O papel das Relações Públicas diante das políticas

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Título do Trabalho:
O papel das Relações Públicas diante das políticas públicas.
Nome da autora:
Maria José da Costa Oliveira.
Título universitário:
Doutora em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo.
Instituição à qual está vinculada:
Pontifícia Universidade Católica de Campinas.
E-mail da autora:
[email protected]
Resumo de 5 linhas:
O trabalho tem como proposta demonstrar a necessidade de envolvimento da área de
Relações Públicas de forma não só a colaborar com o governo, a sociedade e as empresas na
promoção de seu papel social, como também evidenciar a própria área, no sentido de
atualizá-la e adequá-la às novas necessidades sociais, até mesmo porque Relações Públicas
pode ser considerada uma função intimamente ligada à educação com fim social.
Palavras-chave:
Relações Públicas, cidadania, responsabilidade social.
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O PAPEL DAS RELAÇÕES PÚBLICAS DIANTE
DAS POLÍTICAS PÚBLICAS
Introdução
Demonstrar a necessidade de envolvimento da área de Relações Públicas de forma não só a
colaborar com o governo, a sociedade e as empresas na promoção de seu papel social, como
também a evidenciar
a própria área, no sentido de atualizá-la e adequá-la às novas
necessidades sociais,
permitindo a garantia de sua valorização frente ao mercado e à
sociedade, é o objetivo deste trabalho.
Quando se trata de políticas públicas, um conceito que emerge é o de cidadania, cuja prática
se viabiliza com a educação da população, conscientizando-a de seus direitos e deveres e a
necessidade de sua participação no processo de decisão na definição das próprias políticas
públicas. Nesse contexto, podemos dizer que
Relações Públicas
adquire uma função
estratégica no assessoramento da integração de ações voltadas a uma política social capaz de
resolver e/ou amenizar os alarmantes problemas de fome, miséria, discriminação, violência,
corrupção, desigualdade social, entre outros.
Nosso propósito é, pois, realizar uma reflexão sobre algumas questões-chave, capazes de
interligar Relações Públicas às questões sociais.
1. RELAÇÕES PÚBLICAS INTERLIGADA ÀS QUESTÕES SOCIAIS
As transformações por que passa a sociedade têm se refletido, evidentemente, na área de
Relações Públicas, exigindo, inclusive, a adoção de conceitos mais abrangentes e definidos,
novos paradigmas e, conseqüentemente, um novo posicionamento dos profissionais.
Ao mesmo tempo, identificamos em muitas definições de Relações Públicas exatamente a
preocupação com os aspectos que se tornam essenciais ao exercício pleno da cidadania, ou
seja, transparência, responsabilidade social, diálogo, confiança, entre outros.
Assim, analisar o papel de Relações Públicas no contexto social, o que ela representa e pode
representar para a sociedade constitui-se num aspecto básico dentro deste trabalho.
Lembramos, de início,
que
no contexto da cidadania, Relações Públicas pode ser
considerada uma função intimamente ligada à educação com fim social, porque se propõe,
justamente,
a estabelecer a relação entre organização e públicos de forma consciente,
transparente, ética e baseada na confiança.
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Relações Públicas mantém interface com outras áreas envolvidas com a educação com fim
social. Esse fim social tem envolvido as organizações de primeiro, segundo e terceiro setores,
que estão voltando sua atenção para o atendimento às necessidades sociais.A valorização das
parcerias, as iniciativas cidadãs, as campanhas de solidariedade, a justiça social, a qualidade
de vida estabelecem uma relação de causa e efeito entre as ações de impacto social e o
processo de democratização e cidadania, levando não só as organizações de primeiro e
segundo setores, como também as associações civis a buscarem uma interlocução com os
diferentes públicos.
Podemos dizer que essas inovações no formato organizacional e no conteúdo da ação são
constituídas a partir de uma visão social e de uma política pública intimamente relacionada
com a filosofia de Relações Públicas, formando um cenário propício para o envolvimento e
desenvolvimento da área.
Na implementação de políticas sociais e públicas, alguns espaços para a participação dos
entes sociais têm sido identificados. Para Scherer-Warren (1999: 64) esses espaços
compreendem:
- Canais institucionais: incluem múltiplos espaços para parcerias entre esfera estatal
e civil, com atribuições de planejamento e fiscalização na utilização de recursos em
políticas sociais, tais como conselhos setoriais (crianças e adolescentes, saúde,
educação, etc.), fóruns intersetoriais (orçamento participativo, plano diretor, etc.),
coordenadorias específicas (mulher, idosos, deficientes, etc.), programas de serviço
(mutirões habitacionais, urbanização de áreas carentes, etc.).
- Campanhas emergenciais: têm contado com parcerias entre a sociedade civil, o
Estado e o mercado, destacando-se a participação voluntária de múltiplos sujeitos
sociais, tal como ocorreu com a Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela
Vida.
- Ações sociais voluntárias locais: destinam-se a combater carências, discriminações
ou realizar programas educativos entre as populações-alvo específicas, contando
com a participação de organizações voluntárias, tais como ONGs, entidades
filantrópicas, religiosas e cidadãos voluntários.
- Fóruns: contribuem com reflexões e propostas para a formulação de políticas
sociais e públicas. Existem fóruns mais permanentes e outros mais conjunturais,
como seminários estratégico-alternativos, conferências, etc. Contam com a
participação de membros de ONGs, de associações locais, de movimentos
específicos, sindicatos, partidos, universidades, igrejas e cidadãos interessados”.
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Podemos considerar, portanto, que são amplas as possibilidades de participação na definição
das políticas públicas, sendo que, em geral, essa participação implica integração entre os
diferentes setores da sociedade.
Não podemos, porém, ignorar as dificuldades que existem para implementação de parcerias
entre os setores sociais. Scherer-Warren chega a situá-las no campo da cultura política,
exemplificando que:
“Por um lado, o poder público tende a se orientar por práticas políticas tradicionais;
por outro, a sociedade civil encontra-se incipientemente organizada” (1999: 65).
É diante de tais dificuldades, que a atividade de Relações Públicas
representa uma
alternativa eficaz, capaz de contribuir para a consolidação de uma participação cidadã nas
políticas públicas.
Entretanto, para que Relações Públicas tenha uma atuação determinante e contribua
efetivamente com a instituição da cidadania, assessorando o desenvolvimento de uma política
de responsabilidade social por parte de cada ente social que representa e, mais do que isso,
sendo capaz de colaborar para a instituição de uma ação integrada envolvendo os diferentes
setores, é preciso que se estabeleça um consenso em torno de sua inerente responsabilidade
nesse sentido, de forma que os profissionais assumam sua parte no processo de edificação de
uma sociedade que alcance o equilíbrio entre igualdade, liberdade e fraternidade, pilares de
uma sociedade próspera.
Aliás, a busca de equilíbrio entre as relação sociais é a base de um modelo apresentado por
Grunig & Hunt e defendido por alguns estudiosos como o modelo ideal e mais adequado na
busca da excelência em Relações Públicas. Tal modelo denominado como simétrico de duas
vias inclui características, tais como:
“(...) ‘dizer a verdade’, ‘interpretar o cliente e o público’ e ‘administração
entendendo os pontos de vista dos funcionários e vizinhos, assim como os
funcionários e vizinhos entendendo os pontos de vista da organização” (Grunig &
Hunt, 1992).
Conforme nossa análise, o modelo simétrico de duas vias é o que vai ao encontro dos
objetivos de se colaborar com a instituição da cidadania, mesmo porque é ele que apresenta
uma comunicação equilibrada, ajustando a relação entre a organização e seus públicos e
promovendo o diálogo.
2. A NATUREZA ÉTICA DAS RELAÇÕES PÚBLICAS
Para alcançar o equilíbrio nas relações sociais, a atividade de Relações Públicas deve,
evidentemente, estar fundamentada nos princípios de bem comum, justiça e democracia, o
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que significa conquistar a credibilidade das organizações ( governos, entidades, empresas)
junto a seus públicos, utilizando verdade e transparência, colaborando, inclusive, dentro de
um processo de transformação social, para a mudança de mentalidade dos públicos.
E essa contribuição que Relações Públicas pode dar ao processo de mudança de mentalidade
depende diretamente da capacitação dos profissionais responsáveis por sua prática.
Simões vai além, e, numa consideração bastante pertinente, afirma que a função e a
atividade de Relações Públicas devem ser éticas e estéticas. Informa ainda que:
“tudo o que é realizado pela organização, incluindo o que está afeto ao profissional
de Relações Públicas, deve sê-lo segundo os princípios da arte do bem viver (ética)
que, em si própria, contém os princípios da filosofia da harmonia do comportamento
(estética) “(1995).
Parece-nos muito adequado incluir essa conclusão de Simões, quando falamos do papel das
Relações Públicas na construção da cidadania, pois, afinal, nada mais ético e estético do que
adoção de políticas sociais por parte das organizações (públicas e privadas).
Pimlott, no final dos anos 40, já acreditava que os profissionais de Relações Públicas
poderiam ajudar a atravessar
o abismo, que,
apesar dos avanços em educação e
comunicação, existe entre:
“(...) o ‘nós’- os milhões de homens e mulheres comuns e ‘eles’ - os milhões em
negócios, governo, as igrejas, trabalhos organizados, as universidades e, por outra
parte, quem constitui a classe efetivamente dominante”.
Pimlott tratou, também,
de incluir consideração importante sobre o papel de Relações
Públicas no governo, pois, para ele:
“A administração moderna se estagnaria se o governo não conversasse
constantemente com as pessoas como indivíduos em e através dos diferentes grupos
aos quais eles pertencem”(Grunig e Hunt, 1984).
Nessa perspectiva, Relações Públicas torna-se uma condição sine qua non para a existência
de um governo democrático.
De acordo com Pimlott (Grunig & Hunt, 1984), os profissionais de Relações Públicas:
“...disseminam aquele mínimo de informações sem as quais o indivíduo está incapaz
de realizar sua parte como cidadão, uma unidade econômica, um vizinho. Eles falamlhe como e quando pagar suas taxas, o que fazer para evitar incêndios, como ele
pode manter sua família com as melhores vantagens, como se comportara nas
estradas, o que uma associação trabalhista pretende, a economia elementar de
negócios, as facilidades da universidade local, os livros que ele pode retirar da
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biblioteca pública. Neste sentido, Relações Públicas é um valioso auxiliar para o
sistema educacional.
Aproveitando esse destaque que Pimlott faz à contribuição que Relações Públicas pode dar ao
sistema educacional, reforçamos a consideração inicial de que a educação com fim
social é uma função essencial às Relações Públicas, diante do exercício da cidadania.
Contudo, percebe-se que a área, pelo menos no Brasil, precisa avançar muito para alcançar
esse sentido educativo.
3. RELAÇÕES PÚBLICAS E O INVESTIMENTO SOCIAL
Diante do impulso da cobrança de uma sociedade mais consciente, mais exigente, com maior
acesso à informação e que começa a ter uma noção do que vem a ser democracia, as
organizações e a área de Relações Públicas passam a adotar uma postura pró-ativa, na qual as
virtudes sociais começam a ser incorporadas às políticas organizacionais e cuja transparência
já não parece tão utópica quanto há alguns anos.
A responsabilidade social assumida explicitamente e de maneira consistente já não parece tão
distante da realidade. Há, inclusive, alguma resistência por parte de empresas que contam
com tal política, em divulgar suas ações, com receio de que isso expresse mais um objetivo
mercadológico do que uma preocupação social. Pelo menos é isso o que indica o Centro de
Estudos em Administração do Terceiro Setor - CEATS-USP - que, em pesquisa realizada no
primeiro semestre de 1999, em nível nacional, constatou que:
“A prática de divulgação das ações de investimento social da empresa, por meio de
ferramentas de marketing e comunicação, é um tema controverso. Poucos concordam
sobre a localização exata do limite entre a busca legítima de reconhecimento público
da postura socialmente responsável de uma empresa e a manipulação intencional do
investimento social com a finalidade de auferir ganhos de imagem junto à opinião
pública e ao público consumidor. Embora esteja em curso um processo rápido de
aceitação do papel social das empresas pela opinião pública, o brasileiro tende a
‘desconfiar de esmola’ e buscar as ‘verdadeiras intenções’ das empresas que
investem no campo social. Talvez por esse motivo, muitas empresas com práticas
consistentes de investimento social têm adotado políticas de comunicação
institucional de sua atuação social, no mínimo, cautelosas” (1999: 31).
O investimento social beneficia as organizações, agregando valor à imagem das mesmas,
sendo que nenhuma empresa investiria no social se isso não lhe trouxesse algo em troca.
Além disso, aquelas empresas que investem na questão social adquirem um diferencial que
a destaca em relação aos concorrentes, influenciando a preferência do consumidor.
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Entretanto, sabemos que o ideal é que a nossa sociedade alcance um estágio de exigência,
onde atuar socialmente passe a ser algo tão natural, que deixe de se tornar um diferencial e
passe a ser uma condição para a permanência das organizações no mercado.
Hoje, além de merecer a preferência do consumidor, outros benefícios são alcançados pelas
empresas que instituem uma sólida política social, tais como: maior comprometimento e
produtividade dos funcionários, melhoria de imagem junto à comunidade.
Pode-se alegar que a empresa só investe em políticas sociais porque ganhará
algo em troca, ainda que não seja um ganho exclusivamente mercadológico e
imediato. Contudo, contribuir para a construção de uma sociedade melhor beneficia a
todos, e quer seja por meio das empresas, de organizações públicas e outros tipos de
organizações, ou mesmo por meio da atuação de cada pessoa da sociedade, cada qual tem
como elemento de motivação o benefício que esse investimento ou ação lhe proporcionará.
É evidente que os propósitos de quem desempenha ações sociais devem ser verdadeiros,
transparentes e legítimos.
Mensurar os resultados do investimento social é sempre complicado. Entretanto, agir
irresponsavelmente permite quantificar as perdas que a falta de uma política social pode
gerar:
4. FUNÇÕES E ATIVIDADES SOCIAIS DE RELAÇÕES PÚBLICAS
São inúmeros os instrumentos ou atividades que o profissional de Relações Públicas pode
dispor para colaborar com a instituição de políticas sociais por parte das organizações.
Alguns desses instrumentos fazem parte do rol de atividades mais tradicionais, incluídas no
quadro das funções gerais e específicas de Relações Públicas, elaborado pela Federação
Interamericana de Relações Públicas (FIRP), em 1967.
A Lei 5.377 de 11 de dezembro de 1967, que regulamenta a profissão de Relações Públicas
no Brasil, também trata das atividades específicas da área, assim como o regulamento da Lei
5.377, anexo ao Decreto no. 63.283, de 26/09/68, que disciplina o exercício profissional de
Relações Públicas.
Contudo, além das atividades mais conhecidas e rotineiras adaptadas às questões sociais,
Relações Públicas pode fazer uso de novos instrumentos, condizentes não só
com a
imposição do atual panorama social, como também com as novas tecnologias e as novas
exigências da sociedade.
Assim, cabe ao profissional da área enfrentar os desafios de procurar incorporar novas
estratégias, novos instrumentos às suas ações, tendo, também, bom senso para instituir as
atividades mais tradicionais quando essas forem as melhores alternativas.
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Entre as atividades mais condizentes com a questão social, podemos destacar a elaboração do
balanço ou relatório social, instrumento que representa uma forma de prestação de contas da
atuação das organizações que assumem explicitamente sua responsabilidade social. Esse
instrumento é um veículo estratégico, para que diferentes públicos das organizações tenham
acesso aos dados de investimento social.
Outra atividade típica das políticas sociais das organizações e que pode fazer parte das
atribuições de Relações Públicas é o incentivo ao trabalho voluntário. O envolvimento do
público interno das empresas com as questões sociais tem ocorrido principalmente com o
incentivo que tais organizações dão ao trabalho voluntário, seja oferecendo apoio financeiro
ou instrumental às entidades sociais com as quais os funcionários têm colaborado, seja
instituindo prêmios e a valorização dos que atuam socialmente, seja permitindo e
incentivando os funcionários a utilizarem parte de seu horário de trabalho na empresa em
atividades voluntárias realizadas em entidades sociais. Esse tipo de atividade é uma estratégia
que para Relações Públicas permite criar um relacionamento mais saudável entre público
interno e empresas, além de colaborar para a formação de um público interno constituído
por profissionais que têm a possibilidade de aprimorar-se tecnicamente ao se defrontar com
situações diversas daquelas que vive no dia-a-dia das empresas, e aprimorar-se como cidadão,
consciente não apenas de seus direitos, mas também de seus deveres frente à sociedade.
Cada funcionário, que se torna um voluntário junto às entidades, transforma-se num agente
de Relações Públicas da empresa junto à comunidade, pois ele é visto como seu representante
e, em seu nome, pode contribuir para a elevação de seu conceito.
A filantropia corporativa também é uma das alternativas que as empresas utilizam para agir
de forma socialmente responsável. A filantropia corporativa se refere à doação de recursos
financeiros para as entidades sociais, sejam elas públicas ou privadas. Apesar dessa
alternativa representar uma das formas mais limitadas de atuação social das organizações, é
um caminho que viabiliza muitos dos projetos sociais que exigem recursos financeiros para
sua implementação.
Segundo Dwight, a filantropia corporativa pode ser considerada como:
“(...) a interação das empresas com as comunidades, que acontece por exemplo com
o marketing relacionado a causas e patrocínios. Na maioria dos casos, há
investimento de recursos financeiros em projetos que visam propor soluções para as
necessidades sociais das comunidades” (Carta de Educação Comunitária - Ano IV no. 22 - Outubro/novembro 1999: 8).
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Cabe ao profissional de Relações Públicas a divulgação desse tipo de atividade, promovida
pela organização aos diferentes públicos, e a adoção de critérios para a seleção dos
projetos que receberão os recursos solicitados. Até porque:
“O objetivo de fundo da filantropia corporativa é sempre melhorar a imagem da
empresa a partir de ações concretas que promovam o bem-estar da sociedade em que
vivemos” (Dwight: 8).
Atividades de incentivo à educação também compõem o rol de propostas que podem contar
com a assessoria de um profissional de Relações Públicas. Esse incentivo pode se dar com
programas de complementação dentro das próprias escolas, ou mesmo aplicados nas
empresas. Em alguns casos, as organizações chegam a criar fundações que se destinam a essa
tarefas.
A criação de um conselho comunitário, constituído por lideranças da comunidade, também é
uma alternativa interessante para que o profissional de Relações Públicas possibilite e facilite
a interlocução das organizações com a comunidade, que, por sua vez, pode revelar suas
principais necessidades.
A elaboração de projetos sociais, seja por parte das entidades sociais, seja por parte das
empresas, como também dos órgãos governamentais, pode contar com a assessoria do
profissional de Relações Públicas, apto a planejar e a demonstrar a parceria entre os
diferentes setores da sociedade.
Outra atividade, que deverá se tornar estratégica para as organizações dentro dessa
perspectiva social, refere-se à busca de certificações , como é o caso
da
Social
Accountability (SA) 8000.
Além da (SA) 8000, estendemos as considerações aqui apresentadas para a adoção de outras
normas, certificações e selos que expressem o compromisso social das organizações.
A (SA) 8000 foi criada pelo Cepaa - Council on Economic Priorities Accreditation Agency dos EUA, em 1997, ganhando maior projeção e divulgação no Brasil com o crescimento do
conceito de cidadania empresarial e responsabilidade social.
Para obter a certificação (SA) 8000, a empresa deve cumprir, em todo o seu processo de
produção, um conjunto de requisitos que abrangem diversos aspectos sociais, como não se
envolver nem utilizar mão-de obra com menos de 15 anos e promover a educação para
trabalhadores jovens em idade escolar.
No caso, a organização assume compromissos formais e precisa assegurar-se de que os seus
fornecedores também respeitarão as normas, promovendo um envolvimento em cadeia.
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Segundo o auditor Paulo Silveira Ivo, da BVQI - Bureau Veritas Quality International, de São
Paulo , responsável pela auditoria da (SA) 8000 (in Carta Educação Comunitária - Ano IV no. 21 - agosto/setembro 1999:3):
“A norma concretiza o conceito de que o compromisso com a área social não é
apenas um plus, mas uma característica tão essencial quanto a preservação do meio
ambiente ou a prevenção de acidentes internos, no fortalecimento da reputação da
empresa”.
Como a norma exige melhoria contínua e transparência, mantendo dados publicamente
disponíveis, tudo indica que essa necessitará da atuação de Relações Públicas, seja no
assessorando de sua implementação pelas organizações, seja treinando e envolvendo os
públicos, seja divulgando-a, seja prestando contas das ações sociais das organizações por
meio do balanço ou relatório social, instrumento essencial dentro desse processo.
5. RELAÇÕES PÚBLICAS E A CONQUISTA DA ACCOUNTABILITY
Entre as funções que o profissional de Relações Públicas pode desenvolver dentro do
contexto aqui apresentado, queremos chamar a atenção para algo que tem sido alvo de
atenção por parte de
estudiosos e dirigentes de organizações das mais variadas
características. Trata-se da conquista da accountability.
Conforme assinala Coelho:
“Uma pessoa ou instituição é accountable quando é responsável por decisões e pelas
conseqüências de suas ações e inações, e o de,
portanto, ser um exemplo para
outros. Aquele que é accountable aceita a responsabilidade e mantém sua
integridade, evitando a “aparência de improbidade” e resguardando (no caso de
uma organização) sua reputação” (Coelho, 2000: 171).
Em outras palavras,
“a sociedade espera que accountable seja um modelo de responsabilidade moral”
(Coelho, 2000: 171).
O termo accountable pode ser relacionado a pessoas físicas ou jurídicas. No caso das
organizações jurídicas, envolveriam-se tanto as pertencentes ao primeiro, como ao segundo e
terceiro setores.
Sua tradução para o português - responsabilidade final - não parece expressar toda a força de
seu significado, permitindo o surgimento de diversos termos, que representam um estreito
vínculo com accountability, como é o caso de “representação”.
Isso porque, conforme Coelho:
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“(...)
accountability indica uma estreita vinculação entre representante e
representado, na qual este tem o direito de exigir daquele a prestação de contas dos
seus atos de representante” (Coelho, 2000: 171).
Já Frederic Mosher, citado por Campos (1990:33), apresenta accountability como sinônimo
de responsabilidade objetiva ou obrigação de responder por algo.
Assim, acreditamos que accountability é um termo muito mais próximo da noção de
comprometimento social, envolvendo todos os aspectos que dele decorrem.
Ser considerado accountable é contar com alto nível de credibilidade junto à sociedade e aos
mais diversos públicos.
Esse tipo de conceito é o que muitas organizações buscam hoje, pois a relação destas com
seus diversos públicos vem exigindo que seja instituída uma postura ética, que exprima
confiança. E isso vale para todos os setores da sociedade.
O Terceiro Setor, por exemplo, goza de maior confiança junto aos públicos, até porque é de
sua natureza executar tarefas que produzem pouco ou nenhum lucro, exigem compaixão e
solidariedade com os indivíduos, destinando-lhes atenção direta e pessoal, aconselhamento
individual, com a aplicação de regras de conduta moral e de responsabilidade pessoal
(Gaebler & Osborne). Portanto, para que esse tipo de organização exista e se mantenha, ser
accountable é uma condição sine qua non.
Para Coelho:
“Quando uma organização do terceiro setor é tida como accountable, isso significa
que ela é idônea, que presta contas aos seus membros ou à comunidade a que serve e
que está estreitamente vinculada aos interesses destes, preservando sua reputação e
idoneidade”(Coelho, 2000: 173).
Para que uma organização seja accountable, ela deve ser transparente, permitindo o acesso e
a exposição de seus objetivos e resultados; ser íntegra, responsabilizando-se por suas ações de
impacto positivo ou negativo, ou mesmo pela falta de ações, por suas decisões e
conseqüências; prestar contas à opinião pública, sendo, portanto, aberta à fiscalização em
todos os aspectos gerenciais.
Essa é uma postura que, conforme Coelho:
“(...)vai além da obediência a regras formais. A lei pode prover um caminho padrão
de procedimentos, mas não necessariamente um caminho ético” ( 2000: 173).
A conquista da accountable requer, antes de mais nada, a clara definição da missão e objetivo
da organização.
Segundo Robert Lawry, citado por Coelho:
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As organizações devem ser responsáveis por suas ações ou inações sempre tendo em
vista a missão, produzindo relatórios de todas as atividades e justificando as decisões
tomadas e as formas de gerenciamento de recursos materiais e financeiros” ( 2000:
173).
Diante de tais considerações, acreditamos que uma das fortes atribuições que a área de
Relações Públicas pode e deve assumir frente às organizações dos diferentes setores sociais,
refere-se à conquista da accountability. Aliás, na relação entre o primeiro, segundo e terceiro
setores tal conquista permitiria um avanço na efetivação da parceria, essencial à construção
da cidadania, mas que ainda carece de maior transparência, visibilidade e consistência.
Coelho (2000) , por exemplo, considera fundamental o estabelecimento de mecanismos de
controle e avaliação, principalmente na relação entre Estado e Terceiro Setor. Entretanto,
dada a ampliação da participação das empresas nas questões sociais, julgamos útil estender
essa necessidade de controle também para as mesmas.
Analisando especificamente a relação entre Estado e terceiro setor, Coelho destaca que:
“uma questão que decorre diretamente dessa discussão é o significado de
accountability e sua importância para o processo relacional . A rigor, toda a
discussão sobre controle, avaliação e estabelecimento de parâmetros para essa
relação justifica-se por um motivo simples, as verbas governamentais que serão
repassadas ao setor” (grifo nosso) (2000:149).
Acreditamos e defendemos que o caminho para a cidadania passa necessariamente pela
intensificação das relações entre os diferentes setores da sociedade. Entretanto, ao se
intensificar a relação entre o Estado, a sociedade e o mercado, surgem discussões sobre suas
bases éticas e econômicas.
Concordamos com Coelho quando afirma que:
“O pivô da discórdia nada mais é do que o destino dos recursos públicos” (2000:
175).
É preciso, então, primeiro promover uma ampla reestruturação na administração pública, no
que se refere a processos, forma de gestão e, principalmente, moralizando a administração
pública, para depois promover a participação de toda a sociedade . Tal mudança, também terá
que ser promovida a partir dos indivíduos conscientizando-os sobre sua responsabilidade
civil
e junto
aos outros setores, promovendo-se a responsabilidade pública e a
responsabilidade social.
Conforme Coelho, é preciso:
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“ conquistar a anuência da opinião pública em torno da idéia de que essa alternativa
é um dos caminhos viáveis para o provimento das necessidades sociais” (2000: 150).
Cada setor da sociedade precisa se fazer conhecer junto aos outros setores, pois só assim será
possível identificar seus reais propósitos, suas dificuldades, seus recursos, tendo ciência de
suas capacidades e limitações. A partir daí, é possível estabelecer-se uma relação de
confiança, base para a estruturação de uma politica pública, que leve à maior cooperação e ao
maior comprometimento de cada setor da sociedade.
Ao realizar uma recente pesquisa de campo (Oliveira 2001), pudemos perceber a relação
conflituosa que ainda existe entre , em especial, o Estado e o terceiro setor e vice-versa .
Entretanto, não podemos nos esquecer de que
“Uma relação accountable depende do estabelecimento de mecanismos de avaliação
e controle. O estado de confiança, respeitabilidade, transparência e interlocução é
cobrado de todos os lados: na relação da organização com seus membros e com a
sociedade; na relação que estabelece com as agências públicas e com organizações
privadas; e na relação com os órgãos governamentais na gestão dos recursos
públicos” (Coelho, 2000: 173).
No Brasil, o termo accountabilty é, por vezes, substituído por transparência, apesar de que
essa denominação não consegue expressar com a mesma precisão a adoção de processos de
avaliação e de critérios e procedimentos (Coelho: 175).
Todavia, é fácil entender a falta de um sinônimo correto para accountability no Brasil, uma
vez que aqui seu conceito ainda não existe. Afinal, accountability tem relação direta com
democracia.
“Quanto mais avançado o estágio democrático, maior o interesse pela accountability
(Campos, 1990: 33).
É também importante que se lembre que
“Somente a partir da organização de cidadãos vigilantes e conscientes de seus
direitos, haverá condição para a accountability. Não haverá tal condição enquanto o
povo se definir como tutelado e o Estado como tutor” (Campos, 1990: 35).
Infelizmente, este ainda é o nosso caso.
Mesmo assim, não podemos subestimar a capacidade dos brasileiros começarem a exercer
cidadania.
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6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Procuramos, neste artigo, enfatizar o papel de Relações Públicas colaborando com a
instituição de políticas públicas, capazes de promover a construção da cidadania, a partir,
primeiramente, do atendimento às questões sociais.
Esperamos ter demonstrado que, para isso, é preciso envolver os diferentes setores da
sociedade. Claro que para isso é preciso levar em conta suas culturas, com peculiaridades que
precisam ser consideradas quando se pretende criar uma integração entre esses setores, em
prol de um objetivo comum.
Verificamos que a área tem uma íntima ligação com a responsabilidade social e, com isso,
tem a obrigação de participar ativamente da definição das políticas sociais das organizações,
a ponto de envolver seus diferentes públicos.
As barreiras existentes na própria área de Relações Públicas devem ser reconhecidas e
transpostas.
A primeira delas já aparece com a dificuldade em se estabelecer uma homogeneidade
conceitual para Relações Públicas; a segunda, um modelo normativo capaz de atender às
exigências do panorama social.
Percebemos que as atividades que Relações Públicas pode desenvolver no campo social são
inúmeras, envolvendo desde as já tradicionalmente conhecidas da área, como também
aquelas que fazem parte de um novo cenário econômico, político, social e cultural.
Entendemos que toda a análise feita sobre o papel de Relações Públicas enfatiza a filosofia da
área atrelada à função social, defendida, por muitos, como sendo a justificativa para o seu
próprio surgimento.
As ações de Relações Públicas que buscam a accountability, a prestação de contas, com a
elaboração de relatórios ou balanços sociais, bem como ações e
justificativas internas e
externas para a participação de todos nas políticas públicas, incluindo as atividades
relacionadas à imprensa, têm por objetivo o envolvimento de organizações e indivíduos, na
conquista da confiança, com o incentivo de atitudes éticas, de solidariedade, de participação,
de transparência, de responsabilidade social, civil e pública, não só para a conquista de uma
melhor reputação de todos os envolvidos e comprometidos, como, principalmente, para que a
democracia seja instituída e a cidadania, exercida.
Além disso, a própria identificação da missão das organizações e a busca de seu atendimento
por todos os públicos envolvidos fazem também parte do rol de atividades que a área de
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Relações Públicas pode desenvolver, colaborando para a aproximação entre os entes sociais,
e, conseqüentemente, para o atendimento das questões sociais de uma forma mais eficaz.
Todo esse panorama que vem valorizando a atuação conjunta do 1o., 2o. e 3o. setores da
sociedade é bastante propício para posicionar, de uma vez por todas, a área de Relações
Públicas de maneira estratégica para a sociedade.
Definições da área reforçam uma noção clara do papel social que a mesma deve
desempenhar. No entanto, só com a transformação do cenário sócio-econômico e político,
que passou a valorizar a cidadania e todas as questões sociais dela decorrente, é que
encontramos um momento propício para fixar
Relações Públicas como atividade
intimamente comprometida com a educação com fim social, tendo como modelo normativo o
simétrico de duas vias, proposto por Grunig e Hunt.
Para isso, é necessário que os profissionais da área assumam o desafio de assumir seu papel
social, aliando competência técnica com uma sólida base ética.
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