REDE JURIS www.redejuris.com APOSTILA DE DIREITOS HUMANOS PROF. BRUNO PONTES Proibida a reprodução total ou parcial do conteúdo da apostila, sem autorização do autor – Lei 9610/98. DIREITOS HUMANOS 1. Conceito e considerações preliminares. Apesar de direitos humanos ainda estar em formação1, existem basicamente dois conceitos de direitos humanos, um amplo e outro estrito. O amplo está relacionado com a figura humana e que tem conexão com o direito natural (vida, liberdade e justiça – dar a cada um o que é seu). O sentido estrito vai além, porque não basta se correlacionar com o direito natural, havendo necessidade de estar positivado em tratados e convenções internacionais. Por outro lado, se forem incorporados no ordenamento jurídico interno de determinado país, passam a ser chamados de direitos fundamentais2. Assim, direitos humanos são aqueles que surgem em função da figura humana, conexos aos direitos naturais e positivados em tratados ou convenções internacionais, que visam efetivar a dignidade da pessoa humana3. O núcleo do conceito de Direitos Humanos está na dignidade da pessoa humana, que expressa um sistema de valores e orienta toda a ordem jurídica. A expressão “direitos humanos” é moderna, mas o princípio invocado é antigo como a própria humanidade, porque são fundamentais na medida em que, sem eles, a pessoa humana não consegue existir, se desenvolver e participar da vida em sociedade. 2. Concepções Para a concepção jusnaturalista, os direitos fundamentais do homem são imperativos do direito natural, e existem antes mesmo da estruturação estatal. Não haveria, então, nem mesmo necessidade de previsão positiva, porque os direitos não podem ser negados, já que são inerentes à natureza humana. Esta concepção, como se vê, está presente no Direito e na Filosofia, e serviu para combater o Estado absolutista e fundamentar revoluções, em especial para modificar o “status quo”. A concepção positivista, pelo contrário, entende que os direitos do homem são faculdades concedidas pela lei, e não pela natureza das coisas. Não havendo previsão no direito positivo, ter-se-á expectativa de direito, e não direito em si. A concepção idealista, por seu turno, entende que os direitos do homem são ideias abstratas, que nascem do imaginário e que vão sendo absorvidas pela realidade ao longo do tempo. Já para a concepção realista, os direitos do homem não nascem do imaginário e nem são absorvidos com o tempo de maneira natural. Muito ao contrário, os direitos fundamentais do homem são resultados reais das lutas sociais e políticas travadas na história. Para se chegar a eles, quase sempre há um rasto de sangue e muita luta por trás. A concepção liberal, que trata os direitos humanos como liberdades fundamentais, porque a liberdade é que dá força e possibilita modificar, inclusive, a natureza das coisas, porque os seres humanos podem, então, se associar, se reunir e lutar. Os direitos humanos estariam vocacionados para preservar a autonomia da vida do homem. A concepção histórico-crítica vincula fortemente os direitos humanos à sua característica de historicidade, porque estes seriam construções históricas marcadas por contradições, condições e nuanças da realidade social, política, econômica e cultural. 1 É comum a afirmação que o conceito de direitos humanos é, a um só tempo, polissêmico (porque não há um sentido único, mesmo diante do consenso estabelecido na Convenção de Viena), controverso (porque sempre gera debates polêmicos sobre a extensão, até em face da mutação constante do direito internacional e do desenvolvimento do tema) e estruturante (porque avança sobre as bases lógicas, naturais e fundamentais do ser humano enquanto tal). 2 Veja que a Constituição de 1988 fala em Direitos e Garantias Fundamentais no Título II, referentes àqueles reconhecidos na CF/88, e como princípio das relações internacionais, coloca a prevalência dos “direitos humanos”, justamente em referência àqueles universalmente aceitos, indicando a necessidade da nossa República incorporá-los. 3 É comum diferenciar direitos fundamentais, direitos humanos e direitos de personalidade/naturais. Os direitos naturais decorreriam da razão e seriam válidos em todos os momentos e locais; os direitos humanos seriam válidos em toda parte a partir de determinado momento; os direitos fundamentais valeriam em um determinado momento, porém em determinados locais. 3. Características 3.1. Imprescritibilidade. Os direitos humanos não prescrevem. Interessante lembrar que na CF/88 a imprescritibilidade é a regra, sendo imprescritíveis o racismo e a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (art. 5º, XLII, XLIV). Existe discussão para saber se estes rol constitucional de imprescritibilidade é taxativo ou exemplificativo: a doutrina majoritária entende que é exemplificativo, possibilitando inclusão de outros crimes imprescritíveis, desde que para proteção da pessoa humana, como ocorre no Estatuto de Roma (criação do TPI), uma vez que seus arts. 5º e 29 preveem a imprescritibilidade dos crimes de genocídio, contra a humanidade, de guerra e agressão – este ainda não regulamentado. 3.2. Efetividade. O reconhecimento não basta. Somente a positivação não significa que os direitos humanos estão sendo respeitados, daí porque se exige a real aplicação na prática no território nacional. Caso o Estado partícipe não conseguir efetivar os direitos humanos (no caso, fundamentais), existem garantias como o “habeas corpus”. A efetividade realça a dimensão objetiva dos direitos fundamentais, porque é uma garantia de estabilidade dos mesmos no ordenamento jurídico e ainda impõe ao Estado a criação de planejamentos e procedimentos para sua efetivação para toda a sociedade. 3.3. Irrenunciabilidade. Não podem ser abdicados ou negociados, porque fazem parte da própria existência do ser humano. Pode deixar de ser exercido, mas seu titular não pode dispor dos mesmos de forma definitiva (não se pode exigir que um doente em estado terminal aceite a eutanásia). É costume dizer que a irrenunciabilidade não é absoluta, porque em alguns casos é possível renunciar algum direito fundamental, como é o caso de renunciar à integridade física, para fazer doação de rim para parente (vide Lei 9434/97, que trata da doação de órgãos, tecidos e partes do corpo humano), ou de fixar cláusula contratual para limitar a liberdade de expressão, para que o funcionário não divulgue segredo industrial da empresa em que trabalhou. A irrenunciabilidade, diferentemente da inviolabilidade, visa a proteção do próprio titular do direito fundamental, e não está previsto explicitamente na Constituição; a inviolabilidade, por seu turno, está prevista na Constituição e protege o indivíduo contra terceiros. 3.4. Inalienabilidade. A alienação também está vedada (não são disponíveis como se fosse um patrimônio qualquer). 3.5. Historicidade. Se por trás de cada direito há um rastro, senão de sangue, pelo menos de luta, é evidente que o direito fundamental é um direito histórico; 3.6. Relatividade. Nada na vida é absoluto. O direito, mesmo o fundamental, também não é e nem pode ser absoluto, porque é preciso, em vários casos, limitá-lo, mesmo em se tratando de um direito fundamental. O direito fundamental da liberdade, por exemplo, pode ser limitado, a bem da sociedade. Alguns entendem que o direito de não ser torturado e de não sofrer penas cruéis, e o direito de não ser reduzido à condição análoga de escravo, seriam direitos fundamentais absolutos. 3.7. Proibição do retrocesso. Se o direito fundamental foi conquistado, não pode mais ser extirpado4. Por exemplo: se o direito fundamental contido em uma norma constitucional de eficácia limitada foi regulamentado, não pode uma regulamentação posterior acabar com o direito concretizado pela norma anterior. Para quem leva esta proibição do retrocesso às últimas consequências, entende que nem mesmo uma nova Constituição poderá acabar com os direitos fundamentais, porque os direitos naturais seriam limites ao poder constituinte 4 O art. 4º da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto São José da Costa Rica, de 22.11.1969, aprovado pelo Congresso pelo Decreto-Legislativo 27, de 25.09.1992 e promulgado pelo Decreto 678, de 06.11.1992), no art. 4º, item 3, diz que: “Não se pode restabelecer a pena de morte nos Estados que a hajam abolido”. Consta, portanto, no Brasil, como norma supralegal, esta expressa disposição a respeito da proibição do retrocesso, em matéria de pena de morte. originário (neste caso, o poder constituinte teria natureza jurídica jusnaturalista, e não normativista, como entende a maioria). 3.8. Interdependência. Não há choque irremediável entre os direitos fundamentais, porque eles devem se relacionar permanentemente para atingirem suas finalidades. 3.9. Complementaridade. A interpretação de um direito fundamental deve levar em conta os outros direitos fundamentais. Não se interpreta um direito fundamental isoladamente. 3.10. Inviolabilidade. Não pode ser tolerada violação dos direitos humanos, seja pela lei, pela autoridade ou pelo poder, órgão ou entidade pública, sob pena de responsabilização civil, administrativa e criminal. Inviolabilidade, como se viu, existe para proteção contra terceiros, e irrenunciabilidade para proteção contra o próprio titular. 3.11. Universalidade e indivisibilidade. Os direitos humanos/fundamentais nascem para todos os homens, independentemente de raça, nacionalidade, sexo, credo ou convicção político ou filosófica. A Declaração de Direitos Humanos de Viena, de 1993, no item 5, diz que “Todos os direitos humanos são universais, indivisíveis interdependentes e inter-relacionados. A comunidade internacional deve tratar os direitos humanos de forma global, justa e equitativa, em pé de igualdade e com a mesma ênfase. Embora particularidades nacionais e regionais devam ser levadas em consideração, assim como diversos contextos históricos, culturais e religiosos, é dever dos Estados promover e proteger todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, sejam quais forem seus sistemas políticos, econômicos e culturais.” Ainda se fala em exigibilidade e justiciabilidade. A exigibilidade seria o reconhecimento de que cada cidadão tem a possibilidade de demandar a satisfação de seus direitos humanos, cabendo ao Estado e à própria sociedade, oferecer condições para sua efetivação. A justiciabilidade, por sua vez, imporia o reconhecimento de que os direitos humanos, por serem justiciáveis, podem ser demandados judicialmente caso não sejam realizados, especialmente nos dias atuais em que, em face do neoconstitucionalismo e do pós-positivismo, o Direito se aproxima da Ética, há aumento da jurisdição constitucional e o Judiciário é cada dia mais proativo. Questões de concursos 01) Prova: NUCEPE - 2012 - PM-PI - Agente de Polícia - Sargento Em relação ao conceito dos Direitos Humanos, identifique com V as alternativas VERDADEIRAS e F, as FALSAS e marque, em seguida, a sequência CORRETA. ( ) O núcleo do conceito de Direitos Humanos se encontra no reconhecimento da dignidade da pessoa humana. Essa dignidade expressa num sistema de valores, exerce uma função orientadora sobre a ordem jurídica porquanto estabelece “o bom e o justo” para o homem. ( ) Direitos Humanos é uma expressão moderna, mas o princípio que invoca é tão antigo quanto a própria humanidade. É que determinados direitos e liberdades são fundamentais para a existência humana. ( ) Os Direitos Humanos surgiram a partir do século XX, e devem ser utilizados apenas nos países democráticos. ( ) Os Direitos Humanos são considerados fundamentais porque sem eles a pessoa humana não consegue existir ou não é capaz de se desenvolver e de participar plenamente da vida. ( ) Os Direitos Humanos devem privilegiar apenas a parcela da população mais carente, fato que justifica sua própria existência. a) V, V, F, V, F; b) V, V, V, V, V; c) V, V, F, F, V; d) F, F, V, F, V; e) V, V, F, F, F 4. Natureza e classificação Existe uma classificação positiva pela CF/88, em relação aos direitos fundamentais, e várias classificações doutrinárias. No Título II (Dos Direitos e Garantias Fundamentais), a Constituição de 1988 classifica os direitos fundamentais em 05 capítulos: a) Capítulo I – dos direitos e deveres individuais e coletivos; b) Capítulo II – dos direitos sociais; c) Capítulo III – da nacionalidade; d) Capítulo IV – dos direitos políticos; e) Capítulo V – dos partidos políticos. Cada doutrinador, entretanto, costuma fazer sua própria classificação, daí a dificuldade em se adotar esta ou aquela, até porque nenhuma ganhou, ao longo do tempo, um destaque maior. Por isso, a seguir serão destacadas aquelas mais importantes e didáticas. Classificação de José Carlos Vieira de Andrade: 01) Direitos fundamentais de defesa: caráter negativo, porque exige uma abstenção do Estado (Constituição-garantia), para que ele não se intrometa arbitrária e despropositadamente na autonomia do homem, respeitando, assim, as liberdades públicas; 02) Direitos fundamentais de prestação: caráter positivo, porque exige uma prestação do Estado para o homem atingir a felicidade (Constituição-dirigente). O Estado tem o dever de agir para interferir na sociedade, quando isto for necessário para proteger os bens jurídicos, seja pela intervenção indireta ou jurídica, como na expedição de normas, seja pela intervenção direta ou material, pela intervenção policial ou pela prestação direta das necessidades básicas de saúde, educação e segurança; 03) Direitos fundamentais de participação – direito do cidadão de participar na governança da coisa pública. Outra classificação bastante difundida é aquela que os classifica em gerações (a doutrina está evoluindo para abandonar a expressão “gerações”, substituindo por “dimensões”, justamente para evitar a falsa impressão de que uma geração substui a outra, quando na verdade a completa). De toda forma, seriam 04 gerações/dimensões: 01 - Direitos fundamentais de 1ª geração (liberdade) - Surgidos influenciados pelas revoluções burguesas do final do século XVIII, especialmente aquelas ocorridas nos Estados Unidos e na França, são conhecidos como direitos civis e políticos. Ligados à liberdade, surgiram em oposição ao Estado para limitar seus poderes absolutos. Exigia do Estado uma abstenção, daí o caráter negativo, próprio das constituições garantia (ou constituições quadro). Seu titular é o indivíduo, e são conhecidos como direitos negativos, ou direitos de defesa. Exemplos: liberdades físicas, liberdades de expressão, liberdades de consciência, direitos de propriedade privada, direitos da pessoa acusada e as garantias de direitos (“habeas corpus”, mandado de segurança, mandado de injunção, “habeas data”); 02 - Direitos fundamentais de 2ª geração (igualdade). Surgidos no século XX, estão ligados à igualdade, já que se referem aos direitos sociais, econômicos e culturais conquistados pela luta do proletariado (saúde, educação, segurança, habitação, cultura, esporte etc.). Visam a igualdade material (na lei). Têm caráter positivo, porque exigem uma prestação do Estado, e não só uma abstenção, para que sejam reduzidas as desigualdades, próprios das constituições dirigentes. Seu titular é a coletividade. São conhecidos como direitos positivos ou direitos de prestação. Exemplos: art. 6º da Constituição de 1988: “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. O Título VIII da Constituição de 1988 (Da Ordem Social), prevê as seguintes categorias de direitos: Seguridade Social (Saúde, Previdência Social e Assistência Social), Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia, Comunicação Social, Meio Ambiente, Família, Criança, Adolescente, Jovem, Idoso, Índios. Entretanto, os direitos relacionados à Comunicação Social e ao Meio Ambiente se inserem nos direitos fundamentais de 3ª geração; 03 - Direitos fundamentais de 3º geração (fraternidade). A consciência de que o mundo, cada vez mais, estava se dividindo até perigosamente entre nações desenvolvidas e nações subdesenvolvidas, surge a consciência de que o mundo precisa de solidariedade, de fraternidade. Daí porque os principais direitos de 3ª geração são os direitos ao desenvolvimento, a paz, o meio ambiente, a autodeterminação dos povos, à comunicação, ao patrimônio comum e histórico da humanidade. Seu titular é o gênero humano. Exemplos: Direito ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente, à autodeterminação dos povos, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade. 04 - Direitos fundamentais de 4ª geração. São direitos relacionados ao futuro da sociedade, com o futuro da própria cidadania, como é o caso do direito à democracia, à informação e ao pluralismo, além das questões éticas relacionadas com a biotecnologia (engenharia genética), ainda um campo sem fronteiras seguras. Referem-se à possibilidade de regulamentação jurídica da globalização política. Se a sociedade, um dia, ter como um grande problema o lixo ou a espionagem espacial, ou ainda com a clonagem humana, que interferirá no conteúdo das informações, na restrição da utilização da Internet e na característica básica do ser humano? Neste sentido, o julgamento da ADI sobre células tronco embrionárias seria um caso em que esta dimensão foi analisada pelo STF. Paulo Bonavides prefere incluir na quarta dimensão a democracia, pluralismo, informação. Coloca a paz como quarta dimensão, para outros, seria incluída na terceira dimensão. Paulo Bonavidades considera o Direito à Paz como um direito fundamental de 5ª geração. Questões de concurso 02)Prova: CESPE - 2012 - PM-AL - Oficial Combatente da Polícia Militar Com relação ao conceito, à evolução e à abrangência dos direitos humanos, assinale a opção correta. a) Os chamados direitos de solidariedade correspondem, no plano dos direitos fundamentais, aos direitos de segunda geração, que se identificam com as liberdades concretas, acentuando o princípio da igualdade; b) No século XX, inaugurou-se uma nova fase no sistema de proteção dos direitos fundamentais, na medida em que foi nele que os Estados passaram a acolher as declarações de direitos em suas Constituições; c) A individualidade é uma das características dos direitos humanos fundamentais, e, nesse sentido, eles são dirigidos a cada ser humano isoladamente considerado, o que se justifica em razão das diferenças de nacionalidade, sexo, raça, credo ou convicção político-filosófica; d) Os direitos fundamentais são os direitos humanos reconhecidos como tais pelas autoridades às quais se atribui o poder político de editar normas, tanto no interior dos Estados quanto no plano internacional; são, assim, os direitos humanos positivados nas Constituições, nas leis, nos tratados internacionais; e) Com o fim da Primeira Guerra Mundial, a estrutura do direito internacional dos direitos humanos começou a se consolidar. A essa época, os direitos humanos tornaram-se uma legítima preocupação internacional e, então, foram criados mecanismos institucionais e de instrumentos que levaram tais direitos a ocupar um espaço central na agenda das organizações internacionais. 5. Evolução dos direitos humanos A doutrina costuma dividir a evolução dos direitos humanos de duas formas. A primeira, em períodos axial, do cristianismo, do iluminismo e do período do pós-guerra, além de referência aos documentos históricos. A segunda segue a divisão clássica da história, em Idade Antiga, Média, Moderna e Contemporânea, que é a divisão mais seguida. Assim, temos a primeira divisão: Período axial (600 a 480 a.C). Grandes princípios e diretrizes fundamentais da vida (Buda, Confúcio, Pitágoras, Isaías), quando então surge a filosofia, com grande importância para o saber racional em detrimento do saber mitológico. Isto propiciou um grande salto para a igualdade; Período do Cristianismo. Este período trouxe grande conquista aos direitos humanos porque propagou a igualdade entre os seres humanos no plano divino (todos são filhos de Deus). Não se pode esquecer, porém, que houve continuidade da escravidão e da inferioridade da mulher, dentre outros tantos problemas, como foi o caso da Inquisição. Como o cristianismo valorizou o homem, acabou ajudando, em alguma medida, para as políticas de conteúdo econômico e social; Período do Iluminismo. A fé na ciência e na razão foi um salto na humanidade, propagadas pelo Iluminismo, inclusive incentivando decisivamente os direitos naturais e a Revolução Francesa (igualdade, liberdade, fraternidade). Período Pós-2ª Guerra. Depois dos horrores da 2ª Guerra Mundial é que a sociedade definitivamente acordou para a necessidade de proteção dos direitos humanos. Houve, então, criação da ONU, a Declaração dos Direitos do Homem de 1948 e outros tantos documentos internacionais, que acabaram significando outro período. Documentos remotos e históricos. Importante citar, nesta evolução, os principais documentos de força e entusiasmo internacional, que protegeram, em boa medida, os direitos humanos: Magna Carta de 1215; Petition of Rights de 1628; Habeas Corpus Act de 1679; Bill of Rights de 1689; Declaração de Direitos do Estado da Virgínia de 1776; Declaração de Independência dos EUA e Constituição de 1787; Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão da França de 1789; Constituição do México de 1917; Constituição de Weimar de 1919; Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. No Brasil, a Constituição de 1988 e os chamados Planos Nacionais de Direitos Humanos: PNDH1 (1996); PNDH2 (2002); PNDH3 (2009) Na segunda divisão, mais aceita, temos: Idade Antiga (4000 a.C até 476 d.C, quando da tomada do Império Romano pelos povos bárbaros). Neste período, não havia previsões normativas, e a regulação se baseava praticamente na justiça privada, com desproporção e injustiça. Poucas normas surgiram neste período, podendo ser citados o Código de Manu, o Código de Hamurabi e a Lei das 12 Tábuas. O Código de Hamurabi5 se notabilizou pela lei do talião (“olho por olho e dente por dente”6), mas tratava as pessoas com desproporcionalidade e ainda considerando três classes sociais de pessoas: 1ª classe mais alta (“awelum”): punição com patrimônio e sem sanções cruéis; 2ª classe intermediária (“mushkenum”): as vezes com penas cruéis, mas também punição com retirada do patrimônio; 3ª classe (“wardum”, ou bárbaros”: tinham direito à propriedade, mas a regra eram penas cruéis, difamantes e de morte7. Leis das 12 Tábuas8: regulava a vida do povo romano e tinha por base o princípio da igualdade, para tratamento igual de todos, ao contrário do Código de Hamurabi. 5 O Código de Hamurabi, de aproximadamente 1700 a.C., foi uma necessidade para a sociedade da época, porque unificou os reinos sumérios e consagrando o primeiro imperador mesopotâmico (Rei Dhammu-rabi). Assim, eram necessárias regras de condutas unificadas para o império, o que acabou por ratificar a figura estatal conhecida na época e ainda trazer a noção de segurança e prévia definição de condutas. Estas regras de conduta estavam inseridas na pedra (estela em diorito), com 21 colunas e 282 cláusulas. 6 A lei do talião estava espalhada por todo o Código de Hamurabi, mas especialmente nos artigos 196 (“Se um homem arrancar o olho de outro homem, o olho do primeiro deverá ser arrancado - Olho por olho”) e 200 (“Se um homem quebrar o dente de um seu igual, o dente deste homem também deverá ser quebrado - Dente por dente”. A parte criminal (“lex talionis”) atingia inclusive os filhos dos causadores dos danos. No entanto, o Código também regulava o comércio (com importância especial para o caixeiro viajante), a família (inclusive prevendo divórcio, pátrio poder, adoção, adultério e o incesto), o trabalho (indicativo de salário mínimo, categorias profissionais e leis trabalhistas básicas) e a propriedade (inclusive o escravo tinha direito à propriedade). 7 O tratamento punitivo diferenciado entre as classes ficava bem evidente nas seguintes passagens: “198. Se ele arrancar o olho de um homem livre, ou quebrar o osso de um homem livre, ele deverá pagar uma mina em ouro”; “199. Se ele arrancar o olho do escravo de outrem, ou quebrar o osso do escravo de outrem, ele deve pagar metade do valor do escravo.” “201. Se ele quebrar o dente de um homem livre, ele deverá pagar 1/3 de uma mina em ouro. 202. Se alguém bater no corpo de um homem de posição superior, então este alguém deve receber 60 chicotadas em público”. 8 A Lei das Doze Tábuas, ou “Leis das Doze Tábuas” (Lex Duodecim Tabularum), deu origem ao Direito Romano, e organizava o procedimento judicial, estipulava normas conta os inadimplentes, pátrio poder, sucessões e tutela, propriedade, servidões e previa os delitos, e ainda tratava de normas atinentes ao Direito Público e Sagrado. Isto serviu para evitar a surpresa para os plebeus, que costumavam ser punidos sem saber o motivo, daí porque fixadas em 12 tabletes de madeira e colocados à frente do Fórum Romano, para todos lerem. Assim, foi formado um grupo de dez grandes homens (“decenvirato”), para redigir o projeto do Código, realizado o trabalho no período de 451 a 450 a.C., com promulgação em Idade Média (iniciada com a queda do Império Romano, 476 d.C, e termina com a transição para a Idade Moderna, por volta de 1453 d.C). Apesar do período obscuro, com Inquisição, houve significativa evolução na proteção dos direitos humanos, com o surgimento da Magna Carta de 1215, do Rei João Sem Terra. Neste documento, o Rei começava a ser restringido, algo inusitado para a época, inclusive com previsão de “habeas corpus”, do direito de propriedade, do devido processo legal, da proporcionalidade, da proibição dos tributos com efeito de confisco. Idade Moderna (período que vai de 1453, com a tomada de Constantinopla pelos Turco Otomanos, até 1789, com a Revolução Francesa). Surgiu o chamado “Tratado de Vestfália” (ou Paz de Vestfália ou ainda Tratados de Münster e Osnabrück), conjunto de acordos internacionais celebrados em 1648 para encerrar a Guerra dos Trinta Anos, série de guerras entre nações na primeira metade do Século XV, especialmente motivadas por rivalidades religiosas e territoriais. O Tratado, então, fez surgir a concepção do Estado moderno, com elementos objetivos (povo, território e governo soberano) e subjetivos (reconhecimento da sua existência) e, consequentemente, um sistema internacional à vista das soberanias estatais. A soberania, neste tratado, surge como algo novo, capaz de propiciar a paz entre os povos, porque a hierarquia religiosa foi afastada, gerando aquietação territorial nas regiões, respeito e desenvolvimento dos povos. Também nesta Idade Moderna é que surgiram na Inglaterra a Petition of Rights, de 1628, que requeria direitos e liberdades para os súditos do Rei e ainda estabelecia, expressamente, que os impostos só poderiam ser cobrados com o consentimento do Parlamento, que não poderia haver prisão sem justa causa apresentada e que a lei marcial (restrição dos direitos) não poderia ser utilizada em tempo de paz; o Bill of Rights, de 1689, que repetia os direitos protegidos pela Magna Carta de 1215 e previa independência do Parlamento e, assim, a divisão dos poderes; o “Habeas Corpus Act”, de 1679, lei do Parlamento criada durante o reinado de Rei Charles II, e reforçava o já existente “habeas corpus” como garantia da liberdade individual contra prisão ilegal, abusiva ou arbitrária; o “Act of Settlement”, de 1701, que estabeleceu procedimentos e garantias para sucessão protestante do trono inglês e o poder do Parlamento, e ainda reafirmou que os governantes se submetiam ao princípio da legalidade, independência e autonomia dos órgãos jurisdicionais, inclusive acima da vontade da Coroa, além da responsabilidade política dos agentes políticos e possibilidade de “impeachment”. Nos EUA, digno de nota foi o surgimento da Declaração de Direitos do Bom Povo de Virgínia, de 16 de junho de 1776 (antes mesmo da Declaração da Independência dos EUA, de 04 de julho de 1776, e da sua Constituição, de 17 de setembro de 1787), estabelecendo que todo poder emana do povo, que em seu nome deve ser exercido, reconhecendo que todo ser humano tem direitos fundamentais, como a igualdade, a liberdade, os direitos inatos, a previsão e a separação dos poderes executivo, legislativo e judiciário etc. Idade Contemporânea9 (período iniciado com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, surgido na França em 1789, influenciado pela Revolução Francesa e pela Declaração dos Direitos do Povo da Virgínea, de 1776, até o presente momento). Esta Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão foi baseada no direito natural, e estabelece o Estado laico, o princípio da legalidade, da anterioridade e da presunção da inocência. Insere-se neste período contemporâneo, as Emendas à Constituição dos EUA, de 1791, que constituíram as 10 primeiras emendas como “Bill of Rights” norte-americana, com ratificação por três quartos dos estados, prevendo vários direitos fundamentais, como liberdade religiosa e proibição de estabelecimento oficial de religião, direito à vida, devido processo legal, imparcialidade dos julgamentos,. Logo depois das Revoluções Americana (1776-1783) e Francesa (1789-1799), 452 a.C. Posteriormente, no Século VI, o imperador Justiniano, ao assumir o poder, quis salvaguardar a herança do Direito Romano e organizar a legislação, e assim determinou a compilação e a codificação das principais leis, perfazendo então o chamado Corpus Juris Civilis. 9 Entretanto, a concepção contemporânea de direitos humanos surgiu após a 2ª Guerra Mundial. inúmeras constituições, além da Americana de 1789 e da Francesa de 1791, consagraram o constitucionalismo, com tentativas de limitar e separar os poderes e ainda prever direitos fundamentais, como foi o caso da Constituição da Espanha de 1812, de Portugal de 1822, do Brasil de 1824, da Bélgica de 1831. Depois, já no Século XX, merece destaque a Constituição Mexicana de 1917 e a Alemã, de 1919 (Constituição de Weimar), que, em meio à 1ª Guerra Mundial e logo depois do Tratado de Versalhes10, elegeram os direitos trabalhistas e previdenciários à condição de direitos fundamentais11. Foi neste Século, logo depois da 2ª Guerra Mundial, que surgiu a ONU, em 1945, além de inúmeros tratados internacionais e a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, com três dimensões: liberdades públicas, direitos econômicos e sociais e fraternidade/solidariedade, porém apenas como recomendação, sem força normativa de tratado; o Pacto Internacional de Direitos Internacional de Civis e Políticos, de 1966, e o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Culturais e Sociais, também de 1966. 6. Princípio da máxima efetividade (eficiência ou interpretação efetiva) A Constituição de 1988 diz, claramente, que “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata” (§1º do art. 5º). Isto não quer dizer que a dignidade humana será sempre respeitada, que o detento não sofrerá nas prisões e que ninguém passará fome. Sendo isto inconteste, a doutrina adotou o princípio da máxime efetividade, ao entender que o § 1º deve ser entendido como uma norma principiológica, influenciando o intérprete a atribuir aos direitos fundamentais um sentido que, em cada caso, tenha a maior efetividade possível. Este §1º não pode servir para a incorreta conclusão de que todos os direitos fundamentais têm eficácia plena, porque aplicabilidade imediata não se confunde com os graus de eficácia, vistos oportunamente. Daí porque este princípio da máxima efetividade, para os direitos fundamentais, significa que o intérprete e o aplicador deverá expandir o máximo possível estes direitos, sempre que for possível. 7. Teorias monista e dualista Estas duas teorias analisam a relação de ordenamentos jurídicos existentes no mundo. Monismo é, segundo nossos dicionários, o “sistema filosófico que, por oposição ao dualismo ou ao pluralismo, admite que tudo, no Universo, é redutível a uma única realidade ou substância.” Esta concepção, quando levada para o campo jurídico, entende que todos os ordenamentos jurídicos do mundo são redutíveis a um só. A teoria monista, então, defende que tanto o Direito Internacional quanto o Direito Interno de cada país constituem um só ordenamento jurídico, que é a origem tanto das normas internacionais quanto das nacionais, daí porque os tratados internacionais sobre direitos humanos não precisariam ser incorporados ao sistema jurídico nacional, até porque “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata” (art. 5º, §1º). É o entendimento de Hans Kelsen, conforme se depreende do seguinte trecho da “Teoria Pura do Direito”: "Se esta norma, que fundamenta os ordenamentos jurídicos de cada um dos Estados, é considerada como norma jurídica positiva - e é o caso, quando se concebe o direito internacional como superior a ordenamentos jurídicos estatais únicos, abrangendo esses ordenamentos de delegação - então a norma fundamental- no sentido específico aqui desenvolvido, de norma não estabelecida, mas apenas pressuposta- não mais se pode falar em ordenamentos jurídicos estatais únicos, mas apenas como base do direito internacional". O monismo ainda dá margem para uma cisão interna, quando envolve a questão da hierarquia das normas: se há origem comum das normas nacionais e internacionais, como se dá seu escalonamento? A primeira corrente entende que o Direito Interno tem supremacia, sendo o Direito Internacional desdobramento lógico; a segunda corrente entende que o Direito Internacional tem supremacia, daí porque o Direito Interno estará limitado pelas normas internacionais, não podendo contrapô-las; a terceira corrente, moderada, entende ambos se equivalem, e o eventual conflito deverá ser solucionado por critérios próprios, 10 O Tratado de Versalhes, assinado pelas potências europeias em 1919, pôs fim à 1ª Guerra Mundial, com imposição, à Alemanha, a responsabilidade por ter causado a guerra, com reparações às nações da Tríplice Entente (Reino Unido, França e Império Russo), o que acabou por impulsionar o surgimento do movimento ultranacionalista na Alemanha, liderado por Hitler (nazismo). 11 Também pode ser citada a Declaração dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado, de 12.01.1918, da União Soviética, e logo depois a Lei Fundamental Soviética, de 10.07.1918. Tida por muitos como autoritária por acabar com o direito de propriedade, proclamou o princípio da igualdade, independentemente de raça ou nacionalidade e o direito ao asilo contra perseguições políticas e religiosas, dentre outros. como o da revogação da lei mais antiga pela mais recente. Daí porque o monismo não defende que é impossível o conflito entre as normas nacionais (internas) e internacionais (externas). A teoria dualista, por sua vez, separa claramente o ordenamento jurídico internacional do nacional. O internacional (externo) seria a reunião dos tratados e das demais normas e critérios que regulam o relacionamento entre os países, e o nacional (interno) seria a reunião da Constituição e das demais leis do país (os dois ordenamentos regulam realidades próprias e distintas). Deste modo, a norma internacional só teria vigência no ordenamento nacional se este a recepcionasse, por compatibilidade, e a ratificasse, não podendo valer sem tal ratificação. E se o país descumprisse a norma internacional, não teria qualquer consequência interna, pois só poderia sofrer consequências em nível internacional. Portanto, independentemente do novo parágrafo 3º do art. 5º, a CF/88 adota a teoria dualista, até porque o acatamento dos tratados internacionais é ato jurídico complexo, já que precisam de referendum do Congresso Nacional e promulgação pelo Presidente da República, como vimos e como, aliás, entende o STF. O que ocorre, nos dias atuais, é cada vez mais uma aproximação com o monismo, no sentido de valorizar as normas internacionais, seja pelo estímulo para que os países adotem as regras internacionais, seja pela elevação de status das normas internacionais, quando elas entrarem no ordenamento nacional, como ocorreu com o §3º do art. 5º da nossa Constituição. Inclua-se também os fenômenos da Internet, da Globalização, dos Blocos Econômicos, da submissão ao Tribunal Penal Internacional, assim como a transformação da Europa por mecanismos uníssonos de relacionamento jurídico, político e social, como ocorre com a União Europeia, ganhando força, neste ponto, a interpretação do art. 5º, §2º, da CF/88, no sentido de que ali estaria uma mensagem clara de recepção automática de outros direitos e garantias decorrentes de tratados internacionais em que a República brasileira seja parte. Outro ponto importante é que algumas normas internacionais são absorvidas automaticamente pelo ordenamento jurídico interno dos países, inclusive no Brasil, como ocorre com os costumes e princípios gerais, que não precisam da internalização por meio de aprovação do Congresso, via Decreto-Legislativo, e posteriormente o ato final do Presidente da República, via Decreto Presidencial. É que este procedimento de internalização é destinado para os tratados internacionais, e não para as demais normas, como os costumes e os princípios gerais de direito, que são tratados como fontes do Direito Internacional, da mesma forma que os tratados (esta posição, inclusive, foi adotada pelo STF no RE 94.084, julgado em 12/03/1986). Lembre-se que o Estatuto da Corte Internacional de Justiça diz, no seu art. 38, que são fontes do direito internacional os tratados, os costumes e os princípios gerais de direito, e ainda faz referência à jurisprudência e à doutrina como meios auxiliares na determinação das regras jurídicas, inclusive com possibilidade de utilização da equidade. Assim, via de regra, a norma internacional não tem autoridade para, imediatamente, ser exigida no âmbito interno, mas os costumes e os princípios gerais seriam exceções, situação que ratificaria a adoção, neste ponto, da teoria monista no Brasil. Questões de concurso 03) Prova: FUMARC - 2011 - BDMG - Advogado Leia as assertivas abaixo e coloque à frente de cada um dos parênteses (F) se FALSA e (V) se for VERDADEIRA: ( ) Dois ordenamentos jurídicos distintos e totalmente independentes entre si – Dualismo. ( ) Uma ordem jurídica internacional e uma ordem jurídica interna – Monismo. ( ) Impossibilidade de conflito entre Direito Internacional e o Interno – Monismo. ( ) O Direito Internacional é que dirige a convivência entre os Estados, ao passo que o Direito interno disciplina as relações entre os indivíduos e entre estes e o ente estatal – Dualismo. Marque a alternativa CORRETA, na ordem de cima para baixo: a) V – F – V – V. b) V – F – F – V c) F – V – F – F. d) F – V – V – F. 04) Prova: CESPE - 2012 - ANAC - Analista Administrativo - Área 3 No que concerne ao direito internacional público, julgue os itens a seguir. De acordo com o dualismo, as normas de direito internacional e de direito interno existem separadamente e não afetam umas às outras. No Brasil, a teoria adotada é o monismo, de acordo com a qual há unidade do ordenamento jurídico, ora prevalecendo as normas de direito internacional sobre as de direito interno, ora prevalecendo estas sobre aquelas. 