Proposta De Método De Análise De Confiabilidade De

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PROPOSTA DE MÉTODO DE ANÁLISE DE CONFIABILIDADE DE NAVIOS
Faustina B. Natacci
Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo, SP, Brasil
Gilberto F. M. de Souza
Depto. Eng. Mecatrônica e de Sistemas Mecânicos, Universidade de São Paulo, SP, Brasil
Marcelo. R. Martins
Depto. Eng. Naval e Oceânica, Universidade de São Paulo, SP, Brasil
E-mail: [email protected]
RESUMO
Um navio pode ser considerado como um sistema composto por uma série de subsistemas,
tais como estrutural, de propulsão, de movimentação de carga, entre outros, os quais devem
operar apresentando um desempenho específico a fim de manter a condição operacional da
embarcação em conformidade com os requistos de projeto.
Sob o ponto de vista de confiabilidade, deve-se definir o período de tempo em que se deseja
esta condição operacional, bem como em que fase da operação do navio, tal como navegação,
operação de atracamento ou carga / descarga.
A confiabilidade de um sistema está relacionada com a confiabilidade dos seus componentes
e com as políticas de manutenção associadas aos mesmos, que não só influenciam no tempo
de retorno à operação, como também na degradação da confiabilidade do sistema.
Este trabalho apresenta um método para a análise de confiabilidade de navios e de seus
subsistemas baseado na aplicação dos tradicionais métodos de analise de confiabilidade, tais
como análise de modos e efeitos de falhas, árvores de falhas e diagrama de blocos. Por meio
destes métodos indetificam-se componentes críticos de um dado subsistema, ou seja, aqueles
cujas falhas implicam em grave degradação do desempenho do subsistema em análise. De
posse destes componentes críticos pode-se sugerir alterações na configuração do subsistema,
com a adição de elementos redundantes, com o objetivo de aumentar a sua confiabilidade. No
caso do subsistema já estar em operação, com a aplicação dos conceitos da Manutenção
Centrada em Confiabilidade (RCM) pode-se sugerir políticas de manutenção preventivas ou
preditivas para os componentes críticos de forma a reduzir a degradação da sua
disponibilidade.
1. INTRODUÇÃO
O projeto de um navio é executado tomando-se por base requisitos apresentados pelo futuro
operador, os quais envolvem definição da capacidade de carga a ser transportada (deadweight
de carga), velocidade de cruzeiro, rota(s) a ser(em) percorrida(s), terminais de transbordo a
serem utilizados, entre outros. Com base nestes dados executa-se o projeto da embarcação
empregando-se relações paramétricas.
Adicionalmente aos requisitos tradicionalmente empregados pelo armador, podem ser
incluídas necessidades específicas de desempenho para alguns sistemas do navio. Dentre estes
requisitos específicos pode-se citar a confiabilidade de um dado sistema, ou seja, a
possibilidade deste operar, sem apresentar falhas, por um período de utilização previamente
especificado, mantendo um desempenho operacional previamente definido.
Este requisito de confiabilidade ainda não é usualmente especificado para diversos sistemas
de navios. As pesquisas voltadas à aplicação do conceito de confiabilidade na síntese e análise
de estruturas têm se intensificado nas últimas décadas, principalmente através de estudos
financiados pelo Ship Structure Committee, indicados nas referências [1] a [4]. Estas
pesquisas têm por objetivo desenvolver um código de projeto de estruturas navais baseado em
conceitos de confiabilidade estrutural, ou seja, ao invés de se especificar o tradicional
coeficiente de segurança para um elemento estrutural define-se a sua probabilidade de falha,
sendo que no projeto voltado à confiabilidade emprega-se uma descrição probabilística do
carregamento atuante no elemento e da resistência mecânica do material. Esta maior
preocupação com o projeto estrutural baseado em confiabilidade é justificada pela
importância do sistema estrutural sobre a integridade da carga, da tripulação e dos demais
sistemas do navio. Usualmente as falhas estruturais têm como conseqüência danos à carga ou
ao meio ambiente e em casos mais graves a perda da embarcação, além do reparo estrutural
normalmente exigir muito tempo, penalizando a disponibilidade operacional da embarcação.
Adicionalmente, o peso da estrutura do navio representa uma porcentagem significativa do
peso total da embarcação e, portanto, qualquer redução na sua magnitude representa uma
maior capacidade de carga e conseqüentemente um acréscimo na receita associada à operação
do navio.
Tendo em vista o exposto no parágrafo anterior, a aplicação de conceitos da confiabilidade
estrutural no projeto da estrutura do navio é bastante atrativa pois representa um método
racional de projeto de uma estrutura segura, à qual associa-se uma probabilidade de falha
previamente definida, e otimizada, sob o ponto de vista da redução da dimensão dos
escantilhões, possibilitando a redução do peso estrutural.
Para outros sistemas do navio, a utilização de métodos de análise de confiabilidade nas fases
de síntese e análise ainda é bastante restrita, havendo poucas publicações que tratam deste
tema, podendo-se citar a elaborada por Ayyub et al., [5], que tem por objetivo analisar a
confiabilidade de alguns sistemas instalados na casa de máquinas de navios. Entretanto, a
aplicação dos conceitos de confiabilidade no projeto de sistemas não estruturais de um navio
também pode ser útil para verificar a probabilidade de falha dos mesmos ao longo de um
período operacional pré-definido, bem como para determinar os componentes críticos para
estes sistemas, definidos em função da degradação causada na operação do sistema pela da
falha do componente, ou seja, quanto maior esta degradação maior é a criticidade do
componente para o sistema. Um sistema com baixa confiabilidade exige, com maior
freqüência, ações de manutenção, aumentando portanto a sua indisponibilidade operacional,
ou seja, penaliza-se a operação do navio em função da falha de um sistema.
Sendo um navio formado por um complexo conjunto de sistemas, alguns com maior
importância durante a fase de navegação em mar aberto, outros utilizados com maior
freqüência nas manobras em águas restritas ou portos e outros usados apenas em operação de
carga/descarga, tem-se que a confiabilidade e disponibilidade da embarcação é afetada pela
falha destes sistemas em pelo menos uma de suas condições operacionais. A falha destes
sistemas pode ter graves conseqüências para a operacionalidade da embarcação, além de
exigir a ação da manutenção corretiva, implicando em aumento do custo do ciclo de vida de
uma embarcação.
A aplicação de conceitos de análise de confiabilidade na síntese ou análise de sistemas de
navios auxilia na identificação de componentes críticos para os quais devem-se prever ações
de manutenção preventivas ou preditivas como forma de antecipar, ou seja, minimizar a sua
probabilidade de falha e portanto reduzir a indisponibilidade do sistema. Adicionalmente,
quando ainda na fase de síntese do sistema, pode-se prever a alocação de componentes
redundantes como forma de garantir a operacionalidade de um sistema.
