UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO Programa de Pós

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
Programa de Pós-Graduação em Educação
Aline Nunes Viana
DIREITO E ALTERIDADE: a propósito do currículo e do ensino jurídico na
formação dos bacharéis em Direito – Um panorama da Produção
Acadêmica sobre ensino jurídico e currículo do CONPEDI
Mariana
2016
Aline Nunes Viana
DIREITO E ALTERIDADE: A propósito do currículo e do ensino jurídico na
formação dos bacharéis em Direito – Um panorama da Produção
Acadêmica sobre ensino jurídico e currículo do CONPEDI
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Educação da Universidade
Federal de Ouro Preto, como requisito parcial para a
obtenção do título de Mestre.
Professor Orientador: Doutor Erisvaldo Pereira dos
Santos
Agência de Fomento: CAPES
Mariana
2016
V614d
Viana, Aline Nunes.
Direito e alteridade [manuscrito]: a propósito do currículo e do ensino jurídico
na formação dos bacharéis em direito. Um panorama da produção acadêmica
sobre ensino jurídico e currículo do CONPEDI / Aline Nunes Viana. - 2016.
143f.:
Orientador: Prof. Dr. Erisvaldo Pereira dos Santos.
Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Ouro Preto. Instituto de
Ciências Humanas e Sociais. Educação. Mestrado em Educação.
Área de Concentração: Educação.
1. Educação - Estudo e ensino - Direito. 2. alteridade. 3. currículos. 4. ecologia
dos saberes. I. Santos, Erisvaldo Pereira dos. II. Universidade Federal de Ouro
Preto. III. Titulo.
CDU: 37.09
Catalogação: www.sisbin.ufop.br
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho à Presidenta Dilma,
exemplo de mulher e símbolo de luta e
resistência
TEMER.
diante
do
Golpe.
FORA
“Você pode dizer que sou um sonhador,
mas não sou o único, tenho a esperança
de que um dia você se juntará a nós e o
mundo será como um só. Imagine não
existir posses me pergunto se você
consegue sem necessidade de ganância
ou fome uma irmandade do Homem,
Imagine
todas
as
pessoas
Compartilhando todo o mundo” (JOHN
LENNON).
Agradecimentos
Durante a caminhada descobri uma coisa na minha vida, que eu deveria
sempre agradecer por tudo.
A Deus todo poderoso eterno pai da luz.
Agradeço aos meus pais, que com muito trabalho e amor me incentivaram.
À minha irmã Virgínia por ser meu eterno modelo de pesquisadora. À minha
irmã Lorena por sempre mudar a senha das minhas redes sociais para eu me dedicar.
Agradeço a minha sobrinha Ellis por ser minha alegria maior.
À Evinha (presente na lembrança) pelo amor.
Agradeço ao meu orientador Professor Dr. Erisvaldo Pereira dos Santos por me
acolher e me guiar pelos caminhos tortuosos e por ser, além de tudo, meu guia
espiritual.
Agradeço imensamente ao professor Dr. Teodoro Adriano Costa Zanardi,
inspiração para esta pesquisa e por acreditar no meu potencial, desde a Graduação
na PUC Minas.
Agradeço ao Professor Dr. Alexandre Melo Franco de Moraes Bahia pelas
valiosas contribuições.
À Professora Dra.Thèrése Hamel, faltam-me palavras para expressar tamanha
gratidão pelo acolhimento em Quebec, na Université Laval. Além de aprender sobre
Educação, aprendi sobre amor, cuidado e respeito.
Ao Programa de Pós Graduação em Educação da UFOP pelo suporte e
oportunidade.
Ao Professor Dr. José Rubens Jardilino por abrir portas durante esse processo
e pelas aulas inspiradoras de Políticas Educacionais.
Agradeço à Professora Dra. Marinella Machado Araújo por fazer do Núcleo
Jurídico de Políticas Públicas – NUJUP, meu recanto de alento, e pelos valiosos
ensinamentos.
Aos meus amigos da família NUJUP, com vocês eu aprendi a seriedade de ser
pesquisadora. Ao meu amigo Bruno Fernandes, dessa família, meu sincero
agradecimento, por passar comigo momentos felizes e de tensão (qualificação e
apresentação de trabalhos).
Agradeço a amizade construída, no 014.01: Karine, Thamyres, Jumara,
Nayara,
Thaís
e Rômulo obrigada
pelas
risadas desesperadas,
cervejas
intermináveis, batatas do Marcelo, pelo carinho e cuidado durante esse período.Com
vocês Mariana se fez meu Lar.
À Tise, amiga e madrinha, por me receber na República Beijinho, por me
ensinar sobre o convívio, me aguentar no desespero da escrita.
À Karine, amiga e madrinha, pela cumplicidade, amizade sincera e por ser a
Best.
Ao Matheus, companheiro, pela parceria ao longo do Mestrado.
Aos meus bons amigos feitos em Quebec, na Université Laval, Vinicius, André,
Karina, Pedro, Anielle, Ricardo, Sidonie e Isabela, eu agradeço a convivência e
irmandade. Porque, “nunca vuelve quien se fue, aunque regrese”.
Às minhas amigas Michele, Luiza, Maiara agradeço por compreenderem minha
ausência e por toda força durante o percurso.
Ao Emílio, que durante esse período foi namorado, noivo e hoje marido,
obrigada pela compreensão, me aguentar em todas as crises, ainda que sem entender
os motivos, pelo amor e por contribuir para a realização desse sonho.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e
ao Programa de Bolsas dos Futuros Líderes nas Américas (ELAP), do Ministério dos
Negócios estrangeiros, Comércio e Desenvolvimento do Canadá (MACAED), pelo
fomento e pelas oportunidades.
RESUMO
O presente trabalho constitui-se de uma investigação e uma análise sobre o ensino
jurídico brasileiro e o currículo a partir do conceito de alteridade proposto por
Emmanuel Lévinas e de Ecologia dos Saberes de Boaventura de Sousa Santos. Seu
objetivo é verificar “em que medida o ensino jurídico brasileiro contribui para a
formação dos bacharéis em direito, no que tange a alteridade. A pesquisa se dividiu
em três partes diferentes, uma da apresentação das teorias curriculares que seriam
referência no trabalho, explicitando os conceitos chave. Em seguida uma incursão
histórica sobre o ensino jurídico e as diretrizes curriculares. Por fim, apresentam-se
os dois estudos, um sobre o panorama dos artigos publicados sobre a área no
Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Direito – CONPEDI e outro
sobre a análise de IES da Região Metropolitana de Belo Horizonte – RMBH. Para
atingir os objetivos a pesquisa se utilizou de metodologia quantitativa e qualitativa, e
como método a análise documental e bibliográfica, esse levantamento se deu a partir
de sites governamentais, artigos e livros que estudaram previamente o assunto. Além
disso, apresentou a Constituição Federal de 1988 no tocante às garantias do direito
social da educação e das legislações específicas que orientam as diretrizes
curriculares em vigor. Os objetivos específicos tomam forma no capítulo e se resumem
dessa maneira: o primeiro capítulo discorre sobre as teorias curriculares, centrado na
discussão acerca das teorias curriculares, que desvencilham com a ideia de
neutralidade de currículo e faz articulações de argumentos que questionam o ensino
jurídico atual. Dentre as referências utilizadas para a discussão estão Apple (2006),
Moreira (2007), e Santos (2007). Aborda-se, também, as diferentes diretrizes
curriculares para o ensino jurídico, e as estruturas curriculares de cada contexto
histórico. O segundo capítulo trata-se de um estudo, que pretende fazer uma revisão
sistemática dos artigos publicados no CONPEDI. Um panorama da produção
acadêmica sobre “ensino jurídico e currículo”. A revisão sistemática, “estado do
conhecimento”, se deu através do levantamento e análise dos artigos publicados no
Grupo de Trabalho “Ensino Jurídico e Metodologia da Pesquisa Aplicada ao Direito,
do período entre 2006 a 2014. Entre as perguntas que nortearam o estudo, são
algumas delas: as pesquisas nesse campo discutem e como o conceito de alteridade?
Em que me medida se explicita, nessas pesquisas, se o ensino jurídico tem
contribuído para a formação dos bacharéis em direito no tocante a alteridade? Já o
último capítulo, se refere a realização de um dos objetivos específicos deste trabalho,
qual seja analisar os currículos dos cursos de Direito da RMBH, a partir de suas
disciplinas e ementas, que compõem a matriz curricular. O intuito é avaliar se há
emergência e voz ao “outro”, nesses currículos. Entre os resultados obtidos, foi
possível identificar que o currículo do ensino jurídico para formação do bacharel
contribui pouco para a compreensão e a afirmação de um direito que considere a
questão da alteridade. Em virtude de tratar de um campo de formação e atuação
profissional constituído para garantir a proteção dos direitos patrimoniais, econômicos,
em detrimento dos direitos sociais. Este pode ser o motivo pelo qual os artigos
publicados nesse campo silenciam, em sua maioria, as questões da alteridade e da
diferença deixando de problematizar questões étnicas raciais, do direito sob a
perspectiva do feminismo e das minorias em geral.
Palavras chave: Ensino jurídico; alteridade; currículo; ecologia dos saberes
ABSTRACT
This study consists of an investigation and an analysis of the Brazilian legal education
and curriculum from the concept of alterity proposed by Emmanuel Lévinas and
Ecology of Knowledge by Boaventura de Sousa Santos. It’s goal is to see to what
extent the Brazilian legal education contributes to educate it’s law bachelor’s in what
concerns alterity. This research has been divided into three different parts, one
concerning the curriculum theories that would be the main reference to this
dissertation, explaining it’s key concepts. Then it was done a historical research on the
legal education and curriculum guidelines. Finally, we present two studies, one on the
overview of published articles in the area from the National Research Council and
Graduate Studies in Law - CONPEDI and another on the analysis of HEIs in the
metropolitan region of Belo Horizonte - MRBH. To achieve the research objectives was
used quantitative and qualitative methodology, and as a methodology a bibliography
and documental research. This survey took place from government websites, articles
and books that have previously studied the subject. It also presented the 1988 Federal
Constitution regarding the guarantees of social rights of education and specific laws
that guide the current curriculum guidelines. The specific objectives take shape in the
chapters and are summarized in this way: the first chapter discusses the curriculum
theories centered on the discussion of curriculum theories that uproot themselves form
the idea of curriculum neutrality and makes joints arguments challenging the current
legal education. Among the references used for the discussion are Apple (2006),
Moreira (2007) and Santos (2007). It was also discussed the different curriculum
guidelines for legal education, and the curriculum structures of each historical context.
The second chapter regards a study, which aims to make a systematic review of
articles published in CONPEDI. A panorama of academic production on "legal
education and curriculum." The systematic review, "state of knowledge" was through
the survey and analysis of the articles published in the Working Group "Legal
Education and Methodology of research Applied to Law, from 2006 to 2014. Among
the questions that guided this thesis are some of them: how and if the researches in
this field discuss the concept of alterity? In what way are showed in those studies how
the legal education has contributed to the training of law graduates in what relates
alterity? The last chapter brings the to achievement of one of the specific objectives of
this study, which is examining the curriculum from MRBH law schools, from their
disciplines and course outline in what consists the main curriculum. The main aim is to
assess whether there are the voice of the "other” in these courses outlines. Among the
results, it was identified that the curriculum of legal education that forms the law
graduate little contributes to the understanding and affirmation of a legal system that
considers the question of alterity. Therefore it is a educational field and professional
practice that exists to ensure the protection of patrimonial and economic rights in
detriment of social rights. This may be the reason that those articles published in that
field were, in most cases, silent to the issues of alterity and the other lacking to
problematize racial ethnic issues, right from the perspective of feminism and minorities
in general.
Keywordswords: Legal education; alterity; curriculum; ecologyofknowledge
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - As diferentes fases e Transformação histórica do currículo jurídico no Brasil
.................................................................................................................................. 60
Figura 2- Processo de seleção dos artigos publicados sobre Ensino Jurídico e
Currículo da Base de Dados do CONPEDI ............................................................. 667
Abaixo esquema criado para demonstrar as fases da análise dos dados. Figura 3 Processo de seleção dos artigos publicados sobre Ensino Jurídico do CONPEDI ... 87
Figura 4 - Processo de análise das grades curriculares dos cursos de Direito das
Instituições de Ensino Superior (IES) da RMBH. .................................................. 1033
Figura 5 - Ementa da disciplina de Direitos Humanos e Fundamentais da PUC Minas
................................................................................................................................ 114
Figura 6 - Grade curricular do 3º período – carga horária, núcleo, departamento e prérequisitos ................................................................................................................. 115
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Conceitos das diferentes teorias sobre currículo...................................... 28
Tabela 2 - Currículo único dos cursos jurídicos do Império ..................................... 522
Tabela 3 - O currículo mínimo para graduação de Direito ......................................... 54
Tabela 4 - Descrição da quantidade de artigos publicados em cada ano. ................ 65
Tabela 5- Relação de artigos analisados sobre currículo de acordo com os autores,
ano e metodologia. .................................................................................................... 69
Tabela 6 - Demonstrativo dos artigos analisados de acordo com os autores e o ano
.................................................................................................................................. 71
Tabela 7 - Demonstrativo dos artigos analisados sob o viés das disciplinas ............ 74
Tabela 8 - Artigos Analisados.................................................................................... 76
Tabela 9 - Descritivo dos artigos/ por autores e ano das publicações ...................... 77
Tabela 10- Relação das Instituições de Ensino Superior da RMBH........................ 105
Tabela 11 - Oferta da disciplina de Direitos Humanos em Belo Horizonte e Relações
Étnico raciais, como disciplina Obrigatória. ............................................................. 108
Tabela 12 - Demonstrativo da IES que oferta a disciplina de DH como optativa. ... 109
Tabela 13- Representativo das IES que ofertam a disciplina de Direitos Humanos/
Fundamentais como obrigatórias. ........................................................................... 109
Tabela 14 - Síntese do Currículo Pleno .................................................................. 113
LISTA DE SIGLAS
PROUNI – Programa Universidade para Todos
RMBH – Região Metropolitana de Belo Horizonte
IES – Instituição (ões) de Ensino Superior
CES – Câmara de Educação Superior
CNE – Conselho Nacional de Educação
ADAV – Associação Milton Campos para Desenvolvimento e Assistência a Vocação
de bem dotados
CFE – Conselho Federal de Educação
IDH – Índice de Desenvolvimento Humano
UFOP – Universidade Federal de Ouro Preto
MEC – Ministério da Educação
PUC – Pontifícia Universidade Católica
DH – Direitos Humanos
PPP – Projeto Político Pedagógico
SUMÁRIO
1
APRESENTAÇÃO .............................................................................................. 14
2
INTRODUÇÃO .................................................................................................... 18
3
ENSINO JURÍDICO NO BRASIL E CURRÍCULO ASPECTOS HISTÓRICOS ... 22
3.1
Teorias Curriculares ..................................................................................... 22
3.2
Currículo e Alteridade................................................................................... 30
3.3
Currículo e a Ecologia dos Saberes ............................................................. 35
3.4
Quadro conceitual ........................................................................................ 40
3.5
O ensino jurídico brasileiro e o currículo deste ensino. ................................ 41
3.6
Ensino Jurídico no Império ........................................................................... 42
3.7
O ensino jurídico e a Proclamação da República ......................................... 46
3.8
Diretrizes curriculares para o Ensino Jurídico .............................................. 51
3.8.1
A Estrutura curricular única do Ensino Jurídico (1827-1861) ................. 52
3.8.2
O Currículo mínimo do ensino jurídico (1962-1995) .............................. 53
3.8.3
A Portaria do Ministério da Educação número 1.886/1994 e as Diretrizes
Curriculares do Curso de Graduação em Direito – Resolução 09/2004 ............. 57
4
PANORAMA DA PRODUÇÃO ACADÊMICA – ESTADO DO CONHECIMENTO
“ENSINO JURÍDICO E CURRÍCULO” ....................................................................... 62
4.1
Trajetória da análise ..................................................................................... 64
4.2
Análise dos artigos: Categoria Currículo ...................................................... 68
4.2.1
Artigos excluídos da Amostra ................................................................ 70
4.2.2
O Currículo jurídico a partir da análise de algumas disciplinas eleitas pelos
autores dos artigos ............................................................................................. 72
4.2.3
O currículo jurídico e os estudos das imagens ...................................... 75
4.2.4
Contribuições e pertinências ao estudo ................................................. 76
4.3
O Ensino Jurídico nos artigos publicados no CONPEDI .............................. 82
4.3.1
Corpus analisado ................................................................................... 82
4.3.2
Outros conceitos chave da análise ........................................................ 86
4.3.3
Ensino Jurídico e Alteridade: A corporeidade na educação em Direito . 89
4.3.4
Considerações finais: as ausências do “outro” nas pesquisas analisadas.
95
5
INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR (IES) DE DIREITO DA REGIÃO
METROPOLITANA DE BELO HORIZONTE: ANÁLISE CURRICULAR DAS
INSTITUIÇÕES E PERCEPÇÕES ............................................................................ 97
5.1
A Região Metropolitana de Belo Horizonte .................................................. 98
5.2
O estudo das grades curriculares e levantamento das Instituições de Ensino
Superior ............................................................................................................... 101
5.2.1
Resultados das análises das grades curriculares ................................ 108
5.2.2
Histórico da IES pesquisada ................................................................ 110
5.2.3
Considerações sobre o Plano Político Pedagógico da IES escolhida. 111
5.2.4
Ementa da Disciplina de Direitos Humanos da Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais .................................................................................. 113
6
CONCLUSÃO ................................................................................................... 118
7
REFERÊNCIAS ................................................................................................ 126
APÊNDICES 1 – Panorama da análise dos artigos do Conpedi (2006-2014) ......... 134
APÊNDICE 2 - RELAÇÃO DAS IES QUE OFERTAM AS DISCIPLINAS
ANALISADAS .......................................................................................................... 137
APÊNDICE 3 -RELAÇÃO DAS IES DA RMBH QUE OFERTAM DISCIPLINAS ..... 138
ANEXO 1-RESOLUÇÃO CNE/CES N° 9, DE 29 DE SETEMBRO DE 2004 - Institui
as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Direito
CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO .............................................................. 139
14
1
APRESENTAÇÃO
Para dar início a apresentação deste trabalho, a autora gostaria de discursar
sobre sua trajetória. Além disso, comentará o que a motivou a pesquisar tal objeto.
Dessa forma, pede aos leitores licença para poder fazer uso da primeira pessoa do
singular e passa a falar.
Nasci em São Paulo, no bairro Jardim Irene, conhecido por ter sido berço do
Pentacampeão Mundial Cafu, que ergueu a taça e mostrou com orgulho a camisa com
os seguintes dizeres:100% Jardim Irene. Bairro muito simples, marcado pela violência
e pobreza, lá frequentei os meus primeiros anos da escola, subindo o “escadão” e
passando pelo pontilhão.
Quando completei 7 anos meus pais decidiram se mudar para Minas Gerais,
pois a violência em São Paulo já aumentava e estava cada vez mais difícil frequentar
a escola e conviver com a criminalidade e as drogas. Instalamo-nos na Região
Metropolitana de Belo Horizonte, mais precisamente na cidade de Ibirité, lá frequentei
a educação pública do ensino fundamental ao médio. Durante a infância no meu
bairro, na maioria das ruas, não havia se quer saneamento básico.
De uma maneira ou de outra, sempre me vi diante de um contexto de exclusão
e pobreza. Porém sempre fui privilegiada e beneficiária de projetos sociais. Primeiro
na ADAV1 (Associação Milton Campos para Desenvolvimento e Assistência a
Vocação de bem-dotados), projeto idealizado por Helena Antipoff, e naquela ocasião
dirigido por seu filho Daniel Antipoff. Já na adolescência frequentei projetos sociais
realizados e apoiados pela Indústria de Petróleo Brasileira. Lá fiz aulas de Francês
(concluí com um nível intermediário), Direitos Humanos e Cidadania Emancipada, tive
acesso a leituras, capital cultural privilegiado, e me desfiz do mito que diz que o meio
pode condicionar e determinar as pessoas.
Esta última experiência foi o responsável por abrilhantar no meu ser a vontade
de lutar e de continuar empenhada para questionar a realidade na qual eu estava
1
A ADAV,foi criada em 1972.Helena Antipoff preocupada com a necessidade de introduzir algo para o
amparo a jovens talentosos, principalmente do meio rural e das classes menos favorecidas, permitindolhes que desenvolvam aptidões inatas e encontrem suas naturais vocações. Segundo o primeiro
estatuto da Associação, a ADAV tinha como principal objetivo identificar o “bem-dotado”, estudar seus
fatores hereditários, estudar seu meio familiar, social e escolar, proporcionando-lhes ambientes sadios,
oferecer condições de concretizar sua vocação e preservar-lhe a saúde física, mental, moral e espiritual
(IBIRITÉ, 2016).
15
inserida. O relacionamento com as pessoas que não subestimavam a nossa
capacidade cognitiva foi crucial para alimentar e fazer crescer essa vontade. Não
posso deixar de atribuir aos meus pais, também, parte da responsabilidade nessa
trajetória.
Beneficiária do Programa Universidade para Todos2 (PROUNI) cursei Direito
em uma das melhores Universidades privadas do Brasil: a PUC Minas, me dediquei
aos projetos da extensão universitária e da Pastoral na Universidade desde o primeiro
período da faculdade. Em 2009 participando do Fórum Social Mundial, em
Belém/Pará, conheci muitas pessoas engajadas em movimentos sociais e estudantis
e entendi que um novo mundo era possível. Não digo isso por mero proselitismo, mas
sim porque foi a máxima que me moveu e me move até os dias de hoje.
No Fórum percebi que eu era a única estudante de Direito da PUC MinasBarreiro, que havia se disposto a sair de Belo Horizonte dentre os 150 alunos da nossa
instituição.
De volta, comecei a perceber minha graduação com outros olhos. Um dos
professores presentes no Fórum seria o mesmo que, mais tarde, estaria frente dos
projetos de extensão na Universidade e questionava os métodos atuais de ensino.
A graduação a cada dia mais me trazia questionamento, mais e mais disciplinas
técnicas, dogmáticas e estanques da realidade social, da qual me encontrava inserida.
A pergunta que hoje tento responder nesse trabalho me seguia durante toda a
formação universitária, hoje mais bem elaborada e definida: em que medida os
currículos do ensino jurídico contribuem para a afirmação da alteridade e como o
direito e as vozes dos subalternizados se fazem presente neste currículo”?.
Graças ao professor Teodoro Zanardi, hoje avaliador desse trabalho, estreitei
os laços com o ambiente da pesquisa. Tive a oportunidade de fazer iniciação cientifica.
Nesse trabalho que se intitulava a “Lei 10.639/2003 sob uma perspectiva
2
Programa Universidade para Todos (Prouni), É o programa do Ministério da Educação, criado pela
Lei nº 11.096, de 13 de janeiro de 2005, que concede bolsas de estudo integrais e parciais de 50% em
instituições privadas de educação superior, em cursos de graduação e sequenciais de formação
específica, a estudantes brasileiros sem diploma de nível superior. Dentre os requisitos para ser bolsista
do Prouni, estudantes brasileiros que não possuam diploma de curso superior e que atendam a pelo
menos uma das condições abaixo: ter cursado o ensino médio completo em escola da rede pública; ter
cursado o ensino médio completo em escola da rede privada, na condição de bolsista integral da própria
escola; ter cursado o ensino médio parcialmente em escola da rede pública e parcialmente em escola
da rede privada, na condição de bolsista integral da própria escola privada; ser pessoa com deficiência;
ser professor da rede pública de ensino, no efetivo exercício do magistério da educação básica e
integrando o quadro de pessoal permanente da instituição pública e concorrer a bolsas exclusivamente
nos cursos de licenciatura. Nesses casos não há requisitos de renda (MEC, 2015).
16
constitucionalista – a inclusão do outro na educação brasileira”, investigamos se a lei
era suficiente para dar voz ao “outro” nos currículos. A partir daí ocorreu um
encantamento da minha parte com a área do Direito a educação.
Mais recentemente já aluna, do Programa de Pós Graduação em Educação da
Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), fui contemplada com uma bolsa de
estudos (no valor de 9700 dólares), no Programa Futuros Líderes nas Américas3, do
Governo canadense. O programa seleciona estudantes e oferece bolsas de curta
duração (4-6 meses) para estudantes de graduação, mestrado e doutorado que
tenham interesse em estudar ou realizar sua pesquisa no Canadá.
O objetivo do programa é favorecer o aperfeiçoamento dos recursos humanos
de uma nova geração de líderes nas Américas, ao mesmo tempo em que consolida
as relações entre as instituições de ensino superior, brasileiras e canadenses.
Os temas de estudo ou pesquisa prioritários são aqueles relacionados a
disciplinas que promovam a boa governança, prosperidade, paz, segurança e o
desenvolvimento econômico. Durante o período de vigência da bolsa (entre outubro
de 2015 e abril de 2016), estudei na Université Laval, em Quebec, e fui orientada pela
Professora Thèrese Hamel. Experiência ímpar que me propiciou o contato com
diferentes saberes e culturas, me possibilitando conhecer outra realidade e outra
perspectiva na formação do bacharel em Direito.
Debruçada em algumas leituras, principalmente na tese inspiradora de um dos
meus coordenadores da Pastoral na Universidade, Salustiano Álvarez Gómez.Gómez
faz uma análise da Obra de Énrique Dussel. Ao introduzir seu trabalho comentando
Dom Quixote, de Miguel de Cervantes, agracia-nos com a bela passagem em que
este louco cavaleiro se negava a aceitar as loucuras da sociedade, enfrentando ao
resto dos personagens considerados normais pela sociedade, realistas empenhados
em manter a sociedade como se apresenta, sem atrever-se a mudar suas formas de
vida e questionar seus valores. A sociedade, no entanto, se mantém intocável,
inquestionável, mas apresentando situações idênticas de loucura social, permitindo
miséria e provocando vítimas.
Assim como no tempo de Dom Quixote, ainda hoje me vejo diante dessa
sociedade em que a injustiça sempre se faz presente. Se manifestando em contra
valores fundados em individualismo e interesses egoístas, em estruturas que
3
Ver mais sobre o Programa, formas de admissão, candidatura e todas as informações no Site:
http://www.scholarships-bourses.gc.ca/scholarships-bourses/can/institutions/elap-pfla.aspx?lang=fra
17
permitem desigualdades sociais, fome, miséria, ignorância e um grande número de
outras calamidades presentes, expõem e denunciam uma realidade que se
caracteriza pela desumanidade e crueldade.
No tocante a educação, essa situação se externaliza através da falta de acesso
de determinadas camadas ao sistema de ensino ou mesmo nos currículos que
selecionam saberes e excluem outros que julgam menos importantes, condicionando
a formação das camadas mais simples a uma educação muitas vezes reprodutora de
uma lógica de desigualdades.
Consciente dessa situação, perguntei-me e me pergunto o que poderia fazer
diante dessa realidade, desse mesmo dilema de Dom Quixote, de aceitar a realidade
conformando-se com a injustiça ou buscar novas formas de convivência e sociedade.
Nesse contexto e, sobretudo a partir dos caminhos perpassados na minha
trajetória, surge o desejo deste estudo sobre o Ensino Jurídico e currículo, na tentativa
de manter vivo o ideal constante de verdade e justiça.
18
2
INTRODUÇÃO
O presente texto é resultado de uma pesquisa desenvolvida no âmbito do
Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Ouro Preto –
UFOP. Este trabalho apresenta o panorama geral e indica os caminhos que percorreu
para responder aos objetivos propostos na investigação.
Como exposto na apresentação, o estudo teve origem a partir de muitas
indagações e inquietações surgidas na época da graduação em Direito da autora, que
sempre entendeu que, as realidades sociais e educacionais brasileiras quanto as
formações de sua sociedade estão marcadas por desigualdades. Após a promulgação
da Constituição Federal da República de 1988, fica claro que um dos maiores desafios
jaz na construção de um ambiente pós-racial no país para que se elimine o racismo e
a desigualdade renitente na consciência nacional.
O Brasil ao tentar formalizar as conquistas sociais através de normas, esbarrouse, recorrentemente, em heranças culturais que marcam o passado – uma herança
da escravidão marcada pela visão hierárquica e preconceituosa com relação ao
“outro”.
No caso do ensino jurídico brasileiro, a situação não foi diferente. Desde sua
formação em meados do século XIX até os dias de hoje, recebeu influência do
contexto histórico, tendo como função basilar da época manter a ordem e os valores
de um Estado escravocrata independente, mas deficiente. A implantação do Curso de
Direito no país refletia a exigência de uma elite que, sucessora da dominação
colonizadora, buscava concretizar a independência político-cultural do país.
Recompondo, ideologicamente, a estrutura de poder e preparando uma nova camada
burocrático-administrativa – setor que assumiria a responsabilidade de gerenciar o
país.
Ainda nos dias de hoje, os cursos de Direito não têm incorporado (ou
incorporam insuficientemente), em seus currículos, o devido trato aos direitos
subjetivos de segmentos sociais: como estatuto da igualdade racial, do idoso, da
criança e do adolescente e outros saberes não codificados.
Bittar (2008) esclarece que a academia jurídica teve suas bases calçadas no
único espaço de desenvolvimento da norma legislada, por sua vez cercada de
codificação. Segundo o autor “a racionalidade técnica é a linguagem da dominação, e
não condição para sua libertação”, um bacharel altamente especializado em direito
19
processual civil, geralmente, é insuficientemente preparado para a análise de quadros
de conjuntura social, política e econômica (BITTAR, 2008).
Neste ínterim delimitou-se como objetivo geral do presente trabalho identificar
em que medida os currículos do ensino jurídico contribuem para a afirmação da
alteridade e como o direito e as vozes dos subalternizados se fazem presentes neste
currículo, visando oferecer suporte crítico, teórico, para o futuro bacharel atuar na
sociedade brasileira.
Dentre os objetivos específicos eleitos para atingir o objetivo geral e que
adiante tomarão corpo através dos capítulos do estudo estão: (1) verificar como a
legislação que regula o currículo contempla historicamente os princípios básicos de
igualdade respeito a liberdade e a diversidade elencados na Constituição Federal/88;
(2) analisar os currículos dos cursos da Região Metropolitana de Belo Horizonte, a
partir das disciplinas e ementas (e o projeto pedagógico4); e (3) analisar os artigos
sobre currículo e ensino jurídico, publicados no Conselho Nacional de Pesquisa e Pósgraduação em Direito(CONPEDI), a partir do ano de 2006 a 2014, para delinear o
“estado do conhecimento”.
A metodologia utilizada é de cunho quantitativo e qualitativo. No tocante a
utilização dos métodos quantitativos, durante o trabalho o estudo se utilizou do método
que se caracteriza pelo emprego da quantificação, tanto nas modalidades de coleta
de informações, quanto no tratamento de alguns dados, através de técnicas
estatísticas não robustas. A utilização desse método se materializa na quantificação
dos trabalhos que foram analisados na revisão sistemática e separação em categorias
dos mesmo. Na quantificação das IES da RMBH e identificação das grades
curriculares analisadas.
Utilizou-se também, a metodologia qualitativa, parte-se do princípio de que esta
pesquisa também é de cunho qualitativo porque trabalha com dados qualitativos, isto
é, a informação coletada pelo pesquisador não é expressa somente em números, ou
então os números e as conclusões neles baseadas representam um papel menor na
análise. O método foi importante para aprofundar nas análises do levantamento feito
quantitativamente, e, aqui se valeu da pesquisa bibliográfica e da revisão da literatura.
4
Os Projetos pedagógicos serão analisados sempre que publicados pela Instituição de Ensino Superior
(IES), fato que será melhor explicado adiante.
20
No corpo do texto a metodologia ficará ainda mais evidente e esclarecida,
porque a opção feita foi de não se destinar um capítulo especifico e que na introdução
ainda não seria o momento oportuno para tudo dizer, no que tange a metodologia.
Assim, o trabalho se estruturou em três capítulos. O primeiro capítulo discorre
sobre as teorias curriculares. Centrado na discussão acerca das teorias curriculares,
que desvencilham da ideia de neutralidade de currículo, também, faz articulações de
argumentos que questionam o ensino jurídico atual. Dentre as referências utilizadas
para a discussão cita-se Apple (2006), Moreira (2007), Santos (2007) e Arroyo (2011).
Após esse momento, o capítulo se ocupará de discorrer sobre o ensino jurídico
no Brasil empreendendo uma breve incursão histórica que terá suas bases calçadas
nos estudos de Wolkmer (2002), Cunha (2003) e Martinez (2006), além de outros
estudos citados direta ou indiretamente no decorrer desse trabalho. Tal incursão
perpassará desde a criação do ensino jurídico no Brasil em 1827 até os dias de hoje.
A última parte do capítulo trás o contexto histórico tanto das diretrizes
curriculares quanto do ensino jurídico, e tem como principal objetivo vislumbrar a
trajetória do ensino jurídico no Brasil desde sua criação no Período Imperial, passando
pelo advento da República, até os dias atuais. Essa incursão histórica mostra-se
relevante, pois compreende a importância da articulação com os fatos que permearam
o contexto sócio-político-econômico em que ocorreram. Esse levantamento deu-se a
partir de sites governamentais, artigos e livros que estudaram previamente o assunto.
Além do exposta acima, analisou-se a Constituição Federal de 1988 no tocante
as garantias do direito social da educação e das legislações específicas que orientam
as diretrizes curriculares em vigor. Buscou-se identificar, também, O papel e a função
social que essas diretrizes desempenharam ou deveriam desempenhar na sociedade.
Atentou-se, ainda, para a questão da alteridade: ela se explicita, ou não, a partir das
diretrizes curriculares orientadas por medidas públicas e privadas e da própria história
do ensino jurídico brasileiro?
O segundo capítulo trata-se do primeiro estudo deste trabalho, que se
apresenta através uma revisão sistemática dos artigos publicados no CONPEDI; um
panorama da produção acadêmica sobre o ensino jurídico e o currículo. A revisão
sistemática, “estado do conhecimento”, se deu através do levantamento e análise dos
artigos publicados no Grupo de Trabalho (GT) “Ensino Jurídico e Metodologia da
Pesquisa Aplicada ao Direito”, do CONPEDI, a começar do ano de 2006 (ano de
criação do GT).
21
Entre as perguntas que nortearam o estudo, são algumas delas: quais são os
temas mais focalizados ao se estudar o do ensino jurídico e currículo? As pesquisas
nesse campo discutem o conceito de alteridade? Em que me medida se explicita
nessas pesquisas, se o ensino jurídico tem contribuído para a formação dos bacharéis
em direito no tocante a alteridade?
Por fim, último capítulo faz o segundo estudo de caso proposto nesse trabalho:
analisa-se os currículos dos cursos de Direito da Região Metropolitana de Belo
Horizonte (RMBH), a partir de suas disciplinas e ementas, que compõem a matriz
curricular, no intuito de avaliar se há emergência e voz ao “outro” nesses currículos.
Este trabalho se justifica pela importância de se pensar na educação como
imprescindível ao desenvolvimento do bacharel em direito, ao afetar em vários
aspectos da vida enquanto existência e modo de ser. Além disso, por se constituir de
um dos primeiros trabalhos a trazer a questão da alteridade (a partir de Lévinas) para
o centro das discussões do ensino jurídico; e por, perpassar dois campos: Educação
e Direito, tentando criar um diálogo e conjugando, nisso tudo, o conceito de ecologia
dos saberes de Boaventura de Sousa Santos.
Cabe ressaltar, ainda, como aduz Magalhães (2002) que os direitos sociais é
um dos pilares que compõe os Direitos Humanos. Dentre esses, o direito à educação
é um dos mais importantes direitos sociais, pois é essencial para o exercício de outros
direitos fundamentais. A educação não se trata apenas do ato de informar, é a
conscientização, ultrapassando o simples ato de reproduzir o que foi ensinado,
preparando o ser humano para pensar, questionar e criar. (MAGALHÃES, 2002, p.
217- 279).
22
3
3.1
ENSINO JURÍDICO NO BRASILE CURRÍCULO ASPECTOS HISTÓRICOS
Teorias Curriculares
No campo da educação, há ampla discussão sobre as teorias do currículo, de
certo, a este são dadas muitas concepções que se fundamentam em diferentes
interpretações da relação homem e sociedade.
A discussão sobre currículo tem-se constituído em um território profícuo para a
análise do quanto os processos educativos podem absorver em suas propostas
disciplinares questões contemporâneas de relevância para a produção do
conhecimento e para a sociedade. O estudo sobre inclusão, diversidade e currículo
se insere nesse contexto, pois busca dar visibilidade a temática que por muito tempo
esteve fora do debate curricular. Esses debates têm ganhado relevância no Ensino
Superior, tendo em vista a importância desse nível de ensino para a produção,
transmissão e democratização dos saberes, bem como para a construção da
cidadania (RAHME; DINIZ; MAIA, 2014 p. 135-136).
A partir do levantamento bibliográfico realizado para a tessitura deste trabalho,
ressalta-se o texto “Currículo, utopia e modernidade”, de Antônio Flávio Barbosa
Moreira (2011), que em meio as suas conclusões propõem atenção justamente para
o que se julga um dos elementos primordiais desse trabalho.
Nesse sentindo, a despeito de iniciar a seção abordando o currículo, como
enunciado no título, optou-se por expor um parágrafo que tanto reflete as inquietações
e o incômodo que será adiante questionado e revisitado. Assim, discorre Moreira
(2011):
sugere-se que as atenções, no planejamento e no desenvolvimento de
currículos, voltem-se para as margens, para as fronteiras, para as tradições
anuladas, para as histórias não contadas, para as vítimas, para os excluídos.
Não se trata de episodicamente permitir que algumas dessas vozes se façam
ouvir através das benevolentes vozes dos dominantes, mas sim de se
privilegiarem as subjetividades e os discursos até aqui reprimidos e de se
reduzir ao mínimo o processo de silenciamento (MOREIRA, 2011 p.26).
A partir do trecho acima é possível subentender que o currículo tem sido
utilizado como um instrumento de dominação, ou seja, há um discurso selecionado e
outro excluído, um que silencia o outro.
23
Nesse tocante, compreender a concepção de currículo é fundamental para a
temática aqui discutida. É imperativo entender o legado que se pretende transmitir,
visando a sociedade que se deseja construir e que conhecimento deseja-se perpetuar.
Ao se desvelar esse caráter, ainda que de maneira breve, pretendeu-se
comentar determinados perigos e injustiças que a seleção curricular pode cometer, a
medida em que anula algumas tradições e não permite a visibilidade de outras.
Antes de prosseguir na discussão adiantada por Moreira (2011), retomando as
teorias curriculares, aqui o estudo tomará por base a história sobre as teorias
curriculares tradicionais em Michael Apple (2006).
As principais teorias do currículo, em que se baseiam as ideias que permeiam
a organização curricular, são três: as teorias tradicionais; as teorias críticas e as
teorias pós-críticas (APLLE, 2006).
O contexto de surgimento das primeiras teorias curriculares (teorias
tradicionais) se deu com o processo de industrialização no início do século XX –
modernização das fábricas; substituição da mão de obra artesanal pelo trabalhador
especializado; a pequena loja substituída pela grande corporação, dentre outros.
Diante desse panorama, o indivíduo não era mais o responsável pelo projeto e pela
produção do produto, passando a ser responsável por apenas uma parcela desse
produto, cuja natureza e especificações eram fornecidas por um supervisor (APPLE,
2006, p.109).
Além disso, o indivíduo era quase totalmente dependente de outros
especialistas, para se alimentar, para vestir e todas as exigências adicionais
necessárias à sua sobrevivência física. Tal situação fez aparecer novas necessidades,
desconhecidas nos Estados Unidos agrário do século XIX. Apple (2006) tece
considerações sobre a nova classe trabalhadora:
por um lado, essa nova classe trabalhadora da indústria, a que Bobbitt se
referia como “grupo de trabalhadores ou trabalhadores associados”,
precisava ser capaz de executar sua função especializada no modo
hierárquico de organização que dominava a organização. Por ouro lado,
precisavam ter conhecimento suficiente de suas tarefas econômicas e sociais
para que pudessem trabalhar em conjunto a fim de terminar um produto sobre
cujo projeto não tinham quase nenhum papel a desempenhar (APLLE, 2006,
p. 109).
Em face desse novo contexto, a sociedade/sistema capitalista demanda uma
nova maneira de se pensar a formação de seus cidadãos. Segundo Apple (2006),
24
autores como Bobbit e Charters adotaram procedimentos de análise de empregos em
resposta a essa nova necessidade econômica de um treinamento especializado. De
certo modo, Bobbit (1924) e Charters (1971) se apropriam das ideias do movimento
de administração científica e constroem uma teoria de construção do currículo, que
teve como base a diferenciação de objetivos educacionais em termos das funções
particulares e restritas da vida adulta. O currículo seria usado para estimular a
“integração social” (idem).
Assim, as teorias tradicionais são discutidas no campo do currículo, no ano de
1918, nos EUA, com a publicação da obra The Curriculum, escrita por Franklin Bobbitt.
Esse autor assume um papel central na discussão da área, pois defendia a
incorporação dos modelos de eficiência, baseados na administração científica,
proposto por Taylor.
Nesse período, o interesse capitalista era respaldado por questões
econômicas, políticas e culturais e isso impactava nos objetivos da educação. Dentre
outras coisas, Franklin Bobbitt (1924) defendia que as escolas deveriam funcionar
como empresas, voltadas às questões da economia. Para o autor, as escolas
deveriam focar em desenvolver, nos alunos, competências e habilidades que
facilitassem a inserção no mercado de trabalho. Ou seja, a escola deveria estabelecer
padrões de acordo com os da indústria, já que o discente deveria passar por um
processo de moldagem, saindo com o mesmo perfil de trabalhador.
De acordo com Michael Apple (2006) os primeiros teóricos sobre currículo
preocupavam-se com a preservação do consenso cultural, e ao mesmo tempo, em
destinar os indivíduos ao seu “lugar” adequado numa sociedade industrial
interdependente (APPLE, 2006, p.116).
Confirmando esse entendimento, Silva (2009) afirma que esses teóricos não
estavam preocupados em fazer qualquer tipo de questionamento mais radical aos
arranjos educacionais existentes, nem as formas dominantes de conhecimento. Seus
escritos se restringiam à atividade técnica de como fazer o currículo, da elaboração
em si. Dentre esses teóricos podem ser citados, Tyler, Bobbit (SILVA, 2009, p. 30).
Ralph Tyler (1949),em “Princípios Básicos de Currículo e Ensino, amplia e
reforça as ideias de Bobbitt, ao apontar que os objetivos do ensino devem ser muito
bem definidos para atingir seu propósito.
Esse modelo teórico supõe a neutralidade do conhecimento e das relações no
processo de ensino e aprendizagem. Envolve aspectos referentes a organização do
25
ensino, como as questões pertencentes a avaliação, metodologia, didática e ao
planejamento. Dessa forma, o foco está na organização do ensino, desconsiderando
o sujeito do processo.
Todo o discurso veiculado nas teorias tradicionais respaldava-se no princípio
da neutralidade e da cientificidade. O importante, para os autores, era ensinar,
independentemente da qualidade da aprendizagem adquirida. O homem, em tal
contexto, é considerado algo histórico, uma vez que é concebido como reprodutor das
informações advindas do currículo.
Gimeno Sacristán (2000), também comentando sobre as perspectivas de Tyler
como teoria do currículo, diz que para este autor, o currículo é composto pelas
experiências de aprendizagem planejadas e dirigidas pela escola para atingir os
objetivos educativos, e concluí que a postura deste autor é acrítica e a teórica ao citar
a seguinte passagem do mesmo:
o desenvolvimento do currículo é uma tarefa prática, não um problema
teórico, cuja pretensão é elaborar um sistema para conseguir uma finalidade
educativa e não-dirigida para obter a explicação de um fenômeno existencial.
O sistema deve ser elaborado para que opere de forma efetiva numa
sociedade onde existem numerosas demandas e com seres humanos que
tem intenções e preferências (TYLER, 1981 apud. SACRISTÁN 2000 p. 46)
Entende-se, assim, que o currículo aparece como um conjunto de objetivos de
aprendizagem, que devem dar lugar a criação de experiências apropriadas e que
tenham efeitos cumulativos avaliáveis. Sendo assim, torna-se possível manter o
sistema numa revisão constante para que nele se operem as oportunas
reacomodações. Sacrístan (2000) ainda cita Johnson (1967), este autor definia o
currículo como um conjunto de objetivos estruturados que se quer alcançar (idem).
Os modelos e as teorias tradicionais de currículo foram definitivamente
contestados em meio à década de 1960, tempo de agitações5 e transformações.
Surgiram livros e ensaios que colocavam em xeque o pensamento e a estrutura
educacional tradicional. Nasceriam a partir daí, as teorias críticas que efetuaram uma
completa inversão nos fundamentos das teorias tradicionais.
5
Agitações e transformações, devido os movimentos de independência das antigas colônias europeias;
os protestos estudantis na França e em vários outros países; a continuação do movimento dos direitos
civis nos Estados Unidos; os protestos contra a guerra do Vietnã; os movimentos de contracultura;
movimentos feministas; a liberação sexual; as lutas contra a ditadura militar no Brasil; são apenas
alguns dos importantes movimentos sociais e culturais que caracterizaram os anos 60 (SILVA, 2009,
p.29).
26
Essas teorias colocaram em questão precisamente os pressupostos dos
presentes
arranjos
sociais
e
educacionais,
desconfiando
do
status
quo,
responsabilizando-o pelas desigualdades e injustiças sociais. Severamente Silva
(2009) dispôs que as teorias críticas são teorias da desconfiança, do questionamento
e da transformação, já as teorias tradicionais são de aceitação, ajuste e adaptação
(SILVA 2009 p. 29-30).
Silva (2009) esboça uma breve cronologia dos autores e obras, marco
fundamental, tanto das teorias educacionais críticas mais gerais, quanto da teoria
crítica sobre o currículo, dentre esses autores estariam: Paulo Freire (1970) - A
pedagogia do Oprimido; Louis Althusser (1970) - A ideologia e os aparelhos
ideológicos do estado; Pierre Bourdieu e Jean Claude Passeron (1970) - A
reprodução; Baudelot e Establet (1971) - L’école capitalista en France; Basil Bernstein
(1971) - Class, codes and control; Michael Young (1971)–Knowledge and control: new
directions for the sociology of education; Samuel Bowles e Herbert (1976) - Schooling
in capitalist America; e Michael Apple (1979) - Ideologia e Currículo.
No contexto da sociologia crítica da educação na Inglaterra, Basil Bernstein6 e
Michael Young, precursores do movimento conhecido como Nova Sociologia da
Educação7 (NSE), postulavam que a construção do conhecimento envolve relações
de poder, para favorecer a manutenção de grupos dominantes. Ou seja, apontavam
as conexões entre currículo e poder; e organização do conhecimento e distribuição do
poder. (MAINARDES; STREMEL, 2010 p. 03).
Ao contestar a insuficiência do conceito de currículo aceito até o momento,
enquanto “uma seleção e uma organização do saber disponível numa determinada
época”, Young discorre sobre uma valiosa compreensão de currículo como um saber
socialmente organizado, que diz sobre o que deve ser ou não conhecido. Já para Basil
6Basil
Bernstein (1924-2000) foi professor emérito da cátedra Karl Mannheim de Sociologia da
educação no Instituto de Educação da Universidade de Londres. As suas publicações iniciaram-se em
1958 até a sua morte no ano de 2000. A evolução de suas idéias aparece fundamentalmente em cinco
volumes (Class, code and Control), nas quais o autor foi elaborando a teoria dos códigos sociais e
educativos e suas implicações para a reprodução social. O autor costuma ser incluído entre os autores
que fazem uma análise crítica do currículo e do processo de escolarização, tais como Althusser,
Bourdieu e Passeron, Michal Young, Michael Apple e outros. Os estudos do autor colocam em questão
o papel da educação na reprodução cultural das relações de classe, evidenciando que a pedagogia, o
currículo e a avaliação são formas de controle social (MAINARDES; STREMEL, 2010, p.03).
7 A NSE constituiu-se na primeira corrente sociológica de fato voltada para o estudo do currículo. O
grande marco de sua emergência tem sido considerado o livro editado por Young, Knowledge and
Control: New Directions for the Sociology of Education (1971). [...] foi considerável a influência da NSE
no desenvolvimento inicial e nos rumos posteriores da Sociologia do Currículo, tanto na Inglaterra como
nos Estados Unidos (MOREIRA, 1990, p. 73).
27
Bernstein (1971) o currículo define aquilo que conta ou não como conhecimento
válido.
Para Young (2000) citado por Zanardi (2013), a concepção de “currículo como
fato”, (teorias tradicionais), é enganadora de inúmeras maneiras. O autor apresenta o
currículo como algo que tem vida própria e obscurece os contextos sociais em que se
insere e acaba por negar sua realidade externa (YOUNG, 2000 apud ZANARDI, 2013,
p. 03).
A NSE contribuiu de forma decisiva para a atualidade do tema, que centrou seu
interesse em analisar como as funções da seleção e de organização social da escola,
que subjazem nos currículos, se realizam através das condições na quais seu
desenvolvimento ocorre.
Ao invés de entender o currículo como algo dado, explicando o sucesso e o
fracasso escolar como variável dependente (dentro de um esquema no qual a variável
independente são as condições sociais dos indivíduos e dos grupos), deve-se
considerar, também, que os procedimento de selecionar, organizar, lecionar e avaliar
o conhecimento são mecanismos sociais que deverão ser pesquisados (YOUNG,
1980 apud. SACRISTÁN, 2000, p. 19).
Emerge do posicionamento de Young (1980), que o currículo é o mecanismo
através do qual o conhecimento é distribuído socialmente. Com isso, a natureza do
saber, distribuído socialmente, se situa como um dos problemas centrais a ser
discutido. O currículo passa a ser considerado como uma invenção social que reflete
escolhas sociais conscientes e inconscientes, que concordam com os valores e as
crenças dos grupos dominantes na sociedade (SACRISTÁN, 2000, p. 19).
Silva (2009) resume na tabela abaixo alguns conceitos sobre as diferentes
teorias curriculares. Ele mostra, de forma simplificada, o enfoque das teorias
tradicionais, críticas e pós-críticas e possibilita perceber a valorização que cada uma
faz a partir do que propõe. É possível identificar uma preocupação da teoria crítica
com as classes sociais, com a emancipação, conscientização e libertação dessas
classes (trabalhadoras), que de acordo com a teoria são obrigadas a aceitar a
condição de aprender na escola a cultura dominante, de um currículo voltado para os
interesses da burguesia.
28
Tabela 1 - Conceitos das diferentes teorias sobre currículo
Fonte: SILVA, 2009.
Assim, “as teorias críticas de currículo, ao deslocar a ênfase dos conceitos
simplesmente pedagógicos de ensino e aprendizagem para os conceitos de ideologia
e poder, por exemplo, permitiram-nos ver a educação de uma nova perspectiva”
(SILVA, 2007, p. 17).
Brevemente, as teorias pós–críticas abordam com ênfase as preocupações
com a diferença, com as relações saber-poder no âmbito escolar, com o
multiculturalismo, as diferentes culturas raciais e étnicas, enfim, não é uma questão
de superação da teoria crítica, mas, segundo Silva (2009),
a teoria pós–crítica deve se combinar com a teoria crítica para nos ajudar a
compreender os processos pelos quais, através de relações de poder e
controle, nos tornamos aquilo que somos. Ambas nos ensinaram, de
diferentes formas, que o currículo é uma questão de saber, identidade e poder
(SILVA, 2009, p. 147).
Após as teorias críticas e pós-críticas torna-se impossível pensar o currículo
simplesmente através de conceitos técnicos, como os de ensino e eficiência ou de
29
categorias psicológicas como as de aprendizagem e desenvolvimento, ou ainda de
imagens estáticas como as de grade curricular e lista de conteúdo (idem).
Neste ínterim, o presente trabalho toma por base os teóricos críticos sobre o
currículo (e algumas contribuições das teorias pós-críticas), para compreender as
relações de poder que envolvem a formação do bacharel em direito e os currículos
praticados historicamente.
Miguel Arroyo (2011), no livro “Currículo Território em disputa”, adverte que na
construção espacial do sistema escolar, o currículo é o núcleo e o espaço central mais
estruturante da função da escola. Por esse motivo, ele é o mais cercado, normatizado,
politizado, inovado e ressignificado. Para o autor um indicador dessa normatização
excessiva é a quantidade de diretrizes para a educação Básica, Ensino Médio, Ensino
Superior, indígena, étnico racial, EJA, dentre outros.
A centralidade do currículo vem tornando-o um território que concentra as
disputas políticas: da sociedade, do Estado e de suas instituições, como também de
suas políticas e diretrizes (ARROYO, 2011, p. 17). De acordo com o autor, todo
território cercado está exposto a ocupações e a disputas. Como todo território
sacralizado está exposto a profanações. As lutas históricas do campo do
conhecimento foram e continuam sendo lutadas por dessacralizar verdades, dogmas,
rituais, catedráticos e cátedras (idem).
Uma passagem do livro do autor que merece total destaque nesse trabalho é
sintetizada na citação abaixo, essa citação merece tanto destaque que não deveria se
quer ser colocada em letras menores, porém respeita-se aqui as regras de
formatação:
e estruturas fechadas, nem todo conhecimento tem lugar, nem todos os
sujeitos e suas experiências e leituras de mundo têm vez em territórios tão
cercados. Há grades que tem por função proteger o que guardam e há grades
que têm por função não permitir a entrada em recintos fechados. As grades
curriculares têm cumprindo essa dupla função: proteger os conhecimentos
definidos como comuns, únicos, legítimos e não permitir a entrada de outros
conhecimentos considerados como ilegítimos, o senso comum (ARROYO,
2011, p.17).
Retira-se do trecho acima o ponto crucial de toda discussão do presente
trabalho: como essas “grades”, que tem essa dupla função de proteger uns saberes e
excluir outros, se manifestam no ensino jurídico em detrimento do acolhimento, dos
saberes do “outro”, da ecologia dos saberes e da alteridade.
30
Partindo do princípio que o currículo carrega marcas das relações sociais e do
poder; que o currículo reproduz, culturalmente, estruturas sociais; e que está inserido
em um aparelho que transmite a ideologia dominante, pode-se concluir que, em suma,
o currículo é também um território político.
3.2
Currículo e Alteridade
O que se deduz da leitura da Constituição Federal de 1988, que em seu artigo
205afirma ser a educação direito de todos e dever do Estado e da família, com a
colaboração da sociedade (BRASIL,1988),e que o dever do Estado vai além do
oferecimento da instrução, a simples reprodução, é dever do estado e direito subjetivo
dos cidadãos receber uma preparação para o exercício da cidadania e a vida em
sociedade, possibilitando a plena realização como pessoa humana consciente
(MAGALHÃES, 2002, p.279).
No mesmo sentido, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (1996), que
regulamenta tal dispositivo constitucional, estabelece que:
Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o
pensamento, a arte e o saber; III - pluralismo de ideias e de concepções
[...] pedagógicas; IV - respeito à liberdade e apreço à
tolerância;(BRASIL, 1996).
Consideram-se também as heranças históricas das quais resultaram na
construção da identidade brasileira.
Assim, a educação no Brasil, em todos os níveis, deve ser baseada nos
princípios da igualdade de condições de acesso e permanência na escola; na
liberdade de aprender e ensinar; em pesquisar, divulgar o pensamento, a arte do
saber; no pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas; na gratuidade do
ensino público nos estabelecimentos oficiais; na valorização dos profissionais de
ensino; na gestão democrática do ensino público e na garantia do padrão de qualidade
(MAGALHÃES, 2002, p. 280, grifo nosso).
Porém, Moreira (2011), como já citado, afirma que o currículo do ensino pode
ser usado como uma forma de poder, e que nele há vozes que são silenciadas e
31
alguns saberes que são eleitos como mais importantes e mais adequados que outros,
de um modo geral.
Fato que iria em desconformidade com as garantias constitucionais que julga
crucial o pluralismo de ideias, o respeito a liberdade, e o apreço a tolerância.
Dessa forma, torna-se imperativo trazer à baila um dos conceitos fundamentais
para o desenvolvimento deste trabalho, que é a alteridade e “outro8”. Como visto o
primeiro termo refere-se à parte do título desta obra.
De acordo com Santos (2015), ao contrário da alteridade, foi o conceito de
diversidade que ganhou cidadania plena no currículo escolar, a partir da era dos
“Parâmetros” e das “Diretrizes Curriculares”. Através de uma categoria abstrata,
totalizante e universalista como é a diversidade, os proponentes das reformas
curriculares, pretendem resolver uma série de exigências legais que estão presentes
na atual legislação educacional.
Este trabalho fez uma escolha de trabalhar a alteridade a partir de Énrique
Dussel e Emmanuel Lévinas9. A conceptualização do termo é primordial para os
próximos capítulos da pesquisa. Porém, para adiantar o entendimento, que será
revisitado, o termo diz “alteridade10” (ou outridade) é a concepção que parte do
pressuposto básico de que o ser humano tem sua humanidade revelada e afirmada
no outro ser humano com quem ele interage.
Para tentar compreender a alteridade, Lévinas aborda novas propostas de
como viver a ética na convivência com o próximo e assim chegar a alteridade. A obra
lévinalisana é de uma envergadura indiscutível, não apenas pela quantidade de livros,
ensaios e etc., ela é atestada por um conjunto de inquietações que provocou entre os
filósofos.
8De
acordo com DUSSEL (2002) Outro, indivíduo excluído materialmente do sistema, (homem, mulher,
índio, negro, pobre analfabeto) denominado vítima. Ao constatarmos pobreza, fome, traumatismo, dor
e patologias e muitas outras dimensões da negatividade, estaríamos diante desse “outro” vítima.
9 O filósofo Emmanuel Lévinas, nasceu em 30 de novembro de 1906 na Lituânia, onde completou os
estudos secundários. Emigrou para a França, realizando aí seus estudos filosóficos. Aprofundou-se no
estudo da fenomenologia com Husserl e Heidegger. Ocupou a cátedra de filosofia nas universidades
de Poitiers, Paris Nanterre e na Sorbone. O enfoque nos problemas essenciais da sociedade faz do
pensamento de Lévinas algo novo e original e o torna um autor profético, decisivo no campo da filosofia
contemporânea (COSTA e CAETANO, 2014 p.196).
10 O primeiro contato da autora com o termo, a partir da perspectiva lévinasiana, se deu nas aulas do
Programa de Pós Graduação em Educação da UFOP, na disciplina de Direitos Humanos e diversidade
ministrada pelo Professor Dr. Erisvaldo Pereira dos Santos, orientador da presente pesquisa.
32
Emmanuel Lévinas pertenceu a um século em que foi testemunha11 e vítima
dos desastres que desencadearam as duas Grandes Guerras Mundiais; e das
inúmeras violências, destruições e penas inenarráveis que advieram a humanidade,
que revelaram a indiferença do homem contemporâneo para com o outro. A partir daí,
direciona seu pensamento de forma progressiva buscando a primazia da ética sobre
o ser.
A partir do reconhecimento do outro Lévinas apresenta uma perspectiva de
superação do fechamento do homem contemporâneo em si mesmo e faz uma
proposta para a aniquilação do egoísmo através da ética da alteridade como caminho
para a justiça.
Para o autor, a crise da sociedade contemporânea poderia ser sintetizada em
seu anti-humanismo. Trata-se de uma sociedade constituída sob os temores da
guerra, da morte e da destruição. Essa comunidade foi gerada, estabelecida e
consolidada na competição, no progresso técnico-científico, no individualismo, na
racionalidade, no consumismo e na indiferença para com o outro (GOMES, 2008, p.
36).
A sociedade insere-se assim, em um ideal de progresso que subjuga os sujeitos
que a compõem, reduzindo-os à mera condição de consumidores. Esses
consumidores, por sua vez, estão fechados nos desejos individuais e sonham
consumir sempre mais (idem).
Vê-se um indivíduo contemporâneo centrado em si mesmo, no eu totalitário,
imbuído do espírito de competitividade, que encontra no modelo social de sua época
um império do mercado a lhe transformar os sentidos e os valores de si mesmo e do
que está ao seu redor. É um sujeito quase “morto” – de quem ainda não tiraram a vida
física, mas destruíram a individualidade - que precisa constantemente se abastecer,
isto é, consumir, para se sentir vivo (GOMES, 2008, p. 36).
Em Lévinas é impossível pensar alteridade sem analisar o conceito de “rosto”,
conceito chave em sua filosofia. Nesse conceito se expressaria, para o filósofo, a
essência do ser humano de forma concreta. Para Lévinas, o rosto é de extremo valor
na relação infinita do ser humano:
11
Como Judeu e como filósofo, como prisioneiro em campo de concentração nazista, conheceu muito
bem o peso insuportável dessa violência contra o homem (BONAMIGO, 2005, p. 79).
33
O Outro que se manifesta no Rosto perpassa, de alguma forma, sua própria
essência plástica, como um ser que abrisse a janela onde sua figura, no
entanto já se desenhava. Sua presença consiste em se despir da forma que,
entrementes, já a manifestava. Sua manifestação é um excedente (surplus)
sobre a paralisia inevitável da manifestação. É precisamente isto que nós
descrevemos pela fórmula: o Rosto fala. (LÉVINAS, 2009, p.51).
Como Enrique Dussel (2002) tomou inspiração sobre a questão da alteridade e
exterioridade a partir de Lévinas. De acordo com o autor, a noção de alteridade parte,
também, do primeiro elemento, que é o “cara a cara”. Tal elemento, indica a
proximidade, o imediato, o que não tem mediação, o rosto frente ao rosto em que
há abertura e exposição de uma pessoa ante a outra. Para Lévinas, na oposição do
“cara a cara” brilha a racionalidade primeira, o primeiro intangível, a primeira
significação, é o infinito da inteligência que se apresenta diante do rosto. (GOMEZ,
2006, p. 88 e 284, grifo nosso).
Esta realidade indica a relação do “eu” pessoal ante ao “outro” igualmente
pessoal. São duas exterioridades que se encontram e descobrem sua existência, seus
horizontes e seus limites. Até o rosto do outro chega a luz, a compreensão do mundo.
Além do seu rosto se vislumbra sua compreensão do mundo, se abre uma
exterioridade metafísica ou ética, uma realidade que vai além do físico, encontrada no
horizonte de sua liberdade e sua provocação humana (GOMEZ, 2006 p.88).
Logo, para Lévinas a primeira manifestação do ser humano está no rosto.
Nossa consciência é questionada pelo rosto, esse questionamento é nossa tomada
de consciência, onde somos responsáveis pelo outro. Ele esclarece que “O Eu (Moi)
diante do Outro é infinitamente responsável” (LÉVINAS, 2009, p.53).
Tomando como pressuposto os conceitos até aqui analisados, buscando
entender essa crítica que Lévinas faz em seu livro “Humanismo do outro homem”
(1993), onde o ser humano não está preocupado com o face-a-face, nem com rosto
do próximo. O que tem poder e domínio nesse mundo contemporâneo é a questão
econômica, política, e de dominação de um homem em detrimento do outro (COSTA;
CAETANO, 2014, p.201).Na educação e no currículo é perceptível a externalização
dessa dominação, como uma forma de manutenção desse poder.
O resultado dessa reprodução encontra-se implícito tanto na negação do outro,
no que se referem às origens, histórias, cultura, formas de ser, crer e se reproduzir,
quanto nas estratégias práticas, políticas e teóricas para reduzi-lo no mesmo ou
34
invisibilizá-lo. Isso significa dizer que a afirmação da primazia da ontologia clássica
Ocidental, além de não reconhecer o outro, o submete ao mesmo. Essa primazia do
ser está na base da constituição do sujeito na modernidade como “interioridade
racional que demarca seu território próprio. [...] como consciência solitária que pensa
o mundo e os outros a partir de si mesmo” (MOREIRA; MORO, 2010, apud SANTOS,
2015 p. 02).
Este último, de uma maneira geral, teve suas bases epistemológicas calcadas
em matrizes culturais judaico-cristãs e greco-romana, articuladas em torno da
afirmação do ser como princípio ontológico, organizador de todo o sentido da
existência, que reproduz as injunções decorrentes da afirmação da ontologia como
filosofia primeira.
No âmbito da ética da alteridade, o ser humano se torna acolhedor de todo o
Outro que ao Eu se apresenta interpelando a responsabilidade. A dimensão da
alteridade pensada por Lévinas provoca uma mudança interior, aspirando uma
sociedade melhor para se viver. Calcado na subjetividade acolhedora do rosto, o
direito não se reduzirá a uma racionalidade procedimental que dita códigos, normas,
responsabilidade, mas se tornará promovedor da paz e do bem para todos (LÉVINAS,
2005, p. 294).
O Outro passa a existir como concessão de um eu arrogante e solitário, que
toma para si a tarefa de reunir tudo o que é diferente dele próprio e expressar na
noção de diversidade. A partir do reconhecimento da diversidade, o sujeito de
interioridade racional, arrogante e solitário, subjacente em propostas curriculares
consideradas progressistas, dribla a afirmação da alteridade e subsome vários Outros,
na mesma perspectiva ontológica conservadora de afirmação do primado do ser, que
se encontra presente desde a Filosofia de Aristóteles até Heidegger conforme
podemos apreender pela reflexão filosófica de Emanuel Lévinas (1906-1995)
(MIRANDA, 2008, apud SANTOS, 2015, p. 02).
Neste sentido, valendo-se desse termo, como explicado acima, o presente
trabalho pretende continuar a se utilizar da alteridade, a relacioná-la e problematizála nos estudos posteriores. Para expor as mazelas que podem causar um sistema que
não comporta a compreensão do rosto do “Outro”, e da sua não negação deste no
sistema de educação jurídica e na sociedade.
Pois colocar o Outro e seus saberes com distanciamento, como as instituições
jurídicas o tem feito cada vez mais eficazmente, provoca a “morte” absoluta do Outro.
35
Trata-se da fuga da provocação do Outro. Significa a submissão da totalidade do eu
em relação ao mundo em que se circunscreve, no qual evita-se por completo a
interferência e a dialética da existência.
Na tentativa de abarcar o Outro no currículo, para evitar essa “morte” e
encobrimento, incluir sua dimensão e saberes, o estudo traz as contribuições de
Boaventura de Sousa Santos, com a ecologia do saberes como será visitado adiante.
3.3
Currículo e a Ecologia dos Saberes
Boaventura de Sousa Santos, nas obras intituladas La Reinvencíon Del Estado
y el Estado Plurinacional e La Universidad em elSiglo XXI (2007) e Para una Reforma
Democrática y Emancipatoria de la Universidad (2007b), discorre sobre o tempo atual.
O autor alerta que existe um sentimento de urgência: algo deve ser feito diante da
crise ecológica e social que pode levar o mundo ao colapso; ante desigualdades
sociais tão intensas que não é possível se tolerar mais, em suma, ante a capacidade
destrutiva do capitalismo, que de tão grande destrói desde a ecologia até as relações
sociais (SANTOS, 2007 p. 11).
A partir do reconhecimento das desigualdades e da marginalização (seja dos
afrodescendentes, dos indígenas, seja do “outro”) e ao compreender como a realidade
histórica se constitui, torna-se possível visualizar qual o papel do currículo diante da
necessidade de se eleger um saber ou de se criar uma normatividade excludente.
Santos (2007) ao se declarar como cientista social, considera a ciência
importante, no entanto, a ciência não bastaria hoje em dia:
si yo quiero ir a la luna, uso la ciência, pero si quiero preservar la biodiversidad
necesitoade más Del conocimento indígena. Entonces, sostengo la idéia de
que hoy necesitamos de lo que llamo ecologia de saberes (SANTOS,2007 p.
17).
O autor discorre sobre um fato real ao falar sobre a questão da terra e do direito
de propriedade. Santos (2007) discorre sobre um assistente que estava na
universidade: oriundo de uma comunidade indígena, estudante de direito em Bogotá,
e trabalhava em um projeto sobre justiça e democracia na Colômbia.
Relata que esse aluno estava no primeiro ano da faculdade. Na disciplina de
direito de propriedade e obrigações, direitos reais, e o professor ensinava sobre a
36
propriedade individual, na qual há um comprador e um vendedor; e a terra, um bem
imóvel, que se compra e se vende. O aluno interroga o professor e diz: “na minha terra
não é assim, nós não podemos comprar a terra, a terra não nos pertence, nós
pertencemos à terra. Por isso não há compra e venda, a terra é comum”. O professor
o respondeu: “Eu estou ensinando o código civil, e o resto não me interessa”
(SANTOS, 2007, p. 46).
Para o autor, a resposta do professor reproduz a “violência epistemológica”,
que cria ignorância. Ao proferir tais palavras o professor demonstra que ao aprender
o direito oficial, o estudante estava produzindo a ignorância do seu direito próprio. Por
isso, neste caso, a ignorância não é um ponto de partida e sim o ponto de chegada.
Ao aprender o direito oficial se perde o próprio conhecimento.
Para se impedir isso, Santos (2007) sugere que se crie a “ecologia dos
saberes”. O conceito possibilita a integração de diferentes saberes, no qual uns são
incompatíveis e outros não são. De acordo com ele é possível criar outro marco
epistemológico, onde haja realmente possibilidade de interculturalidade12.
Ou seja, é crucial reconhecer a diversidade, no nosso caso a alteridade, e
principalmente a sua importância. Dessa forma, pode-se articulá-la às ciências, pois
só assim se daria a pluriuniversidade, com base no diálogo entre os conhecimentos
que são indissociáveis. Abaixo buscou-se conceituara “ecologia dos saberes”, que
emerge de Santos (2007) e consiste:
La ecología de saberes es, por así decir, una forma de extensiónen sentido
contrario, desde afuera de la universidad hacia adentro de la universidad.
Consiste em la promoción de diálogos entre el saber científico y
humanístico que la universidad produce y los saberes legos, populares,
tradicionales, urbanos, campesinos, provincianos, de culturas no
occidentales (indígenas de origen africano, oriental, etc.) que circulan
en la sociedad. A la par com la euforia tecnológica, ocurrehoy una situación
de falta de confianza epistemológica em la ciencia, derivada de la creciente
visibilidad de lãs consecuencias perversas de algunosprogresos científicos y
Del hecho de que muchas de lãs promesas sociales de la ciencia moderna
todavía no se han cumplido (SANTOS, 2007, p. 67) (grifo nosso).
É possível apreender a ideia de que o currículo seria ideal para promover um
diálogo com o saber científico e humanístico que a universidade produz. Porque só a
12
De acordo, com Santos (2007) a interculturalidade tem essa característica que não é simplesmente
cultural senão também política e, ademais pressupõe uma cultura comum. Não existe interculturalidade
se não há uma cultura comum. Uma cultura compartilhada (SANTOS, 2007, p. 18).
37
partir desse diálogo é possível haver a formação completa a da afirmação da
alteridade.
No ensaio escrito por Santos (2007b), “Para além do Pensamento Abissal: Das
linhas globais a uma ecologia de saberes” o autor esboça, em linhas gerais,
argumentos sobre as linhas cartográficas “abissais”, que demarcavam o Velho e o
Novo Mundo na era colonial e que ainda subsistem estruturalmente no pensamento
moderno ocidental e permanecem constitutivas das relações políticas e culturais
excludentes mantidas no sistema mundial contemporâneo.
Sendo assim, a injustiça social global estaria diretamente associada à injustiça
cognitiva global. A luta por uma justiça social global requer, então, a construção de
um pensamento “pós-abissal”(SANTOS, 2007b, p. 01).
No início do ensaio o autor afirma que o pensamento moderno ocidental é um
pensamento abissal, que consistiria num sistema de distinções visíveis e invisíveis,
sendo que as invisíveis fundamentam as visíveis. As distinções invisíveis são
estabelecidas através de linhas radicais que dividem a realidade social em dois
universos distintos: o universo “deste lado da linha” e o universo “do outro lado da
linha” (idem).
Para Santos o conhecimento e o Direito modernos representariam as
manifestações mais bem conseguidas do pensamento abissal. São estas as duas
principais linhas abissais globais dos tempos modernos, as quais, embora distintas e
operando de forma diferenciada, são mutuamente interdependentes. Cada uma delas
cria um subsistema de distinções visíveis e invisíveis de tal forma que as invisíveis se
tornam o fundamento das visíveis (SANTOS, 2007b. p.03).
No campo do conhecimento, o pensamento abissal consistiria na concessão à
ciência moderna do monopólio da distinção universal entre o verdadeiro e o falso, em
detrimento de dois conhecimentos alternativos: a filosofia e a teologia. Já no campo
do direito moderno, este lado da linha é determinado por aquilo que conta como legal
ou ilegal de acordo com o direito oficial do Estado ou como direito internacional:
o legal e o ilegal são as duas únicas formas relevantes de existência perante
a lei, e, por esta razão a distinção entre ambos é uma distinção universal.
Esta dicotomia central deixa de fora todo um território social onde ela seria
impensável como princípio organizador, isto é, o território sem lei, fora da lei,
o território do a-legal, ou mesmo do legal e ilegal de acordo com direitos não
oficialmente reconhecidos. Assim, a linha abissal invisível que separa o
domínio do direito do domínio do não-direito fundamenta a dicotomia visível
38
entre o legal e o ilegal que deste lado da linha organiza o domínio do direito
(SANTOS, 2007b, p. 04).
Na tentativa de superação desse pensamento, para Santos (2007) o
pensamento pós-abissal pode ser sintetizado como um aprender com o Sul usando
uma epistemologia do Sul. Confrontando a monocultura da ciência moderna com uma
ecologia de saberes. É uma ecologia, porque se baseia no reconhecimento da
pluralidade de conhecimentos heterogêneos (sendo um deles a ciência moderna) e
eminterações sustentáveis e dinâmicas entre eles sem comprometer a sua autonomia.
A ecologia de saberes baseia-se na ideia de que o conhecimento é interconhecimento
(SANTOS, 2007b. p. 24).
Santos (2007b) esclarece no ensaio, que a ecologia de saberes e o
pensamento pós-abissal têm como premissa a ideia da diversidade epistemológica do
mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade de formas de
conhecimento além do conhecimento científico.
Assim o “outro”, seu conhecimento e sua cultura, em todo o mundo, não só
existiriam de diferentes formas– sociedade, vida e espírito– como também muitos e
diversos conceitos sobre o que conta como seu conhecimento e os critérios que
podem ser usados para validá-lo.
Na ecologia de saberes cruzam-se conhecimentos e, também, ignorâncias.
Não existe uma unidade de conhecimento, como não existe uma unidade de
ignorância. As formas de ignorância são tão heterogêneas e interdependentes quanto
as formas de conhecimento. Dada esta interdependência, a aprendizagem de certos
conhecimentos pode envolver o esquecimento de outros e, em última instância, a
ignorância destes (SANTOS, 2007b. p.27).
Em outras palavras, na ecologia de saberes, a ignorância não é
necessariamente um estado original ou ponto de partida. Pode ser um ponto de
chegada. Pode ser o resultado do esquecimento ou desaprendizagem implícitos num
processo de aprendizagem recíproca. Assim, num processo de aprendizagem
conduzido por uma ecologia de saberes, é crucial a comparação entre o conhecimento
que está a ser aprendido e o conhecimento que nesse processo é esquecido e
desaprendido (idem).
A ignorância só é uma forma desqualificada de ser e de fazer, quando o que se
aprende vale mais do que o que se esquece. A utopia do interconhecimento é
aprender outros conhecimentos sem esquecer os próprios. É esta a tecnologia de
39
prudência que subjaz a ecologia de saberes. Ela convida à uma reflexão mais
profunda sobre a diferença entre a ciência como conhecimento monopolista e a
ciência como parte de uma ecologia de saberes (SANTOS, 2007c. p.27).
O autor explica que no Direito se materializa esse pensamento abissal à medida
que ele define o legal e o ilegal, como as duas únicas formas relevantes de existência
perante a lei, e por esta razão a distinção entre ambos é uma distinção universal.
Esta dicotomia central deixa de fora todo um território social onde ela seria
impensável como princípio organizador. Por isso, este estudo se apropria do conceito
de ecologia de saberes, que capacita para uma visão mais abrangente daquilo que se
conhece, bem como do que se desconhece.
Antes de abordar a construção de um novo ensino jurídico, o primeiro estudo
se propõe a refazer um caminho histórico, para avaliar se realmente o ensino jurídico
é expressão do pensamento abissal, e se elementos como a alteridade, a
compreensão do outro, e a ecologia dos saberes estão excluídos tanto da sua história,
quanto das suas diretrizes curriculares.
Nesta monta, abaixo, foi criado um quadro conceitual que vai orientar a
conclusão dessa pesquisa. Os conceitos primordiais que guiaram o estudo foram:
alteridade, outro, currículo, e ecologia dos saberes. Através de um movimento
dialético, esses conceitos permitiram atingir os objetivos do trabalho. Nos próximos
tópicos, após o quadro conceitual finalmente terá início o caminho histórico da
formação dos bacharéis em Direito no Brasil e, consequentemente, do ensino jurídico
brasileiro.
40
3.4
Quadro conceitual
ALTERIDADE
OUTRO
“Alteridade” (ou outridade) é a concepção que parte do
pressuposto básico de que o ser humano tem sua humanidade
revelada e afirmada no outro ser humano com quem ele
interage. A ideia de alteridade o primeiro elemento é o “cara a
cara”, indica a proximidade, o imediato, o que não tem
mediação, o rosto frente ao rosto em que há abertura exposição
de uma pessoa ante a outra. Vale lembrar que Dussel tomou
inspiração sobre a questão da Alteridade e exterioridade a partir
de Lévinas (GOMEZ, 2006, p. 88 e 284).
De acordo com DUSSEL (2002) Outro, indivíduo
excluído materialmente do sistema, (homem, mulher,
índio, negro, pobre analfabeto) denominado vítima. Ao
constatarmos pobreza, fome, traumatismo, dor e
patologias e muitas outras dimensões da negatividade,
estaríamos diante desse “outro” vítima.
CURRÍCULO
Considerado um artefato social e cultural. Isso significa que ele é
colocado na moldura mais ampla de suas determinações sociais, de
sua história, de sua produção contextual. O currículo não é um
elemento inocente e neutro de transmissão desinteressada do
conhecimento social. [...] está implicado em relações de poder, [...]
transmite visões sociais particulares e interessadas, [...] produz
identidades individuais e sociais particulares. O currículo não é um
elemento transcendente e atemporal – ele tem uma história,
vinculada a formas específicas e contingentes de organização da
sociedade e da educação (MOREIRA; SILVA, 2002, p. 07-08).
Fonte: Elaborado pela autora
ECOLOGIA DOS SABERES
Consiste na promoção de diálogos entre o saber científico e o saberes
leigos, populares, tradicionais, urbanos campesinos, provincianos, de
culturas não ocidentais (indígenas de origem africano, oriental, etc)
que circulam na sociedade (SANTOS, 2007, p. 36)
41
3.5
O ensino jurídico brasileiro e o currículo deste ensino.
Ao compreender que existe uma visão ampla sobre o currículo e que este não
é uma simples seleção de saberes, toma-se conhecimento das tensões que o envolve
e do contexto econômico-político-social no qual ele está inserido.
Torna-se imperativo, portanto, uma reflexão sobre o currículo do direito, no
que ele é; pois, sem tal reflexão, acabaríamos preconizando um ensino jurídico, o
tradicional, que só transmite a lei do mais forte e chama de não jurídico o direito dos
subalternizados, para afinal negar o que já se chamou de “direito natural” (LYRA
FILHO 1980 p. 08).
Ocorre que enquanto saber organizado, no Direito, como nas demais áreas
do conhecimento, o currículo foi e é usado para favorecer a manutenção de
determinados grupos, perpetuar saberes, eleger uns e excluir outros conhecimentos,
sofrendo influências de diferentes ordens de poder. Ao tratar do Direito, Roberto Lyra
Filho sabiamente diz que:
nem nos satisfazem determinadas “modernizações de ensino, cuja finalidade
é agilizar o currículo, para servir a ideologia tecnocrática ou ao
desenvolvimento capitalista, dependente e atado à dominação multinacional.
Isto apenas produz “mão de obra” especializada, para o staff do Estado ou
do big business, na mesma estrutura. Quero dizer que esse tipo de ensino
aliena o estudante e paralisa o esforço de pensar o direito da independência
econômica e da liberdade político-social. (LYRA FILHO, 1980, p.08)
Ao centrar a análise no ensino jurídico no Brasil é possível observar problemas
ligados, primeiramente, a concepção do próprio Direito. No princípio, o curso sofria
grande influência da Igreja, que tinha como disciplina obrigatória o Direito Eclesiástico.
Além disso, diversos decretos foram promulgados para adequar os cursos jurídicos
do Brasil, que incluíam e retiravam disciplinas da grade, exemplos disso são a
consolidação da cadeira de Direito Administrativo em 1853 e futuramente a retirada
da disciplina de Direito Eclesiástico de sua grade (SOUZA; NEIVA, 2013).
Necessário aludir que houve um pretenso esquecimento e a deliberada
omissão das primeiras legislações (1824 e 1830) sobre o direito dos índios e dos
negros escravos (WOLKMER, 2005). Wolkmer demonstra que a legislação
oitocentista, ao ocultar o escravismo colonial, parecia “envergonhada” por não
considerar o escravo como pessoa civil sujeita de direitos. Assim, o formalismo oficial
42
ocultava uma postura autoritária e etnocêntrica do legislador da primeira metade do
século XIX(WOLKMER, 2005).
Nesta mesma perspectiva jurídica, ignorou-se qualquer contribuição que os
indígenas poderiam dar. A referência para a construção do sistema jurídico pátrio,
desde então, passou a ser pautado em bases eurocêntricas. A tônica do ensino
jurídico foi a subalternização dos saberes que teve na inferiorização social e racial das
populações dominadas um instrumento poderoso (ZANARDI; ZANARDI,2013, p.
1474).
Os próximos subtítulos demonstram historicamente como o ensino jurídico
brasileiro ignorou alguns saberes, como adiantado nessa breve introdução, assim
como vem provar essa hipótese através das análises das diretrizes curriculares.
Todo esse caminho se norteou em algumas perguntas: “em que medida o ensino
jurídico contribuiu para a compreensão da alteridade? (Objetivo geral deste trabalho),
e como isso se explicitou nas diretrizes e na história do ensino jurídico? A hipótese
inicial é que o ensino jurídico ignorou ou negligenciou a formação dos bacharéis no
tocante ao trato com a alteridade, tal hipótese pode, ou não vir a se confirmar.
3.6
Ensino Jurídico no Império
As primeiras experiências universitárias no Brasil foram tardias. A literatura
mostra que as primeiras instituições criadas no país com o objetivo de formar
profissionais de nível superior, foram estabelecidas após quase trezentos anos após
o início da colonização (BAUER; JARDILINO, 2005, p. 13).
Nas colônias espanholas13, as instituições de nível superior foram instaladas
desde o século XVI. Por sua vez, Portugal não só desincentivou, como também proibiu
que as instituições fossem criadas, negando essa possibilidade durante todo o período
colonial. No seu lugar, a metrópole concedia bolsas para alguns filhos de colonos
estudarem em Coimbra, bem como permitia que estabelecimentos escolares jesuítas
ofertassem apenas cursos superiores de Filosofia e Teologia (CUNHA, 2003, p. 152).
13
O objetivo principal do trabalho não é traçar uma análise comparativa do ensino jurídico, e do ensino
superior entre as colônias espanholas e a portuguesa, mas sim, apenas chamar atenção para esse fato
que causa bastante estranheza, e fazem questionar ainda mais as razões econômicas e políticas que
levaram a Portugal negar ao Brasil por tanto tempo esse Direito. Seria possível destinar um estudo
específico para analisar as implicações que isso gerou, porém, não é a proposta.
43
Com a proibição da criação de universidades na colônia, Portugal pretendia
impedir que os estudos universitários operassem como coadjuvantes de
movimentos independentistas, especialmente a partir do século XVIII, quando
o potencial revolucionário do Iluminismo fez-se sentir em vários pontos da
América. Outros aspectos devem ser considerados nessa diferença, em
especial a disponibilidade de recursos docentes em cada um dos países
colonizadores. Havia na Espanha, no século XVI, oito universidades famosas
em toda a Europa, enquanto Portugal dispunha de apenas uma: a de Coimbra
(CUNHA, 2003, p. 152)
De acordo com Bauer e Jardilino (2005), a história demonstra que os
colonizadores portugueses e a as elites brasileiras quase nada fizeram com o objetivo
de criar na colônia instituições universitárias. Um dos motivos que corroboram para
essa passividade da elite colonial é que ela possuía recursos para formar-se na
Europa, quando necessário. (BAUER; JARDILINO, 2005 p.15).
A vinda da coroa Portuguesa para o Brasil, em 1807, e a transferência da sede
do poder metropolitano para o Brasil, correlata ao surgimento do estado nacional,
gerou a necessidade de modificar o ensino superior herdado da colônia, de fundar
todo um grau de ensino completamente distinto do anterior (CUNHA, 2003, p. 153).
Além disso, trouxe consigo a necessidade de estruturação dos cargos do governo
régio recém-estabelecido.
Nesse contexto de mudanças governamentais, a grande necessidade de se
atender aos interesses da coroa, atrelada as dificuldades para se obter mão de obra
especializada para compor os cargos da administração pública, contribuíram para o
surgimento dos primeiros cursos de Direito no Brasil (MEDEIROS, 2014, p. 36).
De acordo com Medeiros (2014) antes da vinda da coroa, contudo, já se
noticiava algumas manifestações da colônia no sentido de se implantar cursos
superiores na colônia. Em 1768, o governo da capitania de Minas Gerais solicitou à
coroa a criação de uma escola de medicina própria, dada a necessidades desses
profissionais na região – nesse período se tinha dificuldades de deslocamento das
elites para estudar, em sua grande maioria, na Universidade de Coimbra.
Mas somente em 1827, cinco anos após a independência, o imperador Pedro I,
outorgou a Carta de lei de 11 de agosto, que instituiu os primeiros cursos de Direito
do Brasil em São Paulo e Olinda. Próximo ao advento da República, no Brasil se tinha
registro de apenas de seis instituições de ensino superior, duas de Direito, duas de
Medicina, a Politécnica do Rio (Engenharia) e a Escola de Minas em Ouro Preto
(CUNHA, 2003, p. 154).
44
Para Wolkmer (2002) a implantação desses dois primeiros cursos de Direito no
Brasil refletia a exigência de uma elite, sucessora da dominação colonizadora, que
buscava concretizar a independência político-cultural, recompondo ideologicamente,
a estrutura de poder e preparando uma nova camada burocrático-administrativa, setor
que de assumiria a responsabilidade de gerenciar o país (WOLKMER, 2002, p. 80).
Tais centros de reprodução da legalidade oficial positiva destinavam-se muito
mais a responder aos “interesses do Estado do que às expectativas judiciais da
sociedade. Sua finalidade básica não era formar advogados, mas sim atender as
prioridades burocráticas do Estado” (idem).
Nesse sentido, as escolas de Direito foram destinadas a assumir duas funções
específicas: primeiro serem pólos de sistematização e irradiação do liberalismo14
enquanto nova ideologia político-jurídica capaz de defender e integrar a sociedade;
segundo, dar efetivação institucional ao liberalismo no contexto formador de um
quadro administrativo profissional.
As primeiras faculdades de Direito, inspiradas em pressupostos formais de
modelos “alienígenas”, contribuíram para elaborar um pensamento jurídico bem
distante dos anseios de uma sociedade agrária da qual grande parte da população
encontrava-se excluída e marginalizada (WOLKMER 2002, p. 81).
Wokmer (2002) ainda explica que os princípios liberais conferiram legitimidade
à idealização de mundo transposta no discurso e no comportamento desses
bacharéis. Ainda que não tenha sido o único, foi, no entanto, o liberalismo em
diferentes matizes, a grande bandeira ideológica ensinada e defendida no interior das
academias jurídicas.
Ao explorar o perfil ideológico dos atores jurídicos o bacharelismo liberal – o
autor discorre no seguinte sentido:
no bojo das instituições, amarrava-se uma lógica, o ideário de uma camada
profissional comprometida com o projeto burguês individualista, projeto
assentado na liberdade, na segurança e na propriedade. Com efeito, a
harmonização do bacharelismo com o liberalismo reforçava o interesse pela
supremacia da ordem legal instituída (Estado de Direito) e pela defesa dos
direitos individuais dos sujeitos habilitados a cidadania em prejuízo do Direito
à propriedade privada. O bacharel assimilou e viveu um discurso sócio-
14
O liberalismo é uma doutrina que se baseia na defesa das iniciativas individuais e que procura limitar
a intervenção do Estado na vida econômica, social e cultural. Trata-se de um sistema filosófico e político
que promove as liberdades civis e que se opõe ao despotismo. A democracia representativa e os
princípios republicanos têm por base as doutrinas liberais. CONCEITO DE LIBERALISMO. Disponível
em <http://conceito.de/liberalismo#ixzz4EXBHyBV7> Acesso em 24 de mai, 2016.
45
político que gravitava em torno de projeções liberais desvinculadas de
práticas democráticas e solidárias. Privilegiaram-se o fraseado, os
procedimentos e a representação de interesses em detrimento da efetividade
social, da participação e da experiência concreta. Concomitante, o caráter
não democrático das instituições brasileiras inviabilizava, também a
existência de um liberalismo autenticamente popular nos operadores do
Direito (WOKMER, 2002 p. 101).
Rodrigues (2005) citado por Medeiros (2014) trata sobre as principais
características dos cursos de Direito do Império:
a) Ter sido totalmente controlado pelo governo estatal. Os cursos, embora
localizados nas províncias, foram criados, mantidos e controlados de forma
absolutamente centralizada. Esse controle abrangia recursos, currículo,
metodologia de ensino, nomeação dos lentes e do diretor, definição dos
programas de ensino e até dos compêndios adotados;
b) ter sido o jusnaturalismo a doutrina dominante, até o período em que foram
introduzidos no Brasil o evolucionismo e o positivismo, em torno de 1870;
c) ter havido, no que se refere à metodologia de ensino, a limitação às aulas
conferência, no estilo de Coimbra;
d) ter sido o local de comunicação das elites econômicas, onde formavam os
seus filhos para ocuparem os primeiros escalões políticos e administrativos
do país; e
e) por não ter acompanhado as mudanças que ocorriam na estrutura social
(RODRIGUES, 2005 apud MEDEIROS, 2014, p. 36).
O controle governamental na condução do ensino ocorria em razão da coroa
desejar sempre manter sua hegemonia ideológica na formação profissional. As
reformas educacionais, do Marquês de Pombal pretendiam mudar a essência
ideológica da educação, afastando a hegemonia religiosa sem que, contudo,
houvesse o afastamento do exclusivo controle imperial na formação da consciência
política dos intelectuais (MEDEIROS, 2014, p.36-370).
Concordando nesse aspecto, Mossini (2010) explica que assim como Coimbra,
a academia jurídica brasileira tendeu para o afastamento das influências eclesiásticas
nas grades curriculares. Visto que, mantida na primeira grade curricular criada pela
Carta de Lei de 1824, a disciplina de Direito Eclesiástico, tornou-se optativa em 1879
e logo retirada dos currículos na reforma de 1895. No entanto, os aspectos curriculares
serão explorados em um tópico específico.
A função social do ensino jurídico nesse período demonstrou ratificar o modelo
liberal, interpretá-lo, dar vida e continuidade aos currículos ideologicamente
separados. No que se refere à metodologia, como foi insubsistente qualquer avanço
pedagógico, o resultado foi sua inclinação à pedagogia tradicional. Esse processo
46
tradicional se referia à mera transmissão de conhecimento, que contribuía com o
modelo liberal ao permitir a manutenção da estrutura social em concomitância com a
estrutura operacional do Direito (MOSSINI, 2010, p. 82).
Outra questão levantada por Mossini (2010) diz respeito a ausência de
exigências qualitativas para a profissão de professor de Direito, que favoreceu a lei do
mercado do “ensino livre”, permitindo a fácil expansão quantitativa do ensino jurídico
no aspecto da oferta da mão de obra docente. A escolha dos professores tinha como
critério seu sucesso profissional como operador jurídico, e resultou no modelo de
nivelamento pedagógico, baseado em levar para as salas de aula os melhores
práticos.
Em continuidade à digressão histórica o próximo subtítulo dá sequência ao
estudo, com o ensino jurídico no contexto da Proclamação da República.
3.7
O ensino jurídico e a Proclamação da República
No ano de 1889 foi proclamada a República. Alguns anos depois, em 1891,
foi promulgada a Constituição, resultado de conflitos e composições de correntes
político-ideológicas. De acordo com Cunha (2003) todo o processo de ampliação e
diferenciação das burocracias pública e privada determinou o aumento da procura de
educação secundária e superior, pelas quais se processava o ensino profissional
necessário ao desempenho das funções que lhes eram próprias.
Os latifundiários queriam filhos bacharéis e doutores. O ingresso nas
instituições de direito poderia dá-lhes a formação desejável para um bom desempenho
na atividade política, aumento do prestígio familiar, e também, servia como estratégia
preventiva para atenuar possíveis situações de destituição social e econômica
(CUNHA, 2003, p. 157).
As transformações do ensino superior nas primeiras décadas da República
foram marcadas pela facilitação do acesso ao ensino superior, resultado, por sua vez,
das mudanças nas condições de admissão e da multiplicação das faculdades. Essas
mudanças e essa multiplicação foram determinadas por dois fatores relativamente
independentes. Por um lado, houve o aumento da procura de ensino superior
produzido pelas transformações econômicas e institucionais. Por outro, de caráter
ideológico, houve a luta de liberais e positivistas pelo "ensino livre", e destes últimos
contra os privilégios ocupacionais conferidos pelos diplomas escolares (idem).
47
As pressões da sociedade civil sobre o estado induziram a reforma
educacional do ensino jurídico. Os dois cursos de Direito existentes deixaram de ser
monopólio, e passou a ser permitida a criação de novas faculdades de Direito. A
primeira dessas faculdades criadas foi na Bahia, em 1891 (MOSSINI, 2010, p. 81).
Assim, no período que vai da reforma de 1891 até 1910, foram criadas no
Brasil 27 escolas superiores: nove de Medicina, Obstetrícia, Odontologia e Farmácia;
oito de Direito; quatro de Engenharia; três de Economia e três de Agronomia. Masa
medida que o ensino superior se transformava pela facilitação do acesso, mediante a
multiplicação de escolas e a modificação das condições de ingresso, cresciam as
resistências a esse processo. Elas vieram determinar outra reforma de ensino em
1911 (idem).
Galdino (1997) esclarece que a República Velha mantém o status da
formação jurídica retórica e literária (não técnica), descompromissada com a realidade
social e a transformação do país, características do império (GALDINO, 1997, p. 160).
Já em 1930, a predominância do poder econômico das oligarquias agrícolas
perderia espaço com a crise econômica mundial. Dando espaço ao surgimento de
uma nova classe dominante urbana, centrada no comércio e na industrialização do
Brasil. No contexto internacional, a geopolítica havia sofrido modificações após a
Primeira Guerra Mundial, e a América Latina passou a sofrer influência direta dos
Estados Unidos da América, que, em superação da crise econômica de 1929, adotou
uma nova forma de atuação do Estado sobre a sociedade (Estado de bem estar social)
(MOSSINI, 2010, p. 91).
Da intervenção mínima do Estado Liberal na sociedade civil, passava-se
agora ao dirigismo social. Nesse momento, era dever do Estado atuar em prol do bem
estar da sociedade e regular de forma intensa a economia. A sociedade civil brasileira
sofreria várias transformações e sucessivas modificações políticas entre 1930 e 1945
(Era Vargas), ao mesmo tempo em que os dados indicam que o Ensino Jurídico
Brasileiro se estagnara no período (MARTINEZ, 2006, p. 07).
Segundo Martinez (2006) a mais importante das reformas educacionais
providas pelos governos da época foi a “Reforma Francisco Campos 15”, em 1931. O
seu maior mérito seria de institucionalizar a figura da “universidade” no Brasil, em
15
Ver mais sobre a Reforma Francisco Campos em: A reforma Francisco Campos e a modernização
nacionalizada do ensino secundário. DALLABRIDA, N., Disponível em< http://revistaseletronicas.
pucrs.br/ojs/index.php/faced/article/viewFile/5520/4015> Acesso em 24 de mai 2016.
48
nítida ação dirigida à inovação dos ideais educacionais da República Velha. Enquanto
genericamente instala-se período animador para a sistematização universitária do
ensino superior, a atualização curricular proposta por Campos, para organização da
Universidade do Rio de Janeiro (especialmente para o ensino jurídico), revelava o seu
direcionamento às demandas do mercado. Em termos de reprodução do modelo
liberal, ao "incentivar o estudo do Direito positivo, privilegiando as regras gerais do
Direito pátrio", mantinha-se o cerne liberal da fase anterior.
O Estado Novo (1937-1945) tem uma grande produção legislativa de
codificação. Busca-se uma reestruturação nacional e são criados novos estatutos
jurídicos, entre eles o Código de Processo Civil, Código Penal, Código de Processo
Penal e uma Lei de Introdução do Código Civil (MOSSINI, 2010; MARTINEZ, 2006).
Continuava esquecido o estabelecimento de regulação qualitativa dos cursos,
se mantendo a modelagem livre. Nesse momento, a tentativa de solucionar o
descompasso social do ensino jurídico foi proposta em uma alteração curricular. Isso
ocorreu em1961, já sob o controle do Conselho Federal de Educação. Surgia o
"currículo mínimo" para os cursos de Direito (MARTINEZ, 2006, p. 05).
O autoritarismo estatal vigente no Golpe Militar de 1964 veio direcionar as
possibilidades de alteração na estrutura dos cursos de Direito. Não havia mais espaço
para a "Escola Nova16" na esfera política de influência. O momento era da valorização
do tecnicismo. Essa tendência foi confirmada com o estabelecimento dos Acordos
MEC/USAID, embasando a reforma educacional de 1968.
Martinez (2006) assevera que, a meta voltava-se para o atendimento do
crescimento econômico financiado externamente. Requeriam-se novos técnicos para
o suporte do "milagre brasileiro" e novamente o número de vagas estava à frente de
metas educacionais qualitativas. Em 1964 existiam, 61 faculdades, uma década
depois esse número subiu para 122, conforme dados citados por Venâncio Filho
(1982).
16A
Escola nova, também chamada de Escola Ativa ou Escola Progressiva, foi um movimento de
renovação do ensino, que surgiu no fim do século XIX e ganhou força na primeira metade do século
XX. Nascido na Europa, tendo como um dos fundadores o suíço Adolphe Ferrière, e América do Norte,
chegou ao Brasil em 1882, pelas mãos de Rui Barbosa, e exerceu grande influência nas mudanças
promovidas no ensino na década de 1920, quando o país passava por uma série de transformações
sociais, políticas e econômicas. O movimento ganhou impulso na década de 1930, após a divulgação
do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932). Nesse documento, defendia-se a
universalização da escola pública, laica e gratuita (SANTOS; PRESTES e DO VALE, 2006). Ver mais
sobre o assunto em BRASIL, 1930 - 1961: ESCOLA NOVA, LDB E DISPUTA ENTREESCOLA
PÚBLICA E ESCOLAPRIVADA. Disponível em<http://www.histedbr.fe.unicamp.br/revista/edicoes
/22/art10_22.pdf> Acesso em 24 de mai 2016.
49
A técnica, aliada ao controle do pensamento crítico, era o referencial a ser
seguido, porquanto atendia às leis de mercado e mantinha a ordem perante o aparato
estatal autoritário. Segundo Bastos (2000), pela conjugação de fatores apresentada
(crise organizacional, didática, metodológica, curricular, mercadológica), esse foi um
dos momentos de maior crise na história do ensino jurídico brasileiro (BASTOS, 2000
apud MARTINEZ 2006, p. 05).
A manutenção da ideia de reforma, pela simples modificação da grade
curricular, novamente voltou a ser indicada como a solução para a crise em 1972,
quando os cursos de Direito receberam nova modificação curricular por determinação
da Resolução n. 3, do Conselho Federal de Educação. Um dos fundamentos da
reformulação curricular de 1972 consistia em que o obstáculo à implantação de
"soluções inovadoras" na metodologia do ensino jurídico decorria da "dilatada
extensão" do currículo mínimo dos cursos de Direito (idem).
A reformulação não ia o cerne da crise de inadaptação liberal do ensino aos
novos tempos, o resultado foi o mesmo da reforma de 1961 e as faculdades de Direito,
"com raras exceções, continuaram seguindo seus programas tradicionais"
(MARTINEZ, 2006). Essa limitação pedagógica das reformas educacionais refletiu nas
duas décadas seguintes, uma "época perdida" para o Ensino Jurídico Brasileiro. O
que se via era uma continuação e reprodução do discurso e metodologias liberais da
fase imperial. Isso representa uma grande perda das oportunidades de transformação
emancipatória (idem).
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988 (CF/88) houve campo
democrático,
inaugurando
uma
nova
ordem
jurídica,
que
representava
transformações substanciais no ensino jurídico. Vários direitos e garantias haviam
sido introduzidos no ordenamento jurídico brasileiro pela nova CF/88 e essa onda
cidadã permitiria inovações nos cursos de Direito.
No início da década de 1990, havia 186 cursos de Direito no país, os quais
mantinham a mesma estrutura curricular tradicional desde a reforma de 1973. O
resultado dessa política era a existência de um ensino reprodutor, deformador e
insatisfatório na preparação de bacharéis para um mercado profissional saturado,
conforme Melo Filho (1983, p.09).
Tais aspectos da crise “crônica” do ensino jurídico agora floresciam com toda
a sua intensidade. Não havia mais o crescimento econômico do “milagre brasileiro” a
50
absorver a vasta gama de profissionais “fabricados”, com a formação minimamente
técnica requerida (MARTINEZ, 2006).
Para Martinez (2006) as exigências naquele momento:
demandavam profissionais do Direito com qualificação superior aquela
fornecida pelo ensino jurídico tradicional, aptos ao enfrentamento da
complexidade dos conflitos, até então contidos pelo autoritarismo, cujo
reconhecimento advinha da Constituição Federal de 1988.Enfim, a liberdade
de expressão abriu possibilidades ao amplo e livre debate sobre os
problemas do ensino jurídico brasileiro, sobre a formação profissional
tradicional do bacharel e sobre o Direito e a Justiça. Das repercussões sociais
da crise dos cursos de Direito, a Organização dos Advogados do Brasil - OAB,
por meio de sua Comissão de Ensino Jurídico, desde 1992 iniciou um estudo
nacional buscando uma “reavaliação da função social do advogado e de seu
papel como cidadão. Começou-se pela realização de estudos e avaliações
sobre as condições dos cursos de Direito no Brasil, tendo, como parâmetro
regulador, a Resolução CFE n. 03/72, até aquele momento ainda responsável
pelas diretrizes do ensino jurídico (MARTINEZ, 2006 p.08).
As repercussões desse processo de avaliação do ensino jurídico, da
Comissão de Ensino Jurídico da OAB, surgiu a Comissão de Especialistas em Ensino
Jurídico da SESu/MEC.A conclusão desse processo de análise auto avaliativa da
práxis dos cursos de Direito resultou na elaboração do texto final da Portaria 1.886/94
do Ministério da Educação (MEC), revogando a Resolução CFE n. 03/72 e passando
a regular as diretrizes curriculares mínimas para os cursos de Direito no Brasil, mais
a frente será explorada as diretrizes (idem).
Recentemente em 2013, a situação estava tão crítica na proliferação de IES
de Direito que o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, anunciou o fechamento
temporário de autorização para novos cursos de direito e o cancelamento de
vestibulares para todos os cursos cujos alunos formados tenham tirado nota até 3 no
Conceito Preliminar de Curso (Indicador do MEC) (EBC, 2016).
Fato que teve uma enorme repercussão na mídia nacional que noticiava
insistentemente:
Em dezembro (2013), o Ministério da Educação determinou a suspensão do
ingresso de alunos em 38 faculdades de direito espalhadas pelo país. Com
avaliações insatisfatórias pelos critérios estabelecidos pelo governo, a
quantidade ajuda a revelar uma outra realidade existente no Brasil. Nos
últimos 20 anos, de acordo com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB),
houve uma explosão de cursos na área: de aproximadamente 200 na década
de 1990, para atualmente os 1,3 mil existentes (CONGRESSO EM FOCO,
2016).
51
A situação do ensino de Direito no país dá sinais da dramática situação que
se encontra. Para Chaves (2014) presidente da OAB São Paulo:
“Isso evidencia um dado dramático. Nós sabemos que a grande maioria
desses cursos não tem o foco na boa formação, mas sim na questão
mercantil. Os cursos mal avaliados nem deveriam ter sido abertos, foram
criados sem nenhum critério. São verdadeiros estelionatos educacionais”,
comenta o presidente da OAB-SP (CHAVES, 2014, in CONJUR, 2016).
Diante toda essa situação de proliferação, contestada qualidade da formação
dos bacharéis nesses cursos de Direito ficou evidenciado alguns desajustes desse
ensino, principalmente no que tange a formação humanística do bacharel. O próximo
subtítulo tem a intenção de fazer a mesma incursão histórica aqui demonstrada,
porém trata das diretrizes curriculares desse ensino jurídico.
3.8
Diretrizes curriculares para o Ensino Jurídico
Os subtítulos anteriores se detiveram em revisitar as diferentes fases do
ensino jurídico no Brasil. Ocuparam-se de um retorno histórico sobre este ensino, na
tentativa de clarear as diferentes influências recebidas tanto políticas quanto
econômicas e sociais.
O ponto nevrálgico, que não foi diretamente abordado e que caberá a este
tópico, foi de comentar e explicitar as diferentes diretrizes curriculares ao longo do
contexto histórico e as diferentes forças que interfiram em suas características. Para
tanto, o estudo utilizará como fonte dados documentos oficiais, leis, decretos, assim
como fontes secundárias (pesquisas realizadas no campo da Educação e do Direito).
Retomando um dado histórico, como já se sabe, os primeiros cursos
superiores no Brasil surgiram com a vinda de Dom João VI ao país. Herdamos daí o
modelo de Universidade de Coimbra reformada, que substituía o conhecimento
clássico por conhecimento técnico por forte influência dos franceses.
O primeiro currículo do curso de direito, criado em 1827, teve seus estatutos
elaborado por Luiz José de Carvalho Melo (Visconde de Cachoeira), que foi formado
em Direito em Coimbra, magistrado no Rio de Janeiro, deputado da Constituinte de
1823 e ministro do gabinete do império (SILVA apud. GRIPP 2014, p. 180).
52
As pequenas reformas do ensino superior que aconteceram no início do período
republicano tiveram forte influência positivista, mas que não foram totalmente
implantadas. Na República Velha não há mudanças significativas nem no modelo dos
cursos, nem no modelo curricular, estes dados serão comentados adiante (GRIPP,
2014, p.181).
3.8.1
A Estrutura curricular única do Ensino Jurídico (1827-1861)
Apresentada na carta de lei de 11 de agosto de 1827, sob uma estrutura de
currículo único obedecia rigidamente a estrutura determinada pela lei.
A Lei de 11 de agosto de 1827 emana as seguintes determinações:
Crêa dous Cursos de sciencias Juridicas e Sociaes, um na cidade de S. Paulo
e outro na de Olinda.
Dom Pedro Primeiro, por Graça de Deus e unanime acclamação dos povos,
Imperador Constitucional e Defensor Perpetuo do Brazil: Fazemos saber a
todos os nossos subditos que a Assembléia Geral decretou, e nós queremos a
Lei seguinte:
Art. 1.º - Crear-se-ão dous Cursos de sciencias jurídicas e sociais, um na
cidade de S. Paulo, e outro na de Olinda, e nelles no espaço de cinco annos,
e em nove cadeiras, se ensinarão as matérias seguintes (BRASIL 1827):
A mesma lei dispõe sobre o currículo deste ensino, para facilitar a visualização,
optou-se por demonstrá-la nos moldes abaixo:
Tabela 2 - Currículo único dos cursos jurídicos do Império
Fonte: BRASIL, 1827.
53
Como é possível visualizar, as disciplinas eleitas para compor o currículo são
preponderantemente voltadas para a formação técnica como: direito civil, criminal,
teoria do processo e outras.
De acordo com Martinez (2006) essa estrutura curricular confirma uma
tendência liberal, destacando em seus dois últimos anos o estudo do direito civil e
comercial e ao estudo da economia política e prática processual (quinto ano).
Em termos de composição curricular, a mudança mais significativa foi a de
1854, quando houve a inserção das disciplinas de Direito Romano e Direito
Administrativo (Decreto n.º 1.386, de 28 de abril de 1854) (BRASIL, 1854).
É interessante mencionar que, também, foram inseridas as disciplinas:
Hermenêutica Jurídica, Processo Civil e Criminal, e Prática Forense. Além disso,
restringiu-se o Direito Eclesiástico a uma única disciplina (BASTOS, 2000, p. 58). Aqui
já temos a inclinação para o afastamento do ideário religioso e a consagração da
temática positivista no currículo do ensino jurídico em prol dos interesses do mercado
(MEDEIROS, 2014, p 38).
Já é perceptível que os cursos de Direito tinham uma relevância extraordinária
para o governo imperial, não só por ser fonte de mão de obra especializada para os
cargos públicos, mas também porque os alunos egressos, mais tarde, seriam
formadores de opinião daqueles que os cercavam. Assim, quanto mais a concepção
ideológica imperial estivesse neles arraigada, mais bem protegida estaria a
hegemonia imperial.
3.8.2
O Currículo mínimo do ensino jurídico (1962-1995)
De acordo com Mossini (2010) o currículo jurídico não sofreu grandes
alterações até 1962, quando o Conselho Federal de Educação alterou a concepção
vigente de “currículo único” – de matriz pré-estabelecida e rígida, inalterado e
uniforme– para a concepção de “currículo mínimo” – incluindo-se, o bacharelado em
Direito, na forma e sob as competências da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB – lei n. 4.024/61).
Por meio da LDB (lei n. 4.024/61), o Conselho Federal de Educação criado pela
citada lei, em substituição ao até então existente Conselho Nacional de Educação,
emitiu o parecer número 215, aprovado por aquele conselho. Esse parecer propunha
54
um currículo mínimo de Direito, a ser implantado a partir do ano letivo de 1963, que
viria em substituição ao “currículo único”.
Este “currículo mínimo” para os cursos de graduação (bacharelado) em Direito,
teria duração de cinco anos, cuja estrutura é trazida por Rodrigues (2005):
Tabela 3 - O currículo mínimo para graduação de Direito
Disciplinas:
Economia Política;
Direito Financeiro e Finanças;
Medicina Legal;
Direito Penal;
Introdução à Ciência do Direito;
Direito do Trabalho;
Direito Civil;
Direito Internacional Privado;
Direito Comercial;
Direito Internacional Público;
Direito Constitucional
Teoria Geral do Estado);
(incluindo Direito Judiciário Civil (com Prática
Forense);
Direito Administrativo;
Direito Judiciário Penal (com Prática
Forense)
Fonte: RODRIGUES, 2005, p. 64.
É de se notar que, apesar de a LDB ter pretendido avançar na direção de uma
formação superior para além do pragmatismo positivista, a estrutura curricular do
ensino jurídico não acompanhara esse desejo. De fato, inobstante a concepção de
currículo mínimo fosse a de possibilitar às instituições de ensino superior a adoção de
outras disciplinas além daquelas estabelecidas pelo Parecer CFE 215/1962 (BRASIL,
1962), isso, na prática, não ocorreu.
Rodrigues (2005) comenta que:
na prática continuou existindo um curso com rigidez curricular. Além disso, as
matérias listadas demonstram a manutenção da tendência, implementada
principalmente a partir da Reforma Francisco Campos, de transformar o ensino
do direito em formador de técnicos do Direito. [...]. Pelo seu tecnicismo, foi mais
um passo no sentido de despolitização da cultura jurídica. Nota-se dele,
claramente, a tentativa de transformar os cursos de Direito em cursos
estritamente profissionalizantes, com a redução – para não falar em quase
eliminação – das matérias de cunho humanista e de cultura geral. Foram elas
substituídas por outras voltadas para a atividade prática de advogado do foro,
dando continuidade à tentativa de tecnificação do ensino jurídico, que já havia
sido iniciada na República Velha (Rodrigues 2005, p. 64).
55
Essa normatização perdurou até 1972 quando, o Conselho Federal de
Educação – CFE editou a Resolução n. º 03/1972 (BRASIL, 1972), dando novos
direcionamentos para o ensino do Direito brasileiro. Trata-se de importante passo
rumo à flexibilização dos cursos de Direto (RODRIGUES, 2005, p. 65). Essa
Resolução estabeleceu a estrutura curricular mínima para os cursos de Direito,
dividindo as disciplinas em básicas e profissionais, exigindo-se exercícios de prática
forense sob a forma de estágio supervisionado, além de estudos baseados em
problemas brasileiros e a prática de Educação Física.
Dentre as disposições da Resolução CFE n. º 03/1972, destaca-se sua
inclinação para a flexibilidade curricular (facultando às instituições de ensino a
inserção de outras disciplinas adequadas ao contexto regional); a elasticidade de
duração do curso (que poderia variar entre 4 e 7 anos); e a exigência do estágio
obrigatório como ferramenta de prática profissional. Essas inovações viabilizaram o
início de uma visão de estimulo à adequação do itinerário formativo às necessidades
do mercado de trabalho, bem como as realidades locais e regionais onde as
instituições de ensino estavam localizadas (RODRIGUES, 2005, p. 67).
Contudo, essa possibilidade de flexibilização curricular não se operou na
prática. As instituições de ensino, imbuídas pelo “conforto” do currículo mínimo, não
suplantaram as diretrizes curriculares estabelecidas pela Resolução 03/1972, optando
pela autolimitação. Melo Filho (1984) citado por Rodrigues (2005), manifestou-se no
sentido de que:
[...] a Resolução de 1972 do Conselho Federal de Educação concedeu
liberdade às Universidades na organização curricular, condicionando-as
apenas à duração do curso e ao currículo mínimo. No entanto, os cursos
jurídicos, não sabendo usar da liberdade de comportamento que lhes foi
concedida, optaram por uma autolimitação, vale dizer, renunciaram à
autonomia, posto que grande parte dos cursos transformaram em máximo o
currículo mínimo, afastando a flexibilidade, variedade e regionalização
curriculares expressas pelas habilitações específicas (especializações) que
viessem a atender o dinamismo intrínseco do Direito e as possibilidades reais
dos corpos docente e discente. (MELO FILHO, 1984 apud RODRIGUES, 2005,
p. 45).
Segundo Medeiros (2014) ao que parece, naquele momento o grande
obstáculo enfrentado pelo desejo de flexibilização curricular do ensino jurídico não foi
a vontade legislativa, mas sim a "consciência institucional" das entidades que
ofertavam o curso de Direito à época.
56
A Resolução do Conselho Federal de Educação – CFE n. º 03/1972 conferia
às
instituições
de
ensino
autonomia
para
formularem
seus
currículos,
complementando os limites mínimos nela estabelecida com as peculiaridades de seus
contextos locais. Porém, como assevera Rodrigues (2005), a maioria delas adotou o
currículo mínimo como currículo pleno. O tradicionalismo positivista continuou
arraigado à matriz curricular do ensino jurídico e, agora, potencializado pela inércia
dos responsáveis pelas instituições de ensino em promover as mudanças que já eram
prementes (RODRIGUES, 2005, p. 68).
A sistemática de oferta dos cursos de Direito passou, então, a ser objeto de
intensos debates dos estudiosos que criticavam especialmente as metodologias
pedagógicas empregadas e as questões curriculares que desaguavam em aspectos
políticos que também estavam envolvidos no ensino do Direito.
Houve a constituição de uma Comissão de Especialistas de Ensino Jurídico,
em 1980, com a finalidade de refletir sobre a organização e o funcionamento dos
cursos de Direito no país. O modelo curricular proposto pela Comissão acabou não
sendo objeto de análise nem pelo Conselho Federal de Educação (CFE), nem pelo
Ministério da Educação (MEC).
Para possibilitar a melhor visualização das mudanças que, na nossa
concepção, tiveram natureza meramente formal, segue trecho do parecer CNE/CES
n. º 055, de 18 de fevereiro de 2004 (BRASIL, 2004a) que sintetiza, em recortes
históricos, as reformas curriculares ocorridas entre 1827 e o início da década de 1990:
a) 'Currículo único' para todos os cursos de Direito, no Brasil, de 1827
(Império) a 1889 (início da República), e até 1962;
b) mudança de 'currículo único', vigente no período anterior, para 'currículo
mínimo' nacional e 'currículo pleno', por instituição de ensino, com a
flexibilização regional, embora permanecesse rígido o 'currículo mínimo';
c) de 'currículo mínimo' em 1962, perpassando por 1972 com as Resoluções
3/72 e 15/73, mantendo-se as concepções simultâneas de 'currículo mínimo'
nacional e 'currículos plenos' institucionais;
d) 'currículo mínimo' nacional e 'currículo pleno' das instituições com
flexibilização para habilitações e especializações temáticas, em 1994, com a
Portaria Ministerial 1.886/94, para implantação a partir de 1996,
posteriormente diferido para 1998, ainda que a ementa da referida Portaria
estivesse assim redigida, com um equívoco ou contradição em seus termos:
'Fixa as diretrizes curriculares e o conteúdo mínimo do curso jurídico', posto
que, se 'diretrizes' fossem, amplas e abertas, não haveria a exigência
expressa de determinado e limitado 'conteúdo mínimo do curso jurídico'
nacional, ainda que sem embargo dos 'currículos plenos' das instituições; [...].
(BRASIL, 2004a).
57
De acordo com Mossini (2010) essa situação perdurou até 1998, com a
implantação das “Diretrizes curriculares e conteúdo mínimo do curso jurídico”, de
âmbito nacional, fixados pela Portaria número 1.886/94.
3.8.3
A Portaria do Ministério da Educação número 1.886/1994 e as
Diretrizes Curriculares do Curso de Graduação em Direito –
Resolução 09/2004
A partir da promulgação da Constituição Federal de 1988 (CF/88) aumentou o
campo democrático para transformações substanciais no ensino jurídico. Vários
direitos e garantias haviam sido introduzidos no ordenamento jurídico brasileiro pela
nova CF/88 e essa “onda” cidadã permitiria inovações nos cursos de Direito, resultado
de um amplo processo participativo.
No bojo desse cenário, em 1994, o Ensino Jurídico passa a ser regulamentado
pela portaria 1.886 que trazia uma significativa alteração dos currículos dos cursos
jurídicos. A Portaria foi instituída pelo MEC, no dia 30 de dezembro daquele ano.
Dentre as inovações e avanços do currículo do curso de Direito, deve-se mencionar
um direcionamento à realidade social e integração dos conteúdos com as atividades,
conferindo relativa dimensão teórico-prática ao currículo jurídico (MOSSINI, 2010, p.
106).
Mossini (2010) acertadamente descreve o processo de mudança que com a Lei
de Diretrizes e Bases (LDB - Lei 9.394/96) representou um marco no Direito
Educacional brasileiro e passou a ser referência em matéria de organização na
educação brasileira e disciplina diversos assuntos. Entre os quais podemos destacar
os princípios e finalidade da Educação Nacional, os deveres do Estado na esfera
educacional, as formas de organização do sistema, com a repartição de competências
entre os entes da federação e a colaboração entre todos.
A Resolução CNE/CES17 n° 9, de 29 de setembro de 2004, que institui as
Diretrizes Curriculares do Curso de Graduação em Direito, Bacharelado, a serem
observadas pelas Instituições de Educação Superior em sua organização curricular,
surge como um instrumento normativo do ensino jurídico, dentro do cenário
constitucional da Constituição Cidadã (1988). Essa resolução, em seus trezes artigos,
17Câmara
de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação.
58
representou um marco importante nos cursos jurídicos. Observando a obrigatoriedade
de um projeto pedagógico, em que devia constar o perfil do formando, as
competências, habilidades, conteúdos, estágios, atividades complementares e outros
elementos da instituição que se proponha a oferecer os cursos jurídicos (MOSSINI
2010 p. 98).
De acordo com a Resolução n°. 09 de 2004, proferida pela Câmara de
Educação Superior do Conselho Nacional de Educação, vinculada ao Ministério da
Educação, em seu artigo 4°, o curso de graduação em Direito deve revelar as
seguintes habilidades e competências:
I - leitura, compreensão e elaboração de textos, atos e documentos jurídicos
ou normativos, com a devida utilização das normas técnico-jurídicas;
II - interpretação e aplicação do Direito;
III - pesquisa e utilização da legislação, da jurisprudência, da doutrina e de
outras fontes do Direito;
IV - adequada atuação técnico-jurídica, em diferentes instâncias,
administrativas ou judiciais, com a devida utilização de processos, atos e
procedimentos;
V - correta utilização da terminologia jurídica ou da Ciência do Direito;
VI - utilização de raciocínio jurídico, de argumentação, de persuasão e de
reflexão crítica;
VII - julgamento e tomada de decisões; e,
VIII - domínio de tecnologias e métodos para permanente compreensão e
aplicação do Direito (BRASIL, 2004).
Esta previsão de habilidades e competências foi importante, porém como
adverte Zanardi e Zanardi (2013), tal resolução resumia-se ao tecnicismo jurídico,
visto que, não havia expectativa ou compromisso com a transformação da realidade
sócio jurídica. Apesar de na mesma resolução, em seu artigo 3° trazer outro rol de
características necessárias ao graduando, como a prestação da justiça e
desenvolvimento da cidade além de postura crítica e reflexiva (ZANARDI; ZANARDI
2013 p. 1471):
Art. 3º. O curso de graduação em Direito deverá assegurar, no perfil do
graduando, sólida formação geral, humanística e axiológica, capacidade de
análise, domínio de conceitos e da terminologia jurídica, adequada
argumentação, interpretação e valorização dos fenômenos jurídicos e
sociais, aliada a uma postura reflexiva e de visão crítica que fomente a
capacidade e a aptidão para a aprendizagem autônoma e dinâmica,
indispensável ao exercício da Ciência do Direito, da prestação da justiça e do
desenvolvimento da cidadania (MEC, 2004, grifo nosso).
59
Tal artigo ainda que faça referência à formação geral, humanística e
axiológica, da valorização dos fenômenos sociais necessária ao bacharel em Direito
não deixa claro como isso deve se materializar, fazendo com que esse discurso se
dilua na exigência de disciplinas técnicas (como comprovado no próximo artigo
analisado).
O artigo 5º das mesmas Diretrizes Curriculares estabelece disciplinas
obrigatórias em todos os cursos jurídicos brasileiros. Dando continuidade ao caminho
seguido até o momento, tem-se que as disciplinas obrigatórias seriam divididas em
eixos:
Art. 5°. O curso de graduação em Direito deverá contemplar, em seu Projeto
Pedagógico e em sua Organização Curricular, conteúdos e atividades que
atendam aos seguintes eixos interligados de formação:
I - Eixo de Formação Fundamental tem por objetivo integrar o estudante no
campo, estabelecendo as relações do Direito com outras áreas do saber,
abrangendo dentre outros, estudos que envolvam conteúdos essenciais
sobre Antropologia, Ciência Política, Economia, Ética, Filosofia, História,
Psicologia e Sociologia.
II - Eixo de Formação Profissional, abrangendo, além do enfoque dogmático,
o conhecimento e a aplicação, observadas as peculiaridades dos diversos
ramos do Direito, de qualquer natureza, estudados sistematicamente e
contextualizados segundo a evolução da Ciência do Direito e sua aplicação
às mudanças sociais, econômicas, políticas e culturais do Brasil e suas
relações internacionais, incluindo-se necessariamente, dentre outros
condizentes com o projeto pedagógico, conteúdos essenciais sobre Direito
Constitucional, Direito Administrativo, Direito Tributário, Direito Penal, Direito
Civil, Direito Empresarial, Direito do Trabalho, Direito Internacional e Direito
Processual; e
III - Eixo de Formação Prática, objetiva a integração entre a prática e os
conteúdos teóricos desenvolvidos nos demais Eixos, especialmente nas
atividades relacionadas com o Estágio Curricular Supervisionado, Trabalho
de Curso e Atividades Complementares (MEC, 2004).
O Eixo de Formação Fundamental tem por objetivo integrar o estudante no
campo, estabelecendo as relações do Direito com outras áreas do saber, abrangendo
dentre outros, estudos que envolvam conteúdos essenciais sobre Antropologia,
Ciência Política, Economia, Ética, Filosofia, História, Psicologia e Sociologia. Entre o
rol dessas disciplinas que formam esse eixo fundamental, cabe questionar se
realmente é suficiente para a formação fundamental do bacharel apenas essas
disciplinas, não outras, por meio das quais se faria realmente suficiente a formação
humana.
Já o Eixo de Formação Profissional abrange, além do enfoque dogmático, o
conhecimento e a aplicação que são observadas nas peculiaridades dos diversos
ramos do Direito, estudados sistematicamente e contextualizados segundo a
60
evolução da Ciência do Direito e sua aplicação às mudanças sociais,
econômicas, políticas e culturais do Brasil e suas relações internacionais. Inclui-se
aqui, dentre outros condizentes com o projeto pedagógico, conteúdos essenciais
sobre Direito Constitucional, Direito Administrativo, Direito Tributário, Direito Penal,
Direito Civil, Direito Empresarial, Direito do Trabalho, Direito Internacional e Direito
Processual (MEC 2004, grifo nosso).
Nesse artigo questiona-se se disciplinas meramente técnicas (todas
codificadas) são suficientes para formação profissional contextualizada segundo a
evolução do Direito e das mudanças sociais e culturais. Resta claro que não aparecem
como exigência disciplinas condizentes com as lutas dos diferentes segmentos sociais
(negros, indígenas, idosos, direitos humanos).
A partir desse panorama apresentado, a seguir foram comentadas as diferentes
teorias curriculares e tentou-se clarear as escolhas tendenciosas feitas, ao se escolher
como obrigatórios determinados conteúdos e outros os excluindo. Além disso, se falou
da importância da alteridade e do conceito de ecologia dos saberes de Santos (2007).
A figura infra é um esboço de uma linha temporal que pretende explicitar as
diferentes mudanças ocorridas durante o período de criação dos cursos de Direito no
Brasil até a atualidade
Currículo
Único do
Ensino
Jurídico
O currículo
mínimo do
Ensino
Jurídico
Diretrizes
O currículo
O currículo de Currículares
Mínimo
"Conteúdo
Nacionais do
Nacional do
Mínimo do
curso de
ensino
curso jurídico Graduação em
jurídico
Direito
Ano de
aprovação 2004
Ano de 1994
Período 19942010
Período 19721990
Período 19621995
Período 18271961
Figura 1 - As diferentes fases e Transformação histórica do currículo jurídico
no Brasil
Resolução
CNE/CES n.
09
Fonte: Elaborada pela autora
Embora tenham ocorrido progressos ao longo do tempo com relação às
diretrizes do ensino jurídico e a história do ensino jurídico, ficou evidenciado como o
61
ensino jurídico brasileiro sempre teve uma influência econômica muito forte em
detrimento da questão social. Ficou evidente, também, como o currículo expressa os
saberes dominantes, puramente legislados em detrimento dos saberes locais
contextualizados.
Ainda foi possível identificar como é pouco presente ou praticamente ausente
a existência de disciplinas que dialogam com a alteridade e estão preocupadas em
formar os bacharéis para o trato com o “outro”, com a realidade social. O próximo
capítulo continua a pesquisa, agora tentando identificar como fica explicito nas
publicações, nas pesquisas do campo essas preocupações aqui relatadas.
62
4
PANORAMA DA PRODUÇÃO ACADÊMICA – ESTADO DO CONHECIMENTO
“ENSINO JURÍDICO E CURRÍCULO”
O primeiro capítulo deste trabalho se deteve a revisitar a história do ensino
jurídico brasileiro e das diretrizes curriculares e currículo deste mesmo ensino, com
vistas a identificar, com base nos dados históricos, em que medida o mesmo
contribuía para a formação dos bacharéis em direito no que se refere ao trato com a
alteridade. Nesse mesmo capítulo tentou-se desvelar como o currículo se trata se de
uma seleção intencional de saberes específico e como esse exclui outros saberes que
julga em grau de importância inferior. Foi possível apresentar conceitos que serão de
grande valia para o presente capítulo, tais como o conceito de alteridade, outro,
currículo, dogmático, técnico, ecologia dos saberes, que se demonstraram cruciais
para a tessitura dessa proposta de análise.
Dando continuidade ao trabalho, o presente capítulo, baseado na mesma
hipótese anterior (que questiona se o ensino jurídico não contribui ou contribui de
maneira insuficiente na formação dos bacharéis em direito no tocante a compreensão
da alteridade), objetiva avaliar de que maneira isso se explicita na produção
acadêmica, ou mais especificamente, nos artigos publicados no Grupo de Trabalho
“Ensino jurídico e metodologia da pesquisa aplicada ao direito” do Conselho Nacional
de Pesquisa e Pós Graduação em Direito – CONPEDI.
O objetivo da análise é averiguar se essa produção acadêmica problematiza a
questão da alteridade, da crise do ensino jurídico, e dos fatores que representariam
essa crise como excesso de dogmatismo18, tecnicismo, entre outros fatores. Além
disso, se comentam temas como a interdisciplinaridade ou transdisciplinaridade, quais
as referências recorrentes ao trabalhar essas questões e quais questões são
silenciadas do discurso.
Dentre as possibilidades de se justificar a importância e a relevância de se fazer
uma revisão da literatura há uma brilhante passagem que assevera o seguinte:
les chercheurs débutants pensent que le but de la recension des écrits
est de trouver des réponses relativement au sujet de recherche; au
contraire, les chercheurs expérimentés étudient les recherches
18
O dogmatismo pode ser conceituado como uma atitude intelectual que consiste em afirmar de
maneira sentenciosa e peremptória as idéias sem mesmo as apoiar em provas e sem aceitar que elas
se submetam a criticas, a discussão, nem as justificam recorrem ao principio de autoridade. (ZANTEN,
2008, p. 434)
63
antérieures pour développer des questions plus inteligentes et plus
pénétrantes à propos du sujet (YIN, 1994).
Ao se traduzir livremente o escrito acima tem-se que: “os pesquisadores
iniciantes pensam que a finalidade da literatura é de achar as respostas para o sujeito
de pesquisa; ao contrário, os pesquisadores experientes estudam as pesquisas
anteriores para desenvolver as questões mais inteligentes e mais penetrantes a
propósito do sujeito”.
Com base nessa premissa, este capítulo tem por finalidade apresentar uma
revisão sistemática de artigos publicados sobre as temáticas, ensino jurídico e
currículo, entre 2006 e 2014. Para tanto, o estudo se norteou por referências do campo
da educação sobre estado do conhecimento e estado da arte sendo elas Ferreira
(2002), Romanowski (2006); Ens (2006) e referências sobre a análise de conteúdo
como Sabourin in Gauthier (2010).
A revisão da literatura se faz necessária pelo desafio de conhecer o que já foi
construído e produzido, para depois buscar o que ainda não foi feito, de dedicar cada
vez mais atenção a um número considerável de pesquisas realizadas, de dar conta
de determinado saber que se avoluma cada vez mais rapidamente e de divulgá-lo
para a sociedade (FERREIRA, 2002, p. 259). Nesse sentido, aqui será apresentado o
que já foi produzido atrás do levantamento bibliográfico e da avaliação do
conhecimento produzido sobre determinado tema.
De acordo com Soares (1989) citado por Ferreira (2002):
essa compreensão do estado de conhecimento sobre um tema, em
determinado momento, é necessária no processo de evolução da ciência,
afim de que se ordene periodicamente o conjunto de informações e
resultados já obtidos, ordenação que permita indicação das possibilidades de
integração de diferentes perspectivas, aparentemente autônomas, a
identificação de duplicações ou contradições, e a determinação de lacunas e
vieses (SOARES, ANO apud. FERREIRA, 2002, p. 259).
Essa opção metodológica, que parte do princípio do estado da arte torna-se
uma contribuição importante na constituição do campo teórico de uma área de
conhecimento. Procura-se, nesse tocante, identificar os aportes significativos da
construção da teoria, e também, da prática pedagógica. Apontando as restrições
sobre o campo em que se move a pesquisa e as suas lacunas de disseminação,
identificando experiências inovadoras investigadas que apontem alternativas de
64
solução para os problemas da prática e delimitando as contribuições da pesquisa na
constituição de propostas na área focalizada (ROMANOWSKI; ENS, 2006,p. 39).
Essas análises possibilitam examinar as ênfases e temas abordados
nas pesquisas; a relação entre o pesquisador e a prática pedagógica;
as sugestões e proposições apresentadas pelos pesquisadores; as
contribuições da pesquisa para mudança e inovações da prática
pedagógica (idem).
4.1
Trajetória da análise
O presente texto sintetiza e analisa o levantamento dos artigos produzidos no
Grupo de Trabalho (GT) – Ensino Jurídico e Metodologia da Pesquisa Aplicada ao
Direito, do Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Direito (CONPEDI).
O conselho é uma associação de personalidade jurídica de direito privado e sem fins
lucrativos, fundamentalmente voltada para apoiar os estudos jurídicos e o
desenvolvimento da pós-graduação em Direito (CONPEDI, 2015).
Dada a importância desse Conselho no contexto da promoção e divulgação da
produção acadêmica do Direito no Brasil, optou-se por empreender um levantamento
dos artigos publicados no período entre 2006 e 2014. O recorte escolhido justifica-se,
pois, o GT que será analisado foi instituído, somente, no ano de 2006.
O CONPEDI tem como objetivo incentivar os estudos jurídicos de pósgraduação nas diferentes instituições brasileiras de ensino universitário; colaborar na
definição de políticas jurídicas para a formação de pessoal docente da área jurídica,
opinando, junto às autoridades educacionais, sobre os assuntos de interesse da
pesquisa e da pós-graduação em Direito; e defender e promover a qualificação do
ensino jurídico, bem como sua função institucional e seu papel social (CONPEDI,
2015). Desde sua criação, em 17 de outubro de 1989, o CONPEDI organiza e promove
encontros e congressos semestrais sobre ensino e pesquisa jurídica. A partir do
Congresso realizado em Florianópolis em 2004, o CONPEDI passou a publicar os
artigos apresentados pelos professores/pesquisadores e discentes/pesquisadores da
pós-graduação de todo o país (CONPEDI, 2015).
Através do acesso online pelo site do Conselho foi possível realizar o
levantamento de todos os artigos publicados no GT selecionado. Com a intenção
primeira de mapear os artigos produzidos e de discutir a produção acadêmica. Além
de, analisar quais aspectos e dimensões vêm sendo abordados, ou quais estão sendo
65
destacados e privilegiados; e em que condições têm sido produzidos os artigos
publicados. Elegeram-se duas categorias, ou melhor, duas palavras chaves, para
separá-los e possibilitar uma maior problematização das mesmas.
Tais categorias definidas a priori, por organizarem o sentido do discurso, foram:
“currículo19” (s) e “ensino (s) jurídico” (s). Nesse sentido, foram encontrados 346
artigos publicados. Após a organização de todos os artigos divididos por ano de
publicação e separados por eventos, procedeu-se a leitura de cada resumo
observadas as categorias, para criação de dois subgrupos. O primeiro subgrupo
delimitado de trabalhos que discorrem em meio a sua temática sobre ensino jurídico
somou-se 172 artigos. Já o segundo subgrupo sobre currículo soma 21 artigos.
A tabela abaixo mostra os 346 artigos divididos por anos de publicação. Como
pode-se observar os números variam entre 19 e 46, sendo que em 2014 esse valor
praticamente dobra tendo registrado o número de 77 artigos publicados pelo GT.
Tabela 4 - Descrição da quantidade de artigos publicados em cada ano.
Fonte: Elaborada pela autora.
A princípio, o serão analisados os artigos do segundo subgrupo [currículo (s)].
Na sequência, o trabalho voltará às atenções para a maior análise do primeiro
subgrupo (ensino jurídico) que traz um contingente maior de artigos (172 artigos).
Demonstra-se abaixo, de maneira mais didática, como é evidente um aumento
das publicações, e a concentração de artigos que referenciam em seus resumos a
temática sobre ensino jurídico e sobre currículo. Tal constatação pode indicar um
interesse maior nos últimos anos de trato sobre a temática e uma preocupação maior
em se discutir e problematizar o assunto.
19
Os autores dos trabalhos analisados quando fazem referência à categoria currículo em todos os
casos direta ou indiretamente e discutiam temas relacionados ao ensino jurídico. Porém, em alguns
casos a palavra ensino jurídico não estava contemplada nesses resumos dos estudos, o que motivou
a escolha de duas categorias. Mesmo a primeira categoria ao fazer referência ao ensino jurídico
focando em aspectos curriculares, o inverso não acontece necessariamente, pois nos artigos que
tratam sobre ensino jurídico em alguns casos eles desprezam esse aspecto. Ressalta-se, portanto que
os estudos aqui analisados sobre “currículo” são sobre o “currículo jurídico”, ainda que não seja assim
que apareça nos resumos.
66
Gráfico 1 - Estudo dos artigos publicados
Estudo dos artigos PUBLICADOS no CONPEDI
60
400
55
350
50
46
346
42
45
39
40
300
39
250
35
30
27
30
27
200
25
20
19
150
172
15
100
10
50
5
21
0
2006
2007
2008
2009
2010
Ensino Jurídico
2011
Total
2012
Currículo
2013
2014
Total
Ensino
Jurídico
0
Currículo
Artigos publicados
Fonte: Elaborado pela autora.
Continuando a tratar sobre os caminhos percorridos para a revisão
sistemática, a seguir ilustra-se na Figura 1, um esquema produzido para explicitar os
como se deu a análise e o levantamento dos artigos demonstrando o número dos
artigos analisados, divididos em seu subgrupo.
67
Figura 2- Processo de seleção dos artigos publicados sobre Ensino Jurídico e
Currículo da Base de Dados do CONPEDI
1 ª fase: leitura dos títulos
346 artigos encontrados
2 artigos completos não
foram encontrado
21 artigos sobre
currículo (s),a partir da
leitura dos resumos
2 ª fase: leitura dos resumos
3 ª fase: leitura na íntegra
172 artigos sobre
Ensino Jurídico a
partir da leitura dos
resumos
21 artigos selecionados
para leitura na íntegra
4 artigos após leitura na
íntegra, apenas citam a
temática entre as palavras
chave e não aprofundam
17 artigos atenderam
aos critérios de inclusão
17 artigos incluídos
nesta revisão
Fonte: Elaborada pela autora
68
4.2
Análise dos artigos: Categoria Currículo
Para análise dos artigos desse subgrupo, pretendeu-se observar alguns
aspectos
como:
tratando-se
da
temática
currículo
quais
as
abordagens
metodológicas; e quais as críticas fomentadas. Outra questão precipuamente
observada foi se os artigos discorrem sobre a alteridade e a interdisciplinaridade como
uma questão positiva para o ensino jurídico. Abaixo se ilustram todos os artigos que
foram lidos na íntegra e analisados.
69
Tabela 5- Relação de artigos analisados sobre currículo de acordo com os
autores, ano e metodologia.
Autor e ano
Título
FERREIRA; ANDRADE, 2006
A TRANSVERSALIZAÇÃO DA ÉTICA NOS CURSOS JURÍDICOS
Metodologia
DOCUMENTAL E
BIBLIOGRÁFICO
RODRIGUEZ, 2007
A GESTÃO DA ONIPOTÊNCIA: ENSINAR DIREITO A
INICIANTES
ESTUDO DE CASO
BONFIM, 2008
BACELAR, 2009
SANCHES; PEREIRA, 2009
ROSA CASTRO; MARTINS, 2010
POR UMA PROPOSTA DE METODOLOGIA DO ENSINO DO
DIREITO PENAL BRASILEIRO NO SÉCULO XXI.
DOCUMENTAL E
BIBLIOGRÁFICO
SABERES DAS DISCIPLINAS E SABERES PEDAGÓGICOS: OS
DESAFIOS DO ENSINO DA HISTÓRIA DO DIREITO
BIBLIOGRÁFICO E
DOCUMENTAL
O ENSINO DOGMÁTICO DO DIREITO COMO ELEMENTO
LIMITADOR À UNIVERSALIZAÇÃO DO ACESSO À JUSTIÇA
PARADIGMAS CURRICULARES PARA A CONSTRUÇÃO DO
PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO DOS CURSOS DE
DIREITO: EDUCAÇÃO PARA A CIDADANIA,
RESPONSABILIDADE SOCIAL E DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL
DOCUMENTAL E
BIBLIOGRÁFICO
DOCUMENTAL E
BIBLIOGRÁFICO
OLIVEIRA, 2010
A PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM DIREITO NO
BRASIL: UM OLHAR SOBRE AS DISCIPLINAS PEDAGÓGICAS
OFERECIDAS EM SEUS PROGRAMAS
MUSSE, 2011
A UTILIZAÇÃO DO PORTFÓLIO EM CURSOS JURÍDICOS
COMO INSTRUMENTO DE ENSINO E AVALIAÇÃO DAS
ATIVIDADES
COMPLEMENTARES
DOCUMENTAL E
BIBLIOGRÁFICO
MAILLART; NASPOLINI SANCHES,
2011
CRÍTICAS AO
ENSINO JURÌDICO BRASILEIRO: ASPECTOS
EPISTEMOLÓGICOS, FUNCIONAIS E
OPERACIONAIS
DOCUMENTAL E
BIBLIOGRÁFICO
PEREIRA, 2011
O NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA NO CURRÍCULO
DO CURSO DE DIREITO PARA O FORTALECIMENTO DO
ACESSO AO JUDICIÁRIO
NA FORMAÇÃO DO BACHAREL EM DIREITO
DOCUMENTAL E
BIBLIOGRÁFICO
ESTUDO DE CASO
70
:
Autor e ano
ALVES NETO, 2011
DIAS, 2012
Título
Metodologia
DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS E O
CURRÍCULO DO CURSO DE DIREITO DA UFAC: PERCEPÇÃO
DE DOCENTES E
DISCENTES
ESTUDO DE CASO
CURRÍCULO DE INTEGRAÇÃO E EDUCAÇÃO
EMANCIPADORA: REFLETINDO SOBRE O ENSINO JURÍDICO
ESTUDO DE CASO
SALES; BARBOSA, 2012
ENSINO JURÍDICO EM CRISE: ANÁLISE DA
MERCANTILIZAÇÃO DO ENSINO E DOS CURRÍCULOS
JURÍDICOS NO BRASIL
LOUREIRO; CHOUKR, 2013
ENSINO JURÍDICO, CRÍTICAS E NOVAS PROPOSTAS:
PAISAGEM NO HORIZONTE?
LEITE; DIAS, 2013
IMAGENS DA JUSTIÇA E EDUCAÇÃO JURÍDICA NA
CONTEMPORANEIDADE
DOCUMENTAL E
BIBLIOGRÁFICO
DOCUMENTAL E
BIBLIOGRÁFICO
ESTUDO DE CASO
AMORIM ; SAMPAIO, 2013
O CURRÍCULO JURÍDICO E A EFETIVAÇÃO DO DIREITO AO
ACESSO À JUSTIÇA
DIAS; 2014
ACESSO À JUSTIÇA E EDUCAÇÃO JURÍDICA: UMA
PERCEPÇÃO IMAGÉTICA DO DIREITO
LEÃO; CARVALHO, 2014
ANÁLISE DO CURRÍCULO DA ÁREA DE CONCENTRAÇÃO EM
DIREITOS HUMANOS: TENSÕES E DESAFIOS DA PÓSGRADUAÇÃO EM DIREITO NA USP, UFPA E UFPB
DOCUMENTAL E
BIBLIOGRÁFICO
DOCUMENTAL E
BIBLIOGRÁFICO
ESTUDO DE CASO
POMPEU; MARTINS, 2014
EDUCAÇÃO JURÍDICA E IGUALDADE MATERIAL: ESTUDO DA
CLÍNICA JURÍDICA DO CURSO DE DIREITO DA
UNIVERSIDADE DE FORTALEZA E SUA REPERCUSSÃO NO
CONTEXTO DO CRESCIMENTO ECONÔMICO E DO
DESENVOLVIMENTO HUMANO.
ESTUDO DE CASO
O MODELO DO PROCESSO DE BOLONHA COMO FUTURO
POSSÍVEL PARA OS CURSOS DE DIREITO DO BRASIL
CARNEIRO, 2014
ROSA; SILVA, 2014
DOCUMENTAL E
BIBLIOGRÁFICO
OS DESAFIOS DO ENSINO JURÍDICO BRASILEIRO:
CURRÍCULOS TRANSDISCIPLINARES PARA SE ADEQUAREM
DOCUMENTAL E
AO MUNDO CONTEMPORÂNEO
BIBLIOGRÁFICO
Fonte: Elaborada pela autora.
4.2.1
Artigos excluídos da Amostra
Após a leitura de todos os artigos selecionados, percebeu-se que três artigos
apenas citavam a palavra currículo sem aprofundar a temática: Rodriguez (2007);
Musse (2011); Loureiro e Choukr, (2013). Um tratava do currículo da pós-graduação:
Oliveira (2010).
71
Para exemplificar, no estudo de caso realizado por Rodrigues (2007), o autor
tenta refletir sobre seus primeiros anos de experiência docente (2002-2007) em cinco
instituições diferentes. Procura dar forma à sua percepção da agressividade dos
alunos no processo de aprendizado do Direito. Especialmente quando se trata de
alunos iniciantes, houve muita resistência e insegurança nas disciplinas que ministrou
o que o levou a procurar referências que permitissem formular o problema e buscar
meios para lidar.
Loureiro e Choukr (2013) colocam a palavra currículo entre as palavras chave,
mas focam em aspectos da avaliação no Ensino Jurídico, igualmente compreendida
na sua acepção mais abrangente, mesmo que sem adentrar ao problema da avaliação
institucional dos cursos de Direito. Por derradeiro, delineia-se uma proposta brasileira
e duas propostas anglo-saxônicas para o Ensino Jurídico, indagando-se até que ponto
estas duas últimas podem ser úteis ao caso brasileiro.
Oliveira (2010) trata sobre currículos da pós-graduação stricto sensu e do papel
fundamental que a mesma possui na formação para a docência e para a pesquisa.
Procedeu a partir dos dados disponibilizados de cada programa de pós-graduação em
Direito no país, no site da CAPES, a relação das disciplinas contempladas em seu
currículo. Diante desta relação, este estudo procurou as disciplinas relacionadas com
área pedagógica em cada um dos 62programas que disponibilizaram seus dados.
Conclui-se nos artigos supracitados que mesmo contendo as palavras-chaves
procuradas, eles não contribuem de forma significativa para a pesquisa.
Quais sejam as pesquisas:
Tabela 6 - Demonstrativo dos artigos analisados de acordo com os autores e o
ano
Autores e ano
RODRIGUEZ, 2007
Artigos Analisados
A GESTÃO DA ONIPOTÊNCIA: ENSINAR DIREITO A INICIANTES
A PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM DIREITO NO BRASIL: UM
OLIVEIRA, 2010
OLHAR SOBRE AS DISCIPLINAS PEDAGÓGICAS OFERECIDAS EM
SEUS PROGRAMAS
LOUREIRO;
2013
CHOUKR, ENSINO JURÍDICO, CRÍTICAS E NOVAS PROPOSTAS: PAISAGEM
NO HORIZONTE?
72
A
MUSSE, 2011
UTILIZAÇÃO
DO
PORTFÓLIO
EM
CURSOS
JURÍDICOS
COMO INSTRUMENTO DE ENSINO E AVALIAÇÃO DAS ATIVIDADES
COMPLEMENTARES
Fonte: Elaborado pela autora.
4.2.2
O Currículo jurídico a partir da análise de algumas disciplinas
eleitas pelos autores dos artigos
Serão analisados, nesse tópico, os artigos selecionados para esta pesquisa.
Dos 21 artigos encontrados foram analisados na íntegra 17, que seguiam os critérios
pré-selecionados.
Dentre os 17 artigos analisados, cinco artigos trataram da questão do currículo
relacionando-o à inclusão, à prática, aos desafios e aos percalços de algumas
disciplinas específicas do currículo do ensino jurídico, Ferreira, Andrade (2006);
Bonfim (2008); Bacelar (2009); Pereira (2011); e Pompeu, Martins(2014).
O primeiro artigo que enfrenta a temática intitula-se “Atransversalização da
ética nos cursos jurídicos” (FERREIRA; ANDRADE, 2006). Neste trabalho, os autores
buscaram pelo enfoque no histórico dos cursos de Direito no Brasil, especificamente
quanto à previsão de uma disciplina que trata da Ética. O intuito era analisar se o
ensino jurídico forma profissionais que tenham suas atividades pautadas em valores
éticos, conforme a previsão da Resolução 09/04.
Segundo pesquisado por eles o ensino jurídico somente abriu-se à inclusão
da Ética como disciplina obrigatória em seus cursos no ano de 1996, com a edição da
portaria ministerial 1886/96, que fixou o currículo mínimo nacional do curso jurídico.
Dessa forma, o ensino da Ética foi incluído no rol das matérias fundamentais, sendo
dividida em Ética Geral e Ética Profissional. Entretanto, a apresentação da referida
disciplina não se mostrou como um avanço para o ensino jurídico. Essa matéria fora
ministrada apenas conforme normas técnicas e códigos de Ética do Advogado, ou
melhor, aprisionada numa única disciplina, não permeando todo o curso jurídico.
Assim, a proposta apresentada, baseia-se na transversalização do ensino da
ética. Ou seja, na sua aplicação em todas as disciplinas constantes do currículo
jurídico, dada a impossibilidade de se pensar em qualquer área do Direito
descontextualizada de valores éticos, pois o seu exercício já supõe, a priori, um valor,
que é o da justiça (FERREIRA, ANDRADE, 2006).
73
Bonfim (2008) traz uma proposta de metodologia do ensino do Direito Penal
brasileiro no século XXI. No artigo o autor discorre a respeito da metodologia e método
a serem utilizados no ensino do direito penal pós-moderno. Bonfim indica haver uma
defasagem do currículo do direito penal nas Faculdades de Direito. Afirma que o
Ensino Jurídico enfrenta uma crise e discorre sobre três pontos nos quais acredita
haver uma crise. No concernente à metodologia, esta estaria relacionada com a,
falência do método clássico de ensino, que padece de muitas anomalias.
Bacelar (2009) aborda questões relativas à formação e aos saberes
necessários para a docência de conteúdos não-jurídicos e/ou de disciplinas não
essencialmente jurídicas no Curso de Direito. O autor teve como fundamento as
exigências trazidas pela Resolução09/2004, do Conselho Nacional de Educação, que
instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Direito. Opta
por analisar a forma como o currículo para o Curso de Direito se relacionou com a
disciplina História do Direito, ou similar, percorrendo por meio desse recorte a história
dos currículos jurídicos no Brasil. Reflete sobre os saberes docentes necessários, das
disciplinas e pedagógicos, para se alcançar os objetivos dos processos de ensino e
aprendizagem. Bacelar, ainda, apresenta desafios para o ensino da História do Direito,
como ensino de História e propõe algumas iniciativas que podem colaborar para a
superação das deficiências no que concerne aos saberes pedagógicos dos docentes
em Direito.
Dentre as pertinências do trabalho de Bacelar (2009), destaca-se o fato de
alertar que pela Resolução n° 9, de 29 de setembro de 2004, emanada do Conselho
Nacional de Educação – CNE, faz–se presente o caráter da formação oferecida na
graduação jurídica que deve estar permeado de interdisciplinaridade, especialmente
(não exclusivamente) por meio do Eixo de Formação Fundamental, constante da
organização curricular dos cursos. A interdisciplinaridade não é construída apenas,
como pensam alguns, com a inter-relação que se deve estabelecer entre as diversas
disciplinas jurídicas. Vai para além disto, ao interligar e relacionar o Direito com outras
áreas do saber, com destaque para Antropologia, Ciência Política, Economia, Ética,
Filosofia, História, Psicologia e Sociologia. Mas não proposta de interdisciplinaridade,
mas de compreensão de eixo de formação fundação.
Pereira (2011) e Pompeu e Martins (2014) analisaram a questão da clínica
jurídica, ou núcleo de prática jurídica (PEREIRA 2011), no currículo do ensino jurídico.
Os trabalhos comentam as modificações trazidas pela portaria 1889/2004 no tocante
74
ao Núcleo de Prática Jurídica das Universidades. Além da mudança impressa no
currículo
dos
cursos
jurídicos,
decorrentes,
das
reformas
resultantes
da
operacionalização da portaria. Os autores, relatam que estas trouxeram impactos
significativos na formação do bacharel em Direito, considerando a pertinência do
fortalecimento da dimensão social, ética e política na construção de possibilidades de
superação do modelo social excludente e limitador do acesso a Justiça.
Para Pompeu e Martins (2014), o impacto foi similar ao concluir que a clínica
jurídica dos Cursos de Direito e sua repercussão na compatibilização entre
crescimento econômico e desenvolvimento humano, garantiu a aplicação imediata e
a exigibilidade judicial dos direitos fundamentais, inclusive do direito à educação e do
acesso à justiça.
A tabela 7 abaixo explicita de acordo com o ano, os autores e o título de cada
trabalho acima analisado.
Tabela 7 - Demonstrativo dos artigos analisados sob o viés das disciplinas
Autores e ano
FERREIRA;
ANDRADE (2006)
BONFIM (2008)
BACELAR (2009)
PEREIRA (2011)
Artigos analisados
A TRANSVERSALIZAÇÃO DA ÉTICA NOS CURSOS JURÍDICOS
POR UMA PROPOSTA DE METODOLOGIA DO ENSINO DO
DIREITO PENAL BRASILEIRO NO SÉCULO XXI.
SABERES DAS DISCIPLINAS E SABERES PEDAGÓGICOS: OS
DESAFIOS DO ENSINO DA HISTÓRIA DO DIREITO
O NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA NO CURRÍCULO DO CURSO
DE DIREITO PARA O FORTALECIMENTO DO ACESSO AO
JUDICIÁRIO NA FORMAÇÃO DO BACHAREL EM DIREITO
EDUCAÇÃO JURÍDICA E IGUALDADE MATERIAL: ESTUDO DA
CLÍNICA JURÍDICA DO CURSO DE DIREITO DA UNIVERSIDADE
DE FORTALEZA E SUA REPERCUSSÃO NO CONTEXTO DO
POMPEU; MARTINS CRESCIMENTO ECONÔMICO E DO DESENVOLVIMENTO
(2014)
HUMANO.
Fonte: Elaborada pela autora
Em resumo, dos artigos apresentados, observou-se que a problemática
apresentada em relação ao currículo do ensino jurídico percorre por base nas
disciplinas. Os artigos discutem, prioritariamente, quais disciplinas poderiam contribuir
para a formação do discente. Ferreira e Andrade (2006) trataram disso ao
problematizar a ética. Bonfim (2008) na metodologia do Direito Penal. Bacelar (2009)
na história do direito. Por fim, Pereira (2011) e Pompeu e Martins (2014), os dois
75
trabalhos centraram na clínica jurídica e sua repercussão no contexto social e
econômico e no fortalecimento do acesso ao judiciário. Nenhum dos trabalhos
problematizou a questão da alteridade e, também, não discutiram como o direito e as
vozes dos subalternizados se fazem presentes neste currículo (objetivo precípuo
desse trabalho).
4.2.3
O currículo jurídico e os estudos das imagens
Dois artigos revisados tratam de temáticas correlatas: Leite e Dias (2013) e
Dias (2014). A correlação se dá, pois, os autores utilizam, em seus estudos, imagens
como metodologia de análise do ensino jurídico.
Em Leite e Dias (2013) está presente a investigação de abordagem qualitativa
que problematiza a educação jurídica, o currículo do curso de Direito e a pedagogia
jurídica. Utilizando a interpretação de imagens como referencial teórico-metodológico,
com ênfase no Método Documentário de Ralf Bohnsack. Os autores convidam
acadêmicos iniciantes no direito a descrever/desenhar imagens da justiça e, logo a
seguir, remeter um significado ou uma palavra que a represente. Pretenderam, com
isso, questionar como estes estudantes visualizavam a justiça.
Em seguida, quando analisam as imagens elaboradas através de uma
interação de base etnográfica, potencializam-se as relações entre sujeitos e entre
suas representações de mundo. Produz-se, desta forma, conhecimento sobre o outro
e sobre si mesmo, e, sobretudo, reflexiona-se sobre a justiça
O estudo chamou atenção por utilizar-se de uma teoria curricular crítica, para
analisar os conteúdos curriculares desenvolvidos no primeiro ano do ensino jurídico,
que possibilitam desenvolver o senso humanista, crítico e reflexivo que enxerga
na/pela justiça um lócus de transformação social. Ao citar Bernstein (ANO) para
afirmar que atualmente, modelos de currículo que operacionalizam os conhecimentos
de modo interdisciplinar e integrador são experimentados com sucesso em outras
áreas do saber.
Dias (2014) escreve sobre "Educação jurídica", a partir de imagens fotográficas
como potencial reflexivo para o campo do direito e acesso à justiça. Este artigo
problematiza o acesso a justiça com base na análise de imagem fotográfica elaborada
por um acadêmico do Curso de Direito. Trata-se de uma pesquisa de cunho qualitativo
76
e exploratório, recorte de uma investigação de doutoramento, que trata sobre o
currículo e a educação jurídica.
Assim como os artigos anteriores, os artigos também não discutem a questão
do currículo sobre a perspectiva da alteridade. Ainda que um deles (Leite e Dias, 2013)
se refira a uma das teorias críticas do currículo, não a trata pelo viés que é aqui
explorado.
A tabela 8 abaixo elenca resumidamente os artigos, autores e ano de
publicação de cada um.
Tabela 8 - Artigos Analisados
Artigos analisados
Autores e ano
IMAGENS DA JUSTIÇA E EDUCAÇÃO JURÍDICA NA
CONTEMPORANEIDADE
ACESSO
À JUSTIÇA E EDUCAÇÃO
JURÍDICA: UMA
PERCEPÇÃO IMAGÉTICA DO DIREITO
LEITE; DIAS, 2013
DIAS; 2014
Fonte: Elaborada pela autora
4.2.4
Contribuições e pertinências ao estudo
Em uma grade composta por onze artigos, alguns fatores merecem destaque,
pois, repetiam em suas abordagens praticamente as mesmas críticas à formação do
currículo e do ensino jurídico. Dentre essas críticas pode-se citar: o excesso de
positivismo e dogmatismo no currículo, preponderantemente externalizado pelas
disciplinas codificadas. Há ausência de adequação e insuficiência no atendimento às
necessidades sociais do mundo contemporâneo. O currículo tem priorizado a
pedagogia da transmissão. Dentre alguns autores que escrevem sobre a temática,
pode-se citar: Sanches e Pereira (2009); Rosa e Silva (2014); Maillart e Naspolini
Sanches (2011); Dias (2012); Alves Neto (2011), dentre outros.
A tabela abaixo demonstra os artigos analisados, os nomes dos
autores e o ano de cada publicação:
77
Tabela 9 - Descritivo dos artigos/ por autores e ano das publicações
Autores e Ano Publicação
Nome dos artigos
SANCHES; PEREIRA (2009)
O ENSINO DOGMÁTICO DO DIREITO COMO ELEMENTO LIMITADOR
À UNIVERSALIZAÇÃO DO ACESSO À JUSTIÇA
ROSA CASTRO; MARTINS (2010)
PARADIGMAS CURRICULARES PARA A CONSTRUÇÃO DO
PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO DOS CURSOS DE DIREITO:
EDUCAÇÃO PARA A CIDADANIA, RESPONSABILIDADE SOCIAL E
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
MAILLART; NASPOLINI SANCHES
(2011)
CRÍTICAS AO ENSINO JURÌDICO BRASILEIRO: ASPECTOS
EPISTEMOLÓGICOS, FUNCIONAIS E OPERACIONAIS
ALVES NETO (2011)
DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS E O CURRÍCULO DO
CURSO DE DIREITO DA UFAC: PERCEPÇÃO DE DOCENTES E
DISCENTES
DIAS (2012)
CURRÍCULO DE INTEGRAÇÃO E EDUCAÇÃO EMANCIPADORA:
REFLETINDO SOBRE O ENSINO JURÍDICO
SALES; BARBOSA (2012)
ENSINO JURÍDICO EM CRISE: ANÁLISE DA MERCANTILIZAÇÃO DO
ENSINO E DOS CURRÍCULOS JURÍDICOS NO BRASIL
AMORIM ; SAMPAIO (2013)
O CURRÍCULO JURÍDICO E A EFETIVAÇÃO DO DIREITO AO
ACESSO À JUSTIÇA
LEÃO; CARVALHO (2014)
ANÁLISE DO CURRÍCULO DA ÁREA DE CONCENTRAÇÃO EM
DIREITOS HUMANOS: TENSÕES E DESAFIOS DA PÓSGRADUAÇÃO EM DIREITO NA USP, UFPA E UFPB
CARNEIRO (2014)
O MODELO DO PROCESSO DE BOLONHA COMO FUTURO
POSSÍVEL PARA OS CURSOS DE DIREITO DO BRASIL
ROSA; SILVA (2014)
OS DESAFIOS DO ENSINO JURÍDICO BRASILEIRO: CURRÍCULOS
TRANSDISCIPLINARES PARA SE ADEQUAREM AO MUNDO
CONTEMPORÂNEO
Fonte: Elaborada pela autora
Sanches e Pereira (2009) relatam que o ensino jurídico, estruturado sob o
molde positivista e conservador, impede a materialização do acesso à Justiça para
todos. Pois, o objetivo central da formação do bacharel em Direito, segundo os
autores, é a aplicabilidade da norma destituída da reflexão acerca da desigualdade.
Ressaltam, também, que este pensamento, que caracteriza o ensino positivista, se
faz presente no currículo do Curso de Direito, esvaziando a reflexão social da
massificação do acesso à Justiça. O dogmatismo jurídico, ao se estabelecer no âmbito
forense se espraiou na academia, resultando numa formação desprovida de sentido
e representação.
Sob este viés Maillart e Naspolini Sanches (2011) fazem críticas dirigidas ao
Ensino Jurídico brasileiro, tendo por base autores que se ocupam do tema. Com o
78
objetivo de responder quais são essas críticas, eles as dividem em 3: questões
estruturais, questões funcionais e questões operacionais. Serão destacadas, no
âmbito da estrutura, críticas ao paradigma epistemológico. No âmbito funcional,
críticas à formação para o mercado de trabalho que levam a problemas de identidade
e legitimidade dos bacharéis. Por fim, no âmbito operacional as críticas serão dirigidas
às formas administrativas do ensino, a metodologia didático-pedagógica e ao
currículo dos cursos.
De acordo com esses autores, os currículos são em geral, compostos
preponderantemente de matérias codificadas, ou seja, dogmáticas. Maillart e
Naspolini citam Rodrigues (1993) para afirmarem que o currículo é normalmente fixo
ou pouco flexível, deixando nenhum ou pouco espaço para a busca de formação
autonomamente pelo aluno.
Ao discutirem a necessidade de uma reconfiguração dos currículos jurídicos,
Rosa e Silva (2014), comentam que esta é uma medida necessária para que os
egressos do curso de direito estejam preparados para atuar e transformar a realidade
social que os circunda, no qual a transdisciplinaridade assume papel relevante na
construção de uma metodologia que atenda aos pressupostos do paradigma
emergente.
Alves Neto (2011) estuda as Diretrizes Curriculares Nacionais e o currículo do
curso de Direito da Universidade Federal do Acre. O autor avalia a percepção de
docentes e discentes sobre esse curso. Apresente pesquisa teve por objetivo
averiguar em que medida o saber jurídico, proporcionado à formação do bacharel em
direito, tem sido orientado por uma perspectiva dialética e crítica, que permita uma
formação mais comprometida com a realidade do Estado, com um ensino jurídico
defensor de um direito emancipatório e de realização dos fins sociais do ordenamento
jurídico e para uma sociedade mais humana e solidária (ALVES NETO, 20011 p.01).
Alves Neto (2011) aponta como pontos nevrálgicos que o currículo do curso
ainda se reveste de uma concepção positivista, de um currículo fragmentado quanto
aos eixos de formação e carece de um ensino de direito e saber jurídico mais voltado
para a realidade amazônica, com toda a sua biodiversidade, carecedora de ser
contemplada na formalização e práxis curricular (idem).
No artigo intitulado “Currículo de integração e educação emancipadora:
refletindo sobre o ensino jurídico no Brasil”, Dias (2012), pretende, problematizar o
Projeto Político Pedagógico de organização de um Curso de Direito da Região sul do
79
Brasil. Especificamente em atenção ao eixo de formação prática e sua integração
curricular com os demais eixos, na perspectiva de buscar uma educação
emancipadora em prol da formação de um bacharel crítico, reflexivo e agente de
transformação social. Para tal, se utiliza de alguns referenciais da sociologia da
educação, em especial os estudos e pesquisas desenvolvidos no campo pedagógico
por Basil Bernstein (DIAS, 2012 p.01).
Além de teorias que podem subsidiar uma proposta de integração curricular
que viabilize uma educação emancipadora na perspectiva do ensino jurídico, discute
os modos de gestão democrática, o currículo e as práticas pedagógicas em escolas
públicas. O autor argumenta que aspectos relacionados a forma, aos conteúdos, ao
acesso e as oportunidades da educação trazem consequências, e, entre outros
aspectos, podem enfatizar ou comprometer possibilidades de afirmação, motivação e
imaginação.
Desta forma,
a educação emancipadora para o autor (e a integração curricular) não se
opera de maneira simples e rápida, pois para sua conformação há
necessidade de se contrapor ao modelo hegemônico um modelo contrahegemônico (ou emergente) e ainda cita Henry Giroux (2005) (DIAS, 2012 p.
03).
Concluindo, Dias (2012) dispõe que
os cidadãos de uma democracia global devem estar conscientes da natureza
interativa de todos os aspectos da vida cultural, espiritual e física. Isto
significa ter um entendimento profundo da natureza relacional das
dependências globais, quer falemos da ecosfera ou dos circuitos do capital.
Em segundo lugar, os cidadãos devem ter uma cultura multifacetada, de um
modo que não só lhes dê acesso às novas tecnologias da informação (DIAS,
2012).
Sales e Barbosa (2012) discutem a questão dos currículos jurídicos, a fim de
que seja verificado se estes atendem às necessidades sociais do mundo
contemporâneo, contemplando a importância da interdisciplinaridade, da reflexão
crítica e da interpretação além da visão positivista e estática do Direito. Assim, os
autores estudaram a evolução da grade curricular dos cursos de Direito. Os autores
citam o professor Álvaro Melo Filho (1992), na passagem em que este diz que: “o
currículo deve ser vislumbrado não como um simples elenco ou aglutinação de
disciplinas, mas como um processo integrado e dinâmico, em permanente avaliação,
80
o qual se concretiza em atos, na sala de aula e na vida dos alunos. ” (MELO FILHO
(1992 apud SALES e BARBOSA,2012, p.06).
Rosa Castro e Martins (2010) fizeram uma análise do perfil atual da educação
jurídica, frente a tantas mudanças decorrentes da evolução social. No estudo
apresentaram o perfil do estudante de Direito, enfatizando sua relação com as novas
mídias, além de observar a importância da utilização de tecnologias virtuais na
educação jurídica. Assim sendo, apresentaram uma crítica à metodologia tradicional,
“Pedagogia da Transmissão”, marcada pela exposição descritiva de conteúdos
utilizada pela maioria dos professores das ciências jurídicas, que atualmente ainda é
pautada pelo formalismo no ensino.
No trabalho intitulado: “Currículo jurídico e a efetivação do direito ao acesso à
justiça”, de Amorim e Sampaio (2013), os autores tratam sobre a formação acadêmica
dos aplicadores do Direito na efetivação do acesso à justiça. O enfoque foi na atuação
estatal de controle e fiscalização da qualidade do ensino jurídico, em especial por meio
do currículo jurídico e das diretrizes curriculares. Analisou-se o perfil do graduando
estabelecido na Resolução do Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação
Superior nº 9 de 29 de setembro de 2004, que institui as diretrizes curriculares
nacionais dos cursos de graduação em Direito. O objetivo era identificar
características essenciais para atingir esse perfil, fazendo-se um cotejo com a
relevância de cada uma delas na concretização do direito de acesso a uma ordem
jurídica justa.
Amorim e Sampaio (2013) discutiram sobre o termo “currilucum”, e para tanto
se utilizaram da definição de Mossini (2010). De acordo com este autor, o termo
significa caminho, trajeto, percurso e foi aplicado pela primeira vez nos meios
educacionais no século XVI, porém seu significado foi se alterando ao longo do tempo.
Mossini (2010) ainda esclarece que o conceito – de concepção etimológica restrita –
que entendia o currículo apenas como um plano de instrução, modificou-se para
apresentar atualmente uma concepção mais aberta de projeto de formação, que
considera o contexto de uma referida organização educacional, enquanto projeto e
finalidade de escolarização.
Assim, os autores realizaram uma breve abordagem histórica dos currículos
jurídicos no Brasil. Abordam ainda o atual momento histórico e possíveis soluções
para uma formação engajada com a realidade social, que possibilite, de maneira
efetiva e adequada, a implementação do direito ao acesso à justiça.
81
Carneiro (2014) tratou da disciplina legal atualmente vigente, centrada
principalmente na Resolução CNE/CES nº 9/2004. Ao final, especulou acerca das
possíveis transformações que a adoção do modelo do Processo de Bolonha (1999),
em curso na Europa, causaria na estruturação dos cursos de Direito de nosso país. O
objetivo do trabalho, como o próprio nome já diz, foi suscitar reflexões acerca do porvir
do ensino jurídico nacional, e acrescentar algo à discussão acerca da possibilidade
de superação do modelo de curso de Direito tradicionalmente adotado no Brasil.
Leão e Carvalho (2014) trataram sobre os currículos da pós-graduação de três
Universidade, avaliando principalmente o currículo da disciplina de Direitos Humanos.
Sabendo que o objetivo precípuo dessa revisão foi identificar se as
publicações sobre o currículo do ensino jurídico, questionam, ou trazem contribuições
sobre a formação do bacharel em direito no que concerne a alteridade. Foi possível
identificar que apesar dos artigos dessa revisão trazerem aspectos em comum sobre
a crise do ensino jurídico brasileiro e abordagens sobre o currículo, a princípio nenhum
deles explorou a questão da alteridade no currículo ou a ecologia dos saberes como
formas de contribuir positivamente para a formação dos bacharéis em Direito.
No entanto, relatam problemas do ensino jurídico e compartilham críticas em
comum. Críticas que se repetem entre eles, por exemplo, podemos citar: a impetuosa
crise que assola o ensino jurídico, um dos autores se ocupa ainda em descrever a
crise que seria de cunho, estruturais quanto as questões funcionais e operacionais;
funciona, no âmbito às formas administrativas do ensino; e, didática pedagógicas e ao
currículo dos cursos (MAILLART e NASPOLINI SANCHES, 2011).
No que tange ao currículo, os autores concordam que em geral é composto
de matérias codificadas, dogmáticas. Normalmente é fixo ou pouco flexível, deixando
pouco espaço para a busca de formação autônoma para o aluno. Poucos artigos
utilizaram as teorias críticas para confrontar a temática curricular, Dias (2012) citou
Basil Bernstein e Rosa Castro e Martins (2010) que apresentaram críticas a pedagogia
da “transmissão” fazendo uma referência indireta aos estudos de Freire.
Dentre as contribuições para este estudo, os autores trazem aportes para
sustentar outras possibilidades para a mudança de paradigma do ensino jurídico
como: um ensino jurídico emancipatório (DIAS, 2012; ALVES NETO, 2011), do valor
da interdisciplinaridade, e da reflexão crítica e interpretação que vá além da visão
positivista e estática do Direito (SALES e BARBOSA, 2012).
82
4.3
O Ensino Jurídico nos artigos publicados no CONPEDI
Para dar continuidade a revisão dos artigos da primeira categoria, ensino
jurídico, optou-se por comentar um artigo que durante o processo de análise mostrouse interessante e com argumentos que agregaram sentido e corroboram com a
proposta do trabalho.
O artigo intitula-se “Desconstruindo o discurso acadêmico-jurídico moderno:
complexidade, imprevisibilidade e possibilidades práticas no ensino do direito”, Ana
Clara Correa Henning e Marcia Teixeira Antunes (2014). Para as autoras:
o pensamento preponderante em nossas academias jurídicas possui
características bem marcadas: dogmatismo, abstração da realidade,
reducionismo, centralidade do poder docente, dentre outras. Germinado pela
revolução científica do século XVI, desenhado pelo movimento iluminista do
século XVIII, permanece fundamentando o ensino brasileiro contemporâneo.
Essa opção se coaduna com a estruturação do próprio direito ocidental, em
sua busca pela certeza e redução da complexidade através da aplicação
asséptica da norma. A constituição de ambos os campos – o direito e seu
ensino – sofreu, ainda, com a deslegitimação de saberes locais preteridos
pelo saber do colonizador português. O choque cultural que presenciamos
nos move a desconstruir essa perspectiva, através de propostas pedagógicas
que assumam a complexidade e a imprevisibilidade cotidianas, ultrapassando
uma percepção determinista da realidade, e que deem voz às comunidades
locais e características não-eurocêntricas de nossa sociedade. Analisa-se, ao
final deste texto, práticas efetivadas em um curso de direito do sul do Brasil
que conjugam aspectos interdisciplinares e os conectam a descolonização do
pensamento acadêmico. (HENNING; ANTUNES, 2014, p.01)
Henning e Antunes (2014) elucidam alguns aspectos que foram considerados
cruciais para a revisão dos trabalhos. Elas abordam conceitos que foram elencados
como chave para orientar a pesquisa, dentre esses aspectos podemos citar: crítica ao
dogmatismo presente na academia jurídica, deslegitimação dos saberes locais,
necessidade de dar voz as comunidades locais e as categorias não eurocêntricas.
Imbuídos que desse conhecimento se prosseguirá com as etapas e os caminhos
percorridos para a última análise.
4.3.1
Corpus analisado
Para a análise aprofundada e completa dos artigos do subgrupo “ensino
jurídico” foi necessário realizar algumas adaptações, que consequentemente a
83
diferencia, em certa medida, da análise anterior como se explicará adiante mais
detalhadamente.
A segunda amostra de artigos é composta por um contingente bem superior
à primeira, enquanto o subgrupo “currículo” era formado por 21 artigos, a amostra
agora analisada é composta de 172 artigos. Nesse sentido, exigiu um tempo superior
para a conclusão das análises e a conclusão dos trabalhos.
A banca de qualificação, por uma questão de tempo disponível para a
conclusão do mestrado, sugeriu que fosse feita a análise apenas dos artigos que
foram primeiro apresentados. Pois, previam quão laborioso seria a conclusão das
análises dos artigos completos. Devido a seu tamanho e importância, poderia se
construir uma dissertação, apenas da análise completa. Porém, optou-se que esse
seria o momento adequado para trazer à baila, ainda que em considerações iniciais,
do rico material encontrado durante a revisão de todos esses artigos. Para tanto se
fez uma opção metodológica de não analisar as teses e dissertações do banco da
CAPES, que de acordo com o levantamento eram cinco. Algumas delas serviram
como base para o primeiro capítulo do trabalho, como é o caso de Mossini (2010).
Como explicado no início deste capítulo, o contingente de 172 artigos foi
obtido a partir da análise dos resumos dos artigos publicado no GT – Ensino jurídico
e metodologia da pesquisa aplicada ao direito, do CONPEDI. Nessa análise, a
pergunta norteadora desse trabalho continuou sendo: “se o ensino jurídico não
contribui ou contribui de maneira insuficiente na formação dos bacharéis em direito no
tocante a compreensão da alteridade”. Para tentar responder ao questionamento,
também, se objetiva avaliar de que maneira isso se explicita na produção acadêmica,
ou mais especificamente, nos artigos publicados.
Desde o início do levantamento dos dados da pesquisa e no decorrer da
construção do primeiro capítulo, alguns aspectos já vinham evidenciando
preocupações e críticas ao ensino jurídico brasileiro. Aos poucos a argumentação vem
respondendo o que a pergunta inicial questiona e a hipótese de que o ensino jurídico
é insuficiente na formação dos bacharéis no tocante à alteridade. Não é uma
conclusão precipitada, apenas, comenta-se o que será revisitado a todo o momento
neste e nos próximos subtítulos.
No terceiro o capítulo e na primeira análise desse quarto capítulo fazem
emergir críticas à formação dos bacharéis no Brasil e diretamente ao ensino jurídico,
que como exposto em diferentes momentos tem características como: excesso de
84
dogmatismo, o currículo que preconiza um saber elitizante, em detrimento de outros
saberes locais; estanque da realidade social; corriqueiramente citado em “crise” e o
excesso de positivismo.
Por isso, essa análise, a princípio, tentaria identificar em quais publicações
haveria a problematização da alteridade e do outro, como contribuição na formação
do bacharel no ensino jurídico. Porém, escolhe estender o leque de análise e
observância daqueles outros fatores acima, por julgar de extrema importância
demonstrar as inquietações e as críticas bem formuladas e reiteradas sobre o ensino
jurídico.
Outro fator que justificou a extensão dos critérios, de maneira preponderante,
foi através da indicação metodológica da Professora Thèrese Hamel. Hamel sugeriu
começar a análise realizando o que foi chamado, por ela, de leitura flutuante20. Desse
modo, em todos os artigos da amostra, durante a leitura flutuante, o objetivo principal
foi tentar identificar quais relacionavam a questão da alteridade ao ensino jurídico.
Através da leitura flutuante, foi possível identificar que havia questões que
eram insistentemente discutidas, criticadas, que reverberavam nos discursos dos
autores, nas problemáticas pesquisadas e referências usadas. Essa constatação
corroborou com o que os fatos históricos já vinham demonstrando sobre o ensino
jurídico: a crise no ensino jurídico, o excesso de dogmatismo, entre outros; a partir
desse momento foi crucial definir demais categorias a posteriori, para contemplar
esses estudos.
Vale comentar, também, que o presente estudo se vale de determinado
referencial teórico e que foi impossível ignorar o fato de que este mesmo referencial
emerge em vários artigos como referência. Dentre os autores destacam-se: Santos
(2007), Freire (19) e Rodrigues (2005).
A revisão também vai considerar e analisar mais adiante, aquilo que não foi
dito, que foi silenciado, que foi excluído dos discursos e que se quer emergir como um
problema, como algo a ser discutido ou problematizado.
Antes de começar a análise propriamente dita, assim como foi produzido um quadro
conceitual para os conceitos chaves da pesquisa, abaixo se esboça um para os
Segundo Bardin (2011), a leitura “flutuante”, ou seja, um primeiro contato com os documentos que
serão submetidos à análise, a escolha deles, a formulação das hipóteses e objetivos, a elaboração dos
indicadores que orientarão a interpretação e a preparação formal do material. Porém, no caso desse
estudo a leitura flutuante foi realizada já na fase de análise e não somente na fase de pré análise, e as
categorias emergiram a posteriori.
20
85
conceitos chaves da análise. Há uma falsa ideia de que tais conceitos já estão
internalizados e não necessitariam de serem expressos. Entende-se de maneira
diferente e assume-se que tais conceitos, por tamanha importância, já deveriam ter
aparecido descritos em vários outros momentos como uma nota.Em oportuno,
apresenta-se logo e passa-se a trazê-los por julgar imprescindível.
86
4.3.2
Outros conceitos chave da análise
POSITIVISMOJURÍDICO
Os positivistas do século XIX defendiam uma posição ainda hoje
lembrada. O direito deve ser interpretado de forma a afastar qualquer
elemento extra-jurídico do ato de julgar. Ou seja, a aplicação da norma
deve se dar de maneira estritamente técnica. Neutralidade e segurança
jurídica são valores fundamentais para a integridade do sistema jurídico.
BOBBIO que “o positivismo jurídico é aquela doutrina segundo a qual não
existe outro direito senão o direito positivo”
(NASPOLI SANCHES, 2011 P. 7639)
DOGMÁTICO: a dogmática está atrelada a
idéia de dogma, qual seja a de verdade
incontestável,
inatacável,
indiscutível.
Dogmas
não
se
discutem.
Tércio Sampaio Ferraz Júnior (2007, p. 48)
define
dogmática
como:
Ela explica que os juristas, em termos de
um estudo estrito do direito, procurem
sempre compreendê-lo e torná-lo aplicável
dentro dos marcos da ordem vigente. Essa
ordem que lhes aparece como um dado, que
eles não aceitam e não negam, é o ponto de
partida inelutável de qualquer investigação.
Ela constitui uma espécie de limitação,
dentro da qual eles podem explorar as
diferentes
combinações
para
a
determinação
operacional
de
comportamentos juridicamente possíveis.
CRISE: O diagnóstico de crise na Educação Jurídica parte de uma
sensação geral e crescente de insegurança em relação ao seu
modelo, e está necessariamente vinculada ao constante fracasso em
responder às demandas e aos problemas do sistema jurídico, não
conseguindo produzir os resultados que se espera dessa modelo
(KUHN, 2007, p. 95).
87
Abaixo esquema criado para demonstrar as fases da análise dos dados.
Figura 3 - Processo de seleção dos artigos publicados sobre Ensino Jurídico
do CONPEDI
1 ª fase: leitura dos títulos
346 artigos encontrados
2 artigos completos não
foram encontrado
172
artigos
sobre
Ensino Jurídico a partir
da leitura dos resumos
2 artigos completos
não
encontrados.
excluídos da análise
2 ª fase: leitura dos resumos
170 artigos para lidos
na íntegra.
3 ª fase: leitura na íntegra
15 artigos após leitura na
íntegra, apenas citam a
temática entre as palavras
chave e não aprofundam; ou
não
aprofundam
na
temática;
155 artigos atenderam
aos critérios de inclusão
Artigos incluídos nesta
revisão
Fonte: Elaborada pela autora.
88
Como já citado na FIGURA 3, dos 172 artigos, 2 não estavam disponíveis para
consulta na base de dados do CONPEDI quais sejam: “O ensino jurídico em nosso
país no período imperial e no primeiro momento republicano, sua evolução históricometodológica e suas consequências na contemporaneidade” de autoria de Vitor Toffoli
e José Sebastião de Oliveira(2012) e o artigo intitulado: “Reflexões sobre as
deficiências do ensino do direito no Brasil e as consequências na pesquisa e na prática
jurídicas”, de Laiana Delakis Recanello, Tatiane De Abreu Fuin, publicado no mesmo
ano (2012).
Estes artigos foram incluídos na amostra inicial porque no próprio título faziam
referência ao “ensino jurídico”. Não foi possível determinar o porquê da ausência dos
dois artigos, eles também não foram encontrados em uma pesquisa geral realizada
através de outras ferramentas de busca (Google) na tentativa de suprir a ausência
deles. Sendo assim, foram excluídos da análise final dos artigos.
Na segunda fase de leitura, 15 artigos foram excluídos da análise, por
diferentes motivos. O primeiro deles é que alguns apenas estudos citavam “ensino
jurídico” nas palavras chave e não discutiam a temática, entre eles pode-se citar os
artigos: “Ensino e raciocínio jurídicos: ensinar ou ensinar a pensar?”(MOTA, 2007);
Metodologia da Educação Jurídica: formando professores nos Programas de
mestrado (MARTINEZ, 2006); a prática metodologística nos programas de mestrado
em direito: A experiência na disciplina de sociedade civil e efetivação do direito
ambiental (SCEDA) (MARTINEZ, 2010); Pensando o ensino do direito - proposta para
a disciplina" estado, sociedade e meio ambiente" (NASSAR, 2010); Aprendizagem
significativa no ensino jurídico: a experiência da olimpíada jurídica Faculdade de
Direito de Vitória - FDV (GONÇALVEZ e MIGUEL, 2012); O estudante do Direito e as
classificações da norma jurídica: uma ferramenta mal utilizada (MAIA, 2013); entre
cativar e qualificar: os desafios do professor de direito por uma abordagem dos
métodos de ensino participativo, (AMARAL, 2013); Endogenia acadêmica em um
programa de pós-graduação em Direito, (BRAGA, VENTURINI, 2013).
Outros foram excluídos por não problematizarem questões relevantes para
esta análise, para exemplificar no estudo “A experiência da mediação extrajudicial no
núcleo de prática jurídica da Universidade Federal Fluminense através da extensão
acadêmica” de Yadodnik e Meirelles (2013), os autores só introduzem o assunto sobre
ensino jurídico. O artigo “Desafios à formação acadêmica do docente do ensino
jurídico no Amazonas” (SIMAS e SOUZA, 2014) teve como objetivo geral analisar os
89
desafios à formação acadêmica do docente no Amazonas, especialmente os que
lecionam nos cursos de direito. Já como objetivos específicos pretenderam verificar a
educação sob a perspectiva dos direitos fundamentais, fazer um breve histórico do
ensino superior no Amazonas, com destaque ao ensino jurídico e analisar os aspectos
legais atinentes à capacitação do professor universitário. Porém, o ensino jurídico não
é destaque no artigo.
A amostra final passou a contar com um contingente de 155 artigos analisados
na integra.
4.3.3
Ensino Jurídico e Alteridade: A corporeidade na educação em
Direito
Do
contingente
de
artigos
analisados
somente
duas
pesquisas
problematizavam e tratavam sobre a questão da alteridade relacionando-a ao ensino
jurídico. São os artigos: “Direito e educação para a alteridade: metodologia de ensino
e resolução de conflitos”, de Orsin e Costa, (2011); e “A corporeidade na educação
em direito: entre a dessensibilização e o potencial emancipatório”, de Garcia (2014).
Os dois artigos estão diretamente relacionados a temática principal dessa
pesquisa. Por esse motivo, houve um esforço maior em analisá-los e tentar expor o
conteúdo que cada um traz e as contribuições, ou não, deles para esta pesquisa.
No primeiro artigo Orsin e Costa (2011) analisa a realidade dede Belo
Horizonte, mais precisamente na Faculdade de Direito da Universidade Federal de
Minas Gerais – UFMG.O artigo buscava analisar a necessidade de se pensar o ensino
jurídico e o papel da Academia na formação dos operadores do Direito.
Para tanto, apresentava experiências pedagógicas desenvolvidas em duas
disciplinas da Faculdade de Direito da UFMG, com ênfase na atividade de observação
das audiências no Poder Judiciário. A proposta de trabalho dos autores foi, portanto,
pensar a metodologia do ensino jurídico como instrumento indispensável na formação
de alunos que serão profissionais e cidadãos mais ou menos comprometidos com a
realidade conforme o aprendizado recebido. Buscando compreender as relações no
campo jurídico analisado por meio de instrumentos metodológicos qualitativos
interdisciplinares, revisitando formas tradicionais de interpretação da lógica jurídica.
(ORSIN, COSTA, 2011, p.7459)
90
Durante a argumentação, as autoras justificaram a importância de uma
“construção pedagógica em busca da alteridade”. Um dos argumentos seria porque,
o paradigma jurídico-dogmático que domina o ensino nas faculdades de direito não
tem conseguido ver que na sociedade circulam várias formas de poder, de direito e
de conhecimento que vão muito além do que cabe nos seus postulados (ORSIN;
COSTA, 2011, p.7465).
Tal ensino preconizaria
a eliminação de qualquer elemento extra normativo, e as faculdades de
direito acabam criando uma cultura de extrema indiferença ou
exterioridade do direito diante das mudanças experimentadas pela
sociedade. Enquanto locais de circulação dos postulados da dogmática
jurídica têm estado distantes das preocupações sociais e têm servido,
em regra, para a formação de profissionais sem um maior
comprometimento com os problemas sociais (idem).
Para as autoras existiria,
no seio da sociedade, uma pluralidade de realidades jurídico-sociais
não percebidas pelas instituições. A academia deve ter sensibilidade e
capacidade para construir a alteridade nos espaços de diálogo. Citando
a concepção gramsciana, que o homem comum é filósofo porque cria
concepções de mundo no cotidiano. É um processo pedagógico da
vida social(ORSIN; COSTA, 2011, p.7465).
De acordo com elas:
há, claro, um distanciamento de saberes entre o senso comum e o
conhecimento científico, mas que tende a atenuar-se, citando
Boaventura de Sousa Santos, argumenta para quem o conhecimento
científico visa constituir-se em senso comum: (...) a ciência pósmoderna sabe que nenhuma forma de conhecimento é, em si mesma,
racional; só a configuração de todas elas é racional. Tenta, pois,
dialogar com outras formas de conhecimento deixando-se penetrar por
elas. A mais importante de todas é o conhecimento do senso comum,
o conhecimento vulgar e prático com que no quotidiano orientamos as
nossas ações e damos sentido à nossa vida (ORSIN; COSTA, 2011,
p.7463)
Por todos esses argumentos insistem, em um subtítulo nomeado de “Uma
Construção Pedagógica em Busca da Alteridade “neste subtítulo, pretendem justificar
que em todos os ramos do Direito,
seja em relação ao processo seja na esfera do direito material, o ensino
deve estar sempre em contato com a realidade sociológica do mundo.
Importante tocar e problematizar a realidade do trabalhador, do
consumidor, da parte no direito de família, do aposentado, do ente
estatal, do denunciado, da vítima, todos sujeitos de relações jurídicas
sempre tão engessados pelo discurso jurídico, para que possam ser
pensados de uma forma mais humana (ORSIN; COSTA, 2011, p.
7462).
91
Com uma linguagem diretiva, alertam que, o mundo, a sociedade, as relações
sociais, jurídicas e políticas não podem ser encarados
como um retrato petrificado na parede; precisam ser pesquisados sem
serem aprisionados a conceitos rígidos. É desse encontro com seu
suposto objeto de pesquisa que se constrói o jurista, o aluno e o
pesquisador, quando ele traduz e é traduzido sob uma nova
perspectiva nascida na relação com a dimensão humana e sociológica
do objeto de estudo (ORSIN; COSTA, 2011, p. 7462).
As autoras referenciaram Paulo Freire (1996) e Morin (2000), como
enunciadores dos saberes necessários à prática docente de educadores críticos.
Salientaram a necessidade da reflexão crítica sobre a prática para que a teoria não se
transforme em algo vazio e a prática em ativismo. Asseveraram que ensinar exige
criticidade e “quanto mais criticamente se exerça a capacidade de aprender tanto mais
se constrói e se desenvolve o que venho chamando, curiosidade epistemológica’’,
para que não se desenvolva um ensino “bancário”, como Freire (1996), criticamente,
observa (ORSIN; COSTA, 2011, p.7467).
O trabalho das autoras confirma algumas preocupações deste estudo. Dentre
as preocupações confirmadas é possível se referir a importância de outros saberes e
não apenas os codificados, que aprisionam, são petrificados e a necessidade de se
dialogar com outras formas de conhecimento.
Orsin e Costa (2011) fazem críticas construtivas ao ensino jurídico, citando
outras maneiras de se construir a criticidade e de se ensinar nesse meio. O estudo
chama atenção dessa análise, pois as autoras destinam um espaço para abordar a
importância de uma “Construção pedagógica em busca da alteridade”, porque a
academia deve ter sensibilidade e capacidade para construir a alteridade nos espaços
de diálogo. Porém não ficou muito clara qual a concepção de alteridade entendida
pelas autoras. Mas ainda assim não se pode desconsiderar que pelo fato do estudo
trazer o conceito em seu bojo, já demonstra sua perspicácia em relacionar à alteridade
como uma forma de sensibilização e resolução de conflito no bojo do ensino que pode
ser excludente e petrificado em si mesmo, desconectado da realidade social a qual
está inserido.
.
No segundo trabalho publicado mais recentemente intitulado, “A corporeidade
na educação em direito: entre a dessensibilização e o potencial emancipatório”. Garcia
(2014) parte de uma linguagem mais filosófica, embasado pelo mesmo referencial
teórico de Lévinas (2004), para conceituar alteridade, o “outro”, e problematizá-los no
92
ambiente do ensino jurídico. O artigo ainda inova diante dos outros com o conceito de
corporeidade na educação do direito, que é um conceito diretamente relacionado à
questão da alteridade, e, que a princípio não seria discutido aqui no estudo, caso não
viesse a emergir desse trabalho.
Nesse sentido, o autor discute a partir da concepção de Merleau-Ponty (2012)
acerca do corpo reconhecendo a complexidade fenomenológica e biopolítica que
circunda a Educação Jurídica em sua relação estreita com a corporeidade, o artigo se
propõe a realizar uma análise que se divide, essencialmente, em três momentos:
No primeiro momento, faz uma crítica a concepção epistemológica a respeito
do sujeito, do conhecimento presente no senso comum teórico no ensino jurídico,
pontuando o processo de objetificação do discente e também do docente. O segundo
momento trata do processo de dessensibilização do estudante de Direito ao longo do
curso, reconhecendo e identificando a transformação no seu corpo como parte
fundamental da formação jurídica. Por fim, buscou apontar o uso da corporeidade
como possibilidade de abertura ética em direção à alteridade e à sensibilidade
(GARCIA, 2014, p. 01).
Assim como as autoras do texto acima, dá início a discussão comentando que,
com frequência, é afirmado que o ensino do Direito está em crise. A análise mais
recorrente é a de que a Educação Jurídica atual se mostra incapaz de desenvolver
um pensamento crítico, transformador e emancipatório; e de que as faculdades de
Direito têm compactuado basicamente para a reprodução do paradigma dogmáticopositivista, distanciando os “operadores” do Direito da realidade social e dos
problemas que permeiam quem necessita da Justiça (GARCIA, 2014, p.02).
Ao citar Kuhn (2007), afirmam que o diagnóstico de Crise na Educação
Jurídica parte de uma sensação geral e crescente de insegurança em relação ao seu
modelo, e está necessariamente vinculada ao constante fracasso em responder às
demandas e aos problemas do sistema jurídico, não conseguindo produzir os
resultados que se espera desse modelo (GARCIA, 2014, p. 02).
Ou seja, as consequências das práticas educacionais dominantes e dessa
crise, afloram no sentido de evitar o contato interpessoal dos estudantes de Direito,
sempre criando mecanismos institucionais que os distanciam das realidades sociais,
partindo de um dogmatismo intelectual que se reflete eticamente no trabalho desse
estudante (GARCIA, 2014, p.17-18).
93
O autor observou como o processo dessenbilizador na Educação Jurídica se
efetiva em grande parte pela concepção e pela prática (que andam indissociadas entre
si) que se dá ao corpo. Nas faculdades de Direito se vê a opção deliberada pelo
distanciamento do sujeito em relação a quem é o potencial cliente da prestação
jurisdicional (GARCIA, 2014, p. 14).
Esse distanciamento se realiza de três formas para o autor, embora unidos
em um mesmo movimento e de consequências inseparáveis. Trata-se do
distanciamento epistemológico, do distanciamento corpóreo e, mais em consequência
do que em paralelo, do distanciamento ético.
Nesse sentido, a construção de um novo modelo de Educação Jurídica
deve se insurgir tendo por fundamento a aproximação entre sujeitos,
principalmente entre o sujeito do conhecimento e o sujeito submetido
à prestação jurisdicional. É evidente, no entanto, que a prestação
jurisdicional deva ser compreendida em um sentido amplo, não se
restringindo ao momento burocrático do Direito, em que um caso é
levado ao judiciário. Ao contrário, entende-se aqui por prestação
jurisdicional uma atividade voltada para a realização de direitos, sejam
eles reconhecidos ou não pela atividade judicial (GARCIA, 2014, p.14).
Por isso, o autor sustenta a teoria da alteridade fundada em Lévinas que seria
um mecanismo de abertura. Começa com o “outro” em Lévinas (2009), e a partir dos
estudos de Merleau-Ponty (2012), sendo que,
por certo, a menor retomada da atenção me convence de que esse
outro que me invade é todo feito de minha substância: suas cores, sua
dor, seu mundo, precisamente enquanto seus, como os conceberia eu
senão a partir das cores que vejo, das dores que tive, do mundo em
que vivo? Pelo menos, meu mundo privado deixou de ser apenas meu;
é, agora, instrumento manejado pelo outro, dimensão de uma vida
generalizada que se enxertou na minha (MERLEAU-PONTY, 2012,
apud GARCIA, 2014).
Dessa forma, Merleau-Ponty explica que o outro é apreensível para mim
somente na dimensão daquilo que eu já conheço. No entanto, é possível uma abertura
em direção ao outro na medida em que tenho com ele contato, permitindo assim novas
experiências e nova ampliação de subjetividade (GARCIA, 2014).
O autor cita Lévinas, que se refere à obra Merleau-Ponty, que entende
também que “o corpo será pensado como inseparável da atividade criadora, e a
transcendência como inseparável da atividade criadora e do movimento corporal”
(LÉVINAS, 2009 apud GARCIA 2014).
94
Para que o processo de dessubjetivação se efetive ao longo do curso de Direito,
seria necessário o afastamento corpóreo do estudante, o silenciamento de sua voz e
a impossibilidade de uma manifestação particular, fazendo-o existir por tabela, em
uma racionalidade funcional ou estatística dos mecanismos institucionais (GARCIA,
2014).
Garcia (2014) se orienta a partir de duas obras de Lévinas, e as cita durante
quase todo o capítulo, as obras são elas, “Entre Nós, Ensaios sobre a alteridade”,
2004, e Humanismo do outro homem, 2009. Além de outros estudos que dialogam
com as obras.
Em verdadeira reação a esses mecanismos institucionais, a ação, a atividade
positiva no processo educacional e, principalmente, o contato com o outro, são
movimentos em direção ao Outro que chamam a existência do sujeito em direção ao
mundo. Parte-se do entendimento, ainda, de que esse contato, esse chamado em
direção ao outro, é inevitável (GARCIA, 2014).
Como explica Lévinas citado pelo autor:
estar diante do Outro é estar diante da impossibilidade absoluta da
indiferença. O encontro com o Outro me obriga a uma resposta. Sua
presença é uma provocação necessária, da qual não posso ignorar. E
o que garante a impossibilidade da recusa completa, da morte
absoluta, da tentação de uma negação total, é justamente a presença
do rosto. “Estar em relação com outrem face a face – é não poder
matar. É também a situação do discurso” (LÉVINAS, 2004, apud
GARCIA, 2014 p. 18).
Ainda tratando do outro em Lévinas, Garcia acertadamente menciona que:
Esse encontro com o Outro, que desperta no sujeito a infinitude das
possibilidades, que desperta a noção de que o eu não pode existir em
totalidade no mundo, é a recusa necessária dessa própria totalidade.
“O fenômeno que é a aparição do Outro, é também rosto”. O encontro
com o Outro é, pois, estar-se diante da descoberta de possibilidades
sempre novas.
O próprio encontro com o rosto do Outro, antes mesmo de qualquer
outra abertura como a fala, abre o sujeito à existência de algo para
além de si, que lhe é estranha. O rosto, na medida em que se impõe
em forma de provocação da qual não há escapatória, “desconcerta a
intencionalidade que o visa” (LÉVINAS, 2009,apudGARCIA, 2014 p.
18).
Nesse sentido, diante do rosto não se poderia, para Garcia, mais direcionar
lhe o que se era antes de encontrá-lo, ou seja, o encontro com o Outro significa o
próprio questionamento de si mesmo, e, a partir desse encontro, nem ele nem o eu
95
serão os mesmos. Dessa forma, colocar o Outro na distância como as instituições
jurídicas o tem feito cada vez mais eficazmente é precisamente submeter-se à
tentação da morte absoluta do Outro. Trata-se da fuga da provocação do Outro.
Significa a submissão à vontade de totalidade do eu em relação ao mundo que me
circunscreve, no qual evito por completo a interferência e a dialética da existência
(GARCIA, 2014, p.18).
Daí se daria a importância fundamental do uso do corpo como arma
epistemológica. Em uma comunicação de Lévinas com Merleau-Ponty, o filósofo
explica: O corpo é um sensor sentido – eis aí, segundo Merleau-Ponty, sua grande
maravilha. Como sentido, está ainda, contudo, do lado de cá, do lado do sujeito; mas
como sensor, já está do lado de lá, do lado dos objetos; pensamento que não é mais
paralítico é movimento que não é mais cego, mas criador de objetos culturais (idem).
O artigo ora analisado aborda aspectos essenciais que dialogam diretamente
com a proposta deste estudo. O fato de reconhecer o “outro” e a alteridade como
formas de humanizar o ensino jurídico e superar o paradigma dominante é o ponto
nevrálgico.
Neste sentindo o artigo foi o primeiro diante dessa gama de artigos revisados a
problematizar o ensino jurídico e relacionar a alteridade a partir de Lévinas. Foi
possível identificar que ao artigo discorre sobre a importância do trato com alteridade
no ensino jurídico.O autor explicita que a crise do paradigma dominante pode e até
exclui o “outro” desse ensino. Nesse sentido, o artigo contribuiu para confirmar a tese
de que, o ensino jurídico não contribuiu ou contribui de maneira insuficiente na
formação dos bacharéis para a compreensão da alteridade, à medida que se utiliza
de uma epistemologia que distancia o “Outro” desse ensino.
4.3.4
Considerações finais: as ausências do “outro” nas pesquisas
analisadas.
Apesar de serem apenas dois artigos que, a princípio, trazem a questão da
alteridade em seu bojo, a revisão constituiu um material riquíssimo de análise que
poderá servir como base para estudos posteriores. No geral, dentre os artigos
analisados, foi possível identificar que havia preocupação constante e diretamente
96
relacionada com a interdisciplinaridade, como forma superação paradigma
hegemônicos, consubstanciados em dogmas, códigos.
As pesquisas traziam referencias teóricos riquíssimos e críticos da situação
de crise do ensino jurídico, que também era constantemente denunciada entre as
pesquisas. Autores como, Freire (1996) com a “Pedagogia do oprimido”, foi um dos
autores que mais encontrou espaço entre os trabalhos. Principalmente quando
queriam caracterizar o ensino jurídico como dotado de uma pedagogia da repetição,
da transmissão que lembrava a educação “bancária” e do currículo contextualizado
proposto pelo autor. Também pode-se citar o autor Edgar Morin (2000), ao trazer a
interdisciplinaridade e o paradigma do múltiplo como forma de superação desse
sistema.
Porém foi infeliz observar que diante desse panorama houve silenciamentos.
Não emergiu entre os assuntos pesquisados temas como: o ensino jurídico sob a
perspectiva do feminismo, do direito e afrodescendentes, indígenas e LGBT’s. O
“outro” não teve sua voz ouvida nesse ambiente de pesquisa. As pesquisas
silenciaram-se diante das injustiças epistemologias sofridas pelo “diferente”. O que
demonstra que elas, também, externalizam como o ensino jurídico tem sido
insuficiente na formação dos juristas para a compreensão da alteridade e para a voz
do “outro” nesse ensino.
97
5
INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR (IES) DE DIREITO DA REGIÃO
METROPOLITANA DE BELO HORIZONTE: ANÁLISE CURRICULAR DAS
INSTITUIÇÕES E PERCEPÇÕES
O segundo estudo proposto nesse trabalho refere-se à realização de um dos
objetivos específicos deste trabalho, qual seja analisar os currículos dos cursos de
Direito da Região Metropolitana de Belo Horizonte– RMBH, a partir de suas disciplinas
e ementas. O intuito é avaliar se há emergência e voz ao “outro”.
Um dos trabalhos que teve fundamental influência na escolha da temática
refere-se a um levantamento sobre as Instituições de Ensino Superior que ofertam
cursos de Direito na RMBH, feito por Teodoro Adriano Costa Zanardi e Érica Adriana
Costa Zanardi. Eles empreenderam uma pesquisa sobre essas instituições, que mais
tarde resultou em um artigo publicado, que se intitulou “O currículo jurídico e a
exclusão dos excluídos21” (ZANARDI e ZANARDI 2013).
A partir do levantamento das grades curriculares das IES de ciências jurídicas
da RMBH, os autores pretenderam desenvolver uma crítica no tocante às opções
elitistas e elitizantes feitas para a formação do bacharel em Direito. Concluíram dentre
outras coisas, que Disciplinas como Direitos Humanos, Execução Penal e Estatuto da
Criança e Adolescente, na maioria dos casos não encontram lugar reservado nas
grades de disciplinas dos cursos da RMBH. Numa perspectiva freiriana denunciam o
currículo elitista, e propõem que estes devem vir acompanhados da proposta
(anúncio) de um projeto comprometido com a transformação social e a superação da
exclusão.
Há indicativos de que este artigo foi o primeiro publicado a se ocupar
especificamente dessa temática. Nestes termos, a proposta de estudo promete se
debruçar sobre ele, porém não se esgotará apenas neste. No sentido de compreender
o estudo, referenciá-lo, se aproveitar das contribuições e horizontes levantados e a
partir desse momento visitar o novo ainda não trabalhado.
Outro trabalho que se sublinha intitula-se: “Diversidade e Inclusão
Educacional no Ensino Superior: Um estudo sobre os currículos dos cursos da UFOP”.
Neste trabalho Rahme, Diniz e Maia (2014) buscam discutir dados de uma pesquisa,
desenvolvida entre 2011 e 2013, sobre a presença das temáticas étnico-raciais, de
21Artigo
publicado no VI COLÓQUIO INTERNACIONAL DE POLÍTICAS
CURRICULARES – Currículo: (re) construindo os sentidos de educação e ensino.
E
PRÁTICAS
98
gênero, sexualidade e deficiência nos currículos dos cursos de graduação presenciais
da Universidade Federal de Ouro Preto – UFOP. Para a produção da investigação,
realizaram levantamento das ementas, programas de disciplinas e projetos dos cursos
de graduação, e ao longo do trabalho desenvolveram estudos sobre currículo, ensino
superior inclusão e diversidade.
Apesar de o contexto ao qual a pesquisa acima ter se centrado (UFOP), não
se inserir entre os Institutos de Ensino Superior que serão aqui discutidos e nem se
incluírem entre as cidades da região metropolitana, a pesquisa perpassa alguns
caminhos que serão aqui refeitos, e questões que serão em linhas gerais rediscutidas,
como a questão da diversidade no currículo e do papel da Universidade como espaço
de formação, produção e transmissão de conhecimento.
Além de se tomar como parâmetro as pesquisas supramencionadas, o fato de
o trabalho ter realizado um prévio estudo dos artigos publicados sobre currículo e
ensino jurídico e analisá-los, foi possível compreender a emergência de algumas
possibilidades que seriam aprofundadas a medida do estudo do currículo em si.
Diga-se emergência quando em determinados artigos apareceram indicativos
de haver no ensino jurídico um currículo que prioriza o ensino técnico ao ensino
humanista e sensível às demandas sociais, o que poderia se traduzir no silenciamento
de outros saberes e ocultação da diversidade. Neste sentido, a ideia de se discutir os
currículos das Instituições de Ensino Superior (IES) se torna uma valiosa ferramenta
para desbravar essa realidade.
Dito isso, os próximos tópicos foram divididos da seguinte maneira: histórico
e justificativa da escolha da Região Metropolitana; apresentação do levantamento
realizado; perspectivas para a continuidade do estudo; discussão e problematização
preliminar de acordo com as referências supramencionadas e com os demais autores,
como Michael Apple (2006).
5.1
A Região Metropolitana de Belo Horizonte
A Região Metropolitana de Belo Horizonte – RMBH foi instituída em 1973, pela
Lei Complementar nº 14, que criou também as regiões metropolitanas de São Paulo,
Porto Alegre, Recife, Salvador, Curitiba, Belém e Fortaleza. A RMBH era
originalmente composta por 14 municípios: Belo Horizonte, Betim, Caeté, Contagem,
99
Ibirité, Lagoa Santa, Nova Lima, Pedro Leopoldo, Raposos, Ribeirão das Neves, Rio
Acima,Sabará, Santa Luzia e Vespasiano (MINAS GERAIS, 2015).
Em 1989 a Constituição Estadual de Minas Gerais incorporou a RMBH os
municípios de Brumadinho, Esmeraldas, Igarapé e Mateus Leme, além de introduzir
a figura do Colar Metropolitano. Em 1993, a inclusão dos municípios acima citados e
de Juatuba e São José da Lapa – distritos recém-emancipados – foi oficializada por
lei complementar. Em 1997, seis outras municipalidades foram incorporadas:
Florestal, Rio Manso e os ex-distritos recém-emancipados de Confins, Mário Campos,
São Joaquim de Bicas e Sarzedo. Em 2000, entraram para a RMBH os municípios de
Baldim, Capim Branco, Jaboticatubas, Taquaraçu de Minas, Itaguara, Matozinhos,
Nova União.
Em 2002, Itatiaiuçu também foi agregada à RMBH. O Colar Metropolitano é
composto por 14 municípios do entorno da RMBH: Barão de Cocais, Belo Vale,
Bonfim, Fortuna de Minas, Funilândia, Inhaúma, Itabirito, Itaúna, Moeda, Pará de
Minas, Prudente de Morais, Santa Bárbara, São José da Varginha e Sete Lagoas.
Localizada na porção centro-oeste do Estado, a Região Metropolitana é
formada pelos 34 municípios, acima citados, composta por uma população
aproximada de 5 milhões de habitantes, sendo que os maiores percentuais
populacionais estão nosmunicípios de Belo Horizonte (48,26%) e Contagem (12,25%)
e os menores emTaquaraçu de Minas (0,1%) e Rio Manso (0,08%) (MINAS GERAIS,
2009).
Abaixo
um
mapa
ilustrativo
da
área
correspondente
Mapa 1: Área Correspondente à Região Metropolitana de Belo Horizonte
à
RMBH.
100
Fonte: Almanaque Abril, 2016.
A RMBH ocupa uma área de 9.461 km², apresenta grande diversidade física
e socioeconômica, que reflete as dinâmicas diferenciadas na configuração do espaço.
A atividade econômica de Minas Gerais concentra-se na RMBH, um espaço
geográfico de dimensão relativamente pequena, correspondendo a 1,6% do território
mineiro. Apesar de sua dimensão, a RMBH possui uma economia de grande
densidade e diversificação (idem).
O IDH médio da RMBH é superior ao estadual, tanto em 1991 como em 2000.
Observa-se um incremento de 7,1% do IDH neste período, o que indica melhoria da
qualidade de vida na metrópole. Porém, apesar do IDH médio ser superior ao
estadual, de acordo com dados do IBGE (2010) o IDH dos municípios que compõem
essa região é bem díspar. A título de informação no Município de Nova Lima, o índice
de IDH é de 0,813 (equivalente ao de Portugal) e o de Ribeirão das Neves, com índice
de 0,684 (equivalente ao Gabão) (ZANARDI e ZANARDI, 2013).
O setor terciário é representativo na metrópole, destacando-se os serviços de
saúde, educação, instituições bancárias, lazer, cultura e comunicação. A Região
ocupa uma posição de liderança estadual em quase todas essas modalidades de
101
serviços. Além da concentração das atividades de serviços e comércio, merece
destaque o parque industrial diversificado, com empreendimentos de fomento à
indústria automobilística de alta tecnologia e a presença de um polo de biotecnologia
que é considerado o mais importante da América Latina (MINAS GERAIS, 2009 p.32).
A escolha por essa região se deu ao considerá-la importante no cenário
estadual e até mesmo nacional, sendo a terceira maior região metropolitana do país,
no tocante a aspectos econômicos, sociais e demográficos explicitados acima. Por
isso, a presente pesquisa objetiva se debruçar diante dessas realidades díspares para
tentar entender o ensino jurídico praticado neste ambiente.
Visto que economicamente e socialmente uns municípios encontram um
maior índice de desenvolvimento humano do que outros, o que reflete um nível de
desigualdade alto, a pesquisa visa verificar se o ensino jurídico acompanha e é de fato
sensível na sua prática a esta realidade.
5.2
O estudo das grades curriculares e levantamento das Instituições de
Ensino Superior
Para responder aos objetivos propostos pelo trabalho, no tocante a análise
fática da situação da RMBH, a metodologia utilizada foi da análise documental. O
material constitui-se de programas de disciplinas (grades curriculares). Seriam
analisadas, ainda, as ementas e projeto pedagógico dos cursos, mas por falta de
tempo hábil e a disponibilidade das ementas virtuais, apenas uma das instituições teve
a ementa e o Plano Político Pedagógico analisado. Tais documentos foram acessados
a partir do site de cada Instituição de Ensino Superior (IES), geralmente no link “grade
curricular” ou “matrizes curriculares”. Contou, ainda, com o site do Ministério da
Educação para verificar entre as cidades que compõe a Região Metropolitana de Belo
Horizonte (RMBH) quais ofertariam ou não cursos autorizados de bacharelado em
Direito. O material foi selecionado e alguns impressos.
O estudo conjugou as abordagens quantitativas e qualitativas de pesquisa.
Como salienta Claude Dubar (1998), citado por Rahme, Diniz e Maia (2014), a ligação
dessas duas perspectivas propicia a construção de leituras mais fecundas das
relações dinâmicas e, por vezes, obscuras que os fenômenos podem apresentar,
sobretudo quando tomados isoladamente. Ao mesmo tempo, considera-se as
102
especificidades de cada abordagem, suas contribuições para o estudo proposto, bem
como seus limites (DUBAR,1988 apud RAHME; DINIZ; MAIA 2014 p. 152).
No que diz respeito a abordagem quantitativa, foi realizado um mapeamento
dos dados dos cursos em relação as cidades da RMBH, e em relação às temáticas
propostas, o que permitiu a construção de um quadro da distribuição das disciplinas
ofertadas entre as IES.
O período de coleta dos dados da primeira fase da pesquisa se deu entre abril
de 2014 a abril de 2015 e focalizou na amostra previamente definida, bacharelados
em Direito da RMBH. Algumas dificuldades durante o processo foram evidentes
principalmente na localização das grades curriculares.
A próxima figura demonstra o processo de análise dos dados.
103
Figura 4 - Processo de análise das grades curriculares dos cursos de Direito
das Instituições de Ensino Superior (IES) da RMBH.
35 IES identificadas na RMBH
1 ª fase: Identificação das IES
2 grades curriculares não
encontradas
2 ª fase: Analisar currículos
33 grades curriculares
analisados completos
Investigar oferta de 2
disciplinas
–
Direitos
Humanos (DH) e Relações
Étnico raciais (RE)
19IES ofertam DH e 2
ofertam a disciplina de RE
3 ª fase: Análise das ementas
Definir a amostra a ser
analisada
da
ementa
disciplina de DH e analisar
todas as ementas de RE
Grades
e
analisadas
ementas
Definir necessidade de
entrevistas
Fonte: Elaborada pelo autora
104
O Presente trabalho concluiu as etapas previstas para esta investigação,
sendo a primeira e a segunda fase. A terceira fase, da análise das ementas por opção
e diante das impossibilidades apresentadas por Rahme; Diniz e Maia (2014), e
questão de tempo hábil e outros desafios22 foram postos.
Nesse sentido, a opção encontrada foi de se trabalhar apenas com o que está
publicado nos sites das IES e apenas com as grades curriculares. Escolheu-se de se
trabalhar com apenas uma IES para que fosse realizada uma análise aprofundada da
sua ementa. Ressalta-se que apenas essa ementa encontrada disponível. Além disso,
só uma parte do Plano Político Pedagógico.
Defluiu-se dessa análise que a RMBH contabiliza 40 cursos23dos quais 25
estão localizados em Belo Horizonte e 15 nas outras cidades que compõe a RMBH.
Em alguns casos como algumas instituições ofertam o mesmo curso em mais de uma
cidade, o total de IES diferentes que ofertam cursos na RMBH totalizam 35
instituições. Esta pesquisa efetivamente avaliou 33 grades curriculares. As grades
curriculares de duas IES, Faculdade da Saúde e Ecologia Humana – FASEH e
Faculdade Presidente Antônio Carlos de Betim –UNIPAC/FUNEC Betim, não estavam
disponíveis no site da instituição, por isso foram desconsideradas.
A tabela abaixo relaciona o total das IES superior que foram selecionadas, e
no caso das duas acima, que não foram analisadas pesquisadas.
22No
estudo de Rahme; Diniz e Maia (2014), as autoras relatam que não conseguiram acesso a nenhum
dado referente ao Curso de Filosofia (UFOP), e no que se refere aos outros cursos, vários desafios
para obter informações sistematizadas, sobretudo, no que diz respeito às disciplinas eletivas. Aqui a
mesma dificuldade foi confirmada.
23Atenta-se para o fato de que algumas IES (Instituições de Ensino Superior) ofertam o curso em mais
de uma cidade, como é o caso da PUC Minas que possui uma Unidade em Contagem, Betim. A título
de informação o total de 40 cursos incluem estes cursos de mesma IES de cidades diferentes. Porém
também ocorre a situação da mesma IES ofertar o bacharelado em Direito em várias unidades da
mesma cidade, aqui também se citará a PUC que possui uma unidade na Praça da Liberdade, Barreiro,
São Gabriel e Coração Eucarístico, neste caso apenas 1 curso foi contado.
105
Tabela 10- Relação das Instituições de Ensino Superior da RMBH
INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR (IES) DA REGIÃO METROPOLITANA DE BELO HORIZONTE (RMBH)
GRADUAÇÃO EM DIREITO
1
2
Nome da IES - Sigla : (1139) FACULDADE DE ESTUDOS
ADMINISTRATIVOS DE MINAS GERAIS - FEAD-MG - FEAD MG
Nome da IES - Sigla : (1346) FACULDADE BATISTA DE
MINAS GERAIS - FBMG
21 Nome da IES - Sigla : (344) CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA
Nome da IES - Sigla : (349) CENTRO UNIVERSITÁRIO DE BELO
22 HORIZONTE - UNI-BH
Nome da IES - Sigla : (3786) FACULDADE DE ENSINO DE MINAS
3 Nome da IES - Sigla : (1484) FACULDADE IBMEC - IBMEC
Nome da IES - Sigla : (1509) FACULDADE ESTÁCIO DE SÁ DE
4 BELO HORIZONTE - FESBH
Nome da IES - Sigla : (1557) UNIVERSIDADE FUMEC -
5 FUMEC
Nome da IES - Sigla : (1666) FACULDADE NOVOS
6 HORIZONTES - NOVOS HORIZONTES
Nome da IES - Sigla : (1668) FACULDADE DE NEGÓCIOS DE
7 BELO HORIZONTE - ESN ANHANGUERA
Nome da IES - Sigla : (1668) FACULDADE DE NEGÓCIOS DE
8 BELO HORIZONTE - ESN ANHANGUERA
Nome da IES - Sigla : (1818) FACULDADE PITÁGORAS DE
9 BELO HORIZONTE - FPAS
Nome da IES - Sigla : (1923) FACULDADE DE DIREITO
10 PADRE ARNALDO JANSSEN - FAJANSSEN
11
12
Nome da IES - Sigla : (216) CENTRO UNIVERSITÁRIO
METODISTA IZABELA HENDRIX - CEUNIH
Nome da IES - Sigla : (2171) INSTITUTO BELO HORIZONTE
DE ENSINO SUPERIOR - IBHES
Nome da IES - Sigla : (2311) FACULDADE DE CIÊNCIAS
13 JURÍDICAS PROFESSOR ALBERTO DEODATO - FCJPAD
Nome da IES - Sigla : (2450) FACULDADE PROMOVE DE
14 BELO HORIZONTE - PROMOVE
Nome da IES - Sigla : (2849) ESCOLA SUPERIOR DOM
15 HELDER CÂMARA - ESDHC
23 GERAIS - FACEMG
Nome da IES - Sigla : (575) UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS
24 GERAIS - UFMG
Nome da IES - Sigla : (663) UNIVERSIDADE SALGADO DE
25 OLIVEIRA - UNIVERSO
Nome da IES - Sigla : (13666) FACULDADE DE DIREITO DE
26 CONTAGEM - FDCON / (31)25576900
Nome da IES - Sigla : (14313) NOVA FACULDADE - NF
27 /(31)32730798
Nome da IES - Sigla : (14028) Faculdade Presidente Antônio
28 Carlos de Betim - FUNEC Betim
Nome da IES - Sigla : (638) FACULDADE DE DIREITO
29 MILTON CAMPOS - FDMC // (31) 3289 1934
Nome da IES - Sigla : (1670) FACULDADE ASA DE
30 BRUMADINHO - IECEMB - FAB /
Nome da IES - Sigla : (1314) INSTITUTO DE ENSINO
SUPERIOR JOÃO ALFREDO DE ANDRADE - IJAA // (31)
31 3535 8142
Nome da IES - Sigla : (4218) FACULDADE PEDRO
32 LEOPOLDO - FPL // (31) 3686-1461
Nome da IES - Sigla : (1174) FACULDADE DE SABARÁ 33 SOECS // (31) 3241 2891
Nome da IES - Sigla : (1581) FACULDADE DA CIDADE DE
34 SANTA LUZIA - FACSAL // (31) 3079 9000
Nome da IES - Sigla : (1664) FACULDADE DA SAÚDE E
35 ECOLOGIA HUMANA - FASEH // (31) 21382900
16 Nome da IES - Sigla : (2927) FACULDADE DEL REY - FDR
Nome da IES - Sigla : (30) UNIVERSIDADE JOSÉ DO
17 ROSÁRIO VELLANO - UNIFENAS
Nome da IES - Sigla : (3194) FACULDADE DE MINAS BH -
18 FAMINAS-BH
Nome da IES - Sigla : (338) PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE
19 CATÓLICA DE MINAS GERAIS - PUC MINAS
Nome da IES - Sigla : (343) CENTRO UNIVERSITÁRIO
20 NEWTON PAIVA - NEWTON PAIVA
Fonte: Elaborada pela autora.
Para dar continuidade a esta análise buscou-se identificar as disciplinas que
poderiam fazer parte da grade de disciplinas destes cursos, aquelas cujos conteúdos
contemplam direitos dos subalternizados. No estudo realizado por Zanardi e Zanardi
106
(2013 p. 1474) eles elegeram quatro disciplinas (Direitos Humanos, Estatuto da
Criança e do Adolescente e Execução Penal), que guardavam estreita ligação com os
direitos sensíveis excluídos.
Para este trabalho a averiguação se voltou apenas para verificar quais as IES
ofertavam disciplinas com a temática de “Direitos Humanos”, ou que poderiam ser
chamados, em alguns currículos de “Direitos Fundamentais”.
Durante a pesquisa emergiu a partir de um dos currículos das IES uma
disciplina que se intitulava “Relações Étnicos Raciais”, “Relações Étnicas”, que não
poderiam ser desconsideradas ou excluídas de análise desse estudo. Ao averiguar se
havia reincidência dessa disciplina em outros currículos encontrou-se uma disciplina
nominada de “História dos Povos indígenas e Afrodescendentes”.
Cada disciplina encontra uma motivação específica que são resultados de
lutas e conquistas sociais e de materialização de direitos subjetivos de segmentos
sociais. A disciplina de Direitos Humanos, aqui se referindo diretamente à justificativa
apresentada por Zanardi e Zanardi (2013), que afirma que, os Direitos Humanos,
inseridos no contexto jurídico por meio da Constituição de 1988, referem-se aos
direitos de quaisquer seres humanos, detentores de propriedades ou não,
consumidores ou não. Como as elites já encontravam seus direitos tutelados pelo
ordenamento jurídico, a universalização dos direitos humanos trata de incluir sob seu
manto aqueles que se encontravam à margem da proteção jurídica, por estarem fora
da ordem burguesa, apesar da classe burguesa contemplar a marginalização inerente
ao sistema capitalista (ZANARDI, 2013 p. 1474).
Para a disciplina de “Relações Étnico-Raciais” ou “História dos Povos
Indígenas e Afrodescendentes”, pede licença para apresentar a justificativa do projeto
de lei que tramita no Senado que exatamente vai ao encontro do que algumas
instituições já se anteciparam, é a disponibilização na forma de uma disciplina com
esses conteúdos aos seus alunos.
O pressuposto é de que não haverá democracia no Brasil sem a disseminação
da justiça e da equidade para todos os cidadãos, a despeito de suas diferenças e
particularismos. Cumpre relembrar que, em todos os indicadores, conforme
mensuração de instituições respeitáveis, como o Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada IPEA, às diferenças de renda e de escolaridade entre os gêneros masculino
e feminino, em desfavor das mulheres, sobrepõem-se as diferenças entre raças, em
indisfarçável prejuízo dos afrodescendentes (BRASIL, 2012).
107
Quase trinta anos após a promulgação da Constituição da República, resta
claro que o nosso maior desafio, no século XXI, jaz na construção de um ambiente no
país, que efetivamente acabe de vez com o racismo, atualmente velado, porém
renitente na consciência nacional (BRASIL, 2012).
Como brilhantemente assevera Paulo Paim na justificativa do Projeto de lei
153/2012, em tramitação24 no Senado Federal, que visa incluir a disciplina Direito e
Relações Étnicas nos cursos de graduação em Direito, de formação de oficiais e
soldados da Polícia Militar, delegados de polícia e agentes, de delegados de polícia e
agentes da Polícia Civil e de oficiais e soldados das Forças Armadas Brasileiras:
(...)
O reconhecimento do problema racial foi nosso primeiro passo acertado, ante
o caráter peremptório dos indicadores sociais, que reconfirmam o brilhante
insight do compositor Marcelo Yuka, ao afirmar, em bela letra de música, que
“todo camburão tem um pouco de navio negreiro”.
A despeito da legislação anti-racismo no Brasil, bem sabemos que é ínfimo o
total de processos judiciais que chegam a bom termo nos tribunais brasileiros,
com condenações efetivas dos perpetradores de barbarismos,
manifestações, atos e práticas racistas (BRASIL, 2012).
A Constituição Federal, indubitavelmente avançada no combate ao racismo
– tanto no plano externo, quando explicita, no art. 4º, inciso VIII, o objetivo
primordial da República de repudiar o terrorismo e o racismo, nas suas
relações internacionais; quanto no plano interno, ao definir, no art. 5º, inciso
XLII, a prática do racismo como crime inafiançável, imprescritível e sujeito à
pena de reclusão – dificilmente encontra concretude na vida real, no “mundo
fático”, conforme a expressão usual entre os juristas.
Raríssimos, minguados, quase inexistentes são os casos de condenação
levada a termo de crimes de racismo no Brasil, a despeito da notória e
reiterada ocorrência de tais práticas, e da norma jurídica impositiva de
combate ao racismo, a partir do comando da própria lei. E a que se deve esse
descompasso, senão à relativa permissividade social no que tange à
discriminação de negros e índios?
Como combater a inércia e omissão da máquina judiciária, senão pela
infusão, nas consciências e nas almas dos futuros operadores do Direito e da
Segurança Pública, daquilo que, miseravelmente, se convalida em letra morta
na legislação pátria?
Por esse motivo, optaram por oferecer ao Parlamento a ideia de disseminar,
nos cursos de direito e nas academias das forças da ordem, a principiologia
teórica e humanista que garante a todo ser humano tratamento equânime da
lei por sua condição intrínseca de ser humano, igual em dignidade a todo e
24
Tramitação: É o curso regular das proposições pelas comissões técnicas e o Plenário da Câmara ou
do Senado. Começa com a leitura da ementa da proposição, salvo no caso de matéria para deliberação
urgente, cujo texto deve ser lido na íntegra. Propostas de Emenda à Constituição (PECs), projetos de
lei, de decreto legislativo e de resolução, além de indicações, são matérias que só podem ser
apresentadas em Plenário, jamais em comissões. Após a leitura, essas matérias vão para uma ou mais
comissões, onde serão examinadas e receberão um parecer. Posteriormente, retornam ao Plenário
para votação. Se aprovada pelo Senado ou pela Câmara, a matéria é remetida à outra Casa, na
condição
de
órgão
revisor
(SENADO
FEDERAL,
2016,
disponível
em:
http://www12.senado.leg.br/noticias/glossario-legislativo/tramitacao).
108
qualquer dos seus congêneres, e dotado de direitos e de obrigações válidas
erga omnes perante a sociedade e o Estado (BRASIL, 2012).
A partir desse panorama, conhecer essa disciplina e o seu conteúdo, já
ministrado por algumas IES mesmo antes da aprovação do projeto de Lei (153/2012),
se mostra uma importante ferramenta para entender se em alguma medida o que o
projeto de lei pretende, já vem se cumprindo.
5.2.1
Resultados das análises das grades curriculares
De 25 grades curriculares de IES da cidade de Belo Horizonte 11 ofertam a
disciplina de Direitos Humanos (Direitos Fundamentais), como disciplinas obrigatória
e 1 IES oferta como disciplina optativa.
Tabela 11 - Oferta da disciplina de Direitos Humanos em Belo Horizonte e
Relações Étnico raciais, como disciplina Obrigatória.
Fonte: Elaborada pela autora.
Sobre a IES que oferta a disciplina de Direitos Humanos como disciplina
optativa abaixo demonstrada na tabela:
109
Tabela 12 - Demonstrativo da IES que oferta a disciplina de DH como optativa.
Fonte: Elaborada pela autora
Das 8 IES dos outros Municípios da RMBH 6 das IES ofertam a disciplina de
Direitos Humanos, como disciplina obrigatória.
Tabela 13- Representativo das IES que ofertam a disciplina de Direitos
Humanos/ Fundamentais como obrigatórias.
Fonte: Elaborada pela autora
Assim na Região Metropolitana há uma oferta de 17 IES da disciplina como
obrigatória e 1 IES oferta como optativa, de um total de 33 grades avaliadas.
Por outro lado, a disciplina de “Relações Étnico Raciais e Afrodescendência” foi
evidenciada em um currículo de uma IES de Belo Horizonte e outra IES diferente
ofertava a disciplina de “História dos Povos Indígenas e Afrodescendentes”. Nos dois
casos as disciplinas são eletivas. A primeira é ofertada na plataforma virtual da IES já
a segunda não havia informações.
Dentre os próximos passos previstos na metodologia desse trabalho, está o
aprofundamento e a análise dos dados levantados.
Após as análises das grades curriculares, seguindo ao que foi proposto seria
eleita uma das instituições que ofertassem uma disciplina de Direitos Humanos e outra
110
IES que ofertasse a disciplina de Relações Étnico Raciais para análise das ementas
e quando possível do Plano Político Pedagógico25.
Como foi adiantado eram previsíveis as dificuldades que seriam encontradas e
elas realmente ocorreram. Sobre as instituições que ofertavam a disciplina de
Relações Étnico Raciais, apenas o Plano Político Pedagógico de uma (Estácio de
Sá26) foi encontrado, porém ele não trazia a ementa da disciplina, fato que
impossibilitou a análise da mesma.
Sobre a disciplina de Direitos Humanos, foi possível encontrar e analisar, em
partes, o Plano Político Pedagógico de outra instituição e nele continha a ementa da
disciplina. Por isso, apenas essa instituição terá tecidas considerações sobre o seu
Plano Político Pedagógico e ementa, a IES analisada foi a Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais (PUC Minas) e o Plano Político Pedagógico do curso de
Direito (PPP) datado do ano de 2007.
5.2.2
Histórico da IES pesquisada
No mapa de Minas Gerais, a Pontifícia Universidade Católica está presente em
importantes regiões do Estado, através de uma estrutura multicampi composta por
mais de uma centena de prédios, que abrigam laboratórios, bibliotecas, museu, canal
de TV, oficina de teatro, ensino a distância, salas multimídia dentre outros. Além de
outros equipamentos dotados com modernos recursos tecnológicos e pedagógicos.
A comunidade acadêmica da PUC Minas reúne 57.201 estudantes (44.987 na
graduação, 10.053 da especialização, 1.512 no mestrado e doutorado, e 649
distribuídos entre cursos de aperfeiçoamento, atualização e capacitação), 1.750
professores e 2.383 funcionários, espalhados pelos seus campi/unidades. São 114
cursos de graduação, 28 cursos de mestrado e doutorado, além de 358 cursos de
especialização (entre os a distância, presencial e presencial modular).
25
O Plano Político Pedagógico: é um documento que detalha objetivos, diretrizes e ações do processo
educativo a ser desenvolvido na escola, expressando as exigências legais do sistema educacional,
bem como as necessidades, propósitos e expectativas da comunidade escolar. Revela os modos de
pensar e agir dos atores que participam da sua elaboração, expressa a cultura da escola e, ao mesmo
tempo,
contribui
para
transformá-la
(UFBA,
2016)
(Ver
mais
em:
http://www.moodle.ufba.br/mod/book/view.php?id=10197&chapterid=9720).
26 Ver mais sobre o Plano Político Pedagógico da Instituição Estácio de Sá, disponível em:
http://portal.estacio.br/docs/mec-floresta/PPC_DIREITO_PORTAL_2015.PDF
111
Em se tratando da Faculdade Mineira de Direito (FMD) ela foi criada em 12 de
março de 1949, a pedido do Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte, Dom Antônio
dos Santos Cabral, pelo processualista mineiro Alfredo de Araújo Lopes da Costa, que
foi seu primeiro diretor, razão por que é carinhosamente chamada de Casa de Lopes
da Costa (PUC MINAS 2016).
Em 1958 foi integrada à nascente Universidade Católica de Minas Gerais, que
depois se tornaria, por decreto papal, Pontifícia Universidade Católica de Minas
Gerais. O curso de mestrado em direito foi criado em 17 de outubro de 1997, e o curso
de doutorado em Direito foi criado em 2001. O lema da Faculdade Mineira de Direito
é LEX TUA VERITAS, parte do versículo 142, Salmo 119, que significa: "A tua lei é a
verdade" (PUC MINAS 2016).
Na região metropolitana (RMBH) a PUC Minas está presente, ofertando o curso
de direito em Belo Horizonte (Barreiro, Coração Eucarístico, Praça da Liberdade, São
Gabriel), Betim e Contagem.
5.2.3
Considerações sobre o Plano Político Pedagógico da IES
escolhida.
Os currículos dos cursos de Direito da Faculdade Mineira de Direito da PUC
Minas, encontram-se estruturados em três eixos de formação, a saber: Eixo de
Formação Fundamental, Eixo de Formação Profissional e Eixo de Formação Prática
que se somam aos pressupostos gerais do Projeto Pedagógico, ancorados na
indissociabilidade entre Ensino, Pesquisa e Extensão (PUC Minas, 2007 p.58).
O primeiro Eixo de Formação Fundamental privilegiaria as disciplinas que
permitirão ao aluno o desenvolvimento do raciocino crítico, e o conduzirão a
necessária autonomia intelectual. Sendo que seria através do estudo e da pesquisa
nas áreas da Filosofia, da Sociologia, da Cultura Religiosa, da Psicologia e das demais
disciplinas que compõem esse eixo, se esperaria que o aluno desenvolva a
capacidade de ser partícipe ativo no processo de aprendizagem (PUC Minas, 2007).
As disciplinas que compõem este eixo têm uma maior concentração nos dois
primeiros períodos do curso, encontrando se, contudo, disseminadas pelos demais
períodos até o 10º com a disciplina de Ética e Estatuto da Advocacia e da Ordem dos
Advogados do Brasil (PUC Minas, 2007).
112
Já o Eixo de Formação Profissional abrangeria as seguintes disciplinas: Direito
Administrativo, Direito Civil, Direito Constitucional, Direito do Trabalho, Direito
Econômico, Direito Empresarial, Direito Financeiro e Finanças Públicas, Direito
Internacional Público e Privado, Direito Penal, Direito Previdenciário, Direito
Processual Civil, Direito Processual do Trabalho, Direito Processual Penal, Direito
Tributário, Teoria da Constituição, Teoria do Estado, Teoria Geral do Direito e Teoria
Geral do Processo, algumas das quais sofreram os desmembramentos necessários à
acomodação do seu conteúdo programático (PUC Minas, 2007).
O Eixo de Formação Prática é desenvolvido pelo Núcleo de Prática Jurídica
através do Estágio Supervisionado dividido em duas grandes categorias: o Estágio
Supervisionado Prática Real e o Estágio Supervisionado Prática Simulada, oferecidas
nos dois últimos anos do curso (idem).
Como relata o plano, toda a articulação entre os elementos que compõem os
três eixos estruturantes do curso se realiza com a participação ativa de todo o corpo
docente e discente, em todos os âmbitos de execução da Proposta Pedagógica do
Curso, seja na revisão semestral do conteúdo programático das disciplinas, seja nas
reuniões dos núcleos de disciplinas até a renovação e incrementação do acervo
bibliográfico, através do Sistema de Gestão Acadêmica, bem como nos encontros
mensais entre os Colegiados e os representantes discentes, como será adiante
minudenciado (PUC Minas, 2007).
A filosofia deste curso, de acordo com os dados da Faculdade Mineira de
Direito – FMD está embasada nos princípios cristãos da verdade, justiça,
solidariedade e liberdade, de modo a propiciar a formação integral do homem e do
profissional.
Abaixo um quadro explicativo da divisão dos eixos a partir de sua cargahorária correspondente:
113
Tabela 14 - Síntese do Currículo Pleno
Fonte: Plano Político Pedagógico, 2007 p. 73
A divisão em eixos apresentada pela IES segue determinação da Resolução
n°. 09 de 2004, do CES/MEC, que ao instituir as diretrizes curriculares nacionais aos
cursos de direito, estabeleceu três eixos de formação: fundamental, profissional e
prática.
Como foi possível identificar o Plano Político Pedagógico (PPP) da IES
analisada, não traz inovações no sentindo de dialogar com outros saberes, acaba por
reproduzir a legislação, repetindo a lógica do conhecimento positivado em detrimento
de contextualizar seu PPP à realidade a qual os seus cursos de Direito estariam
inseridos.
5.2.4
Ementa da Disciplina de Direitos Humanos da Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais
A análise prosseguiu com a definição dos componentes curriculares. A
princípio, centrou-se na análise dos conteúdos curriculares (disciplina de Direitos
Humanos), seguindo-se as orientações normativas já mencionadas, para os três eixos
de formação: fundamental, profissional e prática. Passou-se, então, para uma análise
e avaliação do corpo curricular no sentido de compreender a sua estrutura de acordo
com o projeto pedagógico.
114
A disciplina aqui considerada, como justificado acima, foi a disciplina de
Direitos Humanos, que compõe a grade de disciplinas do currículo da IES e faz parte
do Eixo de Formação Fundamental.
De acordo com a ementa da disciplina de Direitos Humanos e Fundamentais
(DH), a disciplina tem uma carga horária de 30h, e é lecionada pelos professores no
3º período e faz parte do Eixo de Formação Fundamental. A matéria é nessa
instituição obrigatória.
Figura 5 - Ementa da disciplina de Direitos Humanos e Fundamentais da PUC
Minas
DISCIPLINA: DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS
Carga Horária: 30h
Créditos: 02
Período: 3o
Eixo de formação: FUNDAMENTAL
Núcleo: 04
Classificação: OBRIGATÓRIA
EMENTA: DIREITOS HUMANOS NA ORDEM JURÍDICA INTERNACIONAL
OBJETIVOS: Estudar os temas ligados aos direitos fundamentais da pessoa humana e sua
defesa. Provocar o debate e o interesse a respeito da proposta contida na Declaração dos Direitos
do Homem, da ONU, art. XXVI, nº 2. Estudar o sistema normativo brasileiro no âmbito da
legislação material e processual sob a ótica da defesa dos direitos do homem e do cidadão.
Fonte: Projeto Político Pedagógico, PUC Minas 2007.
Abaixo a grade currículo do 3º período, demonstrando o que foi explicado
acima.
115
Figura 6 - Grade curricular do 3º período – carga horária, núcleo, departamento
e pré-requisitos
Fonte: Projeto Político pedagógico da PUC Minas (2007).
Sobre a ementa da disciplina encontrada, resumida, os objetivos da disciplina
são: estudar os temas ligados aos direitos fundamentais da pessoa humana e as
defesas. Provocar o debate e o interesse a respeito da proposta contida na Declaração
dos Direitos do Homem, da ONU, art. XXVI, n: 02. Estudar o sistema normativo
brasileiro no âmbito da legislação material e processual sob a ótica da defesa dos
direitos do homem e do cidadão (PUC Minas, 2007).
Sobre o artigo supracitado ele dispõe que:
Artigo 26.º
Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo
menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O ensino
elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional deve ser generalizado;
o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade,
em função do seu mérito. A educação deve visar à plena expansão da
personalidade humana e ao reforço dos direitos do homem e das liberdades
fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre
todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos, bem como o
desenvolvimento das atividades das Nações Unidas para a manutenção da
paz. (ONU).
O título da ementa faz a seguinte menção: “Direitos Humanos na ordem jurídica
Internacional”, e cita o artigo da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do
Cidadão. Tal fato, faz lembrar do artigo, “Análise do currículo da área de concentração
em direitos Humanos: tensões e desafios da pós-graduação em direito Na USP, UFPA
116
E UFPB”, de autoria de Ingrid Viana Leão e Camila Magalhães Carvalho (2014), citado
no capítulo anterior sobre análise dos artigos Publicados no CONPEDI.
Apesar das autoras se referirem ao ensino dos Direitos Humanos na pósGraduação, e naquele momento da análise terem sido desconsiderados, agora
contribuem para a compreensão da ementa aqui analisada, pois há coincidências para
esta análise aqui proposta.
Pois, para as autoras sobre os Direitos Humanos no ensino superior, demonstra
que uma das vias de entrada do tema nas universidades foi à disciplina Direito
Internacional dos Direitos Humanos, em regra focada no estudo das normas
internacionais sobre o tema. Foi exatamente como a PUC Minas acolheu em sua
grade curricular a disciplina de Direitos Humanos, focando-a como as autoras
demonstram a partir dos Direitos Humanos sob a perspectiva do Direito Internacional.
Assim, apenas a deliberação para escrever sobre direitos humanos não se
mostra suficiente para o fortalecimento de um campo de pesquisa. E para fazer
emergir os direitos dos subalternizados a partir dos Direitos Humanos. (LEÃO E
CARVALHO, 2014).
De acordo com Douzinas (2009), citado pelas autoras, falar em direitos
humanos se tornou um consenso, “uma espécie de mantra, cuja repetição alivia a
dolorosa lembrança das infâmias” (LEÃO; CARVALHO, 2014, p. 09). Uma concepção
de direitos humanos que promova a sua defesa por si mesmo está insuficiente para
um momento em que as violações de direitos humanos permanecem e as exclusões
se aceleram.
Santos (2009) explica que os Direitos Humanos, se pensados como
instrumental para proteção da dignidade humana e, contemporaneamente, como
linguagem para emancipação social, e logo, enquanto campo de estudo (dimensão
acadêmica) requer outras condições para produção do conhecimento, que se
distanciem do paradigma positivista dominante da formação e da prática jurídicas.
(...) defendo uma posição epistemológica antipositivista e procuro fundamentala a luz dos debates que então se travavam na física e na matemática. Ponho
em cansa a teoria representacional da verdade e a primazia das explicações
causais e defendo que todo o conhecimento cientifico e socialmente
construído, que o seu rigor tem limites inultrapassáveis e que a sua objetividade
não implica a sua neutralidade. (SANTOS, 2008, p. 8).
117
Assim, enfrentar o paradigma dominante é recusar a ideia de um conhecimento
neutro, bem como da separação radical entre sujeito e objeto de pesquisa como
pressuposto da objetividade científica, postulado do paradigma positivista (LEÃO;
CARVALHO, 2014, p.10). Seria necessário se afastar da ideia de Direitos Humanos
sob a perspectiva internacional para se discutir os Direitos Humanos no âmbito local,
de acordo com o contexto da realidade de cada curso superior.
Outro aspecto importante que foi evidenciado na “grade curricular” é que a
disciplina com a menor carga horária é a de Direitos Humanos, apenas 30 horas aula,
diferente das outras disciplinas. Retomando as teorias curriculares, outras conclusões
podem ser retiradas a partir dessa breve análise.
118
6
CONCLUSÃO
É chegado o momento tão esperado de concluir essa pesquisa, que é
resultado de que um longo e árduo caminho percorrido. A definição do problema, das
hipóteses e dos objetivos a serem alcançados, significaram apenas uma pontinha no
universo de tudo que foi feito até aqui. Mas, sem isso seria impossível chegar a algum
ponto.
É com grande satisfação, uma ponta de frustração, misturada com uma
sensação de dever cumprido, ou não, que este capítulo enuncia as considerações
finais desse trabalho.
Porém, não significa que a pesquisa tenha esgotado todo universo proposto.
Alcançou, apenas, em alguma medida, o que se propôs identificar, ainda que para
alguns possa não parecer suficiente. Esse trabalho noticia ainda possibilidades de
continuação,
silêncios
identificados
sobre
determinadas
temáticas
(adiante
comentadas) e de perguntas que ainda não foram respondidas.
O presente trabalho constituiu-se de uma investigação e uma análise sobre o
ensino jurídico brasileiro e o currículo. Trabalhou-se a partir do conceito de alteridade
proposto por Emmanuel Lévinas e de ecologia dos saberes de Boaventura de Sousa
Santos. Seu objetivo foi verificar “em que medida o ensino jurídico brasileiro contribui
para a formação dos bacharéis em direito, no que tange a alteridade.
Para tanto, a pesquisa se dividiu em três partes diferentes, uma da
apresentação das teorias curriculares que seriam referência no trabalho, explicitando
os conceitos chave. Em seguida uma incursão histórica sobre o ensino jurídico e as
diretrizes curriculares. Por fim, apresentou-se os dois estudos, um sobre o panorama
dos artigos publicados sobre a área no Conselho Nacional de Pesquisa e Pósgraduação em Direito – CONPEDI e outro sobre a análise de IES da Região
Metropolitana de Belo Horizonte – RMBH
Estudar o ensino jurídico teve uma motivação peculiar, clareada na
apresentação do trabalho. Mas, analisar o ensino jurídico e o currículo sob a
perspectiva da alteridade (em Lévinas), sem dúvidas recebeu a influência e um
esforço contínuo do Professor Dr. Erisvaldo Pereira dos Santos, orientador dessa
pesquisa.
O primeiro contato com as leituras densas do filósofo Lévinas se deu a partir
da Disciplina de Direitos Humanos e Diversidade, ministradas pelo Professor, no
119
âmbito do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFOP. Durante a disciplina
se discutia a questão da tolerância, da diferença, do outro e da alteridade.
Durante o percurso inicial de definição dos referencias teóricos que seriam
utilizados, Lévinas sempre foi considerado. Mas, a autora ainda se perguntava, caso
se confirmasse a hipótese inicial de que o ensino jurídico não contribui ou contribui
insuficientemente para a formação do bacharel em direito no que tange a alteridade,
como seria possível fazer emergir nesse ensino a alteridade?
Assim como Osin e Costa (2011), se entendeu aqui a necessidade de uma
“construção pedagógica em busca da alteridade”, e um dos motivos seria porque, de
acordo com o argumento construído, o paradigma jurídico-dogmático que domina o
ensino nas faculdades de direito não tem conseguido ver que na sociedade circulam
várias formas de poder, de direito e de conhecimento que vão muito além do que cabe
nos seus postulados (ORSIN; COSTA, 2011, p.7465).
É importante repetir isso tudo, porque, como ficou explicitado (e será revisitado
rapidamente a seguir) nos capítulos desse trabalho identificou-se que tal ensino
preconizaria a eliminação de qualquer elemento extra normativo, e as faculdades de
direito acabam criando uma cultura de extrema indiferença ou exterioridade do direito
diante das mudanças experimentadas pela sociedade. Enquanto locais de circulação
dos postulados da dogmática jurídica, têm estado distantes das preocupações sociais
e têm servido, em regra, para a formação de profissionais sem um maior
comprometimento com os problemas sociais (idem).
Concordando com as autoras o presente estudo, também se concluiu que, no
âmbito das instituições de ensino jurídico, há uma pluralidade de realidades jurídicosociais não percebidas pelas instituições. A academia poderia ter sensibilidade e
capacidade para construir a alteridade nos espaços de diálogo. Por isso Santos (2007)
foi importante para esse trabalho, por trazer a ecologia dos saberes como foi visto.
Retomando ao primeiro capítulo que trouxe, também, as teorias curriculares.
Essas que se afastaram do entendimento das teorias tradicionais que pregavam certa
“neutralidade” dos currículos, e se aproximaram das teorias críticas. Partiu-se do
princípio que o currículo carrega marcas das relações sociais e do poder; que o
currículo reproduz, culturalmente, estruturas sociais; e que está inserido em um
aparelho que transmite a ideologia dominante, e foi possível concluir que, em suma,
o currículo é também um território político. Para a partir desse ponto analisar o ensino
jurídico e o currículo do mesmo.
120
Além disso, demonstrou-se como as grades curriculares têm a dupla função de
proteger uns saberes e excluir outros, e se manifestam no ensino jurídico em
detrimento do acolhimento, dos saberes do “outro”, da ecologia dos saberes e da
alteridade.
Ecologia dos saberes e alteridade nomeiam os subtítulos desse primeiro
capítulo, são conceitos primordiais para o trabalho. No âmbito da ética da alteridade,
o ser humano se torna acolhedor de todo o outro que ao Eu se apresenta interpelando
a responsabilidade. A dimensão da alteridade pensada por Lévinas provoca uma
mudança interior, aspirando uma sociedade melhor para se viver. Calcado na
subjetividade acolhedora do rosto, o direito não se reduzirá a uma racionalidade
procedimental que dita códigos, normas, responsabilidade, mas se tornará
promovedor da paz e do bem para todos (LÉVINAS, 2005, p. 294).
Esse mesmo capítulo, após elucidar os conceitos chaves (currículo, alteridade,
ecologia dos saberes), se propôs a realizar uma incursão histórica sobre o ensino
jurídico e o currículo. Estudou-se os fenômenos sociais que permearam as mudanças
na estrutura curricular do ensino jurídico, porque sem considerar toda a trajetória de
sua criação em meados do século XIX, até os dias atuais, poderia conduzir a pesquisa
a equívocos analíticos.
Através do estudo histórico se revelou o ensino jurídico que se pretendeu
perpetuar até os dias de hoje e quais os fenômenos que o influenciaram. Ainda,
compreendeu-se se o ensino jurídico estava preocupado com as questões sociais. A
importância de se refazer esse caminho histórico se revelou, como já citado no
trabalho, Wolkmer (2002) ao acentuar que, para promover uma nova concepção
histórica das fontes, das ideias e das instituições impõe-se rever criticamente as
ações, os acontecimentos e as produções do passado no que tange às práticas e
regulamentações sociais.
Houve um intuito de avaliar se há emergência e voz ao “outro” nesses currículos
e na história desse ensino. Entre os resultados obtidos, foi possível identificar que o
currículo do ensino jurídico para formação do bacharel historicamente contribui pouco
para a compreensão e a afirmação de um direito que considere a questão da
alteridade. Em virtude de tratar de um campo de formação e atuação profissional
constituído para garantir a proteção dos direitos patrimoniais, econômicos, em
detrimento dos direitos sociais. Este pode ser o motivo pelo qual os o currículo desse
121
campo preconizar disciplinas codificadas, estanques da realidade social ao qual os
bacharéis estariam inseridos.
Reiterando o que foi dito, embora tenham ocorrido progressos ao longo do
tempo com relação às diretrizes do ensino jurídico e sua história, ficou evidenciado
como o ensino jurídico brasileiro sempre teve uma influência econômica muito forte
em detrimento da questão social. A influência econômica está expressa no excesso
de disciplinas voltadas para a proteção patrimonial e financeira. Ficou evidente
também como o currículo expressa os saberes dominantes, puramente legislados em
detrimento dos saberes locais contextualizados.
Ainda foi possível identificar como é praticamente ausente as disciplinas que
dialogam com a alteridade e estão preocupadas em formar os bacharéis para o trato
com o “outro”, com a realidade social.
No próximo capítulo que analisou as publicações do CONPEDI, na primeira
análise (os artigos sobre currículo), sabendo que o objetivo precípuo dessa revisão foi
identificar se as publicações sobre o currículo do ensino jurídico, questionam, ou
trazem contribuições sobre a formação do bacharel em direito no que concerne a
alteridade.
Foi possível identificar que apesar dos artigos dessa revisão trazerem aspectos
em comum sobre a crise do ensino jurídico brasileiro e abordagens sobre o currículo,
a princípio nenhum deles explorou a questão da alteridade no currículo ou a ecologia
dos saberes como formas de contribuir positivamente para a formação dos bacharéis
em Direito.
No entanto, relatam problemas do ensino jurídico e compartilham críticas em
comum. Críticas que se repetem entre eles por exemplo, podemos citar: a impetuosa
crise que assola o ensino jurídico, um dos autores se ocupa ainda em descrever a
crise que seria de cunho, estruturais quanto as questões funcionais e operacionais;
funciona, no âmbito às formas administrativas do ensino; e, didática pedagógicas e ao
currículo dos cursos (MAILLART e NASPOLINI SANCHES, 2011).
Falando do currículo, os autores concordam que em geral é composto de
matérias codificadas, dogmáticas. Normalmente é fixo ou pouco flexível, deixando
pouco espaço para a busca de formação autônoma para o aluno. Poucos artigos
utilizaram as teorias críticas para confrontar a temática curricular, Dias (2012) citou
Basil Bernstein e Rosa Castro e Martins (2010) que apresentaram críticas a pedagogia
da “transmissão” fazendo uma referência indireta aos estudos de Freire.
122
Dentre as contribuições para este estudo, os autores trazem aportes para
sustentar outras possibilidades para a mudança de paradigma do ensino jurídico
como: um ensino jurídico emancipatório (DIAS, 2012; ALVES NETO, 2011), do valor
da interdisciplinaridade, e da reflexão crítica e interpretação que vá além da visão
positivista e estática do Direito (SALES e BARBOSA, 2012).
Na segunda análise desse capítulo, identificou-se que apenas dois artigos, a
princípio, traziam a questão da alteridade em seu bojo. A revisão constituiu um
material riquíssimo de análise que poderá servir como base para estudos posteriores.
No geral, dentre os artigos analisados, foi possível concluir que havia preocupação
constante e diretamente relacionada com a interdisciplinaridade, como forma
superação paradigma hegemônicos, consubstanciados em dogmas, códigos.
As pesquisas traziam referencias teóricos riquíssimos e críticos da situação
de crise do ensino jurídico, que também era constantemente denunciada entre as
pesquisas. Autores como, Freire com a “Pedagogia do oprimido” (1970), foi um dos
autores que mais encontrou espaço entre os trabalhos. Principalmente quando
queriam caracterizar o ensino jurídico como dotado de uma pedagogia da repetição,
da transmissão que lembrava a educação “bancária” e do currículo contextualizado
proposto pelo autor. Também pode-se citar o autor Edgar Morin (2000), ao trazer a
interdisciplinaridade e o paradigma do múltiplo como forma de superação desse
sistema.
Foi infeliz, porém, observar que diante desse panorama houve silenciamentos.
Não emergiu entre os assuntos pesquisados temas como: o ensino jurídico sob a
perspectiva do feminismo, do direito e afrodescendentes, indígenas e LGBT’s. O
“outro” não teve sua voz ouvida nesse ambiente de pesquisa.
As pesquisas silenciaram-se diante das injustiças epistemologias sofridas
pelo “diferente”. O que demonstra que elas, também, externalizam como o ensino
jurídico tem sido insuficiente na formação dos juristas para a compreensão da
alteridade e para a voz do “outro” nesse ensino.
O último capítulo pretendeu realizar um levantamento de todas as IES que
ofertariam cursos de Direito na RMBH. Foram identificados 40 cursos, dos quais 35
IES diferentes os ofertariam. A partir daí foi feita análise das grades curriculares, para
identificar possíveis disciplinas que se ocupariam de problematizar direitos dos
subalternizados. Feito isso, foi analisado uma ementa (Disciplinas de Direitos
Humanos) e parte do Plano Político Pedagógico da mesma IES.
123
Da análise dessa ementa observou-se que a PUC Minas acolheu em sua
grade curricular a disciplina de Direitos Humanos, focando-a a partir dos Direitos
Humanos sob a perspectiva do Direito Internacional. Assim, apenas a deliberação
para escrever sobre direitos humanos não se mostra suficiente para o fortalecimento
de um campo de pesquisa. Para fazer emergir os direitos dos subalternizados a partir
dos Direitos Humanos. (LEÃO; CARVALHO, 2014).
De acordo com Douzinas (2009), citado pelas autoras, falar em direitos
humanos se tornou um consenso, “uma espécie de mantra, cuja repetição alivia a
dolorosa lembrança das infâmias” (LEÃO; CARVALHO, 2014, p. 09). Uma concepção
de direitos humanos que promova a sua defesa por si mesmo está insuficiente para
um momento em que as violações de direitos humanos permanecem e as exclusões
se aceleram.
Santos (2009) explica que os Direitos Humanos, se pensados como
instrumental para proteção da dignidade humana e, contemporaneamente, como
linguagem para emancipação social, e logo, enquanto campo de estudo (dimensão
acadêmica) requer outras condições para produção do conhecimento, que se
distanciem do paradigma positivista dominante da formação e da prática jurídicas.
(...) defendo uma posição epistemológica antipositivista e procuro
fundamenta-la a luz dos debates que então se travavam na física e na
matemática. Ponho em cansa a teoria representacional da verdade e
aprimazia das explicações causais e defendo que todo o conhecimento
cientifico e socialmente construído, que o seu rigor tem limites
inultrapassáveis e que a sua objectividade não implica a sua
neutralidade.(SANTOS, 2008, p. 8).
Concluiu-se a partir da análise dos currículos, mais uma vez, se confirmou o
que vinha sendo explicitado através da incursão histórica sobre o ensino jurídico e o
currículo, se tornou visível nas publicações e agora também nas grades curriculares
praticadas pelas IES.Sendo que, o ensino jurídico preconiza pela disseminação de
saberes dominantes em detrimento dos saberes locais, produzindo violência
epistemológica e causando distanciamento do “outro”, do rosto do outro e do que
Lévinas preceitua da responsabilização com o próximo.
No período que compreendeu de outubro/2015 à março/2016 a autora deste
trabalho, esteve em contato com a realidade do Canadá, por ter sido contemplada
com uma bolsa do Governo Canadense para estudos em Quebec, na Université Laval,
124
ainda que brevemente, pesquisou sobre os currículos e as disciplinas que
compunham a grade curricular da formação dos bacharéis naquela instituição.
A título de curiosidade, ela identificou uma diferença latente entre as
disciplinas ofertadas na Universidade de Laval e as disciplinas ofertadas na RMBH.
Dentre elas é possível comentar a oferta da disciplina Minorités et ethnicité, ou seja,
Minorias e etnicidade (tradução livre). Este curso, de acordo com um resumo da
ementa,
para pesquisar as lógicas
de
perenidade
das minorias étnicas
contemporânea. Explora a reflexão antropológica sobre as noções de minorias, etnia,
identidade, transnacionalidade, sociedades multiculturais e diásporas. Questiona a
origem desses conceitos e expõe elementos estruturantes. No qual, o estudante se
envolve em estudo de casos de minorias étnicas contemporâneas, povos autóctones,
minorias nacionais, migrantes, refugiados.
Outras disciplinas que se gostaria de pontuar presentes nessa grade são
também: diversidade cultural; antropologia religiosa; cultura, história, identidade:
facetas de Quebec contemporâneo; sexualidades e culturas; introdução aos povos
autóctones do Canadá e Direito sob a perspectiva do Feminismo. Essa última
disciplina foi possível um contato direto com a professora que a ministra desde os
anos de 1990 na instituição. Em contrapartida, no Brasil o que se observou através
das Diretrizes curriculares, da história do ensino jurídico, das publicações no campo é
que estão distantes de abarcarem, assumindo como obrigatoriedade para que as IES
as incluam em seu currículo.
Assim, caberia aqui pensar a Universidade, nesse caso, os cursos de Direito,
que como espaço de formação, produção e transmissão do conhecimento, encontramse diretamente vinculada à estrutura e funcionamento da sociedade e pode-se
observar, a partir da modernidade que essa instituição tem buscado estabelecer uma
construção
de
saber
autônomo
face
à
Religião
e
ao
Estado.
Com as mudanças sociais ocorridas a partir do século XX e das lutas e políticas
delas decorrentes, a educação e a cultura passam a ser consideradas como áreas
intrínsecas à construção da cidadania, “fazendo com que, além da vocação
republicana, a universidade se tornasse também uma instituição social inseparável da
idéia de democracia e de democratização do saber”. (CHAUI, apud. RAHME; DINIZ;
MAIA, 2014 p.137)
Como se vê as IES não tem incorporado como perspectiva de formação do
bacharel em Direito os direitos de segmentos sociais, ou o incorporam em sua ínfima
125
minoria. Nesse estudo, ressalta-se que o currículo, não é visto e não se trata de uma
simples seleção de saberes. O mesmo desvela-se como centro de tensões.
Exige-se que se reflita sobre o direito, no que ele é, pois, sem tal reflexão,
acaba-se por preconizar um ensino jurídico, o tradicional, que só transmite a lei do
mais forte e chama de não jurídico o direito dos subalternizados, para afinal negar o
que já se chamou de “direito natural” (SANTOS apud LYRA FILHO 1980 p. 08).
Neste ínterim, confirma-se sabiamente o que foi dito:
A formação jurídica, hoje oferecida ao estudante da RMBH, negligencia a
realidade social. Em uma região com altos índices de criminalidade, a
explosão da população carcerária em andamento e o alto grau de
reincidência que, apesar de não ser de responsabilidade do bacharel em
Direito, não o forma para ser capaz de propor e desenvolver políticas públicas
para solução destes problemas ( ZANARDI; ZANARDI 2013. p. 1476).
Com efeito, vislumbra-se desse panorama a premente necessidade de uma
reforma, aqui advoga-se a favor da inclusão de outros saberes, da adequação
contextual desse currículo, que se incluam não apenas os saberes codificados e os
que expressam a elitização, a patrimonialização do Direito. Para tanto, as políticas de
desenvolvimento das instituições universitária deveriam orientar-se ademais para a
compreensão do seu entorno e sua história.
126
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Currículo e Ensino superior.
134
APÊNDICES 1 – Panorama da análise dos artigos do Conpedi (2006-2014)
Explora o gênero currículo em quais aspectos?
Metodologia
ANO Título
2006
A TRANSVERSALIZAÇÃO DA ÉTICA NOS CURSOS
JURÍDICOS
Hist/análise
documental/bibi
autor e ano
o presente artigo buscará um enfoque no histórico dos cursos de
Direito no Brasil, especificamente quanto à previsão de uma
disciplina que trata da Ética, no intuito de formar profissionais que
tenham suas atividades pautadas em valores éticos, conforme a
previsão da Resolução 09/04, sobre o perfil do egresso.
FERREIRA; ANDRADE,
Assim, a proposta a ser apresentada, baseia-se na transversalização
2006
do ensino da ética, ou seja, na sua aplicação em todas as disciplinas
constantes do currículo jurídico, dado a impossibilidade de pensar
em qualquer área do Direito descontextualizada de valores éticos,
pois o seu exercício já supõe a priori um valor, que é o valor da
justiça.
RODRIGUEZ, 2007
o autor tenta refletir sobre seus primeiros anos de experiência
docente (2002-2007) em cinco instituições diferentes. Este artigo
procura dar forma à minha percepção da agressividade dos alunos
no
processo de aprendizado do direito. Especialmente quando se trata Apenas cita a palavra currículo e não comenta qualquer aspecto,
a não ser no sentido de disciplinas que poderiam ser incluida nos
de alunos
iniciantes, encontrei muita resistência e insegurança nas disciplinas anos iniciais
que ministrei, o
que me levou a procurar referências que me permitissem formular o
problema e buscar
meios para lidar com ele.
2008
POR UMA PROPOSTA DE METODOLOGIA DO
ENSINO DO DIREITO PENAL BRASILEIRO NO
SÉCULO XXI.
BONFIM, 2008
fala em crise do ensino jurídico e informa três pontos nos quais
O presente artigo fala a respeito da metodologia e método a serem
acredita haver uma crise. No concernente à metodologia, “A
utilizados no ensino do direito penal pós-moderno. Indica haver uma
terceira crise do ensino jurídico no Brasil está relacionada com a
defasagem do currículo do direito penal nas Faculdades de
(total e absoluta) falência do método clássico de ensino, que
Direito.
padece de muitas anomalias.”
2009
SABERES DAS DISCIPLINAS E SABERES
PEDAGÓGICOS: OS DESAFIOS DO ENSINO DA
HISTÓRIA DO DIREITO
BACELAR, 2009
2009
O ENSINO DOGMÁTICO DO DIREITO COMO
ELEMENTO LIMITADOR À UNIVERSALIZAÇÃO DO
ACESSO À JUSTIÇA
SANCHES; PEREIRA,
2009
2007
A GESTÃO DA ONIPOTÊNCIA: ENSINAR DIREITO A
INICIANTES
estudo de caso
hist/análise
documental/bibi
Hist/análise
documental/bibi
Hist/análise
documental/bibi
Hist/análise
documental/bibi
2010
2010
estudo de caso
o ensino jurídico somente abriu-se à inclusão da Ética como
disciplina obrigatória em seus cursos no ano de 1996, com a
edição da portaria ministerial 1886/96, que fixou o currículo
mínimo nacional do curso jurídico. Dessa forma, o ensino da
Ética foi incluído no rol das matérias fundamentais, sendo
dividida em Ética Geral e Ética Profissional. Entretanto, não
obstante a apresentação da referida disciplina como um avanço
para o ensino jurídico, a mesma fora ministrada apenas
conforme normas técnicas e códigos de Ética do Advogado, ou
melhor, aprisionada numa única disciplina, não permeando todo
o curso jurídico.
PARADIGMAS CURRICULARES PARA A
CONSTRUÇÃO DO PROJETO POLÍTICO
PEDAGÓGICO DOS CURSOS DE DIREITO:
EDUCAÇÃO PARA A CIDADANIA,
RESPONSABILIDADE SOCIAL E
A PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM DIREITO
NO BRASIL: UM OLHAR SOBRE AS DISCIPLINAS
PEDAGÓGICAS OFERECIDAS EM SEUS
PROGRAMAS
ROSA CASTRO;
MARTINS, 2010
OLIVEIRA, 2010
Com a instituição das Diretrizes Curriculares Nacionais para os
Cursos de Direito, trazidas pela Resolução n° 9, de 29 de setembro
de 2004, emanada do Conselho Nacional de Educação – CNE,
restou inconteste que o caráter da formação oferecida na graduação
jurídica jurídico,
deve estar
permeado sob
de interdisciplinaridade,
ensino
estruturado
o molde positivista especialmente
e conservador
cujo objetivo central da formação do bacharel em Direito é a
aplicabilidade da norma, destituída da reflexão acerca da
desigualdade, impede a materialização do acesso à Justiça para
todos. O pensamento
caracteriza
o ensino
positivista
realiza-se
uma análisecoerente,
do perfilque
atual
da educação
jurídica,
frente a
tantas mudanças decorrentes da evolução social. Apresenta-se,
também, o perfil do estudante de Direito e enfatiza-se sua relação
com as novas mídias, além de observar a importância da utilização
de tecnologias virtuais na educação jurídica.
trata sobre currículos das pós graduação do direito e não da
graduaçãoTrata da pós-graduação stricto sensu possui, como papel
fundamental, a formação para a docência e para a pesquisa. Que em
. Cada programa de pós-graduação em Direito no país disponibiliza,
no "site" da CAPES, a relação das disciplinas contempladas em
seu currículo. Diante desta relação, este estudo foi à procura de
disciplinas relacionadas com área pedagógica em cada um dos 62
programas que disponibilizaram seus dados
Comenta a questão da interdisciplinaridade e critica o excessivo
dogmatismo
fala do modelo positivista, da dogmática e da ausencia da
reflexão social
Assim sendo, apresenta-se uma crítica à metodologia tradicional,
“Pedagogia da Transmissão”, utilizada pela maioria dos
professores das ciências jurídicas. educação jurídica atual ainda
é pautada pelo formalismo no ensino, decorrente da exigência
deste no exercício da
não trata do currículo do ensino superior jurídico. Pos graduaçao
e não graduação.
135
2011
Hist/análise
documental/bibi
A UTILIZAÇÃO DO PORTFÓLIO EM CURSOS
JURÍDICOS
COMO INSTRUMENTO DE ENSINO E AVALIAÇÃO
DAS ATIVIDADES
COMPLEMENTARES
MUSSE, 2011
trata sobre as atividades complementares exigidas nas diretrizes
currículares, só cita ensino jurrídico nas palavras-chave
Hist/análise
documental/bibi
O objeto da presente pesquisa são as críticas dirigidas ao Ensino
Jurídico brasileiro por vários autores que se ocupam do tema desde o
século passado. Com o objetivo de responder à questão de quais são
essas críticas, as mesmas são divididas em: questões estruturais,
questões funcionais e questões operacionais. Serão destacadas, no
MAILLART; NASPOLINI
âmbito da estrutura, críticas ao paradigma epistemológico. No âmbito
SANCHES, 2011
funcional, críticas à formação para o mercado de trabalho que levam
a problemas de identidade e legitimidade dos bacharéis. Por fim, no
âmbito operacional as críticas serão dirigidas às formas
administrativas do Ensino, à metodologia didático-pedagógica e ao
currículo dos cursos.
PEREIRA, 2011
Hist/análise
documental/bibi
trata sobre as modificações trazidas pela portaria 1889/2004 no
tocante ao Núcleo de Prática Jurídica das Universidades. As
mudanças impressas no currículo dos cursos jurídicos, decorrentes,
em particular, das
reformas resultantes da operacionalização da portaria 1.889/2004,
trouxeram impactos significativos na formação do bacharel em
Direito, considerando a pertinência do fortalecimento da dimensão
social, ética e política na construção de possibilidades de superação
do modelo social excludente e limitador do acesso à Justiça
ALVES NETO, 2011
estudo de caso
A presente pesquisa objetiva analisar as diretrizes curriculares do
currículo do curso de Direito da Universidade Federal do Acre,
averiguando em que medida o saber jurídico proporcionado à
formação do bacharel em direito, tem sido orientado por uma
perspectiva dialética e crítica, que permita uma formação mais
comprometida com a realidade do Estado, com um ensino jurídico
defensor de um direito emancipatório e de realização dos
fins sociais do ordenamento jurídico e para uma sociedade mais
humana e solidária.
tenho a Tese que deu oriegem a esse trabalho O trabalho aponta
como pontos nevrálgicos que o currículo do curso ainda revestese de uma concepção
positivista, de um currículo fragmentado quanto aos eixos de
formação e carece de um ensino
de direito e saber jurídico mais voltado para a realidade
amazônica, com toda a sua
biodiversidade, carecedora de ser contemplada na formalização
e práxis curricular.
tentar-se-á, neste artigo, problematizar o Projeto Político Pedagógico
de organização de um Curso de Direito da Região sul do Brasil,
especificamente em atenção ao eixo de formação prática e sua
integração curricular com os demais eixos, na perspectiva de buscar
uma educação emancipadora em prol da formação de um bacharel
crítico, reflexivo e agente de transformação social. Para tal, me
utilizarei de alguns referenciais da sociologia da educação, em
especial os estudos e pesquisas desenvolvidos no campo
pedagógico por Basil Bernstein.
eorias podem subsidiar esta uma proposta de integração
curricular que viabilize uma educação emancipadora na
perspectiva do ensino jurídico. P. 02
Ao
discutirem os modos de gestão democrática, o currículo e as
práticas pedagógicas em escolas públicas, Leite e Hypolito
(2010, p. 10) tematizam que:
Bernstein (2000) considera a Educação como uma instituição
pública, basilar para a produção e reprodução das injustiças
distributivas. Argumenta que aspectos relacionados à forma, aos
conteúdos, ao acesso e às oportunidades da educação trazem
consequências, e, entre outros aspectos, podem enfatizar ou
comprometer possibilidades de afirmação, motivação e
imaginação.
Desta forma, a educação emancipadora (e a integração
curricular) não se opera de maneira simples e rápida, pois para
sua conformação há necessidade de se contrapor ao modelo
hegemônico um modelo contra-hegemônico (ou emergente), pois
como bem lembra Henry Giroux (2005, p. 03):
Os cidadãos de uma democracia global devem estar conscientes
da natureza interactiva de todos os aspectos da vida cultural,
espiritual e física. Isto significa ter um entendimento profundo da
2011
2011
2011
2012
estudo de caso
CRÍTICAS AO
ENSINO JURÌDICO BRASILEIRO: ASPECTOS
EPISTEMOLÓGICOS, FUNCIONAIS E
OPERACIONAIS
O NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA NO CURRÍCULO
DO CURSO DE DIREITO PARA O
FORTALECIMENTO DO ACESSO AO JUDICIÁRIO
NA FORMAÇÃO DO BACHAREL EM DIREITO
DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS E O
CURRÍCULO DO CURSO DE DIREITO DA UFAC:
PERCEPÇÃO DE DOCENTES E
DISCENTES
CURRÍCULO DE INTEGRAÇÃO E EDUCAÇÃO
EMANCIPADORA: REFLETINDO SOBRE O ENSINO
JURÍDICO
DIAS, 2012
Os currículos são, regra geral, compostos preponderantemente
de matérias codificadas, ou seja, dogmáticas. A duração do
curso é em média de 5 anos. O currículo é normalmente fixo ou
pouco flexível, deixando nenhum ou pouco espaço para a busca
de formação autonomamente pelo aluno. (RODRIGUES, 1993,
16) 8919
136
2014
ANÁLISE DO CURRÍCULO DA ÁREA DE
CONCENTRAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS:
TENSÕES E DESAFIOS DA PÓS-GRADUAÇÃO EM
DIREITO NA USP, UFPA E UFPB
estudo de caso
2014
estudo de caso
EDUCAÇÃO JURÍDICA E IGUALDADE MATERIAL:
ESTUDO DA CLÍNICA JURÍDICA DO CURSO DE
DIREITO DA UNIVERSIDADE DE FORTALEZA E SUA
REPERCUSSÃO NO CONTEXTO DO
CRESCIMENTO ECONÔMICO E DO
O artigo trata do debate sobre a estrutura curricular e formação
em nível de mestrado
Trata sobre os currículos da pos graduação de tres universidade em direitos humanos. O objetivo do estudo é compreender como
LEÃO; CARVALHO, 2014 avaliando precipuamente o currículo da disciplina de Direitos o currículo enfrenta as
Humanos
tensões entre um paradigma dominante na formação jurídica e
as concepções
epistemológicas para o campo de estudos em direitos humanos.
POMPEU; MARTINS,
2014
2014
O MODELO DO PROCESSO DE BOLONHA COMO
FUTURO POSSÍVEL PARA OS CURSOS DE
DIREITO DO BRASIL
CARNEIRO, 2014
2014
OS DESAFIOS DO ENSINO JURÍDICO BRASILEIRO:
CURRÍCULOS TRANSDISCIPLINARES PARA SE
ADEQUAREM AO MUNDO CONTEMPORÂNEO
ROSA; SILVA, 2014
Hist/análise
documental/bibi
Hist/análise
documental/bibi
analisa a clínica jurídica dos Cursos de Direito e sua repercussão na
compatibilização entre crescimento econômico e desenvolvimento
humano. Neste contexto, identificou que a partir da Constituição
Federal brasileira de 1988, denominada dirigente, garantiu-se a
aplicação
e a exigibilidade
judicial dos direitos
O presenteimediata
texto apresenta
breves considerações
sobre o passado, o
presente e o futuro dos
cursos de Direito do Brasil. Ao tratar do passado, rememora a
disciplina legal do ensino
jurídico brasileiro desde o surgimento dos primeiros cursos de Direito,
em 1827, até a reforma
curricular de 1994. Em seguida, trata da disciplina legal atualmente
vigente, centrada
principalmente na Resolução CNE/CES nº 9/2004. Ao final, especula
acerca das possíveis
transformações que a adoção do modelo do Processo de Bolonha,
em curso na Europa,
causaria na estruturação dos cursos de Direito de nosso país. O
objetivo do trabalho, como o
próprio nome já diz, é suscitar reflexões acerca do porvir do ensino
jurídico nacional, e
acrescentar algo à discussão acerca da possibilidade de superação
do modelo de curso de
Direito tradicionalmente adotado no Brasil.
PALAVRAS-CHAVE: Direito; Currículo; Bolonha.
discute a necessidade de uma reconfiguração dos currículos jurídicos
a fim de possibilitar que os egressos do curso de direito estejam
preparados para atuar e transformar a realidade social que os
circunda.transdisciplinaridade assume papel relevante na construção
de uma metodologia que atenda aos pressupostos do paradigma
emergente
Nesse diapasão, o Ministério
da Educação, em 2004, exigiu a inserção do eixo de formação
prática, representado pela
clínica jurídica nos currículos dos Cursos de Direito. Os
resultados obtidos, por meio da
137
APÊNDICE 2 - RELAÇÃO DAS IES QUE OFERTAM AS DISCIPLINAS
ANALISADAS
Disciplinas
FACULDADES / UNIVERSIDADE BH
Relações etnico raciais / História dos
povos indigenas e afrodescendentes
Estácio Elet
DIREITOS HUMANOS OB
DIREITOS HUMANOS OP
Nome da IES - Sigla : (1139) FACULDADE DE ESTUDOS
1 ADMINISTRATIVOS DE MINAS GERAIS - FEAD-MG - FEAD - MG
0
Nome da IES - Sigla : (1346) FACULDADE BATISTA DE MINAS
GERAIS - FBMG
1
2
3 Nome da IES - Sigla : (1484) FACULDADE IBMEC - IBMEC
4
Nome da IES - Sigla : (1509) FACULDADE ESTÁCIO DE SÁ DE
BELO HORIZONTE - FESBH
1
1
1
5 Nome da IES - Sigla : (1557) UNIVERSIDADE FUMEC - FUMEC
Nome da IES - Sigla : (1666) FACULDADE NOVOS HORIZONTES -
6 NOVOS HORIZONTES
7
Nome da IES - Sigla : (1668) FACULDADE DE NEGÓCIOS DE
BELO HORIZONTE - ESN ANHANGUERA
8
Nome da IES - Sigla : (1668) FACULDADE DE NEGÓCIOS DE
BELO HORIZONTE - ESN ANHANGUERA
0
1
30
Nome da IES - Sigla : (1818) FACULDADE PITÁGORAS DE BELO
9 HORIZONTE - FPAS
1
25
Nome da IES - Sigla : (1923) FACULDADE DE DIREITO PADRE
10 ARNALDO JANSSEN - FAJANSSEN
11
Nome da IES - Sigla : (216) CENTRO UNIVERSITÁRIO
METODISTA IZABELA HENDRIX - CEUNIH
12
Nome da IES - Sigla : (2171) INSTITUTO BELO HORIZONTE DE
ENSINO SUPERIOR - IBHES
13
Nome da IES - Sigla : (2311) FACULDADE DE CIÊNCIAS
JURÍDICAS PROFESSOR ALBERTO DEODATO - FCJPAD
1
0
20
1
15
10
1
5
1
0
Nome da IES - Sigla : (2450) FACULDADE PROMOVE DE BELO
14 HORIZONTE - PROMOVE
1
Nome da IES - Sigla : (2849) ESCOLA SUPERIOR DOM HELDER
15 CÂMARA - ESDHC
1
16 Nome da IES - Sigla : (2927) FACULDADE DEL REY - FDR
Nome da IES - Sigla : (30) UNIVERSIDADE JOSÉ DO ROSÁRIO
17 VELLANO - UNIFENAS
18
1
Nome da IES - Sigla : (3194) FACULDADE DE MINAS BH FAMINAS-BH
0
Nome da IES - Sigla : (338) PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE
19 CATÓLICA DE MINAS GERAIS - PUC MINAS
20
1
Nome da IES - Sigla : (343) CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON
PAIVA - NEWTON PAIVA
0
21 Nome da IES - Sigla : (344) CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA
Nome da IES - Sigla : (349) CENTRO UNIVERSITÁRIO DE BELO
22 HORIZONTE - UNI-BH
23
24
25
0
Nome da IES - Sigla : (3786) FACULDADE DE ENSINO DE MINAS
GERAIS - FACEMG
1
Nome da IES - Sigla : (575) UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS
GERAIS - UFMG
Nome da IES - Sigla : (663) UNIVERSIDADE SALGADO DE
OLIVEIRA - UNIVERSO
Total de representatividade
2
12
1
138
APÊNDICE 3 -RELAÇÃO DAS IES DA RMBH QUE OFERTAM DISCIPLINAS
Disciplinas
FACULDADES / UNIVERSIDADE
CIDADE
Direitos Humanos OB
DIREITOS HUMANOS OP
Nome da IES - Sigla : (13666) FACULDADE DE DIREITO DE
1 CONTAGEM - FDCON / (31)25576900
2
3
4
5
6
7
8
9
10
Contagem
Nome da IES - Sigla : (338) PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE
CATÓLICA DE MINAS GERAIS - PUC MINAS
Contagem
Nome da IES - Sigla : (14313) NOVA FACULDADE - NF
/(31)32730798
Contagem
Nome da IES - Sigla : (4766) FACULDADE UNA DE CONTAGEM FUNAC
Contagem
1
Nome da IES - Sigla : (14028) Faculdade Presidente Antônio
Carlos de Betim - FUNEC Betim
Betim
INDISPONIVEL
Nome da IES - Sigla : (338) PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE
CATÓLICA DE MINAS GERAIS - PUC MINAS
Betim
1
Nome da IES - Sigla : (4362) FACULDADE PITÁGORAS DE BETIM
- PITÁGORAS-BETIM
Betim
1
Nome da IES - Sigla : (638) FACULDADE DE DIREITO
MILTON CAMPOS - FDMC // (31) 3289 1934
Nome da IES - Sigla : (14151) Faculdade Presidente
Antônio Carlos de Nova Lima - FUNEC Nova Lima //
(31)3542-6079
Nome da IES - Sigla : (1670) FACULDADE ASA DE
BRUMADINHO - IECEMB - FAB /
Nome da IES - Sigla : (1314) INSTITUTO DE ENSINO
SUPERIOR JOÃO ALFREDO DE ANDRADE - IJAA // (31)
Nome da IES - Sigla : (4218) FACULDADE PEDRO
LEOPOLDO - FPL // (31) 3686-1461
Nome da IES - Sigla : (1174) FACULDADE DE SABARÁ SOECS // (31) 3241 2891
Nome da IES - Sigla : (1581) FACULDADE DA CIDADE DE
SANTA LUZIA - FACSAL // (31) 3079 9000
Nome da IES - Sigla : (1664) FACULDADE DA SAÚDE E
ECOLOGIA HUMANA - FASEH // (31) 21382900
Total de representatividade
Nova Lima
Nova Lima
INDISPONIVEL
Brumadinho
1
Juatuba
1
Pedro Leopoldo
0
Sabará
1
Santa Luzia
Vespasiano
INDISPONÍVEL
6
0
139
ANEXO 1- RESOLUÇÃO CNE/CES N° 9, DE 29 DE SETEMBRO DE 2004 - Institui
as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Direito
CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
CÂMARA DE EDUCAÇÃO SUPERIOR
RESOLUÇÃO CNE/CES N° 9, DE 29 DE SETEMBRO DE 2004 (*)
Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de
Graduação em Direito e dá outras providências.
O Presidente da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação,
no uso de suas atribuições legais, com fundamento no art. 9º, § 2º, alínea “c”, da Lei
nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961, com a redação dada pela Lei nº 9.131, de 25
de novembro de 1995, tendo em vista as diretrizes e os princípios fixados pelos
Pareceres CES/CNE nos 776/97, 583/2001, e100/2002, e as Diretrizes Curriculares
Nacionais elaboradas pela Comissão de Especialistas de Ensino de Direito, propostas
ao CNE pela SESu/MEC, considerando o que consta do Parecer CES/CNE 55/2004
de 18/2/2004, reconsiderado pelo Parecer CNE/CES 211, aprovado em8/7/2004,
homologado pelo Senhor Ministro de Estado da Educação em 23 de setembro de
2004,
Resolve:
Art. 1º A presente Resolução institui as Diretrizes Curriculares do Curso de Graduação
em Direito, Bacharelado, a serem observadas pelas Instituições de Educação Superior
em sua organização curricular.
Art. 2º A organização do Curso de Graduação em Direito, observadas as Diretrizes
Curriculares Nacionais se expressa através do seu projeto pedagógico, abrangendo o
perfil do formando, as competências e habilidades, os conteúdos curriculares, o
estágio curricular supervisionado, as atividades complementares, o sistema de
avaliação, o trabalho de curso como componente curricular obrigatório do curso, o
regime acadêmico de oferta, a duração do curso, sem prejuízo de outros aspectos que
tornem consistente o referido projeto pedagógico.
§ 1° O Projeto Pedagógico do curso, além da clara concepção do curso de Direito,
com suas peculiaridades, seu currículo pleno e sua operacionalização, abrangerá,
sem prejuízo de outros, os seguintes elementos estruturais:
140
I - concepção e objetivos gerais do curso, contextualizados em relação às suas
inserções
institucional, política, geográfica e social;
II - condições objetivas de oferta e a vocação do curso;
III - cargas horárias das atividades didáticas e da integralização do curso;
IV - formas de realização da interdisciplinaridade;
V - modos de integração entre teoria e prática;
VI - formas de avaliação do ensino e da aprendizagem;
VII - modos da integração entre graduação e pós-graduação, quando houver;
VIII - incentivo à pesquisa e à extensão, como necessário prolongamento da atividade
de ensino e como instrumento para a iniciação científica;
IX - concepção e composição das atividades de estágio curricular supervisionado,
suas diferentes formas e condições de realização, bem como a forma de implantação
e a estrutura do Núcleo de Prática Jurídica;
X -concepção e composição das atividades complementares; e,
XI - inclusão obrigatória do Trabalho de Curso.
§ 2º Com base no princípio de educação continuada, as IES poderão incluir no Projeto
Pedagógico do curso, oferta de cursos de pós-graduação lato sensu, nas respectivas
modalidades, de acordo com as efetivas demandas do desempenho profissional.
Art. 3º. O curso de graduação em Direito deverá assegurar, no perfil do graduando,
sólida formação geral, humanística e axiológica, capacidade de análise, domínio de
conceitos e da terminologia jurídica, adequada argumentação, interpretação e
valorização dos fenômenos jurídicos e sociais, aliada a uma postura reflexiva e de
visão crítica que fomente a capacidade e a aptidão paraa aprendizagem autônoma e
dinâmica, indispensável ao exercício da Ciência do Direito, da prestação da justiça e
do desenvolvimento da cidadania.
Art. 4º. O curso de graduação em Direito deverá possibilitar a formação profissional
que revele, pelo menos, as seguintes habilidades e competências:
I - leitura, compreensão e elaboração de textos, atos e documentos jurídicos ou
normativos,
com a devida utilização das normas técnico-jurídicas;
II - interpretação e aplicação do Direito;
III - pesquisa e utilização da legislação, da jurisprudência, da doutrina e de outras
fontes do Direito;
141
IV - adequada atuação técnico-jurídica, em diferentes instâncias, administrativas ou
judiciais,com a devida utilização de processos, atos e procedimentos;
V - correta utilização da terminologia jurídica ou da Ciência do Direito;
VI - utilização de raciocínio jurídico, de argumentação, de persuasão e de reflexão
crítica;
VII - julgamento e tomada de decisões; e,
VIII - domínio de tecnologias e métodos para permanente compreensão e aplicação
do Direito.
Art. 5º O curso de graduação em Direito deverá contemplar, em seu Projeto
Pedagógico e emsua Organização Curricular, conteúdos e atividades que atendam
aos seguintes eixos interligados deformação:
I - Eixo de Formação Fundamental, tem por objetivo integrar o estudante no
campo,estabelecendo as relações do Direito com outras áreas do saber, abrangendo
dentre outros, estudosque envolvam conteúdos essenciais sobre Antropologia,
Ciência Política, Economia, Ética,Filosofia, História, Psicologia e Sociologia.
II - Eixo de Formação Profissional, abrangendo, além do enfoque dogmático, o
conhecimentoe a aplicação, observadas as peculiaridades dos diversos ramos do
Direito, de qualquer natureza,estudados sistematicamente e contextualizados
segundo a evolução da Ciência do Direito e suaaplicação às mudanças sociais,
econômicas, políticas e culturais do Brasil e suas relaçõesinternacionais, incluindo-se
necessariamente, dentre outros condizentes com o projeto pedagógico,conteúdos
essenciais sobre Direito Constitucional, Direito Administrativo, Direito Tributário,
Direito Penal, Direito Civil, Direito Empresarial, Direito do Trabalho, Direito
Internacional eDireito Processual; e
III - Eixo de Formação Prática, objetiva a integração entre a prática e os conteúdos
teóricosdesenvolvidos nos demais Eixos, especialmente nas atividades relacionadas
com o EstágioCurricular Supervisionado, Trabalho de Curso e Atividades
Complementares.
Art. 6º A organização curricular do curso de graduação em Direito estabelecerá
expressamente as condições para a sua efetiva conclusão e integralização curricular
de acordo com o regime acadêmico que as Instituições de Educação Superior
adotarem: regime seriado anual; regime seria do semestral; sistema de créditos com
matrícula por disciplina ou por módulos acadêmicos, com a
adoção de pré-requisitos, atendido o disposto nesta Resolução.
142
Art. 7º O Estágio Supervisionado é componente curricular obrigatório, indispensável à
consolidação dos desempenhos profissionais desejados, inerentes ao perfil do
formando, devendo cada instituição, por seus colegiados próprios, aprovar o
correspondente regulamento, com suas diferentes modalidades de operacionalização.
§ 1º O Estágio de que trata este artigo será realizado na própria instituição, através do
Núcleo de Prática Jurídica, que deverá estar estruturado e operacionalizado de acordo
com regulamentação própria, aprovada pelo conselho competente, podendo, em
parte, contemplar convênios com outras entidades ou instituições e escritórios de
advocacia; em serviços de assistência judiciária implantados na instituição, nos
órgãos do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública ou ainda em
departamentos jurídicos oficiais, importando, em qualquer caso, na supervisão
das atividades e na elaboração de relatórios que deverão ser encaminhados à
Coordenação de Estágio das IES , para a avaliação pertinente.
§ 2º As atividades de Estágio poderão ser reprogramadas e reorientadas de acordo
com os resultados teórico-práticos gradualmente revelados pelo aluno, na forma
definida na regulamentação do Núcleo de Prática Jurídica, até que se possa
considerá-lo concluído, resguardando, como padrão de qualidade, os domínios
indispensáveis ao exercício das diversas carreiras contempladas pela formação
jurídica.
Art. 8º As atividades complementares são componentes curriculares enriquecedores
e complementadores do perfil do formando, possibilitam o reconhecimento, por
avaliação de habilidades, conhecimento e competência do aluno, inclusive adquirida
fora do ambiente acadêmico, incluindo a prática de estudos e atividades
independentes, transversais, opcionais, de interdisciplinaridade, especialmente nas
relações com o mercado do trabalho e com as ações deextensão junto à comunidade.
Parágrafo único. A realização de atividades complementares não se confunde com a
do Estágio Supervisionado ou com a do Trabalho de Curso.
Art. 9º As Instituições de Educação Superior deverão adotar formas específicas e
alternativas de avaliação, interna e externa, sistemáticas, envolvendo todos quantos
se contenham no processo do curso, centradas em aspectos considerados
fundamentais para a identificação do perfil do formando.
Parágrafo único. Os planos de ensino, a serem fornecidos aos alunos antes do início
de cada período letivo, deverão conter, além dos conteúdos e das atividades, a
143
metodologia do processo de ensino-aprendizagem, os critérios de avaliação a que
serão submetidos e a bibliografia básica.
Art. 10. O Trabalho de Curso é componente curricular obrigatório, desenvolvido
individualmente, com conteúdo a ser fixado pelas Instituições de Educação Superior
em função de seus Projetos Pedagógicos.
Parágrafo único. As IES deverão emitir regulamentação própria aprovada por
Conselho competente, contendo necessariamente, critérios, procedimentos e
mecanismos de avaliação, além das diretrizes técnicas relacionadas com a sua
elaboração.
Art. 11. A duração e carga horária dos cursos de graduação serão estabelecidas em
Resolução da Câmara de Educação Superior.
Art. 12. As Diretrizes Curriculares Nacionais desta Resolução deverão ser implantadas
pelas Instituições de Educação Superior, obrigatoriamente, no prazo máximo de dois
anos, aos alunos ingressantes, a partir da publicação desta.
Parágrafo único. As IES poderão optar pela aplicação das DCN aos demais alunos no
períodoou ano subseqüente à publicação desta.
Art. 13. Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação, ficando revogada
aPortaria Ministerial n° 1.886, de 30 de dezembro de 1994 e demais disposições em
contrário.
Edson de Oliveira Nunes
Presidente da Câmara de Educação Superior
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