8. Sistemas normativos global, regional, geral e específico de proteção dos direitos humanos Desde a aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, foram desenvolvidos sistemas de proteção a tais direitos, especialmente internacionais. Por isso, já em 2010, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais contava com 160 Estados-artes; o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos contava com 165 Estados-partes; a Convenção sobre a Eliminação da Discriminação Racial, com 173 Estados-partes; a Convenção sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher, com 186; e a Convenção sobre os Direitos da Criança, com 193. “Formouse, então, um sistema global de proteção dos direitos humanos, no âmbito das Nações Unidas. Esse sistema normativo, por sua vez, é integrado por instrumentos de alcance geral (como os Pactos Internacionais de Direitos Civis e Políticos e de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966) e por instrumentos de alcance específico, como as Convenções Internacionais que buscam responder a determinadas violações de direitos humanos, como a tortura, a discriminação racial, a discriminação contra as mulheres, a violação dos direitos das crianças, dentre outras formas de violação” (Flávia Piovesan, Temas de Direitos Humanos, pp. 48/49). Portanto, o sistema global ora é geral (com abstração e generalidade, isto é, para todos sem distinção), ora é especial (relacionado ao sujeito do direito e especificidade e concreticidade, como criança, mulheres etc.), ambos complementares entre si, para integração, sempre na perspectiva de maior proteção possível dos direitos humanos. O sistema normativo regional de proteção “busca internacionalizar os direitos humanos no plano regional, em especial na Europa, América e África. Consolida-se, assim, a convivência do sistema global – integrado pelos instrumentos das Nações Unidas como a Declaração Universal de Direitos Humanos, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e as demais Convenções internacionais – com instrumentos do sistema regional, por sua vez integrados elos sistemas interamericano, europeu e africano de proteção aos direitos humanos” (Piovesan, op. Cit., p. 49). Veja, então, que os sistemas mundiais de proteção aos direitos humanos são: global (considerando a universalidade territorial); regional (para determinadas regiões, em especial Europa, América e África); geral (considerando que atinge todos os seres humanos, indistintamente); especial (destinados para determinadas categorias de pessoas, normalmente minoritárias, como deficientes, mulheres, crianças). Como lembra Piovesan, o Brasil começou a ser relacionar efetivamente com tais sistemas após o início da redemocratização, em 1985. O marco inicial deste processo de relacionamento se deu com a ratificação, em 1989, da Convenção contra Tortura e outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, iniciando inúmeros instrumentos internacionais, de que são exemplos: a) Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, de 20.07.1989 (aprovada pelo CN via Decreto Legislativo 05, de 31.05.1989 e promulgado pelo Presidente pelo Decreto 98.386, de 09.12.1989); b) Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, de 24.09.1989; c) Convenção sobre os Direitos da Criança, de 24.09.1990; d) pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, de 24.01.1992; e) pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 24.01.1992; f) Convenção Americana de Direitos Humanos, em 25.09.1992; g) Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, em 27.11.1995; h) Protocolo à Convenção Americana referente à Abolição da Pena de Mote, em 13.08.1996; i) Protocolo à Convenção Americana referente aos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Protocolo de San Salvador), em 21 de agosto de 1996; j) Convenção Interamericana para Eliminação de todas as formas de Discriminação contra Pessoas Portadoras de Deficiência, em 15.08.2001; k) Estatuto de Roma (TPI), de 20.06.2002; l) Protocolo Facultativo à Convenção sobre eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher, em 29.06.2002; m) Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança sobre o Envolvimento de Crianças em Conflitos Armados, de 27.01.2004; n) Protocolo Facultativo à Convenção contra a Tortura, de 11.01.2007; p) Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, de 01.08.2008; q) Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e segundo Protocolo visando Abolição da penal de Morte, em 25.09.2009. Em 2009, como visto, a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência foi aprovada, inclusive na forma do art. 5º, §3º, da CF (aprovado pelo Congresso pelo Decreto Legislativo 186, de 09.07.2008 e promulgado pelo Presidente pelo Decreto 6.949, de 25.08.2009). A mesma Piovesan elenca inúmeros direitos que, embora não previstos no âmbito nacional, encontram-se enunciados em tratados internacionais: a) direito de toda pessoa a um nível de vida adequado para si próprio e sua família, inclusive à alimentação, vestimenta e moradia, nos termos do art. 11 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais; b) proibição de qualquer propaganda em favor da guerra e proibição de qualquer apologia ao ódio nacional, racial ou religioso, que constitua incitamento à discriminação, á hostilidade ou á violê4ncia, em conformidade com o art. 20 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e art. 13 (5) da Convenção Americana; c) direito das minorias étnicas, religiosas ou linguísticas de ter sua própria vida cultural, professar e praticar sua própria religião e usar sua própria língua, nos termos do art. 27 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e art. 30 da Convenção sobre os Direitos da Criança; d) proibição do restabelecimento da pena de morte nos Estados que a hajam abolido, de acordo com o art. 4º (3) a Convenção Americana; e) Possibilidade de adoção pelos Estados de medidas, no âmbito social, econômico e cultural, que assegurem a adequada proteção de certos grupos raciais, no sentido de que a eles seja garantido o pleno exercício dos direitos humanos e liberdades fundamentais, em conformidade com o art. 1º (4) da Convenção sobre Eliminação de todas as formas de Discriminação Racial; f) possibilidade de adoção pelos Estados de medias temporárias e especiais que objetivem acelerar a igualdade de fato entre homens e mulheres, nos termos do art. 4º da Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a mulher; g) vedação da utilização de meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de ideias e opiniões, nos termos do art. 13 da Convenção Americana; h) direito ao duplo grau de jurisdição como garantia judicial mínima, nos termo dos arts. 8, h, e 25, §1º, da Convenção Americana; i) direito de o acusado ser ouvido, nos temo do art. 8º, §1º, da Convenção Americana12; j) direito de toda pessoa detida ou retida de ser julgada em prazo razoável ou ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo, nos termos do art. 7 (5) da Convenção Americana;13 k) proibição da extradição ou expulsão de pessoa a outro Estado quando houver fundadas razoes que poderá ser submetida à tortura ou a outro tratamento cruel, desumano ou degradante, nos termos do art. 3º da Convenção contra a Tortura e do art. 22, VIII, da Convenção Americana. Outro aspecto destacado pela autora citada, diz respeito ao preenchimento de lacunas internas pelos tratados internacionais, cuja transcrição segue: “O Direito Internacional dos Direitos Humanos ainda permite, em determinadas hipóteses, o preenchimento de lacunas apresentadas pelo Direito brasileiro. A título de exemplo, merece destaque decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal acerca da existência jurídica do crime de tortura 12 Atualmente, o art. 400 do CPP, com redação dada pela Lei 11719/08, obriga a ouvida do acusado ao final da instrução. A duração razoável do processo, como se sabe, foi incorporada na CF/88 pela EC 45/04 (art. 5º, LXXVIII). Antes desta EC 45/04, como se vê, já existia esta garantia em norma supralegal. 13 contra criança e adolescente, no HC 70.389-5 (São Paulo, Tribunal Pleno, 23-6-1994, rel. Min. Disney Sanches, relator para o acórdão Min. Celso de Mello),. Neste caso, o Supremo Tribunal Federal enfocou a norma constante do Estatuto da Criança e do Adolescente que estabelece como crime a prática de tortura contra criança e adolescente (art. 233 do Estatuto). A polêmica se instaurou dado o fato de essa norma consagra um ‘tipo penal aberto’, passível de complementação no que se refere à definição dos diversos meios de execução do delito de tortura. Nesse sentido, entendeu o Supremo Tribunal Federal que os instrumentos internacionais de direitos humanos – em particular, a Convenção de Nova York sobre os Direitos da Criança (1990), a Convenção contra a Tortura adotada pela Assembleia Geral da ONU (1984), a Convenção Interamericana contra a Tortura, concluída em Cartagena (1985), e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), formada no âmbito do OEA (1969) – permitem a integração da norma penal em aberto, a partir do reforço do universo conceitual relativo ao termo ‘tortura’. Note-se que apenas em 07 de abril de 1997 foi editada a Lei 9.455, que define o crime de tortura. Com esta decisão claramente demonstra, os instrumentos internacionais de direitos humanos podem integrar e complementar dispositivos normativos do Direito brasileiro, permitindo o reforço de direitos nacionalmente previstos – no caso, o direito de não ser submetido à tortura.” 9. O sistema interamericano de proteção dos direitos humanos Compreender este sistema regional é importante para compreensão do próprio ordenamento jurídico internacional, neste tema, e das possibilidades reais de proteção dos direitos humanos. A existência deste sistema regional14 parte do reconhecimento de que há uma desigualdade social de consolidação da própria democracia nos Estados da região, em especial pelas várias ditaduras que se instalaram na América do Sul nas décadas de 70 e 80 nestes países 15, com execuções, desaparecimentos, perseguições, prisões sem fundamento e torturas. Neste contexto, a Convenção Americana de Direitos Humanos, de 1969 (Pacto de São José da Costa Rica), trouxe grandes conquistas para a região, na defesa dos direitos humanos, entrando em vigor em 1978, após alcançar o mínimo de 11 ratificações. Como se verá á frente, assegura direitos civis e políticos, mesmo priorizando os chamados direitos fundamentais de 1ª geração (vida, não escravidão, personalidade etc.), tanto é verdade que somente em 1988 houve aprovação do protocolo adicional, de San Salvador, para incluir os direitos sociais, culturais e econômicos, omitidos originariamente. Além de prever os direitos humanos, a Convenção Americana estabeleceu um aparado de monitoramento, como é o caso da Comissão Interamericana de Direitos Humanos16, que fiscaliza seus 14 Na verdade, existe no continente americano tanto o subsistema da OEA, baseado no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos de 1966, quanto o subsistema que agora se trata, baseado na Convenção Americana de 1969. Por isso, um país pode fazer parte do subsistema da OEA, como os EUA, mas não fazer parte do segundo, mas todo Estado-parte do subsistema criado pela Convenção Americana necessariamente integra o primeiro. 15 O próprio “neoconstitucionalismo” iniciou-se mais intensamente na Europa depois da 2ª Guerra Mundial e só tardiamente chegou ao Brasil e na América Latina. Por isso, é comum a afirmação de que, enquanto o neoconstitucionalismo sempre valorizou a dimensão jurídica da Constituição Federal, o novo constitucionalismo democrático latino americano se preocupou mais com a legitimidade democrática e, assim, com mais mecanismos de participação popular, inclusive em face de ditaduras e regimes militares ao longo da história recente: no Brasil, de 1964 a 1985; na Argentina, de 1966 a 1973; no Peru, de 1968 a 1980; no Chile, de 1973 a 1990; no Uruguai, de 1973 a 1985; na Bolívia, de 1964 a 1982 etc.). Não foi por outro motivo que, em Viena, em 1993, após a Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, ficou clara a relação entre democracia e direitos humanos: constou no item 8 da “Declaração de Viena e Programa de Ação”, o seguinte: “A democracia, o desenvolvimento e o respeito aos direitos humanos e liberdades fundamentais são conceitos interdependentes que se reforçam mutuamente. A democracia se baseia na vontade livremente expressa pelo povo de determinar seus próprios sistemas políticos, econômicos, sociais e culturais e em sua plena participação em todos os aspectos de suas vidas. Nesse contexto, a promoção e proteção dos direitos humanos e liberdades fundamentais, em níveis nacional e internacional, devem ser universais e incondicionais. A comunidade internacional deve apoiar o fortalecimento e a promoção de democracia e o desenvolvimento e respeito aos direitos humanos e liberdades fundamentais no mundo inteiro.” 16 A Convenção Americana prevê, no art. 33, dois órgãos competentes para conhecer de assuntos relacionados ao cumprimento dos compromissos assumidos pelos Estados-partes: a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (com sede em San José da Costa Rica) e a Corte Interamericana de Direitos Humanos (com sede em Washington). A Comissão Interamericana já existia desde 1959, com a função de receber e examinar as reclamações de indivíduos contra violação de direitos humanos, mas foi ratificada somente com a Convenção, em 1969, depois que foram superados os debates sobre a conveniência política ou não de ser criado um arcabouço institucional de supervisão no continente. O modelo, portanto, é signatários, composta por 07 membros, eleitos pela Assembleia Geral depois de encaminhamento de listas pelos Estados, para mandatos de 04 anos, com apenas uma reeleição, mas precisam ser nacionais de qualquer Estado da OEA e ainda possuírem alta idoneidade moral e reconhecido saber em matéria de direitos humanos (cada Estado pode propor até 03 nomes, e se assim o fizer, deve constar na lista pelo menos um nome que não seja seu nacional). A principal missão é fazer recomendações aos governos, a respeito da proteção de direitos humanos, mas também divulga estudos e relatórios, busca informações aos Estados mediante solicitação e submete, anualmente, um relatório à Assembleia Geral da OEA, já que deve estimular a consciência dos direitos humanos nos povos da América. Importante atribuição da Comissão está no recebimento de denúncias encaminhadas por indivíduos, grupos de indivíduos ou organizações não governamentais, mas a Comissão exige que, antes da denúncia ser conhecida, tenha se esgotado no âmbito interno todas as possibilidades de recurso ou, pelo menos, que haja uma infundada demora no andamento do processo, sem esquecer que a denúncia não terá andamento se houver uma litispendência internacional (isto é, quando o mesmo caso esteja sendo analisado por alguma instância internacional de proteção dos direitos humanos 17). A Comissão tem autoridade na medida em que os Estados, ao assinarem a Convenção, reconhecem as competências da Comissão e se compromete em auxiliá-la. Importante regulação da Convenção se dá no âmbito da Corte Interamericana. É que, se o caso não for resolvido no âmbito administrativo, depois da atuação da Comissão, haverá uma litigiosidade naquela Corte. Não havendo possibilidade de acordo entre o requerente e o Estado, no âmbito da Comissão, esta dará o prazo de 03 meses para solução do caso, de modo que, diferentemente das Cortes Europeias de Direitos Humanos, o indivíduo não tem o direito de acessar diretamente a Corte Interamericana, porque necessariamente deve passar pela Comissão, que tem a missão de iniciar o processo (início do processo na Corte pela Comissão ou pelo Estado-parte envolvido)18. A Corte, então, é o órgão jurisdicional do sistema regional, composta por 7 (sete) juízes eleitos pelos Estados partes da Convenção, pelo período de 6 (seis) anos, com uma única reeleição, nacionais de países membros da OEA19, com quórum sempre constituído no mínimo por 5 (cinco) juízes e participação da Comissão em todos os casos. Tanto os juízes da Corte quanto os membros da Comissão terão imunidades reconhecidas aos agentes diplomáticos desde o momento da eleição e enquanto durar o mandato, além de possuírem ampla proteção quanto aos votos e opiniões emitidos no exercício de suas funções (não pode haver responsabilidade dos mesmos), e perceberão honorários e despesas de viagem na forma e nas condições que determinarem os seus estatutos, “levando em conta a importância e a independência de suas funções” (art. 72 da Convenção). Os membros da Comissão poderão ser punidos, conforme o caso, pela Assembleia Geral da Organização, nos casos previstos nos respectivos estatutos, via resolução decidida por bifásico perante estes dois órgãos, que não são permanentes, na medida em que se reúnem em períodos pré-determinados de sessões ao longo do ano. 17 O art. 46 da Convenção diz que a petição ou comunicação será admitida se: a) forem i interpostos e esgotados os recursos da jurisdição interna, de acordo com os princípios de Direito Internacional geralmente reconhecidos, além da apresentação no prazo de seis meses, a partir da data em que o presumido prejudicado tenha sido notificado da decisão definitiva (salvo se na legislação interna do Estado não existir o devido processo legal para proteção, ou não tiver oportunidade de exercer direito aos recursos ou ficar impedido de esgotá-los ou, ainda, houver demora injustificada na decisão dos recursos); b) a matéria da petição ou comunicação não esteja pendente de outro processo de solução internacional; e c) a petição contiver o nome, a nacionalidade, a profissão, o domicílio e a assinatura da pessoa ou pessoas ou do representante legal da entidade que submeter a petição. A petição também precisa expor os fatos que caracterizam violação à Convenção e não repetir outra petição ou comunicação anterior à Comissão ou a outro organismo internacional. O processo e seu andamento, perante a Comissão, estão previstos nos arts. 48/51 da Convenção. 