Considerando os benefícios da aplicação de conceitos de confiabilidade quer na fase de
projeto como na fase de análise de sistemas instalados em navios, este trabalho tem por
objetivo propor um procedimento de análise de confiabilidade para sistemas, exceto o
estrutural, instalados em navios. Este procedimento é baseado em técnicas usualmente
empregadas na análise de confiabilidade de sistemas eletro-mecânicos, as quais são
tradicionalmente empregadas pela indústria petroquímica, nuclear e eletro-eletrônica.
2. CONCEITO DE CONFIABILIDADE
2.1 Considerações Iniciais
Pode-se definir confiabilidade como “a probabilidade de que um sistema ou equipamento
opere, sem apresentar falhas, por um período de tempo específico e sob condições prédefinidas de utilização”.
Expressando esta conceituação em termos da variável aleatória t, o tempo até ocorrer a falha, e
da correspondente função densidade de probabilidade (fdp) de ocorrência de falha f(t), tem-se
que a probabilidade de falha, em um intervalo de tempo específico, pode ser definida pela
relação:
f(t) ∆t = P { t ≤ t ≤ t + ∆t }
(1)
Sendo F(t) a função de probalidade acumulada, vem:
F (t) = P { t ≤ t }
(2)
ou seja, F(t) expressa a probabilidade de ocorrência de falha até um tempo t.
Esta função F(t) é crescente com o tempo, atingindo o valor unitário quando t tende a ∞ , tal
como indicado na Figura 1.
Figura 1 – Função de Probabilidade Acumulada F(t), [6].
Como, sob o ponto de vista da lógica de sua operação, um componente ou equipamento ou
está operando adequadamente, conforme previsto no projeto, ou está no estado de falha,
portanto eventos mutuamente excludentes, a confiabilidade pode ser, probabilisticamente,
expressa pela relação:
R (t) = P {t > t}
(3)
R(t) = 1 – F (t)
(4)
ou seja,
A Função de Confiabilidade está mostrada na Figura 2.
Figura 2 - Função de Confiabilidade R(t), [6].
Como decorrência da própria definição da função distribuição acumulada, tem-se:
R(t = 0) = 1
(5)
R(t = ∞) = 0
(6)
A partir do gráfico apresentado na Figura 2 verifica-se, portanto, que a confiabilidade de um
produto ou sistema apenas decai ao longo do tempo, ou seja, quanto maior o tempo de
operação do mesmo, maior será a probabilidade deste apresentar falha. Sob o ponto de vista do
projeto baseado em confiabilidade, a vida operacional do equipamento é definida quando o
mesmo atinge um certo valor de confiabilidade. Este valor é selecionado pelo próprio
projetista, em função da responsabilidade do sistema, ou seja, quanto maiores os prejuízos
associados à falha, maior é a confiabilidade exigida para o equipamento. Por exemplo, para
detalhes estruturais críticos de navios, exige-se confiabilidade superior a 99,9968 % com
relação à falha por fadiga, [2].
O comportamento de determinado produto com relação à falha é melhor compreendido pelo
exame do comportamento de sua taxa de falha. Esta taxa de falha λ(t) pode ser definida em
termos da própria confiabilidade, como segue:
“Sendo λ(t) ∆t a probabilidade de que o sistema falhará em um tempo t < t + ∆t, dado que
ainda não falhou até o tempo em t = t” , tem-se que λ(t) ∆t é a probabilidade condicional
abaixo indicada:
λ(t) ∆t = P (t < t + ∆t t > t )
(7)
Assim, com base na definição de probabilidade condicional, tem-se:
P (t < t + ∆t t > t ) = P { ( t > t ) ∩ ( t < t + ∆t ) / P ( t > t )
(8)
Como o numerador da equação (8) é a própria f(t) ∆t e o denominador é a R(t), a taxa de falhas
instantânea é expressa pela relação:
λ(t) = f (t) / R(t)
(9)
com:
f (t): função densidade de probabilidade de falha;
R (t): confiabilidade.
O comportamento da taxa de falha λ(t) em relação ao tempo t é indicador das causas de falha.
A curva da banheira (“bathtub curve”), mostrada na Figura 3, representa graficamente esta
relação para sistemas ou componentes sem redundância.
Falha
Precoce
Falha Aleatória
Falha por Desgaste
Figura 3 – Representação da Curva da Banheira, [6].
O relativamente curto intervalo de tempo indicado na região I do gráfico constante da
Figura 3, apresenta taxas de falha que decrescem a partir de t = 0. Esta região caracteriza as
falhas precoces (“early failures”) ou ainda, em analogia com seres humanos, de mortalidade
infantil. Sob este parâmetro de comparação as falhas, neste período, são causadas por defeitos
congênitos ou fraquezas, sendo que a taxa de mortalidade decresce com o tempo. Muitas vezes
o problema da falha precoce é contornado através da especificação de um período de tempo
durante o qual o equipamento realiza um pré-teste. Durante este tempo, o carregamento e
utilização do produto são controlados de tal maneira que problemas são detectados e
componentes são reparados.
Normalmente, as falhas precoces ou prematuras estão relacionadas com problemas associados
aos processos de fabricação e montagem ou mesmo com o material empregado na fabricação
do componente. Estes problemas são não usuais, ou seja, ocorrem exporadicamente, muitas
vezes por alguma razão não específica. No caso de montagem, é bastante comum a falha estar
relacionada a algum erro humano do montador. No caso de sistemas de navios, estas falhas
podem também estar associadas com a falta de treinamento da tripulação para operar sistemas
com características inovadoras em relação aos tradicionalmente usados na indústria naval.
A região intermediária da curva da banheira contém as aproximadamente constantes taxas de
falha, sendo preferencialmente o período de operação do produto. As falhas que ocorrem
durante esta fase são denominadas falhas aleatórias e originam-se, normalmente, de
carregamentos inevitáveis e inesperados e menos comumente devido a defeitos inerentes ao
equipamento em si. Fazendo-se uma analogia com a população humana, as mortes nesta parte
da curva da banheira são devidas a acidentes ou doenças infecciosas. Nos equipamentos,
podem-se citar como exemplos de causas de falha na região II da curva da banheira:
sobrecarga na tensão de alimentação, vibrações, impactos mecânicos, flutuações de
temperatura e de umidade.
Na região III, mais à direita da curva da banheira, observa-se que a taxa de falha é crescente,
em função do próprio desgaste do equipamento, na fase final de sua vida útil. Nesta fase, as
falhas tendem a ter natureza cumulativa tais como corrosão, trincas de fadiga, desgaste por
atrito, dentre outros. O aumento muito rápido da taxa de falha normalmente fundamenta o
critério de quando as peças de um equipamento devem ser substituídas e também determina a
vida útil do produto ou sistema.
