7 Considerações finais A língua é um sistema vivo, o qual evolui a cada dia, inevitavelmente. O ser humano, geração a geração, procura apropriar-se de maneira mais eficaz desse sistema, adaptando-o a cada contexto. O internetês é mais uma forma de expressão que surge, sem excluir outras formas de comunicação. Ao longo da história, modismos linguísticos surgiram; muitos desapareceram; outros permaneceram. Tudo isso aconteceu não por imposição, mas pela prática daqueles que realmente "dão as ordens": os seus usuários. A orientação de pessoas mais experientes sempre deve estar presente, em vez de qualquer tipo de postura unilateral, ditatorial. PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0710548/CA Vimos, com este trabalho, a importância de se perceber que a linguagem da internet tem suas peculiaridades e riquezas, e deve ser compreendida e estudada detalhadamente, já que seu reconhecimento pode trazer contribuições para diversas áreas, como a Linguística de corpus, a Educação e várias outras que, com o tratamento automático do internetês, teriam seus dados aumentados consideravelmente. Porém, como há poucos trabalhos em língua portuguesa que tratem de programas de reconhecimento de abreviaturas e outras palavras não dicionarizadas, tivemos de recorrer a diversos trabalhos em língua inglesa, aproveitando algumas características que nos servissem para a criação de um programa próprio, voltado para o nosso idioma. Diferentemente de muitos estudos que tratam do internetês superficialmente, por meio de opiniões pessoais, nosso trabalho investigou os dados de diferentes fontes na Internet: chats (como exemplo de comunicação síncrona), Orkut (como exemplo de comunicação assíncrona) e Twitter (por conta da limitação de 140 caracteres por mensagem). Chegamos, então, à conclusão de que o ambiente assíncrono do Orkut incentiva as pessoas a inovarem na linguagem mais do que nos chats e no Twitter. Neste, são usadas mais palavras de fácil reconhecimento, como abreviaturas consagradas e palavras sem notação lexical; nos programas de bate-papo, recorrese mais às abreviaturas que utilizam o primeiro grafema de cada sílaba. 106 Também concluímos que as palavras com poucas sílabas são as que mais sofrem modificações, já que 70% de todas as palavras do internetês que compõem nossos corpora são monossílabas ou dissílabas. Apenas 8,4% são palavras com mais de três sílabas. Além disso, dessas palavras polissílabas, percebemos em uma análise qualitativa que a maioria sofre pouca modificação, como a retirada de notações lexicais ou a mudança em uma ou outra letra para dar lhe características de texto oralizado. Vimos ainda que o índice de palavras com erros ortográficos em nossos corpora foi baixíssimo, configurando menos de 1% das palavras do internetês, o que não justifica a preocupação de muitos professores quanto à destruição da ortografia da língua portuguesa. Seguindo nossa análise, chegamos a outras conclusões. Percebemos que o padrão silábico que mais se abrevia é o CV e que a queda de rima completa é a PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0710548/CA mais recorrente na formação de abreviaturas do internetês. Ou seja, nosso estudo, além de fazer parte da descrição da língua portuguesa, apresenta alguns dos processos cognitivos que transformam o conhecimento intuitivo sobre a estrutura silábica em conhecimento explícito. Esse é um dos pontos que podem ser retomados e estudados mais detalhadamente no futuro. Todo esse detalhamento serve para que conheçamos melhor o internetês, mostrando que há regras em sua formação e propósitos específicos em sua utilização. Tais informações podem também servir para a criação posterior de programas que reconheçam automaticamente palavras não dicionarizadas, já que a possibilidade de tratar automaticamente palavras desse tipo enriqueceria diversas áreas de estudo, pois traria a possibilidade de utilizarem-se textos coletados em quaisquer ambientes na internet. Seja por falta de conhecimento dos professores, que, em alguns momentos, têm medo de a tecnologia os substituir; ou por puro conservadorismo, a sala de aula tradicional “barra” o trabalho com novas formas de se expressar importantes, como as que surgem com as novas mídias. Com o trabalho conjunto em diversas áreas do conhecimento, essas novas linguagens podem ser compreendidas e seu uso orientado por parte de pessoas esclarecidas. Para que as descobertas desta pesquisa cheguem aos diversos campos de estudo, inclusive à sala de aula, há a necessidade de que uma postura frente às 107 novidades mude, pois só assim abrir-se-ão novos horizontes. Por tudo que aqui foi mostrado, não convém que ignoremos o avanço das tecnologias, principalmente nas novas formas de comunicação que elas proporcionam. Trouxemos, então, algumas propostas de como se trabalhar a linguagem da internet em sala de aula, com atividades simples, que tratem das diversas formas de expressão do dia-a-dia. A observação da grafia do internetês e sua retextualização são opções de tarefas que alertam os alunos sobre o condicionamento que o contexto traz a nossa expressão, além de serem atividades que destacam a importância de se comunicar de forma eficiente tanto formal quanto informalmente, derrubando qualquer tipo de preconceito linguístico que trate a norma culta como a única válida. Esse trabalho serve também para trazer ao aluno a consciência fonológica que permite a compreensão dos processos de abreviação possíveis em nossa língua e sua utilização PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0710548/CA Obviamente, muitos outros estudos acerca do internetês podem ser feitos, principalmente no que diz respeito a seu aproveitamento educacional e a seu reconhecimento automático. Outra análise interessante seria a investigação sobre quais classes gramaticais são as mais abreviadas (ou modificadas) no Internetês, a qual poderia ser útil a áreas que trabalham com léxico mental e acesso lexical. Por não termos um conhecimento técnico vasto na área de programação de computadores, apenas sugerimos procedimentos que podem ser seguidos, e, por conta disso, podemos ter sido superficiais a esse respeito. Este é um ponto em que outros profissionais mais capacitados podem atuar e ampliar nossa pesquisa. Porém, nosso estudo teve como meta mostrar um caminho frutífero a ser percorrido, já que, como afirmamos em diversos momentos desta tese, não há muitos estudos aprofundados sobre o tema. Ressaltamos, então, a riqueza e o alcance dessa linguagem entre as pessoas que se comunicam diariamente em língua portuguesa. Não ignoremos o internetês nem qualquer outro tipo de expressão que possa surgir, pois, como vimos, toda as formas de comunicação, em vez de serem execradas, devem de ser estudadas, para que todos aqueles que as utilizam estejam conscientes de seu papel como falantes, sabendo adaptar, de forma eficiente, seu discurso a cada situação que a vida possa lhes oferecer.