PADRÕES VERBAIS NO JORNAL DIÁRIO GAÚCHO: CONTRAPONTOS COM O REGISTRO DICIONARIZADO Aline Maciel Pereira – (UFRGS) Orientador: Profª Dra. Maria José B. Finatto –(UFRGS) Este trabalho faz parte do projeto PADRÕES DO PORTUGUÊS POPULAR ESCRITO: O VOCABULÁRIO DO JORNAL DIÁRIO GAÚCHO- FASE 1 (ICPIBIC-CNPq) com início em 05/01/2012 e término previsto para 31/07/2012. O projeto segue a linha de pesquisas de teorias linguísticas do léxico e visa descrição e estudos de padrões do vocabulário de jornais diários populares brasileiros, que, em tese, por serem voltados para públicos de baixa escolaridade e menor poder aquisitivo, apresentam um vocabulário “facilitado”. Nesta primeira fase o projeto tem como objeto de estudo o jornal Diário Gaúcho (DG), que, segundo Amaral (Amaral,2006), é um tipo novo de jornal, situado entre o jornal tradicional e o tabloide. O jornal tem publicações seis vezes por semana, pois é publicada uma só edição para o fim de semana, apresenta textos curtos muitas vezes com ilustrações, e design colorido. Em uma pesquisa feita também por Amaral (Amaral,2006), percebe-se que o público deste jornal possui um grau de instrução fundamental, tem como renda familiar até 5 salários mínimos e pertence, na maioria das vezes, à classe C. Desde seu lançamento, há onze anos atrás, o DG tem grande aceitabilidade do leitor e elevou o índice de leitores no RS em relação ao Brasil. Atualmente, o jornal tem 150 mil leitores por dia. O trabalho consiste em uma exploração inicial sobre o uso de verbos no Diário Gaúcho e na descrição de modos de uso dos verbos mais frequentes no DG em relação ao que registra um dicionário. A questão norteadora da pesquisa foi inspirada pelos resultados da dissertação de mestrado de Krieger (Krieger, 1980), que estudou 18 verbetes substantivos do Novo Dicionário Aurélio e verificou que “diversas acepções eram desnecessárias” e que “muitas vezes, poderiam ser reduzidas” . A partir deste trabalho surgiu a curiosidade de saber se essa situação continua acontecendo atualmente, e a pergunta que o trabalho visa responder é: em que medida um dicionário reflete o uso da língua que se verifica num corpus? Como base para a pesquisa foi utilizado o corpus do Diário Gaúcho, compilado pelo projeto e disponível no site http://www.ufrgs.br/textecc/porlexbras/porpopular/. O corpus é composto de edições dos primeiros sete meses de 2008 e de junho de 2010, totalizando-se um conjunto de 2.066.957 palavras. Sendo assim, para identificar os 20 verbos mais utilizados no DG em 2010, foram buscados os trigramas integrados por verbos mais frequentes de junho no mesmo ano, com as ferramentas de busca do site PorPopular Desses trigramas, foram excluídos os com verbos de ligação e auxiliares, selecionaram-se apenas os empregados com sujeito e verbo, ou com verbo e objeto explícitos dos textos de 2010. Como resultado foram encontrados os verbos: Acompanhar, Acontecer, Ajudar, Assistir, Cobrar, Conhecer, Entrar, Enviar, Escolher, Escrever, Estrear, Falar, Fazer, Gostar, Ir ,Ocorrer, Querer, Saber, Ter e Ver. A partir desses verbos, para uma primeira investigação, foram criadas 20 tabelas de construções verbais recorrentes, subdivididas por tipos de sentido/acepções, registrando-se modos, tempos e flexões mais frequentes. Como uma primeira referência para uma percepção genérica de tipos de sentidos e de construções com os verbos mais empregados nesse corpus, recorreu-se ao Miniaurélio Dicionário Eletrônico (Ferreira, 2004). As tabelas estão disponíveis no site, na sessão Construções Recorrentes (http://www.ufrgs.br/textecc/porlexbras/porpopular/construcoes.php) Depois da confecção destas tabelas, partiu-se para uma nova verificação, na qual cada uso e flexão de cada verbo que ocorre nos corpus DG foram detalhadamente contrastados com as acepções e exemplos apresentados pelo Dicionário