análise funcional como instrumento de avaliação psicológica para

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ANÁLISE FUNCIONAL COMO
INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO
PSICOLÓGICA
PARA GASTROPLASTIA*
PATRÍCIA CARDOSO DE SOUSA MARQUES**, WANDERSON
BARRETO***, RICARDO RODRIGUES BORGES****
Resumo: o atual trabalho buscou definir a análise funcional como a investigação da
relação de aprendizagem que o indivíduo estabelece com seu ambiente, análise fundamental para a investigação de diversas alterações comportamentais. Além de uma
técnica de coleta de dados importante para avaliação psicológica, a análise funcional
se adéqua à orientação e desenvolvimento de habilidades em pacientes da cirurgia
gastroplástica.
Palavras-chave: Análise Funcional. Avaliação Psicológica. Gastroplastia. Obesidade .
P
rofissionais da Psicologia são, recorrentemente, convidados a apresentar análises
e hipóteses sobre os fenômenos que compõem a aprendizagem e manutenção dos
comportamentos humanos e infra-humanos. Para tanto, utilizam de vários instrumentos, teorias e metodologias. Um dos recursos utilizados por psicólogos e analistas do
comportamento é a análise funcional, que também permite a investigação e interpretação de
comportamentos (COSTA; MARINHO, 2002; NENO, 2003). Este tipo de análise de comportamento é bastante utilizado em avaliações psicológicas para procedimentos pré-cirúrgicos
que visam às possibilidades de adaptação do indivíduo às mudanças que ocorrem após a cirurgia,
como no caso da conduta cirúrgica conhecida como Gastroplastia.
Gastroplastia é uma cirurgia restritiva, ou seja, tem como objetivo restringir a quantidade de alimento ingerido pelo paciente a partir no fechamento de uma parte do estômago
*
Recebido em: 11.09.2014. Aprovado em: 25.09.2014.
**
Especialista em Avaliação Psicológica pela Faculdade Arthur Thomas. E-mail:patriciacs_marques@hotmail.
com.
*** Mestrando em Ciências do Comportamento pela UnB. Especialista em Avaliação Psicológica pela
Faculdade Arthur Thomas. E-mail: [email protected].
**** Especialista em Psicopatologia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás. Psicólogo clínico na Êxito
Centro de Desenvolvimento Humano. E-mail: [email protected].
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por meio de sutura (FANDIÑO et al., 2002). Considerando as análises feitas por psicólogos
e a forte procura dos serviços psicológicos por pessoas que optam em tratar sua obesidade por
meio de procedimentos de Gastroplastia, o atual trabalho tem como objetivo apresentar
os conceitos da literatura do termo “análise funcional” e posicionar esta técnica como
instrumento de avaliação psicológica no pré-operatório da Gastroplastia. Para tanto, utilizou-se como metodologia o apontamento de conceitos, tanto da análise funcional quanto
da gastroplastia, das possíveis relações entre ambas as técnicas e das implicações no processo
de avaliação psicológica.
A análise funcional é o tipo de investigação em que se examinam as relações funcionais de um indivíduo com seu ambiente. A investigação das relações funcionais implica em
levantar as variáveis das quais o comportamento é função e é este tipo de tarefa que permite
a previsão da ocorrência de tais comportamentos (NOBRE, DE-FARIA, RIBEIRO, 2010;
SKINNER, 1982). Em outras palavras, uma análise funcional será aquela que buscará especificar uma história de interação entre o indivíduo e o ambiente, entre variáveis dependentes e
independentes, entre os eventos antecedentes do comportamento, o próprio comportamento e as consequências do mesmo (CAVALCANTE, TOURINHO, 1998; COSTA, MARINHO, 2002).
A análise funcional pode ser incluída na avaliação comportamental visando uma avaliação de pré-tratamento, cujo objetivo principal será “uma exploração que permita formular
hipóteses no que diz respeito a enlaces funcionais entre variáveis da resposta, objeto de estudo e
aquelas que, segundo determinados processos psicológicos que implicam aprendizado, as determinam” (SILVA; MARTORELL, 1996/2008, p.100). Em outras palavras, a análise funcional é
uma ferramenta de investigação dos fenômenos determinantes dos comportamentos.
