ESCOLA DA MAGISTRATURA DO DISTRITO FEDERAL CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM DIREITO E JURISDIÇÃO ROBSON GONÇALVES DOURADO DOU Previdência Privada Fechada – Fundos de Pensão – ea Relação de Consumo Brasília, maio de 2013 ROBSON GONÇALVES DOURADO Previdência Privada Fechada – Fundos de Pensão – ea Relação de Consumo Monografia apresentada como requisito para conclusão do curso de Especialização em Direito e Jurisdição da Escola da Magistratura do Distrito Federal. Orientador: Dr. Héctor Valverde Santana Brasília, maio de 2013 RESUMO Esta pesquisa discute a aplicação do Código de Defesa do Consumidor nas relações jurídicas entre Entidade Fechada de Previdência Complementar – fundos de pensão – e participante de benefícios, a partir de argumentos doutrinários contrários e favoráveis, aí considerando a jurisprudência correspondente. O ponto de referência é a Súmula 321 do Superior Tribunal de Justiça, que ensejou controvérsias sobre seu nível de amplitude de aplicação. O estudo pautou-se pela identificação de pontos convergentes na hermenêutica de dispositivos legais do CDC e de legislação específica atrelada ao tema, provenientes de doutrinadores e julgadores com posicionamentos divergentes. Em que pese a complexidade do tema, inclusive a exigir outras discussões, esta pesquisa permite concluir pela plausibilidade e razoabilidade da incidência do CDC nas relações jurídicas entre fundos de pensão e participantes de benefícios. Palavras-chave: Previdência privada, EFPC; EAPC, CDC, fundos de pensão, consumidor, participante, fornecedor. SUMÁRIO INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 5 1. História e principais características da Previdência Privada Complementar ....... 8 2. As EFPC no contexto da relação consumerista e as questões a serem postas .... 16 3. Metodologia aplicada na pesquisa jurisprudencial ............................................. 24 4. Argumentos contrários à aplicação do CDC nas EFPC ..................................... 28 5. Argumentos favoráveis à aplicação do CDC nas EFPC ..................................... 44 6. Reflexões sobre os argumentos contrários e favoráveis à aplicação do CDC .... 60 nas relações jurídicas envolvendo as EFPC CONCLUSÃO .............................................................................................................. 72 REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 74 5 INTRODUÇÃO As dificuldades da previdência estatal no Brasil, do Regime Geral do INSS – Instituto Nacional do Seguro Social – têm colocado na incerteza inúmeros trabalhadores em relação à renda futura, que, muitas vezes, é bem inferior à recebida na vida ativa. Em função disso, a previdência privada tem sido uma alternativa atraente para aqueles que desejam complementar a renda, além de poderem contar com outros benefícios e deduções para efeito de imposto de renda. Esse movimento tem colocado a previdência privada com um papel alavancador ou fomentador do próprio país. Dessa forma, um dos fundamentos da previdência privada é de assegurar complementação de renda aos participantes. Além disso, as previdências privadas se colocam como agentes financiadoras do desenvolvimento do país, o que é possível graças às características dos montantes geridos por essas entidades, cabendo destacar: a) grande volume de recursos; b) recursos de baixo custo (juros baixos); c) financiamento de longo prazo; d) recursos não inflacionários. Em relação ao tema, cabe assinalar que a promulgação da Constituição Federal de 1988 foi um marco histórico e jurídico, haja vista que a única norma existente até então – Lei nº 6.435, de 15.07.1977 – não conseguia delinear com clareza suficiente o sentido e a finalidade das Entidades abertas de previdência complementar – EAPC – e Entidades fechadas de previdência complementar – EFPC – respectivamente. Em observância à previsão constitucional, houve detalhamento do funcionamento e das relações envolvendo as entidades abertas e fechadas de previdência privada e seus participantes, que foram consubstanciados nas Leis Complementares nº 108/2001 e 109/2001. 6 Nesse contexto, tem ocorrido crescimento da previdência privada no Brasil, especialmente das Entidades Fechadas de Previdência Complementar – EFPC – o que tem gerado discussões no campo jurídico sobre sua natureza jurídica e as implicações daí decorrentes, tais como sobre a norma aplicável nas situações envolvendo participantes de planos de benefícios e as próprias EFPC. Tal debate tem como ponto referencial a edição da Súmula 321 do STJ de 2005, que prevê a aplicação do Código de Defesa do Consumidor na relação jurídica entre entidade de previdência privada e seus participantes. Diante disso, o presente trabalho busca debater a incidência do Código de Defesa do Consumidor nas relações envolvendo as EFPC e seus participantes. Assim, no Capítulo 1 são apresentados o contexto histórico e as principais características da entidade aberta de previdência complementar (EAPC) e da entidade fechada de previdência complementar (EFPC), enquanto no Capítulo 2 são indicadas suas principais diferenças jurídicas e o problema da incidência do CDC à luz do que dispõe a Súmula 321 do STJ. Em seguida, no Capítulo 3, é feita descrição da metodologia aplicada na pesquisa jurisprudencial, tendo sido pinçados julgados por amostragem no do Superior Tribunal de Justiça – STJ; Tribunal de Justiça do Estado de Goiás – TJGO; Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul – TJRS; Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios – TJDFT; Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP e do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia – TJBA. No Capítulo 4 são apresentados os argumentos jurídicos contrários à aplicação do Código de Defesa do Consumidor nos conflitos judiciais entre fundos de pensão e participantes de benefícios, bem como a jurisprudência correspondente. De forma semelhante, no Capítulo 5 são indicados argumentos jurídicos que se mostram favoráveis à incidência do CDC nesse tipo de relação jurídica, inclusive julgados com esse mesmo posicionamento. 7 Por último, no Capítulo 6, são realizadas reflexões a respeito dos argumentos doutrinários contrários e favoráveis à aplicação do CDC na relação jurídica entre fundos de pensão e participantes de planos de benefícios, de modo a se permitir posicionamento crítico e conclusivo, em nível da temática posta nesta pesquisa, indicando-se outras questões passíveis de aprofundamento em estudo específico. 8 1. História e principais características da Previdência Privada Complementar A temática da previdência privada fechada – fundos de pensão – na perspectiva jurídica, ou seja, com viés de regulamentação é relativamente recente, tendo emergido abordagem mais específica com a edição da Lei nº 6.435 de 1977 – a qual foi revogada pela Lei Complementar nº 109 de 2001 – numa clara inspiração no modelo norte-americano de gestão de fundos de pensão, a fim de atender à própria necessidade de regulamentar as entidades até então em operação no país vinculadas ao setor estatal. Em artigo publicado na Revista Fundos de Pensão, Ricardo Pena traz síntese clara e objetiva a respeito da regulamentação da previdência privada no Brasil, in verbis: A previdência complementar no Brasil surgiu, de forma regulamentar, com a lei nº. 6.435, de 1977, em consonância com a experiência norte-americana do ERISA (Employee Retirement Income Security Act), na necessidade de regulamentação dos montepios, da canalização da poupança previdenciária ao desenvolvimento do mercado de capitais no País a partir do 2º Programa Nacional de Desenvolvimento e no funcionamento de algumas entidades de previdência privada ligadas ao setor estatal. O sistema de fundos de pensão em sua origem nasceu pela administração de planos de aposentadoria na modalidade de benefício definido em que se tem o risco atuarial e evoluiu, durante a década de 80 e 90, para as empresas privadas e para os planos de contribuição definida e mistos no qual esses riscos foram mitigados. 1 Por outro lado, não se pode olvidar que o embrião da previdência privada no Brasil remonta ao Século XVI, momento em que passaram a surgir as santas casas de misericórdia, montepios e sociedades beneficentes, tendo caráter mutualista. Há de se consignar a criação do Montepio para a Guarda Pessoal de D. João VI, ainda em 1808, bem como do Montepio Geral dos Servidores do Estado (Mongeral), já em 1835, que se tornou a primeira entidade particular no Brasil a entrar em operacionalização. 2 Verifica-se que o mutualismo era um aspecto marcante na previdência privada em construção no Brasil desde o período colonial. Para Weintraub, o mutualismo securitário na 1 PENA, Ricardo. Previdência Complementar no Brasil: história, evolução e desafios. Revista Fundos de Pensão. da Abrapp/ICSS/Sindapp, Ano XXVII, Número 340, de maio/2008, p. 13-15. 2 TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito Previdenciário. 5. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 31. 9 perspectiva previdenciária “consiste num esforço recíproco de indivíduos cujos interesses são semelhantes para que haja proteção de todos membros desse conjunto [...] há um cunho altruísta, mesmo que involuntário, no âmbito da solidariedade envolvendo esforço conjunto [...] 3 Também Manuel Sebastião Soares Póvoas descreve o processo histórico da previdência privada no Brasil – inclusive destaca o caráter mutualista inerente aos montepios - de maneira que faz um recorte das principais fases por que passaram as entidades privadas, até chegar à regulamentação ocorrida mediante a Lei nº 6.435 de 1977, in verbis: O sistema de previdência privada foi institucionalizado pela Lei 6.435 de 15 de julho de 1977, que como ela própria expressa à guisa de sumário ‘dispõe sobre as entidades de previdência privada e dá outras providências’ e que foi corrigida, em alguns pormenores adjetivos, pela Lei 6.462 de 09 de novembro de 1977. O Brasil deu um grande passo, institucionalizando a previdência privada, o que sem dúvida o elege como um dos primeiros neste domínio. A índole do povo brasileiro é de preocupação para com o futuro, o que explica os seculares exemplos de estruturas mutualistas na forma de misericórdias e de montepios. A constituição dessas estruturas começou nos primeiros anos do Brasil-Colônia no seguimento da tradição portuguesa das misericórdias devida a inspiração de D. Leonor de Lencastre, rainha viúva do Rei D. João II, e não mais parou. A realidade que, em termos de veículos operacionais, existia quando da promulgação da Lei 6.435, era um quadro mutualista tradicional formado pelos montepios, um certo número de fundações instituídas por empresas estatais e um número indeterminado de esquemas previdenciários criados pelas empresas sem outra garantia que não fosse a sua expressão nos respectivos balanços, denominados ‘fundos contábeis’, expressão sem dúvida inconsistentes, na medida em que tais fundos não passavam de meras provisões sem qualquer especificação material e, sem garantirem quaisquer direitos [...] 4 De acordo com Weintraub, as primeiras instituições criadas no Brasil com caráter de previdência privada foram a fundação do Montepio dos Oficias da Marinha da Corte (de 23 de setembro de 1795); Montepio Geral de Economia dos Servidores do Estado – MONGERAL – (de 10 de janeiro de 1835) e, na sequência, vários montepios, denominados de “Caixas Mútuas de Pensões e Pecúlios”. Destaca, ainda, o autor, a criação da Caixa Montepio dos “Funcionários do Banco da República do Brazil”, composta por 52 associados (de 16 de abril de 1904), que é atualmente a PREVI. Consoante Weintraub, a palavra montepio seria a aglutinação do termo 3 WEINTRAUB. Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência privada. Doutrina e jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 54. 4 PÓVOAS, Manuel Sebastião Soares. Previdência privada: filosofia, fundamentos técnicos e conceituação jurídica. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 104-105 e 144-145. 10 ‘monte’, aí entendido como “o valor conjunto arrecadado para subvencionar as pensões, pio (do latim ‘pius’) no sentido de sagrado, santo”. 5 Já a Previdência Social, de caráter público e obrigatório, só foi mencionada pela primeira vez na Constituição de 1891, indicando-se a possibilidade de aposentadoria de invalidez para funcionários a serviço da Nação. 6 Com o advento da Constituição Federal de 1988, a estrutura geral de previdência no Brasil ficou composta por três regimes: o Regime Geral de Previdência Social, os Regimes Próprios de Previdência dos Servidores Públicos e o Regime de Previdência Privada. Os dois primeiros são operacionalizados por entidades públicas, sendo de natureza obrigatória e seguem, via de regra, o regime financeiro de caixa, isto é, uma geração contribui para a outra. Enquanto isso, a previdência privada por ser de filiação facultativa e autônoma busca acrescentar proteção previdenciária ao participante, apresentando regime financeiro de capitalização – já que os aportes são investidos no mercado e compõem o valor do benefício – e pode ser administrada por entidades fechadas ou abertas. 7 Segundo Weintraub, o art. 202, caput, da Constituição Federal de 1988, deixou clara a diferença estrutural do regime geral de previdência social comparativamente ao regime da previdência privada no que se refere ao aspecto financeiro. No primeiro caso, adotou-se a repartição simples e tendo como princípio a solidariedade, ficou estabelecido que a geração ativa economicamente contribui para sustentação dos benefícios de aposentados e pensionistas do momento presente, ocorrendo aí um mutualismo entre gerações. Na segunda hipótese, utilizou-se o regime de capitalização, de maneira que o participante investe individualmente em sua 5 WEINTRAUB. Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência privada. Doutrina e jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 66. 6 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2011, p. 4. 7 MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL – Sec. Prev. Compl.-SPC. Guia do participante . Disponível em: < http://www.mpas.gov.br/arquivos/office/3_081024-143155-938.pdf > Brasília, 2005. Acesso em 11 Mar 2013, p.6. 11 previdência, de forma independente, afastando o princípio da solidariedade e, por conseguinte, o mutualismo. In verbis: [...] Houve uma patente dicotomia constitucional entre o regime de repartição simples (regime geral de previdência social – INSS) e o regime de capitalização (previdência privada). O regime previdenciário de repartição simples (pay as you go) pressupõe que quem está trabalhando paga os benefícios dos aposentados e pensionistas atuais. Logo, as gerações vindouras suportarão as aposentadorias da geração de agora. É a solidariedade entre gerações: receitas correntes cotizam despesas correntes. Há, portanto, um mutualismo intergerações na repartição simples. [...] No regime de capitalização (funding system), os participantes formam fundos (individuais ou coletivos) onde são investidos pecúlios destinados às suas aposentadorias. O objetivo da capitalização não pressupõe a solidariedade intergerações. (grifos do Autor) 8 As Entidades Fechadas de Previdência Complementar – EFPC – também chamadas de fundos de pensão 9, são estruturadas sob a forma de entidade sem fins lucrativos e acessíveis a segmentos específicos de pessoas, mediante seus empregadores, denominados de Patrocinadores. Quando os fundos de pensão são constituídos por associados ou por membros de determinada categoria profissional, classista ou setorial, mediante suas respectivas entidades representativas, são denominadas de Instituidores. 10 Por outro lado, as Entidades Abertas de Previdência Complementar – EAPC – são constituídas, obrigatoriamente, na forma de sociedades anônimas, com fins lucrativos, a despeito de qualquer tipo de vínculo profissional ou associativo. Nessa modalidade, há possibilidade de contribuir de forma individualizada ou em conjunto com a empresa para constituição de fundos, a fim de fazer poupança. 11 8 WEINTRAUB. Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência privada. Doutrina e jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 56. 9 WEINTRAUB. Arthur Bragança de Vasconcellos. Manual de direito previdenciário privado. São Paulo: Juarez de Oliviera, 2004, p. 32. Daqui por diante, serão adotadas as expressões Entidades Fechadas de Previdência Complementar, Fundos de Pensão como sinônimas, sem adentrar em polêmicas sobre a terminologia adequada. 10 MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL – Sec. Prev. Compl.-SPC. Guia do participante . Disponível em: < http://www.mpas.gov.br/arquivos/office/3_081024-143155-938.pdf > Brasília, 2005. Acesso em 11 Mar 2013, p.7. 11 MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL – Sec. Prev. Compl.-SPC. Guia do participante . Disponível em: < http://www.mpas.gov.br/arquivos/office/3_081024-143155-938.pdf > Brasília, 2005. Acesso em 11 Mar 2013, p.7 12 Desse modo, enquanto o Regime Geral de Previdência Social e os Regimes Próprios de Previdência dos Servidores apresentam como pontos comuns natureza pública, filiação obrigatória e regime de caixa, via de regra, a previdência privada complementar é de natureza privada, contratual, filiação facultativa, autônoma em relação às duas primeiras e regime financeiro de capitalização. Particularmente quanto à Previdência Privada Complementar é importante desde logo destacar as principais diferenças estruturais entre as espécies desse segmento, ou seja, Entidades Fechadas – fundos de pensão – e as Entidades Abertas12, conforme tabela abaixo: Entidades ABERTAS Previdência Complementar - EAPC Entidades FECHADAS Previdência Complementar - EFPC Sociedade Anônima Fundação ou sociedade civil Fins lucrativos Fins não lucrativos Acessíveis a qualquer pessoa física Acessível a grupos específicos, com base no vínculo empregatício ou associativo Planos individuais ou coletivos Planos coletivos Natureza contratual - As regras gerais da Previdência Privada Complementar – Aberta e Fechada – estão contidas na Lei Complementar nº 109/2001, a qual aborda as características estruturais dessas entidades, contemplando os planos de benefício, da fiscalização e da intervenção e da liquidação extrajudicial. Enquanto isso, a Lei Complementar nº 108/2001, dispõe sobre regras específicas das entidades fechadas de previdência complementar. Mais adiante será retomada essa perspectiva jurídica com maior aprofundamento. 12 MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL – Sec. Prev. Compl.-SPC. Guia do participante . Disponível em: < http://www.mpas.gov.br/arquivos/office/3_081024-143155-938.pdf > Brasília, 2005. Acesso em 11 Mar 2013, p.7. 13 A entidade fechada de previdência complementar é constituída por meio de estatuto, o qual contém as regras para formação da entidade, e.g., funcionamento do conselho deliberativo, da diretoria executiva e do conselho fiscal, bem como de seus correspondentes níveis de competência, requisitos para sua composição, mandato. Além disso, os fundos de pensão têm seus planos de benefício regrados por meio de regulamento. Este documento se reveste de natureza contratual e define as regras de operacionalização do plano de benefícios, contemplando questões como regras de carência, fontes de custeio dos benefícios, condições de elegibilidade (idade mínima), hipóteses de ingresso e saída do plano, etc. 13 Na previdência privada a contribuição consiste numa espécie de poupança com objetivos previdenciários, de forma a resguardar riscos sociais, tais como benefícios na modalidade de aposentadoria por invalidez ou tempo de contribuição, pensão por morte. Os planos são formulados com base no sistema de capitalização, de maneira que o valor do benefício ficará condicionado, entre outros fatores, pela contribuição realizada em dado período. 14 Retomando a perspectiva jurídica da descrição dos fundos de pensão e entidades abertas, verifica-se que a Constituição Federal de 1988 no seu art. 202 dispõe sobre o regime de previdência privada, destacando seu papel complementar, de natureza autônoma e facultativa, a partir de formação de reservas e regulação mediante lei complementar. 15 Com a edição da Lei Complementar nº 109, de 29.05.2001, em atendimento ao disposto no art. 202 da Constituição Federal, as entidades de previdência privada passaram a se adequar às regras relacionadas aos planos de benefícios, ao custeio, às condições contratuais, à composição, às finalidades e à abrangência da entidade, em conformidade à aludida lei. Antes 13 MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL – Sec. Prev. Compl.