Houaiss. Nessa etapa optou-se pelo Dicionário Eletrônico Houaiss da língua portuguesa (Houaiss, 2001) como dicionário de referência, porque este traz mais acepções e mais exemplos do que obras similares. Enfim, o confronto entre registros e exemplos do Dicionário Houaiss e do corpus DG gerou quadros de resultados, nos quais estão as categorizações, acepções e exemplos do dicionário, bem como os exemplos de uso encontrados no Diário Gaúcho, acompanhados de comentários (Figura 1). As tabelas estão sendo revisadas e disponibilizadas aos poucos no site do projeto (http://www.ufrgs.br/textecc/porlexbras/porpopular/tabelascorpus.php). Tabelas contrastivas entre os verbos mais frequentes no DG em 2010 e os registros do dicionário Houaiss Verbo: AJUDAR Dados do Corpus DG: Dados do dicionário: (Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa – Versão 1.0 – 2001) Categorias: Sentidos: Exemplos do Exemplos do corpus: Comentários: dicionário: Verbo regência múltipla 1 prestar socorro, assistência (a alguém ou a si mesmo); dar ajuda; auxiliar - Ajudar os pobres. - Ajudou-a em suas tarefas. -Fez tudo sem ninguém lhe ajudar. -Todos queriam ajudar. - Assim, ajudarei minha mãe, que mora de aluguel, porque nós perdemos nossa casa no ano passado, no Litoral Norte, por conta de um temporal. (2010) A acepção 1 é a que mais ocorre no corpus DG. - A internet ajudou a polícia a salvar uma família na Zona Norte. (2010) - Ele carecia de forças para se ajudar. Verbo pronominal 1.1 auxiliar-se mutuamente - Eles se ajudam, pois são muito unidos. - Agora, vão em, no máximo, cinco carros, e os motoristas, garantem, não bebem. – Todos se ajudam com a carona. É o jeito – afirma Wilson Almeida Rodrigues, diretor do time. 2 valer-se, aproveitar-se, servir-se Verbo transitivo direto Verbo 3 tornar mais fácil; facilitar, propiciar 4 - Ajudava-se dos pés e das mãos para subir na árvore. - Caminhar ajuda a digestão. Não ocorre - Jogo futebol e acho que isso ajuda a evitar doenças respiratórias. (2010) Batatas e aipim ajudam a engrossar o caldo da sopa. (2010) Não ocorre Nesta acepção aparece muito mais a distinção sintática do que de sentido. intransitivo Regionalis mo: Nordeste do Brasil. nos engenhos de açúcar, realizar a operação de ajuda ('adição de substância') no caldo de cana Figura 1: Exemplo de tabela Resultados parciais apontam que: a) o dicionário tende a apresentar bem mais possibilidades de uso dos verbos do que as que ocorrem no DG; b) em alguns casos, observando as ocorrências no corpus, tem-se a impressão de que algumas acepções diferentes indicadas no dicionário poderiam formar uma só; e c) conforme verificado por Krieger (1980), parecem ser exageradas as nuances de sentido no dicionário em relação ao que está sendo constatado no corpus. Com efeito, o resultado A já era esperado, pois o dicionário, além de ter uma proposta de abarcar o máximo de possibilidades de uso dos verbos, traz rubricas de áreas específicas para atingir este objetivo. Também foi verificado que apesar de todas as acepções de verbos estudadas até o momento contemplarem os usos do DG, encontrou-se muita dificuldade de identificar a qual acepção os exemplos do corpus pertencem, já que muitas acepções do dicionário se confundem ou apresentam exemplos confusos. Entretanto, estes aspectos devem ser ainda melhor investigados. REFERÊNCIAS: AMARAL, M. F. (2006) Jornalismo Popular. São Paulo: Contexto. FERREIRA, A. (2004). Miniaurélio Eletrônico versão 5.12. Curitiba: Positivo Informática. (CD-ROM) HOUAISS, A (2001) Rio de Janeiro, Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa versão 1.0. Rio de janeiro: Objetiva. (CD-ROM) KRIEGER, M. G. (1980) A definição lexicográfica do novo dicionário Aurélio: análise sêmica de verbetes substantivos. Dissertação de Mestrado. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul.