Universidade de São Paulo Instituto de Matemática e Estatística Campos eletromagnéticos e saúde Carlos Morais de Oliveira Filho Monografia apresentada como exigência parcial para aprovação na disciplina MAC 0463 – Introdução à Computação Móvel, ministrada pelo Prof. Dr. Alfredo Goldman. São Paulo 2008 I. Introdução É questão controversa se campos eletromagnéticos podem causar danos à saúde humana. Tais campos são gerados em companhias elétricas, celulares, antenas de telefonia, redes sem fio e outros equipamentos, como forno microondas. A radiação é uma combinação de energia elétrica e magnética que viaja pelo espaço na velocidade da luz. A radiação eletromagnética é classificada em dois grupos principais: radiação ionizante e não-ionizante. A radiação ionizante é capaz de causar mudanças em átomos ou moléculas no corpo, o que pode resultar em danos aos tecidos, como o câncer. Exemplos deste tipo de radiação são os raios x e os raios gama. A radiação nãoionizante não causa mudança nas características de átomos, mas podem fazer com que moléculas vibrem, o que leva a aumento de temperatura entre outros efeitos. Exemplo deste tipo de radiação são os raios ultravioletas emitidos pelo sol, a luz visível, radiação infravermelha, energia microondas e radiofreqüência. Vários estudos investigaram trabalhadores expostos a campos magnéticos gerados por eletricidade de alta voltagem buscando uma relação de causa e efeito entre essa exposição e câncer. Alguns pesquisadores sustentam que campos gerados deste modo têm freqüências muito baixas para danificar o DNA ou influenciar células vivas. Outros discordam, sugerindo que tais campos podem causar mudanças significativas no corpo através de correntes induzidas dentro dele. Existem cerca de 2,1 bilhões de usuários de telefone celular no mundo (estimativa de 2005) e esse número segue aumentando. O uso do celular está tão difundido que qualquer pequeno risco à saúde associado poderia causar problemas significativos de saúde pública. O forno microondas é um eletrodoméstico versátil e rápido, que usa radiação para esquentar comida. Esse aparelho pode ser perigoso se não for usado corretamente. Este trabalho visa mostrar a situação atual da pesquisa dos efeitos de campos eletromagnéticos à saúde, e quais as recomendações que se fazem aos usuários de aparelhos que emitem radiação. II. Circuitos de alta voltagem Em 1979, pesquisadores investigando leucemia em crianças de Denver, Colorado (Estados Unidos) encontraram uma associação entre altas correntes elétricas próximas a casas e um maior risco de leucemia infantil [1]. Porém, esse trabalho não mediu a intensidade dos campos eletromagnéticos, baseando-se em distância dos circuitos e tipos de cabo. Desde então, outros pesquisadores têm investigado circuitos de alta voltagem, e quase todos os que tentavam relacionar os circuitos com câncer apresentaram sérias limitações. Não foi possível confirmar se existe associação real entre campos eletromagnéticos induzidos por correntes de alta voltagem e câncer. O National Radiological Protection Board (NRPB) do Reino Unido publicou um relatório no qual diz ter encontrado alguma evidência de que exposições a campos eletromagnéticos mais altos que 0,4 µT (microtesla) estão associados com o aumento do risco de leucemia em crianças [2]. A pesquisa não encontrou evidência de aumento de risco em adultos. Entretanto, o NPRB foi cuidadoso ao explicar que não foi encontrada relação causal, mas estudos mais aprofundados seriam necessários. Apesar da evidência de um risco maior de leucemia em crianças expostas a mais de 0,4µT (o dobro do risco, segundo o NRPB), vários estudos experimentais falharam em fornecer evidência clara que apoiasse a alegação de que campos eletromagnéticos podem causar danos à saúde. Por exemplo, não há claras evidências de que tais campos afetam processos biológicos ou causem danos ao DNA, mesmo em estudos realizados com animais. Os governos e instituições de saúde acreditam que as normas atuais são adequadas, pois os campos eletromagnéticos gerados por circuitos de alta voltagem estão bem abaixo do limite máximo recomendado de exposição. Entretanto, é aconselhável evitar grande e prolongada exposição quando possível. III. Telefones celulares Telefones celulares se comunicam com estações rádio-base usando radiação de radiofreqüência (RF). Radiação RF em nível significativo tem um efeito térmico, aumentando a temperatura do corpo. Existe a preocupação de que os pequenos níveis de radiação RF emitidas por telefones móveis possam causar problemas de saúde como cefaléias ou tumores cerebrais. Há