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Título do livro: Tempo de envelhecer
Autores: Py, Ligia ET alii
Editora: NAU
Cidade: São Paulo
Ano: 2004
FOLHA DE ROSTO
Título do capítulo: Movimento Sociais: participação dos idosos
Nome do autor: Serafim Fortes Paz
Qualificação Acadêmica e Profissional: Doutor em Educação/Gerontologia – Unicamp;
Professor Adjunto da Universidade Federal Fluminense do Programa de Mestrado em Políticas
Sociais e Coordenador Acadêmico do Programa de Extensão UFF- Espaço Avançado e
Presidente da Associação Nacional de Gerontologia
Endereço Completo: Rua Afonso Cavalcanti, 33/1001 – Centro/Cidade Nova – Rio de Janeiro CEP 20211-110 - RJ
E-Mail: [email protected]
Sumário
Título do Capítulo: Movimentos Sociais: participação dos idosos
1° Sub-Título: EnCenAção: Atores e Personagens na (Des)organização Social dos
Idosos
2° Sub-Título: Idosos e Aposentados – diferenças e aproximações - a estreita e
eterna aliança
3° Sub-Título: Idoso em movimento: envelhecer é um direito do cidadão – envelhecer com
dignidade um dever da sociedade
4° Sub-Título: Organização social e visibilidade da velhice – idoso presente e atuante, na
perspectiva do futuro
Fragmentos de Textos
Propostas de Estudos e Exercícios
Bibliografia
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Movimentos sociais: participação dos idosos
EnCenAção: Atores e Personagens na (Des)organização Social dos Idosos
Se o chamado fenômeno do envelhecimento no mundo é recente, no Brasil ele se evidencia a
partir da década de 60. O envelhecimento brasileiro até a década de 80, era uma preocupação
quase exclusiva dos especialistas, particularmente, das ciências da área da demografia e dos
campos médico/sociais, que produziram reflexões, estudos e ações a respeito do envelhecimento
e da velhice.
As décadas de 80/90 tornam-se, então, o período fértil de questionamentos sobre a velhice e,
também, na produção de leis e realização de ações (embora pulverizadas), voltadas para os
idosos. Sua maior visibilidade, no entanto, só se inicia no período dos 90, no qual aparece, de
forma mais numérica, com a presença de velhos no cotidiano. É quando, também, se têm as
primeiras manchetes e matérias sobre velhice, particularmente noticiadas pela mídia, após fatos
e/ou tragédias ocorridas, envolvendo idosos. Daí, tanto a velhice se estampa com maior
materialidade como, ainda, os idosos, aos poucos, viram personagens mais presentes e mais
visíveis.
A década de 90 torna-se, assim, o período de maior organização social dos idosos,
praticamente com sua maior mobilização, principalmente, a partir da Lei 8842/94 (Lei do Idoso)
gerando os Fóruns da Política Nacional do Idoso e, também, a maioria dos Conselhos de Idosos.
Cabe ressaltar, no entanto, que, nos anos 80/90, o movimento do idoso, numa direção
sóciopolítica (por cidadania, garantias sociais, participação e direitos), é muito tímido e no seu
conjunto frágil e precário, não chegando, portanto, a ser expressiva para a sociedade como já o
era o movimento dos aposentados.
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Enquanto no movimento dos aposentados eles próprios são os protagonistas, pode-se afirmar
que até o início da década de 90, o movimento dos idosos ainda se realiza sob ou através – de
porta-vozes ou representantes –, das entidades técnico-científicas (ANG, SBGG, ACEPI), ou nas
tradicionais Instituições de Práticas Sociais (principalmente nos anos 60 coma LBA ou até hoje
nos SESCs), ou Programas Governamentais que atuam com o segmento idoso. Essa espécie de
“movimento”, porém, se realizou sem uma efetiva organização sóciopolítica e/ou uma real
participação social dos sujeitos idosos, como a(u)tores-protagonistas. Em geral, o movimento se
deu liderado pelas entidades citadas, em especial, a partir de manifestos, tais como Cartas
Abertas, mas com pouca expressão, no sentido mais fundamental de participação de seu principal
personagem: o idoso. Na maioria desses episódios, o idoso aparece como mero ‘figurante’, no
mínimo, ‘coadjuvante’, nos quais o papel principal é dos técnicos, dirigentes ou especialistas,
como personagens líderes das Entidades Técnicas ou Instituições Sociais, já referidas.
Particularmente, nos meados dos anos 90, é que se observa a maior presença de idosos,
especialmente com a criação dos espaços de debate e/ou de definição de Políticas (Fóruns e
Conselhos), sem, contudo, garantir aos idosos uma real participação social.
Idosos e Aposentados – diferenças e aproximações - a estreita e eterna aliança
A organização dos idosos se dá motivada a partir da denúncia das mazelas da velhice brasileira,
inicialmente numa espécie de “reflexo” de um movimento mais intenso e unificado que se
realizava ao final dos anos 80 e início dos 90; a dos trabalhadores-aposentados brasileiros. O
movimento dos aposentados, embora organizado há mais tempo, era de pouca visibilidade, até
então. Porém, surpreendeu e rouba a cena, em especial na mídia. É através da mídia, que o idoso
se torna visível, pois ao mesmo tempo em que se noticiava sobre o aposentado, estampava a
imagem dos homens/mulheres de cabelos brancos associando a aposentadoria à velhice.
O cenário de luta do movimento dos aposentados tem um processo distinto, gradativo e
trajetórias diferentes, a partir dos seus atores – protagonistas – aposentados e pensionistas da
previdência social, só eclodiu no final dos 80.
A ação dos personagens centrais – hoje
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aposentados – tem início na década de 30/50, à época, na condição de trabalhadores. Suas
atividades/lutas restringiam-se às questões específicas por categorias profissionais; ou seja,
conforme as demandas e particularidades de cada categoria. Os trabalhadores organizavam-se
em torno das Caixas de Pecúlios – CAPs ou Institutos de Previdência Social – IAPs, que
permaneceram organizados de forma distinta, até os anos 60, em categorias independentes
(transportes, ferroviários, bancários, marítimos etc).