A curva da banheira representada na Figura 3 pode ser considerada genérica, uma vez que
cada categoria de equipamento apresenta uma curva característica. Para equipamentos eletroeletrônicos, por exemplo, a curva da banheira apresenta, tipicamente, as regiões I e II, ou seja,
há a presença da mortalidade infantil e durante a vida operacional os mesmos apresentam
falhas de natureza aleatória, sem as características de envelhecimento. Contrariamente, para
componentes mecânicos, pode-se afirmar que a curva da variação temporal da taxa de falha
apresenta preferencialmente as regiões I e III. A mortalidade infantil está associada a
problemas de fabricação, montagem ou de materiais, que induzem a falha no início da vida
operacional. Durante o uso, os equipamentos mecânicos falham, normalmente, por desgaste,
corrosão ou fadiga, que são mecanismos de falha nos quais o dano é cumulativo ao longo do
tempo de operação, até que este atinja um valor crítico, precipitando a falha. Desse modo, a
probabilidade de falha do equipamento é crescente ao longo do tempo e, associada a esta, temse um aumento da taxa de falha, representando um envelhecimento ou desgaste do produto.
2.2 Modos de Falha de Componentes
Observando os aparelhos que nos rodeiam, nota-se que seu funcionamento se dá até que algum
evento impeça temporária ou definitivamente sua utilização, em outras palavras, uma falha
ocorre.
Para alguns tipos de componentes, as falhas são causadas por poucos fatores, por vezes,
apenas um. Outros componentes podem falhar por mais de um motivo. A literatura acerca da
confiabilidade apresenta diversas definições para modo de falha como a de O´Connor, [7] ,
“modo de falha é o conjunto de fatores e solicitações às quais um equipamento está sujeito
durante sua operação, que o levam a atingir o fim de sua vida útil”. Uma definição mais
simples estabelece que modo de falha é “o mecanismo pelo qual um item falha”.
O conceito de modo de falha visa justamente esclarecer que componentes de naturezas
diferentes falham por motivos diferentes.
A experiência no trato com os equipamentos possibilitou à engenharia conhecer
empiricamente alguns dos modos de falhar como por exemplo os associados ao processo de
fadiga, sempre presente em componentes mecânicos sujeitos a solicitações de magnitude
variável no tempo. Atualmente, a determinação dos modos de falha é feita antes mesmo do
produto existir, ou seja, em sua fase de projeto. Pode-se recorrer à simulação, aos testes de
laboratório e de campo com protótipos e até mesmo, projetar componentes impondo seus
modos de falhar.
Ainda que se trate de produtos já em operação, a análise do projeto pode revelar prováveis
modos de falha. Há ferramentas desenvolvidas especialmente com esta finalidade, a serem
estudadas ainda neste capítulo.
O modo de falhar dos componentes é função das solicitações que o mesmo receberá durante
sua operação, em um ambiente específico e executando funções previamente determinadas.
Entretanto, é possível que haja alterações neste modo de falhar se valores admissíveis forem
ultrapassados. Portanto, coerente com as definições da confiabilidade de um componente ou
equipamento apresentadas no início deste capítulo, também os modos de falha podem ser
determinados com segurança dentro de condições pré-estabelecidas.
Modo da falha é uma informação essencial no estabelecimento das políticas de manutenção a
serem aplicadas a um componente ou equipamento, pois, juntamente com a caracterização
estatística das falhas, fornece diretrizes para a tomada de decisões como a necessidade de
substituições periódicas, revisões, monitoração ou mesmo revela a impossibilidade de adotar
medidas que se antecipem à ocorrência da falha, indicando a utilização de intervenções
corretivas.
3. PROCEDIMENTO DE ANÁLISE
3.1 Considerações iniciais
Este artigo apresenta uma proposta para um procedimento a ser utilizado na elaboração de
documentos de análise de confiabilidade. Como esse processo segue, na maioria das vezes,
etapas semelhantes, tentou-se abordar aqui a seqüência mais usual e lógica, a fim de facilitar
futuras análises, bem como facilitar sua utilização na indústria naval, onde esta atividade ainda
não é rotineira.
O objetivo principal no desenvolvimento de análises de confiabilidade é detectar pontos fracos
no sistema analisado, identificando, principalmente, as deficiências que contribuem para a sua
não confiabilidade. Essas análises servem de auxílio ao projetista, uma vez que realimentam o
projeto com informações que podem ser implementadas a fim de melhorar seu desempenho.
A análise de confiabilidade de um sistema é bastante dependente do grau de conhecimento que
o analista possui das suas funções bem como da contribuição de cada componente do mesmo
para a realização de tais funções. Uma forma simples e bastante usual de apresentar as
relações funcionais entre os componentes de um sistema baseia-se no emprego da árvore
funcional.
O desenvolvimento da análise de confiabilidade de um sistema deve ter início utilizando-se
uma técnica de identificação de falhas que seja sistemática e que considere integralmente o
item (quer seja um sistema, subsistema, etc.), objeto da análise. Muitas são as técnicas
disponíveis para essa identificação; uma das mais minuciosas é a AMFE – Análise de Modos
de Falha e Efeitos - que, apesar de bastante trabalhosa e demorada, permite um conhecimento
detalhado do sistema por parte do analista, facilitando o seu entendimento e exigindo uma
interação com o projetista do mesmo. Embora demande um tempo considerável, é uma técnica
que pode ser empregada ao nível de resolução desejado, quer seja em nível de equipamento,
quer seja em nível de componentes do equipamento, etc.. É um processo aplicável a qualquer
fase do projeto, identificando aspectos qualitativos relevantes à análise de segurança de uma
forma geral. Por meio dela, procuram-se identificar os efeitos provocados por falhas simples
no sucesso operacional do sistema considerado, bem como os métodos de detecção e os
mecanismos de minimização do impacto de tais falhas. A AMFE é um processo indutivo,
sistemático e exaustivo, sendo o passo inicial para o desenvolvimento da árvore de falhas do
sistema, que é o objetivo final da análise de confiabilidade. A referência [8] apresenta em
detalhes essa técnica. A norma MIL-STD-1629A9(3), [9], embora seja ainda muito citada
como base para elaboração de AMFE, foi suprimida em sua última revisão; entretanto, os
padrões por ela consagrados em suas revisões anteriores são amplamente utilizados.
Considerando-se que a confiabilidade representa a probabilidade do sistema executar a sua
função por determinado período de tempo (onde tempo pode ser entendido como uma unidade
de medida do uso do sistema, podendo ser expressa em horas, ciclos de operação ou mesmo
distância percorrida), devem-se avaliar quais os componentes do mesmo devem estar operando
para garantir a realização da função principal. Uma forma de representar a inter-relação entre
os componentes de um sistema quando este está operando é através do emprego do diagrama
de blocos. Conhecendo-se a confiabilidade de cada bloco do diagrama (que pode representar
um componente, um módulo ou mesmo um subsistema) define-se a confiabilidade do sistema.
A desvantagem do uso do diagrama de blocos está no fato que este representa a operação
normal do sistema, mas não indica a probabilidade deste operar parcialmente, com
deterioração no desempenho previsto em projeto, em função da ocorrência de falhas ou
mesmo combinações de falhas dos componentes. Para esta avaliação, recomenda-se o emprego
da árvore de falhas.