Neno (2003) explica que a análise funcional busca investigar as complexas e múltiplas determinações dos comportamentos e não apenas um único determinante, o que faria
com que este tipo de técnica fosse mecanicista. Além de investigar os múltiplos elementos
que determinam os comportamentos, a análise funcional pode também ser delineada objetivando o diagnóstico dos problemas dos clientes. Como a análise funcional se interessa pelas
relações que se dão entre a filogênese (história da espécie), ontogênese (história individual) e
as práticas culturais, o diagnóstico também é apresentado considerando estas relações comportamentais. O objetivo do diagnóstico por meio de uma análise funcional é especificar o
que existe no ambiente que pode produzir um comportamento inadequado (FAGIANNI,
2009; NENO, 2003).
O modelo de diagnóstico produzido por uma análise funcional está em oposição ao
modelo tradicional de classificação de transtornos mentais, que apontam para o mau funcionamento mental baseado em sinais e sintomas que revelam apenas a forma do comportamento-problema (CAVALCANTE, TOURINHO, 1998; FAGGIANI, 2009). Neste sentido, ao
classificar, por exemplo, um comportamento como depressão, os psicólogos que utilizam a
análise funcional tentarão mostrar como os comportamentos chamados de depressivos podem estar sendo mantidos pela baixa qualidade de vida do indivíduo. Embora exista uma
ênfase em aspectos biológicos e psicológicos internos para definir problemas como a depressão, a análise funcional permite que se atente para os padrões de interação que o individuo
estabelece com seu ambiente social (CAVALCANTE, 1997; FAGGIANI, 2009).
Para melhor delinear a análise funcional das interações que os indivíduos fazem
com seus ambientes, Costa e Marinho (2002) apresentaram um modelo de investigação dos
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comportamentos de uma mulher de 27 anos, infeliz no casamento, pouco assertiva e com baixo apoio social, que recebeu de um psiquiatra o diagnóstico de depressão. As autoras fizeram
um levantamento dos comportamentos que indicavam a depressão da paciente e mostraram,
por meio de análises funcionais, que seus comportamentos eram mantidos pela perda de reforçadores positivos1 após o casamento (não frequentar a igreja que gosta para acompanhar o
marido em ambientes que ela desaprova) e pelo baixo reforço social2 (quase não saía de casa e
relatou que sua avó era sua única amiga íntima, mas havia falecido logo após seu casamento).
Ao isolar os comportamentos da paciente, como, por exemplo, o comportamento de ficar
deitada durante horas, as autoras descobriram que haviam estímulos antecedentes que predispunham o referido comportamento, tais como: poucas atividades prazerosas, dores no corpo
e marido compreensivo. Estas condições antecedentes davam ao comportamento de ficar
deitada as seguintes consequências: marido demonstrava preocupação e fazia as atividades domésticas e evitava situações desagradáveis quando dormia. Por meio de uma análise funcional
criteriosa, é possível observar que dadas as relações envolvidas em determinados contextos,
aqueles seriam os comportamentos mais prováveis (BANACO, 1997).
Além de fenômenos como a depressão, outros fenômenos comportamentais também
podem ser analisados pela perspectiva da análise funcional, como, por exemplo, os transtornos
alimentares. Assim, os dados obtidos por meio deste tipo de análise também podem compor
uma avaliação psicológica e constar nos documentos produzidos, após as avaliações que se fazem
para o pré-operatório de cirurgias para tratar a obesidade, como as Gastroplastias.
OBESIDADE E GASTROPLASTIA
A obesidade vem sendo um tema tratado mundialmente na área de saúde pública.
A World Health Organization (2012) define a obesidade e o sobrepeso como o acúmulo
anormal ou excessivo de gordura que pode ser prejudicial à saúde. Uma ingestão calórica que
supera o gasto energético, classificada através da equação peso/altura² que define o Índice de
Massa Corporal (IMC), onde um IMC maior ou igual a 25 é sobrepeso, e um IMC maior ou
igual a 30 é a obesidade.
A obesidade é uma doença crônica, caracterizada pelo excesso de gordura corporal, que resulta de uma interação complexa de fatores endócrino-metabólicos, genéticos,
socioeconômicos, comportamentais, culturais e psicológicos, podendo levar à morte precocemente, induzindo o aparecimento de outras doenças e agravar as preexistentes (KHODJA; LANCE, 2005).
Sendo progressiva, a obesidade assume conotações alarmantes quando ultrapassa 40
kg/m² de IMC, ou seja, passa a ser definida como mórbida, apresentando doenças associadas,
tais como: doenças cardiovasculares (principalmente doenças cardíacas e acidente vascular
cerebral); diabetes; lesões músculo-esqueléticas (especialmente a osteoartrite); alguns tipos
de câncer (endométrio, mama e cólon), limitando assim, a qualidade e expectativa de vida
(CZEPIELEWSKI, 2008).
Além dos aumentos com os custos do tratamento e dos prejuízos físicos decorrentes, a obesidade também pode causar algumas alterações comportamentais. Pessoas obesas
são alvos de discriminação e preconceito, o que contribui para a manifestação de distúrbios
psicossociais (TEICHMANN et al., 2006). Entre as pessoas obesas é comum encontrar o
transtorno de compulsão alimentar periódica, que consiste em ingerir grandes quantidades
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de alimentos em um curto período de tempo, acompanhado do sentimento de perda do
controle e de culpa. A dificuldade em diagnosticar esta compulsão tem sido um fator que dificulta o tratamento da obesidade. A depressão é também mais frequente entre os candidatos
à gastroplastia que possuem o transtorno, o que requer cuidados especiais para estes pacientes
durante o período de pós-operatório (AZEVEDO; SANTOS; FONSECA, 2004).
A obesidade é uma condição multicausada que envolve em seu tratamento vários
tipos de abordagens, como a orientação dietética, a programação de atividades físicas e o uso
de fármacos anti-obesidade. Entretanto, o tratamento convencional para a obesidade grau III
continua produzindo resultados insatisfatórios, com 95% dos pacientes recuperando seu peso
inicial em até dois anos (FANDIÑO et al, 2002). Assim, observa-se que devido à necessidade
de uma intervenção mais eficaz na condução clínica de obesos graves, a indicação das operações bariátricas vem crescendo nos dias atuais.
Com exposto acima, a recomendação para o tratamento cirúrgico deve basear-se
numa análise abrangente dos múltiplos aspectos clínicos do paciente. A avaliação destes no
pré e pós-operatório deve ser realizada por uma equipe multidisciplinar composta por endocrinologistas, nutricionistas, cardiologistas, pneumologistas, psiquiatras, psicólogos e cirurgiões (FANDIÑO et al, 2002). Segundo o Consenso Latino Americano de Obesidade, são
reconhecidas três técnicas cirúrgicas: gastroplastia vertical com bandagem (GVB), Lap Band
e gastroplastia com derivação gastro-jejunal (COUTINHO, 1999).
Desde os meados do século passado buscam-se alternativas operatórias para frear o
ganho de peso, sendo que, nos últimos 15 anos grandes avanços cirúrgicos foram alcançados,
destacando-se as gastroplastias verticais com banda e reconstrução gastrointestinal em Y de
Roux (GVBYR), idealizadas pelos cirurgiões Rafael Capella e Mathias Fobi. A gastroplastia
vertical é um procedimento puramente restritivo que consiste na remoção da grande curvatura do estômago, iniciando a partir de 4 a 6 cm do piloro até o ângulo esofagogástrico,
deixando o reservatório novo com formato tubular e alongado de volume entre 150 e 200
ml. É indicado para todos os tipos de pacientes obesos, sendo muito eficaz para pacientes
com obesidade mórbida, ou seja, aqueles que possuem índice de massa corporal maior que
50 kg/m, como também para os que se alimentam de grande quantidade de comida a cada
refeição (MALHEIRO; FREITAS, 2002). É um procedimento simples, com risco menor de
complicações quando comparado a outros procedimentos bariátricos mais demorados e mais
complexos (PICOT et al, 2009).
O número de pacientes que buscam o tratamento cirúrgico, assim como a indicação médica para a realização de tal procedimento, tem aumentado muito nos últimos anos.
Tal fato ocorre em virtude da redução da qualidade e da expectativa de vida acarretado pela
obesidade mórbida, e dos sucessivos fracassos dos tratamentos conservadores, como os dietéticos, os farmacológicos e a atividade física (CORDÁS; LOPES FILHO; SEGAL, 2004).
O tratamento cirúrgico visa o emagrecimento, a melhoria da qualidade de vida e
metabólica. Para tanto, a redução na ingestão energética, assim como a disciplina dietética
são fatores fundamentais (FANDIÑO, 2004). Contudo, a intervenção cirúrgica vem sendo
utilizada como uma “solução milagrosa” para todos os problemas e complicações referentes
à obesidade (GARRIDO, 2004). Neste sentido é que o trabalho investigativo dos psicólogos
por meio das análises funcionais dos comportamentos é importante para avaliar o quão “milagroso” podem ser estes procedimentos cirúrgicos avaliando a capacidade de adaptação dos
indivíduos à cirurgia no pós-operatório.
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AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA: A ANÁLISE FUNCIONAL PARA GASTROPLASTIA
A avaliação psicológica é vista como um processo em que são utilizadas várias técnicas que visam o delineamento dos processos psicológicos dos indivíduos, tais como: técnicas
projetivas, psicométricas, de funções cognitivas, de observações, de entrevistas, entre outras.
Sendo assim, é uma atividade complexa tanto para os profissionais da psicologia quanto para
seus clientes/pacientes, pois os achados de uma avaliação psicológica podem implicar em
emissão de juízos de valores e por isso deve ser cuidadosamente realizada, mesmo que estes
julgamentos se dêem a partir de concepções do sujeito, da sociedade e da ciência que o profissional assumiu (ANACHE, 2011).
A abordagem psicológica é fundamental para a intervenção nos casos de obesidade,
considerando os aspectos biopsicossociais da mesma, contribuindo assim para o sucesso do
tratamento. A psicologia já conta com diversas técnicas e metodologias para avaliar e tratar a
obesidade e uma das técnicas é a análise funcional, que foi descrita anteriormente. Para tanto,
sua implicação no processo de avaliação psicológica no pré operatório é muito relevante, não
só para as questões expostas anteriormente, mas também para a qualidade dos documentos
emitidos após as avaliações, a contar: laudos e pareceres (TRAVADO et al, 2004).
Após uma avaliação pré-cirúrgica com indicação favorável para o tratamento, os
profissionais da psicologia também devem se preocupar com as avaliações e intervenções no
pós-operatório. Para compreender o que ocorre no pós-operatório, bem como os efeitos na
vida de pacientes que se submeteram à gastroplastia, o Hospital das Clínicas de Porto Alegre
(2010) lançou uma cartilha explicando que na primeira fase do pós-cirúrgico a dieta do paciente é baseada na ingestão completa de líquidos. Assim, a falta do ato de mastigar alimentos
pode desencadear comportamentos de ansiedade. A segunda fase da dieta alimentar consiste
em uma alimentação pastosa, na qual o paciente poderá ingerir legumes, verduras e frutas na
forma de purê, cremes ou suflês, carnes desfiadas, arroz, dentre outros, lembrando sempre ao
paciente a importância de se mastigar os alimentos de forma lenta e fracionar a quantidade
dos alimentos que serão ingeridos. Nos meses seguintes, ainda existe o receio das experiências
diárias envolvendo os alimentos.
