ENXAQUECA 1. O que é enxaqueca? Os pacientes com enxaqueca receberam de alguém da família os genes da doença. Embora em apenas um tipo mais raro de enxaqueca, a hemiplégica familiar, tenha sido evidenciado o cromossomo 19 como responsável pela transmissão de um parente para outro, aceita-se hoje que os demais tipos, inclusive os mais comuns, como a enxaqueca sem aura, também sejam herdados através de genes. 2. Como reconhecer a enxaqueca? As crises de enxaqueca apresentam-se como: Dor pulsátil ou latejante (podendo ser em pressão ou aperto) nas regiões da fronte e têmpora; A dor se apresenta mais de um lado da cabeça (em 40% dos pacientes é dos dois lados); A intensidade é moderada a severa ou severa; Geralmente incapacita o paciente para as suas atividades normais; Se inicia leve e progressiva; Piora com esforços ou atividades físicas; Duram em média de 4 a 72 horas quando não são tratadas ou o são de forma ineficaz, geralmente terminando de forma gradual. São associadas a pelo menos dois dos sintomas abaixo: Enjoo ou vômitos Intolerância à claridade ou a ruídos (foto e fonofobia) Após as crises, algumas pessoas sentem-se ótimas, enquanto outras, como se um “trator” tivesse passado por suas cabeças, sentindo, inclusive, dor intensa no couro cabeludo. Sinais de alerta: Há pessoas que sentem que vão ter uma crise de enxaqueca antes de a dor aparecer, a partir de “avisos” que o organismo pode fornecer. Por vezes, estes avisos se iniciam inespecíficos, um dia ou algumas horas antes, com sensações do tipo: Desconforto na cabeça; Bocejos frequentes; Irritabilidade; Perda da capacidade de concentração ou raciocínio; Diarreia; Desejo exagerado por algum tipo de alimento ou aversão total; Desconforto abdominal; Palidez (muito frequente em crianças); Esses sinais chamam-se PRÓDROMOS e não estão presentes em todos os sofredores de enxaqueca, ou então, em um mesmo paciente, estão presentes antes de alguns episódios, mas não de todos. Quando os sinais são mais intensos, antecedendo a crise em menos de duas horas e apresentando-se como dormência ou diminuição da força muscular em um lado ou parte do corpo, observação de pontos ou raios luminosos ou brilhantes e perda total ou parcial de uma parte do campo de visão, os chamamos de AURA. Fatores deflagradores da enxaqueca: Muitos são os fatores externos ou internos de agressão que podem iniciar uma crise de dor em quem tem enxaqueca. No entanto, vamos listar abaixo os fatores mais frequentes relacionados ao início do processo doloroso: Alimentos e Bebidas: queijos amarelos envelhecidos (contêm tiramina); frutas cítricas (principalmente laranja, limão, abacaxi, pêssego); banana – principalmente banana d’água (em alguns pacientes); linguiças; salsichas e alimentos de coloração avermelhada em conserva (devido aos nitritos e nitratos usados como conservantes); frituras e gorduras; chocolate (contém feniletilamina e cafeína); café, chá, refrigerantes à base de cola; aspartame (adoçante artificial); glutamato monossódico (presente em molho geralmente usado em pratos da cozinha oriental); vinhos (principalmente o tinto, que possui radicais fenólicos, já que a tiramina também existe no vinho branco e não é a única responsável); cervejas, chope; aguardentes e uísque. Hábitos de alimentação e sono: mais de cinco horas seguidas sem se alimentar; dormir mais ou menos do que o habitual para aquele determinado paciente. Variações bruscas de temperatura e umidade do ar: Principalmente a entrada em ambientes frios estando antes em ambiente quente e vice-versa, e a ingestão de líquidos gelados com o organismo aquecido ou suando muito. Fatores emocionais e estresse: Como não existe vida sem estresse, principalmente nas grandes cidades, é comum observarmos que muitas pessoas que sofrem de enxaqueca entram em crise logo após períodos de estresse ou excitação. Fases de depressão ainda não foram caracterizadas como responsáveis pelo início de uma crise, embora a incidência do problema nos sofredores de enxaqueca tenha sido considerada estatisticamente maior do que na população normal. Menstruação e fatores hormonais: É muito comum observarmos mulheres portadoras de enxaqueca apresentarem dor nas fases pré, durante ou após a menstruação. Há mulheres que só apresentam crises de enxaqueca na época menstrual (14 % das mulheres com enxaqueca). Parece que a queda sanguínea normal, que ocorre em uma fração do estrogênio, nesta época do ciclo menstrual, é a maior responsável por esta incidência significativa. Entretanto, há muitas portadoras de enxaqueca que pioram de suas crises a partir do momento em que iniciam o uso de anticoncepcionais orais. Também é observado que, na menopausa, muitas mulheres melhoram espontaneamente e voltam a piorar quando iniciam a reposição hormonal estrogênica. Observações: Há ainda fatores deflagradores específicos e individuais para vários pacientes, que não são considerados comuns ou frequentes. Soubemos, por exemplo, de uma paciente que entrava em crise todas as vezes que fazia esclerose de microvarizes com alguma daquelas substâncias saponáceas utilizadas habitualmente. Tratamentos 1. Tratamento preventivo: Para a realização de um tratamento eficaz e com aderência do paciente, é fundamental que sejam fornecidas orientações claras sobre as causas e os mecanismos da dor e da doença enxaqueca, assim como o fato de que as crises de dor de cabeça podem ser deflagradas por fatores variados e comuns na vida de qualquer pessoa. Isso porque a simples prescrição de medicamentos preventivos, geralmente drogas consideradas “fortes” pelo paciente e combinadas com drogas para outras doenças, sem que ele entenda o porquê da ocorrência de cefaleias tão desconfortáveis e incapacitantes, é sinônimo de insucesso e peregrinações por diversos profissionais. O tratamento farmacológico da enxaqueca divide-se em preventivo e agudo. O tratamento preventivo deve ser realizado quando há mais de duas crises de dor de cabeça forte e/ou com duração prolongada por mês ou quando, a despeito da frequência, a intensidade dos ataques é devastadora e absolutamente impeditiva de quaisquer atividades. Atualmente, um novo conceito de que a enxaqueca é uma doença progressiva, que pode ser associada a uma maior incidência de infartos cerebrais, razão pela qual os pacientes devem ser tratados preventivamente mesmo com baixa frequência de crises, vem ganhando mais respaldo na comunidade científica. Várias classes de drogas podem ser usadas (tabela 5). Independentemente da medicação escolhida, todos os tratamentos devem ser iniciados em doses baixas, com preferência pela monoterapia (apenas uma droga) nos casos mais simples e virgens de tratamento. Além disso, as doses devem ser mantidas por dois a três meses para se avaliar a sua eficácia. Os pacientes devem entender claramente que não se pode esperar benefícios antes desse período de tempo, embora alguns melhorem antes disso. Entre as várias drogas usadas, os β bloqueadores são utilizados há mais de 25 anos e ainda representam uma das primeiras escolhas de tratamento para os pacientes não asmáticos. São drogas originariamente usadas para pressão alta e para doenças do coração, mas isso nada tem a ver com seu efeito na enxaqueca. Deve ser enfatizado que as doses necessárias para a prevenção da migrânea são inferiores àquelas para doenças cardiovasculares e, portanto, a tolerabilidade é melhor na maioria dos casos e os efeitos colaterais são bem menos comuns. A metisergida é considerada a droga mais antiga prescrita especificamente para a profilaxia das crises de enxaqueca, com eficácia alta, em torno de 60 a 70%. Os derivados da ergotamina não são drogas usadas com frequência nos dias de hoje, reservando-se para os casos refratários e resistentes e para a profilaxia em curto prazo, por apenas alguns dias, como na migrânea menstrual. As complicações do uso da metisergida realmente existem, mas sugere-se hoje que sejam devidas a reações individuais do paciente e não relacionadas à dose nem ao tempo de uso. No entanto, a maioria dos médicos não conhece bem a farmacologia das drogas que prescreve e continua propagando os efeitos colaterais e não os benefícios claros da metisergida. Os antagonistas da serotonina, pizotifeno e ciproheptadina são os componentes deste grupo de fármacos que revelam eficácia na prevenção da enxaqueca. As drogas pertencentes a este grupo parecem exercer os seus efeitos em receptores centrais da serotonina. Os efeitos colaterais mais comuns são a sedação e a sonolência intensas, além de ganho de peso nas doses plenas recomendadas. No entanto, quando usadas em associação com outras classes de drogas, podem ser empregadas doses menores e por isso são mais bem toleradas pelos pacientes. Os antidepressivos: Os derivados tricíclicos amitriptilina e nortriptilina são os antidepressivos mais utilizados na prevenção da migrânea e, nesse caso, seu uso nada tem a ver com a depressão. As doses devem ser iniciadas sempre baixas com gradual aumento a cada 5-7 dias e os efeitos colaterais mais observados são síndrome vertiginosa, aumento do apetite, ganho de peso, sonolência, boca seca, constipação intestinal. No entanto, como as doses necessárias à profilaxia da enxaqueca são, em geral, bem inferiores às doses antidepressivas, esses fármacos são bem tolerados, principalmente se iniciados lenta e gradualmente. Os antagonistas ou bloqueadores dos canais de cálcio: Os componentes deste grupo de fármacos apresentam estruturas químicas variadas e diferem em eficácia clínica, efeitos colaterais e contraindicações. A flunarizina é o mais usado no Brasil e age basicamente reduzindo a frequência dos ataques. Embora essa substância seja preconizada na dose de 10mg/dia, recomenda-se sua utilização em dose única de 3 a 5 mg/dia à noite, obtendo-se a mesma eficiência, mas sem os indesejáveis efeitos colaterais de ganho de peso, sonolência e tremor. Os anticonvulsivantes: Nos últimos anos, tem sido dirigida atenção especial a esse grupo de drogas para a prevenção da migrânea. Assim como no caso dos antidepressivos, o seu uso na prevenção das crises de enxaqueca nada tem a ver com o paciente ter ou não epilepsia ou convulsões. Isso precisa ficar bem claro, pois os pacientes frequentemente consultam a bula do remédio e ficam com a ideia incorreta de que o remédio é “forte” ou que o médico imaginou que eles tivessem epilepsia, convulsões e outro problema mais sério em vez da enxaqueca. Deve ficar claro, portanto, que o uso destas drogas é justificado e muito eficaz, uma vez que alguns dos mecanismos cerebrais envolvidos na enxaqueca são similares aos da epilepsia, razão pela qual é possível usar em uma doença as drogas para a outra e vice-versa. O topiramato é uma das mais novas aquisições do arsenal para prevenção da enxaqueca. Ele apresenta inédito mecanismo de ação quádruplo, atuando nos canais de sódio e cálcio, nos receptores glutamatérgicos kaianato/AMPA e aumentando a atividade GABAérgica, ao atuar nos receptores GABAA. Esse neuromodulador vem sendo sugerido para o tratamento preventivo da migrânea desde o final da década de 90. Dois estudos com um grande número de pacientes foram decisivos para corroborar o que vinha sendo observado na prática clínica. A posologia do topiramato, assim como a do divalproato de sódio, é de duas doses diárias. Como ele é inibidor da anidrase carbônica, pode provocar dormência em dedos das mãos e dos pés, sendo necessário aumentar a ingestão de líquidos para evitar e combater esse efeito. Dentre todas as drogas existentes para a profilaxia da enxaqueca, esta é a única que promove perda de peso, da ordem de 1 a 3 kg por mês, sendo uma opção interessante para aqueles que se preocupam com esse aspecto. Miscelânea: Nesse grupo de drogas estão várias substâncias de estrutura farmacológica diferente, como a tizanidina, o feverfew, a riboflavina e o magnésio. A tabela 5 mostra as drogas mais usadas para a profilaxia da migrânea, sua eficácia e perfil de efeitos colaterais. Tratamento das crises: As drogas existentes para o tratamento das crises de enxaqueca são divididas em específicas e não específicas. Entre as específicas, os triptanos são antagonistas seletivos dos receptores serotoninérgicos 5HT1B/1D, e existe bom suporte científico atestando a sua eficácia e segurança. A tabela 6 resume as opções de drogas disponíveis e consideradas eficazes para o tratamento agudo da enxaqueca. Tabela 6 Droga Doses disponíveis (em mg) Doses recomendadas por 24h / formulações Nomes Comerciais 500 / 750 2-6 comprimidos Tylenol Derivados salicilatos 500 2-6 comprimidos Aspirina Naproxeno sódico 550/1100 1-2 comprimidos/supositórios Flanax Clonixinato de lisina 250 – 375 2-3 comprimidos Dolamin Diclofenaco 50-100 1-2 comprimidos / supositórios Voltaren Ibuprofeno 200-600 1-3 comprimidos até 2x ao dia Dalsy Meloxican Ketorolac Indometacina Ketoprofeno 15-30 30-60 50-100 100 1-2 compridos 3 comprimidos / 1 ampola 1 comprimido / 1 supositório 1-2 supositórios Inicox Deocil Indocid Compostos não específicos Analgésicos simples Paracetamol Antiinflamatórios não esteroidais Enxaqueca em crianças: Estima-se que 4 a 8% das crianças tenham enxaqueca. Muitas começam aos cinco anos de idade e há pais que asseguram que, mesmo antes, seus filhos já se queixavam de dor de cabeça. De fato, a enxaqueca pode se iniciar entre os cinco e os 40 anos de idade, e 40% daqueles que iniciam a sua dor antes dos dez anos podem entrar em remissão (fim da dor) espontânea durante a puberdade. Os meninos apresentam uma ligeira predominância sobre as meninas na prevalência da enxaqueca, mas isto é revertido após a puberdade, quando começam a ser produzidos os hormônios sexuais e o estrogênio, que sofre oscilações normais durante o mês no sangue das meninas. Como saber se a criança está com dor de cabeça? É problemático, muitas vezes, saber se a criança realmente tem dor de cabeça, enxaqueca ou se está simplesmente imitando algum parente próximo que sofra de dor de cabeça. No entanto, se ela começa a evitar fazer o que gosta por causa de dor de cabeça e não apenas aquilo que lhe é desagradável, é hora de pensarmos na veracidade das queixas. Se tiver algum parente de primeiro grau com enxaqueca com quem ela convive, aí então é bem provável que esse seja o seu problema, em função da transmissão hereditária desta doença. Como reconhecer a enxaqueca na criança? A apresentação clínica dos ataques de enxaqueca é um pouco diferente nas crianças. Apresenta-se, geralmente, da seguinte forma: Dor mais em peso ou pressão; Localização nos dois lados da fronte; Intensidade moderada (geralmente inferior à dos adultos); Costuma ter duração inferior a 4 horas; Os sintomas associados de enjoo, vômitos e intolerância à luz, ruídos e odores fortes também são comuns. Diferenças de apresentação clínica das crises de enxaqueca em crianças e adultos: Localização da dor Qualidade da dor Intensidade da dor Duração da dor Enjoo Vômitos Intolerância à claridade Intolerância a ruídos Crianças Fronte Peso Moderada Menor ou igual a uma hora Comum Incomum Comum Incomum Adultos Fronte e têmpora Pressão ou latejamento Moderada a forte ou forte 4 a 72 horas Comum Comum Comum Comum Fatores deflagradores de enxaqueca em criança: Nas crianças, a influência alimentar nas crises de enxaqueca é mais marcante do que nos adultos e não raro elas próprias aprendem a evitar determinados alimentos que provocam as dores. Isso talvez se deva não apenas ao hábito moderno de ingerir frequentemente comidas do tipo “junk food” ou “fast food”, tais como sanduíches com queijo cheddar e molhos, cachorro quente, batata frita, brigadeiros, doces, confeitos ricos em corantes artificiais, refrigerantes do tipo cola; como também à ausência relativa, na vida das crianças, da maioria dos outros fatores deflagradores das crises nos adultos, como menstruação, estresse do dia a dia, ambientes com ar viciado ou repleto de fumaça e maus hábitos de sono. Entretanto, nem sempre uma determinada criança com enxaqueca irá apresentar crises quando ingerir um certo alimento. Isso pode ocorrer em uma ocasião e não em outra, obrigando os pais a uma observação mais atenta em conjunto com seus filhos. Alimentos de ingestão comum em crianças que podem deflagrar crises de enxaqueca: Alimento Sanduíches Cachorro quente Doces do tipo brigadeiro Confeitos coloridos Frituras Sorvetes diversos Iogurtes Refrigerantes tipo cola Frutas cítricas Substância envolvida Queijo amarelo – tiramina Salsicha – corantes vermelhos nitritos/nitratos Chocolate – feniletilamina e cafeína Derivados da anilina Batatas fritas – frituras Chocolate – feniletilamina e cafeína Derivados do leite e espessantes Cafeína Laranja, limão – l’octopamina Tratamento preventivo da enxaqueca em crianças: Tratar enxaqueca em criança é sempre um dilema. Dar ou não remédios? A dúvida é frequente, em função das possíveis complicações e efeitos colaterais das medicações usadas. O que norteia a utilização de medicamentos preventivos para o tratamento da enxaqueca em criança são parâmetros como: Periodicidade dos episódios dolorosos; Intensidade da dor; Grau de incapacidade funcional que as crises de enxaqueca acarretam; A resposta da criança ao tratamento das crises e a possibilidade de existência de outras doenças que porventura a criança tenha. Crianças que apresentem uma ou no máximo duas crises de enxaqueca por semana, mas que não são prejudicadas por elas, não devem utilizar medicamentos em caráter diário para preveni-las. Se, no entanto, esta mesma frequência de uma ou duas vezes por semana se traduz em crises incapacitantes, que obrigam ao uso de analgésicos muitas vezes em doses altas, e afastam a criança de suas atividades por várias horas ou mesmo durante todo o dia, deve ser feita a prevenção com o tratamento. Embora saibamos que todo e qualquer medicamento tem as suas contraindicações e efeitos colaterais, o médico consciente, que avaliou bem o caso, saberá escolher as substâncias que podem ser usadas sem prejuízo para a criança. Tratamento das crises de enxaqueca em crianças: O tratamento das crises em crianças também difere do tratamento de adultos. Enquanto as crises infantis são mais leves e geralmente de duração inferior, as dos adultos tendem a ser mais dramáticas e incapacitantes. Por isso, não raro as crianças não utilizam remédios para combatê-las, aprendendo a buscar elas próprias o repouso ou o ato de dormir, que frequentemente trazem alívio. Muitas vezes, água fria na face e cabeça representam grandes aliados à melhora da dor. Em outras ocasiões, entretanto, é necessário o uso de medicamentos para as crises, que também diferem dos usados em adultos. É muito importante que a criança seja avaliada por um médico, se possível um neurologista, para eliminar as causas mais graves da dor de cabeça. Discordamos da solicitação de vários exames complementares, tais como eletroencefalogramas, tomografias computadorizadas, e outros, na ausência de dados e alterações no exame físico e neurológico completos É muito comum a prescrição de antiepilépticos a crianças que apresentaram “achados” de anormalidade em eletroencefalogramas solicitados na vigência exclusiva da dor de cabeça. Enxaqueca na mulher: Antes da adolescência, a incidência de enxaqueca é similar entre homens e mulheres. Após a puberdade, no entanto, um número maior de mulheres passa a apresentar enxaqueca em relação aos homens, na proporção de cinco mulheres enxaquecosas para cada dois homens. Parte dessa maior incidência da dor nas mulheres se deve ao fator hormonal, em particular o hormônio estrogênio. Estudos indicam que 65% das mulheres apresentam crises de enxaqueca mais intensas e de maior duração durante a época menstrual. A enxaqueca na gravidez: A enxaqueca pode se iniciar na gravidez. Muitas mulheres passam a apresentar crises de enxaqueca no primeiro trimestre da gravidez ou imediatamente após o término da mesma. Entretanto, quase 70% das mulheres com enxaqueca melhoram, isto é, apresentam decréscimo da frequência e intensidade das crises, durante o segundo e terceiro trimestres desta fase de suas vidas. Durante a gravidez, tratar crises de enxaqueca ou fazer a sua prevenção medicamentosa é sempre um problema. Embora haja medicamentos considerados “seguros” na gravidez, os estudos com eles são baseados em análises passadas de mulheres grávidas que os tomaram até de forma casual. Isso representa que as conclusões observadas não são totalmente confiáveis e até orientação segura em contrário, remédios de quaisquer tipos não devem ser usados durante a gravidez, principalmente no primeiro trimestre. Para aquelas mulheres que apresentam crises durante a gravidez, recomenda-se repouso recostado no leito, compressas geladas na cabeça, técnicas de relaxamento. Se as crises são frequentes, o tratamento preventivo deve ser aventado, mas sempre com estrita orientação de médico consciente e que leve em conta os riscos e a real necessidade do uso da medicação. Enxaqueca na menstruação: A enxaqueca pode apresentar-se apenas na fase pré-menstrual ou durante a menstruação. Muitas mulheres têm enxaqueca durante todo o mês, mas pioram nesta fase. Outras têm dor apenas neste período do mês. É comum haver crises intensas, refratárias aos medicamentos usados habitualmente e “indo e vindo” ao longo de vários dias. Deve-se tratar as crises de forma objetiva e eficaz, para que não perdurem por várias horas ou dias, e preveni-las com o uso de drogas tomadas ao longo de todo o mês ou apenas nas fases pré e durante a menstruação (naquelas que revelem dor restrita a esse período). Muito se tem especulado a respeito do uso de pílulas anticoncepcionais e piora da dor menstrual. Isto realmente se observa com frequência. Pacientes que iniciam crises de enxaqueca após começar o uso de anovulatórios tendem a piorar da dor quando suspendem a ingestão da pílula no fim da cartela. Esta piora deve-se à queda mais acentuada de fração do hormônio estrogênio, que, fisiologicamente, tem o seu nível sanguíneo diminuído com a proximidade da menstruação. Em certas ocasiões recomenda-se inclusive a suspensão do uso do anticoncepcional nos casos de piora acentuada da dor. Em outros, que demandam a sua utilização, recomenda-se o uso contínuo da pílula, sem a interrupção no fim do ciclo menstrual para evitar a queda do nível estrogênico. Enxaqueca na menopausa: “A mulher melhora da enxaqueca após a menopausa.” Este conceito popular domina o imaginário de médicos e pacientes. De fato, devido à queda da produção de estrogênio e, consequentemente, da variação de seu nível sanguíneo durante o mês, após a menopausa muitas mulheres com enxaqueca realmente melhoram da frequência da dor. Homens após a andropausa também tendem a melhorar e, não raro, a enxaqueca desaparece nesta fase da vida. É importante ressaltar, no entanto, que embora muitas pacientes melhorem no pós menopausa, algumas mantêm o padrão doloroso e outras, ainda, apresentam exacerbação do quadro de dor. Há estudos que indicam que: 62% das pessoas melhoram da dor de cabeça com a menopausa; 20% mantêm as características ·18% relatam a piora da dor. da dor inalteradas e Enxaqueca na terapia de reposição hormonal: Mulheres em uso de reposição hormonal podem apresentar importante piora da enxaqueca. É comum a observação de pacientes que evoluíam muito bem em seus tratamentos para a dor de cabeça terem suas crises pioradas ao iniciarem terapia de reposição hormonal. Isso se deve à oscilação do nível sanguíneo do estrogênio quando a reposição é interrompida ao término de cada ciclo. Frequentemente, cria sofrimento e obriga a mulher a aventar a suspensão do uso de hormônios. Nesses casos, é importante o diálogo entre o neurologista responsável pelo tratamento da enxaqueca e o ginecologista que conduz a terapia hormonal, para que ajustes sejam feitos nos tratamentos de forma a alcançar o equilíbrio da melhora obtida anteriormente. Enxaqueca transformada: São as dores de cabeça em caráter diário ou quase diário (mais de cinco vezes por semana), que podem ter evoluído de uma enxaqueca de manifestação episódica. Ou seja, a enxaqueca que se apresentava em crises intensas, mas com intervalos sem dor, passa ao longo do tempo a se apresentar todos os dias. Este tipo de dor de cabeça chama-se cefaleia crônica diária e geralmente ocorre em pacientes que apresentavam enxaqueca desde a infância ou adolescência. A incidência chega a 6% da população mundial. Muitos pacientes apresentam a dor diária sem aquelas características associadas (tais como enjoo, vômitos, intolerância à claridade, ruídos e odores) da crise de enxaqueca, ou com estes sintomas em intensidade mais leve. Essa dor diária assemelha-se, em termos de apresentação clínica para o paciente e para o médico, a uma dor de cabeça do tipo tensional, frequentemente confundindo o médico não acostumado, fazendo-o pensar em uma dor de cabeça puramente do tipo tensional. Entretanto, e isto deve ser mais uma vez enfatizado, a própria enxaqueca, quando evolui para apresentação diária, perde várias de suas características e assume uma intensidade mais leve e com menos sintomas associados. A transformação da enxaqueca em dor de cabeça diária pode ser de forma gradual (80% dos casos) ou súbita. A transformação gradual geralmente é causada por uso regular e/ou excessivo de medicamentos para a própria dor (como analgésicos e derivados da ergotamina), desenvolvimento de pressão alta, personalidade neurótica (ansiedade, estresse e depressão) ou como parte da evolução natural da própria enxaqueca. A transformação súbita pode ser causada por doenças infecciosas da própria cabeça ou de outras partes do corpo, cirurgias, traumas da cabeça (mesmo leves), grande trauma emocional (como perda de um ente querido), gripes fortes ou sinusites e uso de certas drogas para outras doenças. Tratamento: É fundamental que o paciente entenda claramente o porquê de sua dor e qual o processo envolvido na transformação gradual ou súbita em dor diária. Como a maioria dos casos, em torno de 75-80%, é associada ao uso excessivo e/ou regular e abusivo de medicamentos para a própria crise de enxaqueca, é muito importante a suspensão do uso desses medicamentos para se conseguir melhorar. Apenas a suspensão dos medicamentos usados em excesso já acarretará, após 3 a 5 semanas em média, melhora significativa em pelo menos 80% dos pacientes, e o sacrifício inicial de se suportar a piora da dor nos primeiros dias de abstinência, sem voltar a usar os medicamentos anteriores, será profundamente recompensado pela grande melhora observada. No entanto, em outros pacientes com migrânea ou enxaqueca transformada em dor diária, o uso abusivo de drogas não desempenha papel importante, e fatores como desenvolvimento de hipertensão, neuroticismo (ansiedade, estresse e depressão) e até traumas de cabeça ou emocionais podem ter levado à essa transformação de padrão doloroso. Nesse caso, é fundamental que o médico identifique aquilo que desencadeou ou está sendo responsável pela modificação do padrão de apresentação da dor de cabeça, se foi em caráter súbito ou gradual e o que pode ser feito, sempre com a insubstituível participação do paciente, para reverter o quadro apresentado. O tratamento da dor de cabeça diária também inclui os medicamentos usados na prevenção da enxaqueca episódica. Entretanto, o mais comum é a associação de duas ou mais destas substâncias para se obter melhora da resposta ao tratamento. Dietas para enxaquecas: Alguns alimentos possuem substâncias que podem deflagrar crises de enxaqueca, principalmente aqueles com compostos que atuam diretamente sobre os vasos sanguíneos: Tiramina (ex: queijo envelhecido, carnes); Feniletilamina; Nitritos (ex: cachorro-quente); Glutamato monossódico; Álcool. A dieta representada abaixo é recomendada para portadores de enxaqueca por eliminar substâncias que podem deflagrar ataques ou crises deste tipo de dor de cabeça. Seguir à risca esta dieta pode não eliminar a ocorrência de crises, mas em muitos pacientes irá promover uma diminuição da frequência dos episódios dolorosos. Carne, Ave e Peixe Permitidas Evitadas Fresca ou congelada: galinha, peru, Carnes processadas, enlatadas, carne de vaca, peixe, cordeiro, porco. defumadas. Presunto enlatado, arenque Ovos como substitutos de carne (limite salgado, peixe seco e salgado, fígado de de três ovos por semana). galinha, salsicha fermentada, salame, pepperoni. Amendoim e derivados, molho de soja. Leite e Derivados Permitidas Evitadas Leite homogeneizado a 2% ou desnatado. Queijo americano, cottage, ricota, cremoso, velveta. Iogurte (limite de ½ copo) Manteiga, coalhada, achocolatado. Queijos envelhecidos: camembert, suíço, roquefort, cheddar, gouda, muzzarela, parmesão, provolone. Pães e Cereais Permitidas Evitadas Pães: branco, francês, italiano, crackers de Pães e crackers com queijo ou nozes centeio, de trigo ou rosca. Todos os cereais quentes e secos: all-bran, corn-flakes, arroz. Vegetais Permitidas Evitadas Aspargos, cenoura, beterraba, espinafre, Feijão, vagero, azeitonas, ervilha, tomate, brócolis, alface couve,pickles Frutas Permitidas Evitadas Ameixa, maçã, damasco, pêssego, Banana d´água, outras bananas (permitida até ½ pêra. Até ½ xícara de: tangerina, por dia), mamão, figo, passa. limão, lima, laranja, abacaxi. Nozes e sementes. Sopas Permitidas Evitadas Sopas cremosas feitas com os alimentos Sopas enlatadas, contendo leveduras o permitidos glutamato monossódico. Sobremesas Permitidas Evitadas Sorvetes, bolos e biscoitos sem chocolate, Os mesmos, com chocolate gelatinas Doces Permitidas Evitadas Açúcar, geleia, gelatina, mel, caramelos Caldas de chocolate, aspartame Miscelânea Permitidas Sal (moderadamente), limonada, manteiga ou margarina, óleos de cozinha, chantilly, vinagre branco e molhos prontos para saladas (em pequena quantidade) Evitadas Pizzas, molhos com queijo, molho de soja glutamato monossódico, leveduras, strogonoff, macarronada com queijo, past de amendoim Algumas dicas: O que fazer quando estou em crise de enxaqueca? Esteja sempre preparado: quem tem enxaqueca deve ter sua medicação para as crises sempre à mão. Em caso de dor intensa, procure um local fresco e escuro para recostar, não deite. Coloque gelo sobre as áreas dolorosas. Tome o medicamento para crise recomendado pelo seu médico, mas nunca mais de duas vezes por semana. Beba muita água e coma moderadamente. Descanse Quando procurar o médico? Quando as crises de enxaqueca estão comprometendo a realização de suas atividades normais; Se você toma analgésicos para a dor de cabeça duas ou mais vezes por semana; Se os medicamentos que você está tomando não estão aliviando sua dor; Quando houver qualquer modificação no comportamento padrão de sua dor; Se houver reações aos medicamentos; Se engravidar durante o tratamento; Se a sua dor de cabeça é uma novidade, iniciando-se rapidamente e de forma intensa, é fundamental a visita a um neurologista para afastar as causas mais graves. NÃO SE ESQUEÇA: toda dor de cabeça tem uma causa. Só um médico pode avaliá-la corretamente, excluindo as causas mais sérias e ameaçadoras. Consulta médica: como proceder? O diagnóstico correto da enxaqueca requer uma história minuciosa da dor do paciente e um exame neurológico criterioso, portanto procure um médico que possa dispor de bastante tempo para a primeira consulta. Mantenha um relatório diário com informações sobre a sua dor, isso ajudará muito o seu médico. Durante a consulta médica, é muito importante estabelecer uma conversa honesta e aberta com o médico, pois algumas características que, aparentemente, não estão relacionadas com a dor, podem ajudar no diagnóstico. Visitas regulares ao médico são importantes para ajustes necessários nas doses e medicações utilizadas. Informe ao médico todo tipo de medicamento de que está fazendo uso. Como evitar as crises? Mudanças no estilo de vida contribuem para o controle das crises de enxaqueca, como, por exemplo, hábitos regulares para as refeições e sono; Mudanças na dieta, diminuindo ou até mesmo eliminando certos alimentos que deflagram a dor; Evitar a ingestão de bebidas fermentadas, como o vinho tinto; Não se expor demasiadamente ao sol e à claridade; Evitar o uso excessivo de perfume ou a permanência em locais recémpintados ou onde se estejam utilizando solventes químicos; Dietas ricas em magnésio e em um aminoácido chamado triptofano são úteis. O magnésio encontra-se em alimentos verdes frescos, frutos do mar e nozes. Já o triptofano é encontrado em alimentos como verduras frescas, feijão e outros cereais integrais.