ENCONTRO DE BIOÉTICA DO PARANÁ – Vulnerabilidades: pelo cuidado e defesa da vida em situações de maior vulnerabilidade. 2, 2011,
Curitiba. Anais eletrônicos... Curitiba: Champagnat, 2011, p. 52-61. Disponível em: http://www.bioeticapr.org.br/
e - ISSN: 2176-8269
A POLÍTICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO DO SUS E OS CUIDADOS COM O
CUIDADOR
Jaqueline Sena Durães1
Waldir Souza2
RESUMO
O presente artigo pretende uma reflexão sobre a aplicação da Política de Humanização do
Sistema Único de Saúde em relação às ações propostas aos cuidados com o cuidador.
Passaremos por uma visão panorâmica da PNH com seus princípios e diretrizes e falaremos um
pouco sobre o sentido da palavra humanizar. Depois falaremos sobre quem é o cuidador e sobre
a importância de cuidarmos também do cuidador. Por fim apresentaremos uma síntese de alguns
eventos na área de humanização hospitalar em 2010 em Curitiba.
Palavras-chave: Humanização hospitalar. Cuidador. Cuidados. PNH.
ABSTRACT
This article attempts a reflection on the implementation of policy for the Humanization of
Unified System in relation to proposed actions to care for the caregiver. We will go through an
overview of the PNH (Humanization National Policy) with its principles and guidelines and we
will talk a little about the meaning of the word humanize. Then we'll talk about who is the
caregiver and the importance of taking care of the caregiver as well. Finally we will show a
summary of some events in the area of hospital humanization that occurred in 2010 in the city of
Curitiba.
Keywords: Hospital humanization. Caregiver. Cares.
INTRODUÇÃO
A Política de Humanização surgiu em 2003 com o propósito de “efetivar os princípios do
SUS no cotidiano das práticas de atenção e gestão, qualificando a saúde pública no Brasil e
incentivando trocas solidárias entre gestores, trabalhadores e usuários.” (Portal da Saúde).
1
Especialista em Ética e Educação com ênfase em Teologia Moral. Licenciada em Letras pela UTP. Aluna do Curso
de Teologia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Técnica de Laboratório do Hospital de Clínicas da
UFPR. Membro do Comitê de Humanização Hospitalar do Hospital de Clínicas de Curitiba. E-mail:
[email protected].
2
Doutor em Teologia pela PUCRio. Professor do Programa de Pós-Graduação em Teologia da PUCPR. Professor
de Antropologia Teológica, Bioética e Teologia Moral no Bacharelado em Teologia da PUCPR. Membro do Comitê
de Ética e Pesquisa no Uso de Animais da PUCPR. E-mail: [email protected].
53
O SUS (Sistema Único de Saúde) foi criado em 1988 pela Constituição Federal Brasileira
e é considerado um dos maiores sistemas de saúde do mundo. Abrange desde atendimentos
ambulatoriais simples até o transplante de órgãos. Garante o acesso integral, universal e gratuito
a todo cidadão. Promove também campanhas de vacinação e ações de prevenção e vigilância
sanitária que fiscalizam alimentos e registros de medicamentos. Em outras palavras, o SUS busca
atingir a vida de todos os brasileiros com um conceito ampliado de saúde.
Desse modo, em 2003, ao instituir a PNH (Política Nacional de Humanização da Atenção
e Gestão do SUS – Humaniza-SUS) buscou-se trabalhar o “SUS que dá certo”. Ou seja, a
política buscou nos estados e municípios as práticas de humanização que já estavam acontecendo
nas ações de atenção e gestão e que apresentavam bons resultados. Isso ajudou a legitimá-los
como políticas públicas. Em outras palavras, o SUS não impôs uma política, mas, ao contrário,
buscou conhecer o que já estava funcionando para propor para os outros lugares como modelo a
ser adequado conforme suas realidades. O SUS reconhece a criatividade dos trabalhadores da
saúde no Brasil e encontrou muitas ações positivas.
A proposta do Humaniza-SUS é ter um SUS humanizado, “comprometido com a defesa
da vida e fortalecido em seu processo de pactuação democrática e coletiva.” (Portal da Saúde).
A Política de humanização do SUS possui oito orientações básicas que visam: valorizar
as dimensões subjetiva e coletiva em todas as práticas de atenção e de gestão no SUS,
favorecendo e fortalecendo os direitos de cidadania considerando as necessidades específicas
(gênero, etnia, raça, orientação/expressão sexual, cor, origem), sempre pautadas no princípio da
equidade. Fortalecer o trabalho em equipe multiprofissional, dando suporte à transversalidade e à
grupalidade; Construir a autonomia e o protagonismo individuais ou em grupo, ou, como prefere
o SUS, dos sujeitos e coletivos. (HUMANIZA-SUS, 2009, p. 21).
Os sujeitos de que o SUS fala são os usuários, trabalhadores e os gestores. A ideia é
fortalecer o controle social com caráter participativo em todas as instâncias do SUS e
comprometer-se com a democratização das relações de trabalho e valorização dos trabalhadores
da saúde, estimulando processos de educação permanente em saúde (HUMANIZA-SUS, 2009,
p. 21). Neste artigo vamos analisar o modo como essa valorização dos trabalhadores vem sendo
aplicada nos hospitais e postos de saúde, especialmente aqueles apresentados em congressos,
seminários e Encontros voltados à Humanização que ocorreram na cidade de Curitiba em 2010.
Estruturada a partir de princípios, métodos, diretrizes e dispositivos a PNH trabalha
conforme orientações do SUS. Por princípio é transversal3, prega a indissociabilidade na atenção
3
TRANSVERSALIDADE: Aumento do grau de comunicação; transformação dos modos de relação e de
comunicação entre os sujeitos implicados no processo de produção de saúde, produzindo com efeito a
54
e na gestão4 e promove o protagonismo, a co-responsabilidade e a autonomia dos sujeitos5
envolvidos no processo de promover a saúde. O método é o da tríplice inclusão: gestores,
trabalhadores e usuários. Inclui também analisadores sociais, a análise coletiva de conflitos
potencializando a força crítica das crises, inclusão de movimentos sociais, de trabalhadores de
saúde em redes. Dentre as diretrizes, destacam-se: a Clínica Ampliada, a Co-gestão, o
Acolhimento, a Defesa dos Direitos do Usuário, o Fomento das grupalidades, coletivos e redes, a
Construção da memória do SUS que dá certo e, a Valorização do trabalho e do trabalhador, que é
o objeto principal deste artigo.
O QUE É HUMANIZAR
Segundo Jaime Betts o Ser Humano é a combinação de três elementos: a materialidade do
corpo, a imagem do corpo e a palavra que se inscreve no corpo.
O que diferencia o ser humano da natureza e dos animais é que seu corpo biológico é
capturado desde o início numa rede de imagens e palavras, apresentadas primeiro pela
mãe, depois pelos familiares e em seguida pelo social. É esse banho de imagem e de
linguagem que vai moldando o desenvolvimento do corpo biológico, transformando-o
num ser humano, com um estilo de funcionamento e modo de ser singulares (BETTS,
2010).
Desse modo a linguagem é responsável pela construção de uma rede de significados e, a
dinâmica dessa combinação entre a materialidade, a imagem e a palavra do corpo nos permite
transformar “imagens em obras de arte, palavras em poesia e literatura, e sons em fala e música,
ignorância em saber e ciência” (BETTS, 2010). Em outras palavras, somos capazes de abstrair.
Porém, muitas vezes a palavra fracassa, ou, o entendimento da palavra acontece de modo
diferenciado, conforme a significação que cada um dá, quando isso acontece “somos capazes
também das maiores barbaridades” (BETTS, 2010).
Humanizar é então garantir à palavra a sua dignidade ética. Sem comunicação não há
humanização. “A humanização depende de nossa capacidade de falar e ouvir, pois as coisas do
desestabilização das fronteiras dos saberes, dos territórios de poder e dos modos instituídos na constituição das
relações de trabalho. (HUMANIZA-SUS, 2009, p.23).