18 O art. 51-1, da Convenção Americana, diz que, se no prazo de 03 meses o assunto não for solucionado ou ainda não tiver sido submetido à Corte (submissão que se dá tanto pela Comissão quanto pelo Estado envolvido), a Comissão poderá emitir, pelo voto da maioria absoluta dos seus membros, sua opinião e conclusões sobre a questão. O art. 61-1, por sua vez, diz que “Somente os Estados-partes e a Comissão têm direito de submeter um caso à decisão da Corte”. 19 Se o Juiz for originário de um Estado que esteja envolvido em uma lide na Corte, não estará impedido ou suspeito, continuando com o direito de conhecer o caso. Porém, se houver mais de um Estado-parte envolvido na demanda, e apenas um deles tiver um juiz de sua origem, o outro Estado que não tem juiz poderá designar outra pessoa de sua escolha para fazer parte da Corte na condição de juiz “ad hoc”. Por outro lado, se a demanda envolver Estados-partes que não tenham juízes de suas nacionalidades, cada um poderá designar juízes “ad hoc”, sempre com os requisitos pertinentes aos demais (art. 55, 1, 2 e 3, da Convenção). dois terços dos votos dos Estados membros da Organização, e os juízes da Corte também poderão ser punidos, mas por dois terços dos votos dos Estados Pares na Convenção (art. 73). A Corte tem competência consultiva e contenciosa: a consultiva diz respeito à interpretação das disposições da Convenção Americana e contenciosa diz respeito à solução de conflitos acerca da interpretação da Convenção. Interessante anotar que qualquer membro da OEA, mesmo não sendo signatário da Convenção Americana, pode pedir à Corte pareceres consultivos em relação à proteção dos direitos humanos nos Estados americanos e, neste caso, pode emitir opiniões sobre a compatibilidade entre a legislação interna do Estado com os instrumentos internacionais, nos termos do art. 64-2 ( “controle de convencionalidade das leis”). No entanto, a função contenciosa da Corte Interamericana não recai sobre países que não fazem parte da Convenção: sua competência contenciosa, então, se limita aos Estados-partes que reconheçam a sua jurisdição. Esta competência contenciosa é iniciada pela Comissão, que faz um papel importante de filtragem e ainda impedindo, como se viu, que o indivíduo tenha acesso direto à Corte 20. A Corte não substitui os tribunais interno dos países, e nem serve de instância recursal: sua missão é conferir conformidade das obrigações internacionais dos Estados signatários, em matéria de direitos humanos, muito embora sua decisão tenha caráter vinculante e de cumprimento imediato por todos eles. O Brasil passou a ter atuação efetiva no sistema interamericano de direitos humanos a partir de 10 de dezembro 1998, ano do cinquentenário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, quando reconheceu a jurisdição obrigatória da Corte Interamericana. Lembre-se que, na década de 80, com o fim do governo militar e especialmente com o arrefecimento da Guerra Fria, o Brasil intensificou seu comprometimento com a proteção dos direitos humanos. Porém, a ratificação da Convenção Americana só ocorreu em 1992, depois da Constituição de 1988 e a elevação da prevalência dos direitos humanos como princípio da relação internacional (Art. 4º da CF/88). A defesa do Estado brasileiro, então, passou a ser uma grande necessidade, em especial diante do aumento significativo de casos perante a Comissão e da maior estruturação das organizações não-governamentais, ficando a cargo, tal tarefa, à Advocacia-Geral da União, junto com o Ministério das Relações Exteriores e a Secretaria Especial dos Direitos Humanos. A República Federativa do Brasil já se envolveu em alguns casos perante a Corte Interamericana, dos quais21 merecem destaques os seguintes: a) Irene Ximenes Lopes Miranda vs. Brasil. Neste caso, a Corte condenou o Estado brasileiro em 2006, em U$ 130.000,00, por violação do direito à integridade pessoal, à vida, à proteção judicial e às garantias judiciais, por conta do tratamento desumano e degradante a Damião Ximenes Lopes, doente mental, que veio a óbito em 1999 na Casa de Repouso Guararapes de Sobral/CE, instituição privada integrante do SUS, atualmente desativada pelo 20 Uma das principais críticas à Corte Interamericana é justamente este impedimento para o indivíduo iniciar sua jurisdição, ao contrário do que ocorre nas Corte Europeias. Por isso mesmo, a partir de 1996, houve inovação trazida pelo III Regulamento da Corte Interamericana de Direitos Humanos, porque ampliou a possibilidade de participação do indivíduo no processo: é que agora a vítima passou a ser autorizada, por meio de representantes e familiares, a fazer alegações de forma autônoma, inclusive apresentar provas, durante a etapa de discussão sobre as reparações devidas. Também com as alterações produzidas pelo IV Regulamento, é possível que as vítimas, seus representantes e familiares não só ofereçam suas próprias peças de argumentação e provas em todas as etapas do procedimento, como também podem fazer uso da palavra durante as audiências públicas celebradas, acabando por ratificar a condição de parte no desenvolvimento do processo, mesmo sem poder para iniciá-lo. 21 De 1998 até 2009 foram mais de 507 demandas apresentadas na Comissão Interamericana, envolvendo o Brasil, das quais 29 foram admitidas, inclusive com várias recomendações ao Brasil pela Comissão (O Estado de São Paulo, de 10.08.09, p. A6). Vide GOMES, Luiz Flávio. Aumenta procura por corte internacional: 507 demandas. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2262, 10 set. 2009. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/13476. Acesso em: 2 fev. 2014. Veja, por exemplo, a medida cautelar 383/2010 (MC-382-10) emitida pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, depois de acatar pedido do Movimento Xingu Vivo Para Sempre, solicitando ao governo brasileiro que suspendesse as obras da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, para que não se efetivasse risco de dano irreparável às comunidades atingidas. O governo brasileiro emitiu a Nota 142/2011, pelo Ministério das Relações Exteriores, argumentando que a medida cautelar era injustificável e precipitada. Esta Comissão acabou acatando pedido do Brasil e revogou a medida cautelar, passando apenas a recomendar proteção da vida, saúde, cultura e integridade dos membros das comunidades indígenas, se resguardando para análise do mérito final. Governo estadual (ficou comprovado que, depois de 4 dias da internação, o mesmo havia falecido com várias marcas de tortura). A irmã de Damião Ximenes, Irene Ximenes, junto com a ONG Justiça Global, acionaram a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Ceará, ocasião em que foi encaminhada para a Comissão Interamericana. O Estado brasileiro reconheceu o pedido quanto à violação do direito à vida e à integridade pessoal, assim como os fatos relacionados à morte de Damião Ximenes, os maus tratos e a falta de prevenção, mas não reconheceu os pedidos específicos de reparação, até porque tentara conciliação oferecendo pensão vitalícia à mãe da vítima, proposta recusada. Ficou comprovado que estava em trâmite, por mais de seis anos, ação civil de reparação de danos promovida pelos familiares da vítima, além da ação penal contra os acusados da sua morte (na condenação do Estado brasileiro, em 2006, as ações ainda não haviam sido julgadas, mesmo com a morte em 1999). Este caso foi paradigmático, especialmente para ratificar a proteção internacional dos direitos humanos, em particular dos pacientes psiquiátricos (a Corte nunca tinha julgado violação de direitos humanos de deficiente mental). Em 14 de agosto de 2007, decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi publicado, com autorização para que a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência (SEDH) pagasse a indenização em torno de R$ 250.000,00 aos familiares da vítima. b) Nogueira de Carvalho e outro vs. Brasil. Em 13.01.2005, a Comissão Interamericana submeteu à Corte Interamericana a demanda contra a República Federativa do Brasil, depois de quase 08 anos da denúncia, datada de 11.12.1997. O advogado Gilson Nogueira de Carvalho havia sido assassinado em 20.10.1996, e era defensor dos direitos humanos (fazia denúncia contra grupo de extermínio no Rio Grande do Norte supostamente integrado por policiais, e recebia constantes ameaças de morte, tendo por isso recebido proteção policial do Ministério da Justiça por mais de um ano). Assim, a Comissão solicitou à Corte pronunciamento sobre o episódio, em especial violações ocorridas após 10.12.1998 (data em que o Brasil reconheceu a jurisdição obrigatória da Corte), no sentido de ausência de diligências na investigação do crime e punição dos responsáveis, e também para adoção de determinadas medidas e reparação. O Inquérito Policial havia sido arquivado por decisão da 1ª Vara da Comarca de Macaíba/RN, e chegou a ser reaberto em 1998 em face de investigação particular realizada por particular, quando então houve indiciamento de policial civil aposentado, porém sem condenação criminal. Assim, depois de esgotar os recursos no ordenamento jurídico interno, os pais da vítima, por meio da ONG Justiça Global, levaram o caso à Comissão Interamericana. Porém, a Corte, suscitada pela Comissão, absolveu o Brasil e determinou, à unanimidade, arquivar o expediente em virtude do “limitado suporte fático” (questão que incrementou a ausência de provas foi o fato de que a Corte julgou apenas eventuais violações do Brasil para com os pais da vítima, ocorridas depois de 10.12.1998). Importante observar que, neste caso, o Brasil havia apresentado exceção de incompetência da Corte para conhecer o caso, porque havia ocorrido antes do reconhecimento da sua jurisdição obrigatória pelo Brasil, e também porque não teriam sido esgotados os recursos internos. A Corte, nestes pontos, reconheceu sua competência para conhecer de violações que teriam ocorrido posteriormente, por serem contínuas ou permanentes, mesmo sobre fato ocorrido antes de 10.12.1998 e, em relação ao esgotamento dos recursos, enfatizou que não procede porque caberia ao Brasil demonstrar quais recursos deveriam ter sido esgotados e que os mesmos seriam adequados e eficazes, o que não ocorreu. c) Escher e outros vs. Brasil. Em 20.12.2007, a Comissão Interamericana submeteu à Corte Interamericana uma demanda originada em 26.12.2000 pelas organizações Rede nacional de Advogados Populares e Justiça Global em nome dos membros das organizações Cooperativa Agrícola de Conciliação Avante Ltda. e Associação Comunitária de Trabalhadores Rurais, porque teriam ocorrido interceptações telefônicas e monitoramento ilegais no ano de 1999 pela Polícia Militar do Paraná, divulgação das conversas telefônicas e ausência de justiça e reparação adequadas, o que violaria as garantias judiciais, a proteção à honra, a liberdade de associação e a proteção judicial previstas na Convenção Americana. Neste caso, o Brasil alegou preliminarmente: a) o descumprimento dos prazos pelos representantes (rejeitado, por não constituir tema de exceção); b) a impossibilidade de alegar violações no decorrer do procedimento (rejeitado, por não ser a conduta contrária às disposições da Convenção Americana, além de verificar que o Brasil teve oportunidade de se manifestar e se defender); c) a falta de esgotamento dos recursos judiciais (o Brasil alegou que os representantes impetraram mandado de segurança, quando deveria ter impetrado “habeas corpus”, sendo ainda possível ação ordinária para declarar a ilegalidade da prova e destruição, mas não o fizeram, e ainda que a ação penal, com as gravações telefônicas, tramitou dentro do devido processo legal, inclusive com declaração de legalidade das condutas policias e das interceptações à vista das autorizações judiciais, mas houve rejeição porque os recursos internos não seriam efetivos porque a interceptação e a divulgação da conversa já haviam ocorrido); d) inexistência de prévia ação penal devidamente julgada e processada (o TJ/PR havia determinado arquivamento da representação contra os policiais militares e contra a juíza que autorizou a interceptação, e determinou o recebimento e processamento contra o Secretário de Segurança Pública, que havia divulgado, mas o Secretário foi absolvido, de modo que a Corte Interamericana estava sendo usada como uma “quarta instância”, o que foi rejeitado porque a Corte não faz papel de quarta instância, mas apenas analisa se os procedimentos e casos internos se adequam ou não à Convenção Americana, daí porque a preliminar foi rejeitada porque não seria exceção preliminar, para ser julgada no mérito). Existiram outras preliminares, mas o importante deste caso é que a Corte Interamericana deixou claro que não é uma “quarta instância”, e condenou o Brasil por ter violado o direito à vida privada, à honra e à reputação (previstos no art.11 da Convenção), em prejuízo a Arlei José Escher, Dalton Luciano de Vargas, Delfino José Becker, Pedro Alves Cabral e Celso Aghinoni, pela interceptação, gravação e divulgação das suas conversas telefônicas, além da violação da liberdade de associação e das garantias judiciais e proteção judicial, muito embora não tenha condenado pela violação de proteções judiciais (condenou o Brasil em reparação por danos imateriais, estimados em US$ 20.000,00 para cada vítima, a ser paga no prazo de um ano, além de publicação no Diário Oficial, em jornal de ampla circulação nacional e em jornal de circulação no Paraná, de determinadas partes da sentença, investigação dos fatos e restituição de aproximadamente US$ 10.000,00 pelas custas e gastos). d) Garibaldi vs. Brasil. Neste caso, a Comissão submeteu à Corte a demanda contra o Brasil, originada de petição de 06.05.2003 apresentada pelas organizações Justiça Global, Rede nacional de Advogados e Advogadas Populares (RENAP) e Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em nome de Sétimo Garibaldi e seus familiares. A demanda envolvia responsabilidade do Estado brasileiro pelo descumprimento da obrigação de investigar e punir o homicídio de Sétimo Garibaldi, ocorrido em 27.11.1998 durante uma operação extrajudicial de despejo das famílias de trabalhadores sem terra, que ocupavam uma fazenda no Município de Querência do Norte/PR, violando as garantias judiciais do art.8º, as proteções judiciais do art. 25, com relação à obrigação geral de respeito e garantia dos direitos humanos e ao dever de adotar medidas legislativas e de outro caráter no âmbito interno (arts. 1.1 e 2 da Convenção) e outros. O crime ocorreu em 1998, quando vinte pistoleiros entraram em um acampamento do MST na Fazenda São Francisco, afirmando serem policiais, para fins de despejo de todos, quando Garibaldi foi ferido na perna e, sem atendimento, veio a óbito. Um ano depois, o caso foi arquivado perante o Judiciário brasileiro. A Corte declarou a violação, pelo Estado brasileiro, dos direitos às garantias judiciais e à proteção judicial reconhecidos nos artigos 8.1 e 25.1 da Convenção Americana, em relação com o artigo 1.1 da mesma, em prejuízo de Iracema Garibaldi, Darsônia Garibaldi, Vanderlei Garibaldi, Fernando Garibaldi, Itamar Garibaldi, Itacir Garibaldi e Alexandre Garibaldi, além do descumprimento da cláusula federal do art. 2822 da Convenção, e por isso determinou: a) reparação, visando publicação no Diário Oficial, em jornal de ampla circulação nacional e em jornal de ampla circulação no Estado do Paraná, a página de rosto, a parte resolutiva da sentença, e sua íntegra, por no mínimo um ano, em página web oficial da União e do Estado do Paraná; b) obrigação do Estado em conduzir eficazmente e dentro de um prazo razoável o Inquérito e qualquer processo que for aberto, para identificar, julgar e eventualmente sancionar os autores da morte de Garibaldi, além de faltas funcionais de funcionários públicos; e) pagar, no prazo de um ano, o valor de US$23 1.000,00 para Iracema Garibaldi, a título de reposição de gastos de transporte e gestões pessoais em virtude do tema, mais US$ 8.000,00 a título de reposição de gastos e custas, além de “Artigo 28. Cláusula federal. 1. Quando se tratar de um Estado Parte constituído como Estado federal, o governo nacional do aludido Estado Parte cumprirá todas as disposições da presente Convenção, relacionadas com as matérias sobre as quais exerce competência legislativa e judicial. 2. No tocante às disposições relativas às matérias que correspondem à competência das entidades componentes da federação, o governo nacional deve tomar imediatamente as medidas pertinente, em conformidade com sua constituição e suas leis, a fim de que as autoridades competentes das referidas entidades possam adotar as disposições cabíveis para o cumprimento desta Convenção. 3. Quando dois ou mais Estados Partes decidirem constituir entre eles uma federação ou outro tipo de associação, diligenciarão no sentido de que o pacto comunitário respectivo contenha as disposições necessárias para que continuem sendo efetivas no novo Estado assim organizado as normas da presente Convenção.” 23 Apesar da condenação em dólares, a Lei 10.192/2001 determina que os valores devam ser convertidos em real, calculados com o câmbio vigente na bolsa de Nova Iorque no dia anterior ao pagamento. 22 US$ 50.000,00 em favor de Iracema Garibaldi e US$ 20.000,00 em favor de cada uma das seguintes vítimas: Darsônia Garibaldi, Vanderlei Garibaldi, Fernando Garibaldi, Itamar Garibaldi, Itacir Garibaldi e Alexandre Garibaldi, a título de indenização. O Decreto Presidencial 7.307, de 22 de setembro de 2010, autorizou a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência a dar cumprimento à referida sentença, inclusive para fins de indenização; e) Gomes Lund e outros vs. Brasi (“Caso Guerrilha do Araguaia”). A Corte Interamericana, neste caso, apresentado pela Comissão em 26.03.2009, condenou o Brasil a fazer a investigação penal da operação empreendida pelo Exército brasileiro entre 1972 e 1975 para erradicar a Guerrilha do Araguaia, inclusive para esclarecer, determinar as responsabilidades penais e aplicar as sanções previstas em lei pela detenção arbitrária, tortura e desaparecimento forçado de 70 pessoas, especialmente membros do Partido Comunista do Brasil e camponeses da região (declarou também o Estado brasileiro como responsável pelo desaparecimento forçado e pela violação dos direitos ao reconhecimento da personalidade jurídica, à vida, à integridade pessoal e à liberdade pessoal, além de descumprimento da obrigação de adequar seu direito interno à Convenção etc.). A demanda havia sido apresentada na Comissão Interamericana em agosto de 1995 pelo Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e pela ONG Human Rights Watch/Americas, em nome das pessoas desaparecidas e seus familiares. Este caso foi emblemático porque a Corte considerou que as disposições da Lei de Anistia brasileira (Lei 6.683, de 28 de agosto de 197924), que impedem a investigação e sanção das violações de direitos humanos no período, são incompatíveis com a Convenção Americana, não têm validade jurídica e não podem representar obstáculo para investigação dos fatos, identificação e punição dos responsáveis. Acontece, porém, que o STF, em 28.04.2010, julgou improcedente a ADPF 153, proposta pela OAB contra a Lei da Anistia25, e considerou que esta Lei não foi revogada pela Constituição de 1988, porque o Judiciário não poderia rever acordo político que, na transição do regime militar para a democracia, resultou na anistia de todos aqueles que cometeram crimes políticos e conexos a eles, entre 02 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 197926. Permanece, então, a dúvida sobre a necessidade ou não de cumprimento da decisão da Corte Interamericana, até porque foi proferida em data posterior ao julgamento da ADPF, sem esquecer que um dos argumentos de defesa do Estado brasileiro foi justamente o julgamento da ADPF pelo STF 27. Por isso, o cumprimento da decisão da Corte Interamericana pode significar desrespeito ao STF, mas o descumprimento pode trazer prejuízos diplomáticos e políticos ao Brasil, inclusive exclusão do sistema interamericano de proteção de direitos humanos28. Questões de concursos 05)DPU 2010 - CESPE - Defensor Público da União No que concerne ao sistema interamericano de direitos humanos, julgue os itens que se seguem. Art. 1º da Lei de Anistia: “É concedida anistia a todos quantos, no período compreendido entre 02 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, cometeram crimes políticos ou conexo com estes, crimes eleitorais, aos que tiveram seus direitos políticos suspensos e aos servidores da Administração Direta e Indireta, de fundações vinculadas ao poder público, aos Servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário, aos Militares e aos dirigentes e representantes sindicais, punidos com fundamento em Atos Institucionais e Complementares. § 1º - Consideram-se conexos, para efeito deste artigo, os crimes de qualquer natureza relacionados com crimes políticos ou praticados por motivação política. § 2º - Excetuam-se dos benefícios da anistia os que foram condenados pela prática de crimes de terrorismo, assalto, sequestro e atentado pessoal.” 25 A OAB pedia ao STF, entre outros, uma interpretação conforme, para que a anistia concedida pela lei não se estenderia aos crimes comuns praticados pelos agentes da repressão contra opositores políticos, durante o regime militar. 26 O Ministro Cezar Peluzo, na presidência do STF, afirmou na sessão de julgamento da ADPF 153 que: “Só o homem perdoa, só uma sociedade superior qualificada pela consciência dos mais elevados sentimentos de humanidade é capaz de perdoar. Porque só uma sociedade que, por ter grandeza, é maior do que os seus inimigos é capaz de sobreviver.” 27 O julgamento da ADPF foi em abril de 2010, e o julgamento do Caso Ximenes pela Corte Interamericana foi em maio de 2010. 28 Várias possibilidades estão sendo consideradas, inclusive para aumentar o diálogo do STF com a Corte Interamericana, para compatibilizar as decisões, regulamentação legal do cumprimento das decisões desta, manutenção em separado e sem comunicação dos dois sistemas (interno e internacional), com autonomia das decisões etc. O fato é que a divergência ainda permanece, mas na prática é a decisão do STF que vem prevalecendo. De toda forma, o STF ainda não julgou embargos declaratórios interpostos pela OAB, na ADPF 153, ainda não julgados. 24 Embora sem competência contenciosa, de caráter jurisdicional, a Corte Interamericana de Direitos Humanos tem competência consultiva, relativa à interpretação das disposições da Convenção Americana e das disposições de tratados concernentes à proteção dos direitos humanos. Errado MPT - Procurador do Trabalho - 2007) Quanto ao sistema interamericano de proteção dos direitos humanos, analise as assertivas abaixo: I. - No âmbito da Organização dos Estados Americanos, ao contrário do que ocorre no da ONU, só há um Pacto de Direitos Humanos, que trata dos Direitos Civis e Políticos, o Pacto de São José da Costa Rica, não havendo um pacto de direitos sociais, econômicos e culturais. II. - O Pacto de São José da Costa Rica restringe a prisão civil por dívidas ao devedor de alimentos. III. - O Pacto de São José da Costa Rica proíbe todo tipo de trabalho forçado ou obrigatório, inclusive ao presidiário. IV. - O Pacto de São José da Costa Rica consagra o duplo grau de jurisdição ao garantir o direito de recorrer de sentença a juiz ou tribunal. Assinale a alternativa CORRETA a) apenas os itens III. e IV. são corretos; b) apenas os itens I e II são corretos; c) apenas os itens I e IV são corretos; d) apenas os itens II e IV são corretos; e) NRA. 06) SEAD-AP, FMZ - Agente Penitenciário - 2010) A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, também conhecido como Pacto de San Jose da Costa Rica, estabelece que a) os direitos essenciais do homem derivam do fato de ele ser nacional de um determinado Estado e, por isso, merecem proteção no âmbito interno de cada país respectivamente b) os Estados-Partes, signatários da Convenção, obrigam-se a respeitar os direitos e liberdades nela reconhecidos e a garantir seu livre e pleno exercício, sem discriminação alguma, aos seus cidadãos nacionais. c) os países que ainda não aboliram a pena de morte somente poderão impô-la aos delitos mais graves, tais como os crimes políticos, em cumprimento de sentença final de tribunal competente d) toda pessoa tem direito a ser indenizada por erro judiciário, no caso de haver sido condenada em sentença passada em julgado, conforme a lei estabelecer. e) toda pessoa que for acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa, mas, quando o delito em questão disser respeito à segurança nacional, a acusação formulada permanecerá sob sigilo, tendo acesso a ela apenas o Ministério Público 07) PC-RN, Cespe - Delegado - 2009) De acordo com a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, assinale a opção incorreta a) Os processados devem ficar separados dos condenados, salvo em circunstâncias excepcionais, e submetem-se a tratamento adequado à sua condição de pessoas não-condenadas b) Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou de outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de prazo razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. A sua liberdade pode ser condicionada a garantias que asseverem o seu comparecimento em juízo c) A liberdade de manifestar a própria religião e as próprias crenças está sujeita tão-somente às limitações prescritas pela lei, e que sejam necessárias para proteger a segurança, a ordem, a saúde ou a moral públicas ou os direitos ou as liberdades das demais pessoas d) Toda pessoa atingida por informações inexatas ou ofensivas emitidas em seu prejuízo por meios de difusão legalmente regulamentados e que se dirijam ao público em geral tem direito a fazer, pelo mesmo órgão de difusão, sua retificação ou sua resposta, nas condições estabelecidas pela lei. e) Constituem trabalhos forçados os trabalhos ou os serviços normalmente exigidos de pessoa reclusa para cumprimento de sentença 10. Direitos humanos das minorias O termo minoria refere-se aos grupos humanos ou sociais que estejam em inferioridade numérica, ou ainda estejam subordinados política, social, cultural ou economicamente em relação a outro grupo, que é majoritário ou dominante em determinadas sociedades. A minoria, então, pode ser étnica, física ou psíquica, religiosa, linguística, de gênero ou de idade. A história da humanidade revela que as minorias foram as principais vítimas de perseguições, desrespeito aos direitos básicos e, portanto, com grande perigo de que os direitos humanos sofram atentados significativos em relação a tais grupos. Como se vê dos tratados internacionais, há uma preocupação maior com as mulheres, idosos, deficientes, presos, crianças que, ora são mais vulneráveis, ora são minorias. O próprio conceito de Democracia, hoje em dia, está envolvido na proteção das minorias (se antes Democracia significava apenas a preponderância da vontade da maioria, hoje não se pode aceitar que um regime político é democrático se não põe a salvo o direito das minorias, justamente porque a história produziu a preocupação mundial de massacre de minorias pelas maiorias). Este o motivo dos tratados internacionais citados, que tentam manter direitos básicos para as minorias dos Estados, de proteção à mulher, à criança, ao deficiente, em especial a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, de 1966, aprovado pelo Decreto Legislativo 23, de 21.06.1967, e promulgado internamente pelo Decreto 65.810, de 08 de dezembro de 1969. Internamente, também os Estados se preocupam com as minorias, e isto é um respeito ao espírito dos direitos humanos. O Brasil, por exemplo, é pródigo na proteção das minorias, especialmente no âmbito normativo. Veja algumas leis que, de forma direta ou indireta, acabam tentando proteger minorias ou têm um viés protetivo dos direitos humanos: a) Lei 10.048, de 08 de novembro de 2000: prioridade de atendimento às pessoas portadoras de deficiência, idosos (com idade igual ou superior a 60 anos), gestantes, lactantes e acompanhadas com crianças de colo; b) Lei 9.455, de 07 de abril de 1997: define os crimes de tortura e dá outras providências; c) Lei 4.898, de 09 de dezembro de 1965: regula o direito de representação e o processo de responsabilidade administrativa, civil e penal, nos casos de abuso de autoridade; d) Lei 9.807, de 13 de Julho de 1999: estabelece normas para a organização e a manutenção de programas especiais de proteção a vítimas e a testemunhas ameaçadas; e) Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003: dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências; f) Lei 11.340, de 07 de agosto de 2006: Lei Maria da Penha, que cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher29; g) Lei 8.069, de 13 de julho de 1990: dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências; h) Lei 12.852, de 05 de agosto de 2013: institui o Estatuto da Juventude; i) Lei 12.711, de 29 de agosto de 2012: dispõe sobre cotas nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio, regulamentado pelo Decreto 7.824, de 11 de outubro de 2012; j) Lei 7.853, de 24 de outubro de 1989: dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência e sua integração social, e dá outras providências, regulamentada, esta parte, pelo Decreto 3.298/99; l) Lei 9.504, de 20 de setembro de 1997: estabelece normas para as eleições, e no ar. 10, §3º, com redação dada pela Lei 12.034/09, impõe que cada partido ou coligação preencha o mínimo de 30% para candidatas do sexo feminino; Esta Lei foi declarada constitucional pelo STF na ADI 4424, inclusive para declarar a possibilidade do “Parquet” dar início a ação penal sem necessidade de representação da vítima. Neste caso, declarou inconstitucional o art. 16 da Lei, ao dispor que as ações penais estavam condicionadas à representação da ofendida, justamente porque esvaziava a proteção constitucional assegurada às mulheres (assentou a natureza incondicionada da ação penal em caso de lesão corporal, pouco importando a extensão desta, se praticado contra mulher no ambiente doméstico). 29 m) Lei 8.112, de 1990: dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, suas autarquias e fundações, e no art. 5º, §2º, assegura às pessoas portadoras de deficiência o direito de se inscrever em concurso público para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência, reservando-se às mesmas até 20% das vagas oferecidas no concurso30; n) Lei 8.213, de 24 de julho de 1991: dispõe sobre os planos de benefícios da Previdência Social, e em seu art. 93 diz que empresa com 100 ou mais funcionários está obrigada a preencher de 2% a 5% dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, na seguinte proporção: até 200 funcionários, 2%; de 201 a 500 funcionários, 3%; de 501 a 1000 funcionários, 4%; de 1001 funcionários em diante, 5%; o) Lei 12.288, de 20 de julho de 2010: instituo o Estatuto da Igualdade Racial; p) Lei 4.319, de 16 de março de 1964: cria o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana31. Neste sentido, a própria Constituição de 1988 previu a assistência para os mais carentes, o que é uma forma de preservar os direitos humanos e o mínimo necessário para que a dignidade não seja atingida: a) art. 5º, LXXIV: prevê a necessidade do Estado prestar assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos; b) art. 6º: consta como direito social a “assistência aos desamparados”; c) art. 7º, XXV: assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até 5 (cinco) anos de idade em creches e pré-escolas; 30 A CF/88, no art. 37, VIII, diz que lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão. 31 Esta Lei 4.319, de 16.03.1964 (publicada poucos dias antes do Golpe Militar de 31.03.1964), ainda permanece em vigor, com as alterações promovidas pela Lei 5.763/71 e pela Lei 10.683/03, que organiza a Presidência da República e Ministérios. Este Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH) foi criado junto ao Ministério da Justiça, mas hoje faz parte da estrutura da Secretaria de Direitos Humanos, que tem status de Ministério. É composto pelos seguintes membros: Presidente, que é a Ministra de Estado da Secretaria de Direitos Humanos; representante do Ministério Público Federal; representante do Ministério das Relações Exteriores; representante da Associação Brasileira de Educação; representante da Associação Brasileira de Imprensa; representante do Conselho Federal da OAB; representante da minoria e da maioria da Câmara dos Deputados e do Senado, professor de Direito Constitucional e professor de Direito Penal. Realiza reuniões ordinárias por seis vezes ao ano e extraordinariamente sempre que convocado pelo Presidente, por iniciativa própria e por solicitação de 2/3 de seus membros, com sessões secretas, salvo decisão da maioria absoluta. As principais competências do Conselho referem-se à promoção de: a) inquéritos, investigações e estudos sobre a eficácia das normas asseguradoras dos direitos da pessoa humana, inscritos na Constituição Federal e nos atos internacionais, em especial Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948); b) divulgação do conteúdo e da significação de cada um dos direitos da pessoa humana mediante conferências e debates em universidades, escolas, clubes, associações de classe e sindicatos e por meio da imprensa, do rádio, da televisão, do teatro, de livros e folhetos; c) nas áreas que apresentem maiores índices de violação dos direitos humanos: realização de inquéritos para investigar as suas causas e sugerir medidas tendentes a assegurar a plenitude do gozo daqueles direitos; campanha de esclarecimento e divulgação; d) inquéritos e investigações nas áreas onde tenham ocorrido fraudes eleitorais de maiores proporções, para o fim de sugerir as medidas capazes de escoimar de vícios os pleitos futuros; e) cursos diretos ou por correspondência que concorram, para o aperfeiçoamento dos serviços policiais, no que concerne ao respeito dos direitos da pessoa humana; f) entendimentos com os governos dos Estados cujas autoridades administrativas ou policiais se revelem, no todo ou em parte, incapazes de assegurar a proteção dos direitos da pessoa humana para o fim de cooperar com os mesmos na reforma dos respectivos serviços e na melhor preparação profissional e cívica dos elementos que os compõem; g) entendimentos com os governos estaduais e