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edição 4 - ano 2 - março de 2012
medicina laboratorial
O desafio de investigar e
diagnosticar alergias na infância
Os testes laboratoriais podem ajudar desde que sejam
utilizados em conjunto com a história clínica.
As doenças alérgicas são muito comuns na idade pediátrica. Segundo
o International Study of Asthma and Allergies in Childhood (Isaac), a
prevalência dessas afecções entre as crianças é de 54,2%. No Brasil, a
asma brônquica atinge entre 24,4% e 31,4% da população infantil, a
depender da região estudada. Já a rinite alérgica acomete entre 28,8%
e 31,7% dos adolescentes. Nos EUA, a alergia alimentar afeta uma em
cada 25 crianças e envolve sobretudo leite, ovo, amendoim, trigo, soja
e castanhas. Por sua vez, a alergia à picada de inseto está presente em
0,8% das crianças americanas.
À semelhança do que ocorre em outras afecções, o diagnóstico das
doenças alérgicas nos pacientes pediátricos se baseia na história
familiar detalhada, tanto para confirmar ou excluir o padrão da suspeita
quanto para demonstrar os fatores etiológicos.
A maioria dos exames laboratoriais detecta a presença de IgE alérgenoespecífica, porém a demonstração dessa sensibilização não basta
para diagnosticar a condição, já que os pacientes testados podem ser
assintomáticos quando ocorre exposição ao alérgeno. De forma menos
frequente, há indivíduos que reagem a um elemento e não apresentam
IgE específica. Portanto, um diagnóstico em alergia não prescinde do
contexto clínico, não devendo ser fechado unicamente com base nos
resultados dos testes solicitados.
Um exemplo frequente abrange crianças com urticária sem que o
médico consiga correlacionar o agente causal com a clínica. Caso sejam
pedidas aleatoriamente as IgEs específicas, a positividade pode levar
à retirada desnecessária do alimento suspeito. O fato é que muitos
pacientes pediátricos são rotulados como alérgicos pela simples
presença da IgE específica, mas não é raro observar discrepância entre
a história contada pelos pais e os resultados desses exames – cuja
utilidade você confere nas páginas que se seguem.
dobra
alergias
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E os painéis de alérgenos?
Quando utilizar?
O uso desses testes também só é recomendado
quando a história clínica não aponta o alérgeno
suspeito. Em caso de positividade, cada componente
pode ser testado isoladamente, pois um painel
positivo não indica o alérgeno implicado na
possibilidade do desencadeamento da manifestação
clínica. Veja, abaixo, alguns exemplos de painéis:
Alimentos
• FX1 (amendoim, aveia, castanha-do-pará,
amêndoa, coco)
• FX2 (bacalhau, camarão, mexilhão, atum, salmão)
• FX3 (trigo, aveia, milho, gergelim, trigo negro)
• FX5 (clara de ovo, leite de vaca, bacalhau,
amendoim, soja, trigo)
Ácaros
• HX2 (Dermatophagoides pteronyssinus,
Dermatophagoides farinae, poeira doméstica,
barata)
Fungos
• MX1 (Penicillium notatum, Cladosporium herbarum,
Aspergillus fumigatus, Alternaria alternata)
Polens
• GX2 (gramíneas)
Epitélio de animais
• EX1 (cão, gato, vaca, cavalo)
IgE total
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IgE específica
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prática clínica
Quando usar a IgE total e a IgE específica
Esses testes não servem para rastrear processos alérgicos, mas, sim, para
complementar a investigação, a partir da anamnese.
IgE específica
Quando comparada aos testes cutâneos, ou prick test, a
IgE específica possui a vantagem de ser isenta de risco
e de não sofrer interferência de medicamentos em uso
pelo paciente, como antidepressivos tricíclicos e antihistamínicos.
no lugar do papel, usado no RAST®. A capacidade de
ligação, na prática, é maior no polímero, tornando o
método mais sensível. A sensibilidade e a especificidade
variam de acordo com a qualidade do alérgeno utilizado,
mas oscilam entre 60-95% e 30-95%, respectivamente.
A medida dessa imunoglobulina é utilizada nos casos
de suspeita de anafilaxia e de risco de reação sistêmica,
de história de reação grave minutos após o contato com
o alérgeno suspeito, de lesões cutâneas extensas, que
impossibilitam a realização dos testes cutâneos, e de
suspeitas de sensibilização em pessoas com prick test
negativo. Também tem aplicação em extremos de idade e
na gestação, podendo ainda ser usada para substâncias
sem extratos padronizados disponíveis para o teste
cutâneo.
