, o perfume existe desde a cognição do sentido do olfato. Pode-se se dizer, então, que a sua história se confunde com a própria história da Humanidade. O universo da perfumaria iniciou-se na época em que o homem primitivo aprendeu a usar o fogo e constatou que algumas plantas exalavam fragrâncias agradáveis quando queimadas. Ao queimar madeiras e resinas, o homem primitivo percebeu que era possível melhorar o paladar dos alimentos. A palavra portuguesa “perfume” como a correspondente francesa “parfum” (1528), a italiana “profumo” e a inglesa “perfume” derivam do latim “fumus” termo que significa uma atmosfera fumegante, numa referência às nuvens de fumaça perfumada que subiam aos céus durante os ritos em homenagem aos deuses. É quase certo que o perfume surgiu em estreita ligação com a religião, e era utilizado como purificador das almas e como oferenda aos deuses. Segundo Renata Aschcar7: “...mirra, musgo de carvalho, resina de pinho e outros ingredientes com propriedades antimicrobianas eram utilizadas no cuidadoso ritual da mumificação, o preparo egípcio dos corpos para enviá-los à eternidade” (ASCHCAR, 2001 p. 21) 7 Renata Aschcar nasceu em São Paulo em 1965, e é formada em Comunicação Social e Propaganda. É consultora e escritora. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 76 Os perfumes apresentam uma linguagem e alfabeto próprios, capazes de promover as mais diversas reações físicas e emocionais, conectando e explorando os espaços mais profundos da alma. Os cinco sentidos: olfato, paladar, visão, tato e audição são, assim, despertados, direta ou indiretamente, pelo universo da perfumaria. Patrick Süskind8 cita na obra O Perfume: “As pessoas podem fechar os olhos diante da grandeza, do assustador, da beleza; podem tapar os ouvidos diante de uma melodia ou de palavras sedutoras. Mas não podem escapar ao aroma. Ele é o irmão da respiração, penetra nas pessoas – elas não podem escapar-lhe, caso queiram viver. Bem dentro delas vai o aroma, diretamente para o coração – que faz a distinção entra atração e repulsa, horror e prazer, entre amor e ódio. Quem dominasse os odores dominaria o coração das pessoas.” (SÜSKIND, 1986) O poder e a magia do perfume podem ser explicados pela forma como as fragrâncias atuam no cérebro. As moléculas de odor são capturadas por células nervosas localizadas na cavidade nasal. Estas, por sua vez, estão conectadas com o chamado sistema límbico, região do cérebro responsável pelos impulsos primitivos que influenciam diretamente nossa memória e comportamento emocional. Os odores aguçam os outros sentidos e funcionam como trampolins para uma série de lembranças chamadas memória olfativa . O cheiro, apesar de sempre estar despertando nossas lembranças, para algumas pessoas acontece de forma mais intensa, pois estas possuem maior sensibilidade e memória olfativa mais apurada, embora todos vivam esse fenômeno de alguma maneira. 8 Patrick Süskind nasceu na Alemanha, em 1949. Estudou história medieval e moderna e hoje, como escritor, vive em Munique. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 77 O canal para identificar uma infinidade de substâncias é o olfato, algumas de cheiro muito forte e característico e outras de odor muito sutil. Consegue-se distinguir entre 3.000 a 10.000 odores diferentes. O olfato não é apenas utilizado para dar informações acerca dos odores que nos rodeiam, é muito conhecida a relação existente entre o olfato e os outros sentidos. A verdade é que não sentimos os odores com o nariz, mas com o cérebro. Valentin Louis Georges Eugène Marcel Proust (1871-1922), escritor francês, citou em sua obra Em Busca do Tempo Perdido (2002) a respeito dos cheiros: “Cada momento de nossa vida, assim que passa, é registrado em um cheiro, um sabor, uma sensação que encontra novamente, pode disparar a memória (...). Os cheiros mudam com a estação, mas são sempre copiosos e acolhedores, neutralizando a inclemente aspereza da geada matinal com a fragrância do pão quente (...). Cheiros indolentes e pontuais como o soar das horas de um campanário de aldeia (...) Cheiros fugazes e constantes, distraídos e prudentes (...) Cheiros de roupa branca, cheiros matutinos, cheiros de devoção (...)” (PROUST, 2002) O cérebro armazena inúmeras lembranças, algumas ficam escondidas e, de uma hora para outra, vêm à tona. Os meios para acessá-las são os mais variados e misteriosos e incluem o olfato. Basta sentir aquele cheiro familiar para a cena se recompor com uma incrível riqueza de detalhes. Pode ser o aroma de um alimento qualquer, de uma flor que marcou a infância ou do perfume da pessoa querida. São os cheiros de nossas vidas. O primeiro sentido estimulado pelo perfume é o olfato. O universo das fragrâncias, contudo, é tão rico e sutil, e fortemente ligado às nossas lembranças e à memória olfativa, que pode despertar um encadeamento de conexões particulares. Uma fragrância pode ser o gatilho para acionar lembranças de vários momentos. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 78 Apenas um cheiro é capaz de resgatar a memória, reconstruindo uma história com toda distinção e delicadeza. De qualquer maneira, mensurar os cheiros que somos capazes de armazenar em nosso cérebro, seria uma tarefa muito difícil, pois isto depende do treino e da dedicação de cada indivíduo, além de suas características pessoais. Uma pessoa não especializada tem a capacidade de reconhecer algumas dezenas de cheiros. Um perfumista, por sua vez, pode chegar a armazenar mais de dois mil odores. Entre os nossos sentidos de visão, audição, tato, olfato e paladar,.existe uma hierarquia baseada em mecanismos físicos, químicos e fisiológicos, ou seja, uma gradação decrescente de complexidade. As matrizes da linguagem e pensamento estão alicerçadas nos processos perceptivos. A percepção no sistema olfativo humano, portanto, pode ser aprendida e na prática pode o desenvolvimento da mesma ser aperfeiçoado para que se possa avaliar uma fragrância. A criação do conceito e o desenvolvimento do perfume Tarsila foram inspirados na vida e obra de Tarsila do Amaral. O perfume traduz muita personalidade e feminilidade, por meio de uma fragrância intensa e feminina, exprimindo força e beleza. O projeto foi realizado pela Casa de Fragrâncias Firmenich, Suíça, com 110 anos de existência, e há mais de 50 anos no mercado brasileiro. Os perfumistas Harry Fremont e Jean Claude Delville da Casa de Fragrâncias Firmenich, Figura 27, criaram para o perfume Tarsila uma fragrância que evidencia alegria, elegância e determinação. O perfume apresenta Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 79 características olfativas diferenciadas, é recomendado para mulheres ousadas e marcantes, que assim como Tarsila imprimem à sua marca, por onde passam, e estão muito à frente do seu tempo. CASA DE FRAGRÂNCIAS FIRMENICH Suiça Perfumista Jean-Claude Delville Perfumista Harry Fremont Figura 27 – Perfumistas Harry Fremont e Jean-Claude Delville que criaram a fragrância do perfume Tarsila de “O Boticário”. Assim como a composição e harmonia são perseguidas no universo da perfumaria, estas também fazem parte do universo dos sons. Em perfumaria existem as chamadas notas olfativas: florais, cítricas, amadeiradas, frutais, assim como na música as notas musicais: do, ré mi, fá, sol, lá e si. A combinação de 3 ou 4 notas resulta em um acorde, tanto no universo dos perfumes quanto no da música, Figura 28. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 80 Perfume Tarsila: Composição Olfativa Nota de Saída Pera Mimosa Flor de Cactus Flor de mandarina Peônia Orquídea Nota de Corpo Nectarina Hibisco Dove Tree Flower Nota de Fundo Sândalo Musk Almiscar Incenso Figura 28 – Composição das três notas olfativas do perfume Tarsila de “O Boticário” . A harmonia, em música, pode ser classificada como uma evolução sonora agradável. Na perfumaria, a harmonia deve estar entre as notas de saída, de corpo e as de fundo. Essa passagem entre as notas deve ser harmônica, assim como na música, evoluindo agradavelmente ao longo do tempo. A estrutura musical parte de Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 81 sete notas simples e o mesmo acontece na perfumaria, só que com três notas: saída, corpo e fundo, Figura 29. Nota de saída Primeiros 15 minutos. É aquele cheirinho bom que se saída sente ao abrir o frasco e testar o produto. As chamadas notas de saída são leves, e a porção é mais volátil da composição, em geral pertencendo aos grupos cítrico, verde, floral ou frutal. Nota de corpo corpo Três a quatro horas após a aplicação. É o coração da fragrância, responsável pelo seu sucesso. Usa matérias-primas de volatilidade média, como florais e especiarias. Nota de fundo fundo Últimas quatro a cinco horas de evaporação. É a parte nobre, que dura por um tempo prolongado. Para compô-la, empregam-se ingredientes de baixa volatilidade, como madeiras e âmbar. Figura 29 – Notas de saída, corpo e fundo de um perfume. A combinação das notas olfativas isoladas resulta em composições ricas e complexas, transformando-se em perfumes agradáveis e inesquecíveis. Ao analisar todos os sentidos, a audição é a que se relaciona mais indiretamente com o mágico mundo da perfumaria, mas ainda assim é possível estabelecer conexões interessantes. O universo da perfumaria é rico e subjetivo, e parte do vocabulário foi “emprestado” do repertório musical. Como canta Angenor de Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 82 Oliveira (1908-1980), popularmente conhecido como Cartola, cantor, compositor e instrumentista brasileiro na canção As rosas não falam: “Queixo-me às rosas – mas que bobagem – as rosas não falam! Simplesmente as rosas exalam o perfume que roubam de ti.” Neste mesmo contexto pode-se fazer uma analogia com o universo semiótico que apresenta as relações de: Primeiridade; Secundidade e Terceiridade, Figura 30. A estrutura e composição de um perfume, acontecem de forma muito harmônica e intensa, provocando significados e invadindo à análise semiótica, uma vez que abrange um signo que transborda as fronteiras do racional, pois e atinge as camadas mais profundas e subjetivas da comunicação. A apreciação semiótica pode investigar a comunicação por meio de apelos emocionais e racionais, e o seu efeito, como interpretações que, em geral, o mercado pode captar. É justamente nesta sistematização de estratégias, na vivência de um novo consumidor e valores éticos, que a análise semiótica pode contribuir, pois tende a ajudar no reconhecimento do mercado e em suas relações com marcas, produtos, serviços e o público-alvo. Por intermédio da semiótica pode-se enxergar o produto, uma imagem de marca ou serviço como um signo, portanto, como uma representação de algo que o mercado e o consumidor, em especial, almejam. Tais temas, entretanto, serão discutidos, com maior profundidade, no próximo capitulo: Marca e Marketing. Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 83 Primeiridade Relação saída Qualquer monádica, existente sua é existência uma “tudo síntese é”. de determinações múltiplas, pois existir é ocupar um lugar no tempo e no espaço, e reagir em relação a outros existentes, qualidade pura (Sin-signo) Paralelo: Nota de saída - a primeira impressão do perfume pura qualidade. Secundidade corpo Relação diádica, na sua referência àquilo que indica . Índice (signo ”indexical”). Paralelo: Nota de corpo - sentida logo depois da nota de cabeça, e que revela a personalidade do perfume. Terceiridade Relação triádica, algo tem a propriedade da lei - fundo recebe o nome de legi-signo. Seu Caráter de Lei "tudo deve ser”. Paralelo: Nota de fundo - aquelas que ficam na pele por muitas horas. Figura 30 – Relações de Primeiridade (monádica), Secundidade (diádica) e Terceiridade (triádica) de um perfume e suas notas respectivas. A estrutura e composição de um perfume, acontecem de forma muito harmônica e intensa, provocando significados e invadindo a análise semiótica, uma vez que abrange um signo que transborda as fronteiras do racional, pois atinge as camadas mais profundas e subjetivas da comunicação. A apreciação semiótica pode investigar a comunicação por meio de apelos emocionais e racionais, e o seu efeito, como interpretações as quais o mercado em Sandra Penkal A INTER-RELAÇÃO: SEMIÓTICA, DESIGN E EMBALAGEM 84 geral pode captar. È, justamente, nesta sistematização de estratégias, na vivência de um novo consumidor e valores éticos, que a análise semiótica pode contribuir, pois tende a ajudar no reconhecimento do mercado e em suas relações com marcas, produtos, serviços e o público-alvo. Por intermédio da semiótica pode-se enxergar o produto, uma imagem de marca ou serviço como um signo, portanto, como uma representação de algo que o mercado e o consumidor, em especial, almejam. Tais temas, entretanto, serão discutidos com maior profundidade no próximo capitulo: Marca e Marketing. Sandra Penkal MARCA E MARKETING 85 4 MARCA E MARKETING 4.1 MARCA (BRANDING) COMO ELEMENTO DE MARKETING Numa época em que cada vez mais se fala sobre globalização e competição, o marketing tornou-se uma das principais ferramentas aplicadas no mercado e uma das estratégias mais efetivas na captação de novos consumidores. Este capítulo apresenta o porque por meio de determinados elementos do marketing como a comunicação, o design e a marca, e porque os consumidores são mais motivados e induzidos à compra. Segundo Philip Kotler9 (2000), o marketing pode ser definido como: “ É um processo social por meio do qual pessoas e grupos de pessoas obtêm aquilo de que necessitam e o que desejam com a criação, oferta e livre negociação de produtos e serviços de valor com outros.” (KOTLER, 2000 p. 30) Para satisfazer as necessidades do mercado, os profissionais de marketing gerenciam a demanda de produtos, influenciando o nível, a velocidade e a sua composição. São tomadas e analisadas, portanto, decisões