Após a gastroplastia, o indivíduo terá de se adaptar a um novo estilo de vida.
Neste momento, os psicólogos também podem utilizar da avaliação psicológica, acompanhada da técnica da análise funcional, para novo levantamento dos processos psicológicos,
bem como para o estabelecimento de estratégias de mudança de hábitos e que direcione o
tratamento também para um processo psicoterapêutico que vise à readaptação a uma nova
constituição corporal. Neste sentido, o trabalho psicoterapêutico no pós-cirúrgico se torna
importante, pois este tipo de tratamento consiste em auxiliar o sujeito a reorganizar seus
comportamentos se preocupando com a nova constituição de seu corpo, pois algumas dificuldades podem surgir, como: rebaixamento do humor, agitação ou quadros psiquiátricos,
depressão, ansiedade, alcoolismo e gastos excessivos (MOTTA et al, 2011). Quanto ao que
se refere à saúde física, outros problemas podem surgir, tais como hipertensão, diabetes,
varizes, apneia, artropatias, pedra na vesícula, tumores de intestino, infertilidade, dentre
outros (CAMPAGNOLO et al, 2005).
O período pós-cirúrgico é a fase da recuperação de maior desconforto e de adaptação à dieta líquida. Soma-se a expectativa, a ansiedade e a insegurança em saber se o procedimento ocorreu dentro do esperado (FRANQUES, 2003). Posterior à gastroplastia, o
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paciente terá de se adequar a um novo estilo de vida. Assim, é necessário que ele tenha comprometimento e disciplina para dar continuidade às orientações da equipe e, por conseguinte,
obter eficácia com o tratamento. Neste sentido, o trabalho terapêutico pós-cirúrgico visa
auxiliar o sujeito a reorganizar essa nova etapa de sua vida, uma vez que algumas dificuldades
podem surgir, sendo considerado pelos pacientes submetidos ao procedimento, como uma
das fases mais difíceis. É realmente uma fase de adaptação ao processo cirúrgico somado a
certa expectativa, ansiedade e insegurança das novas possibilidades de um novo corpo. Estas
e outras mudanças acabam exigindo do indivíduo uma reflexão, que podem levar a conflitos
emocionais. É nesta fase que o trabalho psicoterapêutico se faz importante, pois irá auxiliar o
sujeito a aderir de forma mais eficiente ao tratamento estimulando a sua participação efetiva
no processo de emagrecimento (OLIVEIRA; LINARDI; AZEVEDO, 2004).
Logo que adaptados, os pacientes entram em contato com ganhos vindos do emagrecimento, retomando suas relações sociais, melhorando sua autoestima e sua autoimagem.
Faz-se de suma importância a equipe profissional esclarecer que a responsabilidade pelo sucesso do tratamento é do próprio paciente. Após um período aproximado de 18 a 24 meses,
o ritmo da perda de peso pode vir a diminuir e/ou se estabilizar. Isso pode acarretar danos à
sua autoestima, uma vez que o indivíduo não receberá mais elogios sobre seus novos traços
corporais, e a compulsão alimentar pode voltar a ocorrer juntamente ao ganho do peso. Além
do que, a compulsão pode deslocar-se para ingestão de bebidas alcoólicas, o uso contínuo de
cigarros, o exercício por compras em excesso, o desejo ou ausência libidinal por sexo, junto a
transtornos alimentares, tais como anorexia e bulimia, desencadeadas pelo o medo de engordar novamente (ALMEIDA; ZANATTA; REZENDE, 2012).
A partir do exposto, observa-se que a obesidade é decorrente de múltiplos fatores e
a recuperação do individuo após a gastroplastia também dependerá de diversas variáveis tais
como: continuidade do aprendizado nutricional, cuidados com a quantidade de alimentos
ingeridos e a busca de novos prazeres além da comida. Isto se faz necessário para que não
sejam desenvolvidas novas compulsões ou outros quadros psiquiátricos (AZEVEDO; SANTOS; FONSECA, 2004; KHODJA; LANCE, 2005). Para tanto os psicólogos que utilizam
de análise funcional para estes fins, devem utilizar seus achados para orientar ou treinar os
pacientes para responderem de forma adequada a um novo corpo, potencializando as regras
nutricionais e ressignificando suas relações com os alimentos, bem como a descoberta de outras fontes de prazer que não tragam danos ao indivíduo.
CONCLUSÃO
As explicações por meio das análises funcionais sejam probabilísticas e as hipóteses levantadas devam ser confirmadas ou refutadas com a manipulação das variáveis envolvidas e por
meio da observação dos efeitos nos comportamentos (COSTA; MARINHO, 2002; NENO,
2003). No entanto, este tipo de técnica pode ajudar os profissionais da psicologia a compreender
o atual comportamento do indivíduo com obesidade e ajudá-lo a identificar as possibilidades para
ter um pós-operatório sem riscos. Contudo, uma avaliação psicológica que vise à capacidade do
individuo de adaptação ao pós-operatório da gastroplastia deve contemplar todos os aspectos que
envolvem o fenômeno da obesidade, bem como as vivências individuais dos sujeitos.
Sendo assim, em um processo de avaliação psicológica os resultados das técnicas
devem ser compreendidos dentro do contexto no qual o indivíduo está inserido, portanto,
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após um exame clínico completo, não sendo adequado elaborar um diagnóstico sobre um
indivíduo somente por meio de técnicas que omitem o exame clínico (LEITE, 2011). Para
tanto, uma avaliação baseada apenas em testagem psicológica pode não ser suficiente para
ajudar os pacientes a se adaptarem ao seu novo corpo e às novas condições de vida que lhe
serão impostas. Por isso, o atual trabalho defende que além de avaliações de aspectos cognitivos e de personalidade, é preciso somar à testagem psicológica, uma análise do contexto e
das variáveis que mantém os comportamentos de uma pessoa obesa que será submetida à
gastroplastia. A análise destes contextos e variáveis pode ser útil não só no processo pré-cirúrgico, mas também após a cirurgia. Assim, o indivíduo obeso que tem seus comportamentos
analisados de forma funcional poderá ter melhor capacidade de adaptação ao novo corpo e as
novas regras que o acompanham.
O atual trabalho apresentou conceitos sobre a gastroplastia e sobre a análise funcional, buscando relacionar ambas as técnicas em prol de uma avaliação psicológica adequada
que vise o tratamento de pessoas obesas gastroplastizadas. Os objetivos do atual estudo foram
alcançados, uma vez que as definições dos conceitos contemplaram os referenciais teóricos
e direcionaram os achados para se pensar em uma avaliação psicológica mais adequada do
ponto de vista técnico e ético, não só para os casos de gastroplastia, mas também para outros
fenômenos vinculados à saúde. Além disso, aponta-se para o atual estudo a dificuldade em
encontrar na literatura um número significativo de trabalhos sobre as análises funcionais ligadas aos transtornos alimentares, bem como a importância em se desenvolver mais pesquisas
com este enfoque.
FUNCTIONAL ANALYSIS AS A PSYCHOLOGICAL ASSESSMENT TOOL
FOR GASTROPLASTY
Abstract: the current paper aimed to define the functional analysis as the investigation of learning relationship between the person and his environment, obligatory analysis to investigate various behavioral
alterations. Not just a technique for collecting important data for psychological assessment, functional
analysis fits the guidance and skills development in gastroplasty patients.
Keywords: Functional Analysis. Psychological Evaluation. Gastroplasty, Obesity.
Notas
1 Reforçadores Positivos são aqueles estímulos consequentes que aumentam a probabilidade de ocorrência dos
comportamentos em determinadas ocasiões (MOREIRA; MEDEIROS, 2007).
2 Reforço Social é quando há outro indivíduo mediando os reforçadores que são praticados por uma
determinada cultura (SKINNER, 2003).
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