4
Alteração dos modos de cuidar inseparável da alteração dos modos de gerir e de se apropriar do trabalho;
inseparabilidade entre clínica e política, entre produção de saúde e produção de sujeitos; integralidade do cuidado e
integração dos processos de trabalho. (HUMANIZA-SUS, 2009, p. 23-24).
5
PROTAGONISMO, RESPONSABILIDADE E AUTONOMIA: Trabalhar implica na produção de si e na
produção do mundo, das diferentes realidades sociais, ou seja, econômicas, políticas, institucionais e culturais; as
mudanças na gestão e na atenção ganham maior efetividade quando produzidas pela afirmação da autonomia dos
sujeitos envolvidos, que contratam entre si responsabilidades compartilhadas nos processos de gerir e de cuidar
(HUMANIZA-SUS, 2009, p. 24).
55
mundo só se tornam humanas quando passam pelo diálogo com nossos semelhantes” (BETTS,
2010).
O trabalhador da saúde que age com humanização é motivado por um compromisso com
a pessoa que sofre um compromisso de compaixão piedosa com a idéia de que assim contribuí
para o bem comum e para o bem-estar em geral; uma paixão pela investigação científica e
uma solidariedade genuína. Dependendo da motivação as consequências em relação à
humanização serão diferentes.
Betts entende a Solidariedade como uma perspectiva para a Humanização porque,
segundo ele, a humanização só se realiza quando a dimensão ética da palavra é colocada e, a
solidariedade implica numa preocupação por universalizar a dignidade humana, que precisa da
mediação das palavras faladas e trocadas no diálogo com o outro para poder generalizar-se.
Implica um mínimo de alteridade e aceitação da pluralidade humana como algo irredutível, o
laço social humanizante somente se constrói pela mediação da palavra.
Por isso, para se humanizar a assistência hospitalar é necessário dar espaço para se ouvir
a palavra, seja do usuário, seja do profissional, seja do gestor. Juntos eles formam uma rede de
diálogo que deve pensar e promover ações, campanhas, programas e políticas assistenciais
preocupando-se com a dignidade ética da palavra, com o respeito e o reconhecimento mútuo da
solidariedade.
O CUIDADOR
Carvalho escreve no artigo Cuidados com o Cuidador do livro de Pessini sobre
Humanização e Cuidados Paliativo sobre que, como profissional de saúde, uma de suas
preocupações é com o profissional da saúde que se empenha intensamente no trabalho com o
paciente, especialmente nas situações limites, que exigem dele uma atenção maior e, em geral,
resulta numa falta de cuidados consigo mesmo.
Em geral, para os médicos a morte é sinal de fracasso. Eles se acham onipotentes em
relação à vida e à morte, porém, logo essa onipotência vai dando espaço ao sentimento de
impotência. (CARVALHO, 2004, p. 306).
Carvalho cita um trabalho de pesquisa de Caroline Thomas com 1300 estudantes de
medicina da John Hopkins Medical School cujos resultados demonstram que aqueles estudantes
cujos pais eram “ambiciosos, rigorosos, distantes, duros, imprevisíveis, ou turbulentos” tiveram
como resultado que os estudantes de medicina tinham maior incidência de patologias orgânicas
como câncer, 10% deles não conseguiam realizar o potencial como médicos, 34% das mortes
56
prematuras foram causadas por suicídio, muitos tinham uma personalidade imatura (uso
freqüente de projeções e fantasias), tinham um comportamento passivo-agressivo e hipocondria.
Outra pesquisa citada por Carvalho a de Tokars que demonstra que a escolha da profissão
do médico está relacionada a uma compulsividade, rigidez, um controle excessivo das emoções,
à fantasias sobre o futuro. Aparecem também outras características como as encontradas em
doenças emocionais: alcoolismo, abuso de drogas e algumas doenças mentais.
A equipe de saúde está sujeita a diversas causas de estresse. A insuficiência verbal devido
ao pouco tempo da consulta; aos avanços tecnológicos que criam procedimentos complexos e de
alto custo, o que impossibilita atender a demanda; a diminuição da remuneração do salário do
profissional de saúde que acarreta em insatisfação com o trabalho e compromete a qualidade de
vida e do atendimento ao paciente.
Essa situação leva à sobrecarga de trabalho causando fadiga, irritabilidade, distúrbios do
sono, dificuldade de concentração, depressão e queixas físicas, além dos riscos ocupacionais
como a exposição à radiação, manipulação de drogas quimioterápicas, (risco de provocar câncer
de tireóide, leucemias, linfomas, anomalias congênitas ou abortos). Aumentar o risco de infecção
(hepatite, tuberculose e citomegalovírus) (CARVALHO, 2004, p. 309-319).
Segundo Carvalho (2004, p. 319), com relação ao câncer existem estresses específicos
classificados segundo a natureza do tratamento e aos efeitos colaterais – e quanto à tomada de
decisão (desentendimentos intra-equipe de saúde) – resposta dos pacientes.
O estresse pode ser classificado em quatro tipos: os relacionados ao tratamento que
podem ser pela natureza do tratamento ou pela reação aos efeitos colaterais; à morbidade do
paciente e sua resposta psicológica que podem ser pela exposição à debilitação e/ou a
desfiguramentos severos ou pela má evolução do paciente na resposta; pelas formas de
intervenção que vão desde a seleção de profissionais, intervenções em nível organizacional,
apoio até o treinamento específico.
O profissional da saúde é um cuidador por excelência. O objeto de trabalho do cuidador é
uma pessoa doente; alguém que expressa sofrimento. Essa pessoa oferece ao profissional de
saúde um desafio muitas vezes intransponível: diagnosticar as razões da doença e tratá-la com
eficácia (CAMPOS, 2007, p. 33). Isso, por si só, demanda que o profissional seja mesmo um
cuidador e não meramente alguém que prescreva receitas.
Em geral, socialmente, o que se espera de um cuidador é que este seja movido pelo
desejo de ajudar. Isto até pode ser verdade na maioria dos casos, porém, com o decorrer dos anos
na profissão nessa tarefa contínua e árdua de lidar com a dor e o sofrimento, corre-se o risco de
se perder a sensibilidade. Quando se dá conta percebe-se que a tarefa torna-se mecânica e
57
tecnicista, meramente profissional. Deixa-se de criar vínculos com os pacientes, perde-se o olhar
humanizado do início da profissão. Não por maldade, mas por já estar habituado com a rotina.
O cuidador também precisa ser cuidado. Ele anseia por acolhimento e proteção. Muitas
vezes, quando o cuidador adoece, o que acontece de fato é que ele quer apenas ser visto e, nesse
caso, como no caso do paciente, olhar apenas para a doença não resolve o problema. É preciso
olhar para a pessoa e descobrir quem é aquele sujeito por trás da doença, o que ela significa.
Muitas vezes esta pessoa está apenas pedindo para ser olhada, tocada, ouvida (CAMPOS, 2007,
p. 38). Por isso os profissionais da saúde precisam de apoio e de suporte.
O conceito de suporte social vem da psicologia social e ter por base a idéia de que
precisamos estabelecer vínculos, sejam interpessoais, grupais ou comunitários. Em geral, nossos
vínculos primários são com a família nuclear (pai, mãe ou aqueles que são os responsáveis pela
criação), mais tarde vamos socializando-nos com os vizinhos, a escola, a comunidade, a igreja, o
clube, etc., somos seres relacionais e precisamos estabelecer relações sociais.
A proposta de trabalho de Campos no grupo de hipertensos surge de um desejo que
precisava ser compartilhado. Uma vez compartilhado e encontrado um objetivo comum: o desejo
de cuidar. Partiu-se, então, para um vínculo ainda maior: o desejo de cuidar e de ser cuidado.
Como? Intercambiando entre a equipe os papéis de “pais” e “mães” uns dos outros para que
todos cresçam e tenham força.