muita pesquisa nessa área, uma vez que o celular está cada vez mais fazendo parte do cotidiano de bilhões de usuários no mundo. Nenhum estudo encontrou evidência conclusiva ou convincente de que telefones celulares danifiquem a saúde em curto ou longo prazo. Entretanto, ainda existem perguntas em aberto em relação à segurança completa no seu uso, e as pesquisas continuam. A telefonia celular funciona como um rádio de dois sentidos entre o aparelho e as estações rádio-base (ERB). AS ERBs montam suas antenas bem acima do solo, geralmente numa torre ou no teto de uma construção alta, para ter maior cobertura. Um aparelho celular tem um receptor e um transmissor. Quando uma ligação é feita, o celular emite radiofreqüência através de sua antena para a ERB mais próxima. As ERBs emitem níveis de radiofreqüência relativamente constantes. O nível de exposição à radiação emitida pelos telefones varia de acordo com o tempo de uso do aparelho, quão perto o aparelho fica do corpo enquanto está sendo usado e a posição do aparelho relativa à ERB. Se o sinal da estação está baixo, o celular aumenta o nível de radiofreqüência para compensar. Os níveis de radiação aos quais o usuários está exposto através do celular, que é usado próximo à cabeça, é de 100 a 1000 vezes mais intenso que os emitidos pelas ERBs. O telefone celular colocado na orelha esquenta uma área da face e, conseqüentemente, o cérebro em uma fração de grau. A estimativa para esse aquecimento é menor que o aquecimento causado pela prática de exercícios. Entretanto, níveis muito altos de radiofreqüência superaquecem e causam danos aos tecidos. Os níveis de exposição aceitados pelas regulamentações internacionais sobre os telefones estão bem abaixo do nível em que aquecimento significativo ocorre. A localização de ERBs e níveis de radiação emitidos pelas antenas também são regulados. Porém, existe debate científico se a radiofreqüência tem algum outro efeito além de aquecimento, como mudanças nas membranas das células. Como não há nenhuma evidência de qualquer outro efeito, as leis são feitas para regular somente o nível de aquecimento. Um efeito no sistema biológico não implica necessariamente em efeitos na saúde. Por exemplo, a radiofreqüência tem o efeito biológico de aumentar a temperatura, mas isso não leva automaticamente a efeitos na saúde, pois o corpo humano tem uma capacidade natural de lidar com variações maiores de temperatura sem sofrer danos. A maioria dos estudos mostra que a radiofreqüência não causa efeitos adversos à saúde, mas alguns sugerem que durante a exposição pode ocorrer, por exemplo, diminuição da eficiência com a qual memorizamos. Entre os que indicam efeitos adversos à saúde, os experimentos subseqüentes não foram capazes de confirmar os resultados. A maioria de estudos com animais não encontraram nenhuma relação entre radiofreqüência e câncer. Porém, houve um estudo australiano no qual se verificou um aumento na velocidade de desenvolvimento de tumores em cobaias modificadas geneticamente para terem predisposição a câncer, quando submetidas à radiofreqüência durante toda a sua vida. Entretanto, estudos subseqüentes feitos no mesmo local e usando mais animais não mostrou nenhum efeito da radiofreqüência. A relevância do tipo de tumor estudado nesses estudos com cobaias em relação a usuários de telefones celulares não é clara. Estudos populacionais têm sérias limitações. Não há como determinar a causa exata de qualquer tipo de câncer. Câncer pode levar anos ou décadas para se desenvolver e estudos até hoje acompanharam os efeitos por poucos anos. A comunidade médica acredita que estudos devem ser feitos por pelo menos 10 anos para revelar efeitos de longo prazo. Estudos populacionais têm medidas imprecisas sobre os níveis de radiação aos quais as pessoas são submetidas. A exposição à radiofreqüência depende de muitos fatores o que a torna difícil de medir. Ainda estão sendo feitos estudos de longo prazo para determinar se usuários de telefones celulares têm uma maior incidência de câncer cerebral. O consenso internacional é de que telefones celulares não causam câncer nem promovem o crescimento mais rápido de tumores existentes. Outros efeitos além de câncer estão sob investigação. Não há evidência de que a radiofreqüência possa causar sintomas inespecíficos como cefaléia, insônia e tontura, embora existam teorias de que ela poderia interferir no sentido do equilíbrio, que tem sensores próximos à orelha. Descobriu-se que radiofreqüência muda a atividade cerebral durante o sono. Entretanto, isso não é considerado uma reação adversa, uma vez que