1 - RBTI

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Volume 16 • nº 1
Janeiro/Março 2004
ISSN 0103-507X
Artigo Original
34
Na Contramão da Medicina Baseada em
Evidências: Posição Semi-Recostada em Pacientes
sob Ventilação Mecânica versus Pneumonia
Editorial
RBTI Indexada é Moeda Forte
5
Comentário
Anemia e Transfusão de Hemácias
em Pacientes Críticos
7
Christian Nejm Roderjan, Paulo Cesar Pereira de Souza, Marcelo
Elysio Lugarinho, Arthur Martinez, Frederico da Costa Azevedo
40
Artigo Original Destaque
Transfusão Sangüínea Intra-Operatória e
Mortalidade em Pacientes Submetidos à
Cirurgia Eletiva para Retirada de Neoplasia
Gastrintestinal
9
Artigo Original
Posicionamento do Tubo Orotraqueal
Utilizando-se como Referência os Dentes
Incisivos Centrais Superiores
Artigo Especial
Terapia Intensiva na Graduação Médica:
Os Porquês
45
Artigo de Revisão
Uso da Noradrenalina no Choque
Séptico em Pediatria
49
Renato G. G. Terzi
Suzana Lobo
Claudio Piras
Luiz André Magno, Ederlon Rezende, Murillo Assunção,
Alexandre Marini Isola, João Manuel da Silva Jr. e Priscila
Pereira Nigro
Artigo Original
A Atitude dos Profissionais de Saúde
Diante da Morte
Ana Paula Pierre de Moraes, Gutemberg Fernandes de Araújo,
César Augusto Castro
14
Rachel Duarte Moritz, Silvia Modesto Nassar
Artigo Original
22
Gravidade de Pacientes e Demanda de Trabalho
de Enfermagem em Unidade de Terapia
Intensiva: Análise Evolutiva Segundo o TISS-28
Adriana Janzantte Ducci, Katia Grillo Padilha, Sandra
Cristina Ribeiro Telles, Beatriz Aparecida Ozello Gutierrez
Artigo Original
28
Insuficiência Renal no Pós-Operatório de
Pacientes Submetidos à Cirurgia para Correção
de Aneurisma de Aorta Abdominal: Incidência,
Fatores de Risco e Medidas Protetoras
Domingos Dias Cicarelli, Luiz Guilherme Villares da Costa,
Fábio Ely Martins Benseñor, Joaquim Edson Vieira
Aline Schröter Fuentes, Cristina Malzoni Ferreira Mângia,
Werther Brunow de Carvalho, Marcelo Cunio Machado Fonseca
Relato de Caso
56
Obliteração Angiográfica da Artéria Brônquica
para Tratamento de Hemoptise Maciça Secundária
à Pneumonia Estafilocócica Necrotizante
Sergio R. Penteado Fo.; Nelson Mozachi; Virginia Helena Soares
de Souza, Rodolfo Castro Cesar de Oliveira; Rogério Luz Coelho
Neto Suzana Boscardin Pereira, Gelson Kupper
Relato de Caso
Nó em Cateter na Veia Jugular Interna
59
William Wobber Cardoso Barros, Felipe José Silva Melo Cruz,
Renato Duarte Barbosa, Sabas Carlos Vieira
SUMÁRIO
Fundada em 1980
Diretoria para o Biênio
2004-2005
Presidente
José Maria da Costa Orlando
Vice-Presidente
Waldemar Henrique Fernal
1º Secretário
Marcelo Moock
2º Secretário
Luiz Alexandre A. Borges
1º Tesoureiro
Rosa G. Alheira Rocha
2º Tesoureiro
Afonso José Celente Soares
Associação de Medicina
Intensiva Brasileira
Rua Domingos de Moraes,
814 Bloco 2 – Conj. 23
Vila Mariana – CEP 04010100
São Paulo – SP
Tel.: (11) 5575-3832
[email protected]
Indexada na base de
dados Lilacs
A REVISTA BRASILEIRA
DE TERAPIA INTENSIVA reserva-se todos os
direitos, inclusive os de
tradução, em todos os
países signatários da
Convenção Pan-Americana e da Convenção
Internacional sobre os
Direitos Autorais. Os
trabalhos
publicados
terão seus direitos autorais resguardados pela
AMIB, que em qualquer
Editorial
RBTI Indexada é Moeda Forte
Renato G. G. Terzi
5
Comentário
Anemia e Transfusão de Hemácias em
Pacientes Críticos
Suzana Lobo
7
Artigo Original Destaque
9
Transfusão Sangüínea Intra-Operatória e
Mortalidade em Pacientes Submetidos à
Cirurgia Eletiva para Retirada de Neoplasia
Gastrintestinal
Intraoperative Blood Transfusion and
Mortality in Patients Submitted to Elective
Gastrointestinal Neoplasic Ressection Surgery
Luiz André Magno, Ederlon Rezende, Murillo
Assunção, Alexandre Marini Isola, João Manuel
da Silva Jr. e Priscila Pereira Nigro
Artigo Original
14
A Atitude dos Profissionais de Saúde Diante da
Morte
The Attitude of Health Professionals
Concerning Death
Rachel Duarte Moritz, Silvia Modesto Nassar
Artigo Original
22
Gravidade de Pacientes e Demanda de
Trabalho de Enfermagem em Unidade de
Terapia Intensiva: Análise Evolutiva
Segundo o TISS-28
Severity of Illness and Nursing Workload in
Intensive Care Unit: An Analysis using the
Therapeutic Intervention Scoring System-28
(TISS-28)
Adriana Janzantte Ducci, Katia Grillo Padilha,
Sandra Cristina Ribeiro Telles, Beatriz Aparecida
Ozello Gutierrez
Artigo Original
28
Insuficiência Renal no Pós-Operatório
de Pacientes Submetidos à Cirurgia para
Correção de Aneurisma de Aorta
Abdominal: Incidência, Fatores de
Risco e Medidas Protetoras
Postoperative Renal Failure in Patients
Undergoing Abdominal Aortic Aneurysm
Repair: Incidence, Risk Factors and Protective
Therapies
Domingos Dias Cicarelli, Luiz Guilherme Villares
da Costa, Fábio Ely Martins Benseñor, Joaquim
Edson Vieira
Artigo Original
34
Na Contramão da Medicina Baseada em
Evidências: Posição Semi-Recostada em Pacientes
sob Ventilação Mecânica versus Pneumonia
In Opposition to Evidence-Based Medicine:
Semi-Recumbent Position in Patients
Mechanically Ventilated versus Pneumonia
Christian Nejm Roderjan, Paulo Cesar Pereira de
Souza, Marcelo Elysio Lugarinho, Arthur Martinez,
Frederico da Costa Azevedo
Artigo Original
40
Posicionamento do Tubo Orotraqueal
Utilizando-se como Referência os Dentes
Incisivos Centrais Superiores
Placement of Oral Endotracheal Tube Using as
Reference the Superior Central Incisors Teeth
Claudio Piras
Artigo Especial
45
Terapia Intensiva na Graduação Médica: Os Porquês
Justifying Teaching Intensive Care for Medical
Undergraduates
Ana Paula Pierre de Moraes, Gutemberg Fernandes
de Araújo, César Augusto Castro
Artigo de Revisão
49
Uso da Noradrenalina no Choque Séptico
em Pediatria
Norepinephrine Use in Pediatric Septic Shock
Aline Schröter Fuentes, Cristina Malzoni Ferreira
Mângia, Werther Brunow de Carvalho, Marcelo
Cunio Machado Fonseca
Relato de Caso
56
Obliteração Angiográfica da Artéria
Brônquica para Tratamento de Hemoptise
Maciça Secundária à Pneumonia
Estafilocócica Necrotizante
Angiografic Embolization of the Bronchial
Artery in the Treatment of Massive
Hemoptysis Secondary to Necrotizing
Staphylococcal Pneumonia
Sergio R. Penteado Fo.; Nelson Mozachi; Virginia
Helena Soares de Souza, Rodolfo Castro Cesar
de Oliveira; Rogério Luz Coelho Neto Suzana
Boscardin Pereira, Gelson Kupper
Relato de Caso
59
Nó em Cateter na Veia Jugular Interna
Knot in Internal Jugular Vein Catheter
William Wobber Cardoso Barros, Felipe José
Silva Melo Cruz, Renato Duarte Barbosa,
Sabas Carlos Vieira
1
RBTI
REVISTA BRASILEIRA DE
TERAPIA INTENSIVA
CORPO EDITORIAL
Editor Chefe
Gilberto Friedman
Professor de Medicina, Faculdade de
Medicina, Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil.
Conselho Consultivo
Cleovaldo S Pinheiro, Professor
de Medicina, Faculdade de Medicina,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
Porto Alegre, RS, Brasil.
Rachel Moritz, Professor de Medicina,
Faculdade de Medicina, Universidade Federal
de Santa Catarina, Porto Alegre, SC, Brasil.
Werther B. de Carvalho, Professor de
Medicina, Escola Paulista de Medicina,
Universidade Federal de São Paulo, SP, Brasil.
Diretor de Publicações AMIB
José O Auler, Professor de Medicina,
Faculdade de Medicina, Universidade de São
Paulo, SP, Brasil.
Editores de Sessão
Revisão:
Renato G. Terzi, Professor de Medicina,
Faculdade de Medicina, Universidade de
Estadual de Campinas, SP, Brasil.
Pediatria:
Jefferson Piva, Professor de Medicina,
Faculdade de Medicina, Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul
e Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
Porto Alegre, RS, Brasil.
Enfermagem:
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do CTI do Hospital Israelita Albert Einstein,
São Paulo, SP, Brasil.
Fisioterapia:
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Departamento de Fisioterapia do Hospital
Português, Salvador, Bahia, Brasil.
Conselho Editorial
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Faculdade de Medicina, Universidade da
República, Montevidéu, Uruguai.
Álvaro Réa Neto, Professor de
Medicina, Faculdade de Medicina,
Universidade Federal do Paraná, PR, Brasil.
Andre Kalil, Assistant Professor of
Medicine, University of Nebraska, EUA
Anibal Basile-Filho, Professor de
Medicina, Faculdade de Medicina,, Ribeirão
Preto, Universidade de São Paulo, SP, Brasil
Arnaldo Dubin, Professor de Medicina,
Faculdade de Medicina, Universidade de
La Plata, La Plata, Argentina.
Carlos Carvalho, Professor de Medicina,
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São Paulo, SP, Brasil.
Cid Marcus David, Professor de Medicina,
Faculdade de Medicina, Universidade
Federal do Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Daniel Garros, Pediatric Intensive Care
Unit, Stollery Children’s Hospital, University
of Alberta, Edmonton, Canada
Dinis R. Miranda, Professor de Medicina,
Escola de Medicina, Universidade de
Gröningen, Holanda.
Ederlon C. Rezende, Diretor da UTI,
Hospital Público do Servidor Estadual, São
Paulo, SP, Brasil.
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Paulo, São Paulo, SP, Brasil.
Eliézer Silva, Professor de Medicina,
Universidade de Santo Amaro, SP, Brasil.
Felipe Dal Pizzol, Professor de Medicina,
Departamento de Medicina, Laboratório de
Fisiopatologia Experimental, Universidade do
Extremo Sul Catarinense, Criciúma, SC, Brasil.
Francisco J. Hurtado, Professor
de Medicina, Faculdade de
Medicina, Universidade da
República, Montevidéu, Uruguai.
Glenn Poblette Hernandez, Professor de
Medicina, Faculdade de Medicina, Pontifícia
Universidade Católica do Chile, Santiago, Chile.
Hervaldo Sampaio Carvalho, Professor
de Medicina, Universidade de Brasília, Brasil.
Humberto Correa, Professor de Medicina,
Faculdade de Medicina, Universidade da
República, Montevidéu, Uruguai.
Luis F. Poli de Figueiredo, Departamento
de Cardiopneumologia, Instituto do Coração,
Escola de Medicina, Universidade de São
Paulo, Sao Paulo, SP, Brasil.
Márcio Borges Sá, Investigador
Associado, Facultade de Medicina,
Universidade Complutense, Madrid,
Espanha.
Maria Cecília Bueno Jayme Gallani,
Professora de Enfermagem, Faculdade de
Ciências Médicas da Universidade Estadual de
Campinas, Campinas, SP, Brasil.
Maria de Fátima F. Vattimo, Professora
de Enfermagem, Escola de Enfermagem,
Universidade de São Paulo, SP, Brasil.
Natan Weksler, Assistant Professor on
Anesthesiology and Critical Care Medicine,
Faculty of Health Sciences, Ben Gurion
University of the Negev, Beer Sheva, Israel
Patricia M. Veiga de C Mello, Professora de
Medicina, Faculdade de Medicina, Universidade
Estadual do Piauí, Teresina, Piauí, Brasil.
Pedro C. R. Garcia, Professor de
Medicina, Faculdade de Medicina,
Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil.
Roberto Machado, Associate Investigator,
Laboratory of Chemical Biology, Critical Care
Department, Clinical Center, National Institutes
of Health, Bethesda, EUA
Roque Aras Junior, Professor de
Medicina, Faculdade de Medicina,
Universidade Federal da Bahia, Brasil.
Rui Paulo Jinó Moreno, Professor de
Medicina, Universidade Católica Portuguesa,
Lisboa, Portugal.
Sayonara de Fátima Faria Barbosa,
Professora de Enfermagem, Universidade Federal
de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil.
Sebastião Araújo, Professor de
Medicina, Faculdade de Medicina, Universidade
Estadual de Campinas, SP, Brasil.
Silvia Regina Rios Vieira,
Professora de Medicina, Faculdade de
Medicina, Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil.
Suzana Lobo, Professora de Medicina,
Escola de Medicina, FUNFARME,
São José do Rio Preto, São Paulo, Brasil.
Jornalista Responsável
Marcelo Sassine - Mtb 22.869
Diretora de Arte
Anete Salviano
Projeto Gráfico e Produção Editorial
MWS Design
Fone: (11) 3399-3028
www.amws.com.br
A correspondência para publicação deve ser endereçada para:
RBTI - Revista Brasileira de Terapia Intensiva
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2
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
NORMAS PARA PUBLICAÇÃO NESTA REVISTA
O escopo do jornal
RBTI é um jornal médico com revisão crítica que objetiva melhorar o
cuidado dos pacientes agudamente doentes através da discussão, distribuição e
promoção de informação baseada em evidência relevante aos profissionais envolvidos com medicina intensiva. O jornal publica comentários, revisões e pesquisa
em todas estas áreas do conhecimento relacionadas aos cuidados intensivos do
paciente grave.
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cuidado intensivo. Todos os trabalhos submetidos serão revisados. Todos os revisores são solicitados a responderem sua decisão inicial em 4-6 semanas.
Os autores são solicitados a garantir que nenhum material infrinja direito
autoral existente ou direito de uma terceira parte. Os autores que publicam com o
RBTI, retêm o direito autoral de seu trabalho.
Os artigos devem ser em português, espanhol ou inglês.
Instruções para os autores de artigos de pesquisa
A submissão de um artigo de pesquisa relatando pesquisa experimental em
humanos ou animais implica que os autores obtiveram aprovação para a sua pesquisa do comitê de ética apropriado, e estão em concordância com a Declaração de
Helsinki. Uma declaração deste efeito precisa estar incluída na sessão “Pacientes
e Métodos” do seu artigo.
Para todos os artigos que incluem informação ou fotografias clinicas relacionadas a pacientes individuais, um consentimento escrito e assinado de cada
paciente para publicar também precisa ser enviado por correio ou fax ao escritório
da revista. O manuscrito deve incluir uma declaração deste efeito na sessão de
“Agradecimentos” como a seguir: “Consentimento escrito foi obtido do paciente
ou seu parente para publicação do estudo”.
Nomes Genéricos das drogas devem ser usados. Quando nomes comerciais
são usados na pesquisa, estes nomes devem ser incluídos entre parênteses na sessão “Pacientes e Métodos”.
Como eu organizo meu artigo de pesquisa?
Todos os artigos de pesquisa devem incluir as seguintes sessões:
Página Título:
O titulo completo do artigo
Os nomes completos de todo os contribuintes
Todos os títulos/posições dos contribuintes (assistente, diretor, ou residente)
O endereço completo (incluindo telefone, fax e email) do autor para correspondência.
Resumo:
Não ter mais que 250 palavras
Ser estruturado com os mesmos cabeçários usados no texto principal.
Mencionar todas as palavras chaves
Refletir acuradamente todas as sessões do texto principal
Todos os trabalhos deverão ser acompanhados de um Abstract (resumo traduzido), necessariamente em inglês
Palavras chaves: ver sessão abaixo
Introdução - esta sessão deve ser escrita do ponto de vista dos pesquisadores sem conhecimento de especialista na área e deve claramente oferecer – e, se
possível, ilustrar – a base para a pesquisa e seus objetivos. Relatos de pesquisa
clínica devem, sempre que apropriado, incluir um resumo da pesquisa da literatura
para indicar porque o estudo foi necessário e o que o estudo visa contribuir para
o campo. Esta sessão deve terminar com uma breve declaração do que está senso
relatado no artigo.
Pacientes e métodos - deve incluir o desenho do estudo, o cenário, o tipo de
participantes ou materiais envolvidos, a clara descrição das intervenções e comparações, e o tipo de análise usado, incluindo o poder de cálculo se apropriado.
Resultados e discussão - os resultados e discussão podem ser combinadas
em uma sessão única ou apresentados separadamente. Resultados da análise estatística deve incluir, quando apropriado, riscos relativo e absoluto ou reduções de
risco, e intervalos de confiança. A sessão de resultados e discussão pode também
ser quebrada em sub-sessões com leituras curtas e informativas.
Conclusões - deve discorrer claramente as conclusões principais da pesquisa
e fornecer uma clara explicação da sua importância e relevância.
Referências – Nós preferimos que não exceda 30 referências. Para formatar a
referência veja a sessão abaixo’ Como eu formato as referências?’.
Figuras e Tabelas: Estas devem ser mantidas separadas do texto principal do
artigo. Veja abaixo ‘Figuras e tabelas’ para maiores informações.
Agradecimentos: ver sessão abaixo
Instruções para os autores de artigo de revisão
O artigo de revisão é uma descrição compreensiva de certo aspecto de cuidado de saúde relevante ao escopo do jornal. Deve conter não mais que 2000
palavras e 50 referências. Existem três tipos principais de revisões:
Revisões científicas - descrevendo ciência que podem ter impacto clínico
Revisões “bancada a beira do leito” - descrevendo ciência que suportam
situações clínicas
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
Revisões Clínicas - descrevendo puramente situações clínicas
Claramente, estes três tipos de revisões possuem o potencial de se sobrepor,
mas o objetivo de dividir o jornal nesta maneira é ajudar os leitores achar o tipo de
material que estão procurando.
Como eu organizo meu artigo de revisão?
Todos os artigos de revisão devem ser divididos nas seguintes sessões:
Página Título:
O título completo do artigo
Os nomes completos dos contribuintes
Todos os títulos/posições dos contribuintes (como assistente, diretor, ou
residente)
O endereço completo (incluindo telefone, fax e email) do autor correspondente.
Resumo:
Não ter maus que 250 palavras
Ser estruturado como o texto principal.
Mencionar todas as palavras chave
Refletir acuradamente todas as sessões do texto principal
Todos os trabalhos deverão ser acompanhados de um Abstract (resumo traduzido), necessariamente em inglês
Palavras Chave: ver sessão abaixo
Abreviações: ver sessão baixa
Referências: listar o máximo de 50 referências. Para formatar a referência
veja a sessão na página ao lado “Como eu formato as referências?”
Figuras e Tabelas: Estas devem ser mantidas separadas do texto principal do
artigo. Veja abaixo ‘Figuras e tabelas’ para maiores informações.
Deve haver, também, a sessão de métodos que relaciona as fontes de evidência usadas. Se você procurou numa bibliografia eletrônica como Medline, por
favor, liste as palavras usadas para realizar a procura.
Instruções para autores de um comentário?
Comentários são curtos (800-1000 palavras, excluindo o resumo), artigos de
opinião escritos por especialistas e lidos pela comunidade médica em geral. Muitos são solicitados, contudo os não solicitados são bem vindos e são rotineiramente revisados. O objetivo do comentário é destacar algo, expandindo os assuntos
destacados, e sugerir o que deve acontecer em seguida.
Qualquer declaração deve ser acompanhada por uma referência, mas nós preferimos que a lista de referências não exceda 15. Para a leitura, sentenças devem
ser curtas e objetivas. Use subtítulos para quebrar o comentário em sessões.
Por favor, lembre que, apesar de muitos de nossos leitores serem especialistas, eles podem não ser especialistas na sua área e assim você necessitar explicar
toda a terminologia e acrônimos a primeira vez que eles são usados. Por favor,
providencie uma lista alfabética de todas abreviações.
Assim como os comentários gerais também existem os tipos específicos:
Debates clínicos Pro/con
Dois autores convidados discutem suas diferentes opiniões sobre um assunto
clínico especifico. Os assuntos são levantados através de cenários clínicos escritos
pelo editor de sessão.
Cada autor é solicitado a escrever um artigo referenciado de 500-palavras,
descrevendo se eles concordam ou discordam com o cenário clínico (pro ou con).
Os artigos contrários são mostrados aos autores para uma resposta de não mais
que 100 palavras. Os autores sabem quem é seu oponente mas não podem ver o
artigo oposto até terem submetido seu. Não deve haver mais que 10 referências
no artigo de 500-palavras, e 2 referências na resposta de 100-palavras. Nós preferimos referências de estudos randomisados e controlados publicados nos últimos
10 anos.
Comentários de Pesquisas
Nossos artigos de pesquisa são freqüentemente acompanhados por comentários. Os mesmos visam descrever as qualidades e/ou deficiências da pesquisa, e
suas implicações mais amplas. O artigo de pesquisa discutido deve ser a primeira
referência do comentário.
Comentários publicações recentes
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últimos seis meses e os relata na forma de um comentário.
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endereços completos (incluindo telefone, fax e email), e deve indicar o autor
correspondente
Resumo: não deve ter mais que 100 palavras e deve mencionar todas as
palavras-chave (não se aplica a debates pro/con). Todos os trabalhos deverão ser
acompanhados de um Abstract (resumo traduzido), necessariamente em inglês
Palavras-chave: ver sessão abaixo
Abreviações: ver sessão abaixo
Texto Principal: veja ‘O que é um comentário’ para esclarecimento.
Subtítulos: Nós encorajamos o uso de subtítulos no seu texto.
3
NORMAS PARA PUBLICAÇÃO NESTA REVISTA
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jornal. Cartas usualmente não são revisadas, mas, ocasionalmente, nós podemos
convidar respostas as cartas para publicação no mesmo número da revista. Nós
preferimos cartas com menos de 400 palavras e que contenham cinco ou menos
referências (a primeira delas a ser referida deve ser o artigo do RBTI ao qual a
carta se refere). Os autores devem também providenciar seus dados e endereço
completo (incluindo telefone, fax, e email). Todas as cartas são editadas; a versão
editada é enviada para os autores para aprovar antes da publicação.
Palavras chave: ver sessão abaixo
Agradecimentos: ver sessão baixo
Referências
Nós preferimos que a lista de referências não exceda 30. Para formatar a
referência veja a sessão abaixo ‘Como eu formato as referências?’.
Figuras e Tabelas
Estas devem ser mantidas separadas do texto principal do artigo. Veja abaixo
‘Figuras e tabelas’ para maiores informações.
Agradecimentos
Estes devem ser concisos. Os autores devem usar esta sessão se eles gostariam agradecer o financiamento da pesquisa ou outra ajuda de organismos
acadêmicos; ajuda de colegas ou colaboradores podem também ser mencionados.
Os autores devem obter permissão para agradecer a todos mencionados nos agradecimentos.
Interesses conflitantes
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interesses conflitantes em nome de todos os contribuintes. Por favor, mencione
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sobre figuras, por favor, veja a sessão; ‘Figuras e tabelas’.
Se necessário, nós podemos aceitar também disquetes, e CD-ROMs. Por
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e a versão usada.
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número de referências antes do aceite.
Os livros devem ser referidos pelo autor, título, cidade-sede da casa editora,
4
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autor do capítulo, título do capítulo, a palavra In (grifada), dois pontos, nome
dos editores indicando com a abreviação eds., título do livro (grifado), cidade da
editora, nome da editora, nº da edição (a partir da 2ª), volume, ano da publicação,
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três primeiros seguidos de et al.
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pode ser incluído no texto. A obtenção de permissão para citar dados na forma de
comunicações pessoais é de responsabilidade do autor(s), que deve incluir uma
confirmação escrita, que a permissão foi obtida com o manuscrito submetido.
EXEMPLO DE REFERÊNCIAS
Artigo de jornal
Baumann WR, Jung RC, Koss M et al. Incidence and mortality of adult
respiratory distress syndrome: a prospective analysis from a large metropolitan
hospital. Crit Care Med 1986; 14 :1-4.
Artigo de suplemento
Walker LK: Use of extracorporeal membrane oxygenation for preoperative
stabilization of congenital diaphragmatic hernia. Crit Care Med 1993, 21(suppl):
S379-S380.
Livro
Doyle AC: Biological Mysteries Solved, 2nd Ed, London: Science Press, 1991.
Capítulo de livro
Lachmann B, van Daal GJ: Adult respiratory distress syndrome: animal
models. In Pulmonary Surfactant. Edited by Robertson B, van Golde LMG, Batenburg JJ. Amsterdam: Elsevier, 1992:635-663
Resumo publicado
Varvinski AM, Findlay GP: Immediate complications of central venous cannulation in ICU [abstract]. Crit Care 2000, 4(suppl 1):P6.
Artigo In press
Kharitonov SA, Barnes PJ: Clinical aspects of exhaled nitric oxide. Eur
Respir J, in press.
Figuras, Ilustrações, Fotografias e Tabelas
Figuras e tabelas devem iniciar com o título que descreve a figura total. Tabelas não devem incluir linhas verticais. Elas não devem tomar mais espaço que
duas páginas no jornal impresso, incluindo seus títulos e legendas. Elas devem
ser mantidos separadas do texto principal do artigo, contendo suas respectivas
legendas e assinalando sua exata localização no texto. Somente serão aceitas as
ilustrações que permitirem boa reprodução.
Se as fotografias forem enviadas diretamente ao escritório, essas não devem
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papel, mas anexe a identificação com os nomes dos autores e o número da figura.
Os autores são encorajados a submeter figuras em formato eletrônico de alta
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reprodução pode reduzir qualidade da figura, assim providencie a mais alta resolução possível, e lembre que a redução do tamanho da figura irá também reduzir
o tamanho do label.
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TIFF (formato preferido para fotos/imagens; mínimo 300 dpi)
Portable Document Format (PDF)
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PowerPoint
Arquivo de Figura podem ser submetidos por email. Alternativamente, os
arquivos podem ser submetidos em disquete ou CD-ROM.
Unitermos
Não mais que cinco palavras chave devem ser listadas em ordem alfabética.
Por favor, garanta que as palavras chave são achadas na lista do Medical Subject
Headings (MeSH) do Index Medicus. Estas palavras podem ser procuradas no
browser da National Library of Medicine’s MeSH.
Abreviações
Acrônimos e outras abreviações devem ser listadas em ordem alfabética. Por
favor, lembre que apesar dos seus leitores serem médicos, eles podem não ser
especialistas no seu campo específico e assim você precisa explicar a terminologia
e os acrônimos a primeira vez que eles são usados. Por favor, forneça uma lista
alfabética de todas as abreviações usadas.
Políticas de publicação do RBTI
Publicação
Submissão de um artigo ao RBTI implica que todos contribuintes leram e
concordam com seu conteúdo. O artigo não foi ainda publicado em outro jornal e
não deve estar em consideração por nenhum outro jornal.
Direitos autorais
Para artigos de pesquisa (incluindo qualquer material suplementar) e revisão,
o direito autoral é dos autores.
Os direitos de todo material publicado na RBTI pertence ao jornal.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / EDITORIAL
RBTI Indexada é Moeda Forte
Renato G. G. Terzi1
A
Associação de Medicina Intensiva Brasileira conta com mais de quatro mil associados, em sua grande maioria portadora
do Título de Especialista em Medicina Intensiva.
Embora a Medicina Intensiva tenha sido reconhecida, oficialmente, como especialidade, somente há
pouco tempo, os intensivistas brasileiros vem atuando como especialistas há vinte e cinco anos. Neste
período, a AMIB tem procurado oferecer à seus associados, formas de atualização profissional, promovendo Eventos Regionais e Nacionais, organizando
Encontros de Atualização e Reciclagem, promovendo Cursos específicos, como o FCSS, o TENUTI e o
CITIN, entre outros, divulgando novidades pelo seu
Boletim e disponibilizando revisões sob forma de
livros de atualização pela Série Clínicas Brasileiras
de Medicina Intensiva. Recentemente, foi lançado
um curso de Atualização em Medicina Intensiva, o
PROAMI. Trata-se de um sistema de educação à distância, dirigido pelos colegas Cleovaldo S. Pinheiro
e Werther Brunow de Carvalho com o apoio para
a diagramação didática da Editora Panamericana e
que, a julgar pela publicação de seus dois primeiros
fascículos, promete ser uma importante ferramenta
de atualização em Medicina Intensiva.
A Revista Brasileira de Terapia Intensiva é um
outro meio de comunicação da Sociedade e que
permite àqueles intensivistas brasileiros envolvidos
com pesquisa clínica e experimental, veicular os
seus resultados. Por outro lado, muitos intensivistas
brasileiros publicam suas pesquisas em Revistas de
circulação internacional, principalmente àquelas indexadas na MEDLINE.
Uma Revista indexada é moeda forte na contabilização acadêmica, pois é valorizada pela Unidade Universitária, pelos Órgãos financiadores de
Pesquisa, e, principalmente, pela CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior - a entidade que avalia a produção científica e qualifica os programas de Pós-graduação no
Brasil. A CAPES também valoriza um outro sistema
de indexação que centraliza eletronicamente a pro-
dução científica nacional, conhecida como SciELO
(Scientifc Electronic Library Online). Trata-se de
um Projeto de Pesquisa da FAPESP - Fundação de
Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - em
parceria com a BIREME - Centro Latino-Americano
e do Caribe de Informações em Ciência da Saúde
- com o apoio do CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.
No portal da SciELO (http://www.scielo.br) é
possível se ter acesso a coleções de periódicos nacionais como um todo, aos fascículos de cada título
do periódico, assim como aos textos completos dos
artigos. Todos os artigos apresentam um resumo em
inglês, disponível “on line” para pesquisadores de
todo o mundo que tenham acesso à rede mundial de
computadores. É possível acessar no portal da SciELO
uma série de informações sobre as mais de quarenta
Revistas científicas brasileiras indexadas na área da
Saúde. Assim, é possível se obter informações sobre
o número de fascículos e de artigos armazenados, o
número de citações concedidas e recebidas, o fator de
impacto e os dez títulos mais visitados, assim como
dados estatísticos de acesso à biblioteca eletrônica por
intervalo de tempo e por periódico.
Atualmente, a RBTI está indexada no LILACS
mas para efeito de pontuação da CAPES é considerada dentro do Sistema Qualis como um periódico
Qualis Nacional B. Para ser classificada como Periódico Qualis Nacional A, a RBTI deve, necessariamente, estar indexada SciELO. Existem alguns
critérios para incluir novos títulos de periódicos na
coleção SciELO. Os periódicos devem publicar predominantemente contribuições originais resultantes
de pesquisa científica e/ou significativa para a área
específica do periódico. A revisão e a aprovação
das contribuições devem ser aprovadas por pares. A
composição do Conselho Editorial deve ser pública
e integrada por especialistas de origem nacional e
internacional. A periodicidade deve ser, no mínimo
trimestral e o número de artigos publicados por ano
deve ser, no mínimo de sessenta, sendo desejável
um número de 72. Ora, sessenta artigos em quatro
Editor Geral da Série CBMI
Professor de Medicina, Faculdade de Medicina, Universidade de Estadual de Campinas, SP, Brasil
Endereço de email: [email protected]
Recebido: 09 de março - Aceito: 28 de março
1
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
5
RBTI / EDITORIAL
números por ano, correspondem a 15 artigos por número. A RBTI vem publicando muito abaixo deste
requisito mínimo para ser reconhecida pela coleção
SciELO. Isto tem preocupado nossas lideranças que
em 2002 publicaram na RBTI, Editoriais sobre a
matéria. Todos reconhecemos que faltam artigos
para publicação. É um círculo vicioso que não se
romperá espontaneamente exortando os sócios a
enviarem artigos, como apelaram os recentes Editoriais da RBTI. É necessário haver um esforço conjunto do Editor da Revista, do Conselho Editorial,
do diretor de Publicações e da diretoria da AMIB no
sentido de atingirmos os critérios mínimos exigidos
para ingressar na coleção SciELO. Uma vez atingido
este patamar, será de interesse dos próprios autores
enviar artigos para a RBTI, de forma que o Editor
possa ter um excesso de contribuições que permita
um índice de rejeição salutar para a qualidade da
Revista. Este é um dos motivos pelos quais várias
Revistas nacionais na área da Saúde que entraram
recentemente no sistema SciELO tiveram notável
salto de qualidade nas suas publicações.
Todos ficaram surpresos com o grande número
6
de excelentes artigos (cerca de 30) enviados para
concorrerem ao Prêmio BIK no Congresso do Rio
de Janeiro de 2002. Lamentavelmente, os artigos
não foram publicados na RBTI, pois não havia esta
exigência e os trabalhos foram publicados alhures,
imprimindo qualidade a outros periódicos.
O Prêmio José Luiz do Amorim Ratton é um
exemplo do esforço da atual diretoria que, em parceria com a ALTANA, re-edita, em Curitiba, o Prêmio BYK em novo formato. Agora, todo trabalho
enviado e aprovado para concorrer ao prêmio será
automaticamente publicado na RBTI. O atual Editor
da RBTI - Dr. Gilberto Friedman - está firmemente
empenhado em incluir a RBTI no sistema SciELO.
Não terá condições de fazê-lo se não houver uma
vontade política das lideranças e das forças vivas
da AMIB como um projeto institucional prioritário.
Se isto ocorrer, todos sairemos ganhando, a AMIB,
a RBTI, os autores e editores, que terão visibilidade
na rede mundial de computadores, mas principalmente, o associado, que terá acesso á pesquisa de
ponta realizada no Brasil. Enfim, todos poderão se
orgulhar da AMIB e de sua Revista Científica.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / COMENTÁRIO
Anemia e Transfusão de Hemácias
em Pacientes Críticos
Suzana Lobo1
A
anemia é uma condição de ocorrência extremamente comum em pacientes críticos.
Cerca de 95% dos pacientes apresentam
baixos níveis de hemoglobina (Hb) precocemente
após sua admissão na Unidade de Terapia Intensiva
(UTI) 1. A causa da anemia em pacientes críticos é
multifatorial e inclui freqüentes flebotomias, perdas
sangüíneas, diluição secundária à reposição volêmica, hemólise, diminuição da produção de eritropoitina e anormalidades no metabolismo do ferro1,2.
Como conseqüência da anemia, mais de 50% dos
pacientes críticos recebem transfusão de hemácias
(TH) durante a estadia na UTI e esta proporção aumenta para 85% quando o tempo de estadia na UTI
ultrapassa uma semana3,4. Geralmente, pacientes
mais graves, isto é, com maiores valores de escores
APACHE II e SOFA, apresentam um nível basal de
hemoglobina mais baixo e recebem mais TH5.
A anemia pode ser tratada ou tolerada. Estudos
demonstraram que a TH não aumenta o consumo
de oxigênio celular e nem diminui níveis séricos
de lactato de pacientes sépticos, mas pode induzir
diminuição do pH gástrico intramucoso6,7. Pacientes
críticos toleram níveis de Hb tão baixos quanto 7
g/dl8. Em estudos com hemodiluição isovolêmica
demonstrou-se que pacientes podem tolerar níveis
de Hb ainda menores9. Embora efeitos deletérios
da anemia tenham sido demonstrados após cirurgia
cardíaca, infarto do miocárdio e trauma, a transfusão parece ter significativo impacto na sobrevida
de outros pacientes críticos10-12. Hebert e col. foram
os primeiros a demonstrar aumento da mortalidade
em conseqüência de TH e relataram que pacientes
mantidos com níveis de Hb entre 7 e 10 g/dl tiveram
melhor evolução do que aqueles que tiveram uma
estratégia mais liberal e a Hb mantida acima de 10
g/dl13. Na verdade, pacientes com estratégia restritiva receberam metade do número de transfusões
e tiveram uma taxa de mortalidade significativamente diminuída. Esta relação foi particularmente
importante em pacientes mais jovens ou de menor
gravidade.
Nesta revista, Magno e col. relataram os resultados de um estudo de avaliação da prática de TH
em um grupo homogêneo de pacientes submetidos
à cirurgia para ressecção de neoplasia do TGI e
avaliaram suas conseqüências sobre o tempo de
internação e sobrevida. Não-sobreviventes tinham
uma taxa de hemoglobina menor no pré-operatório
e foram mais freqüentemente transfundidos do que
os sobreviventes. Ao final de 60 dias, houve uma
tendência a maior mortalidade no grupo de pacientes transfundidos comparados ao grupo de nãotransfundidos. Pacientes submetidos a transfusão de
hemoderivados são geralmente mais graves e uma
relação causal não pode ser estabelecida devido ao
tamanho da amostra. Contudo, em um recente estudo multicêntrico realizado em 4.892 pacientes de
284 UTI americanas, demonstrou-se que o número
de TH é um fator independente de aumento do tempo de estadia no hospital e de mortalidade. Neste
estudo a hemoglobina basal apresentou correlação
com o número de unidades transfundidas, mas não
foi fator preditor independente de maior tempo de
internação ou de mortalidade5.
Em conjunto os estudos sugerem que a prática de
TH pode ser prejudicial. Pensava-se ser impossível
que resultados de um estudo tão grande e bem conduzido como o de Hebert et al. pudessem ser ignorados. Contudo, parece que a sugestão de uma estratégia mais restritiva na TH não resultou em maiores
alterações nas práticas transfusionais e um nível
gatilho de hemoglobina para transfusão de 7 g/dl é
muito menor do que o nível geralmente encontrado
na prática clínica. Dois grandes estudos realizados
na Europa e nos EUA demonstraram que a média da
Hb utilizada na prática como gatilho para transfusão
é de 8,4 g/dl5,8.
Cerca de 25% dos pacientes cirúrgicos recebem
transfusões o que ocorre em maior proporção do que
em outros tipos de internações14. A decisão do uso
de TH em pacientes de risco durante a cirurgia deve
considerar a função cardiovascular e a magnitude das
perdas sangüíneas apresentadas pelo paciente15. No
1Professora de Medicina, Escola de Medicina, FUNFARME, São José do Rio Preto, São Paulo, Brasil.
Endereço de email: [email protected]
Recebido: 29 de fevereiro 2004 - Aceito: 28 de março 2004
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
7
RBTI / COMENTÁRIO
estudo de Magno et al. com um grupo de pacientes
cirúrgicos de maior risco, 39,8% dos pacientes receberam em média 2,5 unidades de concentrado de hemácias durante a cirurgia, sendo que em 65,3% a decisão
baseou-se em valores de Hb obtidos durante a cirurgia,
tendo como Hb gatilho uma média de 8,1 g/dl.
Embora ainda não completamente elucidado o
motivo de uma pior evolução de pacientes que receberam TH, estudos sugerem que a exposição a
antígenos leucocitários pode desencadear alterações
da resposta imune levando a um aumento do risco
de infecção e de morte16. Em pacientes cirúrgicos
foi demonstrada associação entre TH e infecção nosocomial17-19. Embora a hemoglobina ótima para o
paciente crítico não seja conhecida, a literatura não
apóia TH para pacientes críticos com níveis de Hb
acima de 7 g/dl e sem doença cardíaca. A anemia
deve ser tratada quando os benefícios da transfusão
suplantam os riscos. O uso de eritropoitina como
alternativa a transfusões de células vermelhas na
correção de anemia e hipóxia em pacientes críticos
deve ser avaliado no futuro. Devem ser tomados
cuidados para evitar a hemodiluição secundária à
expansão do volume extracelular. Alguns autores
defendem que níveis pré-determinados de Hb como
gatilho para a transfusão de CH sejam abandonados,
e que seja utilizada a prática orientada por necessidades fisiológicas definidas 20, 21.
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and blunted erythropoietin response as causes of the anemia of critical illness. J Crit Care, 2001;16:36-41.
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Is there a reason? Chest, 1995;108:767-771.
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8
decision aide for blood transfusion. Immunohematology, 1995;11:
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and blood transfusion in the critically ill - current clinical practice
in the United States. Crit Care Med, 2004;32:39-52.
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Effects of dobutamine infusions and packed red blood cell transfusions.
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08. Vincent JL, Baron JF, Reinhart K, et al - Anemia and blood transfusions in the critically ill patients. JAMA, 2002;288:1499-1507.
09. Weiskopf RB, Viele MK, Feiner J, et al - Human cardiovascular and
metabolic response to acute, severe isovolemic anemia. JAMA,
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10. Yu M, Levy MM, Smith P et al - Effect of maximizing oxygen delivery
on morbidity and mortality rates in critically ill patients: a prospective, randomized, controlled study. Crit Care Med, 1993;21:830-838.
11. Wu WC, Rathore SS, Wang Y, et al - Blood transfusion in elderly
patients with acute myocardial infarction. N Engl J Med, 2001;345:
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hematocrit during cardiopulmonary bypass in the adult: should
current practice be changed? J Thorac Cardiovasc Surg, 2003;125:
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controlled clinical trial of transfusion requirements in critical care.
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Critical Care Trials Group. N Engl J Med, 1999;340:409-417.
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critical care units in the United States: patient characteristics and
intensive care unit utilization. Crit Care Med, 1993;21:279-291.
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17. Landers DF, Hill GE, Wong KC, et al – Blood transfusion-induced immunomodulation. Anesth Analg, 1996;82:187-204.
18. Mickler TA, Longnecker DE - The immunosuppressive aspects of
blood transfusion. J Intensive Care Med, 1992;7:176-188.
19. Taylor RW, Manganaro L, O’Brien J et al - Impact of allogenic packed
red blood cell transfusion on nosocomial infection rates in the critically ill patient. Crit Care Med, 2002;30:2249-2254.
20. Paone G, Silverman NA - The paradox of on-bypass transfusion
thresholds in blood conservation. Circulation 1997;96:(Suppl2):II205-208.
21. Ladakis C, Myrianthefs P, Karabinis A, et al - Central venous and
mixed venous oxygen saturation in critically ill patients. Respiration, 2001;68:279-285.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL DESTAQUE
Transfusão Sanguínea Intra-Operatória e Mortalidade
em Pacientes Submetidos à Cirurgia Eletiva para
Retirada de Neoplasia Gastrintestinal
Intraoperative Blood Transfusion and Mortality in Patients Submitted to Elective
Gastrointestinal Neoplasic Ressection Surgery
Luiz André Magno3, Ederlon Rezende1, Murillo Assunção2, Alexandre Marini Isola2, João Manuel da
Silva Jr.4 e Priscila Pereira Nigro5 .
Abstract
Introduction: Most discussion has taken place about red blood cell transfusion restrictive and liberal strategies.
Furthermore, there is no agreement about criteria for transfusion of red blood cell and a slight advantage favors
restrictive strategy. This is justified because there are risks like transmission of viral diseases with immunomodulatory
consequences, mainly a higher incidence of hospital infections and tumor recurrence.
Objective: To evaluate the mortality rate in patients submitted to elective gastrointestinal cancer resections and its
relation to red blood cell transfusion.
Results: One hundred and twenty four consecutive patients submitted to elective gastrointestinal cancer resections were enrolled. Sixty-three patients (50.8%) were female and median age, APACHE II score and LODS were
65.9±11.4 years, 12.7±5.0 and 1.6±1.8, respectively. Twenty-six patients (20.9%) died in the sixty days following
surgery. Forty-nine patients (39.8%) received transfusion of an average of 2.5±1.4 red blood cell packages. 32
(65.3%) of these transfusions were based on hemoglobin levels during surgery (8.1±1.0 mg/dl) and nine patients
(18.3%) received vasoacitves drugs during anesthesia. Between survivors patients, only 26/98 (26.5%) were transfused as opposed to nonsurvivors in whom 14/26 (53.8%) were transfused (RR 0.27, 95% IC from 0.06 to 0.46,
p= 0.01).
Conclusions: In this cohort study of consecutive patients submitted to a gastrointestinal cancer resection it was
noted a higher number of transfusions of red blood cell package in nonsurvivors patients.
Key Words: Blood transfusion; gastrointestinal elective surgery; Critical care.
A
ausência de critérios objetivos e bem definidos para indicar a transfusão de concentrados de hemácias (CH), e nos últimos
anos a discussão quanto à provável vantagem em assumir uma estratégia restritiva na sua prescrição,2-5
vem aumentando o debate sobre quando e como utilizar a transfusão de componentes sangüíneos alogênicos. Além dos conhecidos riscos de sua utilização,
como a transmissão de doenças virais,7 vários estudos recentes tentaram demonstrar as conseqüências
deletérias sobre a resposta imune após transfusão
de hemoderivados,9,1 tais como, maior incidência
de infecções hospitalares8 e recidivas tumorais. Ao
mesmo tempo vários levantamentos demonstraram
ausência do benefício em manter níveis mais elevados de hemoglobina.2-5
Os pacientes submetidos à cirurgias de médio e
grande porte, recebem com freqüência transfusões
de concentrados de hemácias no intra-operatório,
baseadas em julgamentos variáveis, na maioria das
vezes, exclusivamente, orientadas pelo valor de hemoglobina intra-operatória,6 ou a presença de sangramento acima do previsto, ou ainda instabilidade
hemodinâmica. Embora não haja critérios definidos
para a indicação de transfusão no ato operatório,
vários trabalhos demonstraram grande variação na
freqüência e no volume da prescrição de concentrado de hemácias ao longo dos anos, apesar dos
(1) Diretor do Serviço de Terapia intensiva (STI) do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo Francisco Morato de Oliveira – HSPE - FMO
(2) Médico Coordenador diarista do STI do HSPE - FMO
(3) Médico assistente e ex-expecializando em Medicina Intensiva STI do HSPE - FMO
(4) Médico Especializando em Medicina Intensiva no STI do HSPE - FMO
(5) Médica Residente do Serviço de Anestesiologia do HSPE-FMO
*Trabalho realizado no Serviço de Terapia intensiva do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo Francisco Morato de
Oliveira – HSPE – FMO
Trabalho apresentado para obtenção do Título de Especialista em Terapia Intensiva pela Associação Médica Brasileira - AMIB.
Endereço para correspondência: Dr. Luiz André Magno - Rua Édison, 953/33 - Campo Belo - 04618-034 São Paulo, SP - Fone: (11)
5088- 8408 – Cel. (11) 9689-3412 - E-mail: [email protected]
Recebido: 11 de novembro 2003 - Aceito: 06 de abril 2004
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
9
RBTI / ARTIGO ORIGINAL DESTAQUE
dados conflitantes quanto à evolução pós-operatória
destes pacientes associado à quantidade de unidades
recebidas durante a cirurgia.
Entretanto, mesmo com a grande variedade e
quantidade de estudos sobre qual é o valor ideal de
hemoglobina suficiente para manter a oferta de oxigênio tissular adequada e quais as conseqüências da
utilização excessiva dos concentrados de glóbulos,
o tema ainda prossegue.
O presente estudo analisa quais as possíveis
conseqüências da transfusão de concentrados de
hemácias, utilizando-se um grupo homogêneo de
pacientes, submetidos ou não a transfusão, avaliando-se sua evolução pós-operatória.
O objetivo primário foi avaliar a mortalidade em
sessenta dias de pós-operatório, em pacientes submetidos à cirurgia gastrintestinal eletiva para ressecção
de neoplasia maligna, relacionado com a presença
ou não de transfusão de concentrado de hemácias
no período intra-operatório. Os objetivos secundários foram avaliar o tempo de internação hospitalar,
a permanência na UTI e a diferença na presença de
disfunção orgânica nos dois grupos. Mensurar a hemoglobina pré e pós-operatória nestes pacientes e relacionar com a mortalidade em sessenta dias, além de
avaliar a freqüência e a quantidade de concentrados
de hemácias utilizadas durante a cirurgia.
MÉTODO
Estudo observacional, prospectivo de Coorte
contemporâneo, composto por pacientes dentro dos
seguintes critérios: pacientes com idade ≥ 18 anos,
submetidos à cirurgias eletivas para retirada de neoplasia gastrintestinal, com indicação de pós-operatório na UTI definidos pela equipe de cirurgia ou de
anestesia, consentimento do paciente ou responsável assinado. Foram excluídos do estudo pacientes
com fração de ejeção de ventrículo esquerdo < 50%
ao ecocardiograma, que haviam recebido transfusão
de concentrado de hemácias nas últimas quarenta e
oito horas antes da inclusão, e aqueles submetidos à
cirurgias paliativas. Foram considerados pacientes
transfundidos aqueles que receberam transfusão de
concentrado de hemácias durante o ato operatório, e
não transfundidos os que não receberam transfusão.
O estudo foi realizado no Serviço de Terapia Intensiva do Hospital do Servidor Público Estadual,
no período entre 01 de abril de 2002 e 30 de junho
de 2003. No momento da inclusão dos pacientes
no estudo foram coletados os dados demográficos
e amostra de sangue até seis horas antes da inter-
10
venção cirúrgica, para determinação da hemoglobina pré-operatória e durante a primeira hora após
a chegada na UTI para definição da hemoglobina
pós-operatória. Para o cálculo do escore APACHE II
(Acute Physiologic And Chronic Health Evaluation
II) e LODS (Logistic Organ Dysfunction System)
foram considerados os piores resultados obtidos durante as primeiras vinte e quatro horas após admissão na UTI. Durante a anestesia foram registrados o
tempo de duração, a quantidade e o tipo de fluídos
administrados, a quantidade de concentrados de hemácias utilizados e a necessidade do uso de drogas
vasoativas, e quando disponível o valor da hemoglobina obtida durante a cirurgia antes da transfusão
(Hb gatilho). Todos os pacientes foram acompanhados quanto ao tempo de internação hospitalar após
a sua inclusão no estudo, permanência na UTI e
mortalidade em 60 dias.
Durante a análise estatística a semelhança entre
os grupos, de acordo com a gravidade da doença,
foi avaliada utilizando dados demográficos quanto à idade, o sexo e os índices de prognóstico. Os
dados foram expressos como média ± erro padrão.
As variáveis quantitativas contínuas foram avaliadas através de um método não-paramétrico (teste
de Mann-Whitney U), e as variáveis qualitativas
através do teste Exato de Fisher, com intervalo de
confiança baseado na aproximação normal da distribuição bi-nominal. As características dos pacientes
e os resultados, os riscos relativos (RR) e os intervalos de confiança correspondentes (IC) também
foram calculados. Foi considerado estatisticamente
significativo um p < 0,05.
RESULTADOS
Durante os quatorze meses de duração do estudo,
foram incluídos 124 pacientes consecutivos, submetidos à cirurgias eletivas para retirada de neoplasia
gastrintestinal, sendo 63 (50,8%) do sexo feminino,
com média de idade 65,9 ± 11 anos e índice APACHE II 12,7 ± 5 e LODS 1,6 ± 2. Desta amostra 26
(20,9%) pacientes morreram durante o período de
seguimento de 60 dias.
Quarenta e nove pacientes (39,8%) receberam
transfusão de concentrado de hemácias no período
intra-operatório, em média 2.5 ± 1.4 unidades, sendo
que em 32 (65,3%) a decisão foi baseada no valor da
hemoglobina obtida durante a cirurgia (Hb de gatilho),
que foi em média 8,16 ± 1 mg/dl, e em apenas nove
(18,3%) destes pacientes foram usadas drogas vasoativas durante a anestesia. A variação da hemoglobina
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL DESTAQUE
definida pela diferença entre a Hb pós-operatória e
Hb pré-operatória foi de 2,06 ± -0,6. Os pacientes
que tiveram Hb determinada antes da transfusão (Hb
gatilho) tiveram uma duração de cirurgia de 379 ± 132
versus 324 ± 104 minutos nos pacientes que foram
transfundidos sem base em Hb de gatilho (p =NS).
Dentre os pacientes sobreviventes 26/98 (26,5%)
foram transfundidos, versus 14/26 (53,8%) dos não
sobreviventes (RR 0,27, IC 95% 0,06 a 0,46, p =
0,01). A idade foi semelhante entre os dois grupos
(66,6 ± 11,8 e 65,9 ± 10 p = 0,7, respectivamente).
Os sobreviventes apresentaram valor de hemoglobina colhida antes da cirurgia maior que os não sobreviventes (11,4 ± 1,7 e 10,6 ± 1,3 mg/dl, p=0,04).
A duração da anestesia, a quantidade de cristalóides
infundidos e o uso de drogas vasoativas durante a cirurgia não foram diferentes entre os sobreviventes e
não sobreviventes (307 ± 97 e 345±154 min, p=NS;
5,8±2,3 e 6,3±3,5 litros, p=NS; 7,1 e 19,2%, p=NS,
respectivamente, sobreviventes versus não sobreviventes). Após a admissão na UTI o valor da hemoglobina pós-operatória não foi diferente entre os dois
grupos (10,8 ± 1,9 e 10,7 ± 3,6 mg/dl, p=NS). Os
escores prognósticos APACHE II e LODS foram significativamente mais elevados nos não sobreviventes
do que nos sobreviventes (12 ± 4,5 e 15,2 ± 6,6, p =
0,004 e 1,2 ± 1,5 e 3 ± 2,2 p < 0,001). As principais
comparações entre os grupos de sobreviventes e não
sobreviventes estão demonstradas na tabela 1.
Ao final de 60 dias, período de acompanhamneto de
estudo, observou-se 14/49 (28,6%) óbitos no grupo de
pacientes transfundidos versus 12/75 (16,8%) no grupo
de pacientes não transfundidos (RR 0,12; IC 95% -0,01
a 0,28, p=NS), conforme demonstrado na figura 1.
Tabela 1 - Comparação entre Sobreviventes e Não
Sobreviventes
Tabela 2 - Comparação entre Pacientes Transfundidos e
Não Transfundidos
Transfusão CH
Idade (anos)
APACHE II
LODS
Hb pré-operatória
(mg/dl)
Hb pós-operatória
(mg/dl)
Duração anestesia
(min)
Infusão de
cristalóides
Uso de droga
vasoativa
Figura 1 - Curva de Mortalidade, em 60 Dias, de Pacientes
Não Transfundidos e Transfundidos
Comparando-se os pacientes transfundidos com
os não transfundidos não se observa diferenças
quanto à idade, APACHE II, LODS, Hb pré-operatória e pós-operatória (66,5 ± 11,4 e 66,4 ± 11,5;
13,1 ± 5,6 e 12,4 ± 4,6; 1,9 ± 2,2 e 1,3 ± 1,5; 10,9 ±
1,5 e 11,4 ± 1,7 mg/dl; 11,1 ± 1,9 e 10,6 ± 2,6 mg/
dl p=NS). As únicas diferenças observadas entre o
grupo de pacientes transfundidos e não transfundidos, diz respeito à duração da cirurgia e quantidade
de cristalóides infundidos (360 ± 125 e 286 ± 92
minutos; 6,9 ± 3,2 e 5,2 ± 2 litros, respectivamente,
p < 0,001). O tempo de internação no hospital após
inclusão no estudo (15,3 ± 11,6 e 14,5 ± 9,6 dias, p
= 0,6) e na UTI (2,8 ± 3,9 e 2,2 ± 3,3 dias, p = 0,3)
foi igual nos grupos transfundidos e não transfundidos, respectivamente. As principais comparações
entre os pacientes transfundidos e não transfundidos
estão demonstradas na tabela 2.
Sobreviventes
N = 98 (%)
Não
sobreviventes
N = 26 (%)
Valor
de p
Variáveis
Estudadas
Transfundidos
N = 49 (%)
26 (26,5)
66,6 ± 11,8
12,0 ± 4,5
1,2 ± 1,5
11,4 ± 1,7
14 (53,8)
65,9 ± 10,0
15,2 ± 6,0
3,0 ± 2,2
10,6 ± 1,3
0,01
0,7
0,004
< 0,001
0,04
10,8 ± 1,9
10,7 ± 3,6
0,8
307 ± 97
345 ± 154
0,1
5,8 ± 2,3 l
6,3 ± 3,5 l
0,3
7 (7,1)
5 (19,2)
0,1
Idade (anos)
APACHE II
LODS
Hb pré-operatória
(mg/dl)
Hb pós-operatória
(mg/dl)
Duração da
anestesia (min)
Infusão de
cristalóides, l
Uso de droga
vasoativa
Permanência
hospitalar (dias)
Permanência na
UTI (dias)
CH - Concentrado de Hemácias, APACHE II - Acute Physiologic And
Chronic Health Evaluation II, LODS - Logistic Organ Dysfunction
System, Hb - hemoglobina
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
Valor
de p
66,5 ± 11,4
13,1 ± 5,6
1,9 ± 2,2
10,9 ± 1,5
Não
Transfundidos
N = 76 (%)
66,4 ± 11,5
12,4 ± 4,6
1,3 ± 1,5
11,4 ± 1,7
11,1 ± 1,9
10,6 ± 2,6
0,3
360 ± 125
286 ± 92
< 0,001
6,9 ± 3,2 l
5,2 ± 2,0 l
< 0,001
9 (18,3)
3 (3,9)
0,1
15,3 ± 11,6
14,5 ± 9,6
0,6
2,8 ± 3,9
2,2 ± 3,3
0,3
0,9
0,4
0,07
0,06
11
RBTI / ARTIGO ORIGINAL DESTAQUE
DISCUSSÃO
Comparando o grupo sobrevivente com o não
sobrevivente, tem-se a existência de transfusão de
concentrados de hemácias em número de vezes significativamente maior no grupo dos não sobreviventes (p < 0,05), permitindo a correlação de transfusão
de concentrados de hemácias e óbito em sessenta
dias. Nesta amostra a mortalidade maior nos transfundidos (28,6%) em comparação aos pacientes
não transfundidos (15,6%), reproduziu resultados
semelhantes já descritos em outros estudos observacionais publicados. No estudo de Taylor e col.8
baseado no banco de dados do projeto IMPACT a
taxa de mortalidade nos pacientes transfundidos foi
de 24,3% versus 10,2% nos não transfundidos. Na
observação conduzida em UTI européias10 evidenciou-se taxa de mortalidade hospitalar de 29% nos
transfundidos, versus 14,9% nos não transfundidos.
Ainda analisando os pacientes sobreviventes, em
comparação aos não sobreviventes, outros dados
que discriminaram estes dois grupos foram o APACHE II e LODS, respectivamente, índices para
gravidade e disfunção orgânica, dados previstos por
apresentarem valores maiores no grupo dos não sobreviventes, não sendo possível descartar correlação
entre estes resultados e a transfusão de concentrado
de hemácias no intra-operatório. A hemoglobina
pré-operatória também mostrou diferenças significativas, sendo maior no grupo dos sobreviventes.
Partindo para comparação entre os grupos de
transfundidos e não transfundidos, os dados com
diferença significativa na comparação destes grupos
são tempo de cirurgia e infusão de cristalóides. Esses, em uma análise mais cuidadosa, provavelmente
estejam relacionados com o maior tempo de cirurgia, maior infusão de cristalóides e transfusão de
concentrados de hemácias. Os dois primeiros costumam ter relação direta, uma vez que a infusão de
cristalóides é quase contínua no ato anestésico. Avaliando o tempo de cirurgia e transfusão de hemácias,
percebe-se que existe solicitação de Hb intra-operatório (Hb gatilho) nas cirurgias mais prolongadas
em freqüência muito maior, sendo possível que este
resultado desencadeie a decisão da transfusão. Outro dado importante é a semelhança entre a hemoglobina pré e pós-operatória que existe em ambos os
grupos, transfundidos e não transfundidos.
Apesar dos dados conflitantes na literatura,
quanto à atitude mais ou menos restritiva com relação à transfusão de hemácias, estudos recentes
vem demonstrando ausência de benefício em manter
12
valores mais elevados de hemoglobina (acima de 9
mg/dl) 2-5 e a tendência em aumentar a mortalidade
nos pacientes transfundidos, incluindo os pacientes
cirúrgicos. Estes resultados estão de acordo com os
encontrados neste estudo. Existem várias explicações em debate, destacando-se o comprometimento
da resposta imunológica relacionado à transfusão de
hemoderivados.1,8,9
Outro aspecto interessante observado foi que
tanto no grupo transfundido como no não transfundido, a média de hemoglobina pós-operatória
apresentou-se maior que 10 mg/dl. A média de Hb
gatilho apresentou valor 8,16 ± 1,02 mg/dl, e na
chegada a UTI em média o valor da Hb foi 2 ± -0,6
mg/dl maior que o valor no pré-operatório. Talvez
demonstrando a dificuldade que existe em definir no
intra-operatório o momento de transfundir, baseado
em dados, algumas vezes até objetivos, como hemoglobina intra-operatória e a quantidade de sangue a
ser utilizada, tendo como conseqüência pacientes
com Hb maior ao final da cirurgia.
Nos pacientes graves a anemia costuma ser uma
condição de maior risco11; entretanto, nos últimos
anos alguns estudos têm demonstrado convincentes
evidências de que os pacientes podem se adaptar a
baixos níveis de hemoglobina, quando se lança mão
de mecanismos compensatórios, tais como o aumento do débito cardíaco e a extração de oxigênio para
garantir o adequado consumo de oxigênio tecidual12.
A conscientização dos riscos associados às transfusões de hemoderivados em pacientes graves fez surgir alternativas para o tratamento da anemia nestes
pacientes, como a administração de eritropoitina,
conhecida glicoproteína produzida pelos rins que
controla a produção de glóbulos vermelhos pela regulação do crescimento de precursores de eritrócitos
na medula óssea. A administração de eritropoitina
exógena tem sido demonstrada como eficiente em
reduzir a necessidade de transfusão de concentrado
de hemácias nesta população de pacientes.13,14
A maior limitação deste estudo, como em outros,
considerados grandes e multicêntricos estudos observacionais, é a dificuldade em estabelecer a relação de causa e efeito pela falta de estudo aleatório;
entretanto, as evidências sugerindo que a prática de
transfusão de hemoderivados se associa a um maior
risco de morbi-mortalidade têm se acumulado nos
últimos anos.
Em conclusão, ao se decidir por transfusão sangüínea no intra-operatório, o anestesiologista e o
cirurgião devem avaliar todas as questões que estão
relacionadas com este ato. É importante considerar
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL DESTAQUE
que o uso de transfusão de concentrado de hemácias
no intra-operatório está relacionado à maior mortalidade, e que existe a possibilidade de transmissão
de doenças virais. Os resultados encontrados neste
trabalho sugerem uma possível relação entre transfusão de concentrado de hemácias e mortalidade até
o 60º dia de pós-operatório em pacientes submetidos à cirurgias eletivas para retirada de neoplasia
gastrintestinal. Deve-se considerar também que, não
existem definições até o momento de qual o valor
ideal de hemoglobina a ser atingido. As evidências
atuais sugerem ser mais seguro assumir uma atitude
mais restritiva na transfusão de sangue e quando
transfundir fazê-lo de maneira criteriosa, evitando-se quantidades desnecessárias de exposição a
hemoderivados.
Agradecimentos ao amigo especialista em banco de dados Joel Lira Sanches por tudo que fez e
tem feito por nosso serviço.
RESUMO
Introdução: A falta de critérios objetivos e bem
definidos para indicar a transfusão de concentrados
de hemácias (CH) e a recente discussão da provável vantagem em assumir uma estratégia restritiva
na prescrição dos mesmos, aumenta o debate de
como utilizar a transfusão. Aos riscos da utilização
de componentes sanguíneos alogênicos, como a
transmissão de doenças virais, somam-se às conseqüências deletérias imunomoduladas, como maior
incidência de infecções hospitalares e recidivas
tumorais.
Objetivos: Avaliar a mortalidade em sessenta
dias de pós-operatório (PO), em pacientes submetidos à cirurgia gastrintestinal eletiva para ressecção
de neoplasia, correlacionando com a transfusão de
CH no intra-operatório
Material e Método: Estudo observacional, prospectivo, de uma coorte contemporânea. Critérios de
inclusão: idade ≥ 18 anos, cirurgia eletiva para retirada de neoplasia gastrintestinal com indicação de
PO na UTI. Foram excluídos pacientes com fração
de ejeção do ventrículo esquerdo <50%, que tenham
recebido transfusão de CH nas últimas 48 horas
antes da inclusão, e aqueles submetidos a cirurgias
paliativas.
Resultados: Foram incluídos 124 pacientes con-
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
secutivos. Sessenta e três pacientes (50.8%) do sexo
feminino, idade 65.9±11.4 anos, escore APACHE II
12.7±5.0 e LODS 1.6±1.8. Vinte e seis (20.9%) pacientes morreram até sessenta dias de PO. Quarenta
e nove pacientes (39.8%) receberam transfusão de
2.5±1.4 unidades de CH, sendo que em 32 (65.3%) a
decisão foi baseada no valor da hemoglobina durante
a cirurgia (8.1±1.0 mg/dl), e apenas nove (18.3%)
utilizaram de drogas vasoativas durante a anestesia.
Dentre os sobreviventes apenas 26/98 (26.5%) foram
transfundidos contra 14/26 (53.8%) dos não sobreviventes (RR 0.27, 95% IC de 0.06 a 0.46, p= 0,01).
Conclusões: Nesta coorte consecutiva de pacientes submetidos à cirurgia eletiva para retirada de neoplasia gastrintestinal observou-se uma maior taxa
de transfusão de CH nos não sobreviventes.
Unitermos: Transfusão sanguínea; cirurgia gastrintestinal eletiva, terapia intensiva.
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erythropoietin in critically ill patient: a randomized controlled trial.
JAMA, 2002;288:2827-2835.
13
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
A Atitude dos Profissionais de
Saúde Diante da Morte*
The Attitude of Health Professionals Concerning Death
Rachel Duarte Moritz1, Silvia Modesto Nassar2
Abstract
BACKGROUND: The capacity of medical science to prolong life through the use of technology, mainly in ICUs, raises the
question of how far physicians should go in treating the terminally ill patient.
OBJECTIVE To verify the attitude of health professionals concerning death, withholding/withdrawal of the futile treatment.
DESIGN: Prospective and quantitative cohort study with qualitative interviews.
METHODS: A questionnaire was delivered to doctors and nurses. It contained various scenarios depicting end-of-life situations, was answered, and afterwards there was a discussion about the theme. After 30 days, the same questionnaire was
answered again. It consists of questions about death and withholding/withdrawal of futile treatment. The answers were given
by means of adjectival descriptions and continuous responses. For statistic analysis we used Wilcoxon, Mann Whitney tests
being considered significant a p≤0,05, and the multiple correspondence analysis test, as an indicative of ideal qualitative
tendency, a total inertia (TI)≥70%.
RESULTS: The tendency for the 77 professionals who accomplished this study was to refer: to be in anguish over discussions about Death; to consider important to have routine debates about it. The evaluation of the personal kind discussions
concerning to familiar dialogues about the theme, and of the professionals’ wishes concerning their own death and the death
of their relatives and patients signaled that those people had talked with their relatives after the first stage of the study, and
that their attitude concerning Death presented modification (TI=61%). The professional decisions were based on scenario
discussions. Firstly, the decision to begin a treatment considered futile was evaluated. The participants tended to change
their opinion about this topic (TI=68%) and accept withholding/withdrawing treatment more easily (TI=67%). The discussion about the necessity of respecting patients’ wishes led the professionals opt to accomplish the orientations previously
expressed by patients (TI=91%).
CONCLUSIONS: The health professionals tended to consider that the theme Death should be more debated, feel themselves uncomfortable while talking about the death of their patients, and feel it difficult to be accepted. Information and
debates about the theme may lead them to change their conduct.
Key Words: Death, Dying, Withholding/Withdrawal Treatment, Futile/Useless Treatment, Ethics.
A
capacidade da ciência médica de prolongar a vida através do uso da tecnologia,
principalmente nas UTI, tem gerado
questionamentos sobre o quanto o médico deve
manter o tratamento de pacientes terminais. Estudos demonstram que a maioria das mortes nas UTI
ocorrem após a recusa ou suspensão de tratamentos. Muitos profissionais da área da saúde desconhecem essa realidade e, têm dificuldade em aceitá-las 1. Torna-se necessário que as decisões sobre
o estágio terminal da vida sejam debatidas entre
os médicos intensivistas, os médicos assistentes e
toda a equipe multidisciplinar 2,3. Tendo em vista o
relatado propôs-se este trabalho, que tem como objetivo verificar a conduta dos profissionais da área
da saúde, envolvidos diretamente com o tratamento
de pacientes internados no Hospital Universitário
da Universidade Federal de Santa Catarina (HUUFSC), diante da morte, do morrer e da recusa ou
suspensão de um tratamento considerado fútil ou
inútil e, após um debate sobre esse tema, analisar a
eventual mudança dessa conduta.
MÉTODO
O projeto desta pesquisa foi aprovado pela Comissão de Pesquisa em Seres Humanos da UFSC. É
um estudo de coorte contemporâneo, com abordagem quantitativa e qualitativa, com medidas repetitivas pré e pós-intervenção, no qual o indivíduo é o
seu próprio controle.
A população alvo deste estudo abrangeu as
áreas de Medicina, incluindo todos os médicos, e
de enfermagem, incluindo todos os enfermeiros e
técnicos de enfermagem que trabalham com os pacientes internados no HU da UFSC. A amostra foi
selecionada aleatoriamente após estratificação por
categoria profissional.
Médica da UTI/HU/UFSC, Professora do Departamento de Clínica Médica da UFSC
Professora de Engenharia do Departamento de Estatística e Informação da UFSC
Endereço para correspondência: Rua João Paulo 1929 - Saco Grande - 88030-300 Florianópolis, SC - E-mail [email protected]
- Fone: (48) 2385700 ou 99728800
Recebido: 03 de fevereiro 2004 - Aceito: 30 de março 2004
1
2
14
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Participaram da primeira etapa do trabalho 91
profissionais, sendo 41 da área médica e 50 da área
de enfermagem. Oitenta e cinco indivíduos completaram o estudo, sendo que 8 questionários não puderam ser pareados com os resultados da primeira etapa. Portanto, foram computados para os resultados
deste estudo os questionários de 77 profissionais.
O questionário de coleta de dados foi elaborado
pela pesquisadora principal que levou em consideração os conflitos diários, referentes ao tema Morte
e Morrer, pelos quais passam aqueles que tratam de
pacientes graves. Trata-se de um questionário estruturado, cujas respostas foram mensuradas através de
escalas nominais e ordinais4, denominadas Escalas
de Decisão (ED). Todas as respostas foram tabuladas e interpretadas classificando-as em variáveis
quantitativas e qualitativas. Esse questionário foi
previamente validado em uma população semelhante à estudada e, através do mesmo, foram efetuadas
perguntas abrangendo as características demográficas do entrevistado e as suas decisões sobre a morte
(Anexo). Foram também descritos 5 casos clínicos
que serão especificados na seqüência deste trabalho.
Esses casos foram originários de situações reais de
pacientes internados na UTI do HU/UFSC, que geraram conflitos para a equipe multidisciplinar sobre
as decisões referentes à recusa ou à suspensão de
tratamentos.
Num primeiro tempo (T1) foi distribuído o questionário que foi respondido imediatamente. Após a
Anexo - Primeira parte do questionário
distribuído aos participantes do estudo.
resposta do mesmo foram apresentadas considerações
sobre a morte e o morrer e sobre a terapia considerada fútil ou inútil. A seguir foram mostrados os mesmos casos clínicos que constavam do questionário.
Foi então desencadeado um debate e foram efetuadas
perguntas padronizadas referentes a aspectos emocionais que envolviam o tema. Imediatamente após o
debate foram respondidas as perguntas que avaliaram
qual o comportamento do pesquisado diante do tema.
Num segundo tempo (T2) foi fornecido outro questionário, com texto igual ao primeiro, que foi respondido após 30 dias do T1. Foi então avaliado se houve
ou não alteração da conduta daqueles que fizeram
parte do trabalho perante a aceitação da morte.
A análise das variáveis quantitativas foi realizada
através de testes não paramétricos (Wilcoxon e MannWhitney), sendo adotado um nível de significância de
0,05. A Análise de Correspondência Múltipla (ACM)
foi empregada para investigar a existência de associação entre as variáveis categóricas que constavam
nas decisões de cunho pessoal e profissional sendo
considerado um total de inércia (TI) igual ou maior
que 70% como indicativo de uma tendência qualitativa ideal5.
RESULTADOS
Os dados demográficos dos profissionais que
participaram estão apresentados na tabela 1. Quando
questionados se já haviam conversado previamente
com os seus familiares sobre a morte e decisões diante do morrer, as respostas dos profissionais tenderam
à negatividade no T1 e à positividade no T2, tanto na
Tabela 1 - Características Demográficas
dos profissionais estudados.
Características
Demográficas
Sexo
Feminino
Masculino
Idade (anos)
Média
Min/Máx
Desvio Padrão
Experiência em UTI
Trabalha/trabalhou UTI
Nunca trabalhou em UTI
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
Área de Atuação
Medicina
Enfermagem
N %
N %
37 47,4
41 52,6
Total
11 29,7
26 70,2
43 55,8
34 44,2
36,6
23-69
14,75
32 78,0
8 19,5
36,1
20-54
7,95
N %
77 100
36
20-69
11,69
9 24,3
28 75,6
26 63,4
10 24,3
35 45,4
38 49,3
Experiência com pacientes
terminais (PT)
Trabalha/trabalhou c/PT
23 62,1
Nunca trabalhou c/PT
5 13,5
30 73,1
6 14,6
53 68,8
11 14,2
15
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
área médica (p=.03) quanto na área de enfermagem
(p=.001). Quanto ao desejo pessoal de ser reanimado, caso sofresse de uma doença grave aos 85 anos e
apresentasse uma parada cardiorrespiratória (PCR),
os profissionais, de ambas as áreas, responderam
negativamente tanto no T1 quanto no T2, não sendo
esse resultado estatisticamente significante a 0,05
(p=NS). A resposta desses profissionais, quando a
pergunta referia-se ao seu desejo de ser reanimado caso estivesse saudável, aos 85 anos, e sofresse
uma PCR, pode ser constatada na figura 1. Quando
questionados sobre a decisão de iniciar a reanimação
cardiorrespiratória (RCR) em um familiar que tivesse
manifestado previamente esse desejo, os participantes deste estudo responderam negativamente no T1
sendo que no T2 houve uma tendência de essa resposta tornar-se mais negativa, principalmente na área
médica (p<0,05).
Figura 1 - Desejo pessoal de ser ou não reanimado, aos 85
anos, na vigência de uma súbita parada cardiorrespiratória
• NS - não significante a 0,05
O último item questionado, do ponto de vista
pessoal, avaliou como os participantes do estudo
desejariam morrer, se repentinamente ou após uma
doença consuptiva. Na ED, na qual 0 era o valor de
morte súbita e 19 de morte após uma doença grave a
média das respostas dos médicos foi de 1,25 ± 1,98
pontos, e a dos profissionais de enfermagem foi de
1,07 ± 1,64 pontos.
São descritos a seguir os casos clínicos que foram debatidos com os integrantes deste trabalho e as
suas respectivas decisões terapêuticas.
Caso 1: Paciente do sexo feminino, com 16 anos,
apresentava história de estenose de esôfago após
ingestão de soda cáustica aos 4 anos de idade. Foi
internada para correção cirúrgica, por pneumonia de
repetição. Evoluiu no pós-operatório com mediastinite mantendo um quadro séptico sem perspectiva
16
de tratamento cirúrgico e sem melhora com o tratamento clínico. O quadro clinico evoluiu com falência de múltiplos órgãos e a paciente apresentou PCR
no 60º dia de internação. Ao serem questionados se
essa paciente deveria ou não ser reanimada, os profissionais avaliados responderam negativamente no
T1, havendo uma tendência ao aumento da negatividade no T2, maior na área médica (p<0,01) que na
área de enfermagem (p=NS).
Caso 2: Paciente do sexo feminino, com 86 anos,
vivendo com os familiares e apresentando boas
condições de saúde para a sua idade. Havia referido
diversas vezes aos membros de sua família que gostaria de morrer de repente. Apresentou perda súbita
do nível de consciência e PCR. Os participantes do
estudo fizeram duas opções a respeito desse caso.
A primeira se referia ao fato de iniciarem a RCR
caso fossem os familiares da paciente em questão.
Os médicos responderam no T1 de forma negativa,
resposta que tendeu a se tornar mais fortemente negativa no T2 (p= NS). Os funcionários da área de
enfermagem responderam afirmativamente no T1 e
essa resposta se tornou negativa no T2 (p<0,001).
A segunda opção abordava o fato de a RCR ser
iniciada caso o questionado pertencesse à equipe
de saúde. A resposta dos profissionais da saúde foi
afirmativa no T1 com tendência à negatividade no
T2, sendo encontrado um resultado estatisticamente
significante tanto na área médica (p=0,03) quanto
na área de enfermagem (p<0,001).
Caso 3: Paciente do sexo masculino, com 63
anos, apresentando diagnóstico de insuficiência
cardíaca por miocardiopatia isquêmica, com fração
de ejeção de 20%. Foi internado na UTI, em centro
médico sem condições de transplante cardíaco, sem
resposta ao tratamento clínico, dependente de dobutamina e ventilação mecânica por 30 dias. Quando
questionados se, em caso de PCR nesse paciente,
iniciariam as técnicas de reanimação, os médicos
responderam negativamente no T1 e no T2 (p=NS)
enquanto os representantes da área de enfermagem
responderam mais negativamente no T2 que no T1
(p<0,001). A maioria dos profissionais respondeu
afirmativamente quanto à necessidade do diálogo
com o paciente e com seus familiares antes de ser
tomada qualquer opção terapêutica.
Caso 4: Paciente do sexo feminino, diabética,
com 57 anos, foi internada no serviço de Emergência, com o diagnóstico de piodermite. Foi encaminhada à UTI com quadro séptico que evoluiu com
falência de múltiplos órgãos (insuficiência renal
necessitando de métodos dialíticos, insuficiência
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
respiratória necessitando de ventilação mecânica e
insuficiência circulatória dependendo de drogas vasoativas). Uma última opção terapêutica seria uma
desarticulação coxo-femoral. A paciente havia dito
hipoteticamente, antes da doença, durante conversa
com familiares que não aceitaria uma amputação.
Quando questionados se dariam o consentimento
para a desarticulação, caso fossem membros da
família dessa paciente, os representantes da área
médica responderam positivamente no T1 e negativamente no T2 (p<0,001). Os representantes da
área de enfermagem assinalaram negativamente em
ambos os tempos; entretanto no T2 a resposta foi
mais fortemente negativa (p<0,001). Foi também
avaliado se, no caso dessa opção terapêutica não
ser aceita pelos familiares da paciente, deveria ser
mantida a terapêutica plena, considerada fútil ou
inútil. Os profissionais que participaram do estudo
responderam negativamente, com uma tendência a
maior negatividade no T2 (p<0,01).
Caso 5: Paciente do sexo feminino, com 52
anos, foi internada para ser submetida à cirurgia
de gastroplastia por obesidade mórbida. Evoluiu
no pós-operatório com infecção de parede, fístula
enterocutânea, escaras de decúbito e dependência
de ventilação mecânica. Não houve resposta clínica
ao tratamento com antibiótico e drenagem cirúrgica.
Tentado sem êxito, durante a internação, desmame
da ventilação mecânica. Faleceu no 49º dia de internação na UTI. Foi questionado se, em vigência
de piora do quadro clínico que não respondia à
terapêutica instituída, deveria ter sido suspensa a
medicação plena e, se novas opções terapêuticas,
consideradas fúteis para o caso, deveriam ter sido
recusadas. Os profissionais responderam negativamente no T1 e positivamente no T2 (p<0,001). A
decisão dos profissionais analisados sobre a recusa
ou suspensão de tratamentos considerados fúteis ou
inúteis, antes e após o estudo, pode ser constatada
na figura 2.
Figura 2 – Decisão dos profissionais analisados, antes (T1)
e após o estudo (T2), de suspender ou recusar tratamentos
considerados fúteis ou inúteis.
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
Quando foi perguntado sobre a necessidade da
consulta prévia aos familiares de um paciente antes
de que qualquer conduta terapêutica fosse tomada,
ambos os grupos responderam afirmativamente no
T1 com maior tendência a afirmação no T2.
Ao serem avaliadas as respostas do questionário
que mostrou qual o comportamento do pesquisado
diante do tema Morte e Morrer pode ser constatado que os profissionais da área de enfermagem
sentiram-se mais angustiados após o debate do que
os da área médica. Na ED a média da resposta dos
médicos foi de 9,22±5,04 pontos e na dos profissionais de enfermagem foi de 7,37±3,95 pontos, sendo
que o número mais baixo estava associado à maior
angústia. Esse resultado foi estatisticamente significante (p<0,05).
A tendência da opinião dos pesquisados foi a de
considerar que o debate do tema Morte e Morrer
deveria ser realizado com mais freqüência, principalmente no ambiente de trabalho. Houve também
uma tendência à afirmação de que esse debate poderia alterar as convicções desses profissionais sobre
a morte, e conseqüentemente sobre as suas atitudes
diante de um paciente terminal. O grupo pesquisado
considerou também que seria importante o diálogo
com os seus familiares, com os seus pacientes e com
os familiares dos mesmos sobre a morte e o morrer.
Os casos clínicos foram subdivididos, de acordo
com que tipo de decisão deveria ser tomado, para a
avaliação de tendência qualitativa.
Nos casos 1 e 3 a decisão principal baseou-se na recusa de um tratamento (RCR) em pacientes sem perspectiva
terapêutica para a sua doença de base. As representações
gráficas da ACM mostram uma divisão espacial entre os
pontos, principalmente os representados pelos itens 1, 4
e 6 (figura 3), sendo encontrado um TI de 68%. Pode
ser constatada uma maior tendência dos profissionais de
enfermagem debaterem mais com os familiares de pacientes moribundos a respeito do tratamento dos mesmos
e aceitarem melhor a morte de um paciente de 63 anos,
com doença terminal. Na área médica houve uma maior
tendência à aceitação da morte de uma paciente jovem,
sem possibilidades terapêuticas.
Na figura 4 pode ser observada a representação
gráfica da ACM que mostra uma clara divisão espacial entre os pontos que representam a decisão de
iniciar RCR em um paciente, contra a sua prévia vontade (TI=91%). Esse fato mostra que os profissionais
pesquisados constataram a importância de ser respeitada a vontade prévia dos pacientes.
As decisões de suspensão ou recusa de tratamentos
considerados fúteis ou inúteis foram analisadas nos
17
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Figura 3 – Tendência qualitativa das decisões dos profissionais
analisados, antes (T1) e após o estudo (T2), sobre a recusa
da Reanimação Cardiorrespiratória em pacientes sem
perspectivas terapêuticas (casos clínicos 1 e 3).
Figura 4 – Tendência qualitativa da decisão dos
profissionais analisados, de aceitarem a vontade
previamente manifesta de um familiar ou paciente, antes
(T1) e após o estudo (T2) (caso clínico 2).
casos 4 e 5 . Nessa análise foi observada uma divisão
espacial mais clara entre os itens 1, 3 e 7 (figura 5), o
que mostra uma tendência à mudança de opinião, no
que concerne às decisões terapêuticas, mais forte na
área médica (TI=67%).
DISCUSSÃO
O desenvolvimento tecno-científico permitiu a
cura de pacientes considerados anteriormente irrecuperáveis; entretanto, em muitos casos, permitiu
18
Figura 5– Tendência qualitativa da decisão dos
profissionais analisados, antes (T1) e após o estudo (T2),
da recusa ou suspensão de tratamentos considerados
fúteis ou inúteis (casos clínicos 5 e 6).
também o prolongamento do morrer. O profissional
da saúde, treinado para curar e salvar vidas, sente-se
angustiado ao reconhecer que a sua profissão o obriga a conviver com a morte. Essa angústia torna-se
ainda mais evidente nas UTI onde salvam-se muitas
vidas, mas também onde é rotineiro o retardo da
morte. Surge então a necessidade do reconhecimento da futilidade ou inutilidade de certos tratamentos
e da avaliação da recusa ou suspensão dos mesmos.
Aceitando essa realidade os médicos estariam evitando a prática da distanásia.
A morte, considerada um tabu, é um tema pouco
debatido na sociedade moderna. É interessante mencionar que, ao ser explicado aos indivíduos sorteados para participar deste trabalho, qual seria o tema
debatido, muitos se mostravam angustiados diante
da realidade que lhes seria imposta, alguns diziam
se interessar pelo tema, outros referiam temê-lo e
desses, poucos se recusaram a participar do estudo.
Reações semelhantes são encontradas em estudos
brasileiros6.
Pode-se constatar que a maioria dos profissionais
já havia participado de discussões sobre a recusa ou
suspensão de tratamentos, estando mais envolvidos nessas discussões os médicos e enfermeiros.
É importante salientar que a multidisciplinaridade
é primordial para o adequado funcionamento dos
serviços no século atual. Entretanto, não deve ser
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
esquecido que a decisão final e a responsabilidade
legal do tratamento de um paciente são do médico.
A responsabilidade da liderança diante da morte não
pode ser delegada pelos médicos a outros membros
da equipe de saúde, apesar de suas participações,
informações e do seu apoio serem tão necessários
quanto valiosos1.
Os profissionais que participaram deste trabalho referiram que pouco haviam conversado com
os seus familiares sobre a morte e o morrer, fato
que corrobora com a afirmação de que na civilização ocidental moderna ler, falar e ensinar sobre a
morte e o morrer é um tabu7. Entretanto, ao serem
alertados sobre a importância desse debate, nos 30
dias que separaram o primeiro do segundo tempo do
estudo, esses profissionais declararam ter dialogado
com seus familiares sobre o tema em questão. Esse
aumento na comunicação ocorreu de maneira significante na área de enfermagem do que na área médica. Esse fato pode estar associado ao predomínio do
sexo feminino na área de enfermagem, já que as mulheres apresentam uma maior tendência a debater,
no lar, os problemas que lhes afligem no trabalho.
Cabe ressaltar que estudos sobre a morte e o morrer
com os profissionais da saúde mostram que as enfermeiras reconhecem os seus conflitos com mais
facilidade do que os médicos, que o seu comportamento muda mais rápido e que essas profissionais
participam mais dos debates sobre esse tema8.
Quando questionados sobre o desejo de ser ou
não reanimado caso viessem a sofrer aos 85 anos
uma PCR, os integrantes deste estudo mostraram
uma tendência à aceitação da RCR se estivessem
saudáveis e à não-aceitação se sofressem de uma
doença grave. É interessante ressaltar que esses
indivíduos quando questionados sobre como desejariam morrer responderam preferir morte súbita.
Pode-se então questionar essa opção, pois se aos
85 anos sofrermos uma PCR e formos reanimados
perdemos a chance de uma morte súbita. Pode-se
inferir que o ser humano, na realidade, não aceita a
morte, e provavelmente sempre a repelirá, corrobora
com essa afirmação o estudo de Fried e cols9.
Quando foi abordado o dilema de iniciar ou não
uma RCR em um familiar que tivesse manifestado
previamente o desejo contrário à essa conduta, a
maioria dos integrantes deste trabalho optou negativamente. Na área médica essa opção tornou-se mais
fortemente negativa na segunda etapa. Pode-se inferir que para os profissionais médicos, no T1, tenha
prevalecido o sentimento da obrigação profissional
e que, esse sentimento tenha sido sobrepujado no
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
T2 pelo reconhecimento de que o ser humano tem o
direito de tomar as decisões sobre a sua própria vida
e de que os médicos não são os donos dessa vida10.
Constatou-se neste trabalho que a discussão sobre
o tema Morte e Morrer, embora tenha provocado um
sentimento de angústia naqueles que dela participaram, provocou mudanças no seu comportamento,
que podem ser qualificadas como mudanças nas decisões de cunho pessoal e nas de cunho profissional. As
decisões de cunho pessoal, tais como: o debate com
familiares sobre o tema morte e morrer, a vontade
pessoal de ser reanimado na vigência de uma PCR
súbita e a decisão de reanimar um familiar contra a
sua vontade declarada previamente, quando estudadas através da ACM, mostraram que os profissionais
apresentaram uma tendência a mudar de opinião.
Quanto às decisões de âmbito profissional, avaliadas através dos casos clínicos apresentados pela
autora principal pode-se constatar diferentes aspectos. Nos casos 1 e 3 foram relatadas as histórias de
pacientes, um com 16 e outro com 63 anos, que sofriam de doenças sem perspectiva terapêutica. Foi
discutido principalmente o fato do reconhecimento
da irreversibilidade de algumas doenças tanto em
pacientes jovens quanto naqueles com idade mais
avançada e a recusa da RCR nesses pacientes. A
ACM mostrou uma tendência à aceitação da recusa
da RCR tendo como suporte um total de inércia de
68%. Resultados semelhantes foram encontrados
por Melltor e Nillstun11. Neste trabalho, um dos
fatos que pode haver influenciado na decisão da
recusa da RCR foi o conhecimento do sofrimento
ao qual foram submetidos os pacientes e da angústia que abalou a equipe de saúde. É conhecido o
fato de muitos médicos submeterem seus pacientes
criticamente doentes a tratamentos mais extensivos
do que eles próprios escolheriam para si12. É importante relembrar que eutanásia significa abreviar um
sofrimento por intermédio de uma morte induzida e
que a ortotanásia se refere ao alívio do sofrimento e
conseqüentemente ao não prolongamento do morrer.
Portanto, a suspensão de um tratamento considerado
fútil deve ser encarada como ortotanásia e não como
eutanásia13. Ressalta-se que as atitudes médicas são
julgadas pela sua intenção e não pelo seu efeito14.
Plaisier e cols. 15, mostraram que decisões de recusar ou suspender tratamentos são independentes
da idade do paciente. Neste estudo, a análise quantitativa mostrou que os profissionais de enfermagem
tiveram maior aceitação da morte do paciente idoso,
vítima de uma doença clínica do que da morte da jovem de 16 anos, vítima de complicações cirúrgicas.
19
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
A morte de jovens e de crianças é mais difícil de ser
aceita pela sociedade. Mais especificamente para a
mulher, a morte de uma criança faz-lhe pensar na
perda de um filho, que lhe é algo inconcebível.
No caso clínico número 2 o principal fato discutido foi o direito do homem de decidir pelo término
da sua vida bem como o dever dos seus familiares e
dos profissionais envolvidos com o seu tratamento
de respeitarem essa vontade. Nesse caso o estudo
de tendência mostrou um total de inércia de 91%,
podendo-se afirmar que o ser humano respeita a
vontade do próximo. Entretanto, para que haja o
conhecimento da vontade prévia dos nossos familiares e pacientes é essencial que o tema morte seja
amplamente debatido na sociedade16.
Nos casos 4 e 5, os aspectos debatidos foram
o reconhecimento do tratamento fútil ou inútil e o
direito do médico de suspender ou recusar esse tipo
de tratamento. Nesse caso foi também discutida a
importância do diálogo com a família e da aceitação
da vontade prévia dos pacientes, antes da tomada de
decisão sobre a recusa ou suspensão de tratamentos.
A tendência atual é a de que para as decisões sobre o
binômio vida-morte, o paciente seja analisado individualmente, que a sua autonomia seja preservada,
que deva haver debate sobre o fato entre a equipe
multidisciplinar, o paciente e seus familiares e que o
médico não seja obrigado a prescrever um tratamento considerado fútil ou inútil17,18.
É um fato mundialmente constatado que a maioria
das mortes nas UTI ocorre após a recusa ou suspensão de tratamentos considerados fúteis ou inúteis1924
, o que indica a importância da comunicação entre
aqueles que trabalham nessas unidades e os demais
profissionais envolvidos no tratamento dos pacientes no âmbito hospitalar, já que esses profissionais
geralmente não estão familiarizados com esse fato.
Os profissionais que participaram deste trabalho,
ao discutirem a evolução das pacientes descritas
nos casos clínicos 4 e 5, tomaram conhecimento da
futilidade ou da inutilidade de certos tratamentos e
optaram no T2 pela recusa ou pela suspensão dos
mesmos. A análise ACM mostrou um TI de 67%,
que permite inferir haver ocorrido uma mudança de
intenção daqueles que participaram deste estudo.
A tendência da opinião dos participantes deste
trabalho foi a de considerar que o debate do tema
Morte e Morrer deveria ser realizado com mais freqüência, principalmente no ambiente de trabalho, e
que esse debate poderia alterar as suas convicções
sobre a morte, e conseqüentemente sobre as suas
atitudes diante de um paciente terminal. Esses re-
20
sultados podem ser decorrentes do fato de esses
profissionais haverem constatado que a falta de comunicação durante o tratamento de um paciente terminal tanto entre os da equipe que o assiste quanto
entre esses profissionais, o paciente e seus familiares
gera angústias, e essas, sim, podem levar a processos
ético-legais; que a busca da decisão compartilhada e
da mutualidade é a base da relação médico-paciente;
que o direito à verdade e à informação são os requisitos indispensáveis para a licitude do ato médico25-30.
Deve ser destacado como principal fator limitante deste trabalho o fato de os resultados serem
baseados na alteração de conduta dos profissionais
30 dias após o debate sobre o tema morte e morrer.