Utilizando-se da metáfora do relacionamento mãe-bebê-pai de Winnicott na teoria do
holding Campos diz que o vínculo primário do cuidado é dado pelo trato direto da mãe para com
o bebê, porém, há um vínculo secundário, quase que imperceptível, porém fundamental, do pai
que dá proteção à mãe para que esta possa se dedicar integralmente à função de cuidadora
(CAMPOS, 2007, p. 127). Assim é também com o profissional da saúde. Este será tão mais
capaz de cuidar de seus pacientes quanto mais sentir-se protegido no desempenho de sua função.
Quando o gestor dá o suporte de que ele precisa o cuidado será garantido. “É importante que a
equipe encontre espaços de troca, de cuidados mútuos, de apoio e acolhimento para que os
vínculos de parceria e afinidade se consolidem” (CAMPOS, 2007, p. 133).
CAMINHOS DA HUMANIZAÇÃO NA SAÚDE
Izabel Rios apresenta uma pesquisa realizada em um hospital de São Paulo cujos dados
podem ser considerados modelo para os demais estados. Ela faz um levantamento do trabalho de
humanização, número de funcionários e fluxo de usuários. O caso foi acompanhado por quatro
anos. Durante esses quatro anos foram realizadas palestras, pesquisa de satisfação e cursos de
58
formação com comitês gestores, funcionários e usuários. Apesar dos esforços não se obteve
grandes mudanças, conforme as palavras da pesquisadora:
O Comitê tinha representatividade e condições técnicas e operacionais para as
atividades de disseminação das idéias da Humanização, mas não para orientar mudanças
de maior calibre, conduzir intervenções e monitorar a gestão e os processos de trabalho,
como passou a se propor quando da mudança do PNHAH para a PNH. A prática
revelou que a mudança de perspectiva da humanização do PNHAH para a PNH exige
mudanças de método para sua implantação (RIOS, 2009, p. 171).
Constatou-se que a grande maioria das pessoas que participava do Comitê trabalhava em
setores bastante atarefados e quase não podiam largar suas tarefas para participarem das
reuniões. O que parecia uma maravilha, pessoas motivadas, passou a esfriar por motivos de força
maior. O afunilamento de funcionário. O acúmulo de funções e excesso de atividades impedia
um melhor andamento do projeto. Os únicos que continuaram participando das reuniões durante
os quatro anos, sem rotatividade, foram os funcionários dos Recursos Humanos, os demais, aos
poucos foram abandonando. Não por falta de vontade, por falta de tempo.
A humanização da Saúde surgiu do desejo de pessoas que trabalham na área da saúde e
também de usuários da saúde. A princípio voltada para ações de humanização como ambiência,
acolhimento e cidadania reconhecendo que o campo da subjetividade no atendimento é
importante. Depois, ampliou-se e obteve-se uma maior consistência no nível de suas práticas e
conceitos, chegando ao que hoje conhecemos como programa de política pública do SUS, o
Humaniza–SUS.
Observou-se que os aspectos organizacionais do sistema de saúde agravavam o
sofrimento daqueles que recorriam àquele serviço que tinha como missão curar e aliviar o
sofrimento. Um paradoxo de difícil solução. O motivo era exatamente o sistema hierárquico e a
má gestão. Não se considerava a importância de seus trabalhadores e deles era apenas esperado
que soubessem executar tarefas. Soubessem obedecer, sem questionar.
A EDUCAÇÃO PERMANENTE COMO METODOLOGIA PARA A HUMANIZAÇÃO
Depois de algum tempo os hospitais passaram a adotar uma nova estratégia: os grupos de
trabalho de humanização. Foi uma maneira de se tentar aproximar o serviço de humanização dos
setores diferenciados dos hospitais. Como, em geral, os hospitais eram muito grandes, era mais
difícil se trabalhar em globalidade. Uma vez separados os grupos, a idéia é de que cada grupo se
reúna conforme suas possibilidades e que tenha sempre um membro representante no comitê.
Dessa maneira esse representante não só leva para o comitê seus projetos e ações como também
59
leva do comitê as propostas e os planos de ação solicitados pelo ministério da saúde. Certamente
foi um avanço, mas, ainda está muito longe do ideal.