municipais e com a direção de entidades autárquicas e de serviços autônomos, que estejam por motivos políticos, coagindo ou perseguindo seus servidores, por qualquer meio, inclusive transferências, remoções e demissões, a fim de que tais abusos de poder não se consumem ou sejam, afinal, anulados; h) recomendação ao Governo Federal e aos dos Estados a eliminação, do quadro dos seus serviços civis e militares, de todos os seus agentes que se revelem reincidentes na prática de atos violadores dos diretos da pessoa humana; i) aperfeiçoamento dos serviços de polícia técnica dos Estados e Territórios de modo a possibilitar a comprovação da autoria dos delitos por meio de provas indiciárias; i) recomendação ao Governo Federal de prestação de ajuda financeira aos Estados que não disponham de recursos para a reorganização de seus serviços policiais, civis e militares, no que concerne à preparação profissional e cívica dos seus integrantes, tendo em vista a conciliação entre o exercício daquelas funções e o respeito aos direitos da pessoa humana; j) estudos de aperfeiçoamento da legislação administrativa, penal, civil, processual e trabalhista, de modo a permitir a eficaz repressão das violações dos direitos da pessoa humana por parte de particulares ou de servidores públicos; além de receber representações que contenham denúncias de violações dos direitos da pessoa humana, apurar sua procedência e tomar providências capazes de fazer cessar os abusos dos particulares ou das autoridades por eles responsáveis. d) art. 23, II, prevê a assistência pública como competência comum da União, Estados, DF e Municípios (além da necessidade de cuidar da saúde e da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência); e) art. 150, VI, “c”, prevê a imunidade de impostos sobre patrimônio, renda ou serviços das instituições de assistência social, sem fins lucrativos; f) art. 194, §7º, complementa a isenção de contribuições para a seguridade social das entidades beneficentes de assistência social; g) art. 194, “caput”: consta a institucionalização da assistência social incorporada à seguridade social, junto com a saúde e a previdência; h) art. 203: ratifica a institucionalização constitucional da assistência social, traçando regras e detalhamentos e obrigando a assistência social para quem necessitar, independentemente de contribuição para a seguridade social, com objetivo de proteger a família, a maternidade, a infância, a adolescência e a velhice, dar amparo às crianças e adolescentes carentes, promover a integração ao mercado de trabalho, habilitar e reabilitar as pessoas portadoras de deficiência e promover sua integração à vida comunitária e ainda garantir um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovarem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família; i) art. 227, “caput”: prevê absoluta prioridade, à criança, ao adolescente e ao jovem, do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, e ainda estabelece proteção especial à criança e ao adolescente órfão ou abandonado, mediante estímulo do Poder Público através de assistência jurídica, incentivos fiscais e subsídios ao seu acolhimento, sob a forma de guarda (art. 227, §3º, VI); j) art. 231: reconhece aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam; l) art. 68 do ADCT: reconhece a propriedade definitiva para os remanescentes das comunidades dos quilombos, sobre as terras que estejam ocupando, com obrigação do Estado em emitir os títulos respectivos. Não por outro motivo que a Constituição permite a ampliação legislativa de proteção das minorias, das comunidades e grupos carentes e da expansão da assistência social32. 11. A Constituição de 1988 e os direitos humanos Além da proteção das minorias e da promoção da assistência social, que a Constituição foi pródiga, com se viu, existem fatores específicos, inseridos na Lei Maior, que se relacionam diretamente com os direitos humanos, daí o destaque a seguir. 11.1. Direitos fundamentais e direitos humanos Como vimos, a CF/88 traça implicitamente os conceitos de direitos fundamentais e direitos humanos, ao considerar aqueles dos arts. 5º ao 17, para considerá-los como direitos e garantias fundamentais, e no art. 4º, II, considera como princípio da relação internacional a prevalência dos direitos humanos. De forma sistemática, começa o texto constitucional a tratar do tema direitos humanos, completado por outras normas, como se vê à frente. 11.2. Princípio da dignidade da pessoa humana Não há como considerar os direitos humanos sem inserir a dignidade do ser humano, até porque, como se viu, o núcleo do seu conceito. 32 No âmbito federal, por exemplo, existem os programas Bolsa Família (Lei 10.836/04 e Decreto 5.209/04), Brasil Carinhoso, Brasil Sem Fronteiras, PRONATEC – Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Lei 12.513/11), Programa Fome Zero e sua ação denominada Programa de Aquisição de Alimentos – PAA (Lei 10.696/03, art. 19), Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF (Lei 8.427/92, art. 5-A, com redação dada pela Lei 12.058/09; Lei 11.326/06; Lei 10.177/01, art. 6º-A), Programa Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural na Agricultura Familiar e na Reforma Agrária – PRONATER (Lei 12.188/10) e outros. A Constituição de 1988, atenta a esta situação, logo no art. 1º inseriu a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, junto com a soberania, a cidadania, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político. Passou a ser, então, a viga mestra que orienta todo o sistema constitucional, verdadeiro postulado moral e espiritual inerente ao ser humano (é o núcleo axiológico da Constituição). Daí porque não é propriamente um direito, mas sim um atributo da pessoa humana, considerado até como postulado (pode servir de interpretação dos próprios princípios constitucionais). Garante, perante o Estado, a existência de um mínimo existencial invulnerável que as políticas públicas e o ordenamento jurídico devem resguardar, independentemente da capacidade financeira e administrativa dos órgãos e entidades públicas. Assim, independentemente da norma constitucional ser de eficácia limitada, se a mesma tratar de um direito fundamental envolvendo a dignidade da pessoa humana, deve ser aplicada no caso concreto para que, pelo menos, o mínimo existencial seja resguardado. O princípio da dignidade da pessoa humana produz duas exigências para o Estado e para a sociedade: exige ação e abstenção, porque devem agir para proteger o mínimo existencial do ser humano e devem se abster de condutas que retiram a dignidade da pessoa humana. Tem fundamento na tradição cristã e na filosofia kantiana. Ao se afirmar que tal princípio também exige ação e abstenção para a sociedade, é porque o mesmo, assim como os direitos fundamentais, não tem apenas eficácia vertical contra o Estado, mas também eficácia horizontal contra os particulares. Não se pode negar que há constante tensão entre a eficácia horizontal dos direitos fundamentais e do princípio da dignidade da pessoa humana com a livre iniciativa e autonomia da vontade, de modo que esta colisão requer ponderação das circunstâncias do caso concreto, mas qualquer intérprete ou aplicador da norma deve deixar a salvo a dignidade do ser humano. O princípio da dignidade da pessoa humana já foi utilizado como fundamentação importante pelo STF, como, por exemplo, para permitir o aborto de anencéfalo, de modo que grávidas de fetos sem cérebro poderão optar pela interrupção da gestão com assistência médica, sem que o caso represente crime (ADPF 54); a união civil homoafetiva (ADPF 132/RJ); a prisão preventiva domiciliar para doentes com enfermidades graves (HC 98675/ES)33. Existem precedentes, com base neste princípio, permitindo o registro civil do novo nome, em caso de mudança de sexo por cirurgia (TJ/RS, Apelação 596.103.135/Porto Alegre). O princípio da dignidade da pessoa humana tem especial importância no caso da inconstitucionalidade casual (a inconstitucionalidade ocorreria apenas para determinadas situações fáticas que a Constituição aceitou para a prática de determinados atos ou condutas, mas que não se verificam), ou no duplo controle de proporcionalidade (em nível abstrato, a lei seria proporcional porque não estaria ferindo o princípio da proporcionalidade em nenhuma das suas vertentes – adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito -, mas na prática, quando aplicada, criaria uma situação desproporcional, que autorizaria o juiz a afastar sua incidência), ou ainda na chamada análise da prognose legislativa (previsão que o legislador faz da realidade e das situações futuras, para aprovar determinada lei, mas que o juiz acaba verificando que não ocorreram no caso concreto, daí porque é possível, atualmente, fazer análise de questões fáticas no controle concentrado de constitucionalidade – arts. 9º, §1º e 20, §1º, da Lei 9.868/99). Isto porque o princípio autoriza o juiz analisar, no caso concreto, se determinada lei ou norma está provocando prejuízo ao mínimo existencial de determinado ser humano, afetando sua dignidade, para afastar sua incidência, mesmo que tenha sido declarada sua constitucionalidade, no caso do duplo controle de proporcionalidade. Como se vê, o princípio da dignidade da pessoa humana dá liberdade para o juiz analisar as circunstâncias do caso concreto para verificar se a aplicação de determinada lei, de determinada pena ou de determinado comportamento, irá afetar a dignidade da pessoa humana, e isto é respeito aos direitos humanos. 33 Também com base na dignidade da pessoa humana, O STF havia declarado a não recepção, pela EC 26/2010 (que inseriu o direito à moradia como direitos sociais no art. 6º da CF/88), da hipótese legal de penhorabilidade do bem de família do fiador dos contratos de locação (art. 3º, Lei 8.009/1990, com redação dada pela Lei 8.245/1991) (RE 352940/SP e RE 449.657). No entanto, posteriormente, no RE 4.07688-9/SP, o STF entendeu que não havia inconstitucionalidade da previsão legal da penhorabilidade do bem de família do fiador do contrato de locação, votando neste sentido os Ministros Cezar Peluso, Joaquim Barbosa, Ellen Gracie, Marco Aurélio, Nelson Jobim, Gilmar Mendes e Sepúlveda Pertence, vencidos apenas os Ministros Carlos Brito, Eros Grau e Celso Melo. No RE 612360/RG/SP, foi declarada a repercussão geral, aguardando definição. Apesar de não haver direitos fundamentais absolutos, é comum a citação de que a dignidade da pessoa humana não poderia ser relativizada (daí porque não poderia haver relativização do direito a não ser torturado e de não ser reduzido à condição de escravo ou em condição análoga) 11.3. Incorporação dos tratados internacionais e suas consequências O procedimento para incorporação dos tratados internacionais (ou internalização ou internação) no ordenamento jurídico nacional segue as seguintes etapas: 1ª etapa: assinatura pelo representante legitimado. Neste caso, dá-se a negociação pelo Ministério das Relações Exteriores e assinatura do Presidente, na condição de Chefe de Estado, ou pelo chamado plenipotenciário (aquele que representa o país na missão diplomática, para assinar o acordo internacional). 2ª etapa: submissão do ato internacional ao Congresso Nacional, para aprovação por Decreto Legislativo, promulgado pelo Presidente do Senado, após discussão na Câmara e depois no Senado. Se não for aprovado na Câmara, o Presidente da República é comunicado da impossibilidade de ratificação. Se aprovado, é encaminhado ao Senado; 3º etapa: promulgação do ato internacional pelo Presidente da República. Esta promulgação se dá por Decreto. O Presidente tem discricionariedade na promulgação ou não. Não há prazo definido para tal aprovação por promulgação. Se aprovado e publicado no Diário Oficial, o ato internacional é internalizado, tendo executoriedade interna, ocasião em que este vigor interno é comunicado aos demais Estados partícipes (a comunicação possibilita que o Brasil pode exigir o cumprimento pelos demais, assim como sofrer sanção caso não cumpra o tratado). Como o §3º do art. 5º, como se vê à frente, adotou e até incentivou outro procedimento para os tratados internacionais sobre direitos humanos, correto dizer que o Brasil adotou um sistema misto: um sistema para tratados internacionais tradicionais e outro para os tratados humanos que tratam de direitos humanos. É possível, inclusive, auferir que o sistema constitucional brasileiro permite força normativa de três graus para os tratados internacionais: força normativa constitucional, para tratados internacionais sobre direitos humanos aprovados da mesma forma que as emendas constitucionais; força normativa supralegal, para tratados sobre direitos humanos não aprovados da mesma forma que as emendas constitucionais; força normativa legal, para tratados tradicionais incorporados na forma acima. É a posição do STF. O §3º do art. 5º, com redação dada pela EC 45/04, diz que: “Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.” O único ato internacional aprovado na forma do §3º do art. 5º, foi a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (aprovada pelo Congresso pelo Decreto Legislativo 186, de 09.07.2008 e promulgado pelo Presidente pelo Decreto 6.949, de 25.08.2009). Em função deste novo dispositivo constitucional, o STF teve a oportunidade de dizer, quando do julgamento do RE 466.343 e do “HC” 87585, que o ordenamento jurídico brasileiro agora pode ser formado por três níveis distintos: normas constitucionais, normas supralegais e normas legais. Temos, então, a seguinte pirâmide jurídica brasileira: 1 – NORMAS CONSTITUCIONAIS (Constituição, Tratados Internacionais sobre Direitos Humanos aprovados na forma de emendas constitucionais e as próprias emendas constitucionais); 2 – NORMAS SUPRALEGAIS (Tratados Internacionais sobre Direitos Humanos, porém sem aprovação na mesma forma que as emendas constitucionais, como o Pacto de São José da Costa Rica)34; 34 A consideração jurídica, pelo Brasil, de que tratados internacionais sobre direitos humanos, não aprovados como emendas constitucionais, têm status de supralegalidade, respeita o princípio da boa-fé do direito internacional: a Convenção de Viena, em seu art. 27, diz que o Estado não pode invocar disposições de seu direito interno como justificativa para o não cumprimento de tratado. Daí porque a supralegalidade fortifica a ideia de que, internamente, devem ser efetivados, jamais descumpridos. 3 – NORMAS LEGAIS (leis ordinárias e complementares, além de medidas provisórias, leis delegadas, decretos-legislativos e resoluções do Congresso)35. Em função desta situação, a doutrina começa a ventilar algumas questões que podem ser exigidas em concurso público: As normas supralegais tornam inaplicáveis as leis brasileiras que a contrariarem, sejam estas aprovas antes ou depois daquelas, porque há uma relação de hierarquia que não se resolve pelo critério cronológico do “lei posterior revoga o anterior”. Leis ordinárias brasileiras incompatíveis com os tratados internacionais sobre direitos humanos não aprovados na formalidade das emendas constitucionais, não são revogadas, porque continuam em vigor. São, na verdade, “derrogadas”, porque perdem a validade; A validade das leis ordinárias brasileiras depende de dupla análise de compatibilidade: análise perante os tratados internacionais sobre direitos humanos (TIDH´s) e também perante a Constituição Federal. Por isso, para terem validade, é preciso que as leis brasileiras tenham “dupla compatibilidade vertical”; Há possibilidade, a partir da reforma da pirâmide de Kelsen, não só do controle de constitucionalidade, mas também do controle de convencionalidade, quando o parâmetro de controle é algum TIDH aprovado sem as formalidades da aprovação de EC. É que, além de analisar se uma lei está de acordo com a Constituição, é preciso analisar se ela está de acordo com os TIDH´s. Entretanto, o controle de convencionalidade só poderia ocorrer pela via difusa/concreta, uma vez que o controle de constitucionalidade pressupõe um parâmetro de controle que tenha status constitucional, e os TIDH´s, aprovados sem as formalidades de aprovação de ED, têm, como se viu do posicionamento do STF, status supralegal, sem esquecer que as normas constitucionais que tratam do controle concentrado/abstrato de constitucionalidade, falam em “inconstitucionalidade” (art. 102, I, “a”, §2º, art. 103, §§1º, 2º, 3º), e não em “inconvencionalidade”. Da mesma forma, não seria possível propor arguição de descumprimento de preceito fundamental – ADPF de uma lei em face de um TIDH, porque a Constituição fala em ADPF no caso de preceito fundamental “decorrente desta Constituição” (art. 102, §1º), e não “decorrente de Tratados Internacionais”. O controle abstrato de compatibilidade com o Tratado Internacional cabe ao tribunal internacional (no caso do Pacto São José da Costa Rica, cabe à Corte Interamericana A Constituição de 1988, ao dar “status” de norma constitucional aos tratados internacionais sobre direitos humanos aprovados da mesma forma que as emendas constitucionais, e o STF, ao dar “status” supralegal àqueles tratados sobre direitos humanos não aprovados como as emendas constitucionais, acabam fortificando a existência de uma “quinta instância” aos jurisdicionados, na medida em que fortalece, também, os Tribunais Internacionais, em especial a Corte Interamericana de Direitos Humanos, sediada em San José, na Costa Rica, que tem por objetivo maior aplicar e interpretar a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto São José da Costa Rica, adotada em 22.11.1969 no âmbito da Organização dos Estados Americanos, em vigor internacionalmente em 18.07.1978, ratificada no Brasil pelo Decreto Legislativo 27/1992 e promulgada pelo Decreto 678, de 06.11.1992). Assim, não é difícil que a referida Corte acabe analisando situações efetivadas em processos judiciais no âmbito do Judiciário brasileiro, que apresentem violação das regras e princípios estabelecidos na Convenção, inclusive após pronunciamento do Supremo Tribunal Federal36. O instrumento utilizado pelo Congresso Nacional para aprovar conjuntamente, com equivalência de emenda constitucional, nos termos do art. 5º, §3º, é o Decreto Legislativo, como ocorreu com a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007. O controle de convencionalidade, pela via abstrata, não pode ser exercido no Brasil, mas apenas na Corte Interamericana de Direitos Humanos. No Brasil, é possível o controle concreto, perante os órgãos do Poder Judiciário. Apesar de não ser cabível a ação direta de inconstitucionalidade ou a arguição de descumprimento de preceito fundamental contra leis estaduais e federais que contrariarem as normas supralegais (tratados internacionais sobre direitos humanos não aprovados como emendas constitucionais), não há dúvida que 35 Inclua-se, ainda, na referida pirâmide, as normas secundárias, que seriam os atos do Executivo para regulamentar a lei, como Decretos, Atos Regimentais, Portarias, Provimentos etc.. “Secundárias” porque se originam da lei, e não diretamente da Constituição. 36 Vide, anteriormente, os casos julgados pela Corte. podem ser propostas no STF se tiverem por parâmetro de controle os tratados internacionais aprovados como emendas constitucionais, vez que estes se inserem no bloco de constitucionalidade. Por isso, um novo tratado internacional sobre direitos humanos aprovados na forma do art. 5º, §3º, da CF/88, pode reformar a Constituição de 1988 se não atingir suas cláusulas pétreas. Ainda importante lembrar que, se o STF declara uma lei estadual ou federal constitucional, nada impede que esta mesma lei venha a ser declarada incompatível com uma norma supralegal surgida posteriormente. Existe uma diferença importante sobre os tratados internacionais sobre direitos humanos aprovados na forma de emenda constitucional e os que não são assim aprovados. Trata-se do instituto da denúncia: em direitos humanos, a denúncia ocorre quando um dos participantes do tratado internacional sobre direitos humanos comunica que o tratado não vale mais para si, mas apenas para os outros Estados que assinaram e ratificaram. Esta possibilidade de denúncia pode ser feita aos tratados internacionais incorporados na forma do art. 5º, §2º, da CF/88. Já os tratados internacionais sobre direitos humanos que forem incorporados na forma do art. 5º, §3º (na mesma forma que as emendas constitucionais – quórum de 3/5 e aprovação em dois turnos em cada Casa do Congresso Nacional), a denúncia não será possível. Assim, se o Brasil incorporar tratados internacionais sobre direitos humanos, na forma das emendas constitucionais37, não poderá denunciá-lo, ficando vinculado ao mesmo até que assine e ratifique outro tratado internacional de direitos humanos mais benéfico, aplicando-se o princípio do “pro omini” (na colisão de interesses fundamentais, prevalece a norma mais benéfica ao ser humano). Outra forma de desvinculação a tal tratado, será pela manifestação do poder constituinte originário, quando uma nova Constituição é promulgada. 11.3. A submissão ao Tribunal Penal Internacional Em 1988, quando a Constituição foi promulgada, constou no art. 7º do ADCT que “O Brasil propugnará pela formação de um tribunal internacional dos direitos humanos”. Em 2004, por meio da EC 45, foi inserido o §4º ao art. 5º da CF/88, com a seguinte redação: “O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão”. Veja, então, que diferentemente do que ocorreu com o poder constituinte originário, de 1988, o poder constituinte reformador deixou bem claro que o Brasil estava se submetendo ao TPI, aceitando, portanto, todas as suas regras, afastando dúvidas sobre a possibilidade de entrega de brasileiro nato e outros assuntos então polêmicos, como se verá adiante. 11.4. A federalização dos crimes contra direitos humanos Art. 109: Aos juízes federais compete processar e julgar: V-A - as causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º deste artigo; §5º Nas hipóteses de grave violação de direitos humanos, o Procurador-Geral da República, com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, poderá suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em qualquer fase do inquérito ou processo, incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal. A EC 45/04 introduziu o art. 109, V-A38, como se vê acima, com preocupação especial para os crimes com violação dos direitos humanos, possibilitando o repasse da questão para a Justiça Federal. Existe, como se vê, um conceito jurídico indeterminado do que venha a ser as hipóteses de grave violação de direitos humanos, deixando, a Constituição, à livre e exclusiva cognição do Procurador-Geral da República, para o fim de pedir, e à livre e exclusiva cognição do Superior Tribunal de Justiça, para decidir se haverá ou não deslocamento de competência. Até o presente momento, dois IDC´s – Incidentes de Deslocamento de Competência foram suscitados pelo PGR no STJ: IDC 01/2005 (“Caso Dorothy Stang”) e IDC 02/2010 (“Caso Manoel Bezerra). No primeiro caso, tratou-se do assassinato de Dorothy Stang, no Pará, em 12.02.2005, missionária que participava da Comissão Pastoral da Terra e da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, e 37 Como ocorreu com a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, primeiro tratado internacional aprovado no rito previsto no art. 5º, §3º, da CF (aprovado pelo Congresso pelo Decreto Legislativo 186, de 09.07.2008 e promulgado pelo Presidente pelo Decreto 6.949, de 25.08.2009). 38 Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei n. 6647/2006, para disciplinar o incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal regulamentando o § 5º do art. 109 da Constituição Federal acompanhava a luta dos trabalhadores do campo na região da Transamazônica, no Pará. A federalização foi negada por falta de comprovação da inércia ou incapacidade das autoridades responsáveis de responder ao caso específico, aplicando-se o princípio da subsidiariedade. O IDC 02/2010, por sua vez, foi aceito pelo STJ, uma vez que se tratava de homicídio, em 24.01.2009, do advogado e vereador Manoel Bezerrra, notório defensor dos direitos humanos e autor de diversas denúncias contra atuação de grupos de extermínio na fronteira da Paraíba e de Pernambuco, e havia ficado claro o risco de responsabilização internacional e a notória incapacidade das instâncias e autoridades locais em oferecer respostas efetivas. O incidente de deslocamento de competência, portanto, é mais um instrumento inserido na Constituição Federal de 1988 que visa punir as violações de direitos humanos e, de alguma forma, servir de prevenção, disponibilizando a maior estrutura e capacidade dos órgãos públicos federais de persecução penal. 11.5. Asilo, refúgio, extradição, expulsão, deportação e entrega O asilo é um direito universal, que está previsto na DUDH-1948 em seu art. 14: “1.Toda pessoa, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países”; “2. Este direito não pode ser invocado em caso de perseguição legitimamente motivada por crimes de direito comum ou por atos contrários aos propósitos e princípios das Nações Unidas”. A CF/88, por sua vez, coloca a concessão de asilo político como um dos princípios das relações internacionais da República Federativa do Brasil, e ainda prevê no art. 5º, LII: “não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião”. Como diz Piovesan (Temas de Direitos Humanos, p. 198), “Quando pessoas têm que abandonar seus lares para escapar de uma perseguição, toda uma série de direitos humanos são violados, inclusive o direito à vida, liberdade e segurança pessoal, o direito de não ser submetido a tortura, o direito à privacidade e à vida familiar, o direito à liberdade de movimento e residência e o direito de não ser submetido a exílio arbitrário. Os refugiados abandonam tudo em troca de um futuro incerto em uma terra desconhecida. É assim necessário que as pessoas sofram esta grave violação aos direitos humanos possam ser acolhidas em um lugar seguro, recebendo proteção efetiva contra a devolução forçosa 39 ao país em que a perseguição ocorre e tenham garantido ao menos um nível mínimo de dignidade”. A Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados, de 1951, em seu art. 1º considera refugiado toda pessoa que, em virtude dos eventos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951 e devido a fundado temor de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, participação em determinado grupo social ou opiniões políticas, está fora do país de sua nacionalidade, e não pode, ou, em razão de tais temores, não queira valer-se da proteção desse país; ou que, por carecer de nacionalidade e estar fora do país onde antes possuía sua residência habitual, não possa, ou por causa de tais temores ou de razões que não sejam de mera conveniência pessoal, não queria regressar a ele. Em 1967, o Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados retirou as limitações temporais. Refugiado, em suma, “é a pessoa que não só não é respeitada pelo Estado ao qual pertence, como também é esse Estado quem a persegue ou não pode protegê-la quando ela estiver sendo perseguida” (Piovesan). “Ainda a respeito do conceito de refugiado, acrescente-se que para o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados, ‘alguém que foge de uma discriminação severa ou tratamento desumano – que vem a ser perseguição – por não concordar com códigos sociais severos, tem razões para ser considerada refugiada. Violência sexual e estupro podem constituir perseguição. Em 1984, o Parlamento Europeu determinou que mulheres enfrentando tratamento cruel ou desumano porque pareciam estar transgredindo morais sociais devem ser consideradas um grupo social particular para o propósito de determinação da condição de refugiadas. Na França, no Canadá e nos EUA foi oficialmente reconhecido que a mutilação genital representa uma forma de perseguição e que mulheres que temem a mutilação genital nos seus países têm uma real reivindicação ao status de refugiada (...) Homossexuais40 O princípio da não devolução do refugiado (“non-refoulement”) está consagrado no art. 33 da Convenção de 1951: “nenhum dos Estados-contratantes expulsará ou repelirá um refugiado, seja de que maneira for, para as fronteiras dos territórios onde a sua vida ou a sua liberdade sejam ameaçadas em virtude de sua raça, religião, nacionalidade, filiação em certo grupo social ou opiniões políticas”. 40 Na Nigéria foram presas dezenas de pessoas, no início de 2014, depois da lei que criminalizou a homossexualidade, votada no Parlamento e sancionada pelo Presidente Goodlukc Jonathan, com amplo apoio popular, A lei prevê: “Qualquer pessoa que se associe, opere ou participe de clubes gays, sociedades ou organizações e demonstre publicamente, directa ou indirectamente, um relacionamento amoroso ocom outra pessoa do mesmo sexo na Nigéria comete uma violação e 39 podem ser elegíveis para status de refugiado com base na perseguição em virtude de sua associação com um grupo social em particular.” (Piovesan, op. Cit., p. 202). Originariamente, o refugiado seria aquele que estava em fuga de determinado país em guerra civil ou quando uma maioria política ou religiosa vitoriosa iniciava perseguições claras e quase sempre fatais contra determinadas minorias. Depois, a ampliação do conceito foi necessária para englobar inúmeras formas de perseguição, quase sempre pelo Estado, mas também pela própria sociedade. A Lei 9.474, de 22.07.1997, define mecanismos para implementação do Estatuto dos Refugiados de 1951, e no art. 1º diz que “Será reconhecido como refugiado todo indivíduo que: I - devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país; II - não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior; III - devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país.” Importante descrever as diferenças entre asilado e refugiado, muito embora ligados e próximos pelo contexto social e político. Novamente Piovesan ensina que originariamente, o refúgio sempre foi um instituto de direito internacional universal, e o asilo se restringia regionalmente (era um instituto jurídico regional, especialmente para a América Latina). Enquanto o refúgio é uma medida humanitária, abarcando motivos religiosos, raciais, de nacionalidade, de grupo social e opiniões políticas, o asilo é medida política, que abarca os crimes de natureza política ou ideológica. Por isso é que, para o refúgio, não precisa a efetiva perseguição, mas apenas a ameaça, justamente porque tem o objetivo de proteger a vida da pessoa, e para o asilo, é preciso a efetiva perseguição. O refúgio faz surgir uma proteção fora do país de origem do refugiado, e no asilo a proteção pode ocorrer inclusive no próprio país do asilado ou na embaixada do país de destino (asilo diplomático). No refúgio existem as chamadas cláusulas de cessação, perda e exclusão, inseridas na Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951, e no asilo estas cláusulas não existem. Finalmente, a natureza do ato de concessão do refúgio é declaratória, enquanto a natureza do ato de concessão doe asilo é constitutiva, porque depende exclusivamente da decisão do país. Com se vê, o asilado e o refugiado entram na perspectiva única dos direitos humanos, porque a proteção aos mesmos é, na verdade, a proteção da dignidade da pessoa humana.41 Por sua vez, extradição é a entrega de um indivíduo a outro Estado em razão da prática de um delito ocorrido no Estado requerente (extraditando pratica crime nos EUA e se encontra no Brasil e EUA pede extradição). Por isso, é tida como um instrumento de cooperação judiciária entre Estados em matéria penal, para que um indivíduo seja entregue pelo Estado solicitado para responder a processo penal ou cumprir pena no Estado solicitante. Ocorre entre dois países com soberania, e funciona para evitar impunidade e efetivar a universalização do direito de punir. A análise do STF se restringe à legalidade do pedido, mediante juízo de prelibação sem entrar no mérito da condenação ao estrangeiro. Por isso, no caso da extradição, adota-se, no Brasil, o sistema de contenciosidade limitada. Isto não impede, entretanto, que o STF, como destacado na Extradição 1074/Alemanha analise aspectos materiais concernentes à própria substância da imputação penal, se tal análise se mostrar indispensável à solução da controvérsia pertinente: a) à ocorrência de prescrição penal; b) à observância do princípio da dupla tipicidade; ou c) à configuração eventualmente política tanto do delito atribuído ao extraditando quanto das razões que levaram o Estado estrangeiro a requerer a extradição de determinada pessoa ao Governo brasileiro. Também é possível ao STF analisar as condições materiais e políticas do país requerente e de suas instituições, que porventura pode demonstrar a inviabilidade de se assegurar ao súdito os postulados básicos do devido processo legal (contraditório, ampla defesa, igualdade das partes, imparcialidade, juiz natural). A extradição pode ser estará sujeita à condenação a dez anos de prisão”. Assim, aqueles que saírem da Nigéria por conta desta perseguição, podem ser considerados refugiados, pelo menos no Brasil, em face do que dispõe o art. 1º, III, da Lei 9.474/97. 41 Piovesan (Temas de Direitos Humanos, p. 197): “É sob essa perspectiva que se há de enfocar o Direito Internacional dos Refugiados e o Direito Internacional Humanitário. A visão compartimentalizada, que afirma a existência de três vertentes da proteção internacional dos direitos da pessoa (Direitos Humanos, Direito Humanitário e Direito dos Refugiados) encontra-se definitivamente superada, considerando a identidade de propósito de proteção dos direitos humanos, bem como a aproximação dessas vertentes nos plano conceitual, normativo, hermenêutico e operacional. Há que se ter uma visão necessariamente integral dos direitos da pessoa humana, como endossa a conferência de Viena de 1993”. ativa, quando o Estado requer a extradição, ou passiva, quando o Estado recebe o pedido de extradição. O STF só atua na extradição passiva, isto é, quando o Brasil recebe o pedido, já que não cabe ao Excelso Pretório requerer extradição, tarefa do Poder Executivo da União. Só haverá extradição no caso de dupla tipicidade: a conduta deve ser tida como crime tanto no Brasil como no outro Estado requerente. O STF entende que não há dupla tipicidade quando o pedido de extradição envolve súdito que tenha praticado o crime no país solicitante quando era menor de idade, visto que menor de idade, no Brasil, não comete crime, mas apenas atos infracionais (Extradição 1135/Alemanha). Destaca-se que o STF tem posição firme no sentido de que atos terroristas não podem ser tidos como criminalidade política, especialmente para impedir a extradição (Extradição 855/Chile). Brasileiro nato não pode ser extraditado, mas o brasileiro naturalizado poderá ser em caso de cometimento de crime comum, antes da naturalização, e envolvimento com tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, antes ou depois da naturalização (vide, abaixo, possibilidade de entrega de brasileiro nato). Os seguintes princípios se aplicam na extradição: Princípio da comutação da pena. Este princípio decorre do art. 91 do Estatuto do Estrangeiro (Lei 6.815/80), e ocorre quando, no deferimento da extradição pelo Supremo Tribunal Federal, percebe-se que no país solicitante, há punição prevista incompatível com o ordenamento jurídico brasileiro. Neste caso, a extradição só ocorre se forem seguidas as condições impostas; Princípio da especialidade: o extraditando somente poderá ser processado e julgado pelo Estado requerente pelo delito objeto do pedido de extradição. O STF tem posição aceitando, porém, o “pedido de extensão”: o Estado que já requereu a extradição e a obteve, pode, posteriormente, pedir permissão para processar o extraditado por outro delito praticado antes da extradição e diverso daquele que a motivou; Princípio da reciprocidade. Este princípio permite que a extradição seja concedida, desde que um Estado se comprometa com o nosso país. Geralmente, a extradição só ocorre se já existe, entre o Brasil e o país solicitante, um tratado internacional, mas mesmo quando não existe, a extradição pode ser concedida se houver promessa de reciprocidade, caso o Brasil solicite, posteriormente, a extradição de alguém que aqui tenha cometido um crime e se encontre naquele país. Porém, se o país não tem condições de fazer a promessa de reciprocidade, a extradição não pode ser concedida. Expulsão é a retirada à força do território nacional de um estrangeiro que pratica, neste território, atos criminosos que demonstra sua periculosidade ou risco de permanência. O art. 65, Lei 6815/80, especificam os atos criminosos do estrangeiro que o torna passível de expulsão: a) atentado contra a segurança nacional, a ordem política ou social, a tranquilidade ou moralidade pública e a economia popular, ou tome procedimento que o torne nocivo à conveniência e aos interesses nacionais; b) praticado fraude a fim de obter a sua entrada ou permanência no Brasil; c) entrado no Brasil com infração à lei e dele não se retirar no prazo que lhe for determinado, não sendo aconselhável a deportação; d) se entregado à vadiagem ou à mendicância; ou e) desrespeitado proibição especialmente prevista para estrangeiro. Deportação é a devolução compulsória ao país de origem, de procedência ou mesmo para qualquer outro que consinta em recebê-lo, do estrangeiro que tenha entrado ou permaneça de forma irregular no território nacional (arts. 57, 58, Lei 6815/80). A deportação, então, pressupõe irregularidades, e não crimes, daí porque há deportação quando o estrangeiro adentra em um país sem seguir as regras deste país (sem comprovante de endereço no país de origem; sem comprovante de reserva em hotel; sem quantidade de dólares no bolso etc.). Se as irregularidades cometidas pelo estrangeiro forem mais graves, e acabar demonstrando que, mais que irregularidades, são verdadeiros crimes ou atos mais graves que dão ensejo à expulsão, a deportação poderá se transformar em expulsão. Ainda é preciso dizer que, atualmente, a doutrina trata diferentemente a extradição da entrega. Extradição ocorre quando há um relacionamento entre dois países soberanos (se dá entre o “Direito das Gentes”). Entrega, por sua vez, ocorre quando há um relacionamento entre um país soberano e um órgão internacional. Na verdade, esta distinção está sendo utilizada para que seja possível a entrega de nacional, mesmo nato, de determinado país para o Tribunal Penal Internacional, criado pelo Estatuto de Roma e promulgado no Brasil pelo Decreto 4.388, de 25 de setembro de 2002. É que o Estatuto de Roma, no art. 59, permite a entrega de qualquer nacional para o Tribunal Penal Internacional, e esta entrega estaria impossibilitada, por exemplo, por algumas constituições de países que adotaram o Estatuto, como é o caso da Constituição brasileira, que não permite a extradição de brasileiro nato e nem naturalizado (salvo, do naturalizado, nos casos já apontados). Por isso, para que seja possível o encaminhamento de brasileiro nato ou naturalizado, para o Tribunal Penal Internacional, a doutrina vem diferenciando extradição de entrega. Assim, é impossível a extradição de brasileiro nato, mas é possível a sua entrega. Questões de concursos 08) TRT 4ª 2012 - FCC - Juiz do Trabalho Substituto Em matéria de Tratados e Convenções sobre direitos humanos é correto afirmar: a) Os Tratados e Convenções só se incorporarão ao Direito Interno com o status de norma constitucional formal, independente de outros atos, pelos Decretos Legislativos aprovados com as mesmas exigências estabelecidas para as Emendas Constitucionais pelo Congresso Nacional. b) Os Tratados e Convenções só se incorporarão ao Direito Interno com o status de norma constitucional material, independente de outros atos, pelos Decretos Legislativos aprovados com as mesmas exigências estabelecidas para as Emendas Constitucionais pelo Congresso Nacional. c) Basta a assinatura do representante brasileiro na negociação que aprova o Tratado ou Convenção para incorporar formalmente no Direito Interno. d) Os Tratados e Convenções de Direitos Humanos só se incorporarão ao Direito Interno com o status de norma constitucional material e formal, se votados em ambas as Casas do Congresso Nacional, em dois turnos, com aprovação por três quintos dos votos de seus membros. e) Basta a Carta de Ratificação do Presidente da República, ainda que não passe pela aprovação do Congresso Nacional, desde que sejam promulgados por intermédio do Decreto Legislativo. 12. Principais documentos históricos sobre direitos humanos: 12.1. MAGNA CARTA DA INGLATERRA DE 1215 Trata‑se de um documento de 1215 que limitou o poder dos monarcas da Inglaterra, inclusive o do Rei João, que o assinou, impedindo o absolutismo reinante e se sujeitando à vontade da lei. Daí considerar que a Magna Carta foi o primeiro texto do processo histórico que levaria ao surgimento do constitucionalismo (poder emanado por um representante do povo). O texto de 63 artigos garantia liberdades políticas e trazia disposições que tornavam a Igreja livre e independente da monarquia, reformando o direito e a justiça e regulando o funcionalismo real. O art. 39 foi um dos dispositivos de maior relevância, trazia noções de legalidade, do devido processo legal e assim rezava: Nenhum homem livre será preso, aprisionado ou privado de uma propriedade, ou tornado fora da lei, ou exilado, ou de maneira alguma destruído, nem agiremos contra ele ou mandaremos alguém contra ele, a não ser por julgamento legal dos seus pares, ou pela lei da terra. Nesse sentido também apresentou o art. 40: “A ninguém venderemos, a ninguém recusaremos ou atrasaremos, direito ou justiça”. Veja seus artigos de maior relevância: Preâmbulo: John, pela graça de Deus, rei da Inglaterra, senhor da Irlanda, duque da Normandia e Aquitânia, e conde de Anjou, aos seus arcebispos, bispos, abades, condes, barões, juízes, guardas florestais, sheriffs, prebostes, ministros e a todos os seus bailios e súbditos fiéis, saudações. Saibam que nós, por respeito a Deus e à salvação da nossa alma, e a de todos os nossos ancestrais e herdeiros, para a honra de Deus e exaltação da santa igreja, e para o aperfeiçoamento do nosso reinado, com o conselho dos nossos venerandos padres, Stephen, arcebispo de Canterbury, primaz de toda a Inglaterra, e cardeal da Santa Igreja Romana, Henry, arcebispo de Dublin, William de Londres, Peter de Winchester, Jocelin de Bath e Glastonbury, Hugh de Lincoln, Walter de Worcester, William de Conventry e Benedict de Rochester, bispos; mestre Pandulph, o subdiácono do Papa e mordomo oficial; irmão Aymeric, mestre dos Cavaleiros do Templo na Inglaterra; e dos nobres, William Marshal, conde de Pembroke, William, conde de Salisbury, William, conde de Warenne, William, conde de Arundel; Alan de Galloway, condestável da Escócia, Warin FitzGerald, Peter Fitz‑Herbert, Hubert de Burgh, senescal de Poitou, Hugh de NevilIe, Mathew Fitz‑Herbert, Thomas Basset, Alan Basset, Philip d’Aubigny, Robert de Roppelay, John Marshal, John Fitz‑Hugh e outros dos nossos servidores fiéis: 1. Prometemos diante de Deus, em primeiro lugar, e por esta nossa presente carta confirmamos por nós e por nossos herdeiros, para sempre, que a igreja da Inglaterra será livre e gozará dos seus direitos na sua integridade e da inviolabilidade das suas liberdades; e é nossa vontade que assim se cumpra; e isto está patenteado pelo fato de que nós, de nossa plena e espontânea vontade, antes que surgisse a discórdia entre nós e os nossos barões, concedemos, e por nossa carta confirmamos e solicitamos a sua confirmação pelo Papa Inocêncio III, a liberdade de eleições, que é da maior importância e essencial para a igreja da Inglaterra; e a isto observaremos e queremos que seja observado em boa‑fé pelos nossos herdeiros para sempre. Nós também concedemos a todos os homens livres do nosso reino, por nós e por nossos herdeiros perpetuamente, todas as liberdades abaixo escritas, para que as tenham e as conservem para si e para os seus herdeiros, de nós e dos nossos herdeiros. (...) 5. Mas o curador, enquanto estiver com a custódia da terra, conservará as casas, os parques, os tanques de peixe, os lagos, os moinhos e outros pertences com os ganhos da terra; e ele devolverá ao herdeiro, quando este tiver idade, todos os seus haveres providos com arados e cultura, tal como a estação possa exigir e os ganhos da terra possam razoavelmente sustentar. 6. Os herdeiros casar‑se‑ão com mulheres de igual condição, além do que, antes que o casamento tenha lugar, aqueles que estão ligados pelo sangue ao herdeiro deverão ser informados. 7. Uma viúva, após a morte do seu marido, receberá imediatamente e sem obstáculo o seu dote e a sua herança, e nada pagará por sua parte, dote ou herança do que ela e seu marido possuírem no dia da morte deste, e ela pode permanecer na casa de seu marido por quarenta dias após a morte deste, período em que a sua parte lhe deve ser designada. 8. Nenhuma viúva será obrigada a casar‑se enquanto desejar viver sem um marido, desde que dê garantia de que não se casará sem nosso consentimento, se estiver sob a nossa dependência, ou sem a do senhor de quem ela depende, se estiver sob dependência de outrem. (...) 10. Se alguém tomou emprestado dos judeus qualquer soma, grande ou pequena, e morrer antes que a dívida tenha sido paga, o débito não terá juros enquanto o herdeiro for de menoridade, de quem quer que seja seu curador; e se a dívida vier às nossas mãos, apenas assumiremos a soma principal mencionada no ato escrito. 11. E se alguém morrer e tiver dívidas para com os judeus, a sua esposa terá a sua parte, e nada pagará daquele débito; e se os filhos do falecido forem de menoridade, as suas necessidades serão salvaguardadas conforme os haveres do falecido, e do remanescente a dívida será paga, excetuando‑se o que é devido aos senhores; do mesmo modo se procederá para os débitos com outros que não judeus. 12. Nenhuma scutage ou ajuda será imposta no nosso reinado, exceto pelo conselho comum do nosso reino, a menos para o resgate da nossa pessoa, a cavalaria do nosso filho mais velho e uma vez para o casamento da nossa filha mais velha, e para tais casos apenas uma ajuda razoável será paga; proceder‑se‑á igualmente a respeito das ajudas da cidade de Londres. 13. E a cidade de Londres terá todas as suas antigas liberdades e todos os seus direitos alfandegários livres, tanto por terra como por mar. E mais, queremos e concedemos que todas as outras cidades, burgos, vilas e portos tenham todas as suas liberdades e direitos alfandegários livres. 14. E para consultar o conselho comum do reino a respeito do estabelecimento de outros tributos que não os três casos acima mencionados, ou para o estabelecimento da scutage, faremos notificar os arcebispos, os bispos, os abades, os condes, e maiores barões, individualmente, por carta nossa; e, além disso, faremos notificar em geral, por meio dos nossos sheriffs e bailios, todos aqueles que, como chefes, de nós receberam benefícios para um dia fixado, a saber, quarenta dias pelo menos após a notificação, e num lugar fixado. E em todas as cartas de tais notificações explicaremos as suas causas. Sendo feitas as notificações, proceder‑se‑á no dia indicado conforme o conselho daqueles que estiverem presentes, mesmo que nem todos os que foram notificados compareçam. 15. No futuro não concederemos a ninguém permissão para exigir uma ajuda dos seus homens livres, exceto para o resgate da sua pessoa, a cavalaria do seu filho mais velho ou, uma vez apenas, para o casamento da sua filha mais velha, casos em que apenas uma ajuda razoável será cobrada. 16. Ninguém será forçado a prestar mais serviços por um feudo de cavaleiro, ou outra tenência livre, além dos que deve em consequência disso. 17. As demandas dos comuns não transcorrerão mais na nossa corte, mas noutro local indicado. (...) 19. E em caso de que as referidas sessões não possam ocorrer no período da corte do condado, tantos cavaleiros e possuidores livres de tenências permanecerão, entre aqueles presentes àquela corte, quantos possam ser necessários para a administração da justiça, conforme seja maior ou menor o volume das questões. 20. Um homem livre será punido por um pequeno crime apenas, conforme a sua medida; para um grande crime ele será punido conforme a sua magnitude, conservando a sua posição; um mercador igualmente conservando o seu comércio, e um vilão conservando a sua cultura, se obtiverem a nossa mercê; e nenhuma das referidas punições será imposta exceto pelo julgamento de homens honestos do distrito. (...) 38. Nenhum bailio levará, de hoje em diante, alguém a julgamento, com base apenas na sua palavra, sem testemunhas dignas de crédito para apoiá‑lo. 39. Nenhum homem livre será capturado ou aprisionado, ou desapropriado dos seus bens, ou declarado fora da lei, ou exilado, ou de algum modo lesado, nem nós iremos contra ele, nem enviaremos ninguém contra ele, exceto pelo julgamento legítimo dos seus pares ou pela lei do país. 40. A ninguém venderemos, a ninguém negaremos ou retardaremos direito ou justiça. 41. Todos os mercadores terão liberdade e segurança para sair, entrar, permanecer e viajar através da Inglaterra, tanto por terra como por mar, para comprar e vender, livres de todos os direitos de pedágio iníquos, segundo as antigas e justas taxas, exceto em tempo de guerra, caso sejam do país que está lutando contra nós. E se tais forem encontrados no nosso país no início da guerra serão capturados sem prejuízo dos seus corpos e mercadorias, até que seja sabido por nós, ou pelo nosso chefe de justiça, como os mercadores do nosso país são tratados, se foram encontrados no país em guerra contra nós; e se os nossos estiverem a salvo lá, estes estarão a salvo no nosso país. (...) 46. Todos os barões que fundaram abadias, das quais possuem cartas dos reis de Inglaterra, ou das quais dispõem de uma possessão antiga, terão a custódia delas quando desabitadas como devem tê‑la. 47. Todas as florestas criadas no nosso tempo de reinado serão imediatamente liberadas o mesmo se fará com todas as represas fluviais que no nosso tempo de governo foram feitas nas reservas. 48. Todas as taxas exageradas concernentes a florestas e pastagens, e os foresters, guardiães de pastagens, sheriffs e seus auxiliares, represas fluviais e os seus guardiães deverão imediatamente ser examinados em cada condado por doze cavaleiros ordenados do mesmo condado, os quais serão eleitos pelos homens honestos do mesmo lugar, e dentro de quarenta dias após a realização do exame tais taxas serão completa e irrevogavelmente eliminadas por eles, previsto que nós, ou o nosso chefe de justiça, se não estivermos na Inglaterra, previamente tenhamos conhecimento disso. 49. Nós devolveremos imediatamente todos os reféns e cartas entregues a nós por ingleses como garantia de paz ou de serviço leal. (...) 52. Se alguém foi desalojado ou desapropriado por nós, sem o julgamento legítimo dos seus pares, das suas terras, haveres, liberdades ou direitos, imediatamente os devolveremos a ele; e se surgir uma discórdia a este respeito, então será esclarecida pelo veredicto dos vinte e cinco barões, cuja menção é feita abaixo na cláusula para a garantia da paz. Mas, com respeito a todas aquelas coisas das quais alguém foi desapropriado ou privado sem o legítimo julgamento dos seus pares, pelo rei Henry nosso pai, ou rei Richard, nosso irmão, e as quais temos na nossa mão, ou que outros dispõem, e aos quais estamos obrigados a garanti‑las, teremos uma prorrogação até o termo usual dos cruzados, exceção feita àquelas a respeito das quais uma demanda foi iniciada ou uma inquisição feita por nossa ordem, antes da nossa assunção da cruz; e quando retornarmos da nossa peregrinação, ou se por acaso permanecermos, imediatamente faremos plena justiça. (...) 54. Ninguém será capturado ou aprisionado a pedido de uma mulher pela morte de uma pessoa que não o seu marido. 55. Todas as multas lançadas por nós injustamente e contra a lei do país, e todas as penas prescritas injustamente e contra a lei do país, serão inteiramente perdoadas, ou então será dado um veredicto pelos vinte e cinco barões, dos quais se faz menção abaixo na cláusula para a garantia da paz, ou pelo veredicto da maior parte deles, juntamente com o referido Stephen, arcebispo de Canterbury, se puder estar presente, e outros que ele possa desejar indicar para esta finalidade; e se ele não puder estar presente, o processo far‑se‑á sem ele, desde que, se um ou mais de um dos referidos vinte e cinco barões estiver implicado numa demanda deste tipo, ele ou eles serão afastados nessa ocasião, e um outro ou outros, eleitos e juramentados pelo restante dos vinte e cinco, para esta vez somente, completarão o número. 56. Se desabrigamos ou desapropriamos galeses de terras, ou liberdades ou outras coisas, sem o legítimo julgamento dos seus pares, na Inglaterra ou em Gales, estas serão imediatamente devolvidas a eles; e se surgir uma disputa a este respeito, então será esclarecida na fronteira pelo julgamento segundo a lei de Gales para as possessões galesas, e segundo a lei da fronteira para as possessões da fronteira. Os Galeses farão o mesmo para nós e os nossos. (...) 58. Devolveremos imediatamente o filho de Llewelyn, e todos os reféns de Gales, e as cartas que a nós foram entregues como garantia da paz. 59. Nós agiremos em relação a Alexander, rei dos Escoceses, com respeito às suas irmãs, e a devolução dos reféns, e as suas liberdades e o seu direito, da maneira como agiremos com os nossos outros barões da Inglaterra, a menos que deva ser diferentemente, conforme as cartas que recebemos de William, seu pai, anteriormente rei dos Escoceses; e isto se fará por intermédio do julgamento dos seus pares na nossa corte. 60. E mais, todos os referidos costumes e liberdades que concedemos para serem observados no nosso reino, na medida em que nos concerne em relação aos nossos homens, clérigos ou leigos, estes deverão observar em relação aos seus próprios homens. (...) 63. Razão por que desejamos e firmemente ordenamos que a igreja inglesa seja livre e que os homens do nosso reino tenham e conservem todas as liberdades, direitos e concessões acima, sólidos e em paz, livre e serenamente, plena e completamente, para si e para os seus herdeiros, em todas as coisas e lugares, perpetuamente como será dito. Isto foi jurado por nós e por nossos barões, que tudo o acima referido será mantido em boa‑fé e sem malícia. 12.2. A DECLARAÇÃO INGLESA DE DIREITOS DE 1689 (BILL OF RIGHTS) Noções gerais A declaração dos direitos dos cidadãos é uma relação de considerandos de grande valia para as pessoas. De posse desses direitos o povo alcançaria a liberdade política, religiosa e de expressão. Então surgiu no Reino Unido, aprovada pelo Parlamento da época em 1689, uma lista de declaração de direitos dos cidadãos, denominada “Bill of Rights”, que se tