Medicina Relato de Pesquisa /Research Reports ISSN 2176-9095 2176-9095 ISSN Science in Health 2010 set-dez; 1(3): 111-20 COMO COMUNICAR MÁS NOTÍCIAS COMMUNICATING BAD NEWS Nelson Henrique da Silva* Fabiana Augusto Neman** Resumo ABSTRACT Introdução: Perante as necessidades de uma maior humanização na área da saúde, surgiu o interesse por esse assunto que é tão pouco estudado pelos alunos de medicina e também pouco difundido entre a grande maioria dos médicos do município de São Paulo. Com o objetivo de montar um protocolo de orientação para profissionais de saúde habilitados para a comunicação de más notícias, este estudo teve como base as opiniões de 20 médicos que atuam nas instituições de saúde do município de São Paulo. Métodos: Para tanto, foi montado um questionário composto de 18 questões. Resultados: Dentre as respostas mais relevantes, 50% dos médicos afirmaram que não receberam informação alguma em sua formação acadêmica relacionada a más notícias, 65% se sentem preparados para passar a informação e 75% não conhecem nenhum protocolo relacionado ao tema. Conclusão: Discute-se a necessidade de um maior debate do assunto nas universidades, além da necessidade de divulgação de protocolos relacionados. Introduction: Perante the needs of a larger humanization in the area of the health, the interest appeared for that subject that is so little studied by the medicine students and that is also little spread among the doctors of the municipal district of São Paulo in great majority. With the objective of setting up an orientation protocol for qualified professionals of health for the communication of bad news, this study had as base the 20 doctors’ opinion that act in the institutions of health of the municipal district of São Paulo. Methods: So that, a questionnaire composed by 18 subjects was set up. Results: Among the most relevant answers, 50% of the doctors said that they didn’t receive any information in his/ her academic formation about bad news; 65% said that they feel prepared to pass the information and 75% don’t know any protocol related to the theme. Conclusion: The need of a larger discussion about this subject is considered in universities, besides the need of popularization of related protocols. Descritores: Humanização das assistências • Relações mé- Descriptors: Humanization of assistance • Phisician-pacient dico-paciente • Revelação da verdade • Educação médica • Ética médica • Profissional da saúde. relations • Truth disclouse • Education, medical • Ethics, medical • Healt personel. 111 Medicina Relato de Pesquisa / Research Reports Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 ISSN 2176-9095 Introdução De acordo com Vandekief1 (2001), Muller2 (2002), Lima3 (2003), más noticias são todas aquelas que causam alguma mudança brusca na vida do paciente. Com isso, este pode vir a desenvolver outras patologias, além daquelas que já o acometeram. Outra definição é que “má notícia pode ser qualquer informação que afeta negativamente a vida futura do indivíduo” (Buckman4 1992). Não necessariamente precisa ser uma notícia de morte, mas alguma doença grave, incapacidades físicas causadas por acidente, perda da visão, entre outras. O interesse pelo presente trabalho surgiu por meio da observação de algumas pessoas que, por estarem passando por um processo de doença grave, receberam a notícia da patologia de maneira inadequada e, consequentemente, desenvolveram outros quadros de doenças físicas e até mesmo psíquicas. Além disso, a quantidade de trabalhos científicos relacionados a esse assunto é muito reduzida, proporcionando uma maior abertura para novos estudos e oportunidades de auxiliar os profissionais de saúde, principalmente os médicos, a oferecerem um maior conforto ao paciente que passa por um momento difícil. A qualidade da relação médico-paciente e do ensino médico atual também não pode deixar de ser ressaltada, visto que, no momento, é assunto muito discutido no meio acadêmico e está intimamente relacionada com a qualidade de comunicação de uma má notícia. Com isso, muitos tópicos relacionados aos referidos temas serão citados no decorrer deste trabalho, visando ressaltar a sua grande importância. A atual formação médica vem sendo muito contestada nos últimos anos, devido a diversas “falhas” encontradas em alguns profissionais médicos, já que algumas instituições trazem a promessa de um curso de medicina completo, mas que, na verdade, escondem um enorme despreparo