A PNH2 defende o desenvolvimento profissional dos trabalhadores no que diz respeito à
educação permanente e por isso apresenta um conjunto de diretrizes gerais, métodos e princípios
que promova, no plano de vida de cada pessoa, conhecimentos, habilidades e atitudes que visem
a participação de todos nos processos de gestão do trabalho (RIOS, 2009, p. 174).
A educação permanente responde às necessidades reais e concretas da sociedade e
incentiva que se compreenda todo o processo: diagnóstico, levantamento de necessidades e
capacitação. O trabalho na área de saúde não pode ser um simples executar tarefas, deve sempre
ser um constante pensar sobre as ações e criar novas estratégias que recuperem o significado da
vida e do trabalho humanizado, tanto para usuários quanto para os profissionais da área de saúde.
Constatou-se, com isso que a violência institucional é crônica e que os avanços são muito
lentos. Não se pode negar que houve algum avanço, mas ainda está bem aquém do ideal. O único
modo de mudar a situação é darem-se as mãos. Precisa mudar-se a mentalidade e isso não
acontece do dia para a noite. Rios defende a criação de redes sociais coletivas que permitam que
as pessoas troquem idéias e informações. Mais do que nunca é preciso dar voz e vez para outras
pessoas, aprender a ouvir outros profissionais para aprender a gerir melhor.
O mais importante é crer que é possível, ainda que ainda esteja difícil de ver as melhoras,
não podemos desistir. O futuro dirá embora não estejamos lá pra ver temos a confiança e a
certeza de que fizemos a nossa parte.
EVENTOS SOBRE HUMANIZAÇÃO
Em 2010 a cidade de Curitiba foi o cenário de alguns eventos sobre humanização.
Aconteceram: o I Congresso de Humanização da Aliança Saúde promovido pela Aliança Saúde
da PUCPR e a Santa Casa; O III Congresso Internacional de Especialidades Pediátricas cujo
módulo, Bioética e Humanização teve o representante nacional do Humaniza-SUS, Dário
Frederico Pasche que falou sobre os princípios e diretrizes da PNH e sobre alguns conceitos
adotados pela política de humanização do SUS.
Em novembro houve também o V encontro de Humanização promovido pelo Hospital de
Clínicas da UFPR. O tema foi Acolhimento: Construção de Projetos Coletivos. Embora não
fosse específico para ações voltadas ao cuidador, foi possível perceber que muitos funcionários
estão se envolvendo no Comitê de Humanização. Alguns projetos estão sendo propostos e serão
estudados. Esperamos ver ações voltadas para o cuidador para que esse possa continuar sendo
60
um bom cuidador. Quanto mais seguro e saudável o cuidador estiver melhor estará para cuidar
de quem precisa de seus cuidados do contrário, se estiver se sentindo inseguro ou doente,
dificilmente prestará um bom serviço.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Concluo afirmando que ainda continuo acreditando que o caminho da humanização
hospitalar deve começar pelo acolhimento aos funcionários. Funcionários motivados e satisfeitos
vão acolher melhor os pacientes sem que eles vejam isso como uma tarefa a mais. Acontece
naturalmente. A mudança na vida de uns melhora a vida dos outros. Felizmente algumas
instituições já promovem ações voltadas para o cuidador. Ainda que pequenas, são ações que
demonstram que o cuidador é valorizado. Medidas simples como promover espaços para
massoterapia, semana do servidor, oficinas de artesanato entre outros são medidas que melhoram
o convívio social entre os funcionários, elevam a auto-estima e promovem a interação entre
usuário, servidor e gestor.
REFERÊNCIAS
ACOLHIMENTO nas práticas de produção de saúde - Ministério da Saúde, Secretaria de
Atenção à Saúde, Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. 2. ed. Brasília: Editora
do Ministério da Saúde, 2009.
BAKES, D. S.; LUNARDI. V.; LUNARDI, W. A Humanização Hospitalar como expressão da
ética. Rev. Latino-Am Enfermagem, v. 14, n. 1, p. 131-135, jan./fev. 2006. Disponível em:
www.eerp.usp.br/rlae. Acesso em: 06 fev. 2011.
BRASIL. Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde.
_______. O SUS de A a Z: garantindo saúde nos Municípios.
CAMPOS, Eugenio Paes. Quem cuida do cuidador: uma proposta para os profissionais da
saúde. Petrópolis: Vozes, 2007.
CARVALHO, V. A. Cuidados com o cuidador. In: PESSINI, Leo; BERTACHINI, Luciana.
Humanização e cuidados paliativos. São Paulo: Loyola, 2004, p. 305-319.
GAUDENZI, Paula; SCHRAMM, Fermin Roland. A transição paradigmática da saúde como um
dever do cidadão: um olhar da bioética em saúde pública. Revista Interface Comunicação e
Saúde, v. 14, n. 33, p. 243-255, abr./jun. 2010. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/icse/v14n33/a02v14n33.pdf. Acesso em: 28 fev. 2011.
61
HECKERT, A. L. C.; PASSOS, E.; BARROS, M. E. B. Um Seminário dispositivo: A
humanização do Sistema Único de Saúde (SUS) em debate. Revista Interface Comunicação e
Saúde, v. 13 supl. 1, p. 493-502, 2009. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/icse/v13s1/a02v13s1.pdf. Acesso em: 28 fev. 2011.
HUMANIZA-SUS – Documento base para gestores e trabalhadores do SUS. Brasília, 2009.
Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/icse/2010nahead/aop3210.pdf. Acesso em: 27 nov.
2010.
LANZIERI, P. G. et al. Boa noite, bom dia HUAP!”, uma experiência de humanização na
formação de profissionais da área de saúde. Revista Interface Comunicação e Saúde.
Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/icse/2010nahead/aop3210.pdf. Acesso em: 28 fev.
2011.
MERHY, E. E. Saúde: a cartografia do trabalho vivo. São Paulo: Hucitec, 2002. In: Saúde em
Debate. 3. ed. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 24, n. 8, p. 1953-1957, ago. 2008.
Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/csp/v24n8/23.pdf. Acesso em: 28 fev. 2011.
NEVES, C. A. B. Que vida queremos afirmar na construção de uma política de humanização nas
práticas de saúde do Sistema Único de Saúde (SUS)? Revista Interface Comunicação e Saúde,
v. 13, supl. 1, p. 781-795, 2009. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/icse/v13s1/a29v13s1.pdf. Acesso em 28 fev. 2011.
PASCHE, Dário Frederico. Política Nacional de Humanização como aposta na produção coletiva
de mudanças nos modos de gerir e cuidar. Revista Interface Comunicação e Saúde, v. 13,
supl., p. 701-708, 2008. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/icse/v13s1/a21v13s1.pdf.
Acesso em 28 fev. 2011.
POLIGNANO, M. V. História das Políticas de Saúde no Brasil: Uma pequena revisão.
Disponível em: http://www.medicina.ufmg.br/dmps/internato/saude_no_brasil.rtf. Acesso em: 07
mar. 2011.
POLÍTICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO – Humaniza-SUS – Ministério da Saúde
(Documento Base para Gestores e Trabalhadores do SUS – Diretrizes Gerais para
Implementação).
PORTAL DA SAÚDE. Disponível em: www.saude.gov.br.
RIOS, Izabel Cristina. Caminhos da humanização na saúde: prática e reflexão. São Paulo:
Áurea, 2009.
SILVA, H. S.; LIMA, A. M. M.; GALHARDONI, R. Envelhecimento bem sucedido e
vulnerabilidade em saúde: aproximações e perspectivas. Revista Interface Comunicação e
Saúde, v. 14, n. 35, p. 867-877, out./dez. 2010. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/icse/v14n35/aop3510.pdf. Acesso em 28 fev. 2011.
VIVA TRANQUILO. Histórico da Saúde no Brasil. Disponível em:
http://www.vivatranquilo.com.br/seguro/seguro_saude/mat1.htm. Acesso em: 07 mar. 2011.