importantes que podem abranger desde as características e criação de um produto até a etiqueta de sua embalagem. Frente ao mercado-alvo escolhido, as empresas procuram se fixar na mente 9 Philip Kotler foi professor de marketing internacional na Kellog Graduate School of Management, da Northwestern University. Autor de Administração de Marketing e de outros livros de sucesso, publicou suas pesquisas em periódicos importantes. Foi o presidente do College on Marketing do Institute of Management Sciences, diretor da American Marketing e consultor de empresas. Sandra Penkal MARCA E MARKETING 86 dos compradores como fornecedora de algum benefício especial. Compete aos profissionais de marketing compreender as necessidades; os desejos e as demandas destes mercados-alvo, podendo atingir vários grupos de clientes que ocupam espaços físicos e virtuais. A satisfação dessas necessidades é um sentimento pessoal de prazer ou desapontamento, resultante da comparação da percepção do desempenho do produto (ou resultados), em relação às expectativas geradas antes da compra . As empresas alcançam seus mercados por meio de vários canais de comunicação, distribuição e venda. Enfrentam concorrências diretas e indiretas, com adversários atuais e potenciais que oferecem os mesmos produtos/serviços ou produtos que possam substituí-los. Neste sentido, a administração de marketing torna-se o esforço consciente para alcançar resultados de troca desejados com os mercados-alvo, e é considerado o processo de planejar e executar a concepção, a determinação do preço, a promoção e a distribuição das idéias, bens e serviços para criar negociações que satisfaçam metas individuais e organizacionais. O acolhimento desta satisfação e das necessidades é adquirido por um esforço integrado de todas as áreas e setores da organização com o ponto de vista no sucesso a curto e longo prazo determinado por algumas estratégias. O conceito de “estratégia” de acordo com Djalma Oliveira é: “...estratégia é definida como um caminho ou maneira , ou ação estabelecida ou adequada para alcançar os resultados da empresa, representado por seus objetivos, desafios e metas” (OLIVEIRA, 1997 p.27). Sandra Penkal MARCA E MARKETING 87 O caminho, a estratégia escolhida para posicionar a organização de forma competitiva e garantir sua sobrevivência em longo prazo, acontece pela definição de atividades e competências inter-relacionadas para entregar valor de maneira diferenciada às partes interessadas. É o conjunto de decisões que orientam as ações a serem tomadas. A estratégia pode ser conduzida para o desenvolvimento de novas marcas e produtos; novos mercados; crescimento das receitas; redução de custos; aquisições e fusões e novas alianças e parceria, etc. Indiscutivelmente, entretanto, nos dias de hoje a marca apresenta-se como um elemento mercadológico estratégico. É considerada como um sinal diferenciador, e é um signo eleito à esfera de um símbolo pelo nível de imaginário atingido e permitindo. Desta forma os produtos podem ser reconhecidos, admirados e ocupar um lugar de evidência na lembrança do consumidor. Como apostila Clotilde Perez (2004) no livro de sua autoria Signos da Marca: “Uma marca existe em um espaço psicológico, na mente das pessoas, dos consumidores. Consiste em uma entidade perceptual, com um conteúdo psíquico previamente definido, mas que é absolutamente dinâmico, orgânico e flexível.“ (PEREZ, 2004 p. 47) Neste contexto, como estratégia da marca, hoje o branding é o estreitamento do relacionamento, na maioria das vezes estabelecido a partir da conexão emocional entre a marca e o cliente. É uma questão de vivência e afetividade para que se possa desenvolver a fidelidade da marca pelo cliente. Sandra Penkal MARCA E MARKETING 88 Como cita Tom Peters sobre branding: “Este é o coração do branding. Porque branding é, por fim, nada mais (e nada menos) que coração. É paixão... aquilo com que você se preocupa. Aquilo que está dentro... O que está dentro de você, o que está dentro da sua unidade, da sua empresa. É mais que isto (claro). Mas se você “conseguir” esta parte do branding... terá conseguido o ... coração do branding” (PETERS, 2004 p.163) Branding é uma palavra nova para um conceito novo, é uma tendência em comunicação nascida há muito pouco tempo. O branding vem da evolução do marketing e dos programas corporativos de identidade. O marketing determina ações e o gerenciamento de marcas, configurando-se uma atividade racional baseada em pesquisas que são respondidas e medidas de forma racional. O branding, por sua vez, é muito mais que o planejamento estratégico da marca. A compra ou escolha de uma marca está ligada à emoção, que é intangível, e mesmo os produtos commodities podem ser escolhidos por meio da emoção. Do ponto de vista dos negócios, branding é essencialmente o objetivo central do marketing. Num momento em que a globalização começa a trazer e difundir as marcas em âmbito global pelos meios de comunicação digital e televisivo, a solução para a escolha de uma determinada marca está, entre outras coisas, na relação de afetividade que esta marca tem com seu cliente. O branding, portanto, influencia a estrutura e a filosofia da própria empresa, em todos os setores: a criação de produtos, produção, treinamento de funcionários, ambiente, comunicação dirigida, etc. Deste modo, a marca ganha personalidade, e Sandra Penkal MARCA E MARKETING 89 tem como objetivo seduzir e cativar o consumidor. Neste sentido Larry Light10 (1998) argumenta: “A guerra de marketing será uma guerra de marcas, uma competição de domínio de marca. Os negócios e os investidores reconhecerão as marcas como os mais valiosos ativos da empresa. Este é um conceito crítico. É uma visão de como desenvolver, fortalecer, defender e gerenciar o negócio. Será mais importante dominar mercados do que possuir fábricas e a única forma de dominar mercados é possuir marcas dominantes”. (LIGHT, 1998) Na sociedade comercial, as marcas, também, tornaram-se poderosos e complexos signos de posicionamento social e de ser no mundo. Sua força de fusão provoca e possibilita sua adequação às reproduções dos desejos de cada consumidor (processo de ressignificação). Assim, um símbolo forte (marca) pode reunir associação, ligação, coesão e estrutura a uma identidade, ajudando a tornálo mais fácil de ser reconhecido e lembrado. Sua apresentação pode ser um elemento decisivo na ampliação da marca, e sua omissão pode gerar uma significativa perda. Ampliar a importância dos símbolos como elemento que compõe a identidade da marca aumenta a sua força. Neste cenário, a análise semiótica em marketing pode constituir um instrumento valioso para identificar e analisar as interconexões deste fenômeno. Pode ser empregada também como ferramenta na investigação e reflexão para os temas de marketing seguintes: Produtos e Serviços (lançamentos, sustentações, relançamentos, 10 posicionamento, reposicionamento); Marcas (identidade, Larry Ligh é norte-americano, proeminente profissional de pesquisa em propaganda que declarou, em 1998, ao editor do Jornal de Pesquisa em Propaganda, sua impressão sobre o marketing das próximas três décadas. Sandra Penkal MARCA E MARKETING 90 posicionamento, reposicionamento, aplicações) e Identidade visual (programações visuais, organizacionais, sites). Pode-se dizer que o entendimento mais aprofundado dos fenômenos de marketing acontece de maneira sinérgica com a semiótica, por meio das ferramentas seguintes: pesquisa de mercado (qualitativa e quantitativa); planejamentos; criação publicitária; programações visuais; design de embalagens, etc. A análise semiótica apresenta elementos conexos e relações argumentativas, que embasam o desenvolvimento dos projetos de branding e marketing, reforçando sua direção, ou auxiliando no desenvolvimento de novas estratégias e significados que ao chegarem ao mercado, com o público-alvo, ou mesmo com alguma forma de comunicação, podem causar sensações, ações e reflexões. A análise semiótica averigua esses apelos (emocionais e racionais) e o efeito deles, como interpretações as quais o mercado, em geral, pode captar. Controlar tais resultados é essencial para a aplicação adequada das ações de marketing e comunicação, involuntariamente de como ela se mostra, pois se vive em um espaço desvendado, nas quais as revelações das marcas e sua apropriação na relação de aquisição e consumo, se posicionam, abundantemente, por meio de informações retiradas da indústria cultural e dos meios de comunicação. A cultura visual é uma fonte de inspiração para o desenvolvimento de temas e conceitos. Igualmente a marca, compreendida como um símbolo que induz ao glamour e ao sonho, faz com que os produtos sejam reconhecidos e tornem-se mais competitivos e diferenciados. Sandra Penkal MARCA E MARKETING 91 O mercado oferece relações de consumo com pouca diferenciação, porém muito concorridos, identificam-se assim oportunidades para as estratégias de marcas e comunicação de modo a provocar intensamente o desejo do consumidor, mesmo que colocadas de maneira inconsciente. Como já foi analisado, as marcas tornaram-se signos valiosos de posicionamento social e cultural. Sua importância pode levar a um processo de ressignificação. Um símbolo forte (marca), destarte, pode reunir associação, ligação, coesão e estrutura a uma só identidade. Sua apresentação pode ser um elemento de significação, pelos atributos, benefício funcionais e emocionais. Em um mercado altamente competitivo, a lealdade dos consumidores pode ser medida pelo grau em que os mesmos estejam satisfeitos. Os consumidores podem criar o conhecimento da marca e gerar confirmação para outros consumidores. Aqueles que são leais também levarão um bom tempo para responder aos avanços da concorrência. David Aaker11 (1998) cita que: “A lealdade da base de consumidores reduz a vulnerabilidade da ação competitiva. Os concorrentes podem ver-se desencorajados a investir recursos para atrair consumidores satisfeitos. Uma alta lealdade implica, ainda, melhores negócios com o comercio, uma vez que os consumidores leais esperam que a marca esteja sempre disponível.” (AAKER, 1998 p. 19) O conhecimento da marca, por parte dos consumidores, representa um grande diferencial competitivo para as empresas, pois é por meio do reconhecimento, da recordação, que a marca é lembrada como pertencente a uma classe de produto, a um segmento, a um mercado . 11 David Aaker é norte-americano, consultor em MKT e Estratégia e autor de vários livros. Sandra Penkal MARCA E MARKETING 92 O reconhecimento é o elo da presença, da substância e da permanência entre o consumidor e o produto. Neste sentido, Marc Gobé12 (2002) esclarece: “O pior conceito, nas estratégias da criação de marcas, é acreditar que a marca diz respeito à participação de mercado, quando na realidade está sempre diretamente relacionada com a participação da mente e das emoções”. (GOBÉ, 2002 p. 29) A posição da marca baseia-se nas suas associações e como diferem da concorrência. Pode ser considerada qualquer agregação, mentalmente ligada à marca. Um símbolo forte, portanto, pode reunir a associação, a ligação, a coesão e a estrutura em uma só identidade. Por meio de métodos indiretos de levantamento de associações, existe uma visão quanto ao que uma marca significa para as pessoas e a que motivações ela responde. A chave para a criação de associações é identificar e gerenciar os sinais. É decisivo ser consistente ao longo do tempo e sobre os elementos da programação de marketing para manter as associações. Ainda neste contexto, segundo Marc Gobé (2002): “...a substituição dos programas de identidade empresarial ”Impostos” pelos Emocionalmente “Conectados” é a expressão da cultura de uma empresa, sua personalidade e os produtos ou serviços que tem a oferecer – o próprio símbolo e assinatura dos valores que devem inspirar confiança aos consumidores, empregados, clientes, fornecedores e à comunidade financeira”. (GOBÉ, 2002 p. 172) O sistema de marketing, na sociedade pós-industrial, foi ampliado não só pelo aspecto comercial, mas também pelo encontro alcançado pelas marcas nas 12 Marc Gobé é Diretor Presidente e Diretor de Criação de d/g mundial. Profere palestras na Universidade de Columbia e conferências sobre marketing e desenho no mundo todo. Vive em Nova York. Sandra Penkal MARCA E MARKETING 93 suas tendências culturais e comportamentais. Neste contexto, desenvolveu-se uma área intitulada como Gestão do Comportamento do Consumidor, definida como um processo de procura, busca, compra uso e avaliação de produtos e serviços para satisfazer necessidades dos consumidores e mercados. Segundo Christiane Gade13 : ... “o comportamento do consumidor são atividades físicas, mentais e emocionais realizadas na seleção, compra e uso de produtos e serviços para satisfação de necessidades e desejos. (...) a psicologia permite entender as influências dos fatores psico-sociais esternos que atuam sobre o consumidor”. (GADE, 1998 p.17) Considerando os aspectos comportamentais do mercado e o poder de associação e síntese que as marcas provocam, as adaptações e as representações do desejo de cada consumidor são fortemente manifestadas, e estas são também percebidas quando o consumidor entra em contato com obras de artistas através de produtos de design. Neste sentido, Tom Peters14 (2004) cita: “Num mercado cada vez mais superlotado, os tolos competirão com preços. Os vencedores encontrarão o caminho da criação do valor duradouro na mente do consumidor” . Esta acepção aplicada ao mercado globalizado atual, com grandes e constantes avanços tecnológicos, eleva ainda mais os desafios do marketing em criar, promover e fornecer bens e serviços a clientes individuais e empresariais. 