-SPC. Guia do participante . Disponível em: < http://www.mpas.gov.br/arquivos/office/3_081024-143155-938.pdf > Brasília, 2005. Acesso em 11 Mar 2013, p.12 e 13. 14 MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL – Sec. Prev. Compl.-SPC. Guia do participante . Disponível em: < http://www.mpas.gov.br/arquivos/office/3_081024-143155-938.pdf > Brasília, 2005. Acesso em 11 Mar 2013, p.10 e 14. 15 BRASIL. Constituição (1988). Constituição federal. 14. ed. São Paulo: Editora Rideel, 2012. 14 disso, tal regramento era definido por meio da Lei nº 6.435, de 15.07.1977, que se encontra revogada. Conforme já pontuado alhures a previdência complementar, na forma concebida no art. 202 da Constituição Federal e posteriormente regulada pela Lei Complementar nº 109, é gênero, no qual se identificam duas espécies: Entidade aberta de previdência complementar – EAPC – e Entidade fechada de previdência complementar – EFPC. As EAPC são constituídas tão-somente na modalidade de sociedade anônima, sendo por natureza acessível ao público em geral e com fins lucrativos, é o que se depreende da inteligência do art. 36, caput, da Lei Complementar nº 109: As entidades abertas são constituídas unicamente sob a forma de sociedades anônimas e têm por objetivo instituir e operar planos de benefícios de caráter previdenciário concedidos em forma de renda continuada ou pagamento único, acessíveis a quaisquer pessoas físicas. 16 Por seu turno, as EFPC são acessíveis, via de regra, aos empregados de uma empresa ou grupo de empresas e aos servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que são reconhecidos por patrocinadores. Na hipótese de instituidores, frise-se, em que não há relação de emprego, as entidades são compostas por associados ou membros de pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial, e.g., inscritos na OAB – Ordem de Advogados do Brasil. A forma de constituição das EFPC, tanto por meio de patrocinadores ou instituidores é de fundação ou sociedade civil, sem fins lucrativos. Tais características são pontuadas pelo art. 31, caput, incisos I e II e § 1º d Lei Complementar nº 109, cuja transcrição se torna necessária: As entidades fechadas são aquelas acessíveis, na forma regulamentada pelo órgão regulador e fiscalizador, exclusivamente: I - aos empregados de uma empresa ou grupo de empresas e aos servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, entes denominados patrocinadores; e II - aos associados ou membros de pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial, denominadas instituidores. 16 BRASIL. Lei Complementar nº 109, de 29 de maio de 2001. Dispõe sobre o Regime de Previdência Complementar e dá outras providências. 14. ed. São Paulo: Rideel, 2012. 15 § 1o As entidades fechadas organizar-se-ão sob a forma de fundação ou sociedade civil, sem fins lucrativos. 17 Nas duas modalidades de previdência complementar – EAPC e EFPC – o participante desembolsa determinado montante em função de regras definidas em contrato e/ou regulamento, observando-se premissas ou hipóteses atuariais, tais como taxa de juros reais, taxa de rotatividade, taxa de inflação. Além disso, vigora em ambas, o regime de capitalização, que caracteriza uma espécie de poupança privada feita pelo participante, cuja contrapartida por parte da EAPC/EFPC se reverterá em forma de benefício no futuro àquele, tais como risco por invalidez, doença ou morte. 18 A Lei Complementar nº 109 trata a respeito do tema sinalizando com a preocupação da saúde financeira da previdência privada – aberta ou fechada – conforme se depreende abaixo: EAPC – art.29, caput e inciso I: Compete ao órgão regulador, entre outras atribuições que lhe forem conferidas por lei: fixar padrões adequados de segurança atuarial e econômico-financeira, para preservação da liquidez e solvência dos planos de benefícios, isoladamente, e de cada entidade aberta, no conjunto de suas atividades. EFPC – art. 18, § 2º:Observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, o cálculo das reservas técnicas atenderá às peculiaridades de cada plano de benefícios e deverá estar expresso em nota técnica atuarial, de apresentação obrigatória, incluindo as hipóteses utilizadas, que deverão guardar relação com as características da massa e da atividade desenvolvida pelo patrocinador ou instituidor. 19 No caso específico dos fundos de pensão – EFPC – a capitalização é também uma forma de garantir o equilíbrio econômico-financeiro da entidade e se manifesta nas modalidades de investimento em renda fixa, renda variável, imóveis, empréstimos e financiamentos imobiliários aos participantes dos planos de benefícios. 20 17 BRASIL. Lei Complementar nº 109, de 29 de maio de 2001. Dispõe sobre o Regime de Previdência Complementar e dá outras providências. 14. ed. São Paulo: Rideel, 2012. 18 MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL – Sec. Prev. Compl.-SPC. Guia do participante . Disponível em: < http://www.mpas.gov.br/arquivos/office/3_081024-143155-938.pdf > Brasília, 2005. Acesso em 11 Mar 2013, p. 15 e 16. 19 BRASIL. Lei Complementar nº 109, de 29 de maio de 2001. Dispõe sobre o Regime de Previdência Complementar e dá outras providências. 14. ed. São Paulo: Rideel, 2012. 20 MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL – Sec. Prev. Compl.-SPC. Guia do participante . Disponível em: < http://www.mpas.gov.br/arquivos/office/3_081024-143155-938.pdf > Brasília, 2005. Acesso em 11 Mar 2013, p. 14. 16 2. As EFPC no contexto da relação consumerista e as questões a serem postas Após a breve caracterização da previdência complementar, consigne-se que, com a edição relativamente recente da Súmula 321 do Superior Tribunal de Justiça – STJ – emergiu um problema que trafega na jurisprudência e especialmente na doutrina: trata-se de estabelecer a amplitude de interpretação e aplicação do enunciado da referida súmula na relação jurídica consumerista, se abrangeria apenas as EAPC – o que neste caso parece pacificado, conforme mais adiante sinalizaremos – ou se também contemplaria as EFPC. Assim, cabe no âmbito desta monografia discutir a incidência da referida súmula à luz também de posicionamentos da doutrina e da própria jurisprudência nas entidades fechadas de previdência complementar – EFPC – cujo teor transcreve-se abaixo: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável à relação jurídica entre a entidade de previdência privada e seus participantes. 21 No caso da Entidade Aberta de Previdência Complementar, há doutrinadores que entendem configurada relação consumerista, tendo em vista que o participante dos planos de benefícios – de forma facultativa e a partir de contrato de adesão – desembolsa prestações por determinado período a fim de obter para si ou para beneficiário que designar cobertura de risco de morte, invalidez ou mesmo aposentadoria, ocupando, por isso, a posição de consumidor. De outra lado, a entidade concede os benefícios pactuados em contrato e segundo o regulamento do plano de benefício, o que a caracteriza como fornecedora. In verbis: O participante é a pessoa física sobre a qual recaem os riscos do contrato previdenciário, quais sejam: a morte, a invalidez e a sobrevivência, sendo o sujeito ativo da relação jurídica de previdência aberta ao qual é conferido o direito de recebimento dos benefícios pagos pela entidade aberta de previdência complementar na forma de pagamento único ou renda firmados no contrato. O beneficiário é a pessoa indicada pelo participante para receber quaisquer benefícios previdenciários previstos no plano em decorrência do evento gerador. 21 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula 321, de 2005, publicada no DJ em 05.12.2005. Disponível em: < http://www.stj.jus.br/SCON/sumulas/doc.jsp?livre=@num='321'> Acesso em 14 Mar 2013. 17 Tais entidades (EAPC) têm por objetivo a comercialização em massa de planos previdenciários privados, cujo objeto é a concessão de benefícios ao participante ou ao beneficiário, sejam estes os próprios contratantes ou apenas favorecidos no plano contratado pela pessoa jurídica.22 Observe-se que nas entidades abertas os planos previdenciários são ofertados livremente no mercado a pessoas físicas ou a pessoas jurídicas, cuja relação jurídica se processa de forma facultativa e mediante contrato, o que coaduna com os fins lucrativos dessa espécie de previdência privada complementar. Parece não gerar controvérsias a patente configuração do consumidor (participante ou beneficiário) e da entidade aberta de previdência complementar (fornecedora de benefícios previdenciários). Mais adiante, Arruda afirma que na relação jurídica firmada entre participante e Entidade Aberta de Previdência Complementar há incidência dos artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor, conforme se depreende de seu posicionamento abaixo: O participante, na qualidade de consumidor, é aquele que adquire produtos (benefícios previdenciários) ou utiliza o serviço previdenciário para a satisfação de necessidades pessoais como destinatário da atividade econômica exercida pela entidade aberta de previdência complementar. As entidades abertas de previdência complementar são caracterizadas como verdadeiros fornecedores, pois são pessoas jurídicas as quais, mediante remuneração e de forma habitual, oferecem ao vasto mercado de consumo – já que acessíveis a todos que queiram com ela contratar – o serviço previdenciário privado, qual seja: a concessão de benefícios sob a forma de renda ou pagamento único. 23 (grifos nossos) Em alinhamento ao posicionamento de Arruda, Léo Amaral Filho evoca julgado do Superior Tribunal de Justiça favorável à incidência do Código de Defesa do Consumidor nas relações jurídicos envolvendo participante e Entidade Aberta de Previdência Complementar, embora não indique se é um entendimento majoritário ou sedimentado na jurisprudência daquele Egrégio Tribunal, in verbis: Civil e Processo Civil. Recurso Especial. Embargos de Declaratórios Protelatórios. Previdência Privada. Aplicação do código de defesa do consumidor. Ofensa ao ato 22 ARRUDA, Maria da Glória Chagas. A previdência privada aberta como relação de consumo. São Paulo: LTR, 2004, 197 e 198. 23 ARRUDA, Maria da Glória Chagas. A previdência privada aberta como relação de consumo. São Paulo: LTR, 2004, 200 e 202. 18 jurídico perfeito. Matéria infraconstitucional. Reexame fático-probatório. Interpretação de cláusulas contratuais. Prequestionamento. Fundamento inatacado do acórdão recorrido. [...] - Aplicam-se os princípios e regras do Código de Defesa de Consumidor à relação jurídica existente entre a entidade de previdência privada e seus participantes. [...] A participação no plano oferecido pela previdência privada ocorre com a celebração do contrato previdenciário. Através deste negócio jurídico o participante transfere à entidade certos riscos sociais ou previdenciários, mediante o pagamento de contribuições, a fim de que, ocorrendo determinada situação prevista contratualmente, obtenha da entidade benefícios pecuniários ou prestação de serviços. [...] Dessa forma, o vínculo jurídico entre o participante e a entidade de previdência privada é relação de consumo, aplicando-se, assim, os princípios e regras do Código de Defesa do Consumidor. (grifos do autor) (Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial nº 306.155, rel. Min. Nancy Andrighi, Diário de Justiça de 25.02.2002). 24 De forma semelhante, Arthur Bragança de V. Weintraub compartilha do entendimento de que as EAPC são enquadráveis na relação de consumo, haja vista que são constituídas como sociedades anônimas, tendo fins lucrativos e com acessibilidade a todas às pessoas, quer dizer, no mercado de consumo, in verbis: Como são sociedades anônimas com natural finalidade lucrativa, as entidades abertas não despertam discussão sobre a sua caracterização como fornecedoras de serviços (colocando seus participantes como consumidores). Os planos destas entidades são acessíveis a quaisquer pessoas (físicas, em planos individuais e jurídicas, nos planos coletivos), e sua qualificação comercial pela exploração da atividade de fornecimento dos serviços securitários/previdenciários visando a obtenção de lucro é nitidamente de relação de consumo. 25 Feito isso, a questão a ser posta e que permeará o presente trabalho é a seguinte: as características já apontadas a respeito das EFPC – Entidades Fechadas de Previdência Complementar – em termos de constituição e composição afastariam per se a incidência da Súmula 321 do STJ, ou seja, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor – CDC – nas relações entre a entidade e os participantes? Como tem se posicionado a doutrina e a jurisprudência a respeito do tema? 24 AMARAL FILHO, Léo do. Previdência privada aberta. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 240 e 241. WEINTRAUB. Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência privada. Doutrina e jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 163. 25 19 Antes de se prosseguir nas discussões a respeito do problema posto, cabe situá-lo, ainda que de forma panorâmica, sob o enfoque constitucional, a fim de não se enveredar por posicionamentos precipitados ou equivocados a respeito do tema. Nesse sentido, é forçoso transcrever o art. 5º, inciso XXXII, o art. 10 e o art. 170, caput e inciso V, todos da Constituição Federal, que dispõem: Art. 5º [...] [...] XXXII. O Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor; Art. 10. É assegurada a participação dos trabalhadores e empregadores nos colegiados dos órgãos públicos em que seus interesses profissionais ou previdenciários sejam objeto de discussão e deliberação. (grifos nossos) Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (grifos nossos) [...] V – defesa do consumidor 26 Por seu turno, no que tange à previdência complementar, a Carta Magna traz o seguinte enunciado, conforme art. 202: O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar. 27 No contexto constitucional, com base nos dispositivos indicados anteriormente, pode-se depreender a especial atenção dispensada ao consumidor, o que não significa desprezar a importância das demais variáveis imbricadas na relação de consumo, sob pena de inviabilizar o funcionamento do próprio mercado. De todo modo, fica evidente nos referidos dispositivos a 26 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. 11. ed. São Paulo: Rideel, 2010. 27 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. 11. ed. São Paulo: Rideel, 2010. 20 ênfase que é dispensada ao consumidor, a exemplo do consignado no inciso XXXII, art. 5º, da Constituição Federal. 28 Ora, desde já, registre-se que as questões envolvendo o consumidor remetem à dimensão de princípios (art. 170, V) e estão entre as garantias fundamentais (art. 5º, inciso XXXII), cuja análise será efetuada oportunamente. Portanto, não se pode olvidar na abordagem do problema posto as discussões constitucionais e principiológicas sob pena de se adotar posicionamentos reducionistas. De qualquer modo, é forçoso esclarecer o seguinte ponto evocado no âmbito constitucional com os respectivos desdobramentos: mas de que proteção ou de quem, afinal, a Constituição Federal está se referindo, ou melhor, quais as figuras e contexto presentes nesse embate de relação jurídica de consumo? O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 2º, caput e § combinado com o art. 3º caput definem de forma bastante elucidativa esses aspectos, pelo menos para o presente propósito, senão vejamos: Art. 2º. Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo. Art. 3º. Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestações de serviços. 29 A par dos enunciados supra Amaral Júnior e Moraes, citados por Cláudia Lima Marques, ponderam que o consumidor não detém informações suficientes a respeito de produtos ou serviços que demanda no mercado, razões pelas quais se mostra hipossuficiente e vulnerável diante do fornecedor, sendo que sua vulnerabilidade se manifesta na dimensão técnica, jurídica, política ou legislativa, biológica ou psicológica, econômica ou social e ambiental. In verbis: 28 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. 11. ed. São Paulo: Rideel, 2010. 29 BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. 11. ed. São Paulo: Rideel, 2010. 21 [...] o consumidor é vulnerável porque não dispõe dos conhecimentos técnicos necessários para a elaboração dos produtos ou para a prestação dos serviços no mercado. Por essa razão, o consumidor não está em condições de avaliar, corretamente, o grau de perfeição dos produtos e serviços [...] Por sua vez, Moraes identifica a vulnerabilidade técnica, jurídica, política ou legislativa, a biológica ou psicológica, a econômica ou social e a ambiental; assim com várias situações ou formas de tornar o consumidor vulnerável. Lista as seguintes formas de tornar o consumidor vulnerável: a) tecnicismo dos contratos; b) complexidade e extensão contratual; c) predisposição; d) generalidade dos contratos; e) estado de necessidade; dimensão dos caracteres dos contratos [...] 30 Segundo Nelson Nery Júnior, a partir do enunciado no art. 2º, caput combinado com o art. 3º do CDC, são identificados três elementos constitutivos de uma relação jurídica de consumo: a) os sujeitos: consumidor e fornecedor; b) o objeto: produto ou serviço; e) elemento teleológico: é a finalidade da aquisição ou utilização do produto ou serviço por parte do consumidor, o qual é considerado o destinatário final. Frisa o autor que o “CDC não fala de ‘contrato de consumo’, ‘ato de consumo’, ‘negócio jurídico de consumo’, mas de relação de consumo, termo que tem sentido mais amplo do que aquelas expressões [...]” 31 Definidos os atores da relação consumerista, o CDC conceitua produto e serviço nos termos dos §§ 1º e 2º do art. 3º, conforme abaixo: Produto é qualquer bem móvel, ou imóvel, material ou imaterial. Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. 32 Verificam-se nos dispostos supra uma perspectiva aberta e genérica a respeito de produto e serviço, tendo como única condição a remuneração. No entanto, quanto a este aspecto, em que um terceiro se envolve na relação por via reflexa e sem o seu consentimento – e.g. inscrição em 30 AMARAL JR., Alberto do. A boa-fé e o controle das cláusula contratuais abusivas nas relações de consumo. Revista Direito do Consumidor, v. 6, p. 27-33; MORAES, Paulo Valério Dal Pai. O Código de Defesa do Consumidor: princípio da vulnerabilidade do contrato, na publicidade, nas demais práticas comerciais. Porto Alegre: Síntese, 1999. Apud MARQUES, Cláudia Lima. Campo de aplicação do CDC. In: BENJAMIN, Antônio Herman V. et al Manual de Direito do Consumidor. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 73. 31 NERY JÚNIOR, Nelson. Da proteção contratual. In: GRINOVER, Ada Pellegrini. et al Código brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, V. I, 2011, p. 512-513. 32 BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. 11. ed. São Paulo: Rideel, 2010. 22 banco de dados como mau pagador por uma compra que não realizou – já existe corrente que define fornecedor por equiparação, a exemplo de Leonardo Bessa, referenciado por Cláudia Lima Marques, mas que não será objeto de apreciação neste trabalho. 33 Cabe assinalar que a relação de consumo se opera dentro de um mercado, aí compreendido, segundo Newton de Lucca, como o ambiente no qual se processam as relações de permuta de bens e de prestação de serviços, mediante a participação dos inúmeros agentes econômicos, in verbis: [...] Nos livros de Direito, em geral, a expressão (mercado) é corriqueiramente utilizada pelos autores como se se tratasse de uma noção absolutamente consabida por todos. Mas, se é verdade que, em Economia, o conceito já terá sido objeto das mais profundas análises, o mesmo não parece ter ocorrido relativamente à Ciência Jurídica [...] Já se deixou assentada, linhas atrás, uma primeira e preliminar noção de mercado, caracterizando-o como a cadeia das relações de troca de bens e de prestação de serviços, realizadas pelos diversos agentes econômicos.34 Mais adiante Lucca esclarece que essas relações de troca de bens e de prestação de serviços, ocorrem, de algum modo, em dado lugar e em determinado tempo, o que abrangeria, consoante o autor, o próprio comércio eletrônico. A título de conceito, Lucca afirma que o “Mercado é o conjunto das relações de troca de bens e de prestação de serviços, praticadas pelos diversos agentes econômicos, em determinado tempo e lugar”. 