Os trabalhadores de então, estavam ligados (sem necessariamente constituírem uma
organização unificada) às suas instituições de seguridade e previdência, voltadas para
aposentadorias, pensões pecúlios e/ou serviços de assistência (respeitadas suas categorias
profissionais). Com a junção desses Institutos, denominado “sistema previdenciário” (SINPAS –
Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social), que reuniu o Instituto Nacional de
Previdência Social – INPS e o Instituto Nacional de Assistência Médica e Previdência Social –
INAMPS, e, conseqüentemente, com a complexidade dessa integração e pelas constantes
dificuldades nos serviços, especialmente, nas perdas ou atrasos dos proventos das aposentadorias
e pensões, que se chamou de “colapso da modernização” (Oliveira, 1998), começaram a surgir as
primeiras organizações de trabalhadores-aposentados da previdência pública, do mesmo modo
que, também, têm início as organizações de previdência (fundos de pensão, fundações de
assistência e previdência, especialmente de complementação de aposentadorias e benefícios do
INPS), das empresas privadas e estatais.
Geralmente, as lutas desses trabalhadores-aposentados estavam ligadas à aposentadoria e
benefícios junto às suas Caps ou IAPs, e/ou nos anos 80 em ações judiciais em relação ao já
instituído INSS. Antes, porém, os IAPs se constituíam em uma das formas mais organizadas de
previdência social, em especial, para aqueles que mantinham uma maior mobilização. Os mais
organizados, conseqüentemente, obtinham maiores resultados em relação à outras. As lutas se
davam num campo particular, reivindicativo, dentro de cada categoria profissional e, certamente,
com melhores respostas às respectivas reivindicações (Simões, 1998). Pode-se dizer que, de
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1930 a 1964, os personagens da seguridade social, segmentadas por categorias, obtinham os
melhores benefícios, que para Simões (1998) decorria da influência das lideranças sindicais,
junto aos IAPs, que geriam recursos políticos e econômicos importantes.
A unificação das Caixas ou Institutos de Aposentadoria, no então Instituto Nacional de
Previdência Social – INPS, em pleno período ditatorial (1964), modificou significativamente o
cenário e retirou de cena seus principais atores, assim como do roteiro e do “texto”, desviando o
quadro da organização dos trabalhadores-aposentados e de suas lutas, desmontando as
organizações por categorias, limitando a participação social dos trabalhadores, levando os atores
de papéis centrais, enquanto gestores de suas previdências, retirando-lhes, portanto, seu papel,
sua voz e seu grau de organização, de mobilização, forças e conquistas. Enfim, tornando-os
figurantes, afastou os trabalhadores da administração, da organização e gestão, um principal
instrumento de garantia dos benefícios e da aposentadoria – principal fonte de poder dos
sindicalistas, perdendo como se refere Simões (1998) sua forte “moeda política”, enfraquecendo
os sindicatos e as lideranças dos trabalhadores. Estes fatores contribuíram para “calar” (os semeco), desmobilizar e fragilizar esse movimento, de trabalhadores e aposentados, por muitos anos,
que se manteve recuado até se constituir novos personagens, (re)definir novos atores, novo texto
com (re)definição de papéis e de (r)estabelecer numa nova dimensão da organização
sóciopolítica que fez emergir como se refere Simões (1998) na nova categoria social –
aposentados da previdência pública, que veio reacender nos anos 80 o movimento pelo reajuste
da aposentadoria no, então, Governo Collor.
As questões da previdência social das aposentadorias (anos 90) e a criação de uma nova
mobilização indicam uma conquista no campo político, alterando assim as cenas e palcos, como
campo e forma de luta dos trabalhadores-aposentados, vindo, posteriormente, eclodir, na grande
peça e cenário, o movimento e a conquista de reposição
dos 147%.
A capacidade de
organização e mobilização dos trabalhadores-aposentados foi surpreendente em tamanho e em
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força. Hoje, já são inúmeras as associações de trabalhadores-aposentados em todo o país,
decorrentes desse movimento.
A conquista dos trabalhadores-aposentados pelos 147% foi decorrente de situações pouco
esperadas. Em especial, após a pressão que as manchetes da mídia nacional e internacional,
transmitiam do movimento reivindicatório. A partir da luta dos aposentados focavam outros
cenários, em especial nas ruas, ou em noticiários que evidenciavam cenas de negligência ou
maus tratos a idosos no cotidiano urbano, nas filas de bancos, transportes entre outras formas de
violência tratadas nas matérias jornalísticas.
Assim, o governo se viu forçado a sancionar a lei do Idoso, pleiteada, desde os 80, conforme é
verificado na Carta do Idoso produzida no Fórum de Gerontologia de 1984 Ceará e na de São
Paulo (1985) ou do Seminário promovido pela ANG no inicio dos 90.
Para se ter uma idéia da aproximação dos então a(u)tores – trabalhadores-aposentados – pela
exposição de suas reivindicações e pela luta de seus direitos e, conseqüentemente, nas questões
da velhice, pode-se observar que esses personagens, conquistaram espaços de voz, de opinião e
de expressão. Tal como evidencia a pesquisa realizada, de 1995 a 1997, junto ao NEVES Núcleo de Estudos sobre Violência e Exclusão Social, da Universidade Federal Fluminense,
trazendo a questão da velhice nos depoimentos dos aposentados, em que muitos deles possuem
uma maior compreensão sobre o quadro da velhice, das lutas por defesa de direitos sociais e
conquista da cidadania.
A pesquisa citada, trouxe importantes revelações, desde a desconfiança sobre a Reforma da
Previdência pautada no aumento da expectativa de vida dos brasileiros; a continuidade do
engajamento no movimento sindical; consciência de direitos; e a rejeição da aposentadoria como
benefício, conferindo-lhe o caráter de remuneração, qualificando-a de salário social, uma nítida
vinculação com a identidade de classe trabalhadora.
Nas referidas vozes desse segmento aposentado apreendido pela pesquisa, observa-se, também
que: nutrem uma identidade de trabalhador e que, na maior parte de seus depoimentos, já se tem
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uma maior extensão da luta dos “aposentados” na vinculação idosos – trabalhadores aposentados, em especial, sobre a necessidade de se manterem mobilizados pelas garantias dos
direitos previdenciários dos aposentados e os direitos sociais dos idosos; reforçam a necessidade
vital das lutas e as crenças na força da organização sóciopolítica dos trabalhadores-aposentados.
Manifestam suas apreensões sobre o futuro, uma subentendida queixa sobre as reformas,
especialmente, da previdência e sobre o impedimento de organização dos fundos de pensão,
revelando, de certa forma, uma crença nesses fundos, talvez por possibilitar aos trabalhadores
administrarem diretamente suas contribuições previdenciárias, como ocorre nos atuais fundos de
previdência das estatais, como à época das Caixas e Institutos de Aposentadoria; fazem
referência ao voto dos idosos como um instrumento poderosíssimo e importantíssimo e de eficaz
resultado para mudanças. De acordo com essas falas, o voto do idoso ou do trabalhadoraposentado parece adquirir dimensão e força; e, expressam uma convicção de grande
importância sobre o peso eleitoral dos idosos, destacam que não há perda de vinculação entre a
situação de aposentado da condição de trabalhador que se reafirma na identidade – trabalhadoraposentado, e também uma recusa aos estereótipos sociais, expressos como uma imposição do
movimento e da luta.
Essa pesquisa constatou, ainda, manifestações contrárias à expressão “inativo”, comumente
atribuída ao trabalhador-aposentado. Há a busca de definir os papéis que diferenciam as forças
entre os trabalhadores “da ativa” que estão diretamente nos meios de produção e os
trabalhadores-aposentados, aqueles que já se afastaram diretamente dessa produção, porém ainda
se mantêm politicamente atuantes, correspondendo a uma referência semelhante à visão de
‘categoria política’ já referida em Simões (1998), o que vem demonstrar que os trabalhadoresaposentados, embora diretamente afastados dos meios produtivos, conseguem desenvolver, no
país, uma das mais importantes forças de organização no cenário dos movimentos sociais; os
trabalhadores-aposentados se configurariam, portanto, como "categoria política".
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A pesquisa, revelou dados da realidade experimentados pelos representantes de Entidades do
segmento idoso que se confrontam com índices divulgados e que flagram essa preocupação sobre
as condições de vida dos idosos. Embora haja pouca e atualizada discussão sobre as condições de
vida da população e, em especial, dos idosos, há algumas confirmações de autoridades
institucionais e de determinados especialistas que vêm divulgando, em documentos e eventos de
caráter técnico-científico, a chamada de atenção tanto para os níveis de empobrecimento da
população, quanto para o risco social e de sobrevivência que os segmentos de menor renda
enfrentam, particularmente, diante da desigualdade social e das limitadas políticas públicas.
Em relação aos idosos, as desigualdades tornam-se ainda mais cruéis, pois denota sinais que
podem revelar as más condições de vida dos idosos, em especial, os de baixa renda como
conseqüências do retardo na implementação dos Programas previstos na Política Nacional do
Idoso (1994) e pela falta de investimentos públicos ou em cortes substanciais na área social dos
últimos governos. Sem dúvida, a falta de recursos vem comprometendo a qualidade dos serviços
públicos, entre outras desatenções, o que atinge a todos os segmentos sociais, da criança ao idoso
e, certamente, trará conseqüências na qualidade do envelhecimento populacional e riscos à
qualidade da longevidade.
Há, no movimento dos idosos, uma descrença em relação ao incremento de políticas sociais e
as medidas adotadas pelos atuais governos, em especial, quanto à previdência social, no que
concerne: à garantia aos direitos, nos sinais de desconfiança aos dados oficiais, em relação à
aplicação das leis e, ainda, em posições contrárias à reforma da Previdência. Tanto na pesquisa
do NEVES, já citada, ou mesmo a partir dos Fóruns Nacionais da Política Nacional do Idoso
(realizados em Fortaleza-CE (1996), Porto Alegre-RS (1998), Olinda-PE (2000) e Niterói-RJ
(2003), pode-se afirmar que há uma insatisfação quanto a não implementação de políticas
públicas, em especial, as que fazem referência à Lei 8842/94. A Lei 8842/94, regulamentada em
1996, desde sua implantação não teve as ações integradas de forma concreta como prevê sua
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regulamentação (1996) em sua aplicação aos Programas estabelecidos e pouco alterou o quadro
brasileiro em relação à velhice pobre, doente e usuária dos serviços públicos.
Percebe-se, no entanto, uma forte referência quanto à perspectiva de organização social e
política e já uma sensível indicação de um movimento aliado por direitos mais amplos e por uma
maior incorporação à luta dos trabalhadores-aposentados, levando em conta as questões da
assistência e maior proteção à velhice.
Essa articulação entre movimento de trabalhadores aposentados e o movimento do idoso pode
ser nitidamente percebida. De um lado, nas mais de vinte Cartas-Abertas ou Manifestos
produzidos pelo movimento do idoso. A maioria faz referências à melhoria da previdência ou às
garantias à aposentadoria e, de outro lado, os trabalhadores-aposentados em documentosmanifestos de suas organizações há expressivas reivindicações ou recomendações sobre Políticas
para o idoso e na instalação de Conselhos do Idoso. Pode-se citar a Carta Aberta à Sociedade
Brasileira produzida pela Confederação Brasileira de Aposentados e Pensionistas – COBAP, em
1999, ou, no manifesto elaborado pela Associação dos Aposentados e Pensionistas da
Previdência Social do Rio de Janeiro – ASAPREV, divulgado no Dia de Construção da
Mobilização Nacional do Idoso no Aterro do Flamengo (Rio de Janeiro, novembro de 2000),
que em seus itens faz reivindicações específicas sobre a Previdência e a Aposentadoria. Trechos
do documento expressam:
– ... o cumprimento dos preceitos legais de proteção ao idoso, sempre em consonância com
a sociedade. Essa é a importância dos Conselhos Federal, Estaduais e Municipais de Defesa
dos Direitos dos Idosos ..., o que se reclama é o direito de cidadania. Se a sociedade sente a
necessidade de promulgar leis garantidoras de direitos de minorias, quaisquer que elas sejam,
é porque estas existem e são discriminadas ... o que desejamos, homens e mulheres idosos não
são privilégios e sim respeito, dignidade e reconhecimento da qualidade de cidadão.
As lutas e reivindicações dos trabalhadores-aposentados, desde as décadas anteriores até ao
final da década de 90, ainda não continha defesas explícitas em relação às demandas dos idosos.
Os idosos, também, não possuíam qualquer expressão ou visibilidade enquanto segmento de
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movimento sóciopolítico. Hoje, a luta dos trabalhadores-aposentados traz consigo uma maior
consciência política do papel que estes trabalhadores exerceram e/ou exerceu no campo das
conquistas de direitos. Eles possuem uma maior clareza de contribuição para o desenvolvimento
do país, enquanto classe trabalhadora. Os trabalhadores-aposentados ligados ao movimento
sindical ou a Entidades de Aposentados, também demonstram ter uma idéia mais nítida de seu
papel de resistência e de recusa a estereótipos que lhes são atribuídos, tais como: inativos ou
improdutivos, inúteis, dentre outros.
Assim, o que se observa é que há uma clara tendência, cada vez mais forte de alianças, entre as
organizações de aposentados e o idoso. Da sutileza em algumas falas até as mais explícitas
manifestações públicas ou no rol dos manifestos escritos, há uma nítida e maior aproximação dos
trabalhadores-aposentados com a questão da velhice. E estas lutas, certamente, serão travadas em
conjunto, uma vez que, pelas regras atuais da previdência, tornam improvável a possibilidade de
algum trabalhador atingir sua aposentadoria antes de chegar à velhice.
Revela-se, então, uma provável tendência a se promover uma maior organização do idoso,
tanto através dos espaços específicos que se constituem, particularmente, nos Fóruns e nos
Conselhos, quanto, também, pela aliança com outras organizações já históricas e
tradicionalmente experientes nesse campo de lutas e nas reivindicações de direitos, tais como a
organização dos aposentados, os próprios sindicatos, com Conselhos por áreas (Assistência
Social, Saúde, Educação etc) e/ou de segmentos sociais (Mulheres, Negros, Deficientes Físicos
etc). Nesse sentido, é possível vislumbrar que a velhice não estará mais tão só.
Confirmando esta característica, pode-se dar como exemplo o resultado da eleição de entidades
não-governamentais, realizada em setembro de 2000, para o Conselho Estadual de Defesa dos
Direitos da Pessoa Idosa do Rio de Janeiro, onde o Fórum Permanente da Política Nacional e
Estadual do Idoso elegeu 04 (quatro) entidades de trabalhadores-aposentados que se
apresentaram como candidatos, tornando-se a maior representação no CEDEPI. Este quadro
demonstra uma maior atenção das entidades de trabalhadores-aposentados pela questão do idoso.
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Situação semelhante à implantação da lei do Idoso, em 1994, viria a ocorrer em julho de 1996,
com sua regulamentação pelo Dec. Lei 1948/96, ocorrida, também, pela repercussão nacional e
internacional originada de fatos graves e mais dramáticos, como foi o caso da tragédia (1996) da
Clínica Santa Genoveva, no Rio de Janeiro. A morte de uma centena de idosos, numa clínica
privada, custeada por recursos públicos de saúde, exigiu medidas mais urgentes, aguardadas pela
sociedade e “esquecidas” pelas autoridades.
Idoso em Movimento: envelhecer é um direito do cidadão – envelhecer com dignidade um
dever da sociedade
A propagação do fenômeno do envelhecimento e suas questões foram inicialmente difundidas
pelas organizações internacionais, que passaram a demandar preocupações e a chamar a atenção
dos países e de suas autoridades para o advento do envelhecimento como fenômeno mundial. Em
particular, organizações internacionais como a ONU e a OMS tiveram um papel fundamental na
comunicação de problemas referentes ao envelhecimento mundial, no sentido de divulgar tanto
os índices demográficos que apontavam o envelhecimento populacional, quanto os impactos
desse envelhecimento nos países mais pobres, também, na tentativa de estimular medidas e ações
por parte dos países. Como destaca Fernandes (1997), houve uma importante Assembléia
Mundial sobre o Envelhecimento, realizado em Viena em 1982, que possibilitou conhecer a
realidade social dos idosos de muitos países. O autor destaca as inter-relações do problema dos
idosos com outras questões de natureza social, tais como os problemas da família e da mulher.
É a partir da Reunião de Viena, que se dá início a campanhas informativas no mundo inteiro,
declaram-se datas comemorativas, culminando na definição para 1999 do Ano Internacional do
Idoso e incentivando-se, também, ações e serviços de todo tipo na busca de soluções
especialmente preventivas, no campo da saúde, com a perspectiva de fomentar o
“envelhecimento saudável” e no campo social pelo envelhecimento com direitos e dignidade.
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Decorrente dessa intenção dos organismos internacionais, que se realizou, em 1997, a
“Caminhada das Gerações”. Essa comemoração ao Dia Internacional do idoso, teve a finalidade
de “chamar a atenção da sociedade e das autoridades para o crescimento do número de idosos e
incentivar a implementação de políticas sociais” (Fernandes, 1997). Pode-se dizer que foi a
primeira iniciativa brasileira de tornar pública, à sociedade, a situação de envelhecimento
populacional no país. Essa Caminhada reuniu mais de 10 mil idosos e foi documentada
(registrada em vídeo), apresentada na Reunião Mundial da OMS, em Genebra/98, e transmitida
para diversos países.
Em decorrência desse acontecimento de 1997, sob a orientação da ONU e da OMS, junto a
outros organismos internacionais de idosos, integrantes do Comitê do Ano Internacional do idoso
decidiram pela realização de um evento internacional intitulado Caminhada de Abraço ao
Mundo, desenvolvido em todos os países, tendo como modelo a Caminhada do Rio de Janeiro.
Cabe ressaltar que no Brasil, além das Caminhadas de outubro de 1997 a 1999, os eventos na
grande maioria para idosos, não são de caráter popular. As caminhadas tiveram repercussão
nacional, porém redundou em parcos resultados em ações concretas da Política Nacional do
Idoso. Contraditoriamente, naquele mesmo ano internacional do idoso (1999), algumas medidas
governamentais, tais como a reforma da previdência, desrespaita a história e a memória,
retiraram direitos e benefícios conquistados pelos trabalhadores da ativa, impedindo-os, hoje, de
usufruir como aposentados.
É como ressalta Bosi (1994): “Quando as mudanças históricas se aceleram e a sociedade
extrai sua energia da divisão de classes, criando uma série de rupturas nas relações entre os
homens e na relação dos homens com a natureza, todo sentimento de continuidade é arrancado
de nosso trabalho. Destruirão amanhã o que construirmos hoje”.
Medidas Provisórias e leis foram criadas diminuindo direitos ou sugerindo a taxação de novos
impostos e/ou contribuições aos aposentados, particularmente do serviço público. Se o Ano
Internacional do Idoso foi de comemorações e celebrações às conquistas do envelhecimento e da
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longevidade alcançadas, foi, também, no Brasil, um ano de perdas, em que tais medidas,
implicitamente, injetam estímulos para uma privatização da Previdência Social. Recentemente,
em plena Campanha da Fraternidade 2003, em favor dos idosos, o Brasil realiza nova reforma da
Previdência Social, onde outros direitos são eliminados e a taxação aos aposentados do serviço
público é aprovada.
Ressalta-se, entretanto, que desde 1999, algumas medidas governamentais (Decretos, Portarias
e Resoluções: MPAS/Decreto 1948; MPAS/Decreto 1330, dentre outros) foram criadas,
especialmente, pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, pelo Ministério da Educação
e pelo Ministério da Saúde, porém de pouca repercussão e, até o momento, de pouca visibilidade
ou com poucos resultados práticos. O Ministério da Saúde lançou sua própria Política Nacional
da Saúde do Idoso e, até o momento, a vacinação dos idosos, por dois anos consecutivos, (1999 e
2000) se apresenta como a maior ação em nível nacional.
Por outro lado, nos últimos anos, é a mídia que se mostra bem mais ativa e intensa na
divulgação e no tratamento de temas relativos ao envelhecimento e às questões dos idosos. Em
nenhum outro período foram transmitidas tantas matérias jornalísticas e/ou programas, tratando
do tema do idoso e do envelhecimento. Agora já não mais as notícias sensacionalistas, que fazem
com que a velhice entre em cena.
No entanto, até a década de 60/70, o segmento idoso não fazia parte da cena do cotidiano
brasileiro. Pouco havia, neste cenário, de referências a organizações sociais ou entidades
exclusivas de idosos. Algumas relacionadas aos aposentados e pensionistas pelo INSS ou
destacavam-se os trabalhos assistenciais da LBA ou no SESC no campo do lazer.
Nos anos 60/70, havia poucas entidades organizadas de trabalhadores-aposentados. No Rio de
janeiro o que se tinha notícia, até as décadas de 70/80, provinha de entidades ligadas a grupos da
sociedade, dentre algumas, como a dos ex-combatentes, nos anos 50, formada no pós-guerra e
constituída por homens e mulheres jovens ou de meia-idade, cujos integrantes se tornaram
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somente idosos nas décadas de 70 a 90; ou, ainda, como as agremiações do universo cultural, tais
como as velhas-guardas na maioria das Escolas de Samba.
A década de 80 é que se torna o palco de muitos problemas para os trabalhadores com reflexos
significativos para os trabalhadores-aposentados, especialmente pelos reajustes diferenciados, o
que gerou a criação das associações dos trabalhadores-aposentados em quase todos os estados
e/ou municípios (no Estado do Rio de Janeiro organizou-se a Associação dos Aposentados e
Pensionistas da Previdência – ASAPREV), vindo a decorrer dessas diversas associações as
Federações das Associações de Aposentados, nos Estados, e, também, a Confederação dos
Aposentados – COBAP, com sede em Brasília.
Essas organizações configuraram-se numa importante força de resistência (Raichelis, 2002) e
luta pelas garantias dos direitos previdenciários, proventos, benefícios e reajustes de
aposentadorias. Portanto, o movimento, onde então, se dava apenas em ações judiciais,
promovidos pelas Associações, acabou gerando, como já foi dito anteriormente, no grande
movimento dos trabalhadores-aposentados que culminou no enfrentamento com o governo
Collor pelos 147%.
Para recordar alguns assuntos já mencionados, foi, também, nas décadas de 70/80, que
surgiram importantes organizações técnico-científicas voltadas para a Gerontologia, como a
Associação Cearense Pró-Idosos – ACEPI – Ceará, a Associação Nacional de Gerontologia –
ANG, e, principalmente no campo geriátrico a Sociedade Brasileira de Geriatria – SBG (década
de 60), que mais tarde incorpora o segmento da Gerontologia, tornando-se assim SBGg e,
posteriormente SBGG.
No campo previdenciário ou aposentadoria, após a unificação dos IAPs (década de 60) no hoje
denominado INPS, os interesses dos trabalhadores-aposentados não eram contemplados pela
maioria dos sindicatos (mesmo quando os trabalhadores-aposentados de determinadas categorias
recebiam apoio para realizar suas reuniões ou manterem suas organizações ligadas aos mesmos).
Muito embora alguns grupos de aposentados ocupassem lugares ou espaços nos sindicatos,
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ocorria de forma isolada. Inclusive, a maioria dos sindicatos sequer incluía os assuntos referentes
à aposentadoria ou às reivindicações dos trabalhadores-aposentados nas suas pautas de
negociação. No entanto, a partir da força organizativa do movimento dos 147%, muitos
sindicatos passaram a incorporar as reivindicações dos trabalhadores-aposentados nas
negociações e criando, na maioria dos sindicatos, os “Departamentos de Aposentados”. Ressaltase porém, que, até inicio da década de 90 a organização dos trabalhadores-aposentados ainda não
se identificava com a questão do idoso.
O que chama atenção é que o movimento sóciopolítico do idoso, especialmente pela
implantação de políticas sociais e medidas governamentais, vai se evidenciar somente a partir
dos meados dos anos 80, quando se realizaram alguns eventos voltados para o segmento idoso,
especialmente ligado a Instituições como o SESC/SP (1984), ANG ou ACEPI/CE (1986), dos
quais surgiram manifestos públicos, com edições de "Cartas Abertas" à população e às
autoridades. Há informações que indicam que tenha sido esse movimento a estimular a criação
da então vigente Política Nacional do Idoso. Nesse sentido, insinua-se uma espécie de
"paternidade" ou "maternidade" dessa lei, uma provável "disputa" quanto a quem pertenceria tal
iniciativa.
Algumas declarações são incontestáveis, tal como a da ex-presidente da Associação Nacional
de Gerontologia – ANG, Professora Nara Costa Rodrigues, reconhecida e respeitada nacional e
internacionalmente pela sua trajetória junto à Gerontologia, que no livro “Conversando com
Nara Costa Rodrigues” (2000), afirma que a Lei 8842/94 é fruto de seminários realizados pela
ANG, em especial, no início dos anos 90.
Nara Costa Rodrigues, também, em um manuscrito para este estudo, expressa que os
manifestos da sociedade civil, particularmente referindo-se às referidas “Cartas Abertas”, não
chegaram a produzir grandes repercussões ou efeitos junto aos governos. No entanto, afirma ter
sido a Carta de São Paulo de 1984, a precursora desse processo.
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Outra participante do movimento dos idosos, a Sra. Maria da Graça Castelo Branco, do Rio de
Janeiro, uma das fundadoras da Associação Nacional de Gerontologia – Seção RJ, afirma que a
lei do Idoso surge efetivamente a partir da Carta dos Idosos do Ceará, em 1986, quando da
realização do Fórum de Gerontologia naquele ano, do qual participou, quando foram formuladas
as propostas que pleiteavam uma Política do Idoso, uma espécie de Estatuto do Idoso.
De todo modo, ambos os depoimentos se referem a 1984 ou 1986, sugerem ter sido esse
período o marco principal da reivindicação por uma Política do Idoso, que se materializou no
Documento da ANG, em 1993, e só viria a se concretizar como lei em 1994. Cabe lembrar que a
Regulamentação da Lei 8842/94 se deu em 03 de julho de 1996, através do Decreto nº 1948, ou
seja, cerca de doze ou catorze anos após as Cartas Abertas do Ceará e de São Paulo,
respectivamente. Mesmo passados quase duas décadas, parece estar longe de sua efetiva
implementação conforme preconiza a Lei de 1994, a Regulamentação de 1996 e o Plano
Intergrado de Ações Governamentais.
Em verdade, as Entidades de Idosos, em nível nacional, estiveram reduzidas à representação
técnica da Gerontologia e da Geriatria, tais como a Sociedade Brasileira de Geriatria e
Gerontologia e a Associação de Gerontologia, ou então, a de trabalhadores-aposentados tais
como a Confederação Brasileira de Aposentados e Pensionistas.
Sem dúvida, a efetivação do movimento idoso na busca de efetiva modificação da atual
situação da maioria dos idosos e por defesa de direitos, faz crer que depende de sua maior
presença como ator e em organização social, maior unidade e fortalecimento do segmento
organizado e de uma maior amplitude das articulações e alianças pela defesa desses direitos e por
novas conquistas sociais.
Pode-se afirmar que a atual participação social do idoso ainda é pouco expressiva - insuficiente
para se garantir uma vida ativa, dinâmica e atuante. Praticamente, se o idoso se vê desmotivado
para participar em grupos, encontros ou outros modos de lazer, ocupação ou entretenimento, que
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são mais atrativos, que dirá no campo sócio-político, onde a mobilização por seus direitos ou luta
mais ampla pela sua cidadania e pelo acesso aos bens de cidadania é quase inexistente.
Muito embora houvesse a ligação da luta dos aposentados com a situação da velhice (final dos
80) e a difusão de matérias sobre a velhice pela mídia (final dos 90), muito pouco produziu no
âmbito das políticas sociais para o idoso. Alguns dramas gravíssimos, tais como o episódio Santa
Genoveva e a absolvição dos envolvidos, a não aplicação de milhões de reais de recursos
públicos enviados para transformar o Abrigo Cristo Redentor em Centro de Referência (o que
não ocorreu), o grande número de denúncias sobre os asilos no Rio de Janeiro com o fechamento
de dezenas deles, e a instalação de mais de uma CPI do Idoso pela Assembléia Legislativa do
Rio de Janeiro (CPI de 1992, CPI 1996 e CPI de 2000), foram e são escândalos (cenas) que
seguramente assentarão poeira (tramas) até caírem no silêncio do esquecimento. Simone de
Beauvoir (1990) já chamava a atenção sobre essa espécie de "conspiração do silêncio".
No caso brasileiro, o “silenciamento” e a (in)visibilidade se dá, também, pela ausência de ações
sociais governamentais e de projetos político-econômicos – provocadores de questões sociais a
todos os segmentos de trabalhadores, em especial aos trabalhadores-aposentados ou idosos – que
são gerados processos de exclusão social, perdas ou violação de direitos e situações de violência.
Como ressalta Beauvoir (1990): “Ninguém o ignora: A condição das pessoas idosas constitui
hoje escândalo... devemos procurar compreender por que motivo a sociedade se acomoda com
tanta facilidade a esta situação. De um modo geral ela fecha os olhos a todos os abusos, dramas
e escândalos que não abalam seu equilíbrio” (Beauvoir, 1990: 265).
Se o número insuficiente de políticas públicas, de programas sociais ou de projetos políticos
levou às tragédias e à escancarada é somente a partir do segmento organizado e, também, do
movimento dos trabalhadores-aposentados que a velhice consegue obter políticas públicas e
maior espaço de participação.
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Sem dúvida, são dramas, como a morte de idosos em Instituições de saúde, é que acaba
tornando mais visível a sua situação de idoso negligenciado e tem feito surgir medidas
governamentais ou produção de legislações nacionais, estaduais e municipais.
No entanto, paralelamente, cresce uma outra visibilidade, feita pelo movimento do idoso, em
especial, suscitado na formação de fóruns, conselhos e outras inúmeras formas de organização
para maior participação social de idosos no Brasil, nos estados e municípios, com vistas a que as
legislações e as políticas públicas não sejam mais resultado dos dramas, mas como frutos da
protagonização cidadã do idoso.
Organização social e visibilidade da velhice – idoso presente e atuante, na perspectiva do
futuro
Se a sociedade nos 50/60 decantava o país jovem com futuro, não reconhecendo o processo de
envelhecimento populacional, será nas primeiras décadas do século XXI que a sociedade
brasileira terá que conviver com o país-velho do presente.
A velhice ocupa cada vez mais espaços. Nos últimos anos, surgem com mais intensidade, nos
cenários locais, Instituições e Entidades dirigidas aos idosos (Fóruns, conselhos, universidades
abertas, grupos sociais e de convivência). E cada vez mais os discursos e práticas denotam a
protagonização dos idosos. No entanto, a protagonização não se dá somente pelo fato dos idosos
estarem nesses espaços de sociabilidade, mas, sim, pela atuação no universo sócio-político, com
real possibilidade de apresentar e debater idéias e propostas, definir, deliberar e agir, assim,
como o convívio com a pluralidade, na relação com as diferenças, tanto na perspectiva de sua
convivência entre si, como segmento e de organização específica, quanto na construção de uma
convivência diversa e múltipla com outros segmentos sociais e etários – realizando a
intergeracionalidade.
O espaço da velhice e a realização desses espaços, cada qual com suas formas de organização
social possui, particularmente, objetivos específicos, tanto no atendimento de interesses técnicos,
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científicos ou de atenção às necessidades dos idosos em diversos campos (saúde, assistência,
orientação, orientação profissional para o cuidados de idosos etc), quanto, no caso da maioria das
Entidades; na qualificação ou socialização de conhecimentos gerais ou disciplinas abertas aos
idosos, comuns à maioria das universidades da terceira idade, e em grupos ou clubes de
convivência, que se ocupam basicamente da promoção de encontros informais em torno de
atividades de lazer (bailes, passeios, atividades lúdicas etc).
No entanto, não se pode desconhecer que há outras diferentes formas de organização e
diferentes propostas de grupos de convivência. Mas, o se assiste de modo crescente, são ações
governamentais ou de entidades não-governamentais ou particulares, atendendo a uma demanda
cada vez maior por atividades de lazer, entretenimento e/ou ocupação do tempo livre. Em geral,
motivados pelos fatores de isolamento social, exclusão e empobrecimento da maioria dos idosos.
As organizações de idosos voltadas para entretenimento e ocupação social, os chamados
grupos ou centros de convivência, segmentados e exclusivos de idosos, como tal, se difundem
como lugares de lazer: passeios e festas (bailes), e se os apresentam como a maior demanda e,
assim, proliferam vertiginosamente. O lazer, os passeios e os bailes,
são extremamente
necessários e devem, sim, ser estimulados, eles fazem parte da vida dos homens e mulheres,
porém, também são espaços de troca, de circulação de informações e, principalmente, deveriam
ser espaços de memória, de convivência intergeracional. Mas, em se tratando de atividade fim,
por si só, podem comprometer níveis de cidadania e, conseqüentemente, podem retardar
processos de participação social, democratização e garantias de direitos. São espaços
importantes, muito embora, em sua maioria, ocorram sob interesses particulares, sem definição,
desordenados, sem critérios claros, comprometendo a qualidade da organização social e política
do idoso. Esses espaços deveriam ser privilegiados para a tomada de consciência e, assim,
tornarem-se verdadeiros espaços públicos, importantes para o exercício da memória, da história e
da cidadania.
19
Atualmente, no Brasil, já existem milhares de grupos de convivência espalhados nos diversos
municípios, assim como são estimulados, no campo das políticas públicas, como únicos
programas com tal finalidade. Desconhece-se, no entanto, a preocupação dos organismos
públicos pela qualificação dos dirigentes desses grupos (organizados, em sua maioria, por
iniciativas particulares), sem acompanhamento dos órgãos públicos ou conselhos. Não há, na
maioria dos municípios ou Estados, cadastramento, monitoramento ou mesmo controle na
criação desses grupos ou organizações, tampouco fiscalização de funcionamento. Esta é uma
tarefa que caberia certamente ao Conselho Nacional e, conseqüentemente, aos Conselhos
Estaduais, do Distrito Federal e Municipais. Na não-existência do Conselho Nacional, com as
atribuições estabelecidas pela lei 8842/94, essa regulamentação poderia estar sendo viabilizada
pela Comissão Nacional de Articulação da PNI e, também, nos Fóruns de debate sobre Políticas
do Idoso Regionais, Estaduais, Municipais e Locais. Fóruns e Conselhos são essenciais na
mobilização e na proposição de ações.
No caso dos Fóruns, estes se criaram como Fóruns da Política Nacional do Idoso, a partir de
1994, incentivados pelos então Escritórios de Representação da Secretaria de Assistência Social,
juntamente com Instituições, Entidades e Grupos de Idosos. Foram criados nas cinco Regiões do
Brasil e em vários Estados e municípios. Por ocasião do II Fórum Nacional, realizado na Região
Sul, acatou-se a reivindicação para que esses Fóruns se tornassem permanentes. A Carta de
Florianópolis recomenda que os Fóruns Regionais tenham
periodicidade anual e o Fórum
Nacional bi-anual. No III Fórum Nacional realizado em Olinda, constituiu-se uma Comissão
Nacional de Articulação Nacional, com 09 (nove) membros representantes das 05 (cinco)
regiões, representante de órgão governamental, representante de entidade não-governamental,
representante de Conselho do Idoso e representante de idoso/aposentado, para atuar junto aos
Fóruns Regionais e organizar os Fóruns Nacionais. Essa Comissão, apesar de não ter tido uma
ação efetiva, desde sua criação em 2000. Ela foi mantida no IV Fórum Nacional, realizado em
julho de 2003 em Niterói, porém, atribuindo-lhe competências e uma agenda mínima de ação. Os
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Fóruns (Nacional, Regionais, Estaduais ou Locais), juntamente com essa Comissão Nacional de
Articulação, têm um papel importante no fortalecimento do movimento do idoso e na ação
descentralizada da Política nacional do Idoso nos Estados e Municípios e, também, o de estreitar
a parceria com as organizações não-governamentais.
É, também, nos anos 90, que tem início a criação dos Conselhos de Idosos, hoje soma-se mais
de 20 Estados com Conselhos, sendo alguns anteriores a Lei 8842/94, como o de São Paulo
(1987), Rio Grande do Sul (1988), Santa Catarina (1990) e Sergipe (1991).
Esta Lei que implanta a Política Nacional do Idoso e cria o Conselho Nacional do Idoso,
juntamente com o Substitutivo ao Projeto Lei 3561 de setembro de 2001 (ainda não aprovado)
que cria o Estatuto do Idoso, tornam-se importantes instrumentos da luta dos idosos e
aposentados, transformando-se em pilares do movimento social do idoso e pela organização
social do idoso em todo o Brasil. No entanto, para finalizar, somente as Leis e o Estatuto do
Idoso por si mesma, demonstram incapazes de se concretizar e cumprir com suas determinações,
o que significa que cada vez mais o movimento social do idoso, tendo o idoso organizado, como
verdadeiro ator e protagonista coletivo, deverá empenhar-se na luta por direitos, conquistas
sociais e pela cidadania do idoso.
E estas conquistas serão alcançadas cumprindo-se a proposta de Heloisa Helena Martins: "... os
idosos não esperam mais que lutemos por eles, mas que lutemos com eles".
o Fragmentos de textos:

Livro de Simone de Beauvoir : A Velhice.
“... se a velhice, enquanto destino biológico, é uma realidade que transcende a história, não é
menos verdade que este destino é vivido de maneira variável segundo o contexto social;
inversamente: o sentido ou não sentido de que se reveste a velhice no seio de uma sociedade
coloca toda essa sociedade em questão ...” (p.16) “como deveria ser uma sociedade, para que,
21
em sua velhice, o homem permanecesse um homem? A resposta é simples: seria preciso que ele
fosse sempre tratado como homem.” (ps. 663)

Livro de Evelina Dagnino: Sociedade Civil e Espaços Públicos no Brasil
“Esse processo de democratização, que se inicia com as lutas contra a ditadura militar e se
estende aos nossos dias, sem previsão quanto ao seu término, não é linear, mas deve ser
entendido como desigual no seu ritmo, nos seus efeitos sobre as diferentes áreas da vida social e
política, combinando avanços, estagnação e até mesmo retrocessos. Esse entendimento permite
dar conta da complexa dinâmica que apresenta a democracia como um processo multifacetado
que resulta da disputa entre distintos projetos políticos que, no interior da sociedade civil e dos
diversos níveis do aparato estatal, confrontam distintas concepções sobre a própria natureza e os
limites do processo.” (p. 10)

Livro de Maria da Glória Gohn: Conselhos Gestores e Participação Sóciopolítica. São
Paulo, Cortez, 2001.
“Os novos mecanismos participativos ... se baseiam no engajamento popular como um recurso
produtivo central: a participação dos cidadãos provê informações e diagnósticos sobre os
problemas públicos, gerando conhecimentos e subsídios a elaboração de estratégias para
resolução dos problemas e conflitos envolvidos. Assim como os movimentos sociais ... os novos
experimentos participativos desempenham também papel educativo aos seus participantes; a
medida que fornecem informações, os capacitam a tomada de decisões e desenvolvem a
sabedoria política. (p.43) “Trata-se de um novo padrão de relações entre Estado e sociedade,
porque eles viabilizam a participação de segmentos sociais na formulação de políticas sociais e
possibilitam à população o acesso aos espaços nos quais se tomam decisões políticas. (p.88)”.
o Propostas de Estudos e Exercícios:
Acompanhar a constituição dos Conselhos nos Estados e Municípios, se têm participação
popular ou se são somente através das leis que os criam e compara-los quanto a natureza, ao
22
caráter, competências e atribuições. Participar das Reuniões dos Fóruns e registrar as principais
demandas do movimento social do idoso. Visitar grupos de convivência e avaliar suas propostas,
em especial, como se dão as inter-relações com outros segmentos.
BIBLIOGRAFIA
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(documento), Brasília, 1989.
BEAUVOIR, S. de. A Velhice. Tradução de Maria Helena Franco Martins. Rio de Janeiro:
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FERNANDES, F. da S. As Pessoas Idosas na Legislação Brasileira – Direito e Gerontologia.
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GOHN, M.G. Conselhos Gestores e Participação Sóciopolítica. São Paulo, Cortez, 2001.
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OLIVEIRA, F. A economia política da hegemonia imperfeita. In Os direitos do antivalor.
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RAICHELIS, R. Esfera Pública e Conselhos de Assistência Social: caminhos da construção
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RODRIGUES, N. C.. Conversando com Nara Costa Rodrigues sobre gerontologia social.
Passo Fundo, RS: UFP, 2000.
SIMÕES, J.A. A maior categoria do país: o aposentado como ator político. In: BARROS, M. L
de (Org). Velhice ou terceira idade? Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1998.
Comentário sobre a bibliografia: Consideramos os textos atuais, renomados, e que tratam de
temas relacionados ao assunto do capítulo, dando preferência aos que, de algum modo,
vinculavam a velhice e/ou aos movimentos sociais.
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