A técnica de árvore de falhas, utilizada para o desenvolvimento da análise de confiabilidade, é
uma ferramenta de análise dedutiva, onde são investigadas as relações seqüenciais de causa e
efeito entre eventos, num processo lógico e gráfico, de modo a identificar uma combinação de
falhas que possam causar uma determinada condição indesejável para a operação do sistema,
incluindo a sua total paralisação. Os efeitos decorrentes de falhas múltiplas podem ser
observados por meio do emprego desta técnica. Deve-se partir do(s) evento(s) indesejável(eis)
para o sistema, buscando todas as possíveis causas para tal(is) evento(s); os pontos terminais
da árvore de falhas são chamados de eventos básicos e representam o maior nível de resolução
a que se pode chegar ou a que se tenha interesse em investigar. A análise por árvore de falhas
pode ser tanto qualitativa quanto quantitativa. Se forem associadas taxas/probabilidades de
falha e/ou de reparo aos eventos básicos, podem ser obtidas medidas de desempenho para o
sistema em análise.
Do exposto nos parágrafos anteriores, verifica-se que para avaliar a confiabilidade de um
sistema necessita-se estimar a confiabilidade de cada um de seus componentes. Esta estimativa
deve, preferencialmente, ser executada com o emprego dos tempos até a falha dos
componentes, obtidos a partir da análise dos registros constantes nos bancos de dados de
manutenção dos operadores dos navios que utilizam o sistema em análise. A utilização das
informações constantes dos bancos de dados de um operador específico permite a estimativa
da confiabilidade dos componentes considerando as características típicas de utilização do
mesmo, incluindo a política de manutenção empregada pelo operador.
As técnicas descritas até o momento permitem a análise de confiabilidade de sistemas já
instalados em navios, bem como permite uma avaliação de confiabilidade ainda na fase de
projeto do mesmo. Na fase de projeto é possível a introdução de alterações no layout do
sistema com o objetivo de aumentar a sua confiabilidade. Para sistemas já em operação as
alterações podem ser difíceis de serem executadas em função de restrições financeiras, ou
mesmo físicas, tipicamente falta de espaço para instalação de novos componentes. Nesta
situação, deve-se prever uma política de manutenção que tenha como objetivo reduzir as taxas
de falha do sistema, principalmente as que envolvem a paralisação total do mesmo.
Propõe-se, como complementação da análise de confiabilidade de sistemas, a seleção de
políticas de manutenção para seus componentes de modo a reduzir a taxa de ocorrência de
falhas de componentes críticos, ou seja, aqueles que em caso de ocorrência de falha podem
causar uma grande degradação no desempenho operacional do sistema. Tendo em vista a
preocupação em definir a confiabilidade do sistema, a seleção das políticas de manutenção dos
seus componentes deve ser baseada em uma filosofia centrada em confiabilidade. Esta
filosofia é denominada de Manutenção Centrada em Confiabilidade, [10].
Nesta introdução foram abordadas algumas técnicas que, aplicadas conjuntamente, tornam
consistente o processo de análise de confiabilidade. As próximas seções e subseções detalham
o conteúdo e a formatação a serem observados na elaboração de documentos de análise de
confiabilidade.
3.2 Descrição do Procedimento
Tal como apresentado no capítulo introdutório, o procedimento para análise de confiabilidade
de sistemas instalados em navios envolve o estudo do sistema sob o ponto de vista da
interligação funcional entre os seus componentes de forma a permitir uma perfeita
compreensão da contribuição de cada componente para o sistema executar a função de acordo
com um desempenho previamente estabelecido. Para executar esta descrição, propõe-se o
emprego da árvore funcional associada ao uso da descrição funcional.
Definida esta relação funcional entre os componentes, deve-se definir qual o efeito da falha de
um dado componente sobre o desempenho operacional do sistema. Esta análise permite definir
quais são os componentes críticos do sistema sob o ponto de vista de redução do desempenho
operacional deste último em função da ocorrência da falha do componente. Quanto maior for
esta perda de desempenho, o componente pode ser classificado com maior criticidade. A
execução desta análise exige um procedimento muito bem estruturado e, para tanto, se sugere
o emprego da Análise de Modos e Efeitos de Falha, proposto originalmente pelo
Departamento de Defesa norte-americano.
Após a identificação dos componentes críticos, deve-se executar a análise de confiabilidade do
sistema. A análise é baseada na estimativa da confiabilidade dos componentes do sistema,
sendo a confiabilidade deste, uma composição da confiabilidade dos componentes, respeitada
a sua interligação funcional. Para avaliação da confiabilidade do sistema propõe-se o uso do
diagrama de blocos ou mesmo o emprego da árvore de falhas. O uso do diagrama de blocos
permite a definição da confiabilidade do sistema enquanto que o uso da árvore de falhas é
indicado para definir a probabilidade de ocorrência de uma condição operacional indesejada
para o sistema.
Finalmente, após a análise de confiabilidade, é possível prever ações de manutenção para os
componentes críticos do sistema visando a minimização da freqüência de ocorrência de falha
dos mesmos. Propõe-se, para a seleção de políticas de manutenção, o uso da filosofia da
Manutenção Centrada em Confiabilidade que tem por objetivo definir ações de manutenção
que preservem o desempenho operacional do sistema, priorizando o emprego da manutenção
preditiva.
Na Figura 4 indica-se o fluxograma do procedimento de análise de confiabilidade. Nos
capítulos seguintes deste texto é detalhada cada uma das ferramentas de análise citadas no
fluxograma.
Análise do
Sistema
Descrição
Funcional
Árvore Funcional
AMFE
Seleção dos
Componentes Críticos
Análise dos Efeitos
Políticas de
Manutenção
Análise de
Confiabilidade
Avaliação dos Resultados
Figura 4 - Fluxograma do Procedimento de Análise de Confiabilidade.
3.3 Elaboração da Árvore Funcional
Como primeiro passo para a elaboração da árvore funcional é necessário que a equipe de
análise (os analistas de confiabilidade e o cliente) possuam um canal de troca de informações
sobre a estrutura do sistema em análise. Com o objetivo de obter um profundo conhecimento
do sistema devem ser obtidas respostas a algumas questões do tipo: quais são os componentes
que compõem o sistema?; como o sistema opera?; quais as alterações efetuadas em relação ao
projeto original?, entre outras informações. É necessário que o “Cliente” forneça fluxogramas
de operação, planos, diagramas, manuais técnicos, manuais de operação, fotografias e todo o
material que a equipe possa usar para elaborar a correta descrição da operação do sistema.
Com o conhecimento destas informações é feita uma listagem dos componentes do sistema ou
subsistema em análise, bem como a descrição de suas funções.
Para a elaboração da árvore funcional de um sistema qualquer, é preciso conhecer a lógica de
operação do mesmo, conhecimento obtido na primeira etapa. A elaboração da árvore
funcional consiste em responder as perguntas: como é executada (cumprida) uma determinada
função?; e, por que uma determinada função deve ser executada?
A resposta à primeira pergunta terá um nível primário, que permite definir quais componentes
devem ser utilizados para executar esta função. Assim deve-se continuar até chegar ao último
nível, que é o nível do componente. A segunda pergunta serve para verificar se a árvore
baseada na primeira pergunta está correta. A Figura 5 ilustra a metodologia para a elaboração
da árvore funcional.
Figura 5 – Método de Elaboração da Árvore Funcional.
3.4 Elaboração da Análise de Modos de Falha e Efeitos
A Análise de Modos de Falha e Efeitos – AMFE (do inglês “Failure Modes and Effects
Analysis”) tem por objetivo verificar as conseqüências da falha de um componente sobre a
operacionalidade de um sistema.
A execução da AMFE inicia-se com a definição dos possíveis modos de falha dos
componentes de um sistema. Os componentes considerados na análise são os listados no final
dos diversos ramos das árvores funcionais dos sistemas que o compõe.
A cada modo de falha estão relacionadas possíveis causas, que se relacionam com fenômenos
físicos que ocorrem durante a operação, fabricação ou montagem dos componentes.
Levantados os modos de falha, procede-se a uma avaliação das conseqüências (ou efeitos) da
ocorrência de uma destas falhas sobre os sistemas, dos quais os componentes fazem parte. A
definição destas conseqüências é feita baseando-se no estudo das características operacionais
do sistema, tendo por base a descrição das funções de cada componente, detalhadas na árvore
funcional. As conseqüências estão sempre relacionadas a uma degradação da condição
operacional do sistema, sendo a gravidade das mesmas classificada em função do grau de
deterioração na capacidade de execução das funções previstas para o sistema.
A partir da associação entre modos de falha de componentes e as suas conseqüências para a
condição operacional do sistema, pode-se executar uma classificação dos componentes de uma
forma hierárquica, tomando como base a degradação da condição operacional em função da
falha dos componentes. Sob o ponto de vista do usuário, sem levar em consideração a
freqüência de ocorrência dos modos de falha, maior atenção deve ser destinada aos
componentes cujas falhas são mais prejudiciais à operação do equipamento. Esta maior
atenção pode estar relacionada com atividades de manutenção preditiva, associadas à
monitoração das características operacionais dos componentes, ou com o emprego de
intervenções periódicas, características da manutenção preventiva.
A análise do tipo AMFE é um método empregado na melhoria de projetos de sistemas, na
determinação dos pontos vulneráveis no projeto, na concepção de testes do tipo “built-in”, no
projeto de linhas de produção (chão de fábrica) e no planejamento da manutenção, onde a
elaboração de rotinas de diagnose e requisitos de manutenção preventiva são benefícios
relevantes.
Este método é uma das técnicas mais importantes e mais empregadas para enumerar os
possíveis modos de falha de um dado componente e, a partir das características de operação do
sistema, definir as conseqüências de cada um destes modos de falha sobre a operação desse
sistema como um todo. O método apresenta, basicamente, uma natureza qualitativa.
As principais razões para se utilizar a AMFE são:
i)
A análise fornece ao projetista informações sobre a estrutura do sistema e os principais
fatores que influenciam a sua confiabilidade;
ii) Define os componentes que influenciam a confiabilidade do sistema como um todo,
indicando uma direção para a adoção de ações corretivas no projeto e/ou manutenção; e
iii) Verifica componentes e subsistemas que devem receber atenção especial quando da
montagem, fabricação ou manutenção.
Como método, a AMFE tem diretrizes gerais as quais norteiam sua elaboração. Desta forma, é
necessário refletir sobre cinco questões a respeito do sistema como base para a elaboração da
AMFE:
1.
2.
3.
4.
5.
Como cada componente do sistema pode falhar (quais seus modos de falha)?;
Quais os efeitos desta(s) falha (s) sobre o sistema?;
Quão críticos são estes efeitos?;
Como detectar a(s) falha(s)?; e
Quais as medidas contra esta(s) falha(s) (evitar, prevenir a ocorrência das mesmas ou
minimizar seus efeitos)?
A AMFE baseia-se na execução de uma tabela, similar à indicada na Tabela 1, que apresenta o
número mínimo de informações para a execução de uma análise adequada. Na primeira coluna
apresenta-se a identificação do componente, sob um código ou numeração indicada pelo
projetista do sistema analisado e na segunda coluna apresenta-se o nome do componente ou
subsistema que está sendo analisado. Em uma terceira coluna pode-se, opcionalmente,
descrever a função do componente, indicando a sua relação com o sistema em estudo. Em uma
quarta coluna descrevem-se as possíveis falhas que podem ser apresentadas pelo componente e
em qual modo de operação do sistema. Eventualmente, poderão ser listados todos os possíveis
modos de falha do componente, pois, dependendo do tipo do sistema em análise, do ambiente
em que este irá operar, ou outras causas, apenas alguns modos de falha se aplicam ao caso em
estudo, devendo esta hipótese ser claramente especificada na folha de análise. Na seqüência da
tabela, são discutidas as conseqüências de cada modo de falha do componente sobre o
funcionamento do sistema, incluindo os efeitos locais e os efeitos sobre outros subsistemas, até
as conseqüências sobre o sistema como um todo. Devem-se também apresentar possíveis
formas de se detectar um dado tipo de falha, ou a indicação de que a mesma está para ocorrer,
de forma a possibilitar a manutenção ou correção do problema antes da ocorrência do mesmo e
a conseqüente propagação de seus efeitos sobre o sistema. Como penúltima coluna da tabela,
tem-se a classificação da severidade de um modo de falha, a qual tem como objetivo fornecer
uma idéia qualitativa do efeito do modo de falha do componente sobre o sistema como um
todo. A extinta norma MIL-STD-1629A, para efeito de aplicação da análise do tipo AMFE,
classificava a severidade (ou criticidade) nas seguintes categorias, ainda usualmente utilizadas:
•
•
•
•
Catastrófica: um modo de falha que cause a interrupção do funcionamento ou a
perda do sistema, podendo causar inclusive mortes.
Crítica: um modo de falha que cause um dano severo ao sistema, ou uma grave
degradação na operação do mesmo, causando redução em seu desempenho e/ou
ferimentos graves.
Marginal: um modo de falha que cause ferimentos leves ou degradação moderada
no desempenho do sistema.
Menor: um modo de falha que não cause ferimentos ou degradação no desempenho
do sistema, mas resulte na sua falha, exigindo manutenção não programada.
Tabela 1 - Informações para Elaboração da Análise de Modos de Falha e Efeitos.
Finalmente, na última coluna da tabela, podem-se adicionar notas esclarecedoras sobre os
pontos abordados na tabela de análise.
3.5 Análise de Confiabilidade
Os equipamentos em geral são compostos de muitas partes atuando de forma combinada, a fim
de possibilitar seu funcionamento conforme as especificações de projeto. São raros os
exemplos, sobretudo em equipamentos mais modernos, de apenas uma ou duas peças
operando para executar uma função complexa.
Isto acrescenta notável complexidade à análise de confiabilidade de um sistema, pois se tem
componentes interligados de diversas maneiras, conduzindo a níveis distintos de
confiabilidade.
Cada uma das partes de um sistema passará a ser formalmente denotada pelo termo
componente. Na análise da confiabilidade dos sistemas, é útil a abordagem de diagrama de
blocos para representá-lo. Neste diagrama, procura-se representar a seqüência de
processamento de informações do sistema por meio de um arranjo de componentes, indicados
por blocos, os quais são considerados unidades autônomas. O diagrama de blocos representa a
modelagem do fluxo de informações do sistema, apresentando uma entrada e uma seqüência
de processamento, com as etapas sendo executadas por cada bloco, até a obtenção da
informação final. A partir da análise do diagrama de blocos é possível definir a confiabilidade
de um sistema.
Entretanto, quando se calcula a confiabilidade de um sistema, está-se considerando todas as
possíveis formas de falha de seus componentes as quais podem impedir o funcionamento do
mesmo, ou seja, qual a probabilidade de falha destes componentes.
Em alguns casos, torna-se importante analisar uma seqüência de eventos e/ou falha de
componentes que gere um evento indesejável para o sistema, como por exemplo, uma falha
que leve a problemas de segurança para uma instalação de processos (geração de energia,
planta química, aeronaves, embarcações, etc.), ou mesmo para a vida humana.
Durante uma análise de segurança de um dado sistema, torna-se necessário avaliar e entender
o mecanismo que leva à ocorrência de um dado tipo de falha, normalmente um acidente,
procurando-se estimar sua probabilidade de ocorrência e, finalmente, verificar as
possibilidades de se reduzir esta probabilidade.
Provavelmente, a tarefa mais importante dentro de um programa de análise de segurança de
um dado equipamento – visando a medição da probabilidade de acidentes com o mesmo – é
identificar os mecanismos pelos quais este pode vir a ocorrer. O analista, portanto, deve
conhecer o sistema sob sua análise, de modo a descrever adequadamente o seu funcionamento
e conhecer as limitações dos subsistemas e componentes que o compõem, de forma a
considerar as possíveis formas “críticas” de falha deste sistema. Para tanto, deve-se completar
a análise por diagrama de blocos com o emprego da técnica de análise por árvore de falhas.
Basicamente, há duas disposições para os componentes de um sistema, as quais são
apresentadas nas Figuras 6 e 7.
1
2
n
Figura
– Componentes
Dispostos
em Série.
Figura66.1
- Componentes Dispostos
em Série
1
2
n
Figura 7 - Componentes Dispostos em Paralelo.
No diagrama de blocos, como indicado nas Figuras 6 e 7, cada quadrado representa um item
ou componente e este diagrama ilustra as interligações entre estes itens, ou seja, o fluxo de
informações do sistema. Os sistemas reais costumam se apresentar como combinações de
componentes em série e em paralelo.
O tipo de sistema (seu arranjo) influi decisivamente em sua confiabilidade. A escolha entre as
formas em série ou em paralelo depende de fatores como a função de cada item, a
confiabilidade requerida, espaço físico, recursos disponíveis e segurança, entre outros.
3.6 Manutenção Centrada em Confiabilidade
O termo Manutenção Centrada em Confiabilidade, do inglês “Reliability Centered
Maintenance” (RCM) é empregado para descrever um programa de manutenção baseado no
tempo, que tem por objetivo manter o equipamento com desempenho igual ou superior ao
necessário para este realizar a atividade para a qual foi projetado, ou seja, controlar a taxa de
degradação da disponibilidade do equipamento. Verifica-se que esta metodologia baseia-se na
análise da confiabilidade dos equipamentos que compõem um sistema, bem como na relação
entre os modos de falha dos mesmos e a degradação do desempenho operacional do sistema,
[10].
O objetivo principal da Manutenção Centrada em Confiabilidade é assegurar que um sistema
mantenha-se com nível de desempenho suficiente para executar as tarefas a ele atribuídas. O
enfoque deste método de seleção de políticas de manutenção difere da antiga filosofia de
manutenção, que procurava evitar a ocorrência de qualquer falha no sistema, considerando a
disponibilidade de recursos financeiros finitos. Nesta metodologia é importante executar
tarefas de manutenção que assegurem que o sistema continue a cumprir suas funções, com um
desempenho específico, dentro de um contexto operacional pré-definido. A ênfase é
determinar a política de manutenção necessária para manter o sistema funcionando, ao invés
de buscar a condição máxima de desempenho do mesmo.
Os princípios para aplicação do RCM baseiam-se nas respostas das seguintes questões:
•
•
•
Como ocorre (qual o processo físico associado) um dado modo de falha de um
componente do sistema?;
Quais são as conseqüências da ocorrência deste modo de falha para o desempenho
do sistema?; e
Quais práticas de manutenção, de preferência às práticas preventiva ou preditiva,
podem ser utilizadas para reduzir a possibilidade de ocorrência deste modo de
falha?
Verifica-se que há uma indicação da priorização das práticas preventivas e preditivas, pois
estas envolvem atividades de substituição, reparo, ou mesmo ajuste de um ou mais
componentes do sistema antes da ocorrência da falha dos mesmos, procurando-se evitar a
parada deste sistema. O objetivo desta priorização é reduzir a possibilidade de perda de
desempenho do sistema, minimizando a taxa de redução da disponibilidade ao longo do
tempo, tendo em vista a deterioração de componentes do sistema devido à ocorrência de
fenômenos cumulativos, tais como fadiga, desgaste e corrosão, entre outros.
Usualmente, as conseqüências da ocorrência de uma significativa perda de desempenho, ou
mesmo a parada de um equipamento ou sistema estão associadas a perdas financeiras,
classificadas como econômicas, as quais usualmente são de grande monta. Daí a priorização
de práticas preventivas ou preditivas, as quais reduzem a possibilidade de ocorrência destas
perdas. Embora a aplicação destas práticas de manutenção tenha custos, estes ainda são
bastante inferiores à perda econômica, no caso de grave perda de desempenho do sistema. O
maior custo da manutenção preventiva está associado com o período de indisponibilidade do
sistema quando da execução das atividades previstas no plano de manutenção, embora ainda
possam ser contabilizados outros custos como de mão-de-obra e de peças sobressalentes. No
caso da manutenção preditiva, além do custo de indisponibilidade do equipamento, estão
associados os custos de aquisição, implantação e operação dos instrumentos de monitoração
dos parâmetros indicativos do desempenho do sistema, bem como os custos de análise dos
dados coletados.
Verifica-se também que a Manutenção Centrada em Confiabilidade prioriza a manutenção de
componentes e subsistemas cujas falhas causem acentuada degradação do desempenho do
sistema, incluindo sua parada. Este método admite que ocorrerão falhas em alguns
componentes, mas a falha dos mesmos não causará prejuízo ao desempenho do sistema,
podendo, portanto, serem toleradas. Para estas falhas utiliza-se a manutenção corretiva, pois o
custo associado com estas tarefas é inferior ao custo que estaria associado com tarefas
preventivas ou preditivas, [11].
Resumindo, pode-se afirmar que o processo de seleção da política de manutenção de um
sistema baseia-se no estudo das conseqüências associadas com a ocorrência da falha de um
componente do sistema e não unicamente no estudo dos modos de falha dos componentes. A
Manutenção Centrada em Confiabilidade permite a elaboração de uma política de manutenção
com atividades pré-agendadas, satisfazendo a requisitos de segurança e de desempenho
econômico-operacional do sistema.
A implantação de um programa de manutenção baseado na filosofia da Manutenção Centrada
em Confiabilidade envolve a execução de algumas tarefas, de uma forma seqüencial, tal como
indicado a seguir:
i.
ii.
iii.
iv.
v.
vi.
Elaborar a árvore funcional do equipamento;
Executar a Análise dos Modos de Falha e Efeitos de cada componente listado na árvore
funcional;
Aplicar um modelo de decisão que permita selecionar uma prática de manutenção para
um dado componente, priorizando aqueles cujas conseqüências da falha causem
degradação da condição operacional do sistema, incluindo problemas econômicos ou
de segurança, fazendo com que este se mantenha com desempenho superior ao mínimo
aceitável para a sua operação;
Identificar os componentes para os quais não é possível a aplicação de práticas de
manutenção preventiva ou preditiva, procurando-se estudar possíveis modificações no
seu projeto, incluindo possíveis alocações de redundâncias, ou mesmo definir
aplicação de manutenção corretiva;
Para os componentes onde a aplicação da prática preventiva é viável, estabelecer um
período inicial de substituição ou reparo do mesmo, tendo em vista o histórico
temporal de falhas. No caso de aplicação de manutenção preditiva, definir o parâmetro
indicativo da evolução de um dado modo de falha, selecionar o processo de
monitoração do mesmo, e definir a forma de análise dos dados obtidos, visando à
tomada de decisão sobre o momento de intervenção no componente, para executar
tarefas de manutenção antes da ocorrência da falha; e
Manter um contínuo registro de falha dos componentes, a fim de subsidiar uma
contínua reavaliação de seu plano de manutenção.
Ressalta-se que a política de manutenção de um sistema definido com a aplicação da filosofia
RCM apenas reduz a taxa de degradação da disponibilidade dos equipamentos que o
compõem. Entretanto, o aumento da confiabilidade/disponibilidade dos mesmos apenas pode
ser obtido com uma reavaliação de seus projetos. Já, para aumentar a confiabilidade do
sistema, além da melhoria da confiabilidade dos componentes, pode-se alterar a configuração
do mesmo, com a adoção de redundâncias em componentes muito críticos.
Com relação à classificação das falhas, considera-se que ocorre falha de um componente
quando este desempenha sua função de forma insatisfatória, caracterizando a incapacidade de
executar a tarefa para a qual foi projetado. A afirmação que um desempenho é insatisfatório ou
não, dependerá das conseqüências daquela falha para certo contexto operacional do sistema.
Assim, a diferença entre um desempenho satisfatório ou insatisfatório estará relacionada com a
função do componente e também ao tipo e ao contexto operacional do sistema no qual este
está instalado.
Para qualificar se um desempenho é satisfatório ou insatisfatório necessita-se da fixação de um
padrão de desempenho mínimo esperado do componente, que será tomado como referência
nesta qualificação. Dessa forma, a condição de desempenho insatisfatório pode representar a
perda de capacidade de o componente executar a sua função, ou mesmo a observação de uma
evidência física de que está ocorrendo um processo de deterioração da capacidade operacional
do componente, que culminará na incapacidade de executar a sua função.
A presença de uma evidência física do processo de deterioração é a premissa básica para a
aplicação da manutenção preditiva. A correta monitoração deste processo permite utilizar ao
máximo o componente e repará-lo (ou substituí-lo) antes da ocorrência da falha funcional.
A ocorrência de falhas só é detectada quando o operador do sistema verifica alguma anomalia
na condição operacional do mesmo. Em sistemas complexos, a habilidade de o operador
detectar a presença de falhas é aumentada com o emprego de sistemas de monitoração
associados a alarmes, que indicam com sinais sonoros ou luminosos, a ocorrência de alguma
falha funcional. Em alguns casos, estes alarmes indicam a ocorrência de alguma falha de
componente, mesmo que este não esteja sendo utilizado no contexto operacional momentâneo
do sistema.
Embora muitas das falhas funcionais possam ser detectadas pelo operador do sistema, podem
ocorrer falhas de componentes que não são imediatamente observadas. Dessa forma, uma
falha funcional pode ser classificada em:
•
•
Falha evidente (ou falha detectável), a qual é imediatamente observada pelo
operador do sistema quando acontece;
Falha oculta (ou falha não detectável), a qual não é observada pelo operador do
sistema quando da sua ocorrência, ou seja, não há evidências que a mesma ocorreu.
As falhas ocultas podem ser de dois tipos: uma função que é ativa durante a operação normal
do sistema, mas que não dá indicação da redução de seu desempenho; ou uma função que é
inativa durante a operação normal do sistema e, portanto, o operador não tem condição de
avaliar se a mesma estará operante em caso de necessidade de seu uso.
Com relação à classificação das conseqüências das falhas funcionais, esta tem por objetivo
determinar a priorização das atividades de manutenção ou mesmo de melhoria no projeto do
sistema ou componente, visando prevenir a ocorrência de falhas e, portanto, suas
conseqüências.
Quanto maior a complexidade de um sistema, maior será o número possível de falhas que este
pode apresentar, em função da ocorrência das falhas dos componentes. As falhas dos sistemas
são as conseqüências das falhas dos componentes, podendo ser classificadas em:
•
•
•
•
Conseqüências de segurança, envolvendo possíveis danos ao sistema, podendo
causar efeitos adversos à sua segurança operacional, colocando em risco seres
humanos ou o meio ambiente;
Conseqüências operacionais, que envolvem uma perda econômica, em função da
redução do desempenho operacional do sistema abaixo do mínimo esperado,
incluindo nesta perda o próprio custo do reparo;
Conseqüências não operacionais, que não afetam o desempenho do sistema no
contexto operacional do mesmo, porém exigem reparo, o qual deverá ser efetuado
em algum momento futuro, sendo associado ao mesmo um custo de reparo; e
Conseqüências de falhas ocultas, que não têm impacto imediato sobre o
desempenho operacional do sistema, mas podem ser o evento iniciador (gatilho)
para o desenvolvimento de outras falhas funcionais.
O método RCM apresenta um diagrama para classificação de uma falha funcional nas
categorias acima citadas, sendo este reproduzido na Figura 8. A classificação é baseada em
perguntas, cujas respostas são do tipo sim ou não, e associadas com as conseqüências da falha
funcional do componente sobre o desempenho do sistema.
Uma vez definida a classificação das falhas funcionais dos componentes de um sistema, em
função das conseqüências destas sobre o desempenho operacional, deve-se proceder ao
processo de seleção das práticas de manutenção recomendadas para cada um dos componentes
do sistema, elaborando a política de manutenção do sistema.
Figura 8 - Diagrama de Classificação das Conseqüências das Falhas, [11].
Este processo de decisão envolve um estudo sistemático de qual das três práticas básicas de
manutenção pode ser aplicada a um componente do sistema estudado, considerando como
critérios de seleção a possível aplicabilidade das práticas e a sua eficácia para retardar ou
evitar a ocorrência de um dado modo de falha.
Os diagramas de decisão empregados pela RCM são indicados nas Figuras 9 a 11, [11].