e, consequentemente, profissionais inseguros, sem o conteúdo adequado, podendo afetar diretamente os pacientes. O médico é vítima da sociedade atual e ele não tem culpa, pois entra em uma faculdade esperançoso de tornar-se médico. É a sua intenção, seu desejo e sua aspiração, mas existem fábricas de diplomas, que devem ser um bom negócio, talvez mais político que financeiro. Abrem-se novas faculdades sem necessidade e sem a devida infraestrutura, sem corpo docente academica- 112 mente qualificado nem hospital próprio. Troncon et al.5 (1998) ressalta que ocorre um visível desinteresse da maioria das faculdades de medicina pelo conhecimento global do paciente, ou seja, os aspectos psicossociais são deixados de lado, prevalecendo fortemente o conhecimento específico e biológico. “As escolas médicas estão submergindo os estudantes em pormenores opressores sobre conhecimentos especializados e aplicação de tecnologias sofisticadas, restringindo a aprendizagem de habilidades médicas fundamentais, o que pode levar a uma fascinação pela tecnologia, tornando o artefato mais importante que o paciente. Faz-se necessário, portanto, introduzir com maior determinação temas de bioética na grade curricular dos cursos médicos e ouvir, com atenção (Troncon et al.5 1998). É fato que os próprios pacientes também estão sentindo as mudanças que ocorreram na Medicina e os sintomas desse fato são claros. O tecnicismo e a falta de humanização na medicina trouxeram à tona o fato de que o homem há de ter direitos de cidadania, entretanto, seu incremento veio atrasado, chegou de maneira abrupta e tumultuada, utilizando como ferramenta a reclamação. Se por um lado ela é fundamental, trouxe por outro um germe perverso que prejudica a relação médico-paciente. Foram péssimas as consequências para o doente que, sempre desconfiado, perde a segurança no médico, gerando para este muito desconforto. É comum e até frequente o médico ouvir, até mesmo na entrada do centro cirúrgico, uma grosseria do paciente ou de seu familiar. As palavras discorridas acima podem revelar que nem sempre o paciente sente-se seguro diante de um profissional médico, fato este que pode prejudicar a comunicação de uma má notícia por parte do médico e também pode alterar a interpretação do paciente diante das palavras que lhe foram ditas. É fundamental diante dessa problemática que o médico, a enfermeira e toda a equipe de saúde se preocupem em superar esses obstáculos e trazer à tona o humano que existe dentro do homem para que se consiga humanizar a medicina e, assim, cuidar do paciente, lembrando que tanto o paciente quanto a família sofrem. Venho observando rotineiramente, apesar de minha incipiente experiência, diversos pacientes indagando sobre o mau atendimento médico e relatando intenso descontentamento por motivo de se sentirem Medicina Relato de Pesquisa / Research Reports Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 ISSN 2176-9095 como algo não humano ou, até mesmo, desprovido de sentimentos “(...) busca-se o médico com quem nos sentimos à vontade quando descrevemos nossas queixas, sem receio de sermos submetidos, por causa disso, a numerosos procedimentos; o médico para quem o paciente nunca é uma estatística e, acima de tudo, que seja um semelhante, um ser humano cuja preocupação pelo paciente é avivada pela alegria de servir” (Lown6 2004). Apoiando as ideias acima e em defesa não só do paciente, mas também do médico, apresenta-se o Código de Ética Médica, no qual estão inseridos artigos que fomentam todos os argumentos até aqui apresentados. Duas passagens do código me chamaram à atenção com base na intenção da defesa moral, física e psíquica do paciente. São elas: Art. 6° - O médico deve guardar absoluto respeito pela vida humana, atuando sempre em benefício do paciente. Jamais utilizará seus conhecimentos para gerar sofrimento físico ou moral, para o extermínio do ser humano, ou para permitir e acobertar tentativa contra sua dignidade e integridade. Art. 41 - Deixar de esclarecer o paciente sobre as determinantes sociais, ambientais ou profissionais de sua doença. Essas palavras devem estar gravadas na memória de todo médico, principalmente daqueles que, de alguma forma, já informaram uma má notícia de maneira muito ríspida ou então não deram a devida atenção ao paciente que passa por um momento delicado de sua vida. Além disso, o Código de Ética Médica deve ser conhecido por todos os profissionais da área, pois muitos equívocos poderão ser evitados. É