DOENÇAS CRÔNICAS NÃO TRANSMISSÍVEIS N as últimas duas ou três gerações, a vida no Brasil transformou-se em muitos aspectos, a sociedade tornou-se predominantemente urbana, com padrões de trabalho e lazer; alimentação e nutrição; saúde e doença aproximando-se agora dos de países desenvolvidos. E GOVERNO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO SECRETARIA DE ESTADO DE SAÚDE SUPERINTENDÊNCIA DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA © 2012 Bianca Andrade Marun - Responsável pelo Setor de Monitoramento de Alimentos e Acompanhamento de Laudos, Divisão de Fiscalização de Alimentos Selma Moura Sobrinho da Paixão - Técnica do setor de Registro e Cadastro de Alimentos, Divisão de Fiscalização de Alimentos Documentos de referência para Guias de Boas Práticas Nutricionais: - www.anvisa.gov.br - Termo de Compromisso nº34, D.O.U. nº247, 26/12/2011 Editoração e Arte Gráfica: Eduardo Garcia Vila Maior - Núcleo de Informática e Informação ssa urbanização muito rápida desestruturou as formas tradicionais de vida e impôs um aumento de demanda na estrutura e nos serviços das cidades. Os padrões de trabalho e lazer para a maioria das pessoas também sofreram mudanças, assim como o perfil do consumo alimentar em decorrência das modificações que vão desde a produção até a preparação e o consumo dos alimentos, impactando no modo de adoecer e morrer da população. Esta transição para um modo de vida mais urbano, sedentário e com maior consumo de alimentos industrializados se reflete no cenário epidemiológico, fazendo com que o perfil das doenças enfrentadas pela população e das causas dos óbitos apresentem uma nova realidade. Ao longo das últimas quatro décadas, do mesmo modo que diminuíram os agravos por enfermidades infecciosas, aumentou numa proporção aproximada, o número de mortes por doenças cardiovasculares, tendo sido considerada em 2006 pela Sociedade Brasileira de Cardiologia, a principal causa de morte em nosso país. quisa, vigilância, prevenção, promoção da saúde e defesa de uma vida saudável. Atualmente, as doenças não transmissíveis são responsáveis por 45,9% da carga de doenças em todo o mundo (WHO, 2003). Dentre as DCNT, destacamos: H D oenças crônicas custam caro para o Sistema Único de Saúde (SUS) e para toda a sociedade, o número de mortes prematuras e de incapacidades faz com que o enfretamento das “novas epidemias”, causadas por doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), envolva importantes investimentos em pes- 3 ipertensão arterial: doença cardio- vascular definida pela manutenção de níveis da pressão sanguínea acima do que é definido como normal. É considerado um problema de saúde pública por sua magnitude, risco e dificuldades no controle. Foi reconhecida como um dos mais importantes fatores de risco para o desenvolvimento do acidente vascular cerebral, infarto do miocárdio, e mortalidade cardiovascular. Estudos identificam como fatores de predisposição à hipertensão arterial, o nível inicial da pressão arterial, a frequência cardíaca, a idade, o sexo, a maturação biológica, a raça, o estado socioeconô- N eoplasias: amplo conjunto de pato- mico, o tamanho corporal, as alterações ambientais, os fatores genéticos e a ingestão de sal. D logias que tem início numa reprodução anormal de células, podendo em alguns casos evoluir para algum tipo de câncer. O termo câncer é utilizado genericamente para representar um conjunto de mais de 100 doenças. Importante causa de doença e morte no Brasil, desde 2003, as neoplasias malignas constituem-se na segunda causa de morte na população, representando quase 17% dos óbitos de causa conhecida, notificados no ano de 2007. Uma neoplasia pode ter diversos fatores de origem, com grande parte dos casos diretamente relacionados aos hábitos alimentares. De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (INCA), no Brasil, observa-se que os tipos de cânceres que se relacionam aos hábitos alimentares estão entre as seis primeiras causas de mortalidade pela doença. iabetes: doença provocada pela de- ficiência na produção ou na ação da insulina, que pode levar a sintomas agudos e a complicações crônicas características, se não for controlada e tratada adequadamente. A falta da insulina compromete o metabolismo da glicose, das gorduras e das proteínas. Algumas vezes surge lentamente e ou pode acometer a saúde do individuo rapidamente, em ambos os casos, tem consequências graves. É um problema de saúde pública por acometer um grande número de pessoas. Um dos fatores para minimizar os riscos da diabetes, é o controle na ingestão de carboidratos e a pratica da atividade física. A mudança do perfil epidemiológico brasileiro, com maior carga de doenças e agravos não transmissíveis, são consequências da urbanização, de melhorias nos cuidados com a saúde, de mudanças de estilo de vida e da globalização. Essas doenças têm múltiplas causas e compartilham vários fatores de riscos, os quais podem ser atenuados. A urgência em deter seu crescimento no País justifica a adoção de estratégias integradas de prevenção e controle, pois um de seus principais fatores de risco, a alimentação inadequada, é modificável. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BATISTA FILHO, Malaquias; RISSIN, Anete - A transição nutricional no Brasil: tendências regionais e temporais. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 19 (sup. 1): S181-S191, 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf> Acesso em 12 fev 2012 BISI MOLINA, Maria del Carmen et al - Hipertensão arterial e consumo de sal em população urbana. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v. 37, n. 6, dez. 2003. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo>. Acesso em 16 mar 2011 BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Coordenação-Geral da Política de Alimentação e Nutrição. Guia alimentar para a população brasileira: promovendo a alimentação saudável /Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Coordenação-Geral da Política de Alimentação e Nutrição. – Brasília: Ministério da Saúde, 2005. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria n.°710, de 10 de junho de 1999. Ministério da Saúde – Secretaria de Atenção a Saúde – Departamento de Atenção Básica: Aprova a Política Nacional de Alimentação e Nutrição CAVALCANTE, Ana Augusta Monteiro et al - Consumo alimentar e estado nutricional de crianças atendidas em serviços públicos de saúde do município de Viçosa, Minas Gerais. Rev. Nutr., Campinas, v. 19, n. 3, Jun 2006. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo>. Acesso em 25 Fev 2012 D O oenças cardiovasculares: doenças que afetam o coração, como o acidente vascular cerebral (AVC), angina de peito e infarto do miocárdio. Apresentam múltiplos fatores de risco, como idade, hereditariedade e sedentarismo. As doenças cardiovasculares, que representam a principal causa de morte e de incapacidade na vida adulta e na velhice, são responsáveis, no Brasil, por 34% de todas as causas de óbito, e estão relacionadas em grande parte, com a obesidade e com práticas alimentares e estilos de vida inadequados. 4 besidade: doença crônica caracte- rizada pelo aumento na reserva de gordura até o ponto de ocasionar outras doenças, como diabetes e doenças cardíacas. É resultado de um balanço energético positivo, onde a ingestão alimentar é superior ao gasto energético. Estima-se que em 2020, dois terços da carga de doenças será atribuída às doenças crônicas não transmissíveis causadas por dietas altamente calóricas e sedentarismo que são os principais fatores relacionados ao aumento da prevalência da obesidade. ______. Dietary reference intakes for sodium. Washington, DC: The National Academy Press, 2005. p. 269. Disponível em: <http://www.nap.edu/openbook.php?record_id=10925&page=269>. Acesso em nov 2011 INCA - Instituto Nacional de Câncer. Consenso nacional de nutrição oncológica, volume 2 / Instituto Nacional de Câncer. Coordenação Geral de Gestão Assistencial. Hospital do Câncer I. Serviço de Nutrição e Dietética. – Rio de Janeiro, 2011.p 65 Disponível em <http://www1.inca.gov.br/inca/Arquivos/consenso_nutricao_vol2.pdf> Acesso em 12 de fevereiro de 2012 INCA – Instituto Nacional de Câncer disponível em: <http://www.inca.gov.br/estimativa/2010/index.asp> Acesso em 01 novembro, 2011 MACIEL, Erica da Silva; OETTERER, Marilia - O desafio da alimentação como fator de qualidade de vida na última década. Qualidade de vida: evolução dos conceitos e praticas do século XXI. Campinas:Ipes, 2010, p.21. Disponível em: http://www.fef.unicamp.br/departamentos/deafa/qvaf/livros/foruns_interdisciplinares_saude/livro_evolucao. html. 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J. 121(6), 2003 TOSCANO, Cristiana M. - As campanhas nacionais para detecção das doenças crônicas não-transmissíveis: diabetes e hipertensão arterial. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro, v.9, n.4, Dec. 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br/ scielo>. Acesso em 18 mai 2010 World Health Organization. Diet, nutrition and the prevention of chronic diseases. Report of a Joint WHO/FAO Expert Consultation. Geneva; 2003. (WHO Technical report series, 916) p. 90 DOCUMENTO DE REFERÊNCIA PARA GUIAS DE BOAS PRÁTICAS NUTRICIONAIS 1 Introdução A s Boas Práticas Nutricionais constituem-se um importante instrumento para a modificação progressiva da composição nutricional dos alimentos. São medidas que visam orientar os serviços de alimentação na preparação de alimentos com menores teores de açúcar, gordura saturada, gordura trans e sódio, contribuindo para uma alimentação mais saudável e para a melhoria da saúde da população brasileira. E sse conceito surgiu a partir da necessidade de melhoria no perfil nutricional dos alimentos, principalmente em relação aos nutrientes que contribuem para o aparecimento e o agravo do excesso de peso e das Doenças Crônicas não Transmissíveis (DCNT), como a pressão alta, o diabetes, a obesidade e as doenças do coração que, atualmente, são os principais problemas de saúde pública do Brasil. A sua adoção é voluntária e é importante que os serviços de alimentação participem desse processo e, assim, contribuam para uma população brasileira mais saudável. 6 O s dados mais recentes da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF2008/2009) indicaram prevalências de obesidade de 12,5% entre os homens e 16,9% entre as mulheres. O excesso de peso (sobrepeso e obesidade) acontece quase na metade dos adultos brasileiros. N ninos (de 4,1% para 16,6%) e, aproximadamente por cinco, entre as meninas (de 2,4% para 11,8%). E o período de 20 anos (de 1989 a 2009), as prevalências de obesidade em crianças de 5 a 9 anos, foram multiplicadas por quatro entre os me- m torno de 6% dos adolescentes do sexo masculino e 4% do sexo feminino foram classificados como obesos. NOTA: Serviço de alimentação é o estabelecimento onde o alimento é manipulado, preparado, armazenado e ou exposto à venda, podendo ou não ser consumido no local, tais como: cantinas, bufês, comissarias, confeitarias, cozinhas industriais, cozinhas institucionais, delicatéssens, lanchonetes, padarias, pastelarias, restaurantes, rotisserias e congêneres. 2 Principais Nutrientes D e acordo com os resultados da POF 2008/2009, o consumo regular de grãos integrais, leguminosas, oleaginosas, frutas e hortaliças, carnes, aves e pescados está associado a um padrão de alimentação adequado do ponto de vista nutricional. 7 N otou-se também que o arroz e o feijão ainda são os alimentos mais frequentes na dieta do brasileiro, principalmente entre os residentes em zona rural e os de menor renda, o que é um fator positivo. Por outro lado, há um consumo excessivo de alimentos com baixo teor de nutrientes e alto conteúdo energético que são considerados marcadores negativos da dieta. P VOCÊ SABIA? Deve-se evitar o consumo excessivo de açúcar e não deve ser estimulada a substituição deste ingrediente por edulcorantes (adoçantes). ortanto, os principais nutrientes a serem considerados na elaboração das Boas Práticas Nutricionais são: açúcar, gordura saturada, gordura trans e sódio por estarem associados ao excesso de peso e às DCNT. GORDURA SATURADA A s gorduras classificam-se em saturadas e insaturadas, de acordo com as suas características e propriedades. AÇÚCAR As principais fontes de gorduras saturadas são alimentos de origem animal (manteiga, banha, toucinho e carnes e seus derivados, leite e laticínios integrais). Já as gorduras insaturadas são encontradas em maior quantidade nos óleos vegetais. O açúcar fornece energia ao organismo, no entanto, segundo a POF 2008/2009 há grandes prevalências de consumo excessivo de açúcares pela população brasileira (61%) devido ao consumo de sucos, refrigerantes e refrescos, adicionados de açúcares, aliado ao baixo consumo de frutas e hortaliças. É recomendável o consumo de alimentos com pouca gordura. No Brasil, o consumo de frutas e de outros vegetais ainda não atingiu a quantidade mínima de 400g, considerada adequada pela Organização Mundial da Saúde. VOCÊ SABIA? A gordura saturada aumenta o risco de doenças cardíacas, por isso o seu consumo deve ser moderado. GORDURA TRANS 8 A gordura trans (hidrogenada) é um tipo de gordura obtida principalmente do processo de industrialização de alimentos, a par- tir da hidrogenação, que converte os óleos vegetais líquidos em gorduras sólidas e mais estáveis à temperatura ambiente. É utilizada como ingrediente, geralmente, nos biscoitos, recheados ou não, nos bolos e pães industrializados, e em outros tipos de massas, margarinas e creme vegetais. chá), enquanto no Brasil o consumo de sal é de aproximadamente 12 gramas per capita ao dia. O excesso de sal pode causar vários problemas de saúde como pressão alta, doenças nos rins e no coração. VOCÊ SABIA? A gordura trans é prejudicial à saúde e por isso deve ser evitada. O SÓDIO sódio é um mineral que compõe quase a metade (40%) do sal. As principais fontes de consumo de sódio são: o sal e os alimentos prontos para o consumo (que possuem sal adicionado e aditivos contendo sódio). O consumo diário de sódio recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) é de 2000 mg, o que equivale a 5 g de sal por dia (1 colher de VOCÊ SABIA? Uma forma de reduzir o sódio é diminuir a quantidade de sal acrescentada aos alimentos. 9 3 Meta de Redução do Teor dos Nutrientes O 4.4. Etapas de preparo D evem ser observadas nas operações de preparo dos alimentos, as etapas críticas a serem controladas para reduzir o teor dos nutrientes preocupantes do ponto de vista de saúde pública. 4.3. Identificação dos ingredientes e de suas funções s serviços de alimentação devem fazer um esforço conjunto com vistas a disponibilizar à população um alimento com quantidades menores de açúcar, gordura saturada, gordura trans e sódio no produto final. Assim, é importante ter clareza do percentual de redução do nutriente desejado em determinado alimento. C om base na receita contendo os ingredientes a serem utilizados no preparo do alimento ou na lista de ingredientes declarada no rótulo dos produtos, devem ser verificadas as possibilidades de alteração da quantidade dos nutrientes sem prejudicar as características do alimento. 4 Boas Práticas Nutricionais O princípio para a elaboração das Boas Práticas Nutricionais tem como referência as Boas Práticas de Fabricação (BPF). Ressalta-se que as BPF são de atendimento obrigatório pelos estabelecimentos pertinentes à área de alimentos, incluindo os serviços de alimentação, de acordo com o disposto na legislação brasileira. É T importante definir as etapas críticas do preparo do alimento a serem controladas sob o ponto de vista nutricional. P or exemplo, no caso do Guia de Boas Práticas Nutricionais para o Pão Francês, as etapas de Seleção de Ingredientes e de Pesagem são consideradas pontos críticos do processo de preparo do pão, pois devem ser realizadas com atenção para que se possa optar por ingredientes que possuam menor teor de sódio. D evem ser levadas em consideração as funções tecnológicas dos ingredientes na modificação do teor dos nutrientes. ambém será considerada a população para a qual o alimento é destinado, pois grupos como crianças, gestantes e idosos possuem necessidades diferenciadas. C 4.1. Identificação dos alimentos om base nesses critérios serão elaborados guias específicos para produtos ou estabelecimentos pertinentes à área de alimentos, incluindo os serviços de alimentos que tem o potencial de contribuir para uma alimentação saudável. P ara identificar os alimentos nos quais é desejável modificar a quantidade dos nutrientes serão utilizados os seguintes critérios: a) alimentos que mais contribuem para o consumo de açúcar, gordura saturada, gordura trans e sódio, seja pelo consumo frequente ou pela quantidade elevada desses nutrientes na sua composição; b) dados de monitoramentos que identifiquem alimentos com quantidades elevadas desses nutrientes. açúcar, gordura saturada, gordura trans e sódio no produto final. 4.2. Composição nutricional 10 É necessário avaliar a composição nutricional de cada um dos ingredientes usados na preparação do alimento, de forma a identificar aqueles que mais contribuem para o teor de 5Referências Bibliográficas 1. BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de Atenção à Saúde. Coordenação-Geral da Política de Alimentação e Nutrição. Guia Alimentar para a População Brasileira. Promovendo a Alimentação Saudável. Primeira edição. Primeira Reimpressão. Edição Especial. Série A. Normas e Manuais Técnicos. Brasília – DF. 2008. 2. BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situação de Saúde. Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas não Transmissíveis (DNCT) no Brasil 2011-2022. Série B. Textos Básicos de Saúde. Brasília-DF. 2011. 160p. 3. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Pesquisa de orçamentos familiares, 2008-2009. Despesas, Rendimentos e Condições de Vida. Rio de Janeiro. 2010. 4. Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP. Núcleo de Estudos e Pesquisas em Alimentação – NEPA. Tabela Brasileira de Composição de Alimentos – TACO. Versão 2 – Segunda Edição. Campinas – SP. 2008 5. UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO– USP. .Estimativa de Consumo de Sódio pela população Brasileira, 2002-2003. Sarno Flávio et al. Revista de Saúde Pública. 11 GUIA DE BOAS PRÁTICAS NUTRICIONAIS PÃO FRANCÊS 1 Introdução O S pão francês é um alimento tradicionalmente consumido pela população brasileira, principalmente em refeições como o café da manhã e o lanche da tarde. egundo os dados da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF- 2008-2009) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) o consumo per capita do pão de sal foi de 53g/dia. Uma unidade de pão francês (50g) apresenta, aproximadamente, 320mg de sódio. Apesar de possuir um teor de sal em torno de 2% em base de farinha de trigo, o pão francês é um dos alimentos que contribui para a ingestão de sódio pela população brasileira. É importante destacar que o excesso de sal pode causar vários problemas de saúde como pressão alta, doenças nos rins e no coração. Atualmente, o consumo diário aproximado de sal no Brasil é de 12 gramas por pessoa, enquanto o recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) é de apenas 5 gramas de sal por dia (1 colher de chá), correspondente a 2000mg de sódio. * NUTRIENTE A SER REDUZIDO NO PÃO FRANCÊS: SÓDIO E studos demonstram que é possível preparar um pão francês com menores quantidades de sal sem que haja alterações significativas em quesitos como sabor, crosta, maciez e aspectos do miolo. * Nota: Sal e sódio são diferentes. O sal é um ingrediente alimentar composto por cloreto e sódio, cuja fórmula química é NaCl (cloreto de sódio). Quarenta por cento (40%) do sal é constituído por sódio e como o sal é muito utilizado na preparação de alimentos, isso faz com que ele se constitua na principal fonte de sódio da alimentação. 12 Portanto, as Boas Práticas Nutricionais para o pão francês devem ser adotadas com o objetivo de reduzir a quantidade de sódio presente nesse alimento. 2 Objetivo O rientar os serviços de alimentação, em especial as padarias, a adotarem as Boas Práticas Nutricionais para o pão francês, de forma a promover a redução da quantidade de sal utilizada durante o preparo, contribuindo para a oferta de uma alimentação mais saudável à população brasileira. 3 Metas de Redução do Teor de Sódio E m 2011, o Ministério da Saúde e a Associação Brasileira das Indústrias de Alimentação (ABIA), Associação Brasileira das Indústrias de Massas Alimentícias (ABIMA), Associação Brasileira da Indústria de Trigo (ABITRIGO) e a Associação Brasileira da Indústria de Panificação e Confeitaria (ABIP) firmaram Termos de Compromissos, com a finalidade de estabelecer metas nacionais para redução do teor de sódio em alimentos. Para isso, começar pela redução do teor de sal adicionado à farinha (de 2% para 1,8%) é uma ótima iniciativa. Isso significa que em 2011 uma receita que utiliza 50kg de farinha de trigo e que, tradicionalmente, é adicionada de 1000g de sal (2% da base de farinha de trigo) terá a quantidade de sal diminuída para 950 gramas (1,9% da base de farinha de trigo) até o final de 2012 e para 900 gramas (1,8% da base de farinha de trigo) até o final de 2014. Para o pão francês acordou-se que a adição de sal ao produto seja progress ivamente reduzida de 2% para 1,8% até o final de 2014, o que representará uma redução de 10% na quantidade de sódio no produto. Assim, uma unidade de pão francês (50g) que em 2011 tem em média 320 mg de sódio, terá 304 mg em 2012 e 289 mg em 2014. Alternativas que visem maiores percentuais de redução de sal ao alimento também são bem vindas, pois o maior beneficiado será a população brasileira, que terá cada vez mais a sua disposição alimentos com menores teores de sal. Da mesma forma, os serviços de alimentação, em especial as padarias, devem fazer um esforço conjunto com vistas a disponibilizar à população um pão francês com quantidades menores de sódio. 4Ingredientes Principais e suas Funções O s principais ingredientes do pão francês são farinha de trigo, água, sal, fermento biológico e melhorador de farinha, os quais possuem as seguintes funções: 13 F arinha de trigo: é o ingrediente bá- adicionada à massa, a levedura utiliza o açúcar como alimento e o transforma em gás carbônico, álcool e substâncias aromáticas. O gás produzido é o responsável pelo crescimento da massa. O álcool e as substâncias aromáticas contribuem para o sabor e aroma do pão. sico na formulação. Tem a função de fornecer as proteínas formadoras do glúten, além de outras proteínas. O glúten (complexo protéico) é formado quando a farinha de trigo, a água e os demais ingredientes são misturados e sofrem uma ação mecânica (amassamento). O glúten dá elasticidade e consistência à massa, retém o gás carbônico (CO2) oriundo da fermentação e faz com que haja um aumento do volume do pão. * S ponsável pela melhoria do desenvolvimento da massa, fortalecimento da rede de glúten, formação da crosta crocante do pão, sabor e conservação do produto (vida de prateleira). A sua ausência prejudica o crescimento do pão e a sua qualidade, porém o seu excesso inibe o desenvolvimento da levedura, prejudica a fermentação do pão, além de contribuir para uma maior ingestão de sódio na alimentação. * Nota: Atualmente no Brasil toda farinha de trigo deve ser enriquecida com ácido fólico e ferro, conforme Resolução RDC nº 344, de 13 de dezembro de 2002. Essa medida visa auxiliar a redução de problemas de saúde como a anemia ferropriva e as doenças de má formação fetal do tubo neural. M elhorador de Farinha: é um aditivo que agregado à farinha, melhora sua qualidade tecnológica para os fins a que se destina. Além disso, reforça a rede de glúten e consequentemente melhora a capacidade de retenção de gás. Á gua: é importante para a formação da massa e para o controle da sua temperatura. A falta deste ingrediente não permite a formação completa do glúten e faz com que o desenvolvimento da massa seja irregular. Por outro lado, o seu excesso provoca o enfraquecimento do glúten, retardando a formação da massa. Também contribui para o desenvolvimento da fermentação do pão. F O 14 N a receita de pão francês, normalmente, as quantidades dos ingredientes (água, sal fermento biológico e melhorador de farinha) são calculadas a partir da quantidade de farinha de trigo utilizada. Do total da massa (165%) a farinha corresponde com 100%, conforme demonstrado na tabela a seguir: P Ingrediente Percentual (%) Farinha de Trigo 100% Água ± 60% Sal 2% Fermento Biológico 2% Melhorador de Farinha 1% TOTAL 165% ara a elaboração de um pão francês de aproximadamente 50g, tamanho habitualmente consumido no país, verifica-se que cada ingrediente irá contribuir para a composição nutricional do produto, de acordo com o especificado na seguinte tabela: Composição nutricional (38g) Água Sal (23g) (0,8g) Fermento biológico TOTAL (0,8g) 137 0 0 0,7 137 Carboidratos (g) 28,5 0 0 0,7 28,5 Proteínas (g) 3,4 0 0 0,1 4,1 Gorduras totais (g), 0,5 0 0 0 0,5 Gorduras saturadas (g) NI* 0 0 0 0 0 0 0 0 0 Fibra alimentar (g) 0,9 0 0 0 0,9 Sódio (mg) 0,4 0 320 0,3 320,7 das quais: Gorduras trans (g) dientes. INGREDIENTES Farinha de trigo Valor energético (kcal) utros: açúcar, dentre outros ingreNota: O uso de aditivos em alimentos deve estar de acordo com a legislação sanitária. Ressalta-se que é proibido o uso de bromato de potássio em qualquer quantidade, nas farinhas, no preparo de massas e nos produtos de panificação, segundo a Lei nº. 10.273, de 5 de setembro de 2001. ermento biológico: é a levedura e outros microrganismos utilizados em processos de tecnologia alimentar que envolvem fermentação. Quando al: é o cloreto de sódio (NaCl) res- 5Composição Nutricional Fonte: Tabela Brasileira de Composição de Alimentos – TACO, 2006 * NI = valor não identificado OBS: No cálculo da composição nutricional o melhorador de farinha não foi incluído em virtude da diversidade de aditivos para esta finalidade de uso. A o se observar a composição nutricional dos ingredientes e a contribuição de cada um na composição final do pão francês é possível constatar que o sal é o ingrediente que mais contribui para o teor de sódio do alimento. Isto é, dos 320,7mg de sódio presente no produto final, 320mg são provenientes do sal. Ressalta-se que os cálculos da tabela em referência são aproximados e podem não re15 fletir o valor de sódio real do produto, uma vez que não foi computado o teor de sódio dos aditivos que podem ser adicionados ao pão francês, em especial o melhorador de farinha. Portanto, as Boas Práticas Nutricionais têm como objetivo diminuir o teor de sódio no pão francês por meio do controle e da redução da quantidade de sal adicionado, com o desafio de manter a qualidade do alimento e também de não prejudicar a sua aceitação pelo consumidor. 6 Etapas do Preparo S eleção dos ingredientes do que a recomendada, o produto final terá maior quantidade de sódio e, consequentemente, poderá influenciar na pressão arterial e aumentar o risco de doenças cardiovasculares. Para conhecer as características dos produtos a serem utilizados no preparo do pão francês é fundamental efetuar a leitura dos rótulos dos alimentos, a fim de se obter informações sobre a lista de ingredientes, composição nutricional, data de validade, temperatura máxima permitida para sua conservação e instruções de uso (quando aplicáveis), dentre outras. É importante efetuar a manutenção e calibração periódica da balança a ser utilizada, de forma a assegurar um produto padronizado, de boa qualidade e para o qual não haja variação significativa de ingredientes e, portanto, de nutrientes. Esta etapa é considerada um ponto crítico do processo de preparo do pão, pois deve ser realizada com atenção para que se possa optar por ingredientes que possuem menor teor de sódio. Nota: Não é recomendada a utilização de utensílios como xícaras, copos, colheres e similares, mesmo que padronizados, para a medição dos ingredientes, pois além de não fornecerem uma medida precisa, pode haver variação das quantidades utilizadas, em função de fatores como a temperatura e a umidade do ambiente. P esagem A pesagem de ingredientes permite seguir, criteriosamente, a receita. É também uma etapa crítica do processo, pois se realizada de forma incorreta, pode comprometer a qualidade do produto final e, até mesmo, acarretar danos à saúde do consumidor. Por exemplo, se a adição de sal for maior P reparo da Massa, Mistura ou Amassamento 16 Etapa na qual todos os ingredien- tes são misturados em equipamentos adequado de acordo com a receita. tura, aroma, pela formação dos alvéolos internos e pelo crescimento do pão. Em seguida é feito um trabalho mecânico (amassamento) sobre a massa até que esta fique bem lisa e uniforme e se desprenda bem das paredes do equipamento. Após a fermentação, se a massa não for logo forneada, deve ser levada à refrigeração para retardar ou inibir o crescimento e a atividade dos microrganismos (leveduras) usados na fermentação dos pães. No ponto ótimo de desenvolvimento da massa, observa-se um ponto de véu, que pode ser finamente esticado sem se romper. D Um tempo excessivo de fermentação faz com que os pães apresentem casca de cor pálida, alvéolos do miolo grossos, textura ruim e sabor e aroma excessivamente ácidos. Tempo de fermentação abaixo do ideal produz pães de volume reduzido, células do miolo muito fechadas, crosta grossa e de cor marrom avermelhado. ivisão, Boleamento, Descanso e Modelagem Para minimizar o ressecamento causado pela diferença de temperatura e de umidade entre a massa e o ambiente, recomenda-se cobrir a massa com um filme plástico próprio para uso em alimentos ou acondicioná-la em câmaras de fermentação controladas. A divisão tem por objetivo a obtenção de frações de massa de peso determinado e regular. A peça (ou corte) da massa para produção de pão francês pesa até 70g. O boleamento proporciona readequação das ligações e orienta a distribuição do gás para que a massa cresça uniformemente. A ssamento ou Forneamento O descanso favorece a abertura da pestana e a formação da crosta. Na produção de pães, as peças são assadas em forno pré-aquecido, entre 180 °C e 210°C. A modelagem é realizada após descanso da massa, antes da fermentação, e tem por finalidade dar à peça a forma apropriada de pão. F O tempo de forneamento varia de acordo com o tamanho das peças e o tipo de forno, sendo verificado o ponto ideal de forma visual. ermentação A fermentação da massa é realizada por meio do uso do fermento biológico (levedura), sendo responsável pela tex- 17 Nesta etapa ocorre a fixação da estrutura do miolo, produção de cor e aroma, aumento do volume, formação de casca e perda de umidade que ocasiona a perda de peso do pão. 8Referências 7Fluxograma de Preparo do Pão Francês Etapa de produção Equipamentos utilizados Balanceamento Pesagem → Balança Tempos, temperaturas e umidade Utensílios e ferramentas → Calculadora → Bacias, cubas, jarras, colheres, conchas, facas, espátulas. ção de massas) → Masseira → Termômetro de penetração (17 a 20 min) → Masseira rápida (5 a 7 min) Temperatura da massa (entre 25 e 30°C) Divisão Manual → Balança → Espátulas Boleamento Manual → Descanso Divisão Modelagem → → Fermentação → Divisora Câmara de fermentação forneamento) Resfriamento → Assadeiras → Carrinho aberto ou esqueleto → Corte de pestana Assamento (ou De 20 a 30 min Modeladora Acondicionamento → Temperatura (entre 32 e 37°C) Umidade (entre 60 e 80%) Bisturi Tempo ideal de assamento → → Forno (entre 32 e 37°C) Temperatura (entre 60 e 80%) → Mesa com área de descanso ou carrinho 2. .BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situação de Saúde. Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas não Transmissíveis ( DNCT) no Brasil 2011-2022. Série B. Textos Básicos de Saúde. Brasília-DF. 2011. 160p. 3. BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de Atenção à Saúde. Coordenação-Geral da Política de Alimentação e Nutrição. Guia Alimentar para a População Brasileira. Promovendo a Alimentação Saudável. Primeira edição. Primeira Reimpressão. Edição Especial. Série A. Normas e Manuais Técnicos. Brasília – DF. 2008. Masseira semi-rápida Mistura (prepara- 1. BRASIL. Lei nº. 10.273, de 5 de setembro de 2001. Dispõe sobre o uso do bromato de potássio na farinha e nos produtos de panificação. Diário Oficial da União. Seção 1. Brasília, 06 de setembro de 2001. 4. BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução-RDC nº 344 de 13 de dezembro de 2002. Aprova o Regulamento Técnico para a Fortificação das Farinhas de Trigo e Milho com Ferro e Ácido Fólico. Diário Oficial da União. Poder Executivo, de 18 de dezembro de 2002. 5. BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Portaria SVS/MS nº 540, de 27 de outubro de 1997. Aprova o Regulamento Técnico: Aditivos Alimentares Definições, Classificação e Emprego. Diário Oficial da União, Brasília, 28 de outubro de 1997. 6. FUNDAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA DE PANIFICAÇÃO E CONFEITARIA. Instituto do Desenvolvimento de Panificação e Confeitaria, I.D.P.C. Fluxograma do preparo de pão francês. São Paulo. 2011. 7. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Pesquisa de orçamentos familiares, 20082009.Despesas, Rendimentos e Condições de Vida. Rio de Janeiro. 2010. 8. MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO. Empresa Brasileira De Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA). Centro Nacional de Pesquisa de Trigo. Fazendo pães caseiros. Eliana Maria Guarienti. Passo Fundo. Embrapa Trigo, 2004. 9. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Termo de Compromisso entre o Ministério da Saúde e a Associação Brasileira das Indústrias de Alimentação (ABIA), Associação Brasileira das Indústrias de Massas Alimentícias (ABIMA), Associação Brasileira da Indústria de Trigo (ABITRIGO) e a Associação Brasileira da Indústria de Panificação e Confeitaria (ABIP) com a finalidade de estabelecer metas nacionais para redução do teor de sódio em alimentos processados no Brasil. Brasília– DF. 2011. 10.SERVIÇO DE APOIO ÀS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS (SEBRAE)/ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA DE PANIFICAÇÃO E CONFEITARIA (ABIP) Encarte Técnico. A importância do Pão do Dia (Tipo Francês) para o segmento da Panificação. 11. SILVA, MEMP; Glauce Hiromi YONAMINE e Lia MITSUIKI. Desenvolvimento e Avaliação de Pão Francês Caseiro sem Sal. Braz. J. Food Technol., v.6, n.2, p. 229-236, jul./dez., 2003. 12. UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS – UNICAMP. Núcleo de Estudos e Pesquisas em Alimentação – NEPA. Tabela Brasileira de Composição de Alimentos – TACO. Versão 2 – Segunda Edição. Campinas – SP. 2006 13. UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO- USP. Estimativa de Consumo de Sódio pela população Brasileira, 2002-2003. Sarno Flávio et a/. Revista de Saúde Pública. Embalagem 18 19