Na prática, os imunoensaios estão disponíveis para
alimentos, veneno de inseto, alérgenos ambientais
(polens, fungos, animais, ácaros e barata), látex e alguns
medicamentos. No entanto, convém enfatizar que esses
exames são complementares. Tanto é assim que cerca de
10% dos pacientes com testes cutâneos negativos para
veneno de inseto apresentam IgE específica para esse
alérgeno.
Embora essa categoria de testes seja coloquialmente
conhecida por RAST®, o correto é utilizar o termo
imunoensaio IgE-específico, já que a marca em questão se
refere à primeira geração de tais exames.
Na a+ medicina diagnóstica, a pesquisa de IgE específica
é feita pelo ImmunoCAP®, que emprega polímeros
hidrofílicos, aos quais o alérgeno se liga covalentemente,
Correlação entre teste cutâneo (prick) e IgE específica
Rapidez
Custo
Sensibilidade
Segurança
Prick
IgE específica
+++
+
+
+++
++
+
+
+++
Como diagnosticar alergia alimentar
O padrão-ouro, no caso da alergia a alimentos, é o teste
de provocação oral, duplo-cego e controlado por placebo.
Devido à limitação da utilização desse recurso na prática
clínica e à estreita associação entre IgE específica
e reações imunológicas a alimentos, há parâmetros
estabelecidos entre níveis séricos de IgE específica e
chance de manifestação clínica como instrumento para
esse diagnóstico.
A IgE específica ainda pode ser indicada para confirmar
testes cutâneos negativos. No entanto, existe a
possibilidade de ocorrer resultado falso-positivo quando
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os valores da IgE total estiverem muito altos – por
exemplo, em indivíduos com síndrome hiper-IgE, que
podem apresentar IgE específica sem história clínica de
reação alérgica a alimentos.
Ainda dentro do diagnóstico de alergia alimentar, deve-se
levar em consideração que algumas proteínas possuem
sequências idênticas de aminoácidos, razão pela qual a
sensibilização a uma proteína pode levar a uma reação
diante de exposição a proteínas semelhantes, conforme
você confere na tabela ao lado.
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E a alergia a medicamentos?
Os betalactâmicos são mais envolvidos na reação imediata,
seguidos por outros antibióticos, anti-inflamatórios não
hormonais e relaxantes musculares. O ImmunoCAP® está
disponível para poucas drogas, como amoxicilina, ampicilina,
insulina bovina, suína e humana e penicilina G e V, tendo
especificidade de 90% e sensibilidade de 50%.
IgE total
Valores de referência
Determinados em classes, mostram-se mais
elevados quanto maior a intensidade das
manifestações clínicas.
IgE específica (em kU/L)
Classe 0
<0,35
Classe I
≥0,35 e <0,7
Classe II
≥0,7 e <3,5
Classe III
≥3,5 e <17,5
Classe IV
≥17,5 e <50,0
Classe V
≥50,0 e <100,0
Classe VI
≥100
Vantagens
• Sem risco de reação sistêmica
• Sem necessidade de suspender a medicação
• Realização possível em pacientes com
eczema extenso ou dermografismo
Desvantagens
• Demora no resultado
• Ausência de prova “viva” para o paciente
• Possibilidade de resultados falso-negativos
A IgE total é uma imunoglobulina cuja concentração sanguínea depende
da idade. Indivíduos com asma brônquica, rinite ou dermatite atópica
apresentam valores maiores do que a população geral. Níveis elevados
podem indicar alergia, mas não fazem referência ao alérgeno. Existem
outras causas de aumento de IgE total, além dos quadros alérgicos, as
quais incluem parasitoses, malignidades (mieloma, linfoma de Hodgkin),
imunodeficiências primárias (síndrome hiper-IgE, de Wiskott-Aldrich, de
Nezelof), doenças infecciosas (aspergilose broncopulmonar alérgica) e
doenças inflamatórias (síndrome de Churg-Strauss, doença de Kawasaki).
A mensuração dessa imunoglobulina está indicada para o tratamento da
asma brônquica grave com um anticorpo monoclonal, o omalizumab.
Valores normais de IgE total (em kU/L)
Faixa etária
Resultado
Até 1 mês
Inferior a 2
De 1 a 3 meses
Inferior a 4
De 4 a 6 meses
Inferior a 10
De 7 a 12 meses
Inferior a 15
De 1 ano a 5 anos e 11 meses
Inferior a 60
De 6 a 9 anos e 11 meses
Inferior a 90
De 10 a 15 anos e 11 meses
Inferior a 200
Acima de 16 anos
Inferior a 100
Reatividade cruzada entre alérgenos
Alérgeno
Alimentos com os quais há risco de reação
cruzada
Amendoim
Ervilha, lentilha, feijão e soja
Nozes
Castanha-do-pará e avelã
Salmão
Peixe-espada e linguado
Camarão
Caranguejo e lagosta
Trigo
Centeio e cevada
Leite de vaca
Carne bovina e leite de cabra
Pólen
Maçã, pêssego e melão
Látex
Kiwi, banana e abacate
Fonte: Solé et al. Consenso Brasileiro sobre Alergia Alimentar. Rev Bras Alerg Imunopatol 2008, 31 (2).
