Impacto da deficiência de vitamina D em pacientes de

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Artigo de Revisão
Cavalcante LFP et al.
Impacto da deficiência de vitamina D em
pacientes de unidade de terapia intensiva
Vitamin D deficiency impact in intensive care unit patients
Lilian Fernanda Pereira Cavalcante1
Aline Oliveira Diniz1
Luana Lopes Padilha2
Kátia Danielle Araújo Lourenço Viana3
Unitermos:
Deficiência. Vitamina D. Unidades de Terapia Intensiva.
Keywords:
Deficiency. Vitamin D. Intensive Care Units.
Endereço para correspondência:
Kátia Danielle Araújo Lourenço Viana
Avenida dos Portugueses, s/nº – Campus Universitário do Bacanga. Centro de Ciências Biológicas e da
Saúde – Secretaria do Curso de Nutrição – São Luís,
MA, Brasil – CEP 65080-040
Email: [email protected]
Submissão:
8 de julho de 2015
Aceito para publicação:
5 de setembro de 2015
1.
2.
3.
RESUMO
Introdução: A deficiência de vitamina D está associada com várias doenças na população
geral e tem apresentado alta prevalência em pacientes em Unidade de Terapia Intensiva
(UTI). A presente revisão da literatura teve o propósito de relatar informações sobre o impacto
da deficiência de vitamina D em pacientes de UTI. Método: Foram consultadas as bases de
dados PubMed e Lilacs, utilizando os seguintes descritores: vitamin D deficiency, mortality,
critical patients, intensive care unit, no período de agosto de 2014 a fevereiro de 2015.
Foram obtidos 13 artigos que melhor expressavam a relação da deficiência de vitamina D
em paciente crítico. Resultados: Foi observada alta prevalência de deficiência de vitamina
D nos pacientes em UTI, avaliados nos estudos selecionados, bem como relação inversa
entre os níveis séricos de vitamina D e mortalidade, infecções nosocomiais, sepse, custos
hospitalares e tempo de internação. A suplementação desse nutriente não foi observada
como parte da rotina em UTI. Conclusão: A vitamina D apresenta importante participação
na resposta imunológica e sua deficiência gera impacto negativo no que diz respeito ao
desfecho da internação em UTI.
ABSTRACT
Introduction: Vitamin D deficiency is associated with various diseases in the general
population and has shown high prevalence in patients in Intensive Care Unit (ICU). This
literature review aimed to report information on the impact of vitamin D deficiency in ICU
patients. Methods: The PubMed and Lilacs were searched using the following keywords:
vitamin D deficiency, mortality, critical patients, intensive care unit, from August 2014 to
February 2015. We obtained 13 articles that best expressed the ratio of vitamin D deficiency
in critically ill patients. Results: We observed a high prevalence of vitamin D deficiency in
patients in ICUs evaluated in selected studies, as well as inverse relationship between serum
levels of vitamin D and mortality, nosocomial infections, sepsis, hospital costs and length
of stay. Supplementation of this nutrient has not been observed as part of routine in ICU.
Conclusion: Vitamin D has an important role in the immune response and its deficiency
generates negative impact with regard to the outcome of ICU stay.
Nutricionista, Especialista (Residente) em Terapia Intensiva pelo Hospital Universitário Presidente Dutra, Universidade Federal do Maranhão,
São Luís, MA, Brasil.
Nutricionista, Mestre em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Maranhão, São Luís, MA, Brasil.
Nutricionista. Mestre em Ciência e Tecnologia dos Alimentos, pela Universidade Federal da Paraíba. Professora do Curso de Nutrição da
­Universidade Federal do Maranhão, São Luís, MA, Brasil.
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Impacto da deficiência de vitamina D em pacientes de unidade de terapia intensiva
INTRODUÇÃO
A vitamina D é comumente reconhecida na regulação
do metabolismo do cálcio1, embora denominada vitamina,
conceitualmente trata-se de um hormônio, sendo classificada
ora como hormônio esteroide com efeitos pleiotrópico2, ora
como pré-hormônio3 e ora como pró-hormônio4.
Adequados níveis de vitamina D são dependentes da
síntese cutânea pela exposição à luz solar, através da incidência de raios ultravioleta, pela adequada ingestão de
alimentos ou por suplementação nutricional1,5-7. Entretanto,
os seres humanos dependem principalmente da produção
cutânea catalisada pelos raios solares6.
A vitamina D derivada a partir da pele e dieta é metabolizada no fígado, na sua principal forma de circulação, que
é a forma usada para determinação laboratorial, 25-(OH)
D, em seguida é metabolizada novamente no rim para a
sua forma biologicamente ativa, 1,25(OH)2D3, pela enzima
1α-hidroxilase3,7.
Estudo aponta que os receptores de vitamina D estão
presentes em quase todos os tecidos e células do corpo
humano, incluindo coração, cérebro, cólon e células do
sistema imune2.
Além disso, estudos sugerem que a vitamina D é importante na imunomodulação através da regulação da inflamação, citocinas, proliferação celular, diferenciação celular
e apoptose; além de atuar na homeostase do cálcio, do
magnésio, do fosfato e da clássica formação dos ossos2,3.
Assim, a vitamina D é um hormônio que influencia mais de
2000 genes no corpo humano, o que pode desempenhar
um papel crítico na manutenção da saúde7.
Estudos epidemiológicos sugerem que a deficiência
de vitamina D está associada com o desenvolvimento de
doenças cardiovasculares, doenças autoimunes e diferentes
tipos de câncer3,8, bem como diabetes8, arteriosclerose18 e
tuberculose10.
Diante disso, a suplementação de vitamina D
demonstra diminuir a morbidade e aumentar a longevidade na população geral8. Níveis séricos de vitamina
D inferiores a 17,8 ng/mL têm sido relacionados ao
aumento do risco de morte em 26% a partir de todas as
causas na população geral11.
Está estabelecido que a deficiência de vitamina D apresenta alta prevalência em pacientes críticos12 e piora as
disfunções orgânicas nos mesmos13. Consideram-se, ainda,
os altos custos associados com internações em UTI, com
valores 700% maior quando comparados aos custos das
demais internações14.
Diante disso, o presente estudo teve o objetivo de discorrer
sobre o impacto da deficiência de vitamina D em pacientes
críticos, com a finalidade de gerar informações para o
aprimoramento no atendimento, planejamento de estratégias
e condutas terapêuticas, para melhor desfecho da internação.
MÉTODO
O presente estudo constituiu-se em uma revisão bibliográfica integrativa, realizada no período de agosto de 2014
a fevereiro de 2015, onde foram consultadas as bases de
dados PubMed e Lilacs, resultando em 13 artigos analisados.
Os descritores utilizados para a busca foram associados entre
si: deficiência de vitamina D (vitamin D deficiency), mortalidade (mortality), paciente crítico (critical patients) e unidade
de terapia intensiva (intensive care unit).
Foram incluídos trabalhos originais que abordassem
aspectos como: pontos de corte para diagnóstico de deficiência de vitamina D, prevalência de deficiência de vitamina D
e impacto da deficiência de vitamina D na saúde. Não foram
incluídos estudos de pacientes com idade inferior a 18 anos.
RESULTADOS
Os pontos de corte utilizados nos estudos foram
variados, mesmo se tratando da mesma população. Houve
predominância de categorização mais detalhada em deficiência, insuficiência e suficiência1,5,7,16,17,21,22 com pontos
de corte diferentes. Outros artigos estabeleceram o ponto
de corte de deficiência (<20 ng/mL) e suficiência (≥20
ng/mL)4,14,19,25. Estudos populacionais categorizaram em
deficiência (≤15 ng/mL), insuficiência (16-29 ng/mL) e
suficiência (≥30 ng/mL)16,17.
A prevalência de deficiência de vitamina D nos artigos
avaliados variou entre 53,3% a 97,7% (Tabela 1). McKinney
et al.19 analisaram a prevalência de deficiência de vitamina D
em função do tempo de internação e verificaram que a deficiência foi maior (55,6%) em pacientes com três dias ou mais
de internação e de 26,8% naqueles com menos de três dias.
Os pacientes negros apresentaram maior prevalência de
deficiência de vitamina D20. McKinney et al.19 apontaram não
haver diferença estatística nos níveis séricos de vitamina D
entre pacientes clínicos e cirúrgicos.
Ao avaliar o impacto da deficiência de vitamina D, os
estudos apresentaram que o tempo de internação em UTI
deixa os pacientes mais propensos a apresentarem deficiência
de vitamina D5,19,21.
No que diz respeito à mortalidade, encontraram que foi
mais significativa em pacientes com deficiência de vitamina
D1,5,17,20,22. Foram encontrados ainda resultados que apresentaram relação inversa entre os níveis séricos de vitamina
D e tempo de permanência em UTI, custo do tratamento e
mortalidade7. Entretanto, não foi encontrado que esta deficiência era fator de risco independente para mortalidade15.
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Cavalcante LFP et al.
Apenas um artigo abordou a suplementação, os autores
avaliaram a quantidade de vitamina D a ser suplementada
com os melhores resultados no aumento dos níveis séricos
desse nutriente, demonstrando que a suplementação de 2µg
de 1,25(OH)2D3 foi a quantidade mais eficiente, cujos valores
sanguíneos normalizaram em uma semana18.
Tabela 1 – Prevalência de deficiência de vitamina D nos estudos analisados,
sobre o impacto da deficiência de vitamina D em pacientes internados em
UTI, publicados de 2010 a 2014.
Autor/ Ano
Mata-Granados et al., 201018
Prevalência de deficiência de
vitamina D
*
McKinney et al., 201119
(< 3 dias- 26,8%) /
(≥ 3 dias- 55,6%)
Matthews et al., 20127
97,7%
Braun et al., 20125
85,0%
Arnson et al., 20124
82,3%
Higgins et al., 201221
81,5%
Azim et al., 2013
79,5%
22
Venkatram et al., 20111
77,8%
Flynn et al., 201214
74,2%
Aygencel et al., 201315
69,2%
Braun et al., 201117
64,8%
Rech et al, 201420
53,7%
Moromizato et al., 201416
53,3%
DISCUSSÃO
No que diz respeito aos vários pontos de corte para o
diagnóstico de deficiência de vitamina D observados nos
artigos analisados, Ross23 afirma que níveis séricos abaixo de
20 ng/ml de vitamina D são insuficientes para a saúde óssea.
Uma meta-análise sobre osteoporose apontou valores séricos
acima de 30 ng/mL de vitamina D como os mais benéficos24.
Aygencel et al.15 questionam qual seria o ponto de corte que
verdadeiramente representa essa deficiência e afirmam que
tal informação é controversa. Higgins et al.21 afirmam não
ter um ponto de corte específico para paciente crítico.
*Estudo caso-controle.
Estudos apontam que os pacientes sobreviventes à
internação apresentavam níveis séricos de vitamina D significativamente mais elevados quando comparados aos não
sobreviventes7,19. Rech et al.20 verificaram que os pacientes
que apresentaram mortalidade em 30 dias eram significativamente mais velhos.
O risco de sepse foi maior em pacientes com deficiência
de vitamina D16. A presença de sepse/choque séptico,
disfunção renal na admissão, a necessidade de ventilação
mecânica e hemodiálise durante a permanência na UTI foi
estatisticamente significante para aqueles com deficiência de
vitamina D15. Além disso, estudo sugere haver relação entre
a taxa de infecção e deficiência de vitamina D21.
Outros estudos reportam que níveis séricos baixos de
vitamina D estão relacionados com maior taxa de infecção,
maior incidência de sepse14 e associação de sepse com
bacteremia e pneumonia20. Portanto, há uma tendência de
aumento de infecção nosocomial para aqueles com deficiência desse nutriente15.
Em pacientes que suplementaram vitamina D antes
da internação na UTI, sem intenção de verificar possíveis
desfechos, a mortalidade hospitalar foi significativamente
menor quando comparados àqueles que não receberam a
suplementação prévia desse nutriente20.
Encontrou-se alta prevalência de deficiência desse
nutriente na literatura analisada1,4,6,11,28-31,34-36. Venkatram et
al.1 sugerem que esses achados podem ser apenas um reflexo
da deficiência desse nutriente na população geral1. Estudos
envolvendo pacientes de UTI encontraram grave deficiência
de vitamina D em pacientes críticos com internação prolongada e encontraram que os negros apresentaram maior
prevalência de deficiência de vitamina D25-27. Estudo aponta
que a presença da melanina, em indivíduos negros, diminui
a síntese de vitamina D28.
Maior parcela dos artigos analisados encontrou
associação com a mortalidade1,4,5,7,16-20 e tempo de internação7,14,21. Segundo estudo, a deficiência de vitamina D
pode aumentar a mortalidade em pacientes críticos9. Entretanto, é possível que a deficiência de vitamina D no início da
doença aguda possa contribuir para desfecho desfavorável
e aumentar o tempo de internação29.
Os estudos revisados encontraram associação entre a
deficiência de vitamina D e infecção14,16,20,21. Jeng et al.27
afirmam que uma maior prevalência de deficiência de
vitamina D tem sido observada em pacientes com doença
crítica e sepse. Cecchi et al.30 demonstraram que pacientes
com sepse apresentaram níveis deste nutriente menor e que
a deficiência de vitamina D estava associada com aumento
da incidência de doenças infecciosas. Aliado a isso, níveis
séricos de vitamina D são inversamente associados com a
ocorrência de infecções respiratórias superiores31.
Foi incomum nos artigos analisados a ocorrência de
suplementação de vitamina D. Entretanto, a American Society
for Parenteral and Enteral Nutrition32 sugere que a suplementação de 200 UI de vitamina D para pacientes hospitalizados
é suficiente para normalizar os níveis séricos. Estudo suplementou 500 UI de vitamina D em pacientes críticos e verificou
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Impacto da deficiência de vitamina D em pacientes de unidade de terapia intensiva
que as concentrações séricas continuaram baixas26. Apesar
disso, a suplementação é raramente considerada em UTI4.
A intoxicação pela vitamina D pode ser um potencial
risco em suplementações acima de 40.000 UI33. Além disso,
de acordo com a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e
Metabologia, a administração de doses excessivas desse
nutriente gera remodelação óssea excessiva.
A administração de 1,25(OH)2D3 foi associada com a
melhora no padrão de coagulação sanguínea em sepse associada à coagulação intravascular disseminada34. Entretanto,
torna-se importante observar que, em algumas condições
clínicas, como sarcoidose, tuberculose, infecções fúngicas
e alguns linfomas, os macrófagos ativados podem produzir
1,25(OH)2D3 de forma excessiva e induzir hipercalcemia e
hipercalciúria6.
No que diz respeito ao mecanismo pelo qual a deficiência
de vitamina D gera tantos impactos à saúde do paciente
em UTI, os macrófagos, linfócitos e monócitos têm receptor
de vitamina D que, ao serem estimulados, aumentam a
expressão gênica da catelecidina, um peptídeo antimicrobiano endógeno, e de defensinas3,27. A deficiência de vitamina D, portanto, gera defeitos na função dos macrófagos
quanto à fagocitose, quimiotaxia e produção de citocina
pró-inflamatória35.
Foi observada uma relação positiva entre os níveis séricos
de vitamina D e níveis de catelecidina em pacientes com
doença aguda, sendo que este peptídeo se mostrou eficaz
contra bactérias, fungos em uma variedade de sítios de
entrada de patógenos, incluindo pele e mucosas do sistema
respiratório e digestório27.
Aliado a isso, pacientes com níveis inferiores a 20 ng/mL
podem ser incapazes de expressar plenamente a catelecidina
e isso pode estar associado ao aumento de susceptibilidade
à infecção nosocomial, pneumonia e sepse27. Estudo sugere
que a vitamina D tem a capacidade de regular as respostas
imune adaptativa e inata36.
Em adição, estudo sugere ser possível que a deficiência de
vitamina D amplifique os distúrbios metabólicos e regulação
imunodeficiente, que podem levar a resultados piores do que
seria experimentado nos indivíduos com níveis normais de
vitamina D1. O aumento da mortalidade no paciente crítico
com deficiência de vitamina D pode ser decorrente de alterações no metabolismo da glicose e cálcio, e/ou disfunção
das células imunológicas e endoteliais37.
Portanto, parece plausível que os pacientes com níveis
séricos de vitamina D mais baixos são menos capazes de
montar uma resposta suficiente à injúria, lesão ou infecção7.
É importante ressaltar que a imunossupressão pode ser
decorrente de procedimentos cirúrgicos, trauma, queimaduras ou hemorragias e que tais situações são comuns em
UTI e podem predispor a infecções nosocomiais8.
As causas da deficiência de vitamina D são multifatoriais.
Quanto às etiologias conhecidas temos: aumento da idade,
baixa exposição à luz solar, baixa ingestão dietética, comorbidades, possíveis interações com medicamentos (como
anticonvulsivantes)6, função gastrointestinal, efeito anormal
da reposição volêmica19 e a raça negra20.
Pacientes críticos podem apresentar risco progressivo de
deficiência de vitamina D, pela baixa exposição à luz solar
e falta de suplementação dietética27.
CONCLUSÃO
Diante disso, é importante pontuar que a dosagem dos
níveis séricos, bem como a suplementação da vitamina D em
UTI, não é uma realidade. É bem estabelecido que pacientes
em ambiente de UTI são mais susceptíveis a infecções nosocomiais e a sepse ainda é uma importante causa de óbito
nessa população.
Nos artigos analisados, alguns pontos relevantes não
foram comumente observados, como a doença renal crônica,
uso de anticonvulsivantes, dose de vitamina D por dieta
(enteral e parenteral) e reposição volêmica, visto que tais
fatores podem alterar a concentração sérica desse nutriente.
Desse modo, a normalização do nível sérico de vitamina D torna-se alvo primordial em UTI, com o objetivo de
otimizar a resposta imune e garantir ao paciente condições
de sobrevivência.
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Local de realização do trabalho: Universidade Federal do Maranhão, São Luís, MA, Brasil.
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358
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