35 Não se pretende aqui discutir e muito menos aprofundar o conceito de mercado, mas cabe somente esclarecer que esta perspectiva jurídica conceitual será utilizada a respeito da expressão. Assim, ainda quanto a essa questão, Lucca afirma que a vulnerabilidade do consumidor reconhecida no CDC só pode ser entendida no ambiente de mercado. Nesse sentido, é oportuno transcrever suas palavras: 33 MARQUES, Cláudia Lima. Campo de aplicação do CDC. In: BENJAMIN, Antônio Herman V. et al Manual de Direito do Consumidor. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 85. 34 LUCCA, Newton de. Direito do consumidor. Teoria geral da relação de consumo. São Paulo: Quartier Latin, 2003, p. 162. 35 LUCCA, Newton de. Direito do consumidor. Teoria geral da relação de consumo. São Paulo: Quartier Latin, 2003, p. 163. 23 Entendo que as expressões mercado de consumo, de um lado, e reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor, de outro – com a primeira colocada imediatamente após a segunda – só podem ser interpretadas no sentido de que nelas existe uma espécie de interpenetração substancial. Em outras palavras, o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor só pode darse, para os efeitos da aplicação da legislação tutelar, no âmbito do mercado de consumo, ainda que se possa conceber a existência de outras vulnerabilidades e de outros consumidores que não se apresentam, necessariamente, no contexto de um mercado de consumo. 36 (grifos do autor) É importante consignar, desde já, que a constituição de fundo de pensão por parte do empregador, que passa a figurar como patrocinador, não tem reflexos jurídicos na relação trabalhista que mantém com o empregado, de modo que este último pode permanecer como participante da entidade mesmo após a ruptura do vínculo empregatício. Para Póvoas: [...] Outra característica destas obrigações (como patrocinador de entidade fechada) é que elas nada têm a ver com os contratos de trabalho, celebrados entre a empresa e os inscritos nos planos previdenciários da entidade. Por outro lado, uma coisa é a posição do empregado em relação à empresa e outra, totalmente diferente, a sua posição em relação à entidade. Se é certo que esta sua posição só foi possível porque ele era empregado na empresa, não é menos certo que a relação jurídica estabelecida com a entidade é completamente autônoma, até porque pode continuar, mesmo depois de desfeito o vínculo empregatício. 37 Em que pesem os indicativos feitos até aqui a respeito da relação jurídica de consumo, quando se defronta com conflito entre participantes e Entidades Fechadas de Previdência Complementar, a temática ainda tem se mostrado polêmica, ainda que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – STJ – encontre-se sedimentada, conforme se verá adiante. Assim, após a apresentação do contexto em que se situa a questão posta, qual seja, a incidência ou não do CDC na relação entre Entidades Fechadas de Previdência Complementar – EFPC – e os participantes dos planos de benefícios, tendo como ponto de partida o enunciado da Súmula 321 do STJ, na seqüência serão analisados argumentos da doutrina e jurisprudência a respeito da problemática, tanto contrários quanto favoráveis. 36 LUCCA, Newton de. Direito do consumidor. Teoria geral da relação de consumo. São Paulo: Quartier Latin, 2003, p. 186. 37 PÓVOAS, Manuel Sebastião Soares. Previdência privada: filosofia, fundamentos técnicos e conceituação jurídica. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 227-228. 24 3. Metodologia aplicada na pesquisa jurisprudencial A pesquisa dos repositórios jurisprudenciais foi realizada no período de 09.04.2013 a 18.04.2013, nos sites do Superior Tribunal de Justiça – STJ – do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás – TJGO – do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul – TJRS – do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios – TJDFT – Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP – e do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia – TJBA. A opção pelas jurisprudências desses tribunais se deu pelas seguintes razões: a) no caso do STJ, em função de ter editado a Súmula 321, que teve vigência a partir de 2005, e por ser a última instância no que tange à divergência de hermenêutica e aplicação de norma infraconstitucional.Além disso, tem posicionamento sedimentado em favor da incidência do CDC nas relações entre EFPC e participante; b) o TJGO por ser um tribunal bastante consultado por este pesquisador na elaboração de suas peças recursais, além de dispor de decisões díspares em outros temas comparativamente, e.g., ao TJDFT e do próprio STJ 38 ; c) o TJRS pelo reconhecimento público e notório de suas decisões vanguardistas e diferenciadas; d) o TJDFT por estar situado no local de realização do presente trabalho; e) o TJSP por ter havido referência de um de seus julgados nesta monografia em citação de um doutrinador; f) o TJBA para se buscar maior representatividade da amostra dos acórdãos prospectados. Nesse sentido, para realizar as buscas jurisprudenciais foram utilizadas as expressões “CDC e Previdência”, “CDC e Previdência Complementar” e “CDC e Previdência Fechada”, cuja análise preliminar era feita na própria ementa, de modo a identificar a aderência com o tema 38 No caso da Tarifa de Abertura de Crédito (TEC) e Tarifa de Emissão de Carnê/Boleto (TAC) cobradas pelas instituições financeiras por ocasião da concessão de crédito, o TJGO tem posicionamento sedimentado no sentido de afastar tais cobranças, por considerá-las abusivas, conforme disposto no art. 51, inciso IV, do CDC (vide AgRg Cível nº 185396-75.2009.8.09.0174, de 26.02.2013, do Egrégio TJGO, Rel. Desa. Amélia Martins de Araújo; TJGO, 2ª Câmara Cível, AC nº 109082-69, DJ 840 de 15/06/2011, Rel.: Des. Carlos Alberto Franca; TJGO, 3ª Câmara Cível, AC nº 17841-02, DJ 819 de 16/05/2011, Rel.: Des. Walter Carlos Lemes; TJGO, 1ª Câmara Cível, AC nº 68571-52, DJ 795 de 07/04/2011, Rel.: Des. João Ubaldo Ferreira). 25 desta monografia. Prima facie, aí considerando principalmente a pesquisa feita no repositório do STJ, que foi a mais completa, o verbete “CDC e Previdência” se mostrou o mais abrangente, de maneira que o seu teor continha os julgados das demais expressões, razão pela qual se optou por utilizá-lo nos demais tribunais. Para prospectar as decisões, foi assinalada a opção de “acórdãos” em todos os sistemas de busca dos tribunais, inclusive do STJ. Consigne-se que, salvo o repositório do STJ, os sites dos demais tribunais tiveram as ementas analisadas por amostragem e na sequência da disponibilização das páginas de consulta, no máximo, até a sexta página, dado a grande quantidade de julgados, especialmente o TJSP, sendo que muitos deles versavam sobre outras temáticas. Além disso, o propósito era de extrair as decisões mais recentes. Buscou-se, ainda, focar os julgados tanto contrários quanto favoráveis à incidência e aplicação do CDC dentro do período temporal posterior à edição da Súmula 321 do STJ (publicada no DJ em 05.12.2005), ou seja, a partir de 2006 até 2013. Dada a importância de tal súmula, os acórdãos anteriores do STJ que a embasaram foram abordados nesta pesquisa, o mesmo ocorreu com julgado AI 163.840.5/1-4ª. Câmara, Rel. Des. Brenno Marcondes – VU, julg. 25.05.2000, só que por outro motivo, que já se evidenciou alhures. Em nível de amostragem, há sinalizações de que o posicionamento dos tribunais – TJRS, TJDFT e TJSP – parece favorável à aplicação do CDC nas relações jurídicas entre participantes e EFPC, já que não foram identificados acórdãos posteriores à edição da Súmula 321 em sentido contrário. Por outro lado, suspeita-se que no TJGO e TJBA, haja mais julgados divergentes da posição da Súmula 321. De todo modo, no caso do TJSP, TJRS e TJDFT, caberia ampliar a quantidade de ementas e teor dos acórdãos analisados, dado os volumes significativos de repositório jurisprudencial destes tribunais. 26 No caso específico da prospecção efetuada no site do STJ, foram descartados entre os 33 arestos identificados os que não estavam relacionados com o presente tema, de maneira que restaram 22 acórdãos. Destes últimos, 20 (vinte) são decisões sobre conflitos entre participantes de planos de benefícios e Entidades Fechadas de Previdência Complementar – EFPC – e 2 (duas) de Entidades Abertas de Previdência Complementar – EAPC. É importante registrar que os 20 (vinte) acórdãos envolvendo participantes de planos de benefícios e EFPC o STJ entendeu pela incidência e aplicação do Código de Defesa do Consumidor, numa demonstração clara da sedimentação do posicionamento daquela Egrégia Corte. Note-se que foram 9 processos da PETROS, 5 processos da FUNCEF, 2 da ELETRA, 1 da VALIA, 1 da SISTEL, 1 da ELOS e 1 da FEMCO, cujas datas de julgamento estão situadas no intervalo temporal entre 04.05.2006 a 16.10.2012. O quadro abaixo sintetiza as principais características das buscas jurisprudenciais efetuadas: Tribunal TJGO Local busca Verbete http://www.stj.jus.br/SCON/index.jsp?li vre=cdc+e+previd%EAncia&&b=ACO R&p=true&t=&l=10&i=1 CDC e Previdência http://www.tjgo.jus.br/index.php/consu lta-atosjudiciais CDC e Previdência TJRS http://www.tjrs.jus.br/busca/?tb=jurisn ova&partialfields=tribunal%3ATribunal %2520de%2520Justi%25C3%25A7a%2 520do%2520RS.(TipoDecisao%3Aac% 25C3%25B3rd%25C3%25A3o|TipoDeci sao%3Amonocr%25C3%25A1tica|Tipo Decisao:null)&t=s&pesq=ementario. CDC e Previdência STJ TJDFT TJSP TJBA http://www.tjdft.jus.br/ CDC e Previdência https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/consultaCo mpleta.do CDC e Previdência http://esaj.tjba.jus.br/cjsg/consultaCom pleta.do CDC e Previdência Período Qtde. acórdãos 09 a 14.04.2013 33 16.04.2013 77 16 a 18.04.2013 554 18.04.2013 305 16 a 18.04.2013 7.034 18.04.2013 57 27 Por último, convém assinalar que a Súmula 321 foi embasada por 5 (cinco) julgados em sede de Recurso Especial, que contemplaram 3 (três) Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Centrus, julgado em 06.05.2004; Sistel, julgado em 17.06.2004 e Valia, julgado em 19.11.2001) e 2 (duas) Entidades Abertas de Previdência Complementar (Montab, julgado em 04.11.1999 e Sabemi, julgado em 07.10.2004). Oportunamente, serão efetuados comentários a respeito dos fundamentos jurídicos mais relevantes dos acórdãos que embasaram a edição da Súmula 321, especificamente, dos três que envolveram os fundos de pensão. 28 4. Argumentos contrários à aplicação do CDC nas EFPC Verifica-se na doutrina posicionamento contrário à interpretação e aplicação extensiva da Súmula 321 do STJ e, por conseguinte, do Código de Defesa do Consumidor nas relações entre participantes e Entidades Fechadas de Previdência Complementar. Entre os argumentos apontados, que é a posição defendida por Lygia Avena, encontram-se as noções de amplitude, finalidade, enquadramento, especificidades legais e representação em conselho no âmbito dessas entidades, que a seguir se fará o detalhamento para maior compreensão. 39 Desse modo, quanto à amplitude, assevera Lygia Avena que a relação previdenciária operada nas EFPC abrange um público específico, não estando aberta ao mercado em geral, conforme disposto no art. 31, caput e incisos, o que, no seu entendimento afastaria uma relação de consumo. Segundo a autora, o § 2º do art. 3º do CDC expressa claramente que o conceito de “serviço” é aquele oferecido no mercado de consumo por meio de remuneração, aí no sentido amplo e indiscriminado de consumidores, sem nenhum tipo de restrição, o que diverge da natureza jurídica da concepção das EFPC, in verbis: Nos termos da citada Lei (art. 3º, § 2º, do CDC), portanto, a relação de consumo está vinculada às noções de comercialização pelo fornecedor de produtos ou serviços e à sua distribuição ampla, no mercado de consumo, com finalidade comercial ou lucrativa. Tais características, expressas no CDC para fins de configurar a relação de consumo, não estão presente na relação previdenciária entre participantes e entidades fechadas de previdência complementar. Essas entidades, nos expressos termos do art. 31, I, da Lei nº 109/01, possuem abrangência restrita, tendo os seus planos de benefícios direcionados a um grupo fechado de empregados de uma empresa ou grupo de empresas patrocinadoras, sendo ainda previstos, como seus destinatários, nos termos de lei específica a regular a matéria, os servidores da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, que optem por serem filiados aos planos de benefícios [...] 40 (grifos da Autora) 39 AVENA, Lygia. Distinção da relação previdenciária das EFPC com seus participantes da relação de consumo do Código de Defesa do Consumidor. In: GOES, Wagner de. Gestão de fundos de pensão – aspectos jurídicos. São Paulo: ABRAPP, 2006, p. 78 a 80. 40 AVENA, Lygia. Distinção da relação previdenciária das EFPC com seus participantes da relação de consumo do Código de Defesa do Consumidor. In: GOES, Wagner de. Gestão de fundos de pensão – aspectos jurídicos. São Paulo: ABRAPP, 2006, p. 75. 29 Também para Weintraub não há que se falar em enquadramento da relação jurídica entre participante e EFPC no CDC, tendo em vista que os fundos de pensão não figuram como fornecedora de produtos ou serviços, mesmo porque o público-alvo dos planos de benefícios são pessoas com vínculo estabelecido com patrocinador ou instituidor. Neste caso, segundo o autor, a relação ocorre fora do chamado mercado de consumo, in verbis: [...] Fundos de pensão não são fornecedores de serviços de consumo. O art. 3º do Código de Defesa do Consumidor conceitua serviços de consumo (proporcionado por fornecedores) com atividade fornecida no mercado. Os fundos de pensão não ofertam seus planos no mercado, até porque deve haver vinculação do participante com patrocinador ou instituidor para ingresso no plano fechado. 41 Em seguida, Weintraub indica uma jurisprudência do TJSP – AI 163.840.5/1-4ª. Câmara, Rel. Des. Brenno Marcondes – VU, julg. 25.05.2000, que está em convergência com o seu posicionamento. Todavia, o autor reconhece que esse tipo de entendimento jurisprudencial é escasso entre os tribunais. Note-se que se trata de decisão anterior à edição da Súmula 321 do STJ, a qual só teve vigência a partir de 2005. Ainda na análise das características dos fundos de pensão, esclarece Avena que quanto à finalidade, as EFPC por natureza são constituídas sem fins lucrativos, sob a forma de fundação ou sociedade civil, com caráter previdenciário, razão pela qual inexiste escopo de comercialização ou lucratividade dos serviços oferecidos, diferentemente da relação de consumo, cuja comercialização de produtos ou serviços está sempre atrelada à lucratividade. Segundo a autora, os valores desembolsados pelos participantes não apresentam natureza remuneratória, mesmo porque tais quantias serão revertidas em benefícios aos próprios participantes ou pessoas a quem estes tenham indicado, conforme se depreende da afirmação abaixo: Ressalta, pois, do mesmo modo que ocorre com a contribuição para a Previdência Social, que a contribuição previdenciária do participante ao plano de benefícios não possui o condão de revestir-se de remuneração, nos termos da finalidade lucrativa ou comercial de que trata o art. 3º, § 2º, do Código de Defesa do consumidor. 41 WEINTRAUB. Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência privada. Doutrina e jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 163-164. 30 [...] todo o patrimônio de tais entidades e seus respectivos rendimentos de aplicação são integralmente direcionados para a concessão e manutenção dos benefícios previdenciários aos seus participantes. Não há, pois, distribuição do seu patrimônio, já que o patrimônio é revertido integralmente em prol da finalidade previdenciária para a qual foram criadas estas entidades. 42 No que tange ao enquadramento legal das EFPC, Avena esclarece que, enquanto a defesa do consumidor se encontra insculpida na Ordem Econômica e Financeira da Constituição Federal (art. 170, V), as EFPC foram abordadas pela Carta Magna na Ordem Social (art. 202), de forma que, no seu raciocínio, essa diferenciação constitucional afastaria a incidência do Código de Defesa do Consumidor nestas últimas. Segundo a autora, fica claro na Constituição Federal que a relação de consumo ocorre no contexto da atividade econômica e financeira, enquanto as relações estabelecidas entre participantes e EFPC se dão mediante perspectiva previdenciária, de caráter eminentemente de ordem social, conforme se depreende de sua afirmação abaixo: Na qualidade de prestadoras de benefícios de natureza previdenciária aos seus participantes e beneficiários, sob a forma de rendas e benefícios suplementares ou assemelhados aos da Previdência Social, inclusive concedendo benefícios de risco nos eventos aleatórios como invalidez, morte ou doença, as entidades fechadas de previdência complementar passaram a ter importante papel social. Neste contexto, são enquadradas no Título VIII, da Constituição Federal, na ‘Ordem Social’, estando disciplinadas no seu art. 202. [...] O princípio de defesa do consumidor, nos termos do art. 170, V, da Carta Magna, é destinado expressamente à Ordem Econômica, estando inserido no Título VII, da Constituição Federal, ‘Da Ordem Econômica e Financeira’ no Capítulo I, ‘Dos Princípios Gerais da Atividade Econômica e Financeira’. É, portanto, neste contexto, diverso daquele verificado na relação previdenciária, que se insere a relação de consumo. 43 Arthur Bragança de V. Weintraub tem esse mesmo posicionamento, na medida em que reforça a teleologia de caráter social inerente à previdência privada complementar, inclusive destacando o contexto previdenciário em que se dá tal tipo de relação, conforme se verifica abaixo: 42 AVENA, Lygia. Distinção da relação previdenciária das EFPC com seus participantes da relação de consumo do Código de Defesa do Consumidor. In: GOES, Wagner de. Gestão de fundos de pensão – aspectos jurídicos. São Paulo: ABRAPP, 2006, p. 77-78. 43 AVENA, Lygia. Distinção da relação previdenciária das EFPC com seus participantes da relação de consumo do Código de Defesa do Consumidor. In: GOES, Wagner de. Gestão de fundos de pensão – aspectos jurídicos. São Paulo: ABRAPP, 2006, p. 72. 31 Mesmo privada, porém, ela não perde jamais seu traço distintivo constitucional de elemento de proteção social. Fica evidenciado, portanto, que a mens legis do legislador constitucional não foi a de reduzir o campo previdenciário privado ao mero contexto de aplicações financeiras. Para resguardar a essência da proteção social inerente, notemos que o fundamento dos planos de Previdência Privada não é o enriquecimento da pessoa por meio de aplicações [...] Os planos previdenciários privados visam permitir uma continuidade no padrão de vida da pessoa, complementando ou não uma aposentadoria oficial. 44 Em relação à legislação aplicável à EFPC, Avena destaca a especificidade da Lei Complementar 109/01, que foca o equilíbrio dos planos de benefícios, os quais se baseiam em severas regras atuariais e sua operacionalização, portanto, no contexto de relação previdenciária, enquanto na relação de consumo busca-se equilíbrio entre consumidor e fornecedor no contexto de atividade econômica. A título de ilustração, a autora remete ao art. 21, caput da Lei Complementar 109/01 45, o qual dispõe que em caso de déficit, entre as opções para solucionar o problema, poderá a entidade definir, por meio de revisão do seu plano de custeio, majoração das contribuições dos participantes e contribuintes. In verbis: Ora, como coadunar tal hipótese e norma aplicável com a regra prevista no art. 51, X, do Código de Defesa do Consumidor, que dispõe ser nula a cláusula contratual que permita ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação de preço de maneira unilateral? Do mesmo modo, como conciliar tal previsão inserta na legislação que rege a relação de consumo com o princípio legal voltado ao equilíbrio econômico-financeiro e atuarial dos planos de benefícios, em proteção aos participantes, previsto no art. 3º, III, da Lei 109/01? 46 Outro aspecto das EFPC que, na concepção de Avena, excluiria a incidência do Código de Defesa do Consumidor nessa relação previdenciária, é o fato da própria Lei 109/01 prevê a representação e ingerência nos contratos dos participantes no Conselho Deliberativo, o qual tem entre outras funções, a de aprovar a instituição e mudança dos regulamentos dos planos de 44 WEINTRAUB. Arthur Bragança de Vasconcellos. Manual de direito previdenciário privado. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2004, p. 17,18 e 24. 45 BRASIL. Lei Complementar nº 109 de 29 de maio de 2001. Dispõe sobre o Regime de Previdência Complementar e dá outras providências. 14. ed. São Paulo: Rideel, 2012. Art. 21, caput: O resultado deficitário nos planos ou nas entidades fechadas será equacionado por patrocinadores, participantes e assistidos, na proporção existente entre as suas contribuições, sem prejuízo de ação regressiva contra dirigentes ou terceiros que deram causa a dano ou prejuízo à entidade de previdência complementar. 46 AVENA, Lygia. Distinção da relação previdenciária das EFPC com seus participantes da relação de consumo do Código de Defesa do Consumidor. In: GOES, Wagner de. Gestão de fundos de pensão – aspectos jurídicos. São Paulo: ABRAPP, 2006, p. 79 a 80. 32 benefícios das entidades, na forma disposta no art. 35 do referido diploma 47 . Nestes termos, afirma a autora, o participante de a possibilidade efetiva de interferir na gestão direta das EFPC, o que não ocorre na relação consumerista. 48 Em convergência a este ponto, Weintraub esclarece que, diferentemente da EAPC, nas EFPC os participantes compõem a estrutura organizacional, podendo interferir nas decisões que dão o rumo destas entidades, de maneira que esse tipo de relação jurídica não exigiria intervenção estatal para se buscar harmonização de interesses, conforme dispõe o art. 4º do CDC. Nesse sentido, afirma o autor: [...] Essencialmente, porém, os fundos de pensão são constituídas em suas estruturas internas por participantes. Os participantes possuem ingerência efetiva sobre a administração da entidade fechada; o que não se passa nas entidades abertas ou empresas públicas. O art. 4º do Código de Defesa do Consumidor determina a ação do Estado para garantia da harmonização dos interesses das partes na relação de consumo. Os fundos de pensão, pela participação intrínseca dos participantes, permite uma harmonização autocompositiva. 49 Por último, Avena argúi que, entre os argumentos que fundamentaram a edição da Súmula 321 do STJ e, por conseqüência, a incidência equivocada do CDC nas relações entre participantes e fundos de pensão, consiste na extensão do termo ‘securitária’, constante no art. 3º, § 2º, do CDC, às atividades previdenciárias, o que a autora não concorda. Segundo ela, as relações dos fundos de pensão ocorrem num ambiente restrito, fora do ‘mercado de consumo’ e não há finalidade lucrativa. Assim, afirma Avena: [...] a argumentação utilizada como embasamento da Súmula 321, para fins do enquadramento das EFPC ao CDC, de que a atividade prestada é securitária, não se compatibiliza com a sua atividade previdenciária específica, bem distinta da acepção de seguro abordada na fundamentação do Tribunal Superior. Nesse sentido, apenas a título de argumentação, se fosse considerado um conceito amplo de atividade securitária, como atividade prestada pelos Fundos de Pensão, ainda assim, em harmonia ao art. 3º 47 Lei Complementar 109/2001, art. 35, § 1º: O estatuto deverá prever representação dos participantes e assistidos nos conselhos deliberativo e fiscal, assegurado a eles no mínimo (um terço) das vagas. 48 AVENA, Lygia. Distinção da relação previdenciária das EFPC com seus participantes da relação de consumo do Código de Defesa do Consumidor. In: GOES, Wagner de. Gestão de fundos de pensão – aspectos jurídicos. São Paulo: ABRAPP, 2006, p. 80. 49 WEINTRAUB. Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência privada. Doutrina e jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 164. 33 do CDC, tal atividade securitária seria aquela prestada em um contexto de escopo comercial ou lucrativo, acessível,, disponível ao mercado de consumo, à população em geral [...] 50 Comunga desse aspecto das EFPC Weintraub, o qual esclarece que, embora a relação jurídica tabulada entre participantes de planos de benefícios e fundos de pensão se operacionalize mediante contrato de adesão, tal característica per se não configura relação de consumo. Além disso, o autor é bastante incisivo em afastar as EFPC da condição de fornecedora de serviços, porquanto o seu âmbito de atuação fica circunscrito a um contexto que não se poderia considerar como mercado, conforme se depreende a partir de sua afirmação abaixo: Os contratos de adesão de entidades fechadas são estabelecidos unilateralmente, sem que o participante possa discutir ou modificar substancialmente seus conteúdos. Entretanto, não é porque há contrato de adesão que a relação é de consumo. Fundos de pensão não são fornecedores de serviço de consumo. O art. 3º do Código de Defesa do Consumidor conceitua serviços de consumo (proporcionado por fornecedores) como atividade de mercado. 51 Paulo Sérgio Cavezzale acompanha também o raciocínio de que as entidades fechadas de previdência complementar são de natureza jurídica totalmente diversa das entidades abertas de previdência complementar, ensejando, por isso, tratamento específico e diferenciado, à luz das orientações contidas na Lei Complementar 109/2001, de maneira que não incidiria o CDC nas suas relações. Nesse sentido, pontua Cavezzale, as EFPC são constituídas sob a forma de fundação ou sociedade civil, sem fins lucrativos, sendo acessível a um público restrito. Além disso, ao contrário das EAPC, as atividades desempenhadas pelas EFPC não são de natureza financeira, pois seu objeto é “a administração e a execução de planos de natureza previdenciária, considerados suplementares ou assemelhados aos da previdência oficial, e se organizam necessariamente sob a forma de fundação ou sociedade civil sem fins lucrativos”. 52 50 AVENA, Lygia. Distinção da relação previdenciária das EFPC com seus participantes da relação de consumo do Código de Defesa do Consumidor. In: GOES, Wagner de. Gestão de fundos de pensão – aspectos jurídicos. São Paulo: ABRAPP, 2006, p. 81. 51 WEINTRAUB. Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência privada. Doutrina e jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 164. 52 CAVEZZALE, Paulo Sérgio. EFPC: sua correta natureza jurídica e decorrências. In: GOES, Wagner de. Gestão de fundos de pensão – aspectos jurídicos. São Paulo: ABRAPP, 2006, p. 13 e ss. 34 Mais adiante, Cavezzale descreve a diferenciação da natureza jurídica e finalidades das EAPC e das EFPC, buscando com isso, afastar qualquer tipo de incidência do CDC nos contratos desta última, senão vejamos: Estas (EAPC), como assinalamos, são empresas comerciais que atuam com intuito de lucro. Aquelas (EFPC), ao contrário, não possuem natureza mercantil, não visam à obtenção de lucros, têm por fim último, em face da insuficiência dos serviços previdenciários estatais, complementar, através de uma ação subsidiária, os programas previdenciários oficiais e dar assistência a determinados grupos de pessoas. Por outras palavras: as empresas abertas de Previdência Privada têm caráter comercial, não são órgãos previdenciários, e tampouco são entidades assistenciais. As instituições fechadas, ao contrário, têm fins mutualistas – embora organizadas com sofisticação própria de nossa época – não visam fins lucrativos [...] 53 Para Paulo Sérgio Cavezzale quando da edição da Súmula 321 pelo Superior Tribunal de Justiça não houve preocupação em discernir a natureza jurídica e definições estruturais de cada uma das espécies que compõem a previdência privada, quais sejam, a Entidade Aberta de Previdência Complementar e Entidade Fechada de Previdência Complementar. O autor pontua as características específicas e diferenciadoras das referidas entidades que não foram observadas no momento da formulação da súmula, o que, segundo ele, compromete sua aplicação. 54 Nesse sentido, Cavezzale traça um paralelo entre as diferenças estruturais das EAPC comparativamente às EFPC, destacando que estas são de acesso restrito, constituídas sob a forma fundação ou sociedade civil, não tem fins lucrativos, só podem atuar dentro de seu objeto previsto na legislação, cuja área de competência é do Ministério de Previdência e Assistência Social – MPS. Em função destes atributos, o autor afirma: Considerando-se estas características, além do fato de exercerem funções complementares às do Estado, no sentido de suprir suas deficiências na esfera previdenciária, conclui-se que, independentemente da existência ou não de contribuições por parte dos participantes as EFPC são instituições de assistência social para todos os fins, inclusive tributários. Não podem ser confundidas, ainda, com EAPC, 53 CAVEZZALE, Paulo Sérgio. EFPC: sua correta natureza jurídica e decorrências. In: GOES, Wagner de. Gestão de fundos de pensão – aspectos jurídicos. São Paulo: ABRAPP, 2006, p. 13 e ss. 54 CAVEZZALE, Paulo Sérgio. EFPC: sua correta natureza jurídica e decorrências. In: GOES, Wagner de. Gestão de fundos de pensão – aspectos jurídicos. São Paulo: ABRAPP, 2006, p. 16. 35 instituições financeiras, companhias de seguro, ou prestadoras de serviço, para os efeitos de aplicação do CDC. 55 Segundo Cavezzale, associados às características já indicadas e que são inerentes às EFPC, não se pode olvidar o caráter facultativo da relação jurídica entabulada entre participante e entidade, os requisitos que devem compor os planos de benefícios, a regulação mediante lei civil, entre outros, numa sinalização inequívoca de que fica configurado contrato de adesão. Nesses termos, o autor afirma: Por sua vez, o caráter facultativo da vinculação, os requisitos obrigatórios que devem constar dos planos de benefícios; a necessidade de aprovação por parte das SPC de disposições constantes nos planos de benefícios; o fato de serem as EFPC reguladas, entre outras, pela lei civil; e, finalmente, a significativa ingerência do poder público na elaboração dos seus planos de benefícios são alguns dos fatores decorrentes da própria legislação, indicadores de que a relação entre o participante e EFPC consiste em contrato de adesão [...] Fica patente, portanto, que, a exemplo das súmulas equivocadas, boa parte do tratamento inadequado – judicial ou administrativo – dado às EFPC se deve à inobservância dos aspectos mencionados, que indicam e fundamenta a natureza daquelas entidades, que, como foi exposto, é a de entidades privadas assistenciais, como conceituou Russomano; ou entes de cooperação com o Poder Público; ou ainda instituições de assistência previdenciária; de direito privado, sem fins lucrativos, situadas na área de competência do Ministério da Previdência. Deve-se, igualmente, à pouca atenção dispensada à natureza jurídica do vínculo existente entre participantes e entidades, ou seja, contratual civil previdenciária. (grifos nossos) 56 Também para Weintraub a relação entre participante e EFCP se processa por meio de contrato, cuja regulação se dá no Direito Civil, nos seguintes termos: Firmado o contrato (de adesão) entre participantes e as entidades de Previdência Privada, perfaz-se, uma relação jurídica de Direito Civil. Juridicamente, esse ambiente contratual intrínseco à Previdência Privada é corroborado pela jurisprudência, inclusive pela Súmula n. 92 do STJ: ‘o direito à complementação de aposentadoria, criado pela empresa, com requisitos próprios, não se altera pela instituição de benefício previdenciário por órgão oficial’. A relação é de Direito Privado, por envolver o contexto particular da sociedade, embora esteja acompanhando matérias típicas de Direito Público. Mesmo assim, há conexões intrínsecas com o chamado Direito Social. 57 55 CAVEZZALE, Paulo Sérgio. EFPC: sua correta natureza jurídica e decorrências. In: GOES, Wagner de. Gestão de fundos de pensão – aspectos jurídicos. São Paulo: ABRAPP, 2006, p. 19. 56 CAVEZZALE, Paulo Sérgio. EFPC: sua correta natureza jurídica e decorrências. In: GOES, Wagner de. Gestão de fundos de pensão – aspectos jurídicos. São Paulo: ABRAPP, 2006, p. 20-21. 57 WEINTRAUB. Arthur Bragança de Vasconcellos. Manual de direito previdenciário privado. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2004, p. 25; 73-74. 36 Verifica-se em Jerônimo Jesus dos Santos posicionamento que se coaduna com as teses em comento até aqui, na medida em que aquele autor identifica singularidade na Entidade Fechada de Previdência Complementar, por considerá-la de natureza previdenciária, cujo acesso é restrito a um grupamento de pessoas. Além disso, Jerônimo Jesus dos Santos destaca que a finalidade dos fundos de pensão é exclusivamente a constituição e implementação de planos de benefícios, que é por essência previdenciária. Com base no disposto no art. 31, caput, da Lei Complementar 109, o autor identifica aspectos diferenciadores dessa espécie de entidade, de modo que é possível entrever nos seus comentários a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor nas relações envolvendo fundos de pensão e participante, conforme abaixo: Sob este olhar, pode-se, numa definição sumária, afirmar que as EFPC’s são aquelas que instituem e executam planos de benefícios de caráter previdenciário, cuja modalidade de acesso é restrita a determinadas pessoas físicas. [...] A partir dessa definição mais ampla, podemos extrair as seguintes características que identificam as EFPC’s: a) a EFPC é uma espécie do gênero entidade de previdência complementar; b) a iniciativa de instituir e manter uma EFPC pode ser do patrocinador, quando se trata de entidade que administra planos de benefícios dos empregados de uma empresa ou de grupos de empresas, ou planos de benefícios acessíveis aos servidores federais, estaduais ou municipais; ou do instituidor, quando se trata de entidade que administra planos de benefícios acessíveis a membros de pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial; c) a EFPC é sempre uma pessoa jurídica de direito privado, ainda que o patrocinador seja pessoa jurídica de direito público; d) as EFPC’s são, obrigatoriamente, constituídas sob a forma de fundação ou de sociedade civil sem fins lucrativos; e) as EFPC’s não podem ter fins lucrativos. A finalidade não lucrativa da entidade é obrigatória por força do disposto no § 1º do art. 31, da LC nº 109, de 2001; f) o acesso aos planos de benefícios das EFPC’s é restrito a determinados grupos ou categorias de pessoas físicas, ou seja, empregados de uma empresa ou grupo de empresas, servidores públicos, membros de categorias profissionais, classistas ou setoriais; g) o objeto institucional das EFPC’s é, única e exclusivamente, a instituição e execução de planos de benefícios de caráter previdenciário. 58 58 SANTOS, Jerônimo Jesus dos. Previdência privada. Lei da previdência complementar comentada. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora e Livraria Jurídica do Rio de Janeiro, 2005, p. 327-328. 37 Após análise do art. 2º, da Lei Complementar 109, Jerônimo Jesus dos Santos defende que o vínculo estabelecido entre participante e Entidade Fechada de Previdência Complementar se processa no âmbito do direito privado, mediante contrato, in verbis: Doutra via, registra-se que a relação de previdência complementar qualifica-se, fora de qualquer dúvida, como relação complexa de direito privado, por faltar a obrigatoriedade do vínculo e bem assim por ausentes as sanções inerentes ao seguro social obrigatório. O direito do participante deriva de um contrato a cuja formação permanece indiferente à lei. Além disso, nela não se pode vislumbrar a especificação de qualquer atividade integrada nos fins do Estado. Mesmo quando, na prática, ela se mostra obrigatória por figurar como cláusula do contrato de trabalho, não perde a feição negocial: a mera adesão do participante não a desqualifica como relação de origem contratual, porquanto ela se desenvolve na esfera da autonomia da vontade privada. 59 Nessa perspectiva de entendimento, Jerônimo Jesus dos Santos reforça que a EFPC não pode ter lucro ou mesmo prejuízo, à luz do disposto no art. 20 da Lei Complementar 109, sendo que na primeira hipótese há de se melhor os planos de benefícios ou diminuir as contribuições da patrocinadora e dos beneficiários, enquanto na segunda situação seria o caso de partilhar o déficit, de modo a assegurar a existência da própria entidade, conforme se verifica abaixo: As EFPC’s estão legalmente proibidas de ter lucro e, assim, submetem-se a regime contábil particular, em que evidentemente não se cogita de lucros ou prejuízos, mas sim de superávits (não distribuíveis e necessariamente reversíveis à melhoria dos planos de benefícios ou à redução das contribuições da patrocinadora e dos beneficiários) e déficits (que têm de ser imediatamente e solidariamente equacionados por uma e outros, a bem da sobrevivência da entidade). 60 Na jurisprudência, identificou-se no Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP – o acórdão AI nº 163.840.5/1, tendo como agravante Fundação CESP, que é uma Entidade Fechada de Previdência Complementar, cujo provimento afasta a aplicação do Código de Defesa do Consumidor num conflito em que a outra parte era um participante de plano de benefícios, conforme se verifica na ementa abaixo: EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA - Ré entidade fechada de previdência privada sem fins lucrativos - Inexistência de relação de consumo - Sede das atividades em São Paulo 59 SANTOS, Jerônimo Jesus dos. Previdência privada. Lei da previdência complementar comentada. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora e Livraria Jurídica do Rio de Janeiro, 2005, p. 78. 60 SANTOS, Jerônimo Jesus dos. Previdência privada. Lei da previdência complementar comentada. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora e Livraria Jurídica do Rio de Janeiro, 2005, p. 273. 38 - Foro competente - Art. 100, IV, "a" e "d"/do Código de Processo Civil – Recurso provido. (TJSP, AI nº 163.840.5/1, 4ª. Câmara de Direito Público, Rel. Des. Brenno Marcondes, julgado em 25.05.2000) Entre os fundamentos jurídicos utilizados para embasar o aresto acima, foi evocada a natureza de constituição da EFPC, que é sem fins lucrativos, cuja filiação aos planos de benefícios é exclusiva aos empregados e afirmou-se que o contrato deveria respeitar as regras da Lei 6.435/77 – que regulamentava na época os planos e benefícios de previdência privada – e não o Código de Defesa do Consumidor, in verbis: [...] Ocorre, porém, que a agravante é entidade fechada de previdência privada sem fins lucrativos que tem, entre suas finalidades, a concessão de benefícios complementares aos Provedores-beneficiários, ou seja, os empregados das empresas provedoras que venham a se filiar aos seus planos de benefícios e serviços ou que estejam de alguma forma vinculados ou ainda que venha a obter benefícios da fundação (fls. 32/34). Ademais, esses planos e benefícios são regidos pela Lei n° 6.435/77, porque sendo a agravante entidade fechada, é acessível exclusivamente aos empregados de um determinado grupo de empresas, qual seja, o das empresas Provedoras. Não se trata, assim, de contrato regido pelas normas do Código de Defesa do Consumidor porque, além de não ter a natureza de relação de consumo, o benefício pleiteado pelo agravado na ação ordinária é limitado àqueles empregados das provedoras que se filiarem aos respectivos planos e não a todas às pessoas indiscriminadamente. [...] (TJSP, AI nº 163.840.5/1, 4ª. Câmara de Direito Público, Rel. Des. Brenno Marcondes, julgado em 25.05.2000) Nessa mesma linha de entendimento, constatou-se julgado recente (03.04.2012) do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás – TJGO – que afastou a aplicação da Súmula 321 do Superior Tribunal de Justiça – STJ – e do próprio Código de Defesa do Consumidor, a fim de não desequilibrar a situação financeira e atuarial de Entidade Fechada de Previdência Complementar, que no caso em comento era a Fundação dos Economiários Federais – Funcef. Destacou-se o acórdão, ainda, tratar-se de pessoa jurídica sem fins lucrativos. In verbis: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. ENTIDADE FECHADA. COMPETÊNCIA. JUSTIÇA ESTADUAL. TRATO SUCESSIVO. PRESCRIÇÃO AFASTADA. SÚMULA 321/STJ. ALCANCE. AUXÍLIO ALIMENTAÇÃO. NATUREZA INDENIZATÓRIA. NÃO INTEGRALIZAÇÃO AO VALOR DO BENEFÍCIO. EQUILÍBRIO FINANCEIRO E ATUARIAL. [...] 39 3. A súmula 321, do STJ, afirma que “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável à relação jurídica entre a entidade de previdência privada e seus participantes”. Não obstante, a aplicação do CDC, indistintamente, para interpretar as cláusulas de contratos ou regulamentos sempre em favor do beneficiário, pode gerar desiquilíbrio financeiro e atuarial nas entidades fechadas de previdência complementar, que, por determinação legal, têm personalidade jurídica de fundação ou sociedade civil (art. 31, § 1º, LC 109/01), cuja finalidade não é o lucro. [...] APELO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. (TJGO, Apelação Cível nº 288730-09.2009.8.09.0051, 6ª. Câmara Cível, Rel. Des. Wilson Safatle Faiad, julgado em 03.04.2012) (grifos nossos) É curioso consignar que o acórdão do TJGO reformou sentença que pugnava pela incidência do CDC – por força da Súmula 321 do STJ – de maneira que a decisão do tribunal acabou sendo favorável neste aspecto ao recurso de apelação interposto pela Funcef, frise-se, que é um fundo de pensão. Na fundamentação do aresto, há uma nítida preocupação em não se utilizar indiscriminadamente o Código de Defesa do Consumidor na hermenêutica de cláusulas contratuais e de forma invariável em favor do beneficiário, o que pode ocasionar desequilíbrio de ordem financeira e atuarial, consoante entendimento do TJGO. O acórdão reforça, ainda, a finalidade não lucrativa dos fundos de pensão, além do que as prestações pagas retornam para os próprios beneficiários, in verbis: Esta questão merece uma discussão mais aprofundada, na medida em que a aplicação do CDC, indistintamente, para interpretar as cláusulas de contratos ou regulamentos sempre em favor do beneficiário, pode gerar desiquilíbrio financeiro e atuarial. É importante advertir que as “entidades fechadas” possuem personalidade jurídica de fundação ou sociedade civil, sem fins lucrativos, por determinação legal (art. 31, § 1º, LC 109/017). É bem verdade que podem e devem buscar formas de “capitalizar” os valores das contribuições pagas por seus participantes. Mas estas aplicações buscam justamente corrigir eventual saldo negativo nos fundos, e serão sempre revertidas para os próprios beneficiários, daí a importância das ciências atuarial e financeira. (TJGO, Apelação Cível nº 288730-09.2009.8.09.0051, 6ª. Câmara Cível, Rel. Des. Wilson Safatle Faiad, julgado em 03.04.2012) (grifos nossos) A questão suscitada no acórdão merece atenção, não pelas características em si das Entidades Fechadas da Previdência Complementar (sem fins lucrativos, não atua no mercado, as prestações retornam para os beneficiários etc.), mas diante da possibilidade de ocorrer, de fato, um desequilíbrio financeiro e atuarial do fundo de pensão, o que poderá prejudicar o próprio participante diante virtual redução dos seus benefícios. Em função disso, no próprio corpo do 40 acórdão remete-se ao movimento de “mutualismo inerente ao regime fechado de previdência privada”, que tem surgido nas decisões do STJ envolvendo conflitos de fundos de pensão, o que pode sinalizar mudança da jurisprudência sedimentada daquela Egrégia Corte no que tange ao teor da Súmula 321, in verbis: Aliás, conforme disposto no próximo tópico da fundamentação deste voto, o STJ já começa a enfrentar as relações estabelecidas entre Fundos de Pensão e seus beneficiários sob o prisma do “mutualismo inerente ao regime fechado de previdência privada”, utilizando da expressão da Ministra Isabel Galotti, o que pode indicar uma rediscussão sobre a inteligência da Súmula 321. (TJGO, Apelação Cível nº 28873009.2009.8.09.0051, 6ª. Câmara Cível, Rel. Des. Wilson Safatle Faiad, julgado em 03.04.2012) Dada a importância do movimento de “mutualismo inerente ao regime fechado de previdência privada”, que tem surgido no STJ, conforme indicado no acórdão do TJGO, convém transcrever parte da fundamentação de decisão daquela E. Corte tratando sobre o tema: RECURSO ESPECIAL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. COMPETÊNCIA. JUSTIÇA ESTADUAL. AUXÍLIO CESTA-ALIMENTAÇÃO. CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO. PROGRAMA DE ALIMENTAÇÃO DO TRABALHADOR - PAT. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA INDEVIDA. [...] 3. A inclusão do auxílio cesta-alimentação nos proventos de complementação de aposentadoria pagos por entidade fechada de previdência privada encontra vedação expressa no art. 3º, da Lei Complementar 108/2001, restrição que decorre do caráter variável da fixação desse tipo de verba, não incluída previamente no cálculo do valor de contribuição para o plano de custeio da entidade, inviabilizando a manutenção de equilíbrio financeiro e atuarial do correspondente plano de benefícios exigido pela legislação de regência (Constituição, art. 202 e Leis Complementares 108 e 109, ambas de 2001). 4. Recurso especial não provido. Verifico, pois, que a extensão de vantagens pecuniárias ou mesmo reajustes salariais concedidos aos empregados de uma empresa ou categoria profissional, de forma direta e automática, aos proventos de complementação de aposentadoria de ex-integrantes dessa mesma empresa ou categoria profissional, independentemente de previsão de custeio para o plano de benefícios correspondente, não se compatibiliza com o princípio do mutualismo inerente ao regime fechado de previdência privada e nem com dispositivos da Constituição e da legislação complementar acima mencionada, porque enseja a transferência de reservas financeiras a parcela dos filiados, frustrando o objetivo legal de proporcionar benefícios previdenciários ao conjunto dos participantes e assistidos, a quem, de fato, pertence o patrimônio constituído. (STJ, Segunda Seção, REsp. n.º 1.023.053/RS, Rel. Min. Maria Isabel Galotti, DJ de 16/12/2011) (grifos nossos) De forma semelhante, prospectou-se no Tribunal de Justiça do Estado da Bahia – TJBA – o acórdão nº 0063442-73.2010.8.05.0001, em sede de apelação, de 29.10.2012, no qual é afastada a incidência do Código de Defesa do Consumidor na relação envolvendo participantes 41 de planos de Benefícios e a PETROS – Fundação Petrobrás de Seguridade Social, conforme se verifica na ementa a seguir: EMENTA – 1. PROCESSO CIVIL. CONSUMIDOR. 2. PREVIDÊNCIA PRIVADA 3. MAJORAÇÃO NO PERCENTUAL DE ARRECADAÇÃO MENSAL SOBRE SALÁRIO- DE - PARTICIPAÇÃO. 4. NECESSIDADE DE PROMOÇÃO DO EQUILÍBRIO FINANCEIRO E ATUARIAL DO PLANO DE PREVIDÊNCIA. 5. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. 6. RECURSO IMPROVIDO. (TJBA, Apelação Cível nº 0063442-73.2010.8.05.0001, 1ª. Câmara Cível, Rel. Desa. Carmem Lucia Santos Pinheiro, julgado em 29.10.2012) Assim, na fundamentação, muito embora o TJBA admita a vigência da Súmula 321 editada pelo STJ para as relações jurídicas entre participantes e fundos de pensão, o TJBA também entende pela necessidade de se manter o equilíbrio econômico e financeiro da EFPC, conforme se depreende abaixo: Em que pese o exposto, em se tratando de Previdência Privada, deve-se observar a relação entre o custeio e o respectivo benefício, não devendo se cogitar no recebimento de uma vantagem sem a correspondente contraprestação, sob pena de comprometer o equilíbrio econômico e financeiro do plano de previdência. É que os planos de previdência privada somente poderão instituir benefícios desde que exista a respectiva fonte de custeio, no intuito de manter o equilíbrio atuarial de todo o sistema. Assim, verificando-se um desequilíbrio financeiro nas contas do plano, estas deverão ser sanadas pelos patrocinadores, participantes e assistidos. (TJBA, Apelação Cível nº 0063442-73.2010.8.05.0001, 1ª. Câmara Cível, Rel. Desa. Carmem Lucia Santos Pinheiro, julgado em 29.10.2012) É importante consignar que o acórdão do TJBA evoca outro julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte – TJRN – que também defende a necessidade de equilíbrio financeiro e atuarial de previdência privada, in verbis: "EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. ACORDO COLETIVO DE TRABALHO. NATUREZA JURÍDICA DO AUXÍLIO CESTAALIMENTAÇÃO. PRELIMINARES. INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA RATIONE MATERIAE DA JUSTIÇA ESTADUAL. CONTRATO ASSOCIATIVO FIRMADO ENTRE AS PARTES. NATUREZA CIVIL. ASPECTOS LABORAIS ENVOLVIDOS TÃO-SOMENTE DE FORMA INDIRETA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM. ILEGITIMIDADE PASSIVA. CAIXA DE PREVIDÊNCIA RESPONSÁVEL PELA COMPLEMENTAÇÃO DA APOSENTADORIA DOS AUTORES. ILEGITIMIDADE AFASTADA. PREJUDICIAL DE MÉRITO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 291 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. MÉRITO. CARÁTER INDENIZATÓRIO DA VERBA PLEITEADA. NÃO EXTENSÃO AOS APOSENTADOS. SÚMULA 680 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA ISONOMIA ENTRE ATIVOS E INATIVOS. REGIME DE PREVIDÊNCIA 42 PRIVADA. NECESSIDADE DE CRITÉRIOS QUE PRESERVEM O EQUILIBRIO FINANCEIRO E ATUARIAL. PRECEDENTES DESTA CORTE . PROVIMENTO DO APELO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL. INVERSÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA." (TJRN, Apelação Cível nº , 3ª Câmara Cível, Rel. Juiz Cícero de Macêdo Filho (convocado), DJe 11/06/2010). Após análise deste acórdão do TJBA, observou-se que a fundamentação jurídica firmouse essencialmente no equilíbrio financeiro e atuarial da Entidade Fechada de Previdência Complementar, a fim de afastar a aplicação de Código de Defesa do Consumidor. Em nenhum momento se utilizou das características específicas dos fundos de pensão (sem fins lucrativos, não atua no mercado, as prestações retornam para os beneficiários etc.) para acolher a pretensão da PETROS. Consigne-se que são recentes os quatro julgados que utilizaram como fundamentação o equilíbrio financeiro e atuarial dos fundos de pensão, aí considerando os acórdãos do STJ (de 16.12.2011) e do TJRN (de 11.06.2010), referenciados pelo TJGO (de 03.04.2012) e TJBA (de 29.10.2012) nos seus respectivos acórdãos. Seria de se aprofundar a discussão a respeito de tal entendimento jurisprudencial em problematização mais específica, de modo a não perder de vista a característica de subsistema do CDC, a exemplo do que pondera o acórdão já citado do TJBA: 5. Antes de outras considerações, é interessante salientar que, sem dúvida, as relações contratuais entre beneficiários e entidades de previdência privada estão sob a égide do Código de Defesa do Consumidor, consoante entendimento já sumulado no Superior Tribunal de Justiça: “Súmula 321 STJ - O Código de Defesa do Consumidor é aplicável à relação jurídica entre a entidade de previdência privada e seus participantes”. Deste modo, as cláusulas do contrato envolvendo a entidade de previdência fechada e seus beneficiários devem ser interpretadas de forma mais benéfica ao consumidor, facilitando-se o acesso aos serviços fornecidos pela instituição. (TJBA, Apelação Cível nº 0063442-73.2010.8.05.0001, 1ª. Câmara Cível, Rel. Desa. Carmem Lucia Santos Pinheiro, julgado em 29.10.2012) (grifos nossos) Observe-se que os julgados em análise não são necessariamente contrários à aplicação do CDC nas relações envolvendo participantes de planos de benefícios e EFPC, mas se mostram opositores à incidência deste codex de forma generalizada ou quando empregado de maneira indistinta nos conflitos entre estas partes. 43 Cabe registrar, ainda, da impossibilidade de se inferir se estes posicionamentos são predominantes ou não nestes tribunais – TJGO e TJBA – haja vista que foram pinçados os primeiros acórdãos identificados na seqüência da amostragem realizada. Particularmente, quanto ao aresto do STJ – que trata do “mutualismo inerente ao regime fechado de previdência privada” – referenciado pelo julgado do TJGO, seria de se aprofundar a temática, o mesmo se aplicaria ao acórdão do TJRN evocado pelo julgado do TJBA. 44 5. Argumentos favoráveis à aplicação do CDC nas EFPC Antes de analisar os argumentos que podem servir de fundamento a respeito da incidência do Código de Defesa do Consumidor –CDC – nas relações jurídicas entre participantes e Entidades Fechadas de Previdência Complementar é preciso esclarecer que não se trata aqui de junção de fragmentos de posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais, mas da evidenciação de pontos convergentes na hermenêutica de dispositivos legais relacionados ao tema, provenientes de doutrinadores e julgadores, respectivamente. Nesse sentido, na doutrina verifica-se que Carlos Alberto Bittar, muito embora não indique, especificamente, a entidade fechada de previdência complementar como uma figura enquadrada na condição de fornecedora, o autor acaba por contemplá-la no seu posicionamento contundente a respeito da amplitude da relação jurídica de consumo – que tem o consumidor como destinatário final na condição de adquirente ou utente de produtos/serviços por força do art. 2º e conceitua fornecedor toda pessoa física ou jurídica que os disponibiliza, conforme o art. 3º, ambos os dispositivos do CDC. Assim, é possível entrever na perspectiva de análise da relação de consumo feita por Bittar a inclusão das Entidades Fechadas de Previdência Complementar – EFPC – segundo o qual o CDC define os dois pólos e suas relações de forma clara, in verbis: Na definição das relações abrangidas na conceituação dos atores do cenário econômico visado, o Código assume posições claras e próprias [...] a respeito do alcance das noções fundamentais de ‘relações de consumo’, ‘consumidor’ e ‘fornecedor de bens ou de serviços’ (expressão que congrega o produtor, o industrial, o intermediário, o prestador de serviços e outros agentes [...] que atuam na circulação econômica e jurídica de bens e de serviços). 61 (grifos nossos) Prima facie, a afirmação de Bittar pode induzir o intérprete a englobar todas as relações jurídicas que figurem ‘consumidor’ e ‘fornecedor’ como de cunho consumerista, inclusive as que 61 BITTAR, Carlos Alberto. Direitos do consumidor – Código de Defesa do Consumidor. 6. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 27-28. 45 ocorrem entre participantes e fundos de pensão. Por isso mesmo, emergem questões que exigem maior elucidação para aprofundamento da temática ora posta, tais como, a definição desses atores, do ambiente em que se processa a relação jurídica, a natureza do serviço prestado e o dimensionamento do nível de equilíbrio entre as partes e de suas respectivas condições jurídicas. Mesmo porque Bittar alerta para esses tipos de questões que podem surgir numa análise na concretude do conflito quando afirma: Assinale-se, de início, que as noções em causa, embora na economia encontrem conceituações unívocas, não recebem, no direito, o mesmo tratamento, ou seja, não são consideradas conceitos estáticos, mas sim definidas em razão dos valores e dos objetivos visados em cada ordenamento jurídico, assumindo, pois, maior ou menor extensão, conforme o caso. 62 Muito embora nesta parte do trabalho se busque evidenciar fundamentos jurídicos que possam justificar a aplicação do CDC nas relações entre participantes e fundos de pensão, não se pode olvidar da complexidade do tema e a todo instante indicar limitações teóricas, cuja discussão doutrinária e jurisprudencial é relativamente recente, tendo sido deflagrada com a edição da Súmula 321 do STJ em 2005. Por essa razão, é oportuna a reflexão trazida por Cláudia Lima Marques quando discute o campo de aplicação do CDC, in verbis: Assim, o grande desafio do intérprete e aplicador do CDC, como Código que regula uma relação jurídica entre privados, é saber diferenciar e saber ‘ver’ quem é comerciante, quem é civil, quem é consumidor, quem é fornecedor, quem faz parte da cadeia de produção e de distribuição e quem retira o bem do mercado como destinatário final [...] No caso do CDC é este exercício, de definir quem é o sujeito ou quem são os sujeitos da relação contratual ou extracontratual, que vai definir o campo de aplicação desta lei, isto é, a que relações ela se aplica. (grifos nossos) 63 De toda sorte, Ada Pellegrini Grinover e Antônio Herman de Vasconcellos Benjamin, posicionam-se de modo enfático a respeito da amplitude do termo fornecedor, de forma a considerar contemplados todos os agentes econômicos, quer atuem direta ou indiretamente no mercado de consumo, in verbis: 62 BITTAR, Carlos Alberto. Direitos do consumidor – Código de Defesa do Consumidor. 6. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 28. 63 MARQUES, Cláudia Lima. Campo de aplicação do CDC. In: BENJAMIN, Antônio Herman V. et al Manual de Direito do Consumidor. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 67. 46 Entre suas principais inovações (do CDC) cabe ressaltar as seguintes: formulação de um conceito amplo de fornecedor, incluindo, a um só tempo, todos os agentes econômicos que atuam, direta ou indiretamente, no mercado de consumo, abrangendo inclusive as operações de crédito e securitárias. 64 (grifos nossos) É importante registrar que a noção jurídica de mercado adotada por Grinover e Antônio Herman converge com o conceito preconizado por Newton de Lucca, segundo o qual “Mercado é o conjunto das relações de troca de bens e de prestação de serviços, praticadas pelos diversos agentes econômicos, em determinado tempo e lugar”. 65 Numa análise mais atenta do entendimento de Grinover e Antônio Herman a respeito do conceito jurídico de mercado, constata-se que estes são bastante categóricos e específicos, de modo que adotam uma visão aberta e dinâmica do ambiente econômico onde ocorrem as relações uma parte visivelmente vulnerável e outra com grande domínio técnico, informacional, judicial e capital, senão vejamos: Por ter a vulnerabilidade do consumidor diversas causas, não pode o Direito proteger a parte mais fraca da relação de consumo somente em relação a alguma ou mesmo a algumas das facetas do mercado. Não se busca uma tutela manca do consumidor. Almeja-se uma proteção integral, sistemática e dinâmica [...] (grifos nossos) 66 Nessa perspectiva de análise, pode-se considerar como relação jurídica de consumo o que ocorre dentro de um ambiente econômico, sem condicionar o nível de vinculação do fornecedor a um mercado amplo ou o tipo de serviço que presta, ainda que seja sem finalidade lucrativa ou até mesmo “gratuita”, haja vista que, de alguma maneira, sua atuação acaba por atingir pessoas que consomem produtos ou serviços. Não poderia ser diferente a situação das Entidades Fechadas de Previdência Complementar, mesmo ponderando que tem uma abrangência específica de público-alvo, de certos segmentos e que não é acessível a todos em geral. Entende64 GRINOVER, Ada Pellegrini; BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcelos. Introdução. In: GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de defesa do consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011, V. I, p. 8. 65 LUCCA, Newton de. Direito do consumidor. Teoria geral da relação de consumo. São Paulo: Quartier Latin, 2003, p. 163. 66 GRINOVER, Ada Pellegrini; BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcelos. Introdução. In: GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de defesa do consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011, V. I, p. 4. 47 se, sob esse enfoque jurídico de conceito de mercado, essa restrição de acesso não teria o condão de afastar tais entidades da condição de fornecedora de serviços, na forma do art. 3º do CDC. Também comunga desse pensamento – quer dizer, do alcance da relação de consumo – e com maior ênfase e especificidade José Geraldo Brito Filomeno, que tem uma hermenêutica ampla do conceito de atividade disposto no § 2º do art. 3º do CDC, deixando claro que no caso específico de previdência privada estaria contemplada tanto a previdência aberta quanto a fechada, de forma a caracterizar uma relação jurídica consumerista, in verbis: Aliás, o Código (CDC) fala expressamente em atividade de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, aqui se incluindo igualmente os planos de previdência privada em geral, além dos seguros propriamente ditos, de saúde, etc. 67 Mais adiante José Geraldo Brito Filomeno reforça que a Súmula 321 do STJ, estando fundamentada nos artigos 2º e 3º do CDC, abrange a atividade securitária como relação de consumo, aí incluídas as relações jurídicas entre participantes e previdência privada, in verbis: Também no que diz respeito à atividade securitária, no caso e mais especificamente da chamada previdência privada, sobreveio a Súmula nº 321 do STJ, do seguinte teor: ‘Súmula nº 321 – O Código de Defesa do Consumidor é aplicável à relação jurídica entre a entidade privada e seus participantes’. Essa súmula trata da incidência dos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor nas relações jurídicas existentes entre as entidades de previdência privada e seus participantes. O embasamento legal da súmula está nos arts. 2º e 3º do CDC. Pelo entendimento uníssono de ambas as turmas que compõem a 2ª. Seção do Superior Tribunal de Justiça, é consumidor a pessoa que adquire prestação de serviço securitário de entidade previdenciária. Constata-se que a fundamentação de José Geraldo Brito Filomeno para defender a incidência do CDC nas relações jurídicas entre participantes e Entidade Fechada de Previdência Complementar encontra-se no conceito amplo que o autor adota para fornecedor. Neste caso, tendo como pano de fundo a hermenêutica que utiliza para o disposto no art. 3º do CDC, Filomeno entende que na figura de fornecedor estão contempladas as pessoas jurídicas 67 FILOMENO, José Geraldo Brito. Comentários às Disposições Gerais. In: GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de defesa do consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011, V. I, p. 54. 48 constituídas em associação mercantil ou civil, de modo que a ausência de lucratividade não teria o condão de afastar a incidência do referido dispositivo, é o que se depreende de sua afirmação abaixo: Nesse sentido, por conseguinte, é que são considerados todos quantos propiciem a oferta de produtos e serviços no mercado de consumo, de maneira a atender às necessidades dos consumidores, sendo despiciendo indagar-se a que título [...] Tem-se, por conseguinte, que fornecedor é qualquer pessoa física, ou seja, qualquer um que, a título singular, mediante desempenho de atividade mercantil ou civil e de forma habitual, ofereça no mercado produtos ou serviços, e a jurídica, da mesma forma, mas em associação mercantil ou civil e de forma habitual. (grifos do Autor) 68 A doutrinadora Cláudia Lima Marques, por sua vez, tende para esse entendimento abrangente de fornecedor e serviço, na medida em que faz hermenêutica contundente do alcance do § 2º do art. 3º do CDC e sem qualquer tipo de condicionante, destacando que por atividade o dispositivo indica uma situação habitual e reiterada para prestação de serviços, cujo fator diferenciador é a remuneração feita pelo consumidor, muito embora a gratuidade per se não afaste a relação consumerista como se afirmou alhures. In verbis: Mesmo o § 2º do art. 3º define serviço como ‘qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, bastando que esta atividade seja habitual e reiterada [...] A expressão no caput do art. 3º, parece indicar a exigência de alguma reiteração ou habitualidade, mas fica clara a intenção do legislador de assegurar a inclusão de um grande número de prestadores de serviços no campo de aplicação do CDC, à dependência única de ser o co-contratante um consumidor. Sendo que, como serviço, o § 2º do art. 3º entende também as atividades de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, ficando excluídas apenas as de caráter trabalhista. 69 Nessa mesma linha de raciocínio, Leonardo Roscoe Bessa afirma categoricamente que a finalidade do fornecedor no mercado de consumo, ainda que sem ambição lucrativa, mas tendo remuneração pelo serviço prestado, acaba por exigir a incidência do CDC. Consigna o autor que a destinação dada à remuneração, se rateada entre os sócios ou não, é sem nenhuma espécie de significância nessa análise da figura de fornecedor, conforme se depreende abaixo: 68 FILOMENO, José Geraldo Brito. Comentários às Disposições Gerais. In: GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de defesa do consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011, V. I, p. 47-48. 69 MARQUES, Cláudia Lima. Campo de aplicação do CDC. In: BENJAMIN, Antônio Herman V. et al Manual de Direito do Consumidor. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 82. 49 Importante destacar que o CDC não exige, para configuração do fornecedor, a atuação no mercado com o objetivo de lucro: basta, quanto a este aspecto, que a atividade seja remunerada. Não importa o destino dessa remuneração, se ela será ou não distribuída entre os sócios da pessoa jurídica. 70 Dentro dessa mesma fundamentação, mais adiante Leonardo Roscoe Bessa reforça a concepção extraída a partir das premissas estruturantes inerentes ao subsistema do CDC, de que a diferenciação entre sociedade, associação e fundação, em torno da lucratividade não é fundamental. Segundo o autor, é relevante identificar se essas pessoas jurídicas, ainda que não visem lucro – no caso da associação e fundação – desempenhem atividade econômica e com remuneração. Em caso de atendimento destas duas últimas condições, há que se falar na incidência e aplicação do CDC, in verbis: A distinção doutrinária que se faz entre associação e sociedade é justamente a finalidade de lucro desta última, vale dizer, a repartição ou distribuição de parte da receita com os sócios. Nas associações, pela própria natureza, não há objetivo de lucro. Todavia, tanto as associações como as fundações, embora não visem ao lucro, podem exercer atividade econômica e remunerada. Se o fazem profissionalmente, são, para fins de aplicação do CDC, consideradas ‘fornecedor’. 71 Para Luís Antônio Rizzato Nunes, não há dúvida de que qualquer categoria de pessoa jurídica deve ser considerada como fornecedora de produtos ou serviços, uma vez que o microssistema do CDC é abrangente nesse sentido, reforça o autor, de modo que não importa se a pessoa jurídica foi constituída com ou sem fins lucrativos, in verbis: Não há exclusão alguma do tipo de pessoa jurídica, já que o CDC é genérico e busca atingir todo e qualquer modelo. São fornecedores as pessoas jurídicas públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, com sede ou não no País, as sociedades anônimas, as por quotas de responsabilidade limitada, as sociedades civis, com ou sem fins lucrativos, as fundações, as sociedades de economia mista, as empresas públicas, as autarquias, os órgãos da Administração direta etc. 72 (grifos nossos) O posicionamento de Rizzato Nunes é contundente quanto a esse aspecto, inclusive o autor destaca que, da mesma forma que o CDC contemplou a possibilidade da pessoa jurídica 70 BESSA, Leonardo Roscoe. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor – análise crítica da relação de consumo. Brasília: Brasília Jurídica, 2007, p. 82. 71 BESSA, Leonardo Roscoe. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor – análise crítica da relação de consumo. Brasília: Brasília Jurídica, 2007, p. 82. 72 NUNES, Luís Antônio Rizzato. Curso de direito do consumidor. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 86. 50 figurar na condição de consumidora de produtos ou serviços, com muito mais razão não deixou espaço para dúvidas sobre a condição de fornecedora, em qualquer espécie de pessoa jurídica, conforme se verifica abaixo: [...] Aqui, no caput do art. 3º, como a lei trata de adjetivar a pessoa jurídica como ‘pública ou privada, nacional ou estrangeira’, poder-se-ia indagar se no art. 2º não se estaria falando menos ou até o contrário, ou, em outros termos: se no caput do art. 3º a norma não estaria, de alguma maneira, cuidando apenas daquelas pessoas jurídicas indicadas. Na realidade, a resposta é bastante simples. Tanto no caso do conceito de consumidor quanto no de fornecedor, a referência é a ‘toda pessoa jurídica’, independentemente de sua condição ou personalidade jurídica. Isto é, toda e qualquer pessoa jurídica. O legislador poderia muito bem ter escrito no caput do art. 3º apenas a expressão ‘pessoa jurídica’ que o resultado teria sido o mesmo. Não resta dúvida de que toda pessoa jurídica pode ser consumidora e, evidentemente, por maior força de razão, é fornecedora. Ao que parece, o legislador, um tanto quanto inseguro, tratou a pessoa jurídica como consumidora sem se importar muito com o resultado de sua determinação, e quis garantir-se de que, no caso do fornecedor, nenhuma pessoa jurídica escapasse de se enquadrar na hipótese legal. (grifos nossos) 73 Ainda segundo o pensamento de Leonardo Roscoe Bessa, a discussão da relação de consumo, muitas vezes, foge ao tripé básico de fornecedor, consumidor e produto/serviço, concentrando-se na atividade remunerada no contexto mercadológico. Quanto a isso, o doutrinador, firmando-se em Newton de Lucca, entende por mercado “o ambiente e atividade remunerada relativos ao processo profissional de produção e circulação de produtos e de prestação de serviços”. 74 Para afastar qualquer interpretação precipitada quanto ao entendimento de atividade remunerada, na concepção de Bessa, não há que vinculá-la à obtenção de lucros, de modo que, para efeito de relação de consumo, tanto associação quanto fundação podem exercer atividade econômica e remunerada, ocorrendo, portanto, incidência do CDC, conforme se verifica abaixo: Registre-se, desde já, que atividade remunerada não significa necessariamente auferição de lucros. A distinção doutrinária que se faz entre associação e sociedade é justamente a finalidade de lucro desta última, vale dizer, a repartição ou distribuição de parte da receita com os sócios. Nas associações como as fundações, embora não visem ao lucro, 73 RIZZATO, Luís Antônio. Curso de direito do consumidor. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 87-88. BESSA, Leonardo Roscoe. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor – análise crítica da relação de consumo. Brasília: Brasília Jurídica, 2007, p. 52. 74 51 podem exercer atividade econômica e remunerada. Se o fazem profissionalmente, é, para fins de aplicação do CDC, consideradas ‘fornecedor’. 75 Ainda segundo Bessa, nos casos mais complexos para se enquadrar ou não um conflito como relação de consumo, torna-se imprescindível recorrer à Carta Magna e dar um enfoque funcional, a fim de verificar se está presente a vulnerabilidade em todas as suas dimensões (técnica, jurídica, fática, informacional, psíquica). Nesse sentido, afirma o autor: Portanto, para solução dos casos difíceis, os conceitos precisam ser analisados sob perspectiva constitucional e funcional, vale dizer, verificando, em concreto, a presença da vulnerabilidade, sob os seus diversos aspectos (técnica, jurídica, fática, informacional, psíquica). Este critério hermenêutico deve ser utilizado para todas as definições de consumidor constantes na lei (art. 2º, 17 e 29) e, de modo mais genérico, para exame do âmbito de incidência do CDC. 76 É oportuna a recomendação do recurso hermenêutico indicado acima por Bessa, para efeito de enquadramento ou não das EFPC nas relações de consumo, haja vista a complexidade dos casos concretos aduzidos na justiça, e.g., quando o embate envolver o equilíbrio financeiro e atuarial dos fundos de pensão, conforme se discutiu alhures, cujo aprofundamento não será possível nesta monografia. De toda sorte, já antecipando a discussão do capítulo seguinte, entende-se que, diante da força dos argumentos até aqui discorridos, é inarredável a aplicação do CDC na relação jurídica entre participantes e as Entidades Fechadas de Previdência Complementar. Em relação à jurisprudência, verifica-se que o Superior Tribunal de Justiça – STJ – tem entendimento abrangente a respeito de consumidor e fornecedor na relação jurídica que contemple Entidades Abertas e Fechadas de Previdência Complementar, conforme se depreende da sua Súmula 321 que dispõe: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável à relação jurídica entre a entidade de previdência privada e seus participantes”. Tal posicionamento parece 75 BESSA, Leonardo Roscoe. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor – análise crítica da relação de consumo. Brasília: Brasília Jurídica, 2007, p. 52. 76 BESSA, Leonardo Roscoe. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor – análise crítica da relação de consumo. Brasília: Brasília Jurídica, 2007, p. 53. 52 já pacificado naquela Egrégia Corte. A edição da aludida súmula se firmou nos arts. 2º e 3º do CDC, tendo os seguintes fundamentos jurídicos: a) a previdência privada tem funções de natureza securitária; b) o participante do plano de previdência configura-se como consumidor, pois demanda prestação de serviço para si; c) as entidades de previdência privada se enquadram na condição de fornecedor de serviços. 77 Dos cinco recursos especiais – REsp – que embasaram a edição da Súmula 321, três deles tinham como parte Entidades Fechadas de Previdência Complementar ou fundos de pensão: VALIA (REsp 306.155), CENTRUS (REsp 600.744) e SISTEL (REsp 567.938), cabendo realizar na seqüência comentários, ainda que breves, a respeito dos fundamentos jurídicos mais significativos destes acórdãos. De fato, o REsp 600.744 (julgado em 06.05.2004) e 567.938 (julgado em 17.06.2004), citam os fundamentos jurídicos contidos no REsp, não trazendo nada novo para efeito do tema abordado nesta pesquisa, razão pela qual são foram analisados. Nesse sentido, no REsp 306.155, julgado em 19.11.2001, interposto pela Fundação Vale do Rio Doce de Seguridade Social – VALIA –– o STJ reconheceu a relação jurídica de consumo, na forma disposta no art. 2º, art. 3º, caput e § 2º do Código de Defesa do Consumidor, conforme ementa abaixo: Civil e Processo Civil. Recurso Especial. Embargos de declaração protelatórios. Previdência privada. Aplicação do código de defesa do consumidor. Ofensa ao ato jurídico perfeito. Matéria infraconstitucional. Reexame fático-probatório. Interpretação de cláusulas contratuais. Prequestionamento. Fundamento inatacado do acórdão recorrido. [] Aplicam-se os princípios e regras do Código de Defesa do Consumidor à relação jurídica existente entre a entidade de previdência privada e seus participantes [...] É inadmissível o Recurso Especial em que o recorrente deixa de atacar um dos fundamentos mantenedores do acórdão recorrido (Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial n º 306.155, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19.11.2011). O fundamento jurídico do acórdão acima se prende à identificação inequívoca da figura do consumidor, o qual desembolsa contribuições em favor da entidade a fim de que esta assuma 77 AVENA, Lygia. Distinção da relação previdenciária das EFPC com seus participantes da relação de consumo do Código de Defesa do Consumidor. In: GOES, Wagner de. Gestão de fundos de pensão – aspectos jurídicos. São Paulo: ABRAPP, 2006, p. 70 e 71. 53 riscos sociais e previdenciários, ou seja, preste serviço ou ofereça benefícios ao consumidor. Observe-se que no entendimento do aresto o papel da previdência privada nesse tipo de relação está contido no enunciado “...natureza securitária...”, insculpido no art. 3º, § 2º do Código de Defesa do Consumidor. Cabe aqui transcrever trecho do julgado: A participação no plano oferecido pela previdência privada ocorre com a celebração do contrato previdenciário. Através deste negócio jurídico o participante transfere à entidade certos riscos sociais ou previdenciários, mediante o pagamento de contribuições, a fim de que, ocorrendo determinada situação prevista contratualmente, obtenha da entidade benefícios pecuniários ou prestação de serviços. A obrigação da entidade previdenciária, portanto, é atividade de natureza securitária. (Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial n º 306.155, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19.11.2011). (grifos nossos) No referido acórdão é rechaçada a tese de que o fato da entidade se constituir como associação poderia afastar, per se, eventual relação de consumo, aí poderia inferir “fundação ou sociedade civil”, nos termos do art. 31, § 1º da Lei Complementar 109/2001 78. No raciocínio da decisão, depende do tipo de associação, das finalidades e do modelo de relação entre os associados, sendo excluídos da relação consumerista, segundo o aresto, os casos em que houver “gestão da coisa comum, em que todos os associados decidem os atos que serão praticados, e cujas contribuições são por eles estipuladas, a exemplo dos condomínios e associações desportivas”. Ao concluir a argumentação sobre o tema em conflito no referido Recurso Especial, o posicionamento do aresto é categórico em reconhecer o enquadramento da figura de fornecedor para Fundação Vale do Rio Doce de Seguridade Social – VALIA – na medida em que entende configurada a prestação de serviço previdenciário – que é atividade securitária nos termos do CDC – mediante cobrança de mensalidade ou contribuição. Observe-se que a conclusão tem caráter generalizando, porquanto engloba Entidades Abertas e Fechadas de Previdência Complementar, in verbis: 78 Lei 109/2001. Art. 31, § 1º: As entidades fechadas organizar-se-ão sob a forma de fundação ou sociedade civil, sem fins lucrativos. 54 É fornecedor de serviços aquele que os presta no mercado de consumo. Em relação à associações, estão excluídas desta categoria aquelas que servem, exclusivamente, à gestão da coisa comum, em que todos os associados decidem os atos que serão praticados, e cujas contribuições são por eles mesmo estipuladas, a exemplo dos condomínios e associações desportivas não são fornecedores, pois não se destinam à prestação de serviços em mercado de consumo. Contudo, se o ente é formado com o objetivo de fornecer determinado serviço, mediante cobrança de mensalidade ou contribuição e não exclusivamente para gerir os recursos comuns, caracteriza-se como fornecedor. É o caso das entidades fechadas de previdência privada. Essa entidade (fechada, quando a participação no plano é limitada a uma categoria de pessoas, ou aberta, quando acessível a qualquer interessado) presta o serviço mencionado no art. 3º, § 2º, do CDC, pois objetiva, como anteriormente exposto, a realização de atividade securitária. Dessa forma, o vínculo jurídico entre o participante e a entidade de previdência privada é relação de consumo, aplicando-se, assim, os princípios e regras do Código de Defesa do Consumidor. (Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial n º 306.155, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19.11.2011). (grifos nossos) Com base no REsp 306.155, ou seja, Súmula 321 do STJ, a atividade da previdência privada, seja ela aberta ou fechada, reveste-se de natureza securitária, conforme disposto no § 2º, do art. 3º, do Código de Defesa do Consumidor. Considerando que tais entidades são fornecedoras de serviços previdenciários, mediante recebimento de mensalidades ou contribuições, por força do art. 2º e art. 3º, caput, ambos do CDC, o contexto de atuação é o mercado de consumo, quer seja na modalidade restrita (das entidades fechadas) ou de acesso amplo (entidades abertas). Da mesma forma, a figura do consumidor fica patente, na medida em que demanda para si serviço previdenciário, estando na condição de destinatário final, razão pela qual é a parte vulnerável da relação jurídica, tanto sob a dimensão econômica, técnica, jurídica ou informacional. Assim, conforme REsp 306.166, que foi o principal julgado a subsidiar a edição da Súmula 321 do STJ – pelo menos no que tange às entidades fechadas de previdência complementar e sob o prisma da temática ora enfocada – não foi considerado determinante a natureza jurídica da previdência privada, se com fins lucrativos ou não, assim como se de acesso limitado ou amplo ao mercado de consumo, para efeito de enquadramento no CDC. Da mesma 55 forma, não foi ponderada a especificidade das leis que regem tais entidades e os conflitos em relação ao CDC, a fim de afastar a incidência deste último código. Em relação às decisões mais recentes do Superior Tribunal de Justiça, conforme já registrado no capítulo da metodologia de pesquisa jurisprudencial, dos 22 (vinte e dois) acórdãos do STJ posteriores à edição da Súmula 321 e que são favoráveis à incidência do Código de Defesa do Consumidor, em 20 (vinte) tratam de conflitos envolvendo participantes de planos de benefícios e Entidades Fechadas de Previdência Complementar (fundos de pensão). Assim, o posicionamento do STJ já se encontra há algum tempo pacificado e sedimentado quanto ao enquadramento de tais entidades na relação jurídica de consumo. Não obstante esse entendimento sedimentado e pacífico do STJ a respeito da incidência do CDC nas relações jurídicas entre entidades fechadas de previdência complementar e participantes de planos de benefícios, efetuou-se análise por amostragem dos acórdãos que são favoráveis à aplicação do CDC em tais relações, tem sido constatado que a fundamentação, via de regra, remete à Súmula 321 daquela Corte e, quando muito, são transcritas as decisões anteriores. Não foram identificados argumentos novos para enquadrar a previdência privada fechada no CDC. De todo modo, ainda que correndo o risco de ser redundante na evidenciação do posicionamento do STJ, entende-se oportuno transcrever fundamentação jurídica utilizada no AgRg no AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 915.506, interposto pela Fundação dos Economiários Federais – FUNCEF, julgado em 09.08.2007, que reflete bem o teor das decisões com tal natureza de demanda, in verbis: O recurso especial teve o seu provimento negado por aplicação de entendimento pacífico desta Corte. Como expus na decisão agravada, a incidência do CDC independe da forma de constituição da entidade de previdência complementar, se aberta ou fechada. Está configurada a relação de consumo a partir do momento em que a agravante recebe os depósitos e deve posteriormente fornecer a contrapartida, porque seus associados estão na posição de consumidores dos serviços prestados e hipossuficientes na relação. Nesse 56 sentido: REsp 600.744/CASTRO FILHO, REsp 261.793/DIREITO e REsp 567.938/CASTRO FILHO. 306.155/NANCY, REsp Assim, é perfeitamente cabível a aplicação da Súmula 321 ao caso concreto. (Superior Tribunal de Justiça, AgRg no AgRg no REsp n º 2425-6, Terceira Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, julgado em 09.08.2007). (grifos nossos) A partir da amostragem realizada nos demais tribunais – TJRS, TJSP e TJDFT – suspeitase prevalência de posicionamento favorável à aplicação do CDC nas relações jurídicas entre participantes de planos de benefícios e Entidades Fechadas de Previdência Complementar, em consonância à Súmula 321 do Superior Tribunal de Justiça. Mesmo porque os julgados nesta linha de raciocínio se apresentaram com mais abundância na consulta realizada por amostragem. Dessa forma, no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul – TJRS – o aresto nº 70041155995 julgou desfavoravelmente à FUNCEF –fundo de pensão, apelante no caso – no ponto relacionado à complementação de aposentadoria (reajuste de benefícios e migração de planos), cuja fundamentação jurídica consistiu no reconhecimento da configuração de prestação de serviços pela entidade, na forma disposta no art. 3º, caput, e § 2º, do Código de Defesa do Consumidor. Depreende-se no acórdão que foi dado sentido amplo ao conceito do termo “serviço” e da expressão “mercado de consumo” contido no referido codex. O julgador recorreu à Súmula 321 e à jurisprudência do STJ, in verbis: APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. AÇÃO DE REVISÃO DE BENEFÍCIO. FUNCEF. REDUÇÃO DO BENEFÍCIO. ILEGALIDADE. APLICAÇÃO DO CDC. [...] 4. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA - É aplicável o Código de Defesa do Consumidor, na medida em que se trata de relação de consumo, consoante traduz o art. 3º, §2º do CDC. Inteligência da Súmula 321 do STJ. [...] APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. [...] Inicialmente, sinalo que o caso em testilha deve ser apreciado à luz do Código de Defesa do Consumidor, por tratar-se de prestação de serviços previdenciários, consoante traduz o artigo 3º, §2º do CDC, ipsis litteris: Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. § 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial. § 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. (TJRS, Apelação Cível nº 57 70041155995, 6ª. Câmara Cível, Rel. Des. Niwton Carpes da Silva, julgado em 04.04.2013). (grifos do julgador) Em outro julgado do TJRS, apelação cível nº 70037437084, há um profícuo debate jurídico a respeito de possíveis reflexos do fator previdenciário introduzido pelo INSS nas entidades fechadas de previdência complementar, conforme tentou defender a Fundação Banrisul – apelado – firmando-se no seu regulamento para reduzir complementação de aposentadoria, mas que o tribunal concluiu por inaplicável no caso de participantes inscritos em planos de benefícios antes da mudança operada pela Previdência Oficial. Mais uma vez o TJRS esclareceu tratar-se de relação consumerista, dados os serviços previdenciários de natureza privada, de acordo com art. 3º, caput, e § 2º, do Código de Defesa do Consumidor e Súmula 321 do STJ. Na apelação cível nº 70037437084, do TJRS, entre as fundamentações jurídicas utilizadas para afastar a tese da Fundação Banrisul – apelado – fica inequívoco o reconhecimento pelo tribunal de relação de consumo configurado entre as partes, de modo a exigir a aplicação do CDC, conforme se depreende abaixo: APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. AÇÃO ORDINÁRIA DE COBRANÇA. FUNDAÇÃO BANRISUL DE SEGURIDADE SOCIAL. FATOR PREVIDENCIÁRIO. INOPERÂNCIA. ALTERAÇÃO DO CÁLCULO DO BENEFÍCIO. COMPLEMENTAÇÃO DEVIDA. RESPEITO AO CONTRATADO. [...] 3. É aplicável o Código de Defesa do Consumidor às relações previdenciárias, na medida em que se trata de relação de consumo, consoante traduz o art. 3º, §2º do CDC. Inteligência da Súmula 321 do STJ. Com efeito, aplica-se ao participante o regulamento que estava em vigor à época da sua adesão, à luz da Súmula nº 288 do TST. [...] APELAÇÃO PROVIDA [...] Equivocada a orientação do egrégio STJ, concessa venia, além de manifestamente injusta e injurídica, muito conveniente às empresas de previdência privada, defender a idéia de que o direito adquirido somente se aperfeiçoa no momento em que o participante preencher os requisitos para a percepção do benefício previdenciário complementar (AgRg no Resp nº 331299/SP, Rel.Min. Hélio Barbosa), cobrindo com véu espesso as modificações conveniente e oportunistas dos regulamentos ao longo das contratações, em total desprezo e lesão ao direito dos consumidores e aos aderentes desse negócio jurídico privado de trato sucessivo, de longa duração, bilateral e sinalagmático. É a pregação da inversão exegética do art.6º, inc.VIII do CDC, em manifesto prejuízo ao consumidor, tolerando a modificação do regulamento ou do contrato em verdadeira reformatio in pejus. Ao invés de proteger o consumidor, essa orientação jurisprudencial, condenável por suposto, o prejudica implacavelmente, com cujo raciocínio não posso compactuar, data vênia. (TJRS, Apelação Cível nº 70037437084, 6ª. Câmara Cível, Rel. Des. Niwton Carpes da Silva, julgado em 04.04.2013). (grifos do julgador) 58 Mais adiante, o julgador pugna pela aplicação do CDC nessa espécie de conflito envolvendo fundos de pensão – Fundação Banrisul – e participantes de planos de benefícios, senão corre-se o risco estimular desequilíbrio contratual, em confronto aos princípios insculpidos naquele codex, in verbis: [...] Ora, parte do STJ diz que o direito adquirido ocorrerá só com a aposentadoria, com já visto (v.AgRg no REsp nº 331299; Ag em REsp nº 3.169/DF), antes disso não, pois se trataria de “direito em formação”. Então, para essa corrente de entendimento, tal modificação é natural e válida, plenamente eficaz, posto que a modificação do regulamento se deu antes da aposentadoria do aderente. Data venia, mas a defesa dessa tese é absurda e embala injustiças gritantes e também absurdas, sem falar na injuridicidade da tese, que promove e estimula o descumprimento e o desequilíbrio contratual, em violação frontal ao CDC – Código de Defesa ao Consumidor que prega e promove justamente o contrário, a proteção do hipossuficiente, no caso a parte autora. (TJRS, Apelação Cível nº 70037437084, 6ª. Câmara Cível, Rel. Des. Niwton Carpes da Silva, julgado em 04.04.2013). (grifos do julgador) Também se identificou no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios – TJDFT – o acórdão nº 650.279, em sede de apelação cível, que no mérito não proveu a pretensão de participantes de planos de benefícios em face da Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil – PREVI – mas deixou inequívoco o enquadramento das Entidades Fechadas de Previdência Complementar na relação de consumo, conforme se verifica na ementa abaixo: PREVIDÊNCIA PRIVADA. APOSENTADORIA. REVISÃO DE BENEFÍCIO. AUXÍLIO CESTA-ALIMENTAÇÃO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. [...] 2. A inversão do ônus da prova, medida excepcional, prevista no art. 6º, VIII, do CDC, é cabível nas relações de consumo, quando há verossimilhança nas alegações do consumidor. E não se relaciona à situação econômica do consumidor, mas ao nível de dificuldades dele em ter acesso às informações técnicas pertinentes à relação de consumo. 3 - Apelação não provida. (TJDFT, acórdão nº 650.279, Apelação Cível nº 20090110701889, 6ª. Turma Cível, Rel. Des. Jair Soares, julgado em 30.01.2013). (grifos nossos) No meio do julgado, ainda que em tom moderado, defende-se claramente a incidência do CDC nas relações entre participantes e EFPC, pontuando que a inscrição em planos de benefícios ocorre de forma facultativa e por espontânea adesão. Neste caso, prossegue o acórdão, o estatuto deve nortear a relação jurídica naquilo que não afrontar as regras de proteção do consumidor, in verbis: 59 Por tratar-se de faculdade e não de obrigação, é livre a adesão do interessado ao regime de previdência privada que, embora submetido à fiscalização do Estado e às normas do CDC (súm. 321 do STJ), insere-se no campo das relações privadas, norteadas pela autonomia da vontade. Isto quer dizer que prepondera o previsto no estatuto como expressão da vontade daqueles que compõem a entidade de previdência privada, desde que não contrarie o regramento legal imposto pelo Estado e as normas de proteção ao consumidor. (TJDFT, acórdão nº 650.279, Apelação Cível nº 20090110701889, 6ª. Turma Cível, Rel. Des. Jair Soares, julgado em 30.01.2013). (grifos nossos) De forma semelhante, no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – TJSP – na apelação cível nº 0142391-86.2011.8.26.0100, tendo como apelante Fundação Sistel de Seguridade Social (fundo de pensão) há posicionamento favorável à aplicação do CDC na demanda apreciada, em que pese a fundamentação jurídica ter sido feita de forma concisa, firmando-se na Súmula 321 do STJ, in verbis: Apelação ação de cobrança - previdência privada pretensão à correção monetária relativa aos expurgos inflacionários possibilidade - devida correção dos valores pela CORREÇÃO PLENA inteligência das Súmulas 289 e 321 do STJ - ação julgada procedente em primeira instância competência da Justiça Comum determinada pelo STF - sentença mantida. Recurso improvido. (TJSP, Apelação Cível nº 014239186.2011.8.26.0100, 12ª. Câmara de Direito Público, Rel. Des. Venicio Salles, julgado em 03.04.2013) Com base na análise da jurisprudência favorável à aplicação do CDC nas relações jurídicas entre participantes de planos de benefícios e entidades fechadas de previdência complementar, pode-se afirmar que o posicionamento do STJ ainda não apresenta indicativos de mudança de seu posicionamento. Por outro lado, quanto ao TJDFT, TJSP, TJRS caberia estudo aprofundado para verificar o entendimento majoritário, em função da limitação da amplitude de análise efetuada nesta pesquisa, ainda mais diante da enorme quantidade de julgados identificados nestes tribunais, particularmente, no TJSP. 60 6. Reflexões sobre os argumentos contrários e favoráveis à aplicação do CDC nas relações jurídicas envolvendo as EFPC Feito isso, após a análise realizada dos argumentos contrários e favoráveis à aplicação do CDC nas relações jurídicas entre fundos de pensão e participantes, verifica-se que o posicionamento contrário não se mostra sustentável juridicamente. Nesse sentido, as características de tais entidades – regramento por lei específica, acesso restrito, sem fins lucrativos e enquadramento na Ordem Social da Constituição Federal – conforme em seguida abordará, não são condições suficientes para afastar a incidência do CDC, além do mais este codex tem caráter principiológico e funciona como um subsistema. O Código de Defesa do Consumidor apresenta um caráter diferenciado comparativamente às demais leis infraconstitucionais, uma vez que traz em si regras e dispositivos principiológicos com amplitude que transcende este próprio Codex, na medida em que ocorra eventual conflito com outra norma no contexto de consumo. Assim, em que pese a especificidade da norma que trata da previdência privada, qual seja a Lei Complementar 109/2001, há de se considerar o caráter abrangente do próprio CDC, o qual se estrutura com base nos princípios da vulnerabilidade (técnica, jurídica e econômica) do consumidor e na sua hipossuficiência diante do fornecedor, a fim de assegurar um mínimo de equilíbrio nesse tipo de relação. Nesse sentido, o CDC é considerado por Luiz Antônio Rizzato Nunes um subsistema dentro do ordenamento jurídico, podendo, muitas vezes, sobrepor-se a outra norma: Não será possível interpretar adequadamente a legislação consumerista se não se tiver em mente esse fato de que ela compõe um subsistema no ordenamento jurídico, que prevalece sobre os demais – exceto, claro, o próprio sistema da Constituição, como de resto qualquer norma jurídica de hierarquia inferior – sendo aplicável às outras normas apenas de forma supletiva e complementar. [...] O importante mesmo aqui é destacar que o CDC, como lei ordinária, funciona como um subsistema próprio, dentro do modelo jurídico constitucional existente, e que ele não está submetido a nenhum comando hierárquico superior, com exceção, claro, do 61 próprio texto constitucional, que lhe é superior, como está também acima de toda e qualquer outra norma jurídica não-constitucional. 79 Mais adiante Rizzato enfatiza ainda mais o revestimento principiológico do CDC, ao ponto deste Codex impedir que outra norma infraconstitucional contrária às suas disposições e regras gere eficácia jurídica. Segundo o autor, estando configurada uma relação jurídica de consumo o CDC se impõe mesmo em que pese a especificidade de outra lei, claro estando conflitantes sobre a mesma matéria de relação consumerista, in verbis: Ademais, o CDC é uma lei pricipiológica, modelo até então inexistente no Sistema Jurídico Nacional. Como lei principiológica entende-se aquela que ingressa no sistema jurídico, fazendo, digamos assim, um corte horizontal, indo, no caso do CDC, atingir toda e qualquer relação jurídica que possa ser caracterizada como de consumo e que esteja também regrada por outra norma jurídica infraconstitucional. Assim, por exemplo, um contrato de seguro de automóveis continua regulado pelo Código Civil e pelas demais normas editadas pelos órgãos governamentais que regulamentem o setor (Susep, Instituto de Resseguros etc.), porém estão tangenciados por todos os princípios e regras da lei n. 8.078/90, de tal modo que, naquilo que com eles colidirem, perdem eficácia por tornarem-se nulos de pleno direito. 80 Também Nelson Nery Júnior tem o entendimento de que o CDC se reveste de caráter principiológico, de tal maneira que a aplicação, e.g., de leis civis e comerciais às relações de consumo só deve ser feita se não afrontar o subsistema de proteção de consumidor, na forma emanada daquele codex, in verbis: Evidentemente, as leis civis e comerciais são aplicáveis às relações jurídicas de consumo, para integração de lacuna por situação não prevista pelo Código, naquilo que não contrariar o sistema de defesa do consumidor regulado pelo CDC. [...] Pensar-se o contrário é desconhecer o que significa o microssistema do Código de Defesa do Consumidor, como lei especial sobre relações de consumo e lei geral, principiológica, à qual todas as demais leis especiais setorizadas das relações de consumo, presentes e futuras, estão subordinadas. 81 79 NUNES, Luís Antônio Rizzato. Curso de direito do consumidor. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 65 e 98. NUNES, Luís Antônio Rizzato. Curso de direito do consumidor. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 65-66. 81 NERY JÚNIOR, Nelson. Da proteção contratual. In: GRINOVER, Ada Pellegrini. et al Código brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011, V. I, p. 513 e 516. 80 62 Mais adiante Nelson Nery Júnior mostra-se ainda mais categórico a respeito da natureza principiológica do CDC, que é, por essa razão, de abordagem sintética. Nesse sentido, reforça o autor a necessidade das demais normas se submeterem às regras genéricas do CDC, conforme se depreende abaixo: O Código de Defesa do Consumidor, por outro lado, é lei principiológica. Não é analítica, mas sintética. Nem seria de boa técnica legislativa aprovar-se lei de relações de consumo que regulamentasse cada divisão do setor produtivo (automóveis, cosméticos, eletroeletrônicos, vestuário etc.). Optou-se por aprovar lei que contivesse preceitos gerais, que fixasse os princípios fundamentais das relações de consumo. É isso que significa ser uma lei principiológica. Todas as demais leis que se destinarem, de forma específica, a regular determinado setor das relações de consumo deverão submeter-se aos preceitos gerais da lei principiológica, que é o Código de Defesa do Consumidor. 82 De forma semelhante, Cláudia Lima Marques ao tratar dos conflitos entre leis, que é o caso em análise, qual seja Lei Complementar 109/01 e a Lei 8.078/90 – CDC – pondera que os critérios de temporalidade e especialidade não são suficientes para equacionar tais confrontos, cabendo recorrer ao critério de hierarquia, em que se impõe como parâmetro a Constituição Federal. Nesse sentido, é oportuno transcrever comentários feitos por Norberto Bobbio, citado pela autora: [...] o aplicador da lei deve priorizar o critério hierárquico, que é o mais forte e mais importante em relação ao critério cronológico ou ao critério da especialização [...] Certo é que, em caso de conflito entre as soluções propostas pelo critério hierárquico e qualquer dos outros dois, o da anterioridade e o da especialização, prevalece o critério hierárquico, mas também certas relativizações são necessárias. O guia maior é a Constituição e os valores que impõem, como vimos nos capítulos anteriores.83 A própria doutrinadora Lima Marques apresenta ilustrações de conflitos de normas, e.g., leis especiais de planos de saúde, lei sobre incorporação imobiliária, em que há situações envolvendo o consumidor. Nessas hipóteses, caberia interpretação e aplicação sistemática, sob a 82 NERY JÚNIOR, Nelson. Da proteção contratual. In: GRINOVER, Ada Pellegrini. et al Código brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011, V. I, p. 515. 83 MARQUES, Cláudia Lima. Diálogo das fontes. In: BENJAMIN, Antônio Herman V. et al Manual de Direito do Consumidor. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 97. 63 perspectiva de valores e princípios constitucionais, possibilitando complementaridade das normas, o que a autora denomina de diálogo das fontes. In verbis: [...] Neste caso (conflito de leis especiais, e.g., CDC e lei planos de saúde), diante do disposto no § 2º do art. 2º da LICC e a visão de sistema, pressupõe-se que o legislador não esqueceu que a CF/88 mandou proteger os consumidores, a chamar a aplicação sistemática das normas do CDC – logo, há diálogo de coerência e de complementaridade, aplicando-se as duas leis especiais complementarmente e em uma convivência conforme aos valores da CF/88. 84 No julgamento da Adin dos bancos (nº 2.591), conforme Lima Marques, o Ministro Joaquim Barbosa buscou o balanceamento das questões evocadas no caso sub judice com base no “diálogo das fontes”. Nesse sentido, o Ministro defendeu na fundamentação da referida Adin relação de complementaridade entre as normas, estando subjacente nesse tipo de abordagem a preponderância dos valores e princípios constitucionais, conforme se depreende do trecho abaixo, remetido pela autora: A Emenda Constitucional 40, na medida em que conferiu maior vagueza à disciplina constitucional do sistema financeiro (dando nova redação ao art. 192), tornou ainda maior esse campo que a professora Cláudia Lima Marques denominou ‘diálogo das fontes’ – no caso, entre a lei ordinária (que disciplina as relações consumeristas) e as leis complementares (que disciplinam o sistema financeiro nacional). Não há, a priori, por que falar em exclusão formal entre essas espécies normativas, mas, sim, em ‘influências recíprocas’, ‘em aplicação conjunta das duas normas ao mesmo tempo e ao mesmo caso, seja complementarmente, seja subsidiariamente, seja permitindo a opção voluntária das partes sobre a fonte prevalente’. 85 Entende-se que esse tipo de enfoque está intrinsecamente ligado ao movimento chamado pela doutrina de constitucionalização do direito ou neoconstitucionalismo, que consiste na força normativa da Constituição Federal, aí considerando seu papel supremo e aglutinador na interpretação e aplicação das normas infraconstitucionais. É oportuno, então, recorrer às ponderações sobre o tema feitas por Luís Roberto Barroso: Nesse ambiente, a Constituição passa a ser não apenas um sistema em si – com sua ordem, unidade e harmonia – mas também um modo de olhar e interpretar todos os demais ramos do Direito. Este fenômeno, identificado por alguns autores como 84 MARQUES, Cláudia Lima. Diálogo das fontes. In: BENJAMIN, Antônio Herman V. et al Manual de Direito do Consumidor. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 98. 85 MARQUES, Cláudia Lima. Diálogo das fontes. In: BENJAMIN, Antônio Herman V. et al Manual de Direito do Consumidor. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 100. 64 filtragem constitucional, consiste em que toda a ordem jurídica deve ser lida e apreendida sob a lente da Constituição, de modo a realizar os valores nela consagrados [...] Em suma, a Constituição figura hoje no centro do sistema jurídico, de onde irradia sua força normativa, dotada de supremacia formal e material. Funciona, assim, não apenas como parâmetro de validade para a ordem infraconstitucional, mas também como vetor de interpretação de todas as normas do sistema. 86 Dessa forma, aplicando-se hermenêutica sistemática, tendo a Constituição Federal como cânon máximo, e com enfoque principiológico, pode-se adotar, no caso concreto, a prevalência do contido no inciso XXXII do art. 5º da Constituição Federal combinado com o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor, que é um dos princípios direcionadores da relação jurídica de consumo, na forma do inciso I do art. 4º do CDC diante dos serviços prestados por Entidade fechada de previdência complementar. Então, o conflito entre a norma específica que rege o funcionamento dos fundos de pensão, isto é, a Lei Complementar 109/2001 e CDC é só aparente, dado o caráter principiológico deste último e suas raízes assentadas na Constituição Federal. Esta é a perspectiva de abordagem adotada por Leonardo Roscoe Bessa, consoante a sua afirmação abaixo: Portanto, para solução dos casos difíceis, os conceitos precisam ser analisados sob perspectiva constitucional e funcional, vale dizer, verificando, em concreto, a presença da vulnerabilidade, sob os seus diversos aspectos (técnica, jurídica, fática, informacional, psíquica). Este critério hermenêutico deve ser utilizado para todas as definições de consumidor constantes na lei (art. 2º, 17 e 29) e, de modo mais genérico, para exame do âmbito de incidência do CDC. (grifos do autor) 87 Prima facie, o comentário de Bessa indicado acima parece mitigar a incidência do CDC nos contratos envolvendo entidades fechadas de previdência complementar (EFPC), mas conjugando com outras intervenções do autor pontuadas alhures, não deixa dúvidas quanto ao seu posicionamento favorável à aplicação do CDC nessa espécie de relação. O que o doutrinador 86 BARROSO, Luís Barroso. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito (o triunfo tardio do direito constitucional no Brasil). Revista Eletrônica sobre a reforma do estado. Salvador, nº 9, p. 20-21, mar./maio 2007. 87 BESSA, Leonardo Roscoe. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor – análise crítica da relação de consumo. Brasília: Brasília Jurídica, 2007, p. 53. 65 destacou acima foi a importância a ser dada à Constituição e ao reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no caso concreto, a fim de se chegar às soluções de conflitos. De forma semelhante, é preciso rechaçar a tese de que a entidade fechada de previdência complementar atua num ambiente restrito, não acessível a todas as pessoas indistintamente e não visar lucros, como se isso fosse suficiente para excluí-la do mercado. O fato de abranger um segmento específico não implica necessariamente estar fora do mercado. Os fundos de pensão estabelecem uma relação muito clara de “troca mercadológica”, que se processa mediante desembolso de determinado valor pelo consumidor com o propósito de se proteger de riscos existenciais – e.g., acidente, invalidez – ou resguardar sua renda quando encerrar suas atividades laborais, ficando tais contraprestações a cargo das entidades. Consoante mencionado alhures, o conceito de mercado utilizado nesta pesquisa é o propugnado por Newton de Lucca, que remete, essencialmente, à ideia de troca. De forma semelhante, Philip Kotler – numa análise mais abrangente e com enfoque na ciência da Administração, cujo pano de fundo traz ideia de necessidade – define marketing como um sistema de troca, o qual consiste em receber algo dando determinado valor como forma de retribuição, in verbis: Marketing ocorre quando as pessoas decidem satisfazer necessidades e desejos através da troca. A troca é o ato de obter-se um objeto desejado dando alguma coisa em retribuição [...] Como meio de satisfazer necessidades, a troca apresenta muitas vantagens. A pessoa não precisa apropriar-se de objetos alheios ou viver de caridade [...] Pode dedicar-se a fazer o que sabe e trocar isso pelos artigos de que necessita, feitos por outrem. Assim, a troca permite que uma sociedade produza muito mais do que em qualquer outro sistema alternativo. (grifos nossos) 88 Mais adiante, Kotler esclarece que o conceito de troca – marketing – conduz à definição de mercado, que “é o grupo de compradores reais e potenciais de um produto. Esses compradores têm uma necessidade ou desejo específico, que pode ser satisfeito através da troca”. 88 KOTLER, Philip; ARMSTRONG, Gary. Princípios de marketing. 7. ed. Rio de Janeiro: LTC, 1995, p. 6. 66 Segundo o autor, a economia hodierna estriba-se no princípio da divisão de trabalho, de modo que cada indivíduo se especializa em produzir alguma coisa, recebe um pagamento, possibilitando adquirir os bens de que precisa. A idéia de troca perpassa essa cadeia produtiva que dispõe de vários atores, tais como, produtor, trabalhador, intermediário e consumidor, senão vejamos: A economia moderna opera com base no princípio de divisão de trabalho, onde cada pessoa se especializa em produzir alguma coisa, recebe pagamento pela sua produção e com esse dinheiro compra as coisas de que necessita. Portanto, a economia moderna existe em abundância no mercado. Os produtores vão ao mercado de recursos (mercados de matéria-prima, mercados de trabalho, mercados financeiros), compram recursos, transforma-nos em bens e em serviços e vendem-nos aos intermediários, que os vendem aos consumidores. Os consumidores vendem seu trabalho, pelo qual recebem uma renda para pagar pelos bens e serviços que compram [...] 89 Nesse sentido, passa a ficar claro o mercado de consumo em que atua a previdência privada fechada a partir das próprias informações disponibilizadas pela ABRAPP - Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar – Consolidado Estatístico de Dezembro/2012, em que 261 fundos de pensão prestam serviços previdenciários a mais de 6,6 milhões de pessoas, aí computando participantes, dependentes e assistidos, conforme detalhado abaixo 90: Participantes Dependentes Assistidos Total 2.329.741 3.664.294 675.275 6.669.310 No mesmo relatório de Consolidado Estatístico da ABRAPP é evidenciada a evolução de ativos – o ativo representa o disponível + realizável + permanente – dos fundos de pensão, cuja composição conta com contribuições de patrocinadores ou instituidores, bem como com 89 KOTLER, Philip; ARMSTRONG, Gary. Princípios de marketing. 7. ed. Rio de Janeiro: LTC, 1995, p. 7. ABRAPP - Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar – Consolidado Estatístico. Dezembro/2012. Disponível em: < http://www.abrapp.org.br/Documentos%20Pblicos/ConsolidadoEstatistico_12_2012.pdf>. Acesso em 23 Abr 2013, p. 2. 90 67 mensalidades desembolsadas por participantes de planos de benefícios, que são os consumidores de serviços previdenciários, conforme gráfico abaixo 91: 800 Evolução dos Ativos (R$ bilhões) 700 600 668 500 400 300 320 515 457 445 2007 2008 558 597 375 200 100 0 2005 2006 2009 2010 2011 2012 Ainda no relatório de Consolidado Estatístico da ABRAPP são demonstrados os benefícios pagos a participantes e assistidos, traduzindo como serviços previdenciários prestados pelos fundos de pensão – no sentido de atividade econômica – consoante abaixo: Demonstrativo de Benefícios Valor - R$ mil 1 Quant 2 10.165.411 456.467 3.712 Aposentadoria por invalidez 503.763 52.170 1.609 Pensões 1.513.007 140.681 1.792 Tipo Aposentadoria programada (1) (2) Valor médio mensal - R$ Valor acumulado até junho/12 Conforme INMPS/SPC n. 24, de 05.06.08 É interessante registrar que, de acordo com o referido Consolidado Estatístico da ABRAPP, os fundos de pensão têm apresentado, historicamente, superávit das contribuições 91 ABRAPP - Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar – Consolidado Estatístico. Dezembro/2012. Disponível em: < http://www.abrapp.org.br/Documentos%20Pblicos/ConsolidadoEstatistico_12_2012.pdf>. Acesso em 23 Abr 2013, p. 2. 68 administradas, o que não deixa de ser também um indicativo de que as EFPC estão inseridas no mercado, atuando como fornecedoras de serviços previdenciários – atividade econômica –, ainda que seja para um grupo específico, senão vejamos 92: Evolução do Superavit das EFPC - R$ bilhões 74,8 66,1 51,5 48,2 54,1 55,0 47,0 37,0 2007 2008 2009 2010 2011 jun/12 set/12 dez/12 Dessa forma, em troca da prestação de serviços previdenciários, as entidades fechadas de previdência complementar recebem contribuições ou parcelas mensais de acordo com o plano de benefício do participante, configurando um mercado de consumo tanto nos termos do § 2º, do art. 3º, do CDC, quanto sob a perspectiva conceitual da economia e administração, conforme indicado logo acima. Neste caso, não importa que seja sociedade ou fundação sem fins lucrativos, a despeito de regramento específico do § 1º do art. 31, da LC nº 109, de 2001. Assim, é suficiente o desenvolvimento de atividade econômica no mercado de consumo, mediante recebimento de remuneração e sem finalidade lucrativa – o que restou demonstrado – ainda que essa atuação ocorra numa espécie de nicho de mercado ou segmento restrito, cuja acessibilidade seja limitada. Tal raciocínio pode ser depreendido a partir da afirmação categórica de Leonardo Roscoe Bessa quando trata do tema: 92 ABRAPP - Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar – Consolidado Estatístico. Dezembro/2012. Disponível em: < http://www.abrapp.org.br/Documentos%20Pblicos/ConsolidadoEstatistico_12_2012.pdf>. Acesso em 23 Abr 2013, p. 4. 69 Registre-se, desde já, que atividade remunerada não significa necessariamente auferição de lucros. A distinção doutrinária que se faz entre associação e sociedade é justamente a finalidade de lucro desta última, vale dizer, a repartição ou distribuição de parte da receita com os sócios. Nas associações como as fundações, embora não visem ao lucro, podem exercer atividade econômica e remunerada. Se o fazem profissionalmente, é, para fins de aplicação do CDC, consideradas ‘fornecedor’. (grifos nossos) 93 Outro argumento que não se sustenta, mas que é defendido por aqueles que são contrários à aplicação do CDC nas relações jurídicas entre participantes e fundos de pensão, consiste no enquadramento diferenciado na Constituição Federal dispensados aos temas relação de consumo e previdência privada, sendo que este último se encontra inserto na “Ordem Social” (Título VIII, art. 202), enquanto o outro está localizado na parte “Da Ordem Econômica e Financeira” (Título VII, art. 170, inciso V). Este entendimento carece de fundamentação jurídica, porquanto acaba por adotar hermenêutica isolada, cujos temas têm realmente pesos constitucionais distintos, tendo o CDC certa prevalência. Assim, não custa recordar que o tema de direito do consumidor está insculpido nos direitos fundamentais, art. 5º, inciso XXXII, da Constituição Federal, num reconhecimento claro do legislador constituinte a respeito de sua importância. Tanto é assim que o legislador buscou blindar os direitos fundamentais de ingerência ou agressões tanto por parte do Estado quanto por parte de terceiros, conforme afirma Gilmar Ferreira Mendes, in verbis: [...] Já a colocação do catálogo dos direitos fundamentais no início do texto constitucional denota a intenção do constituinte de emprestar-lhes significado especial [...] Analisando as posições jurídicas fundamentais que integram os direitos de defesa, importa consignar que estes não se limitam às liberdades e igualdades (direito geral de liberdade e igualdade, bem como suas concretizações), abrangendo, ainda, as mais diversas posições jurídicas que os direitos fundamentais intentam proteger contra ingerências dos poderes públicos e também contra abusos de entidades particulares, de forma que se cuida de garantir a livre manifestação da personalidade, assegurando uma esfera de autodeterminação do indivíduo. 94 Além disso, a interpretação de dispositivo constitucional per se – típico do solipsismo cartesiano – ou com base na sua localização constitucional pode conduzir a conclusões 93 BESSA, Leonardo Roscoe. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor – análise crítica da relação de consumo. Brasília: Brasília Jurídica, 2007, p. 52. 94 MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de direito constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 681 e 683. 70 reducionistas, precipitadas e distorcidas em relação à concretude, ou seja, ao problema que incitou o diálogo com a norma, cuja relação exige uma espécie de dialética processada entre o concreto e o abstrato e vice-versa. É oportuna a afirmação de Eros Roberto Grau, citado por Gilmar F. Mendes, de que “[...] A norma é produzida, pelo intérprete, não apenas a partir de elementos colhidos no texto normativo (mundo do dever ser), mas também a partir de elementos do caso ao qual ela será aplicada, isto é, a partir de dados da realidade (mundo do ser)”. 95 Assim, no problema em análise, não custa reafirmar que se identifica claramente a figura do participante de plano de benefício (consumidor) que demanda serviço previdenciário a fundos de pensão (fornecedor), a fim de obter aposentadoria ou proteção em situações adversas que possam ocorrem em sua vida (serviços). Tal relação jurídica ocorre de forma autônoma e facultativa em relação à Previdência Oficial, de modo que ambos entabulam contrato típico de relação de consumo, conforme art. 2º e 3º do CDC. Neste caso, é oportuna a firmação de Gilmar F. Mendes “A norma constitucional, assim para que possa atuar na solução de problemas concretos, para que possa ser aplicada, deve ter o seu conteúdo semântico averiguado, em coordenação com o exame das singularidades da situação real que a norma pretende reger[...]”. 96 Por último, verifica-se que a jurisprudência, com base na amostragem, sinaliza como favorável à aplicação do CDC nos conflitos entre participantes e fundos de pensão, mesmo naqueles tribunais em que se identificou julgado com entendimento divergente da orientação da Súmula 321 do STJ. Nestes últimos tribunais, via de regra, há o reconhecimento da incidência daquele codex nessa espécie de lide, fazendo-se ressalva para não aplicá-lo indiscriminadamente em todas as situações, de forma apriorística. Em outros termos, tais tribunais que discrepam do entendimento já pacificado no STJ a respeito da temática tentam minimizar o caráter irradiador e de imposição do CDC – “é um 95 GRAU, Eros Roberto. Apud. MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de direito constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 92. 96 MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de direito constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 93. 71 subsistema que prevalece sobre os demais”, conforme defende Rizzato 97 – criando exceções para aplicação deste codex, e.g., quando o conflito envolve o desequilíbrio da situação financeira e atuarial da entidade fechada de previdência complementar, consoante se teve oportunidade de abordar. Um possível argumento para isso seria que, muito embora as EFPC tenham uma perspectiva privada, facultativa, liberal, a partir do momento em que a pessoa se ingressa no grupo, é fundamental não perder de vista a finalidade do todo, da coletividade, a fim de garantir a saúde financeira do fundo de pensão e, por conseguinte, assegurar os benefícios e coberturas particulares. No entanto, a problemática acima certamente é controvertida e merece pesquisa específica para maior aprofundamento, inclusive para confrontar com princípios como o da vulnerabilidade (técnica, jurídica, econômica, informacional), do equilíbrio contratual e da hipossuficiência, os quais passaram a ser reconhecidos sempre em favor do consumidor aprioristicamente após longo processo de embate jurídico. No caso particular dos fundos de pensão, não custa lembrar que são pessoas jurídicas que, embora constituídas sob a forma de sociedades ou fundações sem fins lucrativos, detém poderio econômico, jurídico, informacional, sistema de governança e estrutura organizacional, os quais colocam o consumidor em situação de desvantagem e de vulnerabilidade na relação contratual. 97 NUNES, Luís Antônio Rizzato. Curso de direito do consumidor. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 65. 72 CONCLUSÃO Na abordagem sobre as entidades fechadas de previdência complementar – EFPC – e sua relação com os participantes, foram analisados argumentos tanto favoráveis quanto contrários à aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Prima facie e à guisa de conclusão, pelo menos para efeito deste trabalho, percebe-se maior plausibilidade e razoabilidade nos posicionamentos favoráveis, haja vista a presença dos três elementos caracterizadores de uma relação consumerista na questão em debate, quais sejam, consumidor, fornecedor e produto/serviço, que se processa no mercado de consumo. Entende-se que a natureza jurídica das EFPC, constituídas como sociedade civil ou fundações sem fins lucrativos, suas atividades diferenciadas com enfoque previdenciário, regradas por legislação específica e seus limites em termos de público de acesso, não têm o condão de afastá-las do enquadramento de fornecedor de serviço consignado no Código de Defesa do Consumidor – CDC. Ao contrário, a atividade securitária implica desembolso por parte do consumidor e oferecimento de proteção e benefícios por parte das EFPC, sendo o participante o destinatário final, de modo que há “troca de interesses” entre as partes envolvidas. Assim, o serviço previdenciário, embora fornecido a segmentos específicos, caracteriza-se por atividade econômica desenvolvida no mercado de consumo, não importando se com finalidades lucrativas ou não. Nesse sentido, há, na concretude, uma relação jurídica de consumo, estando o consumidor vulnerável sob os aspectos técnicos, econômicos, informacionais e jurídicos, bem como fica evidenciada sua hipossuficiência diante de toda a estrutura – poderio financeiro, jurídico, técnico, organizacional, sistema de governança – com que se impõem as próprias EFPC. 73 Por outro lado, em que pesem os sólidos argumentos favoráveis à incidência do CDC nas relações entre as EFPC e os participantes, não se pode perder de vista que o tema é bastante polêmico e ainda não está pacificado em todas as suas nuanças, a exemplo da questão do equilíbrio financeiro e atuarial dos fundos de pensão, conforme se analisou em alguns julgados, restando aprofundar em muito o debate, ficando aí sugestão para pesquisa específica. Particularmente, no que se refere à questão problematizada acima, meramente à título de não impedir o debate, é importante não interpretar o CDC com ampla extensão e de forma absoluta, sob pena de se incorrer em posicionamentos radicais e que resultem em conclusões precipitadas. Em tese, é possível que a aplicação apriorística e indiscriminada do CDC nas decisões judiciais inviabilizem o funcionamento regular e pleno de dado plano de entidade fechada de previdência complementar, quando tal hermenêutica visar atender, por exemplo, a (s) situação (ões) específica (s) de pequeno (s) grupo (s) de participante (s) ou de somente um participante em detrimento da maioria de dado plano de benefício. Ainda assim, é só hipótese. Não obstante as considerações sobre a questão acima, que foi suscita em alguns julgados, inclina-se para o entendimento de que o CDC tem natureza de subsistema e possui caráter principiológico, motivos pelos quais deve prevalecer diante das normas infraconstitucionais, qualquer que seja a espécie de conflito, inclusive entre participante e fundos de pensão. Além disso, o CDC está insculpido entre os direitos fundamentais da Constituição Federal, de modo que sua prevalência no conflito com outras normas decorre do reconhecimento de sua posição especial no ordenamento jurídico, de modo a se sobrepor à LC 109/2001. Portanto, entende-se que as entidades fechadas de previdência complementar se enquadram na situação de fornecedora de serviços e mantêm uma relação jurídica de consumo com os participantes, o que implica incidência do Código de Defesa do Consumidor nessas situações fáticas. 74 REFERÊNCIAS ABRAPP - Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar – Consolidado Estatístico. Dezembro/2012. Disponível em: < http://www.abrapp.org.br/Documentos%20Pblicos/ConsolidadoEstatistico_12_2012.pdf>. Acesso em 23 Abr 2013. AMARAL FILHO, Leo. Previdência Privada aberta. São Paulo: Quartier Latin, 2005. ARRUDA, Maria da Glória Chagas. A previdência privada aberta como relação de consumo. São Paulo: LTR, 2004. AVENA, Lygia. Distinção da relação previdenciária das EFPC com seus participantes da relação de consumo do Código de Defesa do Consumidor. In: GOES, Wagner de. Gestão de fundos de pensão – aspectos jurídicos. São Paulo: ABRAPP, 2006. BARROSO, Luís Barroso. 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