Um só debate sobre um tema tão complexo pôde levar a um maior conhecimento sobre o mesmo, mas
é difícil afirmar que levará à mudança de atitude e
principalmente à mudança de comportamento individual. Outros fatores limitantes que devem ser
mencionados são: a) o fato de que a predominância
do sexo feminino na área de enfermagem poderia
estar associado às diferenças encontradas entre os
grupos estudados. Essas diferenças não seriam portanto entre os profissionais e sim entre os sexos; b)
o fato de o estudo haver sido efetuado entre profissionais de uma universidade, portanto ligados ao
ensino e diferenciados de outros grupos.
Pode-se concluir diante dos resultados apresentados que os profissionais da saúde sentem-se
angustiados ao falar sobre a morte dos seus pacientes, tem dificuldade de aceitá-la e consideram que
o tema Morte e Morrer deveria ser mais debatido.
As análises estatísticas mostraram uma tendência
dos pesquisados à mudança de opinião e de conduta
no que concerne à Morte, ao Morrer e a Recusa ou
Suspensão de Tratamentos considerados Fúteis ou
Inúteis. Entretanto, esses resultados devem levar a
uma conclusão cautelosa, tendo em vista que o TI
encontrado oscilou de 61% a 91% e que o valor
mencionado como ideal para o TI é ≥ 70%.
Os autores permitem-se sugerir que o tema Morte e Morrer passe a ser debatido rotineiramente nos
ambientes hospitalares e que faça parte da formação
curricular dos profissionais da área da saúde.
RESUMO
BACKGROUND: A capacidade da ciência médica de prolongar a vida através do uso da tecnologia,
principalmente nas UTIs, tem gerado questionamentos
sobre o quanto o médico deve manter o tratamento de
pacientes terminais.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
OBJETIVO: Verificar as atitudes dos profissionais
da saúde no que concerne à morte e à recusa/suspensão
de tratamentos fúteis/inúteis.
DESENHO: Estudo de coorte prospectivo, com
abordagem quanti-qualitativa.
MÉTODO: Foi distribuído um questionário, abordando o tema morte, para médicos e profissionais da
enfermagem. Esse questionário foi respondido antes e
após 30 dias de um debate sobre o tema, quando foram
avaliadas situações de cunho pessoal e profissional. As
respostas foram efetuadas através de escalas adjetivas
com variáveis contínuas. Para a análise estatística foram
utilizados os testes de Wilcoxon, Mann-Whitney, considerando-se significativo p≤0,05, e de análise de correspondência múltipla, considerando-se como indicativo
da tendência qualitativa de associação ideal um total de
inércia (TI) ≥70%.
RESULTADOS: A tendência dos 77 profissionais
avaliados foi a de sentir angústia diante do tema e considerar importante o seu debate. A avaliação dos questionamentos referentes à importância do diálogo familiar
sobre a morte e aos desejos dos profissionais diante da
sua própria morte e da morte dos seus familiares e pacientes, mostrou uma tendência desses indivíduos conversaram mais com os seus familiares e modificarem a
sua atitude diante do tema (TI=61%). As discussões dos
casos clínicos, mostraram uma tendência dos profissionais à mudarem de opinião, no que concerne a decisão
de iniciar (TI=68%), recusar ou suspender (TI=67%)
um tratamento fútil/inútil. A discussão sobre a necessidade de ser respeitada a vontade do paciente levou
esses profissionais a optarem pelo cumprimento dessas
orientações (TI=91%).
CONCLUSÃO: Há uma tendência de os profissionais da saúde sentirem-se angustiados ao falar sobre a
morte, principalmente dos seus pacientes, terem dificuldade em aceitá-la e considerarem que esse tema deveria
ser mais debatido. Esse fato pode levá-los a uma mudança de conduta.
UNITERMOS: Morte, Morrer, Tratamento
Recusado/Suspenso, Terapia Fútil/Inútil, Ética
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21
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Gravidade de Pacientes e Demanda de Trabalho
de Enfermagem em Unidade de Terapia Intensiva:
Análise Evolutiva Segundo o TISS-28
Severity of Illness and Nursing Workload in Intensive Care Unit:
An Analysis using the Therapeutic Intervention Scoring System-28 (TISS-28)
Adriana Janzantte Ducci1, Katia Grillo Padilha2,
Sandra Cristina Ribeiro Telles3, Beatriz Aparecida Ozello Gutierrez4
Abstract
BACKGROUND AND OBJECTIVES: To characterize the severity of illness and nursing workload - in intensive care
unit (ICU) using TISS-28; -to describe the evolution of TISS-28;-to analyze the association among those variables:
severity of illness and origin of patients, length of stay and mortality in ICU.
METHODS: A retrospective study was conducted by collecting data on 77 patients admitted to the ICU over three
months in 2001. The patients were followed up from admission to discharge of the unit. Seventy hundred and eight
measures of TISS-28 were applied in the period.
RESULTS: Most of the patients were male (57.0%) and the mean age was 60 years. Clinical treatment and admissions from intermediate intensive care unit were predominant. The mortality rate was 32.6% and the mean length of
stay was 8 days. The mean TISS-28 score was 25.3 ± 6,8 with variance from 10 to 38 points. Although the number
of patients decreased during the data collecting period, the results demonstrated that the severity of illness and
nursing workload were high.
CONCLUSIONS: There were association among the variables origin of patients (p = 0.013), length of stay (p <
0.001), and discharge from ICU with severity of illness and nursing workload.
Key Words: ICU, TISS-28, severity index; nursing workload
A
principal característica que define um
paciente internado na Unidade de Terapia
Intensiva (UTI) é a gravidade do seu estado
de saúde que exige, conseqüentemente, atendimento
médico e de enfermagem especializados, com demandas diferenciadas de cuidados, quando se comparam
com outras unidades hospitalares.
Se por um lado não há dúvidas que a UTI é unidade destinada ao tratamento de pacientes graves,
porém recuperáveis, por outro, identificar quem é
o paciente que necessita de cuidados intensivos e
avaliar a real gravidade das suas condições apenas
tornou-se exeqüível a partir do desenvolvimento de
sistemas objetivos de medida1 e de métodos prognósticos específicos para sua aplicação em UTI2- 6.
Dentre os vários índices existentes, o Therapeutic
Intervention Scoring System (TISS) encontra-se entre
aqueles que têm se mostrado útil para classificar os
pacientes, não só por indicar a gravidade, como também por medir a demanda de trabalho de enfermagem
na UTI.
O TISS foi desenvolvido como um sistema que
classifica a gravidade do paciente tendo por princípio
que a quantidade de intervenções terapêuticas a que
os pacientes são submetidos relaciona-se à gravidade
do quadro clínico, isto é, quanto mais grave o paciente, maior o número de intervenções terapêuticas
necessárias para o tratamento e, consequentemente,
maior o tempo despendido pela enfermagem para a
sua assistência7.
O TISS, originalmente idealizado em 19742, sofreu adaptações em 19838 e ampla reestruturação em
1996 quando passou a conter 28 itens que resultaram
na versão TISS-289. Nessa versão, após estudo que
incluiu o registro de múltiplos momentos de observações das atividades de enfermagem na UTI, concluiu-
Bolsista do Programa de Iniciação Científica do CNPq. Graduanda de Enfermagem da Escola de Enfermagem da USP
Profª Associado do Departamento de Enfermagem Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem da USP
3
Enfermeira Chefe da UTI do Hospital Universitário da USP. Mestre em Enfermagem
4
Diretora da Divisão de Enfermagem Clínica do Hospital Universitário da USP. Doutora em Enfermagem
Endereço para correspondência: Katia Grillo Padilha - R. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 - Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo - Cerqueira César - 05403-000 São Paulo, SP - Fone comercial (11) 3066-7543 / 3066-7544 - Fone residência:
(11) 3031-5092 - E-mail: [email protected]
Recebido: 19 de novembro 2003 - Aceito: 23 de março 2004
1
2
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RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
se que um ponto TISS-28 eqüivale a um consumo de
10,6 minutos do tempo de um profissional de enfermagem no cuidado direto. Assim sendo, em um plantão de 8 horas, um profissional é capaz de atender um
paciente de, no máximo, 46 pontos TISS-28.
Na realidade brasileira, a literatura aponta estudos
que utiliza o sistema de pontuação nas versões 76 e
28, demonstrando a utilidade desse sistema na classificação da gravidade dos pacientes, tanto isoladamente quanto em análises comparativas com diferentes
índices10-13. Referente, porém, a caracterização evolutiva dos pacientes de UTI com o escore TISS-28
poucos trabalhos foram realizados14.
Considerando que o TISS-28 reúne características
que permitem avaliar a gravidade dos pacientes por
meio das intervenções terapêuticas e, além disso,
subsidiar o dimensionamento da carga de trabalho de
enfermagem na UTI, julgou-se oportuna a sua utilização neste estudo.
Foram estabelecidos os seguintes objetivos: caracterizar os pacientes quanto à gravidade e demanda de
trabalho de enfermagem segundo o TISS-28; descrever a evolução diária da gravidade dos pacientes no
decorrer da internação na UTI; verificar a associação
das variáveis procedência, tempo de permanência e
condições de alta da UTI com a gravidade dos pacientes e demanda de trabalho de enfermagem.
MÉTODO
Trata-se de um estudo descritivo-exploratório,
retrospectivo, longitudinal, desenvolvido na Unidade
de Terapia Intensiva (UTI) de adultos do Hospital
Universitário da Universidade de São Paulo (HUUSP), instituição de nível secundário, que atende
pacientes com diferentes doenças, submetidos à
tratamentos cirúrgico e clínico. A Unidade dispõe
de 11 leitos destinados a pacientes críticos e agudos,
contando com o suporte de uma Unidade de Cuidados
Semi-Intensivos (USI) provida também de 11 leitos.
A amostra foi composta por 77 pacientes com idade igual ou superior a 18 anos, admitidos consecutivamente na UTI nos meses de junho, julho e agosto
de 2001, e que nela permaneceram internados por um
período mínimo de 24 horas. Readmissões foram incluídas no estudo.
Após aprovação do projeto pelo Comitê de Ética
e Pesquisa do Hospital, local do estudo, a coleta de
dados foi feita por meio dos registros contidos nos
prontuários dos pacientes, sendo registrados os escores TISS-28 diários, da internação à alta da UTI.
Para fins de padronização foram consideradas as
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
informações referentes às 24 horas do dia anterior
que se completavam às 8 horas da manhã. Avaliações
realizadas no primeiro e no último dia de permanência na UTI, ou seja, na admissão e alta, foram feitas
independente de terem sido completadas 24 horas.
Sempre que os pacientes permaneciam internados na UTI por um período superior a duas semanas,
isto é, 14 dias, o registro do TISS-28 diário foi feito
do primeiro ao décimo quarto dia e do último dia
de internação, considerado como décimo quinto dia.
Tal critério foi adotado considerando-se o dobro do
tempo médio de internação nessa unidade, estimado
em cerca de sete dias.
Referente ao tratamento dos dados, as informações coletadas foram armazenadas em um banco
eletrônico no programa Excel/Windows. A análise
estatística foi realizada no Programa SPSS versão
10.0. Estatísticas descritivas foram utilizadas para
a caracterização da amostra, enquanto que para o
estudo da associação da gravidade com as variáveis
procedência, tempo de permanência e condição de
alta da UTI foram aplicados testes estatísticos paramétricos.
Para a comparação dos valores com relação às
variáveis procedência, tempo de permanência e mês
de internação, foi realizado o teste de Análise de Variância (ANOVA). Com relação à variável condição
de alta da UTI, isto é, os que sobreviveram e os que
foram a óbito, foi utilizado o teste t Student.
Foram considerados estatisticamente significativos os resultados cujos níveis descritivos (valores
de p) foram inferiores a 0,05.
RESULTADOS
Os resultados deste estudo referem-se aos dados
de 77 pacientes admitidos na UTI de adultos do HUUSP nos meses de junho, julho e agosto de 2001,
dos quais, 10 (12,9%) foram readmitidos 1 vez e
1 (1,2%), duas vezes, o que resultou em 89 admissões. Nesse período, foram registradas 708 medidas
TISS-28.
Os pacientes que compuseram a amostra apresentaram uma média de idade de 60 anos, com uma
variação entre 19 e 92 anos. A maioria dos pacientes
tinha idade acima de 60 anos (53%) e 57% eram do
sexo masculino.
Em relação à existência de doença crônica preexistente verificou-se que 53% dos pacientes eram
portadores de doença do sistema cardiovascular, enquanto que, respectivamente, 15% e 12% possuíam
doenças dos sistemas renal e respiratório.
23
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Quanto à procedência, houve predomínio de admissões da USI (31,5%), seguidas da unidade de
Pronto-Socorro (28,1%). Vinte por cento foram admitidos do Centro Cirúrgico.
Referente ao tipo de internação, a maioria das
admissões (78%) ocorreu por razões clínicas. Das 19
admissões cirúrgicas, 14 (73,6%) foram cirurgias de
urgência.
Quanto ao tempo de permanência na UTI, constatou-se uma média de 8 dias, com variação entre
2 e 52 dias. Em 51,7% das admissões os pacientes
permaneceram na UTI por um período de 1 a 5 dias.
Permanências entre 6 e 10 e maior do que 10 dias foram encontradas em, respectivamente 15,7% e 32,6%
das admissões.
Em relação ao destino após a saída da unidade, em
58,4% das admissões, os pacientes foram transferidos
para a USI. A mortalidade encontrada foi de 32,6%.
Sobre a gravidade dos pacientes, verificou-se média TISS-28 de 25,3 ± 6,8, mínimo de 10 e máximo
de 38 pontos. Na análise por mês, observou-se que,
embora o número de pacientes que foram internados
no mês de julho tenha sido menor (23 pacientes),
quando comparado com os meses de junho e agosto (33 pacientes cada), a pontuação TISS-28 média
foi mais elevada (27,5 ± 6,9) comparativamente aos
meses de junho (25,8 ± 6,7) e agosto (23,2 ± 6,5) A
análise estatística com o teste ANOVA no entanto,
mostrou que não existe diferença estatisticamente
significativa dos valores do TISS-28 com relação ao
mês de admissão (p = 0,069).
A figura 1 mostra a evolução da pontuação média
TISS-28 no decorrer da internação dos pacientes na
UTI. Os dados referentes ao primeiro dia correspondem à média das primeiras horas de internação (13
horas). Da mesma forma, os escores referentes ao
décimo quinto dia correspondem à média das últimas
horas de internação dos pacientes na unidade (11
horas).
O número de pacientes internados no decorrer do
período foi decrescente do primeiro ao décimo quarto dia, constatando-se um decréscimo de 89 para 43
pacientes (48,3%), do primeiro ao oitavo dia, e de
40 para 27 (30,3%), do nono ao décimo quarto dia.
No décimo quinto dia havia um total de 24 (26,9%)
pacientes. Referente à evolução da pontuação média
do TISS-28, verificou-se um aumento gradativo do
primeiro (24,3 pontos) ao quarto dia (27,2 pontos),
com elevação desses valores que oscilaram entre 28,6
e 29,8 pontos, do quinto ao décimo quarto dia. O último dia de permanência dos pacientes que estiveram
internados por mais de 14 dias teve média TISS-28
de 25,2 pontos.
A análise da associação do TISS-28 com relação
à procedência mostrou diferença estatisticamente
significativa (p = 0,013) dos valores do escore entre
pacientes provenientes da USI e PS. Pacientes admitidos do PS apresentaram média TISS-28 menor
(22,6 ± 9), comparativamente àqueles vindos da USI
(28,5 ± 3,5).
Também relacionado ao tempo de permanência,
houve diferença estatisticamente significante (p <
0,001) da média TISS-28 dos pacientes que permaneceram de 1 a 5 dias, ou seja, 22,2 ± 7,6 pontos,
daqueles com permanência maior, entre 6 a 10 dias
(28,5 ± 5,9) e acima de 10 dias (28,7 ± 2,3).
Em relação à condição de alta dos pacientes da
UTI, verificou-se que a média TISS-28 dos pacientes
que foram a óbito (31,1 ± 3,9) foi significativamente
maior (p = 0,039) do que daqueles que sobreviveram
(22,5 ± 6) (Figura 2). Tais diferenças mantiveram-se
estatisticamente significativas também na análise de
cada um dos meses (Figura 3).
Figura 2 - Box Plot Comparativo das Médias TISS-28
Segundo o Destino após a Alta da UTI.
Figura 1 - Distribuição das Médias TISS-28 e Número de
Pacientes do 1º ao 15º Dia na UTI.
24
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Figura 3 - Distribuição Mensal da Média TISS-28 Segundo
a Condição de Alta da UTI.
DISCUSSÃO
O HU-USP, enquanto hospital universitário de
atendimento de nível secundário, dispõe de um total
de 247 leitos ativos, dos quais 26 (10,9%) são destinados à assistência intensiva, adulta e pediátrica,
proporção em conformidade com a recomendada
pela Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) 15. A UTI geral de adultos atende tanto
pacientes clínicos como cirúrgicos, de diferentes
especialidades médicas, com exceção de cirurgias
neurológicas e cardíacas.
A caracterização dos pacientes quanto ao gênero
e a idade mostra que a maioria dos pacientes é do
sexo masculino (57%) e idosa, com idade acima de
60 anos (53%), dados compatíveis aos de estudos
nacionais e internacionais16-20. No município de São
Paulo, trabalho que caracterizou pacientes de UTI
por meio de amostra estratificada por regiões, constatou que 59,3% dos pacientes tinham mais que 60
anos 13 Também uma análise do perfil de pacientes
internados em UTI de um hospital universitário,
constatou alto percentual de pacientes idosos21.
Tais achados vem confirmar que a longevidade e
presença de doenças previamente existentes acabam por desencadear agravos à saúde que exigem
tratamento em UTI. Neste estudo 53% dos pacientes
apresentavam doenças do sistema cardiovascular e a
maioria das admissões (78%) ocorreu por problemas
clínicos.
O fato de os pacientes em maior proporção serem procedentes da USI se justifica, em razão dessa
unidade ter sido criada para atender pacientes que
não necessitam de assistência de alta complexidade,
porém, apresentam alta dependência de cuidados e
necessitam monitorização e controles freqüentes.
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
Por serem ainda instáveis e susceptíveis a mudanças
súbitas do quadro clínico, a maior procedência dos
pacientes dessa unidade para a UTI era esperada.
Notou-se, porém, que o PS foi a segunda unidade
de procedência dos pacientes, o que parece indicar
que, por atender pacientes de uma região de baixo
poder aquisitivo, ela acaba sendo a porta de entrada
de pacientes idosos, com condições de saúde precárias, que apresentam descompensação aguda e são
encaminhados para a UTI.
Na literatura, a USI tem sido pouco citada como
sendo a unidade de procedência dos pacientes para
a UTI, talvez por ser pouco comum no nosso meio,
apesar da sua importância22. Procedências do CC,
PS e UI são mais freqüentemente encontradas13,16-19.
A média de 8 dias de internação observada é
compatível com estudo realizado em UTI brasileiras, em que se encontrou permanência de 9,4 dias23.
No entanto, essa média está acima da verificada no
primeiro Censo Brasileiro de UTI, realizado pela
AMIB, onde o tempo médio de permanência variou
entre 3 e 6 dias, com predomínio de uma média entre 3 e 4 dias15.
Quanto ao destino de alta da UTI, a USI foi a unidade que recebeu a maioria dos pacientes (58,4%),
provavelmente pelas razões já descritas, diferindo
de outros estudos nacionais que constataram que a
maioria dos pacientes foi para unidades de internação 13,14. Em estudo realizado em duas UTI brasileiras, apenas 12,6% dos pacientes receberam alta para
a USI, sendo que esta esteve presente apenas nas
instituições particulares19.
A taxa de mortalidade de 32,6%, embora compatível com a verificada em estudos realizados no
Brasil 13,21,24, situa-se acima da observada em estudos estrangeiros (8% e 19%)25,26. Na Europa, índices
elevados de mortalidade, entre 40% e 65%, foram
encontrados em UTI que atendem pacientes oncológicos27,28.
Frente à elevada mortalidade encontrada nesta
amostra, faz-se necessário considerar que as próprias características dos pacientes atendidos neste
hospital, que apresentam condições prévias de
saúde precárias, contribuem para maior gravidade,
menor resposta ao tratamento e, consequentemente,
maior mortalidade. Além disso, outro fator que pode
ter influenciado em tais resultados foi a exclusão
dos pacientes internados por tempo menor do que
24 horas na UTI.
Em relação à gravidade do paciente e demanda
de trabalho de enfermagem aferida pelo TISS-28,
o escore médio obtido (25,3), esteve próximo aos
25
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
encontrados em estudos nacionais20,29 e internacionais9,25. Apesar disso, pontuações menores, de cerca
de 20 pontos13,14 e maiores, acima de 30, foram também observadas em estudos com diferentes amostras de pacientes26,28, demonstrando variação dos escores, dependendo da população e UTI analisadas.
Considerando-se neste estudo que a média TISS28 dos pacientes que foram a óbito foi significativamente maior (p = 0,039), com relação aos que
sobreviveram (31,1 e 22,5 pontos), respectivamente, a média TISS-28 do conjunto da amostra (25,3
pontos) aponta para gravidade moderada das condições clínicas dos pacientes. Assim como no presente
estudo, pontuações médias mais elevadas entre os
que não sobreviveram foram também verificadas
em trabalhos nacionais13,14 e internacionais16,17,25,
referendando a premissa de que pacientes mais graves, são submetidos a maior número de intervenções
terapêuticas e exigem maior tempo de trabalho de
enfermagem. Ressalta-se que não houve diferença
estatisticamente significativa entre as médias TISS28 nos diferentes meses do estudo (p = 0,069).
Com relação à carga de trabalho de enfermagem,
considerando-se que cada ponto TISS-28 corresponde a 10,6 minutos do trabalho de um profissional,
em um plantão de 6 horas, cada integrante da equipe
teria condições de cuidar de um paciente com, no
máximo, 34 pontos. Segundo essa referência, teoricamente, na UTI estudada, a relação numérica
profissional-paciente seria de um profissional para
um paciente (1:1), com tempo excedente para participar do cuidado de outro paciente, até o alcance de
34 pontos. A relação 1:2, segundo recomendações
oficiais30 não seria recomendável, podendo comprometer a qualidade da assistência.
Quanto à evolução dos pacientes no decorrer
da internação na UTI, à exceção do primeiro dia,
cuja média TISS-28 foi de 24,3 pontos, os escores
mantiveram-se elevados, entre 28 e 29, o que parece
indicar que investimentos continuaram a ser feitos
no tratamento dos pacientes que devem ter recebido
intervenções adicionais, possivelmente, em razão da
piora das condições clínicas.
Quanto à associação das variáveis gravidade e
procedência, pacientes provenientes da USI foram
mais graves comparativamente aos procedentes do
CC (p = 0,013), corroborando comentários já feitos.
Com relação à gravidade e tempo de permanência
na UTI, conforme esperado, pacientes que permaneceram na unidade por períodos maiores do que seis
dias, eram significativamente mais graves do que os
que nela ficaram por até cinco dias (p < 0,001).
26
Esse resultado encontra respaldo em estudo
prospectivo que analisou a evolução da gravidade
de pacientes internados em uma UTI geral, no período de dois meses, onde também se verificou uma
elevação progressiva da pontuação média TISS-28
com o aumento do tempo de permanência na UTI 14,
embora não tão acentuado quanto ao encontrado
neste estudo.
A caracterização dos pacientes críticos e análise
da gravidade das condições clínicas e da demanda
de trabalho de enfermagem com a aplicação de um
instrumento de medida como o TISS-28, constitui
fonte de importantes informações quando se pretende melhorar a qualidade do cuidado, otimizar
recursos e diminuir custos da assistência intensiva
em UTI.
Apesar da contribuição que os resultados podem
trazer enquanto subsídios para a adequação dos recursos materiais e humanos de enfermagem na UTI,
algumas limitações merecem comentários.
Não obstante o TISS-28 seja um instrumento
desenvolvido para avaliar a gravidade dos pacientes
críticos, com esse propósito específico, encontra-se
suplantado pelos instrumentos de base fisiológica, mais fidedignos para mensurar a gravidade e
predizer mortalidade. Mais adequado para aferir a
demanda de trabalho de enfermagem na UTI, apesar
das modificações já ocorridas no sentido de melhor
ajustá-lo para esse propósito, algumas lacunas o tornam ainda sujeitos a críticas, em razão de não contemplar na sua estrutura, atividades de enfermagem
que exigem tempo expressivo dos profissionais.
Pode-se apontar entre elas, as atividades de higiene
e posicionamento dos pacientes, de atendimento à
família, de preenchimento de protocolos, de gerenciamento da unidade, fundamentais quando se busca
aferir a carga de trabalho de enfermagem na UTI.
Limitações para além do instrumento utilizado,
recaem também na amostra do estudo e período utilizado para a análise da demanda de trabalho na UTI
que precisariam ser ampliados para resultados mais
representativos. Apesar das limitações, a utilização
de um instrumento de medida objetivo, conhecido
internacionalmente, traduzido e validado para uso
na realidade brasileira29, e que traz subsídios para
a adequação de recursos na UTI, justificam investimentos em outros estudos dessa natureza.
RESUMO
JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: Caracterizar
a gravidade dos pacientes e a carga de trabalho de
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
enfermagem na UTI, segundo o Therapeutic Intervention Scoring System –28 (TISS-28); descrever a
evolução dos pacientes no decorrer da internação na
UTI; verificar a associação das variáveis procedência, tempo de permanência e condições de alta da
UTI com a gravidade segundo o TISS-28.
MÉTODO: A casuística incluiu 89 admissões
consecutivas na UTI geral do Hospital Universitário
da Universidade de São Paulo, no período de três
meses no ano de 2001. O TISS-28 foi aplicado diariamente da internação à alta da UTI, com os dados
do prontuário.
RESULTADOS: A maioria dos pacientes era
do sexo masculino (57%) e a média de idade foi de
60 anos. O mais freqüente tipo de tratamento foi o
clínico (78%), com predomínio de pacientes provenientes da unidade de Cuidados Semi-Intensiva
(USI) e Pronto Socorro (PS). A mortalidade na UTI
foi de 32,6% e a média de permanência de 8 dias. A
média TISS-28 foi 25,3 ± 6,8, mínimo de 10 e máximo de 38 pontos. Apesar da diminuição do número
de pacientes no decorrer dos quatorze dias analisados, a média TISS-28 permaneceu elevada.
CONCLUSÕES: Pacientes provenientes da USI
eram mais graves comparativamente aos do PS (p =
0,013). Também os pacientes que permaneceram internados por mais de seis dias na UTI apresentaram
maior escore TISS-28 (p < 0,001). Escores médios
do TISS-28 foram significativamente maiores entre
os pacientes que foram a óbito (p = 0,039).
Unitermos: UTI; TISS-28; Índice de Gravidade;
Enfermagem
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27
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Insuficiência Renal no Pós-Operatório
de Pacientes Submetidos à Cirurgia para
Correção de Aneurisma de Aorta Abdominal:
Incidência, Fatores de Risco e Medidas Protetoras
Postoperative Renal Failure in Patients Undergoing Abdominal Aortic Aneurysm
Repair: Incidence, Risk Factors and Protective Therapies
Domingos Dias Cicarelli1, Luiz Guilherme Villares da Costa2,
Fábio Ely Martins Benseñor3, Joaquim Edson Vieira4
Abstract
BACKGROUND AND OBJECTIVES: Patients undergoing abdominal aortic aneurysm repair are at high risk for acute
renal failure (ARF). Prevention of postoperative renal failure is the final objective of critical care management of
these patients, because of the high mortality of patients that required dialysis, identify the ARF incidence in patients
undergoing abdominal aortic aneurysm repair, variables associated with ARF and efficacy of protective therapies.
DESIGN: retrospective investigation.
SETTING: Surgical Support Unit (postoperative ICU) of Clínicas Hospital of São Paulo University.
METHODS: We retrospectively analyzed 126 patients undergoing abdominal aortic aneurysm repair, comorbidities
and preoperative use of medications. We analyzed preoperative and postoperative serum creatinine and creatinine
clearance, duration and level of aortic cross-clamping, use of diuretics during anaesthesia and intraoperative utilization of mannitol and hydroxyethil starch and their relation with the incidence of post-operative ARF. ARF was
diagnosed with an increase of creatinine more than 30% or >2 mg/dl, or clearance decrease by 50%.
RESULTS: From the 126 patients included in the study, 16 patients (12.7%) developed ARF in postoperative period
and postoperative death occurred in 10 of these patients (8%). From the 16 patients with ARF, 6 patients (4.7%)
required dialysis on ICU and all have been died. Duration of aortic cross-clamping was different between the groups
and less than 60 minutes in group I.
CONCLUSIONS: We conclude that acute renal failure incidence results directly from duration and level of aortic
cross clamping. No benefit of utilization of calcium channel antagonists, angiotensin converting enzyme inhibitor,
diuretics or intraoperative use of mannitol and hydroxyethyl starch was observed.
Key Words: complications: acute renal failure; surgery: aortic aneurysm.
A
s cirurgias de aorta infra-renal estão associadas com uma incidência de 5% de insuficiência renal que necessitam de hemodiálise1.
Esta incidência aumenta quando a cirurgia é de aorta
supra-renal, ficando em torno de 17%1.
A insuficiência renal é uma síndrome cuja principal
característica é a perda aguda da função de filtração renal, resultando em rápido acúmulo de uréia e creatinina
no sangue2. Quando se conceitua a insuficiência renal
aguda (IRA) amplamente, considerando casos com
pequenas elevações de creatinina sérica, ela está presente em 25% dos pacientes internados na UTI3. Vários
estudos retrospectivos demonstraram persistência de
elevada mortalidade nos pacientes com IRA (aproximadamente 50%)3. Outros estudos demonstraram que
pacientes com IRA que necessitaram diálise durante sua
internação apresentaram maior risco de óbito4. Um dos
fatores de agressão responsável pelos casos graves de
IRA é a isquemia renal5-7, tendo como exemplo clássico,
os casos de aneurisma de aorta abdominal com clampeamento supra-renal. Porém, evidenciamos insuficiência
renal também no pós-operatório de pacientes com clampeamento infra-renal. A prevenção do aparecimento de
IRA no pós-operatório destes pacientes torna-se um
dos principais objetivos do intensivista, visto que um
paciente com IRA, principalmente dialítica, tem seu
1Anestesiologista do HCFMUSP, Especialista em Terapia Intensiva/AMIB.
2Residente do 2º ano da Disciplina de Anestesiologia do HCFMUSP.
3Doutor em Anestesiologia da FMUSP, Médico Supervisor da Unidade de Apoio Cirúrgico do HCFMUSP.
4Professor Colaborador da Disciplina de Clínica Geral, Departamento de Clínica Médica, Doutor em Anestesiologia da FMUSP,
Anestesiologista do HCFMUSP.
Unidade de Apoio Cirúrgico da Divisão de Anestesiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo (HC – FMUSP)
Endereço para correspondência: Dr. Domingos Dias Cicarelli - Av. Piassanguaba, 2933/71 - Planalto Paulista - 04060-004 São Paulo,
SP - E-mail: [email protected]
Recebido: 16 de novembro 2003 - Aceito: 11 de março 2004
28
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
prognóstico comprometido8.
Alguns trabalhos utilizam critérios como oligúria
(diurese inferior a 400 ml em 24 horas), hipotensão9
(pressão arterial sistólica inferior a 100 mmHg por mais
de 10 horas com ou sem o uso de vasopressor) e tempo
de ventilação mecânica9 (componentes do Escore Individual de Gravidade de Necrose Tubular Aguda / ATNISS4) para prever a gravidade da IRA no pós-operatório.
Outros autores consideram como principais fatores de
risco para desenvolvimento da IRA a existência de doença renal prévia10,11, uso de inibidores da enzima conversora da angiotensina, diabetes melito e instabilidade
hemodinâmica12.
O objetivo deste estudo foi verificar a incidência de
IRA no pós-operatório de pacientes submetidos à correção de aneurisma da aorta abdominal, sua correlação
com fatores de risco intra e pós-operatórios e identificar
fatores de risco pré-operatórios nesta população.
MÉTODO
Após aprovação pela Comissão de Ética em Pesquisa desta instituição, foram estudados retrospectivamente 126 pacientes submetidos à correção de aneurisma
de aorta, cujos pós-operatórios foram acompanhados
na Unidade de Apoio Cirúrgico do Centro Cirúrgico do
Hospital das Clínicas da FMUSP, no período de dezembro de 1999 a dezembro de 2002.
Foram coletados os seguintes dados dos prontuários
dos pacientes: idade, sexo, peso, APACHE II (Acute
Physiology and Chronic Health Evaluation score), medicamentos em uso (bloqueadores de canal de cálcio,
diuréticos, inibidores da enzima conversora de angiotensina), comorbidades como HAS, diabetes melito, nível de creatinina pré-operatória. Foram anotados ainda
a evolução dos níveis de creatinina no pós-operatório,
tempo e altura do clampeamento, uso de diuréticos durante a anestesia, necessidade de terapêutica transfusional, hipotensão com a utilização de drogas vasoativas e
utilização intra-operatória de manitol e hidroxietilamido (HEA 6% - 200/0.5). Foi calculada a depuração de
creatinina de todos os pacientes no pré e pós-operatório,
através da fórmula de Cockcroft e Gault13.
Os valores normais de creatinina, de acordo com
o laboratório em que as análises foram feitas, variam
entre 0,6 mg/dl (53 µmol/l) e 1,4 mg/dl (124 µmol/l)14 e
a depuração de 90 a 140 ml.min-1, 73m2 ASC14. Foi considerada como disfunção renal no período pós-operatório, os pacientes que apresentassem nível de creatinina
superior a 30%15 (ou >2 mg/dl16) ou diminuição da sua
depuração superior a 50%13.
A associação entre os fatores de risco presentes na
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
população estudada e a insuficiência renal pós-operatória foi analisada através do teste do qui-quadrado com
correção de Yates e o nível de significância considerado
foi p < 0,0517-19.
RESULTADOS
Foram estudados 142 pacientes submetidos à correção de aneurisma de aorta abdominal, com exclusão de
16 pacientes que já apresentavam diagnóstico de insuficiência renal crônica previamente à cirurgia. Destes pacientes excluídos, 50% foram a óbito no pós-operatório.
Dos 126 pacientes estudados, a idade variou entre 48 e
84 anos (67 ± 7), sendo 110 do sexo masculino e 16 do
sexo feminino (87%/13%). A incidência dos fatores de
risco na população estudada encontra-se na tabela 1.
Nenhum dos fatores de risco estudados apresentou
associação estatisticamente significante com a incidência de insuficiência renal pós-operatória.
Dos 126 pacientes incluídos no estudo, 16 pacientes
(12,7%) evoluíram com IR no pós-operatório, sendo
que 10 (8%) foram a óbito, ou seja, dos pacientes que
evoluíram com IR, 63% morreram. Outros 5 pacientes
(4%) foram a óbito por complicações cardíacas, totalizando 15 (12%). Dos 16 pacientes com IR, 6 (4,7%)
necessitaram de diálise na UTI e todos foram a óbito.
A tabela 2 divide os pacientes estudados em dois
Tabela 1 – Incidência de Fatores de Risco
na População Estudada.
Fator de Risco
Número de
Pacientes
Hipertensão arterial sistêmica
91
Tabagismo
58
Insuficiência coronariana
41
Doença pulmonar obstrutiva crônica 24
Diabetes melito
17
Percentagem
72%
46%
33%
19%
13%
Tabela 2 – Dados Demográficos e Comparação entre os
Grupos (Média ± DP)
Idade (anos)
Peso (kg)
APACHE II
Creatinina no pré-operatório (mg/dl)
Creatinina no pós-operatório (mg/dl)
Depuração da creatinina no
pré-operatório
Depuração da creatinina no
pós-operatório
Tempo de clampeamento (min)
Duração da cirurgia (min)
Grupo I
(n = 110)
68 ± 8
70 ± 12
11 ± 3
1,2 ± 0,3
1,2 ± 0,4
64 ± 21
Grupo II
(n = 16)
67 ± 7
71 ± 19
13 ± 3
1,3 ± 0,3
3,3 ± 1,4
54 ± 16
64 ± 22
22 ± 7
59 ± 21
249 ± 75
81 ± 48
352 ± 126
APACHE II: Acute Physiology and Chronic Health Evaluation score
29
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
grupos: grupo I (pacientes que evoluíram sem IRA) e
grupo II (pacientes que evoluíram com IRA) quanto à
idade, peso, APACHE II, creatinina pré e pós-operatória, depuração de creatinina pré e pós-operatório, tempo
de clampeamento e duração da cirurgia.
Não houve diferença estatisticamente significativa
entre os dois grupos com relação à idade, peso, APACHE II, nível de creatinina e sua depuração no préoperatório. Os grupos diferiram em relação ao nível de
creatinina e sua depuração no pós-operatório (definição
de IRA) e pelo tempo de clampeamento inferior a 60
minutos no grupo I (teste t com p = 0,003).
As figuras 1 e 2 ilustram a evolução dos níveis de
creatinina dos dois grupos com relação ao período
pré e pós-operatório, e a evolução da depuração de
creatinina dos dois grupos nesses dois momentos.
No grupo I, observou-se diminuição de aproximadamente 3% na depuração de creatinina no pós-opeFigura 1 - Os grupos diferiram em relação
à dosagem de creatinina pós-operatória
(teste de Mann-Whitney com p < 0,001).
ratório, sendo que no grupo II, a redução média foi
de 59%. Os dois grupos apresentavam, no pré-operatório, depuração diminuída em relação aos valores
normais, evidenciando uma diminuição da reserva
funcional renal.
Não houve diferença significativa entre os grupos
I e II com relação à quantidade de hemoderivados
transfundidos no intra-operatório, nem com relação
ao tempo de hipotensão ou uso de vasopressores.
Dos 126 pacientes, 102 receberam clampeamento
infra-renal com 9 casos de IR (9%) e 24 receberam
clampeamento supra-renal com 7 casos de IR (29%).
Dividiu-se os 126 pacientes em 3 grupos distintos
que faziam uso de medicação única para o controle
da hipertensão arterial sistêmica (HAS), comparando-os com um grupo que não fazia uso de medicação
nenhuma. O grupo BLOQ foi composto de 11 pacientes que faziam uso de bloqueador de canal de cálcio
(nifedipina), grupo DIUR foi composto de 18 pacientes que usavam diurético (clortalidona ou hidroclortiazida), o grupo IECA foi composto de 13 pacientes
que usavam inibidor da enzima conversora da angiotensina (enalapril ou captopril) e o grupo CONTR foi
composto de 50 pacientes que não usavam nenhuma
medicação. Os outros 34 pacientes não incluídos
nestes grupos usavam mais de uma medicação para
controle da HAS. Na tabela 3 observamos os grupos
quanto a incidência de IRA.
Tabela 3 – Divisão dos Pacientes quanto à Medicação
usada no Controle da Hipertensão Arterial Sistêmica e a
Incidência de Insuficiência Renal Aguda (IRA)
Grupos
Figura 2 - Os grupos diferiram em relação à
depuração de creatinina pós-operatório
(teste de Mann-Whitney com p < 0,001).
Total de
pacientes
IRA (%)
Controle Bloqueador Canal
de Cálcio
50
11
6 (12%)
1 (9%)
IECA
Diurético
13
18
2 (15%)
5 (28%)
Não houve diferença estatisticamente significativa entre estes quatro grupos
com relação à incidência de IRA (teste Qui-quadrado com p = 0,570).
Não houve diferença estatisticamente significativa
entre estes quatro grupos com relação à incidência de
IRA (p = 0,570).
Os pacientes analisados também foram divididos
em 4 grupos com relação a utilização intra-operatória
de manitol e HEA. O grupo C constava de 25 pacientes
que receberam somente cristalóides no intra-operatório;
todos os outros grupos receberam cristalóides e o grupo
M constava de 34 pacientes que receberam manitol na
dose de 0,5 a 1 g/kg ; o grupo H foi composto de 24 pacientes que receberam HEA 10 a 15 ml/kg; o grupo M +
H foi composto de 43 pacientes que receberam manitol
30
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Tabela 4 – Divisão dos Pacientes quanto ao
Uso de Cristalóides, Hidroxietilamido (HEA)
e Manitol durante o Período Intra-Operatório
e Incidência de Insuficiência Renal Aguda (IRA)
Grupos
Total de
pacientes
IRA (%)
Cristalóide
25
Manitol
34
HEA
24
Manitol + HEA
43
2 (8%)
5 (15%)
0 (0%)
9 (21)
Não houve diferença estatisticamente significativa entre estes quatro grupos
com relação à incidência de IRA (teste Qui-quadrado com p = 0,142).
(0,5 a 1 g/kg) e HEA (10 a 15 ml/kg). Na tabela 4 observamos os grupos com relação a incidência de IRA.
Não houve diferença estatisticamente significativa entre estes quatro grupos com relação à incidência de IRA (χ2, p = 0,142).
DISCUSSÃO
A incidência de insuficiência renal foi de 12,7%
na população estudada, sendo que dos pacientes que
evoluíram com insuficiência renal, a mortalidade
foi de 63%. Dos 126 pacientes, 5% evoluiu com
IR necessitando de diálise no pós-operatório, dado
compatível com a literatura 1.
A fisiopatologia da lesão renal isquêmica pode
ser explicada da seguinte forma: a isquemia leva a
falência das bombas de sódio/potássio ATPase e cálcio ATPase por redução dos níveis intracelulares de
ATP. Ocorre um acúmulo de água intracelular com
edema celular e um aumento do cálcio intracelular,
que ativa a fosfolipase A2 e as proteases. As proteases transformam a xantina desidrogenase em xantina oxidase que transforma hipoxantina em radicais
livres de oxigênio. Os radicais livres de oxigênio
juntamente com a fosfolipase A2 lesam a membrana
celular, aumentando a liberação de cálcio intracelular, causando alterações no citoesqueleto e lesão
endotelial. As alterações do citoesqueleto levam à
morte celular e conseqüentemente IRA5.
Durante períodos de isquemia, as porções do
néfron que possuem alta taxa de reabsorção tubular,
como túbulo contornado proximal e alça ascendente de Henle, são mais susceptíveis à isquemia por
apresentarem elevado consumo de ATP5. A isquemia
leva ao aumento da concentração de cálcio intracelular, um dos mediadores mais importantes da
vasoconstrição intra-renal20. O aumento do cálcio
livre nas células da musculatura lisa eleva o tônus
vascular e contribui para vasoconstrição que pode
ser revertida ou minimizada pelo uso dos bloqueadores de canal de cálcio5. Esse grupo de fármacos
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
ocupa um importante papel na prevenção e tratamento da IRA isquêmica, tanto no pós-operatório de
risco como nas cirurgias para correção de aneurisma de aorta5,21. Em nosso estudo, não houve menor
incidência de IRA nos pacientes que faziam uso de
bloqueadores de canal de cálcio antes da cirurgia,
não confirmando a proteção renal conferida por esta
classe de fármacos.
A angiotensina II causa aumento da resistência
vascular predominantemente na arteríola eferente,
aumentando a pressão de perfusão glomerular. Os
inibidores da enzima conversora da angiotensina
podem causar IRA por aumentarem a resistência
vascular na arteríola aferente, diminuindo a pressão
hidrostática glomerular e a filtração glomerular22.
Porém alguns autores acreditam na proteção renal
conferida pelos IECA, mesmo que incompleta11,23.
O maior efeito da angiotensina II é um aumento na
resistência vascular renal e na reabsorção de sódio
(diretamente por ação no túbulo e indiretamente por
aumentar a produção de aldosterona). O pré-tratamento com IECA estaria associado com um completo retorno do fluxo sangüíneo renal e da taxa de
filtração glomerular após o desclampeamento1. Em
nosso estudo, não houve maior nem menor incidência de IRA nos pacientes que faziam uso de IECA
antes da cirurgia, não confirmando nem proteção
nem prejuízo com relação ao uso desta classe de
drogas.
A eficácia da dopamina utilizada em dose dopa
é questionada e não recomendada por vários autores que não encontraram diminuição da incidência
da IR com a sua utilização13,23,24. A dopamina seria
responsável por aumentar a síntese de prostaglandinas em situações onde os rins estão submetidos
à capacidade máxima de produção de substâncias
vasodilatadoras. Baixas doses de dopamina reduzem a resistência vascular renal, aumentam o fluxo
sangüíneo renal, aumentam o ritmo de filtração
glomerular, promovem diurese, porém não melhoram a função renal, não diminuindo a necessidade
de diálise destes pacientes, conseqüentemente não
melhorando sua evolução5,13,25,26. Esta classe de fármacos não foi avaliada em nosso estudo por não ser
conduta habitual.
Com relação ao manitol alguns autores não observaram diminuição da incidência de IR com a sua
utilização23-26. Porém, outros autores recomendam o
seu uso atribuindo a ele função de proteção renal27,
principalmente por seu efeito contra os radicais livres de oxigênio que são responsáveis não só por lesões renais como também pulmonares1. Em modelos
31
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
experimentais de IRA, o manitol reduziu o edema
das células endoteliais, funcionando como scavenger de radicais livres11, aumentando o volume urinário, atenuando a obstrução tubular por cilindros,
benefícios controversos na prática clínica5,23. Em
nosso estudo, o uso isolado de manitol ou associado
ao HEA não reduziu a incidência de IRA, não confirmando a proteção renal desta droga.
Alpert e col. em trabalho experimental, conferiram ao uso do manitol a prevenção da elevação de
creatinina em situação de clampeamento de artéria
renal de até 60 minutos 22. Neste estudo, observamos
que, independentemente, do uso de manitol, pacientes com tempo de clampeamento inferior a 60 minutos têm menor incidência de IRA pós-operatória.
Uma diminuição na reabsorção tubular associada
a uma diminuição do consumo renal de oxigênio, seria o principal mecanismo de proteção renal conferido pelos diuréticos em situações de isquemia renal1.
Porém, caso a reposição volêmica nestes pacientes
tenha sido insuficiente, o uso de diuréticos pode ser
mais prejudicial do que benéfico1. Em nosso estudo,
não houve maior nem menor incidência de IRA nos
pacientes que faziam uso de diuréticos antes da cirurgia, não confirmando proteção renal com relação
ao uso desta classe de fármacos.
O HEA tem ocupado o papel de principal colóide
utilizado no período perioperatório. Porém, várias
restrições são feitas ao seu uso, em pacientes com
creatinina elevada. Não foi possível encontrar na
literatura um estudo que defina o nível crítico de
creatinina acima do qual não deva ser usado o HEA.
Nem afirmações sobre a necessidade de evitar o uso
de HEA em pacientes com alteração de função renal
podem ser feitas com base na revisão da literatura12.
A única afirmação consistente é a de que a utilização
de grandes quantidades de colóides (albumina, HEA
ou gelatinas) em pacientes desidratados, pode causar o aparecimento de IRA hiperoncótica. Esta IRA
hiperoncótica é explicada pelo aumento da pressão
coloidosmótica do plasma causada em pacientes desidratados que recebem colóides, diminuindo ainda
mais o ritmo de filtração glomerular e causando
insuficiência renal12. A filtração glomerular de moléculas coloidais hiperoncóticas leva a formação de
urina hiperviscosa, estase do fluxo tubular e obstrução da luz do túbulo11. Em nosso estudo, houve menor incidência de IRA nos pacientes que receberam
HEA, apesar de não haver diferença estatística entre
os grupos, fato explicado pelo pequeno número
de pacientes em cada grupo. Porém, é indiscutível
que a otimização dos parâmetros hemodinâmicos,
32
tornando estes pacientes normovolêmicos por mais
tempo, diminui a incidência de IRA.
Concluindo, verificou-se que a incidência de
IRA no pós-operatório de cirurgias para correção de
aneurisma de aorta abdominal foi influenciada diretamente pelo tempo e altura do clampeamento. Não
houve qualquer benefício do uso de terapias com
bloqueador de canal de cálcio, inibidor de enzima
conversora da angiotensina, diurético ou da utilização de medidas protetoras intra-operatórias como
manitol ou hidroxietilamido.
RESUMO
JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: Muitos pacientes submetidos à cirurgia para correção de aneurisma de aorta cursam no período pós-operatório
com insuficiência renal (IR), que contribui com o
aumento da morbidade e mortalidade desses pacientes. O objetivo deste estudo foi verificar a incidência de IR no pós-operatório de pacientes submetidos
à correção de aneurisma da aorta abdominal, sua
correlação com fatores intra e pós-operatórios.
DESENHO: Investigação retrospectiva.
CENÁRIO: Unidade de Apoio Cirúrgico do
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo.
MÉTODO: Foram analisados retrospectivamente 126 pacientes submetidos à correção de aneurisma de aorta abdominal, suas doenças prévias e as
medicações usadas antes da cirurgia. Foram analisados os níveis de creatinina séricos, a sua depuração
preoperatórias e pós-operatórias, duração e nível do
clampeamento aórtico, uso de diuréticos durante a
anestesia e a utilização intraoperatória de manitol
e hidroxietilamido e suas relação com a incidência
de insuficiência renal no pós-operatório. IR aguda
foi diagnosticada como um aumento de creatinina
maior que 30% ou >2 mg/dl ou uma diminuição na
depuração de 50%.
RESULTADOS: Dos 126 pacientes avaliados,
16 pacientes (12,7%) evoluíram com IR no pós-operatório, sendo que 10 (8%) foram a óbito. Dos 16
pacientes com IR, 6 (4,7%) necessitaram de diálise
na UTI e todos foram a óbito. Os grupos diferiram
em relação ao nível de creatinina e sua depuração
no pós-operatório e pelo tempo de clampeamento
inferior a 60 minutos no grupo I.
CONCLUSÕES: a incidência de IR aguda no
pós-operatório de cirurgias para correção de aneurisma de aorta abdominal foi influenciada diretamente pelo tempo e altura do clampeamento. Não
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
houve qualquer benefício do uso de bloqueador de
canal de cálcio, inibidor de enzima conversora da
angiotensina, diurético ou da utilização de medidas
protetoras intra-operatórias como manitol ou hidroxietilamido.
Unitermos: cirurgia; aneurisma de aorta; complicações: insuficiência renal aguda.
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33
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Na Contramão da Medicina Baseada em
Evidências: Posição Semi-Recostada em Pacientes
sob Ventilação Mecânica versus Pneumonia
In Opposition to Evidence-Based Medicine: Semi-Recumbent Position in Patients
Mechanically Ventilated versus Pneumonia.
Christian Nejm Roderjan1, Paulo Cesar Pereira de Souza2, Marcelo Elysio Lugarinho3,
Arthur Martinez4, Frederico da Costa Azevedo5
Abstract
BACKGROUND AND OBJECTIVES: Ventilator - associated pneumonia (VAP) is associated with high mortality rates,
prolonged hospitalization and increased medical costs. A program for prevention of ventilator-associated pneumonia
should incorporate easily available methods which efficacy and cost-effectiveness have been validated through clinical
studies. The purpose of this study was to evaluate if the recommendation of semirecumbent position in patients on
mechanical ventilation is being used as a prophylactic measure for VAP in the Intensive Care Unit of HCML.
METHODS: During the period of June to December of 2002 an observacional study was accomplished, under an
audit form, which recorded the variation of the trunk position in the patients in mechanical ventilation. Patient on
mechanical ventilation for 48 hours had the trunk position registered twice a day in schedule times. They were followed for a maximum time of five days thereafter. The patient’s position in the bed was registered under the form
of interval of angles (0-15o; 16-30o; 31-45o; and >45o). In this period 37 patients were assessed and they were accomplished in the total 288 annotations of the position in the bed. The ideal semirecumbent position was defined
as the inclination of the trunk in angle larger than 45o in relation to the horizontal plan.
RESULTS: 288 evaluations of the patients’ position in the bed were recorded. We found 5,56% of the evaluations
with angle of inclination of the trunk among 0-15o (N = 16); 48,61% with inclination among 16-30o (N = 140);
43,05% among 31-45o (N = 124); and 2,78% with angle bigger than 45o (N = 8). Inside of the group that developed
VAP we had 112 registrations, among these 1,79% among 0-15o (N = 2); 44,64% among 16-30o (N = 50); 51,78%
among 31-45o (N = 58); and 1,79% above the 45o (N = 2).
CONCLUSIONS: Despite current knowledge of the physiopathologic mechanisms involved and the evidence that
semirecumbency reduces the risk of aspiration and pneumonia, this effective and affordable prevention strategy is
under-utilized in the general practice.
KEY WORDS: evidence, prevention, semirecumbent position, ventilator-associated pneumonia.
A
pneumonia nosocomial é a segunda infecção
hospitalar mais comum nos Estados Unidos
da América, e a maior causa de morte entre as
infecções adquiridas em ambiente hospitalar1. O risco
de pneumonia é cerca de 3 a 21 vezes maior entre os
paciente em ventilação mecânica. A PAVM de início
tardio, que ocorre a partir do quinto dia de intubação
orotraqueal é freqüentemente causada por agentes mais
resistentes (microbiota hospitalar), e possuem as maiores taxas de morbidade e mortalidade1-4. A pneumonia
associada à ventilação mecânica (PAVM) corresponde a
cerca de 50% das infecções em UCI7-10, 14, 26, 27. A morbidade e mortalidade atribuída a PAVM são clinicamente
importantes. A presença de pneumonia associada à ventilação mecânica leva ao aumento de dias em ventilação
mecânica, que prolonga o tempo de internação com
maiores custos no atendimento hospitalar7, 11, 13, 14, 26.
O conhecimento dos fatores de risco para pneumonia nosocomial e o mecanismo de patogênese são
importantes aspectos na profilaxia. A profilaxia da colonização por potentes bactérias, métodos que reduzam
o acesso destes agentes no trato respiratório inferior e
Médico com residência em Clínica Médica pelo Hospital Universitário Clementino Fraga Filho da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (HUCFF – UFRJ), Ex-pós graduando da Unidade de Cuidados Intensivos do Hospital de Clínicas Mário Lioni (UCI-HCML),
Especialista em Terapia Intensiva pela AMIB, Médico da UCI do HCML, Médico da UCI do Hospital São Lucas (HSL), Médico do
Setor de Clínica Médica do HUCFF-UFRJ.
2
Médico Chefe das Unidades de Cuidados Intensivos do HCML e do Hospital de Clínicas de Niterói, Especialista em Terapia Intensiva pela AMIB.
3
Médico rotina das Unidades de Cuidados Intensivos do HCML e do HSL, Especialista em Terapia Intensiva pela AMIB.
4
Médico rotina da Unidade de Cuidados Intensivos do HCML, Especialista em Terapia Intensiva pela AMIB.
5
Ex-pós graduando da Unidade de Cuidados Intensivos do HCML, Especialista em Terapia Intensiva pela AMIB, Médico da UCI
do HSL e do Hospital Copa D’or.
Trabalho Realizado na Unidade de Cuidados Intensivos do Hospital de Clínicas Mário Lioni
Dados para Correspondência: Christian Nejm Roderjan - Av. Boulevard 28 de Setembro 44/sala701 – Vila Isabel - Cep Rio de Janeiro
- RJ - Tel: (21) 2577-7249 - [email protected]
Recebido: 12 de março 2004 - Aceito: 07 de abril 2004
1
34
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
a preservação ou melhora das condições de defesa do
hospedeiro são as pedras fundamentais na prevenção.
A patogênese da PAVM envolve a aspiração de
microorganismos patogênicos em quantidade e virulência suficientes para sobrepor ao sistema imune do
trato respiratório inferior dos pacientes. A fonte destes
microorganismos pode ser exógena (p.ex.: circuitos de
ventilação mecânica, processo de aspiração das vias aéreas, ou dos próprios profissionais de saúde em contato
direto com o paciente), ou endógena. Em vários estudos
a colonização gástrica com microorganismos potencialmente patogênicos tem sido vista preceder a colonização traqueal, e subseqüente PAVM7,12,13,15.
Neste contexto as estratégias de prevenção são divididas em: aquelas que envolvem as vias aéreas, circuitos dos respiradores e manuseio das secreções; e as que
envolvem o trato gastrintestinal, sendo estas o objetivo
de nossa discussão.
A posição supina tem sido identificada como um
importante fator de risco independente associado a
PAVM. Uma abordagem potencialmente efetiva na
prevenção da pneumonia é a modificação dos fatores de
risco conhecidos, e testá-los em ensaios clínicos aleatórios. Cerca de quatro estudos aleatórios compararam a
posição supina com a semi-recostada nos pacientes em
ventilação mecânica6,20-22; e concluiram que a posição
semi-recostada mantida por maior tempo possível tem
mostrado reduzir a incidência de PAVM1,5,7-12,16,17.
Uma vez que o Setor de Terapia Intensiva do Hospital de Clínicas Mario Lioni (HCML) vem passando
por uma transformação visando uma Medicina de alto
desempenho, o objetivo inicial deste estudo é documentar, sob a forma de auditoria, qual a inclinação do tronco
dos pacientes em ventilação mecânica. No período do
estudo não havia recomendação ou política de prática
do uso da posição semi-recostada.
MÉTODO
O estudo foi conduzido no Centro de Terapia Intensiva Adulto do HCML que integra o corpo de hospitais
da Rede ESHO de Saúde. O setor é de caráter privado
com 12 leitos com predomínio de pacientes clínicos
(média de 1 enfermeiro e 1 médico para cada 6 leitos).
O critério de inclusão utilizado foi todo paciente
clínico que necessitasse de ventilação mecânica por um
período maior do que 48 horas sem contra-indicações
formais para a posição semi-recostada (uso de balão de
contra-pulsação aórtica, instabilidade cervical ou pélvica, ou contra-indicação da equipe assistente externa do
setor).
Todo paciente depois de completadas 48 horas de
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
ventilação mecânica passava a ter a posição do tronco
registrada duas vezes ao dia em horários pré-determinados (manhã e tarde coincidindo com a posição dorsal
no rodízio de decúbitos executado no setor), pelo tempo
máximo de cinco dias. A posição do paciente no leito
foi registrada sob a forma de intervalo de ângulos (015o; 16-30o; 31-45o; e >45o). Os dados foram coletados
por dois médicos pós-graduandos em Terapia Intensiva
no período entre 1o de junho a 1o de dezembro de 2002.
Neste período 37 pacientes foram auditados e foram realizadas, no total, 288 anotações da posição no leito.
Uma vez que a estimativa da posição era observacional, os intervalos foram previamente padronizados
e houve um período de treino da equipe responsável
pelo registro dos dados. Nesta fase utilizou-se pacientes
que já se encontravam internados no início do estudo.
Os pacientes no momento do registro deveriam ser
descobertos e avaliados pela lateral direita do leito
(durante a fase de treinamento a estimativa do ângulo
de inclinação do tronco era confrontada com auxílio de
um goniômetro). O ângulo avaliado era formado pela
linha axilar média do 4o espaço intercostal até o grande
troncânter (representando o plano frontal do tronco) e
plano horizontal do leito, paralelo ao chão.
A posição semi-recostada ideal é definida como a
inclinação do tronco em ângulo maior do que 45o em
relação ao plano horizontal.
Os dados referentes à densidade de utilização de
ventilação mecânica, bem como a incidência de PAVM
do serviço foram extraídas do banco de dados da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH) do
HCML.
Os critérios diagnósticos utilizados para definir
PAVM são os mesmos utilizados pelo Centro de Controle de Doenças Norte Americano (CDC – Center of
Disease Control).
Durante o período de observação não havia ainda
política de posicionamento no leito quanto à inclinação
da cabeceira, não houve interferência dos observadores
e o registro foi realizado em segredo da equipe diretamente envolvida nos cuidados dos pacientes.
RESULTADOS
Os gráficos iniciais (figuras 1 e 2) mostram que apesar da baixa utilização da ventilação mecânica invasiva
(Média HCML 2002 = 30% vs. CDC p90 = 49%); a
taxa de pneumonia associada à ventilação mecânica
(PAVM) no mesmo período foi acima do desejado (Média HCML 2002 = 22,4% vs. CDC p90 = 13,5%). O
intervalo de confiança utilizado em ambos os gráficos
foi de 95%.
35
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Figura 1 – Densidade de utilização de ventilação mecânica
no Centro de Terapia Intensiva do Hospital de Clínicas
Mário Lioni (intervalo de confiança de 95%).Fonte:
Comissão de Controle de Infecção Hospitalar.
ção maior do que 45o (N = 8). (Figura – 3). Dentro do
grupo que desenvolveu PAVM tivemos 112 registros,
entre estes 1,79% entre 0-15o (N = 2); 44,64% entre
16-30o (N = 50); 51,78% entre 31-45o (N = 58); e
1,79% acima dos 45o (N = 2). (Figura – 4). No grupo
que não desenvolveu PAVM houve 176 registros; entre estes 7,95% entre 0-15o (N = 4); 51,14 % entre 1630o (N = 90); 37,5% entre 31-45o (N = 66); e 3,41%
acima dos 45o (N = 6). (Figura – 5).
Tabela 1. Características dos Pacientes – (n= 37)
Figura 2 – Taxa de Pneumonia Associada à Ventilação
Mecânica no Centro de Terapia Intensiva do Hospital de
Clínicas Mário Lioni (intervalo de confiança de 95%).
Fonte: Comissão de Controle de Infecção Hospitalar.
No período do estudo, dos 37 pacientes auditados, foram registrados pela Comissão de Controle
de Infecção Hospitalar (CCIH) 14 casos de PAVM
(37,84% dos pacientes estudados); sendo a maioria
tardia (PAVM tardia = 92,3% dos casos registrados
– Tabela 1).
Com relação à presença de infecção (com e sem
PAVM), o tempo médio de permanência em ventilação mecânica é semelhante em ambos os grupos
(tempo médio nos pacientes que desenvolveram
PAVM = 14,92 dias vs. tempo médio dos pacientes
sem PAVM = 13 dias) e encontra-se dentro da média
histórica do setor.
Segundo a avaliação da idade e prognóstico (APACHE II - Acute Physiology Score and Chronic Health
Evaluation), o grupo se mostrou homogêneo. Na divisão por grupos diagnósticos, no total há um predomínio dos pacientes neurológicos e com insuficiência
respiratória (24 pacientes = 64,88% - Tabela – 1).
Foram feitas 288 avaliações da posição dos pacientes no leito. Encontramos 5,56% das avaliações
com ângulo de inclinação do tronco entre 0-15o (N =
16); 48,61% com inclinação entre 16-30o (N = 140);
43,05% entre 31-45o (N = 124); e 2,78% com angula-
36
Com PAVM
(14)
65,5 ± 17,2
6 (43%)
17,7 ± 5,4
01 (7,1%)
13 (92,9%)
Idade (anos) [média ± DP]
Mulheres [N(%)]
APACHE II Escore [média ± DP]
PAVM precoce
PAVM tardia
Tempo Médio de Ventilação
14,9
Mecânica
Diagnóstico primário
Neurológico
5
Insuficiência Respiratória
2
DPOC
3
SEPSE
1
Choque Circulatório
1
Trauma
0
IAM
1
ICC
1
TOTAL
14
Sem PAVM
(23)
62,8 ± 19,4
12 (52%)
16,8 ± 7,3
13
7
10
2
2
1
1
0
0
23
PAVM – pneumonia associada a ventilação mecânica; APACHE II
– acute physiology score and chronic health evaluation; DPOC - Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica; IAM, infarto agudo do miocárdio;
ICC, insuficiência cardíaca congestiva
Obs: Todos os pacientes estavam em nutrição enteral por cateter naso
ou oroenteral.
Figura 3 – Registros da posição no leito dos
pacientes com mais de 48 horas em ventilação mecânica
no CTI – HCML. Total de medidas = 288. Entre 0-15º
= 5,56% (N=16); 16-30º = 48,61% (N=140); 31-45º
=43,05% (N=124); >45o = 2,78% (N=8).
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Figura 4 – Registros da posição no leito dos pacientes
que desenvolveram pneumonia associada à ventilação
mecânica no CTI – HCML. Total de registros = 112. Entre
0-15º = 1,79% (N=2); 16-30º = 44,64% (N=50); 31-45º =
51,78% (N=58); >45º = 1,79% (N=2).
Quanto aos horários das avaliações, 51,04% foram
feitas pela manhã (N = 147); enquanto que 48,96% à
tarde (N = 141). Pela manhã 10 registros (3,47%) encontravam-se entre 0-15o; 75 (26,04%) entre 16-30o;
60 (20,84%) entre 31-45o; e 2 (0,69%) acima de 45o.
À tarde encontramos 6 aferições (2,08%) entre 0-15o;
65 (22,57%) entre 16-30o; 64 (22,23%) entre 31-45o;
e 6 medidas (2,08%) acima de 45o. (Figura – 6).
DISCUSSÃO
Figura 5 – Registros da posição no leito dos pacientes que
não desenvolveram pneumonia associada à ventilação
mecânica no CTI – HCML. Total de registros = 176. Entre
0-15º = 7,95% (N=14); 16-30º = 51,14% (N=90); 31-45º
= 37,5% (N=66); >45º = 3,41% (N=6).
Figura 6 – Elevação do tronco dos pacientes em ventilação
mecânica de acordo com horário da avaliação.
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
A subjetividade da avaliação clínica da angulação da cabeceira, que poderia representar um viés
no resultado, foi minimizada pelo treinamento e
padronização da avaliação no período pré-estudo,
pelo mínimo de pessoas envolvidas na coleta dos
dados, e também pela opção do registro sob a forma
de intervalos (quatro grupos divididos dentro do intervalo 0-45o) ao invés de números absolutos. Além
disso, há trabalhos que mostram que a avaliação da
posição semi-recostada pode ser clínica, e realizada
pela equipe multidisciplinar com moderado grau de
acurácia e concordância independente da experiência
do observador.18
A avaliação sob a forma de auditoria credita confiabilidade aos dados coletados uma vez que se manteve sigilo durante o período de registro, e não houve
intervenção dos observadores que gerasse mudança
da prática pesquisada.
Os dados permitem de uma maneira geral observar que a prática recomendada não é seguida rotineiramente (Figura 3). No entanto, quando comparados
os grupos de pacientes, esperar-se-ia que aqueles que
não evoluíram com infecção respiratória se encontrassem com elevação maior de sua cabeceira, o que
não é observado (Figuras 4 e 5). Logo, os dados existentes não permitem definir a parcela de contribuição
da sub-utilização da posição semi-recostada nas altas
taxas de PAVM existentes no CTI – HCML, uma vez
que outros fatores de risco não estudados poderiam
estar presentes.
Na divisão por grupos diagnósticos, no total há um
predomínio dos pacientes neurológicos e com insuficiência respiratória (Tabela 1), no entanto quando se
comparou os grupos, o número pequeno de pacientes
impede de apontar quais seriam aqueles com maior
risco de desenvolver PAVM nesta unidade.
O horário em que é realizada a avaliação da posição influi na sua precisão, que parece ser menor durante o período noturno, razão pela qual o trabalho foi
desenvolvido durante o dia.18 Os horários escolhidos
para realização da auditoria estão também relaciona-
37
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
dos a uma das práticas de profilaxia das úlceras de
decúbito do HCML (o “rodízio de decúbitos”). Aproveitou-se dois horários diurnos (manhã e à tarde) em
que os pacientes encontravam-se em posição supina
para registrar a inclinação do tronco. No que diz
respeito ao horário, as diferenças encontradas foram
pequenas para definir dominância de uma posição por
período (manhã=147 vs tarde=141), ou a sua relação
com a presença ou não de pneumonia (Figura 6).
O estudo, por possuir objetivo único de observar
ou não a prática da posição semi-recostada na prevenção da PAVM, possui também outras limitações.
Nota-se que o tempo médio de ventilação mecânica foi semelhante entre os grupos com e sem
PAVM (com PAVM = 14,92 dias vs. sem PAVM =
13 dias). No entanto, esperava-se que o grupo com
PAVM tivesse um tempo de ventilação mecânica médio significativamente maior. O número pequeno de
pacientes avaliados, bem como diferenças não avaliadas existentes dentro dos grupos poderiam justificar
tal resultado. Por exemplo, dentro do pequeno grupo
de pacientes avaliados que desenvolveram PAVM (14
pacientes), uma morte precoce poderia trazer a média
para menos; assim como no grupo dos pacientes que
não desenvolveram infecção, um tempo prolongado
de ventilação sem apresentar PAVM, aumentaria a
média.
Também não é possível correlacionar a presença
de PAVM, tempo de ventilação mecânica e de internação, bem como a mortalidade por pneumonia.
Um grande questionamento, embora também não
tenha sido o objetivo inicial, é por quais motivos à
prática recomendada não é seguida no CTI -HCML.
Seria necessário que se soubesse inicialmente se é do
conhecimento de toda equipe que a posição dos pacientes em ventilação mecânica no leito pode alterar
o risco do desenvolvimento de PAVM, e qual seria a
posição recomendada. E em um segundo momento
deveria ser apurado quais seriam os fatores que de
forma intuitiva, e os que de fato influenciam a boa
prática no ambiente em questão26.
Mais recentemente tem sido mostrado que iniciativas em busca da melhoria na qualidade, utilizando-se de objetivos alcançáveis, aumentam
significativamente a implementação de estratégias
preventivas29. Fundamentado neste modelo em que
“os fins justificam os meios”, é que o Serviço de
Terapia Intensiva do HCML montou seu programa
de alto desempenho, o que de certa forma tornou
desnecessário o conhecimento dos fatores cognitivos
individuais inicialmente. A literatura mostra também,
que o uso de “guidelines” como medida na mudança
38
da prática é insuficiente, a não ser quando implementados em conjunto com estratégias mais dinâmicas e
coletivas, tais como: programas de incentivo, participação ativa nos programas de educação continuada,
informatização do sistema, aulas, cartazes e avisos,
implementação de auditorias e redirecionamento de
práticas inefetivas5,18,24,25.
Em suma, a despeito da comprovação fisiológica
e das evidências de que a posição semi-recostada
reduz o risco de PAVM, esta estratégia de prevenção
é sub-utilizada na prática23,26,28. Tal fato foi também
observado na auditoria realizada (2,78% dos 288
registros). A posição mais observada globalmente
encontrava-se no intervalo entre 16-30o (N = 140; ou
48,61%), consistente com dois outros trabalhos18,23. O
exame clínico do paciente vem sendo substituído pela
tecnologia utilizada no cotidiano da terapia intensiva.
No entanto, a avaliação clínica é sempre fundamental
para o cuidado do paciente grave6,19-22.
Os dados gerados pela CCIH serviram para trazer
ao conhecimento da equipe multidisciplinar os altos
índices de PAVM do setor nos anos anteriores. No
que tange a posição do paciente no leito, a auditoria
serviu para mostrar que há necessidade de mudança
na prática atual. Não é possível estabelecer o real
efeito desta intervenção sobre a incidência da PAVM
considerando o método utilizado no estudo (observacional) e a falta de ajustes necessário para comparação entre aos grupos com diferentes posições no
leito e a presença ou não de infecção. No entanto, um
programa para prevenção da PAVM deve incorporar
métodos facilmente disponíveis cuja eficácia e custo efetividade sejam validadas por estudos clínicos
sendo a aplicação da posição semi-recostada no leito
além de fundamentada em evidências, de simples realização necessitando apenas a avaliação clínica da
posição do tronco.
Conclui-se que a conscientização e implementação de mudanças na maioria das intervenções são
influenciadas por fatores ambientais, principalmente
administrativos e culturais26. Logo, para aumentar a
probabilidade da aceitação de um programa de intervenção e o seu sucesso, esforços devem ser feitos
para adaptá-lo às características de cada hospital1.
RESUMO
Justificativa e Objetivos: A pneumonia associada à ventilação mecânica (PAVM) tem altas taxas de
mortalidade e está associada a hospitalizações mais
prolongadas e aumento dos custos médico-hospitalares. Um programa para prevenção da PAVM deve
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
incorporar métodos facilmente disponíveis cuja
eficácia e custo efetividade sejam validadas por estudos clínicos. O objetivo do estudo é avaliar se a
recomendação da posição semi-recostada no leito,
como profilaxia da PAVM, é seguida no tratamento
dos pacientes em assistência ventilatória na Unidade
de Cuidados Intensivos do Hospital de Clínicas Mário Lioni.
Método: Durante o período de junho a dezembro de 2002 foi realizado um estudo observacional,
sob a forma de auditoria, que registrou a variação
da posição do tronco nos pacientes em ventilação
mecânica. Todo paciente depois de completadas 48
horas de ventilação mecânica passava a ter a posição
do tronco registrada em dois horários pré-determinados diariamente, pelo tempo máximo de cinco dias.
A posição do paciente no leito foi registrada sob a
forma de intervalo de ângulos (0-15o; 16-30o; 31-45o;
e >45o). Neste período 37 pacientes foram auditados
e foram realizadas no total 288 anotações da posição
no leito. A posição semi-recostada ideal foi definida
como a inclinação do tronco em ângulo maior do que
45o em relação ao plano horizontal.
Resultados: Foram feitas 288 avaliações da posição dos pacientes no leito. Encontramos 5,56% das
avaliações com ângulo de inclinação do tronco entre
0-15o (N = 16); 48,61% com inclinação entre 16-30o
(N = 140); 43,05% entre 31-45o (N = 124); e 2,78%
com angulação maior do que 45o (N = 8). Dentro do
grupo que desenvolveu PAVM tivemos 112 registros,
entre estes 1,79% entre 0-15o (N = 2); 44,64% entre
16-30o (N = 50); 51,78% entre 31-45o (N = 58); e
1,79% acima dos 45o (N = 2).
Conclusões: A despeito do conhecimento do mecanismo fisiopatológico e da evidência que a posição
semi-recostada reduz os riscos de aspiração e pneumonia, esta simples estratégia de prevenção é sub
utilizada na prática.
Unitermos: evidência, prevenção, posição semi-recostada, pneumonia associada à ventilação mecânica.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
16.
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39
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Posicionamento do Tubo Orotraqueal
Utilizando-se como Referência os
Dentes Incisivos Centrais Superiores
Placement of Oral Endotracheal Tube Using as
Reference the Superior Central Incisors Teeth
Claudio Piras*
Abstract
OBJECTIVE: To determine whether a certain distance measurement on the oral endotracheal tube at the superior
central incisors teeth could reasonably ensure proper depth of placement and avoid complications like bronchial
intubation and recurrent laryngeal nerve injury.
MATERIAL AND METHOD: Twenty-five cadavers were intubated and the orotracheal tube introduced until the
proximal end of the cuff reached the lower margin of the cricoid cartilage. After that, the distance from the superior
central incisors teeth to the tip of the tube was measured and the average and SD was calculated.
RESULTS: The average length was 225,24 mm (195 mm to 250 mm) and the SD was 16,21 mm.
CONCLUSIONS: We concluded that a depth of oral endotracheal tube placement, from the superior central incisors
teeth, of 225 mm have led to a proper placement.
KEY WORDS: Endotracheal, intubation, intratracheal.
A
intubação orotraqueal é um procedimento
largamente utilizado nos setores de urgência
e emergência, e nas unidades de terapia
intensiva. Não é um procedimento isento de complicações, sendo as mais freqüentes a lesão dos nervos
laríngicos recorrentes, as intubações bronquiais e as
estenoses traqueais. As lesões dos nervos laríngicos
recorrentes e as estenoses traqueais decorrem do posicionamento ou da pressão de enchimento inadequados
do balonete, enquanto as intubações bronquiais decorrem da introdução excessiva do tubo orotraqueal.
A traquéia mede em média 12 cm com extremos entre
9 cm e 15 cm, na dependência da idade, do biotipo
e da fase da respiração. O método utilizado para se
evitar o posicionamento incorreto do tubo orotraqueal
é o da visão direta da laringe, com progressão do tubo
até que a extremidade proximal do balonete se localize cerca de 2 cm abaixo das pregas vocais. Alguns
autores preferem utilizar uma marca no tubo 2 ou 3
cm proximal ao balonete e consideram uma intubação
adequada quando essa marca está no nível das pregas
vocais. Essas condutas tem diminuido a ocorrência
das complicações citadas. Em pacientes previamente
intubados a confirmação da posição do tubo orotra-
queal se faz pela radiografia do tórax, onde pode-se
observar a localização da extremidade do tubo, que
deve estar à uma distância não inferior a 2 cm da carina. Foi através da utilização da radiologia que vários
autores definiram como adequada, para a intubação
orotraqueal, a distância de 21 cm para as mulheres e
de 23 cm para os homens. Esses estudos utilizaram
como referência a comissura labial e a carina. Por ter
a comissura labial grande mobilidade há o risco de
variações importantes na marcação do comprimento
de tubo introduzido. Entendendo ser importante um
ponto de referência menos sujeito a variações ou com
amplitude de variação de menor intensidade, resolvemos estudar a distância entre a extremidade de um
tubo orotraqueal e os dentes incisivos centrais superiores, mantendo a extremidade proximal do balonete
no nível da margem inferior da cartilagem cricóide,
localizada, em média, a 2,12 cm abaixo das pregas
vocais. O objetivo desse estudo é obter, em nossa
população, uma distância de introdução do tubo orotraqueal média que seja segura para os pacientes, evitando a lesão de nervos laríngicos recorrentes ou as
intubações bronquiais, e que permita a confirmação
dessa posição à beira do leito.
Professor adjunto do Departamento de Morfologia da Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória, Professor adjunto do Departamento de Cirurgia da Universidade Federal do Espírito Santo, Médico Intensivista do Hospiral São Lucas,
Especialista em Terapia Intensiva pela AMIB.
Local de realização do trabalho: Laboratório de Anatomia da Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória.
Endereço do Autor: Claudio Piras - Rua Alaor Queiróz de Araújo, 175 apto 602 - Enseada do Suá, Vitória – ES - CEP: 29055-010
Telefone para contato: 27 3345-1118 / 27 8111-3955
Recebido: 30 de janeiro 2004 - Aceito: 02 de abril 2004
40
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
MÉTODO
Foram utilizados 25 cadáveres formolizados, mediolíneos, de ambos os sexos, com predominância do sexo
masculino e da cor parda. A cabeça e o pescoço foram
seccionados sagitalmente em um plano que dividisse a
cavidade nasal, a cavidade oral, a laringe e a traquéia
em duas metades (Figura 1). Essa secção nos permitiu
uma visão direta do vestíbulo da laringe, da prega vocal
e da cartilagem cricóide (Figura 2). O próximo passo
foi introduzir uma cânula orotraqueal através da cavidade oral, faringe, laringe e traquéia (Figura 3), até que
a extremidade proximal do balonete ficasse localizada
no nível da margem inferior da cartilagem cricóide (Figura 4). A partir do posicionamento do tubo medimos a
distância entre a sua ponta e os dentes incisivos centrais
superiores dos cadáveres (Figura 5), utilizando-se para
tal um guia metálico flexível que, após a marcação, era
retificado e seu comprimento medido. Não encontra-
Figura 3. Introdução do tubo orotraqueal através
da cavidade oral, faringe e laringe, até a traquéia.
Figura 4. Posicionamento da extremidade
proximal do balonete (linha) no nível da
margem inferior da cartilagem cricóide (CC).
Figura 1. Cabeça e pescoço seccionados sagitalmente para
expor a cavidade oral, faringe, laringe e traquéia.
Figura 2. Secção sagital da laringe e
traquéia com visualização da prega vocal (PV)
e da cartilagem cricóide (CC).
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
Figura 5. Detalhe do tubo orotraqueal e do
local de referência para as medições, no nível
do dente incisivo central superior (seta).
41
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
mos variações importantes na conformação das arcadas
dentárias dos cadáveres estudados. Todos apresentavam
os incisivos centrais superiores, que se encontravam
alinhados com os demais dentes da arcada dentária superior. Com as distâncias obtidas calculamos a média e
o respectivo desvio-padrão (DP).
RESULTADOS
Foram estudados 25 cadáveres de estatura mediana,
biotipo mediolíneo, com predominância da cor parda e
do sexo masculino. Todos apresentavam arcada dentária
superior completa e alinhada. Não notamos variações
da arcada dentária superior dignas de nota nos cadáveres estudados. A distância entre os dentes incisivos
centrais superiores e a extremidade do tubo orotraqueal,
estando a extremidade proximal do balonete no nível
da margem inferior da cartilagem cricóide, variarou de
195 mm a 250 mm (Tabela 1). O menor valor obtido
coincidiu com um cadáver do sexo feminino enquanto
o maior valor obtido coincidiu com cadáveres do sexo
masculino. A comprimento médio obtido foi de 225,24
mm, com Desvio Padrão de 16,21 mm (Quadro 1).
Tabela 1. Relação dos cadáveres estudados e respectivas
distâncias entre os dentes. Incisivos centrais superiores e a
extremidade de um tubo orotraqueal
Número da peça
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
42
Distância obtida (mm)
238
212
222
207
228
228
232
245
205
250
244
217
204
195
209
217
244
242
250
201
233
226
228
235
219
Quadro 1. Resultados obtidos da medição
da distância entre os dentes incisivos centrais
superiores e a extremidade de um tubo orotraqueal,
estando a extremidade proximal do balonete
no nível da margem inferior da cartilagem cricóide,
em 25 cadáveres formolizados.
Número de cadáveres estudados
Maior distância encontrada
Menor distância encontrada
Média das distâncias encontradas
Desvio-padrão
25
250 mm
195 mm
225,24 mm
16,21 mm
DISCUSSÃO
A intubação orotraqueal é um procedimento médico
que objetiva o acesso à via aérea para várias finalidades,
uma das quais a ventilação mecânica por pressão positiva. Para que esse procedimento não produza complicações, a extremidade da cânula deve ser posicionada
na transição do terço médio e inferior da traquéia1. Das
complicações decorrentes do deslocamento do tubo
orotraqueal temos, predominantemente, a intubação
bronquial e a lesão do nervo laríngico recorrente, esse
último decorrente da compressão pelo balonete quando localizado na laringe2,3. Vários autores publicaram
estudos sobre o melhor posicionamento da cânula orotraqueal4,5,6,7. Cavo4, estudando a paralisia das cordas
vocais em pacientes intubados, verificou que a parte
vulnerável para a lesão do nervo laríngico recorrente,
pelo balonete, fica entre 6 mm e 10 mm abaixo das
pregas vocais. INADA et al.8, em seu estudo sobre as
alterações da posição do tubo orotraqueal durante colecistectomias laparoscópicas, utilizando broncoscopias,
concluiram que a posição recomendada seria aquela
em que a extremidade proximal do balonete ficasse
15 mm abaixo das pregas vocais, o que deixaria uma
distância média entre a ponta do tubo e a carina de 28
mm. SALEM6 afirma que a ponta do tubo tem que estar
posicionada na metade da traquéia, o que poderia ser
obtido pela introdução do tubo até que a extremidade
proximal do balonete estivesse 2 cm (20 mm) abaixo
das pregas vocais. Essa mesma recomendação é referendada por outros autores9,10. A distância média entre
as pregas vocais e a carina, segundo HARTREY et al.1,
é de 128 mm (110 mm – 140 mm) para os homens e de
119 mm (98 mm – 140 mm) para as mulheres. Esses
mesmos autores decrevem um deslocamento da extremidade do tubo, com os movimentos da cabeça, de 15,3
mm distal (em direção à carina) durante a flexão e de
14,1 mm proximal (em direção à laringe), na extensão.
Outro fato de relevância é o deslocamento cranial da
carina que ocorre com o aumento da pressão intra-abRBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
dominal que, segundo IWAMA et al.11, atinge 11 mm
(DP 4 mm) para um aumento de 10 mmHg. Os dados
apresentados acima levaram os autores a concluir que
a técnica adequada para o posicionamento correto do
tubo orotraqueal seria a introdução do mesmo, por visão direta, até que a extremidade proximal do balonete
estivesse 2 cm distal às pregas vocais. Esse deve estar
a, pelo menos, 2 cm cranial à carina. Devido ao fato de
que o tubo sofre migração tanto proximal quanto distal,
com os movimentos da cabeça, tão freqüentes durante
a manipulação e realização de procedimentos nos pacientes da UTI, e que mudanças pequenas na posição do
tubo orotraqueal podem desencadear complicações importantes, a verificação da posição do tubo orotraqueal
deve ser uma constante em todo paciente intubado. Levando-se em consideração que a confirmação do correto
posicionamento do tubo, de forma seqüencial, seja por
visão direta ou por radiografias, é trabalhosa, demorada
e dispendiosa, a observação do comprimento de tubo
orotraqueal introduzido, através das marcas existentes
nos mesmos, tornou-se uma opção atraente. Para que
essas marcas fossem de valia seria necessária a validação do comprimento médio de tubo orotraqueal a ser
introduzido, para que o limite proximal do balonete se
situasse 2 cm abaixo das pregas vocais e a sua extremidade 2 cm acima da carina. Nas intubações utilizando-se
as marcas dos tubos orotraqueais como parâmetro, uma
radiografia do tórax deve ser realizado sempre após o
procedimento, pois esse exame pode, facilmente, detectar o posicionamento correto ou não do tubo6. OWEN &
CHENEY12 e BRUNEL et al.13 que estudaram, respectivamente, 578 pacientes e 219 pacientes concluiram
que a distância entre a ponta do tubo orotraqueal e os
lábios deveria ser de 21 cm para as mulheres e de 23
cm para os homens, para que houvesse uma intubação
adequada. Esses autores concluiram que a introdução
do tubo orotraqueal dessa forma prevenia a intubação
bronquial melhor que a ausculta pulmonar. ROBERTS
et al.14 estudaram 83 pacientes com o objetivo de avaliar
a colocação adequada do tubo orotraqueal em pacientes
adultos, antes da confirmação radiológica. Definiram,
esses autores, como intubação adequada aquela em que
a ponta do tubo estava pelo menos 2 cm cranial à carina.
Dos 83 pacientes avaliados, 52 do sexo masculino e 31
do sexo feminino, a medida média do tubo no nível da
comissura labial era de 22,2 cm nas mulheres e de 23,1
cm nos homens. Nessa situação anteriormente descrita,
75 pacientes do total de 83 pacientes tiveram posicionamento correto do tubo orotraqueal a radiografia inicial
(90,4%). Segundo os autores, quando a distância do
tubo era ajustada para 21 cm nas mulheres e 23 cm nos
homens, no nível da comissura labial, 81 pacientes do
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
total de 83 pacientes passaram a ter posição adequada
do tubo (97,6%). Pudemos observar que as distâncias
obtidas na literatura foram semelhantes, a despeito de
terem sido utilizados parâmetros diferentes como os
lábios e as comissuras labiais. Levando em consideração a possibilidade de ampla mobilização dos lábios
e das comissuras labiais, optamos por utilizar como
parâmetro superior os dentes incisivos centrais superiores e como parâmetro inferior a margem inferior da
cartilagem cricóide, local de transição entre a laringe e a
traquéia, localizada 2,12 cm (DP 0,4 cm) distalmente às
pregas vocais, com variação de 1,9 cm a 2,6 cm (dados
próprios não publicados). Através dos parâmetros acima
citados, obtivemos como distância média entre os dentes incisivos centrais superiores e a margem inferior da
cartilagem cricóide 225,24 mm (22,5 cm), com desvio
padrão de 16,21 mm (variação de 195 mm a 250 mm).
Com a introdução dos tubos orotraqueais nos valores
médios obtidos tivemos um posicionamento da extremidade proximal do balonete sempre abaixo de 10 mm das
pregas vocais, como preconiza CAVO4 e uma distância
mínima de 34 mm da carina, suficiente para assimilar
deslocamentos distais da ponta do tubo nos movimentos
da cabeça, como citado por HARTREY et al.1.
CONCLUSÃO
Nossos resultados nos permitem concluir que a introdução do tubo orotraqueal a 22,5 cm (225 mm) dos
dentes incisivos centrais superiores, com a cabeça em
posição neutra, permite o posicionamento adequado
do mesmo. Como recomendações poderíamos citar a
introdução do tubo orotraqueal de não mais que 22,5 cm
nas mulheres e de não menos que 22,5 cm nos homens,
realizando sempre uma radiografia do tórax de controle,
após o posicionamento e fixação do tubo orotraqueal.
RESUMO
A intubação orotraqueal é um procedimento corriqueiro em unidades de urgência, emergência e terapia
intensiva. Não é, entretanto, um procedimento isento de
complicações. As complicações mais freqüentes (intubação bronquial, lesão do nervo laríngico recorrente e
estenose traqueal) decorrem do posicionamento incorreto ou de pressão de insuflação excessiva do balonete.
Na prevenção das complicações inerentes ao posicionamento incorreto do balonete, duas medidas tem sido
utilizadas com sucesso: intubação sob visão direta, em
que o tubo orotraqueal é introduzido até que o balonete
ultrapasse em 2 cm as pregas vocais; e a realização de
uma radiografia do tórax, onde a extremidade do tubo
43
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
deve se localizar pelo menos 2 cm acima da carina.
Como controle da adequação da intubação tem-se adotado a medição do comprimento de introdução do tubo,
através das marcas que os mesmos possuem. A literatura cita como comprimentos adequados 23 cm para os
homens e 21 cm para as mulheres, tendo como ponto de
referência a comissura labial. Dada a ampla mobilidade
que a comissura labial está sujeita, optamos por estudar o comprimento adequado de introdução dos tubos
orotraqueais utilizando, como ponto de referência, os
dentes incisivos centrais superiores. Para tal utilizamos
25 cadáveres formolizados em que a cabeça e o pescoço
foram seccionados sagitalmente, para que a laringe e
a traquéia pudessem ser visualizadas. Um tubo orotraqueal no 8 foi introduzido através da cavidade oral,
faringe, laringe e traquéia, até que a extremidade proximal do balonete estivesse no nível da margem inferior
da cartilagem cricóide. O próximo passo foi medir o
comprimento de tubo entre os dentes incisivos centrais
superiores e a sua extremidade. Com os valores obtidos
calculamos a média e o desvio padrão, que foram, respectivamente, 225,24 mm e 16,21 mm (variação de 195
mm a 250 mm). Concluimos, portanto, que a introdução
e manutenção do tubo orotraqueal a 225 mm (22,5 cm)
dos dentes incisivos centrais superiores permite um posicionamento adequado e uma baixa probabilidade de
complicações.
Unitermos: Endotraqueal, Intubação.
44
REFERÊNCIAS
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RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ESPECIAL
Terapia Intensiva na Graduação Médica: Os Porquês
Justifying Teaching Intensive Care for Medical Undergraduates
Ana Paula Pierre de Moraes1, Gutemberg Fernandes de Araújo2, César Augusto Castro3
Abstract
Intensive Care is a medical specialty with a well established body of knowledge as well as incorporated advanced
technology. However Intensive Care education of medical students has been largely ignored.. This paper reviews the
main reasons that justify inclusion of Intensive Care essentials in undergraduate medical curricula worldwide.
Key Words: Intensive Care, teaching, undergraduate, medical education, curriculum.
O
s primeiros estudos que abordaram a face educacional da Terapia Intensiva ocorreram por volta
dos anos sessenta, nos Estados Unidos. Análise
de surveys, distribuídos em nível nacional, apontavam que
aproximadamente 50% dos médicos daquele país se consideravam incapazes de conduzir efetivamente manobras de
reanimação cardiorrespiratória (RCP) e que apenas 20%
das escolas médicas questionavam essas habilidades aos
seus estudantes no final do curso. Por essa razão, na década
de 1970, estabeleceu-se um programa educacional específico para uma abordagem de currículo multidisciplinar em
emergência e cuidados intensivos para alunos do curso de
Medicina e para a residência médica naquele país1.
DA DÉCADA DE 1990 AOS DIAS ATUAIS
Uma ampla análise da situação da educação em Terapia
Intensiva foi realizada por Buchman e col. em 1992, utilizando revisão de literatura e as respostas de um questionário realizado em 1990 com os participantes do Simpósio
Científico e Educacional da Sociedade de Terapia Intensiva. A maioria dos participantes considerava a Terapia
Intensiva como um corpo de conhecimentos e habilidades
com identidade própria, e não uma extensão de outras
disciplinas e que todos os clínicos deveriam estar familiarizados com os cuidados básicos ao paciente crítico. Além
disso, a maioria respondeu que os alunos eram capazes de
aprender esses fundamentos e que esse aprendizado deveria ser-lhes requerido2.
Nessa ocasião, foi reavaliada a necessidade educacional da abordagem de currículo multidisciplinar em Terapia Intensiva para estudantes de Medicina e residentes.
Verificou-se que esta abordagem para pós-graduação se
concretizava como estágio rotatório, mas para a graduação ainda era deixada em segundo plano no currículo da
maioria das escolas médicas daquele país. Como conseqüência, os estudantes normalmente se graduavam revelando
carência na maioria das habilidades básicas inerentes
à Terapia Intensiva, tendo dificuldades em referenciar
apropriadamente um paciente para UTI e de iniciar intervenções em situação de emergência. Para Buchman e col.,
há uma lacuna entre o que os estudantes de Medicina são
exigidos a aprender e o que eles precisam saber para efetivamente iniciar as intervenções de cuidados intensivos e
referir apropriadamente pacientes para as UTI. Esta lacuna
pode e deve ser reparada com a implementação da Terapia
Intensiva no núcleo curricular2. O grupo alega que estes
conhecimentos podem e devem ser reunidos nas disciplinas tradicionais, mas que há motivos para organizar certos
objetivos de aprendizagem na Unidade de Terapia Intensiva: o fato de a maior parte dos estudantes de Medicina não
estar familiarizado com a forma mais comum de doença
crítica; alguns tópicos são difíceis de ensinar fora da UTI
como manuseio da via aérea e da ventilação, falência orgânica múltipla, estado de mal asmático, pós-operatório de
um paciente crítico2.
Apesar das vantagens da UTI para o ensino dos cuidados ao paciente crítico, as dificuldades deste ambiente
também foram levadas em consideração. A maioria dos
estudantes é mal preparada para lidar com os aspectos
técnicos e o estresse emocional da UTI. Eles têm pouco
conhecimento da sistemática e prioridades na conduta dos
cuidados ao paciente crítico, não estão familiarizados com
doenças em estágio de evolução grave. A participação,
guiada por um senso de responsabilidade, é uma peça
importante no aprendizado do estudante de Medicina e
¹Rotina UTI do Hospital Universitário Presidente Dutra da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) - Especialista em Medicina
Intensiva AMIB/AMB - Mestre em Ciências da Saúde pela UFMA
Endereço para correspondência: Rua dos Antúrios, quadra 04, casa 22, Renascença II - São Luís- MA. CEP: 65075-450 / Tel: (98)
235-9533 - E-mail: [email protected]
²Professor Adjunto de Clínica Cirúrgica e do Mestrado em Ciências da Saúde da UFMA - Mestre e Doutor em Cirurgia pela Escola
Paulista de Medicina
³Professor Adjunto do Departamento de Biblioteconomia e do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFMA - Mestre e
Doutor em Educação pela Universidade de São Paulo
Recebido: 02 de março 2004 - Aceito: 08 de abril 2004
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
45
um currículo pré-estabelecido assegura aos estudantes que
eles, de fato, aprenderão o básico e não se perderão em
minúcias. Estabeleceu-se, então, os objetivos específicos,
guidelines para o ensino da Terapia Intensiva e programas
para o desenvolvimento curricular nos Estados Unidos2.
Realmente, existem razões para assegurar que todos os
médicos devem ao menos ter alguma familiaridade com os
fundamentos da Terapia Intensiva, iniciando pela questão
de que a recuperação dos pacientes críticos é contingência de um rápido reconhecimento e o estabelecimento de
intervenções imediatas de suporte antes da transferência
para a UTI. Na Austrália, a Critical Care Working Party da
Universidade New South Wales em Sidney, formada por
representantes da Fisiologia, Farmacologia, Anestesiologia, Medicina de Emergência, Terapia Intensiva adulto e
pediátrica, Clínica Médica e Clínica Cirúrgica, adotam o
pressuposto de que nenhum estudante de Medicina deveria
graduar-se sem a habilidade de prevenir a perda de um paciente com uma doença fatal aguda que fosse reversível3.
Um estudo com o objetivo de responder se os alunos
realmente poderiam aprender as habilidades necessárias
para resolução de problemas na Unidade de Terapia Intensiva ocorreu na Universidade de Pittsburgh, nos Estados
Unidos4. Realizou-se um curso de um mês, baseado nos aspectos particulares da UTI com os alunos do quarto ano do
curso de Medicina. Os temas do curso incluíam diagnóstico, análise de dados laboratoriais e de resposta terapêutica,
além de explanação sobre os aspectos éticos relacionados
aos pacientes da UTI, de modo a encorajar a decisão, a resolubilidade, o diagnóstico diferencial e a prioridade frente
à resolução dos problemas. Por outro lado, havia discussão
com os alunos para que se diminuísse a ansiedade existente durante o aprendizado em uma UTI. As situações
complexas que envolvem tanto o lado fisiológico como o
tecnológico, somadas aos aspectos éticos comuns no diaa-dia, poderiam levar os estudantes ao desinteresse e reduzir a eficácia da experiência educacional4. Comparando o
aumento estatisticamente significante entre as médias das
provas dos alunos antes e após o curso, o estudo afirmou
que os alunos de fato podem aprender as habilidades inerentes à Terapia Intensiva4.
Após a publicação desse estudo da Universidade de
Pittsburgh, várias discussões sobre o ensino da Terapia
Intensiva ocorreram nos Estados Unidos, tanto favorável,
quanto desfavoravelmente5-8.
Os trabalhos favoráveis à abordagem feita nesta Universidade reconheceram o esforço pela sua elaboração
abordagem que satisfaça a um programa gradativo supervisionado, envolvendo cenários diferentes para abranger a
totalidade da Terapia Intensiva e que estimule o estudante
a opinar e a justificar sua postura frente às questões técnicas e éticas envolvendo os pacientes da UTI e seus familia-
46
res. Esses trabalhos ressalvam que, embora uma boa parte
dos recém-graduados esteja trabalhando no nível primário
de atenção à saúde, os objetivos do programa da Terapia
Intensiva, relacionados à informação, análise de dados,
seleção terapêutica e posterior avaliação dos resultados,
fazem parte do aprendizado de qualquer graduando. Esse
processo de tomada de decisão clínica é necessário em
todos os aspectos da Medicina e seria o ponto mais importante do rodízio dos alunos na Terapia Intensiva5,6.
Por outro lado, os trabalhos que discordaram desta
abordagem alegaram que a Terapia Intensiva seria um
nível avançado e desafiador dentro das especialidades
médicas e acreditavam que a necessidade dos alunos seria
possuir uma base sólida de habilidades básicas como anamnese, exame físico, formulação de hipóteses diagnósticas
e conduta, alertando para a precocidade desnecessária7,8.
Seguindo esse tema, realizou-se uma pesquisa no
continente europeu9 com o objetivo de analisar o ensino
da Terapia Intensiva para a graduação e pós-graduação na
Europa. Após coleta dos dados, este estudo analisou a variação do ensino da Terapia Intensiva tanto na graduação,
como na pós-graduação destes países. O trabalho revelou
que, em relação ao ensino da graduação, os tópicos relacionados à Terapia Intensiva, na maioria das vezes, não
são abordados de forma conjunta, e sim distribuídos entre
as disciplinas tradicionais, mais freqüentemente Medicina
Interna, Anestesiologia e Cirurgia. Mesmo em países onde
a Terapia Intensiva é considerada uma especialidade ou
subespecialidade, em grande parte das vezes, ainda não é
reconhecida como uma disciplina acadêmica independente na graduação. Embora os resultados demonstrem que
situações com os pacientes críticos são abordadas em todas as escolas médicas, os princípios e a prática da Terapia
Intensiva ainda estariam em um segundo plano na maioria
dos currículos9.
Esse estudo europeu cita que um problema particular
das escolas médicas são os tópicos de reanimação cardiorrespiratória. Enquanto os conceitos de RCP são ensinados
a vários profissionais da saúde, bombeiros, professores
estão sendo introduzidos na comunidade, muitos médicos
e alunos de Medicina relatam carência deste conhecimento básico, o que os coloca em posição desfavorável em
situações críticas. A experiência na UTI permite que os
alunos reconheçam um paciente grave e compreendam
que o sucesso da reanimação está relacionado ao rápido
diagnóstico e de como agir com eficiência. Assim, embora
o núcleo da Terapia Intensiva situe-se no treinamento da
pós-graduação, os médicos deveriam dominar algumas
competências na graduação. Para Garcia-Barbero e Such,
embora o volume do ensino da Terapia Intensiva esteja
direcionado para o treinamento da pós-graduação, poucos
argumentariam contra a necessidade dos graduandos de
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ESPECIAL
Medicina de adquirir experiência em lidar com emergências médicas9 .
Um artigo publicado na revista New Horizons da
Society of Critical Care Medicine trouxe considerações
sobre a reforma do sistema de saúde dos Estados Unidos,
refletidas no ensino médico. Segundo o artigo, ainda que
as orientações principais digam respeito aos cuidados
básicos, o hospital continua recebendo pacientes com
gravidade. Os residentes e alunos do último ano do curso,
independente da especialidade que escolheram para si, são
chamados para avaliar pacientes instáveis e precisam saber
reconhecer sinais e sintomas de instabilidade respiratória
e cardiovascular e iniciar reanimação antes do transporte
para uma unidade de referência ou UTI. Todos os estudantes necessitariam aprender estas habilidades; apesar disso,
a maioria das escolas não exige que os alunos aprendam10.
Em sua discussão, esse artigo coloca que embora a UTI
possua uma equipe profissional altamente especializada,
esteja ocupada por pacientes graves com muitos sistemas
orgânicos comprometidos e utilizando tecnologia avançada, ainda assim, é um excelente ambiente de ensino.
A Terapia Intensiva dá oportunidades de reforçar muitos
princípios gerais da Medicina interna, condições de observar a fisiologia no seu tempo real e de ensinar a organizar
habilidades para análise e prioridade na resolução dos
problemas e de se estabelecer objetivos para a conduta terapêutica. Mesmo que os alunos nunca tenham conduzido
um paciente em ventilação mecânica, eles necessitam saber estabelecer o suporte ventilatório manual sob máscara
e, no caso de parada cardiorrepiratória, é necessário que
se aprenda as habilidades técnicas e de comunicação para
liderança na reanimação. Além disso, a Terapia Intensiva
dá oportunidades de lidar com aspectos éticos, tais como o
de se iniciar, ou não, a reanimação cardiorrespiratória, de
obter o termo de consentimento para a doação de órgãos,
de avaliar o custo-benefício das intervenções e de desenvolver habilidade de comunicação com os familiares dos
pacientes10.
Sob um outro aspecto, devido ao fato de o cuidado
com o paciente grave constituir uma área de convergência
multidisciplinar, as escolas assumem que estes conteúdos
estejam sendo abordados por todas as áreas. Uma vez que
não se haveria delegado um responsável específico, esses
tópicos poderiam estar sendo omitidos, com o receio de
repetições em várias disciplinas2-10. Entretanto, a avaliação
dos estudantes do quarto ano do curso da Universidade de
Pittsburgh, utilizando manequim em tempo real para avaliar
se os mesmos possuíam as habilidades necessárias para
iniciar conduta face à situação crítica, demonstrou que há
falhas neste processo de tomada de decisão e que os alunos,
após participarem de curso na Unidade de Terapia Intensiva,
melhoraram significativamente tais habilidades11.
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
O estudo de Harrison e col., na Austrália, descreveu
que uma grande proporção de alunos do último ano do
curso de Medicina não executou ou não presenciou a
execução de muitos procedimentos envolvidos nos cuidados intensivos, incluindo intervenções simples. Também
responderam que lhes faltaria confiança no seu potencial
de conduzir a maioria das situações clínicas críticas, caso
fossem o único clínico disponível no hospital. Esse estudo forneceu subsídios para recomendações ao comitê de
currículo daquela universidade, de modo a incorporar a
avaliação dos cuidados ao paciente crítico no currículo
de graduação3. Na mesma linha de pesquisa, outro estudo australiano revelou que os recém-graduados tiveram
poucas oportunidades de executar alguns procedimentos
no curso, 37% nunca intubaram, 29% perceberam como
inadequada sua proficiência em procedimentos básicos
e 43% consideraram inadequado seu treinamento nesses
aspectos12.
Outros estudos sugerem que o treinamento do cuidados ao paciente grave deve ser aumentado tanto para o
graduando, como para o pós-graduando, por serem uma
parte importante da prática hospitalar13, uma vez que os
cuidados com paciente agudamente doente são freqüentemente abaixo do desejável, incluindo o reconhecimento
deste paciente agudo grave e as condutas iniciais ao seu
atendimento. Para alguns pesquisadores, o último ano do
curso de Medicina é o momento de treinar formalmente as
habilidades e as competências para os estagiários conduzirem com eficiência as emergências mais comuns, o que
tem aumentado consideravelmente na Universidade de
Glasgow, no Reino Unido14.
A Terapia Intensiva foi considerada, em outros estudos,
uma área integradora de conteúdos desde os princípios fisiológicos e farmacológicos básicos de diversas disciplinas
do curso médico, já que dá a chance de aplicá-los e observá-los em tempo real, o que constituiu um dos fatores para
seu espaço na graduação10,15,16,17,18. A UTI seria um local
importante para o ensino e a integração de conhecimentos
básicos com as habilidades para reanimação e condução de
um paciente gravemente enfermo19.
Estudos nas escolas médicas de língua inglesa, incluindo as dos Estados Unidos, Reino Unido, Austrália,
Nova Zelândia, Canadá, África do Sul, Zimbawe e Sudeste da Ásia; revelaram que a maioria considerou que
o ensino da Terapia Intensiva na graduação é essencial;
entretanto, apenas em 31% delas este ensino é obrigatório20. Em relação aos tópicos abordados em seus
respectivos programas, chamaram a atenção aqueles
relacionados à reanimação cardiorrespiratória, abordagem e conduta no paciente agudo grave, condutas em
insuficiência respiratória, circulatória, falência orgânica
múltipla, condutas no paciente inconsciente, pós-ope-
47
ratório imediato e habilidades para comunicação e
ética nas questões relativas ao paciente terminal. Este
estudo verificou que a Terapia Intensiva está sendo
gradualmente introduzida no currículo destas escolas
médicas. Os principais fatores que impediam o desenvolvimento adequado do ensino da Terapia Intensiva
na graduação daqueles países seriam o pouco tempo
dos intensivistas às atividades de ensino e a carência
de staffs e de recursos20.
No Brasil, a Associação Brasileira de Medicina
Intensiva vem discutindo, em especial nos últimos
anos, a inclusão da Terapia Intensiva nos currículos de
graduação médica21,22, pela possibilidade de apresentar
ao graduando os aspectos técnicos para reanimação de
um paciente grave, correlacionar princípios fisiológicos
básicos com os clínicos e questões éticas. A Terapia
Intensiva está incluída no currículo da graduação médica de algumas escolas médicas brasileiras, como a
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, Universidade Severino
Sombra, Universidade Federal do Ceará, Faculdade de
Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo e Universidade Federal do Maranhão. Uma pesquisa brasileira23
demonstrou que o interesse pela abordagem da Terapia
Intensiva na graduação médica é considerável e provém
de uma teia de fatores que tem início na curiosidade de
conhecer e estabelecer condutas ao paciente grave, algo
que tanto alunos como professores julgam necessário
para todos os médicos. Identificou-se que o convívio na
Unidade de Terapia Intensiva desperta no graduando de
Medicina reflexões sobre aspectos técnicos e humanos
do profissional médico. Tal estudo concluiu que o aluno
que participa do estágio na Unidade de Terapia Intensiva vivencia experiências diversas do ser médico, que
versam sobre fisiopatologia, terapêutica, ética, equipe
multidisciplinar, comunicação com o próprio paciente e
seus familiares, autolimite. O estágio neste setor auxiliaria a formação generalista do futuro profissional23.
O espaço da Terapia Intensiva nos currículos de
graduação médica vem sendo discutido, em especial
nas últimas décadas, em vários países do mundo. No
Brasil, esse espaço ainda é pequeno e a Associação de
Medicina Intensiva Brasileira incentiva a pesquisa nesta
área para que se amplie a discussão sobre o tema22. Os
trabalhos realizados em nível mundial, incluindo o Brasil, destacam as questões relacionadas às habilidades de
reconhecer o paciente grave, de iniciar precocemente
intervenção de urgência, de executar procedimentos,
de comunicação, de liderança, de integração de conhecimentos básicos com os clínicos e de discutir aspectos
éticos, quando se debate a inclusão da Terapia Intensiva
no ensino médico para o nível de graduação.
48
RESUMO
A Terapia Intensiva é uma especialidade médica que
tem estabelecido sua face educacional nas últimas décadas. Esse artigo faz uma revisão sobre as principais discussões e motivos que levam à inclusão desta especialidade
nos currículos de graduação em nível mundial.
Unitermos: Terapia Intensiva, educação médica, graduação médica, currículo.
AGRADECIMENTOS
Ao Professor Dr. Marcelo Alcântara Holanda, pelo
incentivo.
Ao Professor Dr.Vinícius José da Silva Nina e à Professora Drª Márcia Manir Miguel Feitosa, pela revisão.
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RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
Uso da Noradrenalina no
Choque Séptico em Pediatria
Norepinephrine Use in Pediatric Septic Shock
Aline Schröter Fuentes1, Cristina Malzoni Ferreira Mângia2,
Werther Brunow de Carvalho3, Marcelo Cunio Machado Fonseca4
Abstract
BACKGROUND: There are controversies in the medical literature about the benefits of norepinephrine vasopressure effects.
OBJECTIVE: To evaluate norepinephrine use in the pediatric setting searching for its effects and adverse effects on
hemodynamic parameters.
Design: Review of the medical literature. Medline and Lilacs data bases were searched, from 1980 to 2002, using the
following health descriptors: “septic shock”; “norepinephrine”; “hemodynamic support”; “inotropic support”.
RESULTS: We found 24 articles, 15 were clinical studies (6 randomized, one case series, one cohort study and four
observational studies) but only three of them were clinical trials in pediatric patients, none of them randomized. The
authors analyzed these studies pointing out material and methods, the performed intervention and results. Concerning therapy, dopamine is still the first line vasopressor for high cardiac output, low peripheral vascular resistance
septic shock, however at hyperdinamic shock state there is a reduction of peripheral vascular resistance and a lower
response to cathecolamines due, in part, to intrinsic modifications in alpha adrenergic receptors.
CONCLUSIONS: The literature has demonstrated that dopamine is not so efficacious in children but there are no
pediatric studies showing norepinephrine´s superiority over dopamine. Although we recognize the important role of
norepinephrine in the management of pediatric septic shock, mainly in those resistant to dopamine infusion, more
clinical trials are necessary to confirm its efficacy and safety, as well as, the precise moment of its indication in the
pediatric septic shock.
KEY WORDS: norepinephrine, septic shock, hemodynamic support, pediatric, infant, critical care.
C
om o advento das unidades de cuidados intensivos pediátricos e neonatais, o prognóstico na sepse em crianças tem melhorado,
com redução da mortalidade de 97% em 1960, para
60% em 1980 e 9% em 1999.1
Apesar do suporte ventilatório, monitorização hemodinâmica, terapêutica antimicrobiana,reanimação
fluídica combinada com suporte vasopressor e inotrópico reduzirem a morbimortalidade no choque
séptico, dados recentes demonstram 5,9 mortes por
100.000 crianças com a taxa de mortalidade de 0,6
por 100.000 no grupo de um a quatro anos e 0,2 por
100.000 no grupo de cinco a quatorze anos.2
Dentre os recursos intensivos disponíveis para
melhora da sobrevida no choque séptico, a dopamina
tem sido o vasopressor de escolha. Nos casos de cho-
que refratário, a indicação de noradrenalina pode ser
benéfica, em manter a resistência vascular periférica
adequada, com provável diminuição da disfunção de
múltiplos órgãos.1,3,4
Alguns autores relataram a superioridade da noradrenalina em relação à dopamina, em reverter as alterações do choque com parâmetros de permeabilidade
tecidual mais adequados.3
Efeitos inotrópicos positivos da noradrenalina
no choque séptico também foram documentados por
alguns pesquisadores, com melhora das condições
de pós-carga biventricular e da função ventricular
direita.3
Para a adequada compreensão da aplicabilidade da
noradrenalina no choque séptico é necessário conhecer
alguns aspectos principais sobre a definição e fisiopa-
Ex-médica residente da Unidade de Cuidados Intensivos Pediátrica do Hospital São Paulo e médica assistente do Hospital Santa Catarina
Médica Assistente da Unidade de Cuidados Intensivos Pediátrica do Hospital São Paulo. Vice-coordenadora do programa de especialização Latu-sensu modalidades básico e avançado em Cuidado Intensivo Pediátrico da UNIFESP/EPM. Mestre em Pediatria pela
Universidade Federal de São Paulo. Pós graduando em Doutorado em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo – Escola
Paulista de Medicina
3
Professor Adjunto Livre-Docente do Departamento de Pediatria da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina.
Coordenador do programa de residência médica e especialização Latu-sensu modalidades básico e avançado em Cuidado Intensivo Pediátrico da UNIFESP/EPM. Chefe das Unidades de Cuidados Intensivos Pediátricos do Hospital São Paulo e Hospital Santa Catarina
4
Médico Assistente da Unidade de Cuidado Intensivo Pediátrico do Hospital São Paulo. Mestrando em Medicina pela Universidade
Federal de São Paulo-Escola Paulista de Medicina
Trabalho realizado pela Unidade de Cuidados Intensivos Pediátrica do Hospital São Paulo da Universidade Federal de São Paulo
– Escola Paulista de Medicina
Endereço do autor: Rua Maria da Grã, 333 – casa 16 – Alto Pinheiros – CEP05465-040; Telefone: 3021-3949 / 5576-4288; e-mail:
[email protected] Não houve patrocínio para a realização desse trabalho.
Recebido: 12 de fevereiro 2004 - Aceito: 06 de abril 2004
1
2
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
49
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
tologia do choque séptico. O choque séptico pode ser
definido por variáveis clínicas, hemodinâmicas, celulares e do metabolismo de oxigênio1. O choque séptico
é definido (segundo a American College of Chest Physicians/ Society of Critical Care Medicine Consensus
Conference e pela modificação pediátrica dos sinais vitais baseada em Jafari & McCracken) como sepse com
hipotensão (PS < 65 em lactentes, PS < 75 em crianças,
ou PS abaixo do percentil 5 para a idade ou PS < 90 em
adolescentes), (ou redução em 40 mmHg em relação ao
basal), apesar da reanimação fluídica com a presença de
alteração na permeabilidade que podem incluir, mas não
são limitadas, à acidose láctica, oligúria, ou alteração
aguda no nível de consciência.2
A principal teoria sobre a fisiopatologia do choque
séptico refere a presença de um processo inflamatório sistêmico amplificado com perda do organismo de
sua capacidade de auto-regulação.5
As conseqüências cardiovasculares desta resposta
sistêmica são: disfunção do miocárdio, alteração da
permeabilidade e tônus vascular e alteração do metabolismo de oxigênio.
O choque séptico é classificado como distributivo
com extravasamento do volume intravascular, com
má distribuição do fluxo sangüíneo, diminuição da
resistência vascular sistêmica e alteração da permeabilidade tecidual.6
Em crianças, o choque séptico se apresenta com
hipovolemia grave secundária à ingesta inadequada,
perdas excessivas e aumento da permeabilidade vascular.6
A disfunção miocárdica se inicia precocemente
em crianças ao contrario dos adultos. A causa predominante de mortalidade em adultos com choque séptico é a paralisia vasomotora. Adultos com disfunção
miocárdica manifestam-se com diminuição da fração
de ejeção; entretanto, usualmente mantêm o rendimento cardíaco por dois mecanismos: taquicardia e
dilatação ventricular.1
Em crianças, mais freqüentemente, o rendimento
cardíaco se reduz, com aumento da pós-carga do ventrículo esquerdo e com redução da função ventricular
direita.7
De tal forma que no choque séptico pediátrico,
o principal fator associado com a mortalidade é o
baixo rendimento cardíaco, e não a baixa resistência
vascular sistêmica,ao contrário do que ocorre com os
adultos.1
Ceneviva e col. descreveram 50 crianças com choque séptico resistente à reanimação fluídica. Neste
estudo foram definidos os 3 estados hemodinâmicos
do choque séptico pediátrico: choque hiperdinâmico
50
que são as crianças com alto índice cardíaco e baixa
resistência vascular periférica; o choque com baixo
rendimento cardíaco e alta resistência vascular periférica e o choque com baixa resistência vascular periférica e baixo rendimento cardíaco. Foi relatado que
a maioria das crianças possuía baixo. Estes estados
hemodinâmicos podem freqüentemente progredir,
oscilar, mudando durante as primeiras 48 horas da
evolução da doença.8
TERAPÊUTICA META-DIRIGIDA - USO DA
NORADRENALINA NO CHOQUE SÉPTICO
Além do conhecimento sobre os estados hemodinâmicos para uma terapêutica dirigida, deve-se objetivar a manutenção de índice cardíaco entre 3,3-6,0
l/min/m2 com melhora da sobrevida. A oferta de oxigênio, ao contrario dos adultos, e não a extração de
oxigênio é o maior determinante do consumo de oxigênio em crianças. Então, deve-se manter consumo
de oxigênio maior que 200ml/min/m2 , para melhora
do prognóstico.1
A dopamina continua como vasopressor de primeira linha para o choque com alto rendimento
cardíaco e baixa resistência vascular periférica em
adultos. Uma recente revisão sobre o choque séptico pediátrico também recomenda a dopamina como
vasopressor de primeira linha no choque refratário à
fluidos.1No entanto, a literatura vem demonstrando,
que há uma insensibilidade idade específica à dopamina. A dopamina causa vasoconstrição por liberação de noradrenalina através de vesículas simpáticas.
Animais imaturos e humanos jovens podem ainda
não apresentar estas vesículas simpáticas totalmente
formadas, explicando assim a refratariedade ao uso
desta droga.1,9
No estado de choque hiperdinâmico, vai ocorrendo diminuição da resistência vascular periférica e
cada vez menor resposta à catecolaminas, em parte
por alterações intrínsecas dos receptores alfa adrenérgicos. A dopamina tem sido reportada cada vez
menos eficaz em crianças e nos casos resistentes há
comumente resposta à noradrenalina.1,8
A noradrenalina é uma catecolamina endógena
com ações alfa e beta agonistas. Ela é um mediador
natural da atividade do sistema nervoso simpático,
sendo secretada nas terminações pós-sinápticas e
também pelo córtex da suprarrenal. Apresenta ação
inotrópica e cronotrópica positivas, quando em baixas doses, com invariável elevação da pressão arterial e débito cardíaco. Em altas doses seu principal
efeito é o aumento da resistência vascular periférica
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
por alfa vasoconstrição.10
Verificou-se, assim que ainda existem controvérsias na literatura sobre a utilização da noradrenalina
e se os efeitos benéficos vasopressores permitem perfusão tecidual adequada, mesmo que, na última década, alguns estudos tenham demonstrado a melhora
do fluxo urinário e perfusão esplâcnica com o uso da
noradrenalina.3
Assim os autores avaliaram as indicações atuais da
noradrenalina no choque séptico com ênfase na faixa
etária pediátrica, procurando abordar seus efeitos benéficos e adversos e sua ação sobre parâmetros hemodinâmicos, baseados em uma revisão da literatura.
“inotropic support”.
Foram selecionados todos os tipos de estudos, em
humanos, em todas as idades, e somente aqueles em
inglês, português e espanhol.
RESULTADOS
Foram encontrados 24 artigos e selecionados 9
artigos de revisão e 15 estudos clínicos (6 aleatórios,
1série de casos, 1 coorte e 4 observacionais) demonstrando a aplicabilidade da noradrenalina no choque
séptico.
Quando limitou-se a idade à faixa etária pediátrica, foram selecionados apenas 3 estudos clínicos
(nenhum deles aleatório) e 5 artigos de revisão.
As tabelas 1 e 2 demonstram os artigos encontrados, o metodo utilizado, bem como as intervenções realizadas e os resultados obtidos em cada um
dos estudos, tanto em pacientes adultos como em
crianças.
METODO
Realizada revisão de artigos publicados entre
1980 e 2002 nas bases de dados: Lilacs e Medline.
Foram utilizadas como palavras chaves: “septic
shock”; “norepinephrine”; “hemodynamic support”;
Tabela 1 – Estudos em Pacientes Adultos Utilizando a Noradrenalina no Choque Séptico
Estudo
No.
1
1º. autor
ano
2000
Referência
no.
3
Desenho
do estudo
Nível III
No.
pacientes
97
Martin C
2
Martin C
1993
4
Nível II
37
3
Martin C
1994
14
Nível V
9
4
Schreuder WO
1989
10
Nível II
10
5
Martin C
1990
16
Nível III
23
6
7
Ambruster C
Hoogenberg K
1993
1998
18
20
Nível II
Nível II
56
7
8
9
Metrangolo L
Levy B
1995
1997
22
19
Nível IV
Nível II
67
30
10
Hanneman L
1995
21
Nível III
25
11
Marik PE
1994
17
Nível II
20
12
Hayes MA
1992
23
Nível V
4
Resultados
Redução da mortalidade em 38% versus 18% com
outras drogas
Reversão do choque em 93% dos pacientes versus
31% com dopamina
Melhora PAM, RVS, PAP, IRVP, PSFVD (p< 0,05). IC
estável
Melhora da PAM, PVC,IC, RVS (p<0,02) ação
semelhante à dopamina
Melhora da PAM, RVS (p<0,02) .IC estável.
Associação dobutamina + noradrenalina: aumento no
IC (p<0,05)
Melhora PAM, RVS (p< 0,05). IC sem alteração
Grupo Dopamina + Noradrenalina versus
Noradrenalina baixa dose isolada ação semelhante
sobre o fluxo renal
Melhora da função de VE nos sobreviventes (p<0,05)
Grupo Adrenalina : aumento lactato e redução do
pHi (p< 0,01)
Grupo Noradrenalina: redução lactato e aumento do
pHi (p< 0,01)
Grupo 1 - Dobutamina aumento do IC em 20%
versus Grupo 2- dobutamina + Noradrenalina: IC
aumentou em 33% (p< 0,01)
Grupo 1 Noradrenalina aumento da PAM, RVS, IC e
pHi (p< 0,01)
Grupo 2 Dopamina redução do pHi (p=0,02)
Gangrena periférica com uso de Noradrenalina
IC=Índice Cardíaco; PAP = Pressão Artéria Pulmonar; PAM=Pressão Arterial Média; RVS=Resistência Vascular Sistêmica; pHi = pH intramucoso; IRVP=
Índice de Resistência Vascular Pulmonar; PSFVD = Pressão sistólica final de ventrículo direito. Nível II= estudos aleatórios com numero pequeno de
casos; Nível III = estudo não aleatório, caso-controle contemporâneo, Nível IV = estudo não aleatório, controle histórico; Nível V = série de casos
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
51
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
Tabela 2 - Estudos Pediátricos Utilizando a Noradrenalina no Choque Séptico
Estudo
No.
1
2
1º. autor
ano
1998
1995
Referência
no.
8
24
Desenho
do estudo
Nível V
Nível III
No.
pacientes
50
31
Ceneviva G
Wong HR
3
Fioretto JR
1993
13
Nível V
104
Resultados
Associação inotrópico + vasopressor 91% de sobrevida
Resposta reduzida a Noradrenalina durante o choque é
mediada pelo NO
Estudo descritivo relatando a utilização da
noradrenalina no choque séptico refratário
NO= óxido nítrico. Nível III = estudo não aleatório, caso-controle contemporâneo; Nível V = série de casos
DISCUSSÃO
O choque séptico em pediatria contínua com alta
morbidade e com mortalidade de aproximadamente
de 20% a 40%.
Nenhuma outra terapêutica específica que a reanimação fluídica, o tratamento da causa infecciosa e o
suporte hemodinâmico têm sido capazes de melhorar
a sobrevida em pacientes pediátricos e adultos com
choque séptico.7
Dentro do suporte hemodinâmico, a noradrenalina
foi usada com sucesso no passado e vem adquirindo
maior popularidade atualmente.11
Em recente revisão, Task Force Comittee (2002),
utilizou-se como referências, na sua maioria, estudos
em adultos para a indicação de noradrenalina no tratamento do choque séptico pediátrico.1
Esta revisão selecionou 15 estudos clínicos, sendo
apenas 3 estudos pediátricos e foram abordados, não
apenas a indicação de noradrenalina no choque séptico com ênfase na faixa pediátrica, mas também seus
efeitos hemodinâmicos, efeitos sobre o fluxo urinário, sobre metabolismo aeróbico e anaeróbico.
EFEITOS HEMODINÂMICOS
A maioria dos estudos em adultos indica a noradrenalina no choque séptico hiperdinâmico refratário
à dopamina.12 Com relação aos estudos pediátricos,
Ceneviva e Fioretto também indicaram o uso da noradrenalina nos casos com baixa resistência vascular
periférica e principalmente naqueles associados com
alto rendimento cardíaco, assim como nos choques
dopamina resistentes.8,13
A maioria dos estudos em adultos mostraram um
aumento na pressão arterial média, de forma significante com a norepinefrina.3,4,14-21
Martin e col., em estudo aleatório controlado
em adultos com choque séptico hiperdinâmico, observaram aumento significante na pressão sistólica,
significante, com a infusão de noradrenalina com
dose de 0,5 a 5 μg/kg/min, por seu efeito em alfa
52
receptores.4 Outros estudos corroboram este mesmo
resultado.3,4,14-18
EFEITOS INOTRÓPICOS
Estudos recentes confirmam o efeito inotrópico da
noradrenalina, com aumento da pós-carga biventricular, com aumento significante da função ventricular
direita.7,9
Isto seria explicado em parte por estímulos beta-1
e por correção da hipotensão seguido por aumento da
pressão de permeabilidade coronariana.3
Metrangolo e col., em estudo de série de casos
em adultos, mostraram que a melhora na função
ventricular esquerda é um marcador de sobrevida no
choque séptico.22
Nessa revisão, apenas oito estudos em adultos
avaliaram os efeitos inotrópicos da noradrenalina.
Em seis estudos, a infusão de noradrenalina não
alterou significantemente o índice cardíaco.4,14-18 Em
duas pesquisas17,19, houve aumento do índice cardíaco
mas em um deles a noradrenalina estava associada
com a dobutamina.19
Schreuder e col. relataram em estudo aleatório
que apesar da noradrenalina não aumentar o índice
cardíaco, a fração de ejeção de ventrículo esquerdo
e o volume de ventrículo direito, ocasionou elevação da resistência vascular pulmonar. Neste estudo,
apesar do aumento da pós-carga, ocorreu melhora
na relação entre a oferta e o consumo de oxigênio de
ventrículo direito sendo a noradrenalina tão efetiva
quanto à dopamina na performance do ventrículo
direito.15
A elevação da resistência vascular pulmonar e
do índice de performance de ventrículo direito, com
melhora da função ventricular direita com a noradrenalina foi demonstrada em estudo observacional,
realizado por Martin e col.14
O aumento do índice cardíaco, da fração de ejeção
de ventrículo direito e do índice de trabalho de ventrículo esquerdo com o uso da noradrenalina foram
relatados por Marik em estudo aleatório.17
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
Os estudos em crianças não analisaram os efeitos
inotrópicos da noradrenalina.
EFEITOS NO FLUXO URINÁRIO
E FUNÇÃO RENAL
A relutância no uso de substâncias alfa-adrenérgicas durante a década passada pode ser explicada
pelo fato de que o aumento da resistência vascular
sistêmica para manter o índice cardíaco poderia levar à insuficiente permeabilidade de órgãos vitais.
Particularmente, devido ao alto risco de insuficiência
renal aguda em pacientes sépticos.18
Entretanto, nos últimos anos, os autores observaram um aumento do fluxo urinário com utilização da
noradrenalina.
Nessa revisão, tal variável foi avaliada em apenas
quatro estudos em pacientes adultos.
Redl Wenzl e col., em estudo prospectivo aleatório
controlado demonstraram aumento da depuração da
creatinina de forma significativa em adultos recebendo noradrenalina com dose inicial de 0,05μg/kg/min
até manter a pressão arterial média maior que 60.18
Em outros dois estudos em adultos, foi demonstrado
aumento do fluxo urinário com noradrenalina.4,16
Em apenas um estudo, foi verificado diminuição
não significante do fluxo urinário com noradrenalina,
mas com aumento na fração de filtração glomerular
com a droga em baixas doses.19
O fluxo urinário diminui como resultado da pressão de perfusão glomerular. A noradrenalina tem
maior efeito na resistência arteriolar eferente que na
aferente, com aumento na fração de filtração, normalização da resistência vascular renal, restabelecendo
então o fluxo urinário.7
Outro mecanismo para explicar o fato da noradrenalina aumentar o fluxo urinário, seria através da
diminuição da liberação do hormônio antidiurético.
Baroreceptores e receptores sino-aórticos e cardíacos
são sensíveis à pressão e nos pacientes com restauração da pressão arterial, provavelmente ocorrerá
inibição da secreção do hormônio.3,4
Os estudos pediátricos não avaliaram os efeitos
renais da noradrenalina.
EFEITOS NO METABOLISMO
AERÓBICO E ANAERÓBICO
Com relação aos efeitos da noradrenalina no metabolismo de oxigênio, os resultados são conflitantes.
Seis estudos em adultos avaliaram os efeitos da
droga neste parâmetro. Marik e col. mostraram auVolume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
mento significativo da oferta de oxigênio em adultos
com infusão de noradrenalina de 0,18± 0,06 μg/kg/
min.17 Outros dois estudos em adultos mostraram
também este mesmo resultados.16,19. Em relação à
oferta de oxigênio, dois estudos não mostraram diferença com o uso da noradrenalina.4,18 Um estudo
mostrou diminuição da oferta de oxigênio com a
noradrenalina, em comparação com a dopamina15.
O consumo de oxigênio aumentou com a infusão de
noradrenalina em quatro estudos.4,16,17,19
Não houve diferença no consumo de oxigênio em
dois estudos.4,15 A extração de O2 aumentou em dois
estudos.4,15 Com relação ao metabolismo anaeróbico,
a concentração sérica de lactato não se modificou
com a noradrenalina em três estudos,17,18,19 e diminuiu
em apenas um estudo.4
Os estudos pediátricos não avaliaram esse parâmetro.
EFEITOS NA PERFUSÃO TECIDUAL
O conceito que a vasoconstrição excessiva, causada pela noradrenalina poderia levar à isquemia
esplâcnica, está ultrapassado.3
O pH gástrico intramucoso avalia a perfusão mesentérica, sendo a sua redução um indicador de prejuízo na utilização de oxigênio pelo tecido esplâcnico.
Marik e col. mostraram que o uso da noradrenalina resultou em aumento do pH intramucoso gástrico,
enquanto que com a dopamina houve redução do pH
gástrico intramucoso. Então, ocorreu um aumento
descompensado da necessidade de oxigênio com a
dopamina, e uma melhora na utilização de oxigênio
esplâcnico com a noradrenalina.3,17
Um aumento no fluxo sangüíneo esplâcnico e da
entrega de oxigênio em pacientes adultos em uso
da noradrenalina foi relatado por Likewise e col. 3
Portanto, a terapêutica com a noradrenalina deve
ser baseada, não apenas em reverter a hipotensão mas
também em adquirir padrão ótimo em termos do metabolismo de oxigênio e perfusão tecidual. Este parágrafo não foi avaliado nos estudos pediátricos.
EFEITOS ADVERSOS
A noradrenalina poderia ser prejudicial em altas
doses, resultando em vasoconstrição periférica grave
e gangrena de membros.11
Apenas um estudo, um relato de 4 casos clínicos
em adultos mostrou associação da noradrenalina em
choque séptico e o surgimento de gangrena periférica
simétrica.23
53
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
Neste estudo, com um número restrito de casos,
não foi possível determinar se o principal fator desencadeante da gangrena periférica, foi o choque, a
CIVD, ou a administração de noradrenalina.
Há uma especulação que a noradrenalina poderia
contribuir para disfunção de múltiplos órgãos aumentando a mortalidade. Gonçalves e col. analisaram a
relação entre noradrenalina e disfunção múltipla e
concluíram que a noradrenalina falhou como preditor
de mortalidade, não estando associada à disfunção de
múltiplos órgãos.
DOPAMINA VERSUS NORADRENALINA
Apesar da dopamina ser considerada a droga vasopressora de escolha no choque séptico pediátrico, há
casos refratários à dopamina, onde a noradrenalina
mostrou ser benéfica.
Em estudos em adultos foi relatada uma superioridade da noradrenalina, em relação à dopamina, em
reverter as alterações do choque.
Martin e col., em estudo aleatório controlado
com 32 adultos com choque séptico hiperdinâmico,
demonstrou que 93% dos pacientes recebendo noradrenalina tiveram sucesso em reverter o choque, enquanto que apenas 31% dos pacientes com dopamina
conseguiram o mesmo efeito.4
Foi documentado por Marik e col., que a dopamina poderia ter efeito deletério na balança de oxigênio
enquanto que a noradrenalina poderia melhorar o uso
de oxigênio esplâcnico.17
Em relação aos efeitos inotrópicos, a noradrenalina pode ser tão efetiva quanto a dopamina, como
demonstrado em estudo aleatório realizado por
Scheuder, em adultos.15
Há controvérsias, se baixas doses de dopamina
durante a infusão de noradrenalina, traria alguma
melhora no fluxo urinário.20,21
Não existem pesquisas em crianças comprovando
a superioridade da noradrenalina em relação à dopamina em reverter as alterações do choque.
Mas a literatura vem demonstrando uma insensibilidade idade específica à dopamina, que tem sido reportada como cada vez menos eficaz em crianças.1,8
Segundo revisão recente (2002), a dopamina continua sendo o vasopressor de escolha no choque séptico pediátrico, sendo a noradrenalina indicada nos
casos refratários à dopamina.
NORADRENALINA VERSUS ADRENALINA
Nesta revisão, há apenas um estudo aleatório em
54
adultos que comparou os efeitos hemodinâmicos, de
metabolismo do lactato e as variáveis de tonometria
gástrica da associação dobutamina - noradrenalina
com a adrenalina no choque séptico hiperdinâmico.
Não foram observadas diferenças significativas nas
medidas hemodinâmicas, mas em relação aos efeitos
metabólicos e de utilização de oxigênio esplâcnico,
a combinação noradrenalina-dobutamina mostrou
ser mais apropriada. A utilização de adrenalina demonstrou alterações metabólicas e uso inadequado de
oxigênio,apesar de transitórias19.
Em crianças não há estudos comparando a eficácia
e segurança da noradrenalina com a adrenalina.
CHOQUE RESISTENTE À NORADRENALINA
Joseph A. Carcillo, utilizando 31 crianças com
sepse e 16 casos sem sepse como controle, realizou
medidas séricas de nitrito e nitrato como um indicador da produção de óxido nítrico endógeno. As
crianças sépticas, principalmente as hipotensas, possuíam maiores concentrações de nitrito e nitrato. Nas
cinco crianças que receberam noradrenalina, haviam
maiores concentrações de nitrito e nitrato, que eram
associadas com maior necessidade da droga para
manter a pressão arterial média no percentil 50 para
a idade.Então a hiporesponsividade à noradrenalina
durante a sepse pode ser em parte um processo óxido
nítrico mediado.24
CONCLUSÕES
A maioria dos estudos pediátricos e adultos
evidenciou o uso da noradrenalina no choque séptico hiperdinâmico, ou seja, naqueles com baixa
resistência vascular periférica e alto rendimento
cardíaco, principalmente nos choques refratários
à dopamina. Revisão recente sobre choque séptico pediátrico realizada pelo comitê “Task Force”,
recomenda o uso da noradrenalina como droga de
escolha nos choques hiperdinâmicos resistentes
à dopamina, utilizando como referências para tal
indicação, muitos estudos em adultos ou ensaios
pediátricos não aleatórios.
Entretanto, a fisiopatologia do choque e a resposta
terapêutica é idade dependente. Então, estudos aleatórios controlados em pediatria são necessários para
confirmar a indicação precisa da noradrenalina no
choque séptico pediátrico.
Em pacientes adultos a noradrenalina aumenta
a pressão arterial média por aumento da resistência
vascular sistêmica e, parece possuir também efeitos
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
inotrópicos positivos. Com relação aos efeitos renais,
em adultos, a maioria dos estudos demonstraram um
aumento do fluxo urinário, sem evidenciar piora da
permeabilidade tecidual com a droga.
Com relação aos metabolismos aeróbico e anaeróbico, os estudos em adultos mostram dados conflitantes.
Pesquisas sobre os efeitos hemodinâmicos, renais,
metabólicos e de perfusão tecidual são necessários
em pediatria.
Apesar do papel importante da noradrenalina no
choque séptico pediátrico, principalmente nos choques resistentes à dopamina, mais estudos são necessários para confirmar sua eficácia e segurança , assim
como sua a indicação precisa nesta entidade clínica.
ção nos pacientes pediátricos com choque séptico.
Unitermos: norepinefrina, choque séptico, suporte hemodinâmico, pediatria, lactentes, cuidados
intensivos.
REFERÊNCIAS
1.
2.
3.
4.
5.
RESUMO
6.
Justificativa: Há controvérsias na literatura médica sobre o uso e os benefícios da noradrenalina.
Objetivo: Avaliar o uso da norepinefrina em pediatria salientando seus efeitos, e eventos adversos
nos parâmetros hemodinâmicos.
Método: Revisão da literatura médica. As bases
de dados Medline e Lilacs foram revisadas, de 1980
a 2002, utilizando os seguintes descritores de saúde:
“choque séptico”; “norepinefrina”; “suporte hemodinâmico”; “suporte inotrópico”.
Resultados: Foram encontrados 24 artigos. 15
eram estudos clínicos (6 aleatórios, uma série de
casos, um estudo de coorte e quatro estudos observacionais), mas somente três deles eram estudos
clínicos em pacientes pediátricos, nenhum deles aleatório. Os autores analisaram os estudos mostrando
o método, a intervenção realizada e os resultados.
Em relação à terapêutica, a dopamina é ainda o
vasopressor de primeira linha para casos de choque
séptico com débito cardíaco alto e baixa resistência
vascular periférica. Entretanto, no estado de choque
hiperdinâmico há uma redução da resistência vascular periférica e baixa resposta às catecolaminas
devido, em parte, a modificações intrínsecas nos
receptores alfa-adrenérgicos.
Conclusões: A literatura demonstra que a dopamina não é tão eficaz em crianças, mas não há estudos
pediátricos mostrando superioridade da norepinefrina
sobre a dopamina. Embora os autores reconheçam o
importante papel da norepinefrina no manuseio do
choque séptico pediátrico, principalmente naqueles resistentes a infusão de dopamina, mais estudos clínicos
são necessários para confirmar a sua eficácia e segurança, assim como, o momento preciso da sua indica-
7.
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
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55
RBTI / RELATO DE CASO
Obliteração Angiográfica da Artéria Brônquica para
Tratamento de Hemoptise Maciça Secundária à
Pneumonia Estafilocócica Necrotizante
Angiografic Embolization of the Bronchial Artery in the Treatment of Massive
Hemoptysis Secondary to Necrotizing Staphylococcal Pneumonia
Sergio R. Penteado Filho1.; Nelson Mozachi2; Virginia Helena Soares de Souza3,
Rodolfo Castro Cesar de Oliveira4; Rogério Luz Coelho Neto4 Suzana Boscardin Pereira4, Gelson Kupper5
Abstract
Massive hemoptysis is a life-threatening condition with dismal prognosis. Medical therapy alone is often inadequate
for bleeding control, and surgery during active bleeding results in high morbidity and mortality. In these cases, bronchial artery embolization is an excellent alternative for massive hemoptysis control. We discuss the literature and
report a case of a necrotizing Staphylococcal aureus pneumonia complicated by massive hemoptysis, which was
successfully managed with bronchial artery embolization.
KEY WORDS: hemoptysis, angiografic embolization, Staphylococcus aureus, pneumonia
A
ocorrência de hemorragia pulmonar maciça é
evento de extrema gravidade e de prognóstico
reservado. A mortalidade pode chegar a 75%
com hemorragia superior a 600 ml em 16 horas ou taxa
de sangramento superior a 150 ml por hora se for manuseado apenas com tratamento clínico 1. As condutas disponíveis para o seu controle são: tratamento conservador
(oxigenioterapia, posicionamento do paciente em semiFowler, reposição volêmica); procedimentos endoscópicos (lavagem brônquica com solução fisiológica gelada,
tamponamento com cateter balão ou de Fogarthy); tratamento cirúrgico (ressecção do local afetado) e embolização das artérias brônquicas (EAB)3,8. Nos casos em que
a cirurgia não pode ser executada, como em pacientes
com reserva pulmonar inadequada a embolização das
artérias brônquicas(EAB) torna-se alternativa terapêutica
de escolha8. O presente estudo tem como objetivo revisar
a utilização da embolização ou obliteração angiográfica
das artérias brônquicas na hemoptise maciça, e relatar um
caso de hemoptise pulmonar maciça tratada com sucesso
com obliteração do tronco da artéria brônquica.
do no Hospital Universitário Evangélico de Curitiba,
por apresentar quadro de abcesso no lábio inferior
com septicemia e extenso acometimento pulmonar
(Figura 1).
Figura 1 - Aspecto Tomográfico de Pneumonia
Estafilocócica Necrotizante
RELATO DO CASO
Paciente do sexo masculino, 20 anos, foi interna1. Professor da Disciplina de Infectologia da Faculdade Evangélica do Paraná.
2. Chefe do Serviço de Terapia Intensiva do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba.
3. Médica Intensivista do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba
4. Acadêmico do Curso de Medicina da Faculdade Evangélica do Paraná.
5. Angiografista intervencionista do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba
* Trabalho realizado pelos Serviços de Terapia Intensiva e Infectologia do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba e Disciplina
de Infectologia do Curso de Medicina da Faculdade Evangélica do Paraná
Endereço para correspondência: Prof. Dr. Sérgio R. Penteado Filho - Av. Iguaçu, 3560/09 - 80240-031 Curitiba, PR - Telefones:
(41)243-01-59 / (41) 91-06-92-58 / (41) 99-06-20-47 - E-mail: [email protected]
Recebido: 27 de Novembro 2003 - Aceito: 04 de abril 2004
56
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
Após 13 dias de tratamento com rifampicina e oxacilina o paciente apresentava-se clinicamente estável, quando
apresentou dor torácica súbita, choque hipovolêmico e insuficiência respiratória por hemoptise maciça (aproximadamente 2.000 ml). Foi prontamente intubado, ventilado com
PEEP elevado, recebeu reposição volêmica e transfusão
sangüínea. Trinta minutos após o início do quadro, foi realizada broncoscopia, onde foi observada a presença de sangue
nas vias aéreas sem definição do local de sangramento. A
seguir foi realizada angiografia pulmonar que constatou impregnação anômala do parênquima nos lobos médio direito
e superior esquerdo (Figura 2). Foi realizada embolização
destas áreas utilizando-se partículas calibradas de álcool polivinílico e gelfoam (Figura 3). Após o procedimento não
Figura 2 - Cateterismo Seletivo da Artéria Brônquica PréEmbolização, Evidenciando Sinais de Vasculite e Hemorragia.
Figura 3 - Pós-Embolização Seletiva com Gelfoan,
Evidenciando Desaparecimento do blush Arterial
Periférico e Parada da Hemorragia.
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
ocorreram novos sangramentos. O paciente recebeu
alta da UTI 10 dias após o episódio e alta hospitalar
após 37 dias de internação. Observou-se recuperação clinica da função pulmonar, confirmada através
de espirometria e teste gasométrico, realizado após
6 meses e 1 ano de seguimento. Não houve mais
ocorrência do sangramento.
DISCUSSÃO
A hemoptise maciça é uma situação que necessita intervenção médica imediata devida à alta morbimortalidade 2,10,11. Tem como principais causas:
tuberculose, bronquiectasias, abcesso pulmonar,
pneumoconiose, aspergiloma e neoplasias 2,3,4,8,11,15.
De acordo com a literatura, a angiografia da artéria brônquica e a embolização para o diagnóstico
e o tratamento da hemoptise, eram reservadas aos
casos nos quais não se obtinha controle do quadro
através do tratamento clínico ou cirúrgico 4,6. Entretanto a EAB tem sido indicada, por alguns autores,
como tratamento de escolha para hemoptise grave
e recorrente 9,12.
Relatos na literatura atribuem altas taxas de
morbidade ao tratamento cirúrgico, isto ocorre
devido ao sangramento intra-operatório, asfixia,
fístula broncopleural, falência respiratória, ataque
cardíaco hipóxico e embolia gasosa 2-4,8.
Estudos mostram vantagens da EAB como terapia pré-operatória em casos de hemoptise grave,
em pacientes instáveis do ponto de vista respiratório e/ou hemodinâmico 4.
Para a correta realização da embolização da artéria brônquica é necessária a presença de radiologista intervencionista com adequado conhecimento
da anatomia dos vasos pulmonares 9. A anatomia
vascular da artéria brônquica e o suprimento arterial pulmonar, são acompanhados de inúmeras
variantes anatômicas, sejam elas congênitas ou adquiridas; um exemplo são os quadros de insuficiência coronariana, que fazem um recrutamento arterial através dos vasos brônquicos, ou as variantes
intercostais que irrigam a medula. Estas alterações
são importantes e devem ser reconhecidas para se
evitar complicações subsequentes, que consistem
em deslocamento inadvertido do cateter, dissecção
subintimal da artéria, refluxo do material embolizante para a luz aórtica, possibilidade de lesões
coronarianas e/ou medulares devido às possíveis
comunicações vasculares e ocorrência de fístula
broncoesofágica. No entanto, estas lesões são de
baixa incidência ocorrendo em menos de 0,5% dos
57
RBTI / RELATO DE CASO
casos; além disso, um radiologista intervencionista
pode detectar artérias potencialmente perigosas
durante o procedimento, diminuindo a frequência
destas complicações 4,7,12.
A hemoptise maciça tem sido facilmente controlada por EAB com uso de particulas de Ivalon
(polyvinyl alcohol) e Gelfoam (gelatin sponge) 4,5,13.
Em várias séries de casos publicadas relatou-se
controle imediato do sangramento em 94% a 100%
dos casos 4,13,14 em paralelo os índices de sucesso
através do procedimento cirúrgico encontram-se
entre 98% e 100% 1,3. Stebbings e col. encontraram
melhores resultados com a execução da EAB quando comparada aos métodos de tratamento clínico
conservador no controle imediato da hemoptise
maciça 11.
Após 6 meses de acompanhamento, têm sido relatados episódios de recorrência em cerca de 20%
a 33,3% dos pacientes submetidos a EAB, em 36%
a 40% dos pacientes que receberam tratamento clínico, e 0% a 2% com o tratamento cirúrgico 1,4,8,13.
A recorrência da hemoptise em pacientes tratados
com EAB, têm como causas embolização parcial,
recrutamento de outros vasos colaterais sistêmicos,
recanalização da artéria embolizada ou progressão da doença de base 9. Foi observado aumento
da recorrência em pacientes tratados com EAB:
com sangramento de outro local que não a artéria
brônquica, sangramento de múltiplas artérias e
história de sangramento maciço ou recorrente das
vias aéreas 10. Também foi encontrado como fator
significativo o controle inadequado da inflamação
causada pela doença de base, nos casos de vasculite pulmonar 14.
A longo prazo não há diferença significativa em
relação às taxas de mortalidade entre os pacientes
submetidos à ressecção cirúrgica ou à embolização
como terapia definitiva 4.
A decisão quanto ao tipo de procedimento a ser
indicado deve ser realizada a partir de análise clínica criteriosa pela equipe cirúrgica e pelo intensivista. A impossibilidade de manutenção de níveis
pressóricos, crase sanguínea e ventilação adequada
podem ser determinantes de contra-indicação cirúrgica, nestes casos a utilização de procedimentos
radiológicos intervensionistas podem ser alternativa terapêutica definitiva ou paliativa, permitindo a
diminuição do sangramento e ganho de tempo para
a melhora de parâmetros clínicos que permitam intervenções cirúrgicas mais invasivas.
Em conclusão, o procedimento de oclusão da
58
artéria brônquica é eficaz para controle de sangramentos maciços pulmonares, e pode ser alternativa
aos procedimentos cirúrgicos em paciente clinicamente instáveis em unidades de terapia intensiva.
RESUMO
A Hemoptiase maciça é uma condição clínica
que acarreta risco de vida com prognóstico reservado. O tratamento com medidas conservadoras
é frequentemente insuficiente para controle da
hemorragia.e os procedimentos cirúrgicos em vigência de sangramento pulmonar ativo resultam
em alta morbidade e mortalidade; nestes casos a a
embolização arterial brônquica é uma alternativa
terapêutica para controle da hemoptiase maciça.
O presente artigo propõe-se a revisar a literatura
sobre o assunto e relata um caso de hemorragia
pulmonar maciça secundária a pneumonia estafilocóccica necrozante tratada com sucesso através da
embolização da artéria brôquica.
Unitermos: hemoptise, angiografia, embolização,
Staphylococcus aureus, pneumonia necrozante.
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RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
Nó em Cateter na
Veia Jugular Interna
Knot in Internal Jugular Vein Catheter
William Wobber Cardoso Barros1, Felipe José Silva Melo Cruz2,
Renato Duarte Barbosa3, Sabas Carlos Vieira4
Abstract
We report a rare complication of right internal jugular vein cannulation in a patient with colon adenocarcinoma
submitted to a right half colon resection. The catheterization occurred without problems but the control chest X ray
showed a bent of catheter into the internal jugular vein. However, it was decided to stay with catheter in his place
until the discharge of the patient from the hospital because it had a good infusion and a normal reflux and the patient
was without complains. When was tried to remove the catheter, the patient complained of pain. A next chest-X ray
showed a curly of the extremity of catheter, which had to be removed by surgery. There was a curly and a thrombus
1,5 centimeter from the extremity of catheter.
KEY WORDS: Curly, knot, venous catheter, complications.
O
acesso venoso central em pacientes internados em unidades de terapia intensiva é
um procedimento realizado freqüentemente, todavia passível de ampla variedade de complicações relacionadas tanto à inserção quanto à manipulação do cateter. Dentre as complicações mecânicas
mais freqüentes, as quais são causadas em geral
durante a inserção do cateter, destacam-se pneumotórax, embolia gasosa, hemorragia e punção arterial
inadvertida. A manipulação do cateter, por sua vez,
está relacionada à complicações de natureza infecciosa1-5. Apresentamos um caso raro de nó em cateter
venoso central na veia jugular interna necessitando
de intervenção cirúrgica para remoção do cateter.
um cateter de nylon número 14 de 30 cm de comprimento. A punção transcorreu sem incidentes. A radiografia de tórax de controle mostrou que o cateter
estava dobrado na veia formando uma alça (Figura
01). Entretanto, como apresentava boa infusão e
refluxo sanguíneo normal, optou-se por mantê-lo
posicionado para hidratação venosa da paciente, já
Figura 1: Radiografia de tórax de controle mostrando
o cateter dobrado na veia formando uma alça.
RELATO DE CASO
Paciente do sexo feminino, 79 anos de idade, com
diagnóstico de adenocarcinoma de cólon direito,
submeteu-se a hemicolectomia direita por via laparotômica transcorrendo a cirurgia sem incidentes.
Na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) foi realizada uma punção de veia jugular interna por via
posterior ao músculo esternocleidomastóideo para
colocação de cateter venoso central, utilizando-se
Trabalho realizado no Hospital São Marcos e na Universidade Federal do Piauí. (1) Residente em Cirurgia Geral do Hospital Getúlio
Vargas / UFPI;
(2) Acadêmico de Medicina da Universidade Federal do Piauí;
(3) Cirurgião Vascular do Hospital São Marcos;
(4) Cirurgião Oncológico do Hospital São Marcos - Professor Auxiliar da Universidade Federal do Piauí
Endereço para correspondência: Rua 06, nº 2109, casa V, Condomínio Tropical Park, Bairro Santa Lia, Teresina-PI; CEP: 64055150; Tel/Fax: (86) 226-1555; e-mail: [email protected]
Recebido: 25 de novembro 2003 - Aceito: 01 de dezembro 2003
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
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RBTI / RELATO DE CASO
que ela apresentava-se estável e sem necessidade de
mensuração da pressão venosa central. No segundo
dia de pós-operatório (DPO) a paciente recebeu alta
da UTI. No sexto DPO teve alta hospitalar. No momento da retirada do cateter a paciente referiu dor
local intensa não sendo possível a retirada do cateter. Foi então realizada uma radiografia de tórax que
demonstrou um nó na ponta do cateter. A paciente
foi submetida a retirada cirúrgica do cateter através
de cervicotomia longitudinal direita com exposição
e flebotomia da veia jugular interna direita (Figura
02). O cateter apresentava um nó a 1,5 centímetros
da extremidade distal e um trombo (Figura 03). Foi
realizada a rafia da veia e sutura da pele. A paciente
recebeu alta hospitalar no oitavo dia de internação.
Encontrava-se assintomática um mês após a realização do procedimento.
Figura 2: Cervicotomia longitudinal direita com
exposição e flebotomia da veia jugular interna direita
Figura 3: Cateter com nó e trombo removidos
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DISCUSSÃO
No presente caso optou-se pela remoção cirúrgica do cateter já que o mesmo apresentava-se
íntegro. Outra opção seria a remoção através de
radiologia intervencionista.
A ocorrência de nó em cateter venoso central
é um evento pouco freqüente. Na base de dados
Pubmed ® encontrou-se 14 trabalhos utilizando a
associação “curl in central venous catheter” ou
“knot in central venous catheter”. O primeiro foi
a ocorrência de síndrome de veia cava superior
secundária a um nó no cateter venoso central em
um paciente com linfoma. A resolução deste caso
ocorreu através de radiologia intervencionista 6.
O segundo caso foi a ocorrência de um nó em
cateter venoso através de cateterização de veia
basílica 7. No terceiro caso formou-se um nó após
a punção da veia subclávia que foi percebido ao se
tentar posicionar o cateter ainda conectado ao fioguia no interior da veia. O nó folgou ao se retirar
somente o fio-guia o que permitiu a retirada do
cateter sem lesão da parede venosa 8.
O outro relato menciona a formação de um nó
de 3 mm ao se tentar retirar o cateter 9. Há ainda
relato de formação de nó entre um cateter inserido na veia jugular direita e um cateter de SwanGanz introduzido através do mesmo para aferir a
pressão de artéria pulmonar. O nó formou-se ao
tentar-se retirar o cateter de Swan-Ganz já que a
sua progressão não foi realizada com sucesso. Foi
necessária a retirada cirúrgica dos cateteres 10. Este
último caso é o primeiro relato de formação de nó
entre dois diferentes cateteres no interior de um
vaso sanguíneo.
Existe relato de formação de nó entre dois cateteres centrais inseridos através das veias subclávias sendo que um deles servia para introdução de
um cateter de Swan-Ganz. A resolução deste caso
também foi cirúrgica 11. Outra possibilidade de remoção de nó em cateter venoso central encontrada
na literatura é a introdução de fio guia de consistência elástica através de controle fluoroscópico 12.
No presente relato a radiografia de controle demonstrava que o cateter estava dobrado com uma
alça longa (Figura 1) e a formação do nó ocorreu
no momento da retirada do cateter.
Todos os cuidados devem ser tomados durante a
retirada de cateteres para evitar o aumento da morbidade deste procedimento. Desse modo, apenas
profissionais treinados devem realizar esta tarefa.
A impossibilidade de retirada do cateter venoso
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
central deve alertar os profissionais de saúde para
a probabilidade de ocorrência de formação de nó
em ponta de cateter e a necessidade de emprego
de terapêutica adequada evitando a ocorrência de
lesões na parede venosa.
RESUMO
Relatamos o caso de uma paciente com adenocarcinoma de colon submetida a hemicolectomia
direita sem intercorrências, que no pós-operatório,
apresentou uma rara complicação decorrente de
uma punção de veia jugular interna direita. A punção transcorreu sem problemas mas a radiografia de
controle demonstrou que o cateter estava dobrado
na veia. Como o cateter tinha boa infusão, refluxo
normal e a paciente apresentava-se bem, manteve-se
o cateter até a alta hospitalar. Ao se tentar retirar o
cateter a paciente referiu dor intensa. Nova radiografia demonstrou a presença de um nó na ponta do
cateter que teve de ser retirado cirurgicamente.
Unitermos: nó; cateter venoso; complicações.
Volume 16 - Número 1 - Janeiro/Março 2004
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