Estou convencido de que o glifosato está induzindo deficiências de micronutrientes em várias culturas. Níquel (Ni) é um destes nutrientes. Como você sabe, a deficiência de Ni nos solos dos pomares é muitíssimo rara. Assim, o aparecimento dos sintomas de deficiência sugerem fortemente que existe algo seriamente errado com a fisiologia da cultura, ou com a química do solo/ambiente, ou com ambos. Acredito que os sintomas aparentes de deficiência de Ni observados nos cafeeiros (visitados no Brasil) são consistentes com os que se esperaria da ligação de cátions divalentes, como o Ni, com o glifosato. Excetuando as hiperacumuladoras de Ni, todas as plantas absorvem apenas quantidade pequena de Ni e como (só) os transportadores de ureídas necessitam de concentrações relativamente altas de Ni endógeno, é razoável esperar que plantas com este tipo de transporte de N serão as primeiras a apresentar danos fisiológicos como conseqüência da quelação dos micronutrientes pelo glifosato. Em outras palavras, as inter-relações entre Ni, transporte de ureídas e glifosato são como as entre canário, mina de carvão e o homem (no passado, o canário era usado como indicador do nível tóxico de gás; assim, se o pássaro morria, era sinal de que havia nível tóxico de gás e que os mineiros deveriam evacuar as minas), em que (a deficiência) o Ni seria o “alarme precoce indicador” (early warning indicator, no original) do problema (do glifosato). A deficiência de Ni em cafeeiro, seja (ela causada) por falta (de Ni) no solo ou por indução pelo glifosato poderá ser corrigida com uma a duas pulverizações foliares de sais de Ni na concentração de 100 ppm de Ni (+ 1 a 2 kg de uréia em 378 litros de água + um surfactante não iônico) feitas (a primeira) alguns dias após o início das brotações e mais uma (a segunda) após duas semanas. Funcionará ou como correção da deficiência de Ni ou como antídoto parcial contra danos induzidos pelo glifosato. Espero que os administradores de fazendas testem o Ni, mas que deixem um controle para que possamos melhor entender o que está acontecendo com o cafeeiro. Eu suspeito que a faixa foliar (de Ni) para o cafeeiro está entre 3 e 5 ppm. Também vi (no Brasil) algumas laranjeiras com folhas exibindo três sintomas diferentes associados com a deficiência de Ni. Nos citros, aparentemente o N é transportado como amida, possuindo, assim, necessidade muito baixa de Ni (pode ser cerca de 200-500 ppb). Por conseguinte, suspeito que o uso do glifosato tem o potencial de causar problemas de “fome oculta” mesmo em culturas relativamente insensíveis ao Ni, como os citros. Suspeito que existam também problemas (de deficiência) de Ni na cana-de-açúcar e na soja. Em relação ao greening de citros e o uso de fosfito, acredito que é razoável concluir que ambos podem ter papéis (na doença); contudo, é provável que seja um tiro de longa distância (longshot ou “chutão”). Apesar disto, ainda é, na minha opinião, (uma hipótese) válida de ser estudada. O fosfito pode provar sua eficácia, pois possui ação contra certas classes de bactérias. Assim, parece razoável esperar que o uso combinado de Ni e fosfito poderia suprimir ou prevenir o crescimento ou a reprodução bacteriana e assim constituir numa maneira eficaz para controlar o greening. Existe ainda o trabalho vietnamita mostrando que o greening é controlável através do plantio intercalar de goiabeira com laranjeira, na base de 1:1, ou seja, cada pé de citros circundada por 4 pés de goiabeira (e vice-versa). A goiabeira produz terpenos, que repelem os Psilídeos, que são os vetores das bactérias causadoras da doença. Outro enfoque é controlar os Psilídeos com pesticidas, mas este controle será muito caro. INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 119 – SETEMBRO/2007 A combinação Ni2+-fosfito foliar, ou o encharcamento do solo com ambos, Ni2+ e fosfito, parece-me um enfoque viável com razoável probabilidade na redução dos impactos adversos do greening. Eu falei recentemente num encontro no México sobre o grande sucesso obtido com o encharcamento do solo circundando o tronco com fosfito na cura de certas doenças afetando o carvalho na Califórnia. Daquelas discussões concluí que os encharcamentos de solos com soluções constituem meios altamente eficazes de colocar compostos orgânicos e inorgânicos dentro da planta. Como regra geral, os volumes aplicados devem ser cerca de 1,5 L por cm de diâmetro do tronco. A solução necessita de um surfactante apropriado para facilitar o movimento dentro da planta. Uma “baixa” concentração de um surfactante organo-silicone na dose de 0,26 ml L-1 da solução parece melhorar a absorção radicular das árvores. Vejo, portanto, que o enfoque potencialmente viável para controlar o greening de citros que envolveria a cessação do uso do glifosato incluiria as opções: 1. Pulverizações foliares ou injeções com Ni, em tempo oportuno; 2. Pulverizações foliares ou injeções com fosfito, em tempo oportuno; 3. Pulverizações de ambos, Ni e fosfito, em tempo oportuno; 4. Encharcamento do solo com Ni; 5. Encharcamento do solo com fosfito; 6. Encharcamento do solo com ambos, Ni e fosfito. Adicionalmente, é possível que a inclusão de salicilato, ou análogo, poderia ter eficácia contra bactéria afetando o floema; assim, o tratamento foliar com salicilato poderia estimular as defesas da planta de modo a suprimir ou matar a bactéria. Mais uma vez, obrigado pela oportunidade de participar. Foi uma viagem muito benéfica para mim. Saudações cordiais, Bruce W. Wood Research Leader Palestra: PROBLEMAS RELACIONADOS AO GLIFOSATO E DOENÇAS DE PLANTAS NO CANADÁ Myriam Fernandez, Agriculture and Agri-Food, Canadá, e-mail: [email protected] Segundo a Dra. Fernandez, desde meados da década de 90, na parte oeste da região dos Prairies do Canadá, onde o clima é mais chuvoso e os solos são mais pesados, a fusariose do trigo (FHB) tornou-se um problema sério. Esta doença reduz a produtividade e a qualidade dos grãos (Figura 18), acumula micotoxinas e diminui a germinação e vigor das plântulas, sendo a fonte mais importante do inóculo da fusariose os restos culturais dos cultivos anteriores. De 1999 a 2002 ela buscou identificar práticas de manejo que reduzissem os danos da doença nas áreas de cultivo do trigo bem como sua disseminação para outras áreas do Canadá. Nos 851 campos de trigo e cevada analisados (resíduos e raízes), foram encontradas várias espécies de Fusarium, como: F. graminearum, F. avenaceum, F. culmorum, F. poae e F. sporotrichioides. Resultados do estudo demonstraram que quatro fatores agronômicos foram significativos no aumento da severidade da doença: 11 Figura 18. Efeito do ataque de Fusarium nas sementes e espigas de trigo. suscetibilidade do cultivar, rotação de culturas, sistema de cultivo e uso de glifosato, sendo que os três primeiros fatores foram significativos em 2 dos 4 anos estudados, os mais chuvosos, enquanto a influência do glifosato foi significativo em todos os 4 anos. Durante os estudos dos fatores de risco e de produção associados à fusariose da espiga de trigo observou-se que: • O ambiente (chuva e temperatura) foi o fator mais importante no desenvolvimento da doença; • A aplicação de formulações de glifosato nos 18 meses anteriores à semeadura foi o fator agronômico mais importante associado com os maiores índices de fusariose no trigo de primavera; • Houve maior incidência do patógeno quando o herbicida foi empregado nas culturas em geral (75%) ou sob cultivo mínimo (122%), quando comparado às culturas sem glifosato, e a associação positiva do glifosato com a doença não foi afetada pelas condições ambientais. A Tabela 3 mostra o efeito cumulativo do glifosato aplicado nos três anos anteriores ao cultivo do trigo. Tabela 3. Índice de fusariose da espiga do trigo (FHB) em função do número de aplicações de glifosato. Trigo de primavera, 2001. No de aplicações de glifosato nos três anos anteriores Índice de FHB (%) Nenhuma 1a2 3a6 4,2 6,4 12,4 Estudo da correlação entre o número de aplicações de glifosato e o índice de fusariose em duas cultivares de cevada com diferentes resistências ao glifosato – suscetíveis e com resistência intermediária – , sob cultivo mínimo, mostraram que o índice de fusariose não foi significativo para F. avenaceum e F. graminearum, mas foi significativo para as cultivares com resistência intermediária. Estas apresentaram níveis de fusariose tão altos quanto as cultivares suscetíveis, mostrando que o glifosato anulou a resistência das cultivares com resistência média, pois estas se mostraram suscetíveis na presença do herbicida. De acordo com Dra. Fernandez, a podridão radicular da cevada e do trigo é causada, na maioria dos casos, por Cochliobolus sativus e Fusarium spp. Estudos com cevada, em três sistemas de cultivo e com aplicação ou não de glifosato, mostraram que os mais altos níveis da doença foram encontrados nos campos em cultivo 12 mínimo e com uso de glifosato. Observou-se também mudança na comunidade de fungos radiculares associada com o uso do glifosato, com nível mais baixo de C. sativus e mais alto de Fusarium. Dra. Fernandez mencionou que, devido à natureza dos estudos de campo, não foi possível separar completamente os efeitos do glifosato dos da intensidade de cultivo e da rotação de culturas. E que os resultados inconclusivos ou as discrepâncias entre os estudos publicados sobre o glifosato devem-se a diferentes causas: • Estudos conduzidos em condições ambientais diferentes (tipo de solo, clima, etc.); • Emprego de diferentes manejos (por exemplo, manejo convencional sem glifosato x plantio direto com glifosato); • Espécies diferentes de culturas; • Aplicação direta sobre a cultura RR versus aplicações em pré-semeadura na cultura convencional; • Efeito das aplicações de glifosato no campo ou em laboratório na ausência de invasoras ou ainda com densidade desconhecida de invasoras. Palestra: MUDANÇAS INDUZIDAS PELO GLIFOSATO NA RESISTÊNCIA DE PLANTAS ÀS DOENÇAS Guri Johal, Purdue University, Estados Unidos, e-mail: [email protected] Dr. Johal dividiu sua apresentação em três partes: (1) Como o glifosato torna as plantas suscetíveis às doenças? (2) Por que o glifosato torna as plantas mais suscetíveis às doenças? (3) Estão as plantas RR livres deste problema? As duas primeiras perguntas foram temas das suas teses de Mestrado e Doutorado, respectivamente, feitas sob a supervisão do Dr. James Rahe, Simon Fraser University, Burnaby, BC, Canadá. Na sua tese de Mestrado observou que a eficiência do glifosato como excelente herbicida advém, em grande parte, da sua capacidade em comprometer a habilidade das plantas na sua autodefesa contra os patógenos. Identificou que, destes, os mais importantes são Pythium e Fusarium, de distribuição generalizada nos solos agricultáveis. No seu experimento, Dr. Johal observou que as plantas tratadas com glifosato (15% da dose recomendada) e cultivadas em solo esterilizado e também em vermiculita (meio inerte) mostraram-se pouco afetadas pela atividade do herbicida, recuperando o crescimento após algumas semanas do tratamento. Porém, as plantas cultivadas em solo natural morreram e houve rápida colonização das raízes por Pythium e Fusarium (dois a três dias após o tratamento). Além disso, notou que a adição destes patógenos aos meios esterilizado e inerte (vermiculita) restabeleceu a atividade herbicida do glifosato nas plântulas (Figura 20). Concluiu que a eficácia herbicida do glifosato ocorreu em grande parte devido à sua interação sinergística com patógenos, como Pythium e Fusarium, que estão presentes na maioria dos solos. Um outro aluno do Prof. Rahe, chamado Andre Levesque, domonstrou que a textura e a umidade do solo influenciavam na predominância do patógeno na raiz da planta sob a influência de doses subletais de glifosato: Pythium, quando o solo era argiloso e úmido, ou Fusarium, no caso de solo mais arenoso e seco. Na sua tese de Doutorado, Dr. Johal buscou identificar a causa da menor resistência às doenças com estas doses subletais de glifosato. INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 119 – SETEMBRO/2007