RCPV (2014) 109 (589-590) 38-42 Qual madeira os coelhos em crescimento preferem como enriquecimento ambiental? Which wood growing rabbits prefer as environmental enrichment? Samuel W.B. Santos1*, Maísa M. Heker2, Jeffrey F. Lui1 1 Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias – UNESP, Jaboticabal, São Paulo, Brasil 2 Faculdade de Medicina Veterinária – UNESP, Araçatuba, São Paulo, Brasil Resumo: Pesquisas envolvendo enriquecimento ambiental crescem a fim de auxiliar o bem-estar de animais confinados. O enriquecimento mais utilizado para coelhos é a madeira, porém poucos estudos avaliaram que madeiras esses animais preferem para assim enriquecer o bem-estar. Dessa forma propomos avaliar o uso de diferentes tipos de madeiras como enriquecimento ambiental para coelhos desmamados aos 35 dias de idade. Cada grupo consiste em quatro fêmeas e quatro machos criados em gaiolas coletivas usando diferentes madeiras: Peroba Rosa (Aspidosperma macrocarpon) – 1, Cedrinho (Erisma uncinatum) – 2, Pinus (Pinus elliottii) – 3, Jatobá (Hymenaea courbaril) – 4 e Controle - 5. Os animais foram pesados ao nascimento, aos 35 e 75 dias de idade para avaliar o desempenho. Cada madeira foi pesada antes e depois da introdução à gaiola. Os parâmetros avaliados foram a quantidade de madeira roída, o peso aos 35 e aos 75 dias e a ansiedade através do teste de labirinto em cruz elevado. O uso dessas madeiras como enriquecimento ambiental não alterou o desempenho e comportamento no teste de labirinto em cruz elevado, porém a madeira mais roída foi o Cedrinho. Palavras chave: bem-estar, comportamento, cunicultura, desempenho, enriquecimento Summary: Research involving environmental enrichment grows in order to help the welfare of confined animals. Wood is the most enrichment used for rabbits, but few studies evaluated the kind of woods that animals prefer to enrich its welfare. Thus we propose to evaluate the use of different wood species as environmental enrichment for rabbits weaned at 35 days of age. Each treatment consists of four females and four males raised in collective cages following treatments: Peroba Rosa (Aspidosperma macrocarpon) - 1, Cedrinho (Erisma uncinatum) - 2, Pinus (Pinus elliottii) - 3, Jatoba (Hymenaea courbaril) - 4 and Control - 5. The animals were weighed at birth, at 35 and 75 days of age to assess performance. Each wood was weighed before and after the introduction of the cage. The parameters evaluated were the amount of gnawed wood, the weight at 35 and 75 days and anxiety by elevated plus maze test. The use of these woods as environmental enrichment did not affect performance and behavior in the elevated plus maze test but Cedrinho (Erisma uncinatum) wood was more gnawed. Keywords: welfare, behavior, rabbit production, performance, enrichment *Correspondência: [email protected] Tel: +55(17)97131721 38 Introdução O aumento do interesse dos consumidores por carnes de alta qualidade e produzidas sob condições humanitárias e de saúde, sugere estudos voltados para sistemas alternativos de criação envolvendo o bem-estar (Verga et al., 2007). Além de proporcionar sistemas de criação e manejo mais interessantes por melhorar a relação homem-coelho, são as manipulações precoces e o enriquecimento ambiental que podem reduzir o efeito do tédio provocado pela falta de estímulos no ambiente, especialmente nas gaiolas (Newberry, 1995). Enriquecimento ambiental é qualquer modificação no ambiente de animais confinados de forma a melhorar o seu bem-estar físico e psicológico pela promoção de estímulos específicos de sua espécie (Baumans, 2000). Existem diversas formas de melhorar as condições de vida dos coelhos fornecendo oportunidade para que o animal possa expressar seu repertório comportamental (Morisse et al., 1999; Baumans, 2005). O enriquecimento ambiental deve procurar proporcionar melhores condições em cativeiro, permitindo, desse modo que o animal cativo tenha maior atividade e mais controle sobre seu ambiente (Baumans, 2005). Portanto, para que o enriquecimento ambiental se torne, efetivamente útil, é necessário o conhecimento das necessidades específicas da espécie animal com a qual estivermos lidando, ou seja, é importante o estudo do comportamento natural do animal (Baumans, 2005). Em relação aos coelhos, o entendimento do seu comportamento natural deve ser especialmente analisado, uma vez que, diferentemente de outros animais, que foram selecionados por características comportamentais, os coelhos sofreram uma seleção baseada nas qualidades de sua carne e pelo. Desse modo, podemos concluir que os coelhos não foram totalmente domesticados, conservando muitas das características comportamentais dos animais selvagens (Hawkins et al, 2005). O uso de enriquecimento ambiental para melhorar o bem-estar de animais de laboratório foi incorporado Santos S. et al. na legislação Europeia no ano de 2006 sugerindo que forragem, blocos de feno ou pedaços de madeira sejam colocados nas gaiolas (Council, 2006). Segundo Kermauner et al. (2004), coelhos em gaiolas com pedaços de madeira apresentaram carne mais vermelha e com maior capacidade de retenção de água. Verga et al. (2007) afirma que pedaços de madeira, feno ou alimento peletizado para atividades orais tem demonstrado benefício para coelho em gaiolas individuais com restrição alimentar e sujeitos a manipulações estressantes. No trabalho publicado por Zucca et al. (2008) utilizando pedaços de Acácia (Robinia pseudoacacia) em coelhos desmamados demonstrou aumento no comportamento social representado por lamber outros coelhos. Dentre a diversidade de madeiras encontradas no Brasil escolhemos quatro espécies: o Jatobá (Hymenaea courbaril) que apresenta gosto indistinto, 0,89 g/ cm3 de densidade e 15% de humidade; o Pinus (Pinus elliottii) que mostra gosto resinoso, textura fina, densidade de 0,4 g/cm3 e 15% de humidade; a Peroba Rosa ou Muirajuçara (Aspidosperma macrocarpon) que é uma madeira de textura fina, com gosto ligeiramente amargo, cheiro quase imperceptível, densidade de 0,65 g/cm3 e uma humidade de 11,4% e o Cedrinho (Erisma uncinatum) é considerado de textura média, com cheiro imperceptível, densidade de 0,48 g/cm3 e 15% de humidade (IBAMA, 2012; IPT, 2013). O objetivo deste estudo foi avaliar a preferência de coelhos em crescimento por estes tipos de madeira, usada como enriquecimento ambiental, e sua influência no desempenho e temperamento. Material e Métodos O experimento foi desenvolvido na Área de Produção de Coelhos da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Unesp, Jaboticabal, SP, Brasil. As coelhas utilizadas pertencem ao grupo genético Botucatu linhagem sintética originada de híbridos Norfolk 2000 (Moura et al., 2001) e foram acasaladas com machos da mesma linhagem. Todos os animais foram criados em gaiolas galvanizadas suspensas e individuais (80X60X40 cm). Os ninhos foram colocados aos 28 dias de gestação. Os filhotes permaneceram com suas mães até os 35 dias de vida quando foram desmamados e colocados em gaiolas coletivas (4 animais em cada) de 80X60X40 cm e enriquecidas ambientalmente com plataforma de madeira conforme recomendação de Hoy (2008) e pela European Food Safety Authority-EFSA (2005). A ração era peletizada, comercial e foi fornecida à vontade durante todo o experimento, assim como a água. Os tratamentos 1, 2, 3 e 4 consistiram em colocar 2 pedaços de madeira de tamanho 12x4x2 cm por gaiola no primeiro dia pós desmame, sendo 8 animais por tratamento, distribuídos em duas gaiolas. As espécies de madeira avaliadas foram: Peroba Rosa (Goupia glabra) – Tratamento 1, Cedrinho (Erisma uncinatum)– Trata- RCPV (2014) 109 (589-590) 38-42 mento 2, Pinus (Pinus caribea) – Tratamento 3, Jatobá (Hymenaea courbaril) – Tratamento 4 e grupo controle – Tratamento 5. Cada madeira foi pesada antes de ser colocada na gaiola e posteriormente pesada ao final, avaliando a quantidade de madeira roída. Os animais foram pesados ao nascimento, aos 35 dias e aos 75 dias de idade para avaliação do desempenho. Labirinto em Cruz Elevado (Handley e Mithani, 1984) Aos 75 dias de idade cada coelho foi posicionado no meio do labirinto a 60 cm do chão com 60 cm de comprimento em cada braço, 60 cm de altura nos braços fechados e 30 cm de largura. Durante cinco minutos foi registrada a freqüência de entrada e o tempo de permanência nos braços abertos e nos braços fechados do labirinto; a latência para a primeira entrada nos braços abertos, freqüência para chegada ao final dos braços abertos, freqüência de tentativas de entrada nos braços abertos, freqüência do comportamento bipedal ou levantamento nos braços fechado e número de mergulhos nos braços abertos (olhar para o chão ao estar no braço aberto). O teste de labirinto em cruz elevado realizado em ratos permite identificar o grau de ansiedade e medo nesses animais podendo ser usado para estudo de ansiedade, aprendizagem e memória apresentando a vantagem do conflito entre exploração de um novo ambiente e a esquiva dos braços abertos que pode levar tanto ao impulso de exploração como ao impulso de medo (Cabral, 2003). Longas latências e poucas freqüências de entradas nos braços abertos indicam alto grau de medo. As análises de variância para desempenho foram realizadas com o auxílio do procedimento GLM do SAS 9.0 e comparação múltipla de médias recorrendo ao teste de Turkey ao nível de 5% de probabilidade. ANOVA one-way foi utilizada para análise do teste de labirinto em cruz elevado pelo procedimento NPAR1WAY do SAS 9.0, teste de Kruskal-Wallis para comparar tratamentos e a comparação múltipla foi realizada pelo teste de Dunn no GraphPad Prism 4. Resultados e Discussão O peso ao nascer apresentou diferenças significativas (CV = 8,12; P = 0,01) assim como o peso aos 35 dias (CV = 16,43; P = 0,045) fase em que os animais ainda não estavam com cama de madeira. O peso aos 75 dias (CV = 8,25; P = 0,07) e o ganho de peso total (CV = 8,41; P = 0,08) não apresentaram diferenças significativas indicando que o uso das madeiras não afetou o peso final dos animais (Tabela 1). O consumo de madeira apresentou diferença significativa (CV = 75,83; P = 0,01) sendo diferente apenas no grupo com Cedrinho, que foi a madeira mais consumida (Figura 1). 39 Santos S. et al. RCPV (2014) 109 (589-590) 38-42 Tabela 1. Médias e desvio padrão dos pesos ao nascer (PN), aos 35 dias (P35), aos 75 dias (P75), ganho de peso (GP) e consumo de madeira (CM). Tratamento Peso Peroba Rosa Cedrinho Pinus Jatobá Controle P CV PN 66,03 ± 3,55 65,94 ± 2,28 62,48 ± 0,12 72,84 ± 11,05 65,64 ± 0,64 0,01 8,12 P35 928,75 ± 159,50ab 906,87 ± 130,24ab 787,87 ± 139,09b 1000,50 ± 110,06ab 1006,87 ± 204,75a 0,045 16,43 P75 2381,25 ± 184,97 2383,12 ± 182,19 2183,25 ± 118,48 2404,37 ± 185,96 2461,87 ± 271,57 0,07 8,25 GP 2315,22± 182,75 2317,18 ± 179,51 2120,76 ± 118,48 2331,53 ± 182,08 2396,23 ± 271,03 0,08 8,41 CM 0,70 ± 0,13 11,37 ± 5,85 1,99 ± 0,25 5,10 ± 4,30 - 0,01 75,83 ab b ab b a a b b ab CV = Coeficiente de variação. Valores com sobrescritos diferentes em uma mesma linha diferem entre si pelo teste de Tukey (P < 0,05). Figura 1. Variações entre as médias de consumo de madeira de cada tratamento. Teste do Labirinto em Cruz Elevado Os coelhos não apresentaram diferenças significativas na maioria das variáveis observadas, indicando que o uso dessas madeiras não altera o temperamento desses animais (Tabela 2, Figura 2). Apenas as frequências de número de entradas nos braços fechados (X2 = 12,99; p = 0,011) e de tentativa de entradas nos braços abertos (X2 = 11,61; p = 0,020) apresentaram diferenças, com maiores frequências para coelhos do tratamento com Cedrinho (5,43 ± 2,15 e 4,86 ± 2,34 respectivamente) (Figura 3). Figura 2. Latências em segundos do teste do labirinto em cruz elevado (média + E.P.). Tabela 2. Médias e desvio padrão das latências e frequências dos comportamentos observados no teste do labirinto em cruz elevado. Tratamento Variável Cedrinho Pinus 161,12 ± 127,82 139,43 ± 112,67 63,43 ± 56,96 Controle X2 Prob 169 ± 81,56 7,40 0,12 62,67 ± 44,67 7,91 0,095 51,44 ± 94,41 4,39 0,35 Nºentrada aberto 1,25 ± 1,58 4 ± 3,32 2,57 ± 1,40 Jatobá 118,5 ± 100,49 142,62 ± 77,99 35,75 ± 17,81 2,62 ± 1,06 3,55 ± 2,74 6,56 0,16 Nºentrada fechado 1,5 ± 1,07b 5,43 ± 2,15a 3,41 ± 2,43ab 3 ± 2,39ab 3,89 ± 1,76ab 12,99 0,011 Mergulho 0,62 ± 0,92 2,43 ± 1,27 2,43 ± 1,40 2,25 ± 2,43 3,44 ± 4,19 8,05 0,089 Levantamento 0,75 ± 1,16 2,29 ± 1,80 1,86 ± 1,46 0,87 ± 1,46 1,22 ± 1,64 5,74 0,23 Lat.aberto Peroba Norte Lat.fechado 160,12 ± 113,68 99,71 ± 53,52 102,86 ± 48,86 Lat.1ªentrada aberto 165,37 ± 144,56 104,14 ± 135,34 83,57 ± 105,36 Chegada final 0,62 ± 1,19 2,43 ± 2,15 1,57 ± 1,13 1,37 ± 1,06 2,33 ± 2,29 5,94 0,20 Tentativa aberto 1,12 ± 1,36b 4,86 ± 2,34a 2,57 ± 2,22ab 1,62 ± 1,92ab 3,11 ± 2,52ab 11,61 0,02 Valores com sobrescritos diferentes em uma mesma linha diferem entre si pelo teste de Dunn ao nível de 5% de probabilidade. 40 Santos S. et al. RCPV (2014) 109 (589-590) 38-42 Figura 3. Frequências dos comportamentos realizados no teste do labirinto em cruz elevado (média + E.P.). As diferenças significativas entre os tratamentos estão indicadas pelas diferentes letras (Dunn’s Multiple Comparison Test). Johnson et al. (2003) não encontrou diferenças no comportamento e nos parâmetros hematológicos entre coelhos alojados em gaiolas com enriquecimento ambiental e coelhos sem enriquecimento. Este fato pode ser resultado de um processo de habituação aos objetos que reduz a interação com o tempo, sugerindo que diferentes objetos devem ser rotacionados para que o uso de enriquecimento ambiental seja efetivo (Verga et al, 2007). Bayne (2005) constatou que o uso de enriquecimento ambiental produz diferenças significativas apenas nos 15 primeiros dias de utilização e neste experimento os coelhos permaneceram com a mesma madeira durante 40 dias. Baumans (2005) indica que deve-se trocar frequêntemente os objetos utilizados como enriquecimento, uma vez que os animais podem perder, em apenas um dia, o interesse por enriquecimentos que não estejam relacionado à alimentação ou confecção de abrigos. Conclusões Os coelhos em crescimento demonstraram preferência pelo Cedrinho (Erisma uncinatum), porém essa preferência não alterou o desempenho e comportamento dos mesmos. Agradecimentos Á FAPESP pela bolsa de iniciação científica e á FCAV pelo desenvolvimento do trabalho. Bibliografia Bayne K (2005). Potential for unintended consequences of environmental enrichment for laboratory animals and research results. ILAR Journal, 46(2), 129-139. Baumans V (2000). Environmental enrichment: A right of rodents! In: Balls M, Van Zeller A-M, Hander M eds. Progress in the Reduction, Refinement and Replacement of Animal Experimentation. Amsterdam: Elsevier BV. 1251-1255. Baumans V (2005). 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