imprescindível citar também que na hierarquia hospitalar as responsabilidades e tarefas delegadas a cada membro da equipe de saúde podem despertar angústias de modo distinto nesses profissionais. O médico passa menos tempo com os pacientes, mas é quem perante a sociedade detém a maior responsabilidade de cura, apresentando maior sentimento de fracasso e medo de errar ante a morte de seu paciente. Tem sido descrita a defasagem entre a posição hierárquica do profissional de saúde e o tempo que efetivamente despende com o paciente. Quanto mais especializado for, menos tempo gastará com o doente no ambiente hospitalar, o que também ocorre nas situações de morte do paciente, como afirma Moritz7 113 (2003). O relato acima pode ser associado ao fato de que grande parcela dos médicos especialistas possui dificuldades em se relacionarem com seus pacientes, o que permite uma reflexão sobre a falta de capacidade de passar uma má notícia. Além disso, é importante ressaltar que muitos profissionais de saúde não têm a consciência de que os familiares dos enfermos também estão envolvidos em todo o processo. De acordo com Kübler8 (1992), os pacientes ou seus familiares normalmente passam pelos mesmos estágios quando recebem uma má notícia. Esses estágios foram classificados para pacientes que estavam morrendo. Inúmeras outras situações presentes na prática dos profissionais de saúde, como a comunicação de diagnósticos de doenças genéticas, por exemplo, podem fazer com que as pessoas passem por estágios semelhantes. Os estágios são os seguintes: Choque inicial; Negação e isolamento; Raiva; Barganha; Depressão; Aceitação. De acordo com os dados acima estabelecidos, é possível o conhecimento de algumas orientações que são disponibilizadas por alguns autores e estabelecem formas de comportamento de um médico diante da situação de ter que passar uma informação difícil para o paciente. “É muito importante compreender o paciente, ter uma expressão neutra e, em seguida, informar as más notícias de maneira clara e direta. Usar um tom de voz suave, pausado e usar uma linguagem sincera. O profissional deverá assegurar-se que o paciente tenha compreendido a mensagem com clareza. A maioria dos autores sugere o uso de uma linguagem simples, sem muitos termos médicos. Isso não significa, no entanto, que o uso de terminologia específica e adequada não seja também importante para que o paciente possa, por conta própria, encontrar informações sobre sua doença” (Ptacek e Eberhardt9 1996). Tendo em vista toda a preocupação com a qualidade da comunicação, principalmente do médico para com seu paciente, não podemos nos esquecer de que a responsabilidade para passar uma má notícia sempre recai sobre os ombros do médico, mas é importante Medicina Relato de Pesquisa / Research Reports Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 ISSN 2176-9095 ressaltar que outros profissionais de saúde como enfermeiros, psicólogos e até mesmo alunos estagiários autorizados pelo hospital podem ser incumbidos para tal ação. A exposição acima permite uma reflexão sobre o preparo de muitos profissionais de saúde, visto que é muito difícil manter o controle emocional, ou até mesmo ter de lidar com reações inesperadas dos indivíduos que recebem má notícia. Método A busca de novos horizontes para um assunto ainda tão desconhecido orientou-nos para um estudo com caráter qualitativo, por pretender analisar essa atividade tão difícil para qualquer profissional da saúde. O trabalho foi realizado em três etapas, as quais consistiram em: coleta dos dados fornecidos pelos profissionais médicos, tabulação das respostas obtidas e elaboração de um protocolo de orientação para os profissionais da saúde habilitados para comunicar más notícias. Para o alcance do objetivo proposto foi utilizado um questionário composto de perguntas abertas e fechadas, as quais foram empregadas para uma população delimitada de médicos que atendem nas instituições de saúde do município de São Paulo, os quais tiveram que transmitir uma notícia de câncer, morte na família, etc. A coleta de dados foi realizada após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Cidade de São Paulo. Com a análise dos resultados obtidos, foi possível elaborar um protocolo de orientação para os profissionais de saúde habilitados para comunicar más notícias. Apresentação dos resultados Na busca de respostas, após a aplicação do instrumento de coleta de dados, com um total de 20 profissionais médicos, foi possível obter as seguintes informações: Em relação à primeira questão obtivemos os dados a seguir: 1, Em sua opinião, o que é uma má notícia? De acordo com Vandekief1 (2001), Muller2 (2002), Lima3 (2003), más noticias são todas aquelas que causam alguma mudança brusca na vida do paciente. Com 114 isso, este pode vir a desenvolver outras patologias, além daquelas que já o acometeram. Outra definição é que “má notícia pode ser qualquer informação que afeta negativamente a vida futura do individuo” (Buckman4 1992). Baseado no gráfico acima, as opiniões dos diferentes médicos não se desviam completamente das definições utilizadas, ou seja, todas as respostas estão diretamente relacionadas a uma mudança negativa na vida do individuo. 2. Você recebeu alguma informação sobre o assunto durante sua formação acadêmica? O gráfico acima expressa a necessidade da introdução do tema “más notícias” nas grades curriculares das faculdades de medicina. A falta de conhecimento sobre o assunto pode trazer diversos problemas ao paciente, visto que manifestações psíquicas e, até mesmo físicas, estão intimamente ralacionadas à rispidez durante o informe da má notícia. Troncon et al.5 (1998) ressalta que ocorre um visível desinteresse da maioria das faculdades de medicina pelo conhecimento global do paciente, ou seja, os aspectos psicossociais são deixados de lado, prevalecendo fortemente o conhecimento específico e biológico. 3. Você se sente preparado(a) para informar uma má noticia? Medicina Relato de Pesquisa / Research Reports Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 ISSN 2176-9095 Mesmo com todas as observações dos dados obtidos, grande parte dos médicos sentem-se preparados e autoconfiantes para passar uma má notícia. Esse fato é muito preocupante, já que o reconhecimento de alguma falha pode ser o primeiro passo para a melhora da qualidade do atendimento médico. 4. Qual a maior dificuldade encontrada na hora de passar uma má notícia? A intimidação após a reação do paciente diante de a uma má notícia pode levar à reflexão sobre o despreparo e a insegurança do médico em contornar situações difíceis e que exijam um maior conhecimento sobre o tema más notícias. 5. Para você, o que é mais importante para o médico no momento de informar a má notícia? De acordo com os diversos trabalhos já descritos, informar uma má notícia aos poucos é uma das melhores atitudes a serem tomadas. 6. Para tomar essa atitude, você leva em consideração o atual estado emocional do paciente? Ver: o gráfico abaixo tem menos partes que as legendas 7. No momento em que o paciente recebe a notícia, você explica todos os riscos da doença que o 115 acomete, bem como sua chance de morte? O gráfico acima leva a crer que, de acordo com os diversos trabalhos descritos sobre o assunto, os médicos estão tomando a decisão mais correta. 8. Já soube de algum paciente que tenha ficado traumatizado após receber uma má notícia de maneira muito ríspida? Os dados encontrados remontam a necessidade de um maior conhecimento sobre o assunto e, além disso, apesar de ser passada a má notícia com informações detalhadas sobre a doença do paciente, podem existir falhas na comunicação entre os médicos Relato de Pesquisa / Research Reports Medicina Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 ISSN 2176-9095 e pacientes. 9. Já teve que informar a enfermidade ao paciente em ambientes movimentados e sem privacidade? Os dados acima levam à reflexão sobre a estrutura da maioria dos hospitais do município de São Paulo, os quais não apresentam a estrutura adequada para a atividade em questão. 10. Percebeu alguma diferença de reação do paciente quando passou a notícia em ambiente privativo? 11. Nas instituições de saúde em que você trabalha, existe algum ambiente específico para informar uma má notícia? A falta de conhecimento de um protocolo se reflete no gráfico acima. 15. Você considera que os médicos que atuam nas instituições de saúde do município de São Paulo estão preparados para passar uma má notícia? 12. Conhece algum protocolo relacionado ao assunto? 16. Você gostaria que os alunos de medicina recebessem maiores orientações sobre o assunto? Os dados indicam a necessidade de um maior conhecimento sobre o assunto. 13. Se conhece algum protocolo, você o segue? 14. Em sua opinião, o que teria que mudar nos atuais protocolos para melhorar a relação do médico para com os pacientes diante da necessidade de informar uma má notícia? Podemos refletir sobre a falta de humanização e o excesso de tecnicidade na Medicina, fato que, nos últimos anos, é ou foi uma realidade no meio médico. Troncon et al.5 (1998) ressalta que ocorre um visível desinteresse da maioria das faculdades de medicina 116 Relato de Pesquisa / Research Reports Medicina Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 ISSN 2176-9095 pelo conhecimento global do paciente, ou seja, os aspectos psicossociais são deixados de lado, prevalecendo fortemente o conhecimento específico e biológico. 17. Você acredita que a falta de humanização na medicina contribuiu para que os cursos médicos tenham sido desprovidos de maiores esclarecimentos sobre o assunto? 18. Em sua opinião, o que deve ser feito para melhorar a relação entre médico e paciente perante a necessidade do profissional de saúde informar uma má notícia? Quadro 1: respostas mais frequentes Questão 1a Em sua opinião, o que seria má notícia? 2ª Você recebeu alguma informação sobre o assunto durante sua formação acadêmica? Não - 50% 3ª Você se sente preparado(a) para informar uma má noticia? Sim - 65% 4ª Qual a maior dificuldade encontrada na hora de passar uma má notícia? Reação do paciente - 60 % 5ª Para você, o que é mais importante para o médico no momento de informar a má notícia? Informar aos poucos - 50% 6ª Para tomar essa atitude você leva em consideração o atual estado emocional do paciente? Sim - 90% 7ª No momento em que o paciente recebe a notícia, você explica todos os riscos da doença que o acomete, bem como sua chance de morte? “As escolas médicas estão submergindo os estudantes em pormenores opressores sobre conhecimentos especializados e aplicação de tecnologias sofisticadas, restringindo a aprendizagem de habilidades médicas fundamentais, o que pode levar a uma fascinação pela tecnologia, tornando o artefato mais importante que o paciente”. Faz-se necessário, portanto, introduzir com maior determinação temas de bioética na grade curricular dos cursos médicos e ouvir, com atenção (Troncon et al.5 1998). Sim - 95% 8ª Já soube de algum paciente que tenha ficado traumatizado após receber Sim - 60% uma má notícia de maneira muito ríspida? 9ª Já teve que informar a enfermidade ao paciente em ambientes movimentados e sem privacidade? Sim - 90% 10ª Percebeu alguma diferença de reação do paciente quando passou a Sim - 80% notícia em ambiente privativo? 11ª Nas instituições de saúde em que você trabalha, existe algum ambiente Não - 100% específico para informar uma má notícia? 12ª Conhece algum protocolo relacionado ao assunto? 117 Resposta obtida Quando leva a piora da qualidade de vida do paciente - 50% Não - 75% Medicina Relato de Pesquisa / Research Reports Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 13ª Se conhece algum protocolo, você o segue? 14ª Em sua opinião, o que teria que mudar nos atuais protocolos para melhorar a relação do médico para com os pacientes diante da necessidade de informar uma má notícia? 15ª Você considera que os médicos que atuam nas instituições de saúde do município de São Paulo estão preparados para passar uma má notícia? 16ª Você gostaria que os alunos de medicina recebessem maiores orientações sobre o assunto? 17ª Você acredita que a falta de humanização na medicina contribuiu para que os cursos médicos tenham sido desprovidos de maiores esclarecimentos sobre o assunto? 18ª Em sua opinião, o que deve ser feito para melhorar a relação entre médico e paciente diante da necessidade do profissional de saúde de informar uma má notícia? ISSN 2176-9095 Não - 80% Nada - 50% Não - 70% Sim - 100% Sim - 90% Introdução do assunto nas universidades - 75% Considerações De acordo com a análise dos gráficos acima, podemos refletir sobre a importância do tema “más notícias” no cotidiano profissional dos médicos. A falta de conhecimento do assunto, devido à não inclusão de disciplinas relacionadas à humanização nas faculdades de Medicina, faz com que a comunicação entre médico e paciente fique prejudicada. De acordo com Quintana et al.10 (2002), essa problemática é pouco explorada nos currículos de Medicina, o que ocasiona uma abordagem inadequada e aumenta desnecessariamente o sofrimento do médico e do paciente, em especial daqueles sem expectativa de cura. Ao lado dessas informações, Ramos et al.11 (2005) propõe a inclusão formal de vivências durante a graduação que recorram a outras estratégias de ensino, como, por exemplo, o emprego de técnicas psicodramáticas. Já há trabalhos nessa linha, mas são experiências esporádicas, sem a força transformadora necessária para aliviar a ansiedade e humanizar o ensino. Os dados obtidos revelam que, apesar de sentir 118 insegurança e medo da reação do paciente diante da má notícia ou então não conhecer nenhum protocolo relacionado ao assunto, a maioria dos médicos sente-se preparada para enfrentar essa difícil situação. Essa é uma grande dualidade, visto que a falta de aceitação do desconhecimento pode levar à falta de novos aprendizados, menor humanização e, consequentemente, um pior atendimento individualizado ao paciente enfermo. A forma com que os médicos transmitem uma má notícia e o quanto expõem a real situação de saúde do paciente também merecem destaque, já que a maioria dos profissionais informa de maneira paulatina e leva em consideração o estado emocional dos indivíduos. Em contraste com essas informações, diversos entrevistados afirmaram conhecer pacientes que receberam a notícia de maneira ríspida e ficaram “traumatizados” após o fato. As considerações de Premi12 (1993) mostram que a preocupação maior dos pesquisadores está centrada na importância (ou não) de informar o paciente o quanto ele deve saber, mas que pouca atenção tem sido dada à capacitação do médico para enfrentar essas situações. Perante todas as considerações acima, a humanização emerge como uma das principais maneiras de melhorar a relação médico-paciente. O papel do médico nesse contexto é essencial, pois uma relação mais harmoniosa, menos científica e mais humana leva a maior credibilidade na relação com a pessoa enferma. A seguir, apresentamos uma proposta para orientação aos profissionais, com o intuito de apoio nessa experiência. 1. Necessidades na graduação: 2. Introdução do tema “comunicação de más notícias” nas grades curriculares das diversas faculdades de medicina. 3. 2- Maior divulgação de protocolos relacionados ao assunto (Spikes). 4. Orientar os alunos de medicina no sentido de maximizar a humanização e melhorar a relação médico-paciente. 5. Maior contato dos alunos de medicina com pacientes portadores de doenças graves, salientando a importância do cuidado especial para com esses indivíduos. 6. Necessidades na atividade profissional: Medicina Relato de Pesquisa / Research Reports Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 ISSN 2176-9095 7. Conhecer o que é uma má notícia. 8. Ter conhecimento de algum protocolo de orientação, como o protocolo Spikes, para evitar o medo da reação do paciente. 9. Procurar seguir esses protocolos, no intuito de minimizar o sofrimento do paciente. 10. Informar a notícia aos poucos, evitando a “rispidez” durante a transmissão da informação. 11. Considerar o estado emocional do paciente, ou seja, dar tempo ao paciente para refletir sobre sua atual situação. 12. Demonstrar segurança ao informar a má notícia. 13. Informar todos os detalhes da doença do individuo, bem como sua sobrevida, possíveis tratamentos ou, até mesmo, sua chance de morte. 14. Informar a má notícia em ambiente silencioso e privativo. 15. Maior humanização no tratamento dos pa- 119 cientes, ou seja, menor quantidade de termos técnicos e maior empatia e compreensão. 16. Introdução de cursos preparatórios para médicos do município de São Paulo sobre o tema más notícias. 17. Adequação das entidades de saúde no intuito de manifestarem o interesse em adaptarem salas específicas para a comunicação das más notícias. Agradecimentos Agradeço à professora Fabiana Neman, à qual destino grande parte do crédito deste trabalho. Além disso, confio a meus pais a imensa gratidão de ter a oportunidade de estudar Medicina e poder elaborar trabalhos científicos, com o intuito de auxiliar pacientes e profissionais de saúde. Este trabalho contou com o apoio financeiro da Universidade Cidade de São Paulo. Relato de Pesquisa / Research Reports Medicina Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 ISSN 2176-9095 Referências 1. Vandekief GK. Breaking Bad News. American Family Physician, 2001; 64:12. 2. uller OS. Breaking bad news to patients - The SPIKES approach can make this difficult M task easier. Postgrad Med 2002 Sep; 112(3): 15-6. 3. lves de Lima AE. Cómo comunicar malas noticias a nuestros pacientes y no morir en A intento, Rev Argent Cardiol 2003 mayo-jun; 71(3): 217-220. 4. uckman R. Breaking Bad News: a guide for health care professionals. Baltimore: Johns B Hopkins University Press; 1992, p. 15. 5. roncon LE, Cianfrone AR, Martin CC. 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