Tabela 4. Efeito de doses de glifosato na expressão de sintomas e acumulação de fitoalexinas na interação compatível entre feijoeiro e Colletotricum lindemuthianum. Glifosato Lesões mostrando Tamanho da (μ expansão (%) lesão (mm) μg planta-1) Vermiculita Solo natural Fitoalexinas totais μg lesão-1) (μ Controle 0 5,0 21,35 0,5 30 8,5 16,50 1,0 60 12,0 10,85 10,0 100 > 15,0 4,60 Testemunha Figura 20. Plantas de feijão que cresceram em solo natural morreram após tratamento com glifosato enquanto plantas que cresceram em vermiculita sobreviveram. Estudando os mecanismos que levam o feijoeiro a perder a resistência à antracnose causada pelo fungo Colletotrichum lindemuthianum, Dr. Johal observou que as fitoalexinas estavam associadas à proteção das plantas contra a contaminação por fungos. As fitoalexinas são substâncias antimicrobianas sintetizadas e acumuladas pelas plantas quando expostas aos patógenos, derivadas da rota do fenilpropanóide e com características fenólicas. No caso do feijoeiro, há produção de quatro diferentes fitoalexinas durante sua interação com o fungo da antracnose: faseolina, faseolidina, kievitona e faseolinisoflavona. Dr. Johal observou que no feijoeiro as fitoalexinas estavam envolvidas nos dois tipos de interação patógeno-hospedeiro, ou seja, interação compatível e interação incompatível. Na interação compatível as plantas ficam suscetíveis ao patógeno e apresentam lesões no hipocótilo, como as apresentadas na Figura 21. Figura 22. Habilidade do glifosato em suprimir a produção de fitoalexinas em feijoeiro infectado por fusariose. Inoculação com esporos do fungo Aplicação tópica dos esporos do fungo Lesões de antracnose Figura 21. Efeito do ataque de antracnose em hipocótilo de feijoeiro. À esquerda, interação patógeno-planta incompatível; à direita, interação patógeno-planta compatível. Com o objetivo de determinar se as fitoalexinas estavam envolvidas na proteção direta contra a doença, Dr. Johal utilizou dois inibidores químicos – AOPP e glifosato – visando bloquear a rota do ácido chiquímico, responsável pela produção de fitoalexinas. Dr. Johal observou que uma dose da ordem de 0,5 μg de glifosato por planta já era suficiente para aumentar o tamanho da lesão e diminuir a produção de fitoalexinas, e a de 10 μg por planta causou expansão da lesão em 100% das plantas estudadas (Tabela 4 e Figura 22). Supondo que tivessemos 300.000 plantas por hectare, a dose de 10 μg por planta equivaleria a apenas 3 g do ingrediente ativo de glifosato por hectare! Numa formulação co- INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 119 – SETEMBRO/2007 mercial padrão, com 360 g L-1 de glifosato, esta dose equivaleria a pouco menos de 10 mL ha-1, que já seria suficiente para tornar a cultura do feijoeiro suscetível ao Colletotrichum lindemuthianum. Dr. Johal observou ainda que aplicações exógenas de fenilalanina ajudaram a conter a expansão das lesões em plantas suscetíveis tratadas com glifosato. Como se sabe, a fenilalanina é um dos três aminoácidos cuja síntese é inibida pela ação do glifosato. Finalizou sua palestra dizendo que as plantas RR não são completamente resistentes às mudanças induzidas pelo glifosato. Isto porque as mudanças fisiológicas nas plantas transgênicas que promovem resistência aos patógenos biotróficos (como, por exemplo, a ferrugem da soja) geralmente aumentam a suscetibilidade da planta aos patógenos necrotróficos, como Pythium e Fusarium. Palestra: EFEITOS DO GLIFOSATO EM DOENÇAS DE PLANTAS Don Huber, Purdue University, Estados Unidos, e-mail: [email protected] Segundo Professor Huber, quatro fatores interagem para determinar a severidade de uma doença: planta (vigor, suscetibilidade, resistência, estádio de desenvolvimento, exsudatos de raiz), meio 13 abiótico (nutrientes, umidade, temperatura, pH, densidade, gases), meio biótico (antagonismo, sinergismo, oxidantes, redutores, competidores, mineralizadores) e patógeno (população, virulência, atividade) (Figura 23). Figura 25. Efeitos do glifosato na fisiologia das plantas. Tabela 5. Patógenos de planta afetados pelo glifosato. Aumentados pelo glifosato Figura 23. Interação entre fatores que determinam a severidade das doenças. Qualquer interferência no sistema agrícola pode provocar uma mudança na interação entre esses fatores, e o seu entendimento torna mais fácil o manejo e o controle das doenças de solo. Sabese, por exemplo, que a rotação de culturas reduz a incidência de doenças, e um dos primeiros efeitos dessa prática ocorre sobre a atividade biológica do solo, a qual influencia as formas de nitrogênio disponíveis para as plantas ao longo do tempo bem como a quantidade residual do nutriente para a cultura subseqüente. Mencionou que a introdução do glifosato há 30 anos promoveu grande mudança na agricultura, com consideráveis efeitos na nutrição e na incidência de doenças de plantas. As interações do glifosato com a microbiota do solo estão resumidas na Figura 24, com as plantas na Figura 25 e com os patógenos na Tabela 5. Botryospheara dothidea Corynespora cassicola Fusarium avenaceum F. graminearum F. oxysporum f. sp. cubense F. oxysporum f.sp (canola) F. oxysporum f.sp. glycines F. oxysporum f.sp. vasinfectum F. solani f.sp. glycines F. solani f.sp. phaseoli F. solani f.sp. Pisi Gaeumannomyces graminis Magnaporthe grisea Marasmius spp. Monosporascus cannonbalus Myrothecium verucaria Phaeomoniella chlamydospora Phytophthora spp. Pythium spp. Rhizoctonia solani Septoria nodorum Thielaviopsis bassicola Xylella fastidiosa Diminuídos pelo glifosato (patógenos obrigatórios) Phakopsora pachyrhizi Puccinia graminis Dr. Huber chamou a atenção para o fato do glifosato ter forte natureza metal-quelante, com alta especificidade para os micronutrientes Mn, Fe, Zn e Cu. Comentou que a qualidade dos alimentos vem declinando nos últimos 15 anos, podendo este fenômeno estar relacionado ao uso de produtos quelantes de metais. Em relação ao Mn – elemento essencial para a produção de compostos de defesa da planta (cumarinas, ligninas, flavonóides) –, fatores como alto pH, calcário, fertilizantes nitrogenados na forma de nitrato, matéria orgânica e baixa umidade do solo podem diminuir sua disponibilidade no solo e, em conseqüência, aumentar a predisposição da planta às doenças. Figura 24. Algumas interações microbiológicas que ocorrem no solo com o uso de glifosato. 14 Dr. Huber explicou que o glifosato provoca mudanças no equilíbrio microbiológico do solo e afeta a população de organismos benéficos para as plantas. Assim, se o produto for utilizado por vários anos, a nodulação das raízes das leguminosas é comprometida, e conseqüentemente a fixação biológica de N, e serão necessários muitos anos para restabelecer o equilíbrio da microflora e da população normal de Rhizobium. INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 119 – SETEMBRO/2007 O glifosato também interfere na população de micorrizas, comprometendo a nutrição das culturas em solos com baixa disponibilidade de Zn e P. Por outro lado, o glifosato estimula o aumento de organismos patógenos e oxidantes de Mn, os quais indisponibilizam este nutriente para a planta e a predispõe ao ataque de doenças. A Figura 27 mostra o efeito do glifosato no aumento da predisposição da soja à podridão de raiz por Corynespora cassiicola, doença que no passado era de pouca importância econômica, mas que atualmente tornou-se severa. Controle Inoculada microbiologia do ambiente da rizosfera. Estas alterações na rizosfera afetam: (1) Ciclagem