13 14 Chrisitiane Gade é Doutora em Psicologia pela USP, escritora e professora em várias Instituições de Ensino Superior. Tom Peters é norte-americano, consultor e estrategista, autor de vários livros e é chamado “o criador da empresa pós-moderna”. Sandra Penkal MARCA E MARKETING 94 Neste sentido, as empresas estão envolvidas na comercialização de bens, serviços, experiências, eventos, pessoas, lugares, organizações, informações, idéias, etc. O marketing, portanto, passa a ser ressaltado não só do prisma da venda de produtos/serviços, como também pelas tendências culturais e comportamentais que consegue representar, resumir e antecipar. Neste sentido, concretiza as negociações comerciais, excedendo o conceito de facilitadores de transações do consumidor para a condição de “agregador “ de valor competitivo. Nos próximos tópicos são contempladas as análises mercadológicas da empresa “O Boticário”, que por meio de conceitos diferenciados, com a temática nacional/brasileira e com a valorização de nossas referencias artísticas, consegue, mais uma vez, antecipar tendências no mercado brasileiro de perfumaria premium. Sandra Penkal MARCA E MARKETING 95 4.2 CONDIÇÕES MERCADOLÓGICAS: EMPRESA O BOTICÁRIO E LINHA DE PERFUMARIA FEMININA TARSILA As condições mercadológicas de um negócio envolvem vários fatores estratégicos, como a análise do ambiente de marketing, do público alvo/ consumidor, do composto de marketing e do posicionamento da marca e/ou produto. A empresa deve analisar seus mercados e ambientes de marketing a fim de descobrir oportunidades atraentes e evitar ameaças ambientais. Deve analisar suas forças e fraquezas e também as ações dos mercados atuais e potenciais, para determinar que oportunidades devem ser perseguidas.A seguir são analisados os fatores estratégicos da empresa “O Boticário” e da Marca de Perfumaria Feminina Tarsila. 4.2.1 Empresa “O Boticário” “O Boticário” é uma empresa totalmente brasileira e que está no mercado faz 26 anos. Iniciou suas atividades com uma pequena farmácia de manipulação no centro de Curitiba, Estado do Paraná. Hoje a empresa apresenta um grande portfólio de produtos (Tratamento para Corpo e Rosto, Tratamento de cabelos, Proteção Solar, Maquilagem, Linha Spa, Linha Infantil, etc). Seu fundador e presidente, Miguel Krigsner, sempre apostou no potencial do mercado brasileiro de cosméticos e hoje a empresa conta com mais de 10 mil colaboradores em todo o Brasil, com a fábrica localizada em São José dos Pinhais/PR. A Figura 31 mostra o logotipo da marca. Sandra Penkal MARCA E MARKETING 96 Figura 31 – Logotipo da marca “O Boticário” (http://www.boticario.com.br) A marca “O Boticário” é associada à qualidade, tecnologia, proteção ao meio ambiente e respeito ao consumidor. A instituição desenvolve programas de responsabilidade social e ambiental, por intermédio da Fundação “O Boticário”, conforme mostra a página institucional da empresa na Internet: “A Fundação O Boticário de Proteção à Natureza é uma organização sem fins lucrativos, cuja missão é promover e realizar ações de conservação da natureza. Suas ações estão pautadas em ciência e na consciência de que esse é o caminho para a manutenção da vida na Terra. O desafio da Fundação O Boticário é grande: proteger a natureza do Brasil, país que é considerado um dos maiores abrigos de vida do mundo, mas que enfrenta significativos desafios sócioeconômicos. O uso inadequado dos recursos naturais tem causado degradação, extinção de espécies e, conseqüentemente, diversos reflexos negativos ao equilíbrio natural..., também protegem importantes sítios do patrimônio arqueológico, cultural e histórico do país.” (http://www.boticario.com.br) Por meio de produtos inovadores e de qualidade comprovada, a empresa cresceu e, além disso, conquistou o mercado com uma rede de lojas na estrutura de Sandra Penkal MARCA E MARKETING 97 franquias. Com mais de 2.200 lojas no Brasil, “O Boticário” além de operar no mercado brasileiro, está presente em vários países e vem consolidando sua presença internacional por meio da oferta de seus produtos em lojas exclusivas, departamentais e multimarcas, localizadas em Portugal, Estados Unidos, México, Emirados Árabes, Arábia Saudita, Egito, Grécia, Cabo Verde, Suriname, Nicarágua, El Salvador, Venezuela, Bolívia, Peru, Uruguai, Paraguai, Moçambique, África do Sul, Angola, Japão e Austrália. “O Boticário” é, hoje, uma das maiores redes de franquias em perfumaria do mundo com um conceito singular de loja e atendimento. A palavra “franquia” tem sua origem em: “Franc é uma palavra proveniente do francês antigo, que significa a transferência de um direito, outorga de um privilégio ou concessão exclusiva. Tecnicamente falando, franchising não é um negócio ou uma indústria, mas sim um método de condução de negócios. Franchising é um sistema de distribuição no qual um fornecedor concede à outra parte interessada o direito de comercializar seus produtos ou serviços, conforme termos e condições pré-estabelecidos em comum acordo, durante um certo período de tempo, e numa área ou região específica. Podemos definí-lo ainda como um sistema estratégico para distribuição de bens e serviços pelo qual uma empresa (franqueadora) cede o direito de uso de seu nome, seu logotipo, know-how e tecnologia, mediante ao pagamento de taxas a um terceiro, que se torna um franqueado com determinados direitos e obrigações para com o detentor da marca.” (http://www.sofranquias.com.br/conceitos) E, considerando ainda o conceito empresarial, a definição de “Franquia Empresarial” está na Lei no 8.955 de 1994 e é: "Franquia empresarial é o sistema pelo qual um franqueador cede ao franqueado o direito de uso de marca ou patente, associado ao direito de distribuição exclusiva ou semi-exclusiva de produtos ou serviços e, eventualmente, também ao direito de tecnologia de implantação e administração do negócio ou sistema operacional desenvolvidos ou detidos Sandra Penkal MARCA E MARKETING 98 pelo franqueador, mediante remuneração direta ou indireta, sem que, no entanto, fique caracterizado vínculo empregatício" (BRASIL Lei no 8.955 art. 10, 1994). “O Boticário” desenvolve regularmente um Plano de Expansão, pesquisando o potencial de cada mercado e identificando as oportunidades de negócios. Do resultado deste estudo depende a abertura de cada uma das franquias. Só depois de avaliadas todas as possibilidades de sucesso, uma nova loja é aberta, Figura 32. Figura 32 – Exemplo de loja franqueada de “O Boticário”. (http://www.boticario.com.br) Hoje, as lojas apresentam um modelo de identidade visual que demonstra elegância e modernidade, destacando os principais elementos associados à marca “O Boticário: Natureza; Tecnologia; Sonho; Brasilidade”. Pensar em franchising no Brasil é pensar em “O Boticário”. Esta é uma das primeiras empresas a apostar neste sistema e é a franqueadora que mais cresceu. A estrutura de vendas e Sandra Penkal MARCA E MARKETING 99 atendimento da empresa é realizada por consultoras de beleza, detentoras de conhecimento de cosmético e perfumaria. 4.2.2 Linha de Perfumaria Feminina Tarsila Considerando a abrangência do marketing nas organizações e seu impacto na gestão empresarial, desenvolve-se o composto de marketing, ou seja, o conjunto de ferramentas de marketing empregadas para perseguir os objetivos no mercadoalvo. São elementos estabelecidos e controláveis pela estratégia da empresa. Neste sentido, analisa-se a seguir o composto de marketing da Linha Tarsila, considerando: o público alvo, o produto, o preço, a praça (distribuição), a promoção e a marca/branding . 4.2.2.1 Público Alvo O público-alvo, também conhecido como consumidor ou target, é uma definição estratégica, pois determina para a empresa o direcionamento no desenvolvimento do produto/ marca, bem como todas as decisões do composto de marketing. Neste sentido, a construção do conceito e posicionamento do público alvo da Linha Tarsila surgiu da inspiração da vida e obra da artista plástica, caracterizada principalmente pela sua irreverência, coragem, talento e beleza. Ninguém rompeu a tradição com mais ousadia, determinação e brilho como Tarsila do Amaral. Sandra Penkal MARCA E MARKETING 100 A linha Tarsila está posicionada para mulheres envolventes e ousadas, detentoras de um grande senso de curiosidade. Para elas é importante viver intensamente cada momento de suas vidas. A forte determinação é uma grande característica da forma como encaram suas vidas. São mulheres modernas e que vivem a frente de seu tempo, depositando um amor extremo em tudo que realizam. Exuberantes, cultivam a sua beleza e elegância e, acima de tudo, são felizes. O público alvo da marca é diferenciado e transmite as características da marca por meio da sofisticação e qualidade no produto. Este público é composto por mulheres na faixa etária de 25 a 50 anos, pertencentes às classes econômicas A e B. As consumidoras que a marca Tarsila pretende atingir, são as “buscadoras” de Marca, pois estas são fiéis à marca, independente da estratégia de preços que esta pratica. A marca é a principal motivação que leva as consumidoras a comprar. São mulheres com estilo de vida socialmente ativo, que possuem valores associados à aceitação e reconhecimento do grupo social de referência onde estão inseridas e adquirem produtos que reflitam estes valores. Consumidoras que procuram por um produto exclusivo e sofisticado para atender às suas necessidades, também buscam marca, exclusividade, qualidade e status. 4.2.2.2 Produto: Linha Tarsila O produto apresenta-se como o elemento tangível do composto de marketing, Sandra Penkal MARCA E MARKETING 101 ocupando posição de referência e de destaque na relação mercadológica. As decisões em seu processo são amplas e abrangem aspectos estratégicos, científicos, técnicos e mercadológicos. Neste sentido, os produtos da Linha Tarsila, Figura 33, apresentam um posicionamento diferenciado e estão segmentados para o mercado seletivo. Figura 33 – Perfume Tarsila da linha (http://boticario.com.br). de fragrâncias femininas de “O Boticário” Um dos maiores diferenciais competitivos é a assinatura Tarsila, que se apresenta como um forte símbolo, que gera valor agregado ao produto. Além disso, a fragrância é de excelente qualidade, inspirada na vida e obra de uma das maiores artistas plásticas brasileiras que se tornou símbolo do modernismo no Brasil. A embalagem é elegante e arrojada, tornando o Perfume Tarsila - 100mL um dos carros chefe do portfólio da perfumaria premium de “O Boticário”. Sandra Penkal MARCA E MARKETING 102 Como parte do portfolio, inclui-se também a Emulsão Perfumada Tarsila 200mL, Figura 34. Este produto possui uma formulação à base de Leite da Flor de Hibiscus mais agentes emolientes que deixam a pele macia, hidratada e agradavelmente perfumada. Figura 34 - Emulsão Perfumada Tarsila 200mL da mesma linha do perfume Tarsila de “O Boticário” (http://boticario.com.br). A gestão estratégica das marcas acontece em função das necessidades conjunturais e estruturais, determinadas pelo mercado. No mesmo sentido estratégico, existem algumas opções para a marca que já esteja a algum tempo no mercado, de tal modo que a estratégia de extensão de linha pode ser uma das maneiras de revitalização da marca ou do produto. Desta forma a empresa “O Boticário”, depois de quatro anos do lançamento da Linha Tarsila/2002, adotou a estratégia de extensão da linha com o Perfume Tarsila Rouge de 100mL, Figura 35. Sandra Penkal MARCA E MARKETING 103 “O Boticário” homenageou as mulheres com Tarsila Rouge, lançamento com edição limitada feito em março de 2006 no Dia Internacional da Mulher. A criação da embalagem foi inspirada na obra Manteau Rouge (Tarsila do Amaral "Auto-retrato – Le manteau rouge", 1923, óleo sobre tela, 73 x 60,5 cm). Figura 35 – Linha Rouge de “O Boticário” foi inspirada na pintura de Tarsila do Amaral intitulada Manteau Rouge, pintada em 1923 (http://boticario.com.br). Conforme já foi mencionado, o estilo artístico de Tarsila, associa as técnicas do cubismo à temática e ao cromatismo singular brasileiro. Observou-se, também, que nas suas fases artísticas, Tarsila deposita a influência que sofreu da arte européia, principalmente dos cubistas, e em especial de Pablo Picasso. Picasso aplicava figuras geométricas quando pintava a natureza, por expor Sandra Penkal MARCA E MARKETING 104 nela o quadrado, a esfera e o cone. Freqüentemente em seus desenhos apresentava uma face, habilmente distorcida, e também demonstrava formas que se desvendam em planos geométricos, cubos e volume, distribuídos concomitantemente em diversos ângulos da obra. Tal proposta pode ser observada com muita propriedade no cartucho da linha Tarsila Rouge, onde as características cubistas de Picasso são muito evidentes e competentemente aplicadas no cartucho do produto. A fragrância de Tarsila Rouge é intensa e feminina, é para mulheres ousadas e marcantes que, como Tarsila, imprimem sua marca por onde passam. O perfume apresenta as características olfativas seguintes: Ö Saída: Bergamota, Mexerica, Pimenta-Preta, Pêssego; Ö Corpo: Flor-de-Lótus, Magnólia, Jasmim; Ö Fundo: Madeiras de Cashmere, Musk, Baunilha. Como complemento da linha Tarsila Rouge, foi lançado, simultaneamente, o batom Tarsila Rouge, Figura 36. O sucesso alcançado pela empresa “O Boticário” foi instantâneo, pois a cor do batom é linda (vermelho Manteau Rouge) e está muito integrada com o conceito da linha e perfil da consumidora alvo. Sandra Penkal MARCA E MARKETING 105 Figura 36 – Batom da linha Tarsila Rouge de “O Boticário” lançado em março de 2006(http://boticario.com.br). O batom tem, também, muita qualidade, proporciona mais conforto e maciez aos lábios, sua fórmula resultou em produto hidratante pois usa um complexo de ceramidas e ingredientes umectantes. Oferece textura macia, cobertura uniforme e duradoura, com ótimo deslizamento. Sua fórmula contém Vitamina E e FPS 12 que mantém os lábios protegidos da ação do sol. 4.2.2.3 Preço O preço é um elemento altamente estratégico, e que mais absorve pressões e influências do ambiente externo em sua definição. As decisões são extremamente estratégicas e abrangem aspectos organizacionais, técnicos e mercadológicos. Ao considerar todos estes fatores os produtos da Linha Tarsila, possuem uma estratégia de preço Premium, base Junho de 2006 (ref. São Paulo Capital) e são: Sandra Penkal MARCA E MARKETING 106 Ö Perfume Tarsila 100mL: Preço R$ 72,00; Ö Emulsão Perfumada Tarsila 200mL: Preço R$ 29,90; Ö Perfume Tarsila Rouge 100mL: Preço R$ 78,00; Ö Batom Tarsila Rouge: Preço R$ 21,90 Conforme discutido, a linha Tarsila de Perfumaria é estratégica para “O Boticário” no contexto institucional, pois agrega imagem de marca. Seu posicionamento de preço, por isto, é mais elevado em função do seu valor agregado. 4.2.2.4 Praça (Distribuição) A distribuição é o elemento de maior representatividade da relação entre o ambiente interno (empresa) e o externo (mercado), uma vez que o produto desejado deve proporcionar as condições ideais para que seja disponibilizado no momento certo e no lugar certo, e na quantidade desejada. As decisões são estratégicas e adversas, abrangendo os aspectos: conceituais, quanto aos canais e tipos de distribuição; técnicos, quanto à logística necessária; mercadológicos, quanto ao produto e quantidade desejada, e altamente operacionais quanto à realização do processo. Segundo mencionado anteriormente, “O Boticário” desenvolve uma estratégia bastante inteligente de venda, pois apesar de grande parte da sua operação estar na estrutura de franquias, a empresa também atua em outros paises com estratégias Sandra Penkal MARCA E MARKETING 107 de distribuição diferenciadas com o objetivo de atender as necessidades de cada tipo de mercado. O poder de expansão e internacionalização do “O Boticário” tem sido muito bom, e isto representa uma abertura de fronteiras positiva , também , para o Brasil. 4.2.2.5 Promoção Considerando os fatores promocionais, as decisões são estratégicas e envolvem aspectos: conceituais quanto à forma de comunicação integrada; científicos, quanto ao perfil do mercado-alvo; técnicos, quanto ao tipo de comunicação e mercadológico, quanto à cobertura da mensagem, e o elemento de comunicação e estímulo com o mercado. No caso da linha Tarsila as decisões refletiram os objetivos estratégicos da linha de produtos e da marca “O Boticário”. A comunicação da marca Tarsila foi planejada para atingir o seu público alvo provocando interesse e conhecimento. Os investimentos na marca foram realizados de forma intensa no decorrer do primeiro ano de operação da linha (no ano de 2002), porém com sustentação durantes os outros anos, e até hoje. Os materiais de comunicação foram utilizados de forma segmentada por ação promocional da forma seguinte: Ö Mídia eletrônica e filmes publicitários. Foi utilizada a imagem da atriz Daniela Escobar, Figura 37, para ação de comunicação e como representante do publico alvo . Sandra Penkal MARCA E MARKETING 108 Figura 37 – Signos da publicidade na mídia eletrônica para lançamento do perfume Tarsila de “O Boticário”. Ö Mídia impressa: Foi feita uma campanha nas 10 principais revistas femininas de circulação no Brasil, Figura 38. Figura 38 – Propaganda impressa em diversas revistas de circulação nacional para lançamento do perfume Tarsila de “O Boticário”. Sandra Penkal MARCA E MARKETING 109 Ö Equipe de vendas e Lojas: Distribuição de folder conceitual e de treinamento para os gerentes de Loja, consultoras e caixas, Figura 39. Figura 39 – Folder com a propaganda do perfume Tarsila de “O Boticário” (http://boticario.com.br). Ö Estratégia de Lançamento Amostragem: Cartela com amostras, com flaconete do perfume, Figura 40. Distribuição: no ponto de venda e outros eventos com o publico alvo. Figura 40 - Cartela com amostras, com um flaconete do perfume Tarsila de “O Boticário”. Sandra Penkal MARCA E MARKETING 110 Ö Promoção de Lançamento: Na compra do Perfume Tarsila 100mL mais R$ 1,80, o consumidor ganhava um lindo porta-retrato, Figura 41. + R$ 1,80 = Figura 41 - Perfume Tarsila 100mL. Na promoção de lançamento o consumidor ao comprá-lo e pagar mais R$ 1,80 ganhava um porta-retrato (http://boticario.com.br). Como ferramenta de comunicação foi utilizado também o trabalho de Relações Públicas e Assessoria de Imprensa para o desenvolvimento da estratégia de lançamento e da sustentação mercadológica da Linha Tarsila. 4.2.2.6 Marca/branding. A marca Tarsila está associada à qualidade, inovação, força, sensibilidade, beleza e exclusividade. Qualidades essas identificadas no perfil do seu público alvo. Como fatores estratégicos para a marca institucional “O Boticário” e para a Marca Sandra Penkal MARCA E MARKETING 111 de Perfumaria Feminina Tarsila, foi utilizado um símbolo forte – a assinatura Tarsila, que pode reunir - associação, criar uma identidade - marca, e auxiliar no seu relacionamento com o consumidor, fator decisivo na construção do branding, a partir da vinculação emocional entre a marca e o consumidor, Figura 42. Figura 42 – Identidade do perfume Tarsila de “O Boticário” que é representada pela assinatura da Tarsila do Amaral. Ao utilizar o nome Tarsila, fica evidente como as revelações marcárias surgem por meio de composições sígnicas, confrontando-se assim com uma mudança conceitual na qual os bens de consumo não derivam prioritariamente da necessidade, e sim a necessidade passa a existir como efeito da presença de seus signos que se transformam em desejos. Como estratégia da marca Tarsila, o Branding, o relacionamento com o cliente foi constituído por uma demanda de experiência e afetividade com o seu signo, desenvolvendo um vínculo e uma fidelidade da marca pelo consumidor; conseqüência da associação a uma identidade, como meio de significação, por atributos e benefício funcionais e emocionais. Outro fator determinante para o sucesso da marca Tarsila, foi emprego de um design fundamentado em elementos tipicamente nacionais, por meio da valorização das nossas heranças artísticas e culturais. Sandra Penkal CONCLUSÕES 112 5 CONCLUSÕES No mundo contemporâneo, em razão do processo de globalização e informatização, observa-se um grande desenvolvimento dos aspectos intangíveis da marca, amparado por várias possibilidades de relacionamento da marca com o mercado, e com o seu consumidor. Isto ocorre, entre outros fatores, por meio de interconexões geradas por uma nova forma de comunicação. Neste contexto, em função da intangibilidade da marca, é necessária ponderar o Branding relacionamento com o cliente, e criar uma conexão entre a marca e o consumidor. Nesta dissertação foi avaliada a marca e suas relações sígnicas, o que conduziu a uma análise mais aprofundada desta marca, dos seus significados e de valores que possam levar o consumidor a ter os sentimentos e as relações que a marca pode expressar. Para aplicar a teoria semiótica neste trabalho, foram usados os conceitos peirceanos, que criam formas de classificação, para entender a pluralidade dos signos que existem em nossa sociedade. Essa classificação visou entender como o signo aparece; a que ele se refere e que tipo de efeitos pode causar em uma mente interpretadora, considerando a relação Arte X Design. Defendeu-se dessa forma, que a semiótica enxerga a marca e o produto como um signo, conseqüentemente, como uma reprodução de algo que o mercado e o consumidor, em particular, podem aspirar. Neste sentido a identidade visual e a marca, também, podem utilizar tais mecanismos como fortes edificações, que vinculadas às referencialidades da Sandra Penkal CONCLUSÕES 113 marca, propiciam acender a uma grande motivação e fidelização do seu público alvo. O desenvolvimento de projetos de marca / branding e marketing, podem ser sustentados, por meio de uma reflexão semiótica e com elementos lógicos para auxiliar o aperfeiçoamento de novas estratégias e significados que ao tomarem contato com o mercado, com o público-alvo, ou mesmo com alguma forma de comunicação, sejam capazes de causar sensações - marketing sensorial - e ações, uma vez que a análise semiótica investiga os apelos tanto emocionais como racionais, e suas implicações. Atualmente, tem-se experiência de um mercado exposto, no qual as manifestações marcarias e sua absorção nas relações comerciais, se apóiam em uma nova estrutura de negociação e de comunicação. A marca (comercial ou institucional), portanto, deve carregar em si uma ponderação sobre a sua função no universo da comunicação mercadológica e da identidade institucional, como signo social e também um bem simbólico. O presente trabalho, neste sentido, também analisou o papel do designer como formador de opinião, de conscientização e fomentação das questões sociais, culturais e ambientais. Torna-se essencial que o designer transmita estes valores em seus trabalhos e identidades, pois, particularmente o Brasil é um país com composições étnicas/sociais/culturais muito variadas, e o que se vê é que o design brasileiro é idealizado de forma a transmitir esta diversidade. O legado cultural brasileiro é extremamente qualificado, assim sendo a diversidade tem se Sandra Penkal CONCLUSÕES 114 fundamentado em algumas peculiaridades, valorizando e diferenciando o design nacional. Este acontecimento é ressaltado com o lançamento da linha Tarsila de “O Boticário”, no projeto do designer curitibano Leonardo Alves Cordeiro. O Brasil é um país rico em movimentos culturais, expresso das mais distintas maneiras, e com características próprias de cada região, decorrente do vasto território e das inúmeras influencias externas. Até mesmo, muitos brasileiros desconhecem grande parte desta cultura, porém, têm sido gradualmente estimulados por uma onda de patriotismo que tem atingido o universo do design, reconhecidos com as criações nacionais, com suas cores e a relação direta de uma cultura miscigenada. Também, com a nossa competência de reciclar materiais, com humor, a flexibilidade emocional e cultural evidenciada em muitos segmentos, não há como negar que o mercado internacional vem valorizando os produtos brasileiros. Isto pode ser visto no número de prêmios na edição do IF Design de 2004, em que a empresa “Natura”, que atua na mesmo segmento de mercado que “O Boticário”, recebeu um prêmio na categoria de design de embalagem do “Perfume do Brasil”, da linha Natura Ekos. Na medida em que o mercado se torna mais especifico, assume maior complexidade, uma vez que as variáveis aumentam: o dispositivo de saída que o design nacional busca é o de adequar, aos produtos brasileiros, a qualidade de forma para torná-los mais competitivos no mercado global. A maior parte das indústrias brasileiras nos mais distintos setores, porém, não possui uma tradição na utilização de um design fundamentado em elementos tipicamente nacionais, resultando na reprodução de conceitos desenvolvidos por Sandra Penkal CONCLUSÕES 115 outros países. Este acontecimento já foi vivido em outros períodos culturais e artísticos na história do Brasil (Movimento Modernista). O setor de cosméticos e perfumaria, de modo competente, identificou a oportunidade de incentivar a consolidação do Design Nacional, e apontou investimentos na produção e lançamento de produtos. Atualmente, alguns segmentos já utilizam elementos nacionais para a produção de seus produtos, mas ainda são poucas as que utilizam um design fundamentado em elementos brasileiros para a criação de produtos de consumo. Ressalta-se o “trânsito” da Arte X Design para Design X Arte. Os profissionais do setor como os designers, produtores, anunciantes e consumidores, promovem a movimentação e a alteração dos significados culturais entre as várias esferas do mundo social, pois vivem em um ambiente onde as mídias estão, a cada dia, mais evidentes e atuantes. Destarte, um símbolo forte pode congregar associação, ligação, coesão e estrutura para uma identidade marcaria. Sua exposição é um fator determinante na potencialização da marca, expandindo a importância dos símbolos como elemento de composição e da marca, aumentando a sua força. A marca e o marketing, conseqüentemente, passam a ser salientados não só pelo aspecto mercantil, mas, principalmente, pelos aspectos culturais e comportamentais que ostentam. Consolidam-se assim as relações comerciais ampliando o seu valor competitivo. Como exemplo cita-se a empresa “O Boticário” Sandra Penkal CONCLUSÕES 116 que possui um posicionamento diferenciado, pelo conceito de valorização das raízes nacionais, das nossas heranças artísticas, inovando e antecipando, mais uma vez, as tendências no mercado de perfumaria. A proposta fundamental deste estudo foi analisar a conexão entre a arte, o design de produtos e as marcas comerciais, por meio dos elementos formais representados pelo universo artístico que são, num determinado aspecto, reprodutivos e acessíveis. Com a valorização dos aspectos sensoriais, como forma de reconhecer e se comunicar com o mundo, tornam-se possível analisar a complexa estrutura de significações. Igualmente o universo dos sentidos e das sensações, também trouxeram contribuições importantes para este trabalho de análise do perfume que homenageia a grande artista brasileira Tarsila do Amaral, por meio de uma linguagem e de um alfabeto próprio do perfume, desempenhada pela arte da perfumaria e do design. Sandra Penkal REFERÊNCIAS 117 REFERÊNCIAS AAKER, David. Marcas: Brand Equity Gerenciando o Valor da Marca. São Paulo: Negócio Editora, 1998. ASCHCAR, Renata. Brasil essência. A cultura do perfume. São Paulo: Nova Cultural, 2001 Cap 3 ALESSI, A. Design and Poetry. In: Object and Image. Helsinki UIAH: University of Industrial Arts, 1992, p. 10 AMARAL, Aracy. Tarsila: sua obra e seu tempo. São Paulo: Perspectiva, EDUSP,1975. ANDRADE, Oswald. O Manifesto Antropófago. Revista de Antropofagia. 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