o mesmo tipo de mudanças pode ser causado por hormônios e cafeína. Mudanças na memória ou reflexos, revelados em algumas pesquisas são pequenos e temporários, não sugerindo implicações à saúde. Estudos não verificaram nenhuma evidência de mudanças no sistema cardiovascular, incluindo pressão sanguínea e ritmo cardíaco. Por fim, não há evidência que sugira alteração em níveis hormonais induzidas por radiofreqüência. Existem outras preocupações que devem ser levadas em consideração em se tratando de celular e saúde. Celulares devem ser desligados em hospitais, pois a radiofreqüência pode alterar o funcionamento de equipamentos eletrônicos vulneráveis. Falar ao telefone enquanto dirige aumenta drasticamente a chance de acidentes. Esse aumento é menor se o motorista não segura o aparelho, como no modo viva-voz. Evidências mostram que celulares não causam danos à saúde, mas riscos de longo prazo ainda estão sendo estudados. Para aqueles que se preocupam com tais efeitos, existem algumas recomendações para diminuir o nível de exposição: escolher um modelo de telefone que tenha baixa taxa de absorção específica (SAR); usar telefones tradicionais quando acessíveis; fazer ligações curtas; usar acessórios que mantenham as mãos livres e o aparelho mais longe da cabeça; não carregar o celular muito perto do corpo. Deve-se ver com desconfiança anúncios de aparelhos protetores ou “escudos”, pois não há evidências de que esse tipo de equipamento funciona. Pelo contrário, os celulares podem tender a aumentar seus níveis de radiação para compensar os efeitos bloqueadores do “escudo”. Telefones sem fio usados dentro de casa ou escritório têm níveis de energia muito menores que celulares, os quais podem transmitir sinal para uma estação a até 20 km. Redes de computadores sem fio seguem protocolos de transmissão / recepção de sinais que fazem com que o meio seja muito menos utilizado, enquanto telefones móveis transmitem e recebem constantemente. Portanto, caso esses equipamentos ofereçam risco à saúde, tais riscos seriam bem menores que os oferecidos pelo uso do celular. Alguns usuários de telefones celulares relataram sintomas inespecíficos como fadiga, distúrbios digestivos e cefaléia. A assim chamada hipersensibilidade eletromagnética não foi revelada em um estudo alemão feito com os usuários que apresentaram esses sintomas [3]. Em outubro de 2004 a Organização Mundial de saúde publicou um relatório a respeito dizendo que não há nenhuma evidência de que os campos eletromagnéticos possam ter causados esses sintomas, e recomenda tratamento psicológico às pessoas que apresentem a hipersensibilidade [4]. IV. Forno microondas Os tipos de energia são classificados no espectro eletromagnético de acordo com quanta energia eles produzem, o que é indicado pelo comprimento de onda. Quanto menor o comprimento de onda, maior energia. Ondas de rádio são as mais longas, raios x e raios gama são os mais curtos. Ondas de microondas têm comprimento maior que radiação infravermelha e luz visível, mas são mais curtas que VHF e UHF. Microondas são transmitidas, refletidas ou absorvidas por objetos, dependendo do material de que ele é feito. Microondas passam pelo plástico e pelo vidro, refletem em alguns metais e são absorvidas por qualquer objeto que contenha água. Qualquer alimento tem um nível de umidade, mesmo os que parecem muito secos. O calor é produzido pelo microondas agitando moléculas de água. Entre as vantagens de usar um microondas podemos citar: é mais rápido que os métodos tradicionais; economiza mais energia, pois o microondas esquenta diretamente a comida ou invés de esquentar outra substância (como gás ou ar); mais nutrientes são preservados; organismos potencialmente perigosos tendem a se reproduzir mais rapidamente em temperaturas entre 5°C e 60°C, e o aquecimento no microondas passa menos tempo nessa zona de temperatura perigosa. Existem alguns mitos a respeito do microondas. A energia microondas não causa mudanças na composição química da comida, a não ser o efeito causado pelo aquecimento rápido. Não existem evidências de que compostos perigosos ou venenosos sejam produzidos pela energia microondas. A comida não guarda radiação, uma vez que o microondas esteja desligado a radiação cessa. A energia microondas não pode fazer com que nada se torne radioativo. Diversas pesquisas foram feitas e nenhuma mostra clara evidência de que microondas causem ou potencializem câncer. Sabe-se que a exposição a altos níveis de radiação microondas podem causar problemas de saúde como cataratas e queimaduras. A radiação pode escapar do forno se a porta