de nutrientes e, por conseqüência, sua disponibilidade para as plantas; (2) Potencial fitopatogênico e o balanço antagonístico; (3) Composição e atividade dos microrganismos benéficos (por exemplo, micorrizas e rizobactérias promotoras do crescimento das plantas). Assim, o seu grupo de pesquisa no início tinha os objetivos: (1) Entender os impactos das culturas transgênicas nas interações com a biologia do solo e seus mecanismos; e (2) Determinar processos para corrigir os fatores limitantes derivados das interações detrimentais entre as culturas transgênicas e a biologia do solo. Na primeira fase, seus estudos buscaram saber os efeitos dos fungos patogênicos e do nematóide de cisto (Heterodera glycines) na soja RR. Os resultados mostraram um consistente aumento na população de Fusarium spp. colonizando as raízes da soja RR com a aplicação de glifosato nas doses recomendadas pelo fabricante. Também observou que a colonização por Fusarium foi geralmente de duas a cinco vezes superior no tratamento com glifosato, quando comparado ao controle, sem glifosato (Figura 28). Inoculada + glifosato via foliar Figura 27. Podridão da raiz da soja causada por Corynespora cassiicola, induzida pela aplicação de glifosato. Professor Huber terminou sua palestra com as recomendações para os principais problemas relacionados ao uso do glifosato ou ao uso das plantas RR: (1) Menor absorção de Mn pelas plantas RR: selecionar cultivares com maior eficiência para Mn. (2) Menor translocação de Mn com a aplicação de glifosato: aplicar Mn e outros micronutrientes 8 dias após a pulverização da planta RR com glifosato. (3) Mudanças acumulativas na biologia da rizosfera: usar práticas culturais que minimizem o impacto do glifosato; usar herbicida não sistêmico. (4) Redução no desenvolvimento do sistema radicular: usar o gesso, ou superfosato simples, no sulco de semeadura. (5) Aumento da severidade de doenças com o uso de glifosato: usar métodos alternativos de controle de invasoras; minimizar o uso de glifosato. Palestra: INTERAÇÕES ENTRE GLIFOSATO E MICRORGANISMOS NA RIZOSFERA DE PLANTAS RESISTENTES AO GLIFOSATO Robert Kremer, USDA-ARS & University of Missouri, Estados Unidos, e-mail: [email protected] Dr. Kremer iniciou sua palestra mencionando que o desenvolvimento de plantas geneticamente modificadas buscou apenas a melhoria da produtividade agrícola. E que foram negligenciados importantes processos fisiológicos das plantas e da microbiologia do solo que podem ser afetados pelo uso desta tecnologia. Assim, o “Sistema de Produção Roundup-Ready” constitui um avanço no manejo efetivo das invasoras. No entanto, lembrou ele que esta tecnologia apresenta alguns pontos fracos como: aparecimento de invasoras com resistência ao glifosato e alterações na INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 119 – SETEMBRO/2007 Figura 28. Incidência de Fusarium na rizosfera de soja RR em função do tempo de aplicação. O Fusarium mostrou ser bom indicador dos impactos causados pelo glifosato na rizosfera das plantas transgênicas. Contudo, como a rizosfera é um sistema complexo, tornou-se claro a necessidade de estudos mais completos sobre a estrutura e as funções das comunidades microbianas lá instaladas, que é o atual enfoque da pesquisa do seu grupo. Especificamente, as novas pesquisas estudam: (1) O Fusarium dentro da comunidade fúngica na rizosfera; (2) Os organismos transformadores do Mn (oxidantes e redutores); (3) A fixação biológica do nitrogênio pelos rizóbios; (4) As comunidades Pseudomonad; e (5) Os fungos micorrízicos arbusculares. Trabalhos recentes mostram que a massa de nódulos na soja RR é menor que na soja convencional, mesmo sem o tratamento com glifosato. Com o uso deste, o peso dos nódulos é ainda 15