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dicas e soluções
Dúvidas mais frequentes no diagnóstico
laboratorial das alergias
Embora a indicação dos testes seja bem delimitada, o assunto
suscita uma série de questionamentos. Veja os mais comuns.
Existe IgE específica para chocolate?
Não. O chocolate é um produto
industrializado, feito à base de cacau,
que pode conter diversos ingredientes
potencialmente alergênicos, como
leite, soja e castanhas. Existe a
possibilidade de que o paciente
apresente alergia a um ou mais
desses componentes isoladamente.
E para lactose?
Não. A lactose é um açúcar contido
no leite, podendo causar diarreias e
cólicas em pacientes com deficiência
de lactase, a enzima que metaboliza
a lactose. Nos quadros suspeitos de
alergia à proteína do leite de vaca,
é possível pesquisar IgE específica
para leite (F2), assim como para as
proteínas alfalactoalbumina (F76),
betalactoglobulina (F77) e caseína
(F78).
Exames muito positivos predizem
anafilaxia?
Não necessariamente. Se comparadas
com indivíduos com baixos
níveis de IgE específica, pessoas
com resultados muito elevados
apresentam sintomas quando
expostas a um alérgeno mais
frequentemente.
Valores muito altos de uma IgE
específica confirmam o diagnóstico
de alergia?
O achado de valores muito altos
(classe VI) em pacientes com história
clínica, nos quais o alérgeno está
bem caracterizado, confirma o
diagnóstico, enquanto níveis fracos
(classe I) necessitam de maior
investigação com testes cutâneos
e de provocação, indicados pelo
especialista.
Teste cutâneo e IgE específica
negativos para insetos afastam
a possibilidade de anafilaxia na
próxima picada?
Não totalmente, pois o mecanismo
da reação pode não ser o da IgE
mediada. Não há um exame-padrão
para o diagnóstico da alergia
a picadas de insetos, embora
preferencialmente o teste cutâneo
seja a primeira opção, pois cerca de
20% dos indivíduos com esse exame
positivo apresentam IgE específica
negativa. Para formiga, por exemplo,
a IgE específica disponível é para o
corpo do inseto, que leva a 26% de
falso-negativos, quando o ideal seria
utilizar o veneno. A IgE específica
para inseto deve ser feita após 3-6
semanas da picada, devido à menor
sensibilidade nesse período.
Pode ocorrer IgE específica num
indivíduo sem história de alergia?
Sim, por conta da presença dos
cross-reactive carbohydrate
determinants, os CCDs. Indivíduos
alérgicos a pólen e a veneno de inseto
apresentam esses elementos, que
reagem cruzadamente, resultando
em IgE contra plantas e/ou proteínas
animais. Pacientes alérgicos ao
pólen cuja IgE específica tenha uma
reação cruzada com vegetais devido
aos CCDs não possuem sintomas de
alergia alimentar.
Situações
clínicas
distintas e
um mesmo
resultado de
IgE específica
Três crianças de 2 anos de idade
em avaliação para alergia ao ovo.
A criança A apresentou urticária,
angioedema e crise de broncoespasmo
após ingesta desse alimento. A criança B
tem dermatite atópica grave, que parece
piorar, segundo os pais, com qualquer
alimento, o ovo inclusive, mas sem
história de reação aguda. A criança C
não possui histórico de alergia, embora
os pais desejem fazer a pesquisa “para
prevenir” tal possibilidade. Apesar
dessas diferenças, a IgE específica dos
três pacientes é 3 kU/L (ImmunoCAP®).
Como interpretar esse resultado?
A discussão
A criança A tem grande probabilidade
de apresentar alergia ao ovo, mesmo
com o valor baixo do teste, devendo
ser encaminhada ao especialista para
exames confirmatórios. A criança B, por
sua vez, possui moderada probabilidade
de desenvolver reações alérgicas a
esse alimento, pois cerca de 40% dos
pacientes pediátricos com dermatite
atópica cursam com alergia alimentar.
Já na criança C, a alergia ao ovo é menos
provável com esse resultado de IgE
específica, o que ilustra a desvantagem
de realizar teste sem história consistente
de alergia.
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• Responsável técnico: Dr. Rui M. B. Maciel (CRM 16.266) • Editores científicos: Dra. Kaline Medeiros Costa Pereira, Dra. Barbara Gonçalves da Silva e
Dr. Marcelo Jenne Mimica • Editora executiva: Solange Arruda • Produção gráfica: Solange Mattenhauer Candido • Impressão: Leograf
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