estiver danificada e não oferecer um isolamento completo. Na maioria dos casos, a quantidade que escapa é muito pequena para causar danos significativos, desde que o aparelho esteja em boas condições e as instruções sejam seguidas corretamente. Precauções incluem: verificar a porta do microondas, vendo se ela encaixa perfeitamente e se possui rachaduras ou corrosões; nunca desativar ou tentar burlar o mecanismo que garante que o forno esteja desligado quando a porta estiver aberta; limpar o forno regularmente para se assegurar de que não há comida queimada nas paredes e na porta; não ligar o microondas vazio. Pode-se testar a segurança da porta na assistência técnica. A maior desvantagem do forno microondas é que a comida não é esquentada uniformemente, o que significa que ela fica com porções mais quentes e porções menos quentes. Bactérias e outros organismos podem sobreviver nas partes menos quentes. Sugestões para lidar com isso: assegurar-se de que comidas congeladas sejam descongeladas antes de cozinhar; um cozimento mais uniforme é mais provável caso a comida esteja cortada em picadinhos; recipientes rasos e redondos oferecem aquecimento mais uniforme que fundos e quadrados; mexer a comida pelo menos uma vez durante o cozimento; ficar atento a instruções dos alimentos feitos para microondas, como pipocas empacotadas; evitar cozinhar aves recheadas, pois fica difícil saber se o recheio alcançou temperatura suficiente para matar bactérias. Comidas esquentadas no microondas podem causar queimaduras. Por exemplo, através do vapor d’água saindo de recipientes recém abertos ou porque o alimento pode conter líquido dentro dele muito mais quente que a sua superfície. Algumas recomendações: não esquentar mamadeiras com leite no microondas, pois o leite pode estar muito quente, mesmo que o recipiente pareça estar a uma temperatura segura; usar luvas para retirar do forno recipientes que não se sabe o quanto esquentam no microondas; quando abrir sacolas ou levantar tampa de recipientes, fazer de modo que a abertura fique voltada para longe; antes de morder a comida, corte um pedaço para ver se o interior está muito quente, especialmente se a comida for do tipo que tem várias camadas (como recheio); observar as instruções de cozimento, pois comidas superaquecidas podem explodir. Em particular não cozinhar ovos no microondas. V. Conclusões Pesquisas científicas não demonstram efeito algum que campos eletromagnéticos gerados por circuitos de alta voltagem possam causar danos à saúde. No entanto, se eles causam ou não dano ainda é uma questão em aberto, e recomenda-se evitar exposição prolongada quando possível. O consenso internacional é de que telefones móveis não causam câncer ou promovem o crescimento acelerado de tumores existentes. Porém, os estudos populacionais até hoje foram feitos monitorando os efeitos durante poucos anos de uso de celular, e câncer pode levar muitos anos, mesmo décadas, para se desenvolver. Também se estudam efeitos cognitivos como menor eficiência de memorização, mas os estudos que mostraram esses efeitos conseguiram detectar variações muito pequenas e temporárias. Redes sem fio de computadores transmitem informação a um nível bem menor de energia que os celulares. Comida cozinhada no microondas é tão nutritiva quanto comida preparada de outras formas, e estudos sugerem que o aquecimento no microondas preserva mais vitaminas, minerais e nutrientes que a fervura. Uma grande exposição à radiação emitida pelo microondas pode causar danos à saúde, portanto deve-se certificar que a porta do forno não está danificada e oferece um bom isolamento. Na grande parte dos casos, a radiação que escapa é muito pequena para causar qualquer risco significativo. O maior inconveniente do microondas é que ele não aquece uniformemente, e bactérias podem sobreviver nas partes menos quentes da comida. Referências Bibliográficas [1] WERTHEIMER, Nancy; LEEPER, Ed. Eletrical wiring configurations and childhood cancer. American Journal of Epidemiology Vol. 109. 1979. [2] National Radiological Protection Board. ELF Electromagnetic Fields and the Risk of Cancer: Report of an Advisory Group on Non-ionising Radiation. Documents of the NRPB Vol. 12, No. 1. Oxon, UK, 2001. [3] SEITZ; STINNER; EIKMANN; HERR; ROOSLI. Electromagnetic Hipersensitivity (EHS) and subjective health complaints associated with electromagnetic fields of mobile phone communication. Science of the Total Enviroment. 2005. [4] ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. http://www.who.int/peh-emf/meetings/hypersens_summary_oct04.pdf [5] www.google.com