Verifica-se que, qualquer que seja a conseqüência da falha, busca-se preferencialmente a
aplicação da prática de manutenção preditiva. Na seqüência, o diagrama de decisão indica
preferência por tarefas de reparo ou substituição do componente em intervalos pré-definidos
de tempo, caracterizando a aplicação da prática preditiva. Finalmente, na impossibilidade de
aplicação das práticas acima citadas, pode-se utilizar a prática corretiva, ou seja, intervir no
componente após a falha do mesmo.
Figura 9 - Diagrama de Decisões para Seleção de Práticas de Manutenção – Modos de
Falha envolvendo Conseqüências de Segurança, [11].
Figura 10 - Diagrama de Decisões para Seleção de Práticas de Manutenção – Modos de
Falha envolvendo Conseqüências Operacionais e Não-operacionais, [11].
Figura 11 - Diagrama de Decisões para Seleção de Práticas de Manutenção – Modos de
Falha envolvendo Conseqüências Ocultas, [11].
A aplicabilidade da prática de manutenção preditiva, visando à monitoração da condição
operacional de um componente de um sistema, deve ser determinada por técnicos que estejam
familiarizados com a operação do componente, com as características de projeto e modos de
falha do mesmo, com as técnicas de monitoração disponíveis e com a geometria do sistema
onde o componente está instalado, a qual pode influenciar a instalação de sensores. Deve-se
ressaltar que a manutenção preditiva só deve ser empregada para modos de falha que tenham
um tempo de desenvolvimento, ou seja, apresentam sintomas que vão se modificando ao longo
do tempo, até a ocorrência da falha.
Com relação à aplicação da manutenção preventiva, esta é aplicável apenas para modos de
falha associados a um processo de dano cumulativo, onde é possível determinar um tempo de
intervenção antes da ocorrência da falha. Deve-se ressaltar que a condição operacional do
componente, representada pelo ambiente de instalação e pelos esforços sobre ele atuantes,
exerce significativa influência na evolução do dano, associado a um dado processo de falha, ao
longo do tempo. Para seleção de um período inicial de intervenção preventiva envolvendo um
reparo ou substituição de componente, deve-se basear em informações constantes dos
catálogos técnicos dos componentes.
Especificamente para o caso das falhas ocultas, ao final do diagrama de decisões, caso não seja
possível a aplicação de práticas preventivas ou preditivas, existe a necessidade de estudo da
viabilidade de aplicação de testes e/ou inspeções periódicos que permitam identificar o estado
operacional do componente. Caso não sejam possíveis estas inspeções, por razões técnicas ou
econômicas, sugere-se o emprego de manutenção corretiva, desde que a falha do componente
não afete a segurança operacional do sistema. Neste caso, exige-se um re-projeto do sistema,
para eliminar esta possibilidade.
4. CONCLUSÕES
O procedimento proposto para a análise de confiabilidade de sistemas instalados em navios é
baseado em quatro etapas básicas:
1. Estudo sobre a operação do sistema, envolvendo a determinação da integração funcional
dos diversos elementos que o compõem;
2. Definição dos modos de falha dos componentes bem como seus efeitos sobre o
desempenho operacional do sistema, possibilitando a seleção de componentes críticos sob
o ponto de vista da degradação do desempenho operacional em função da falha dos
mesmos;
3. Definição da confiabilidade do sistema, a partir da estimativa de confiabilidade de seus
componentes, com o emprego das técnicas de diagrama de blocos e/ou de árvore de falhas;
e
4. Proposição de políticas de manutenção para os componentes do sistema visando a
minimização da probabilidade de ocorrência de falhas dos componentes críticos.
Este procedimento pode ser utilizado na fase de projeto de um sistema específico de um navio,
onde usualmente existe mais de uma configuração admissível para o sistema. Considerando
que a confiabilidade deve ser um dos requisitos a ser avaliado na seleção de um dado sistema,
o método ora proposto permite definir o número de componentes críticos, bem como estimar a
confiabilidade das possíveis configurações, com o emprego de informações constantes em
banco de dados. Adicionalmente, mesmo em um estágio inicial de projeto, pode-se pré-definir
ações de manutenção para os componentes, cujo custo deve ser considerado quando da
estimativa do custo do ciclo de vida do sistema (“Life Cycle Cost Assessment”). Estas
informações podem ser utilizadas para subsidiar a seleção de um sistema específico a ser
instalado em um navio.
Nos casos onde o sistema já esteja em operação o presente método permite verificar a
confiabilidade/disponibilidade do sistema, definindo seus componentes críticos. A partir desta
identificação, caso seja possível em termos de espaço físico e em termos de viabilidade
econômica, pode-se sugerir a instalação de componentes redundantes, visando o incremento da
confiabilidade. Adicionalmente, com o emprego dos conceitos associados com a filosofia da
Manutenção Centrada em Confiabilidade é possível sugerir alterações na política de
manutenção dos componentes críticos do sistema em análise visando a redução da freqüência
de ocorrência de falhas. Considerando que esta filosofia prioriza o emprego da manutenção
preditiva, pode ser necessário avaliar a possibilidade de instalação de sensores para
monitoração da magnitude de algumas variáveis do sistema (pressão, temperatura, magnitude
de corrente elétrica, deslocamento, vibração, entre outros) que permitam a realização do
diagnóstico do desenvolvimento da falha.
Finalmente, a utilização deste procedimento exige o emprego de pessoal técnico treinado na
operação e manutenção do sistema em análise visando a plena aplicação dos métodos
sugeridos neste texto.
5. REFERÊNCIAS
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Uncertainty in Strength Models for Marine Structures, Ship Structural Committee
Research Report SSC-375, 1994.
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Design: Implementation and Design Guidelines, Ship Structure Committee Research
Report SSC-392, 1996.
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Life Cycle Management on Ship Structures, Ship Structure Committee Research Report
SSC-416, 2001.
4. HESS III, P.; AYYUB, B.M.; KNIGHT, D.E.; Failure Definition for Structural
Reliability Assessment, Ship Structure Committee Research Report SSC-420, 2002.
5. AYYUB, B.M.; KARASZEWSKI, Z.; WAD, M.; Probabilistic Risk Analysis of Diesel
Power Generation on Board Ships, Naval Engineers Journal, n. 111, vol. 37, pp 35-58,
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6. LEITCH, R. D.; Reliability Analysis for Engineers: An Introduction, 1a Edição, Oxford
University Press, 1995.
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Professional, 2002.
8. MCDERMOTT, R.E.; MIKULAK, R.J..; BEAUREGARD, M.R..; The basics of FMEA,
Quality Resources, 1996.
9. DEPARTMENT OF DEFENSE; Procedures for performing a failure mode effects and
criticality analysis, MIL-STD-1629A(3), U. S. Government Printing Office, 04 de agosto
de 1998.
10. MOUBRAY, J.; Reliability-Centered Maintenance, Industrial Press, 2nd edition, 2001.
11. LAFRAIA, J.R.B., Manual de Confiabilidade, Mantenabilidade e Disponibilidade, 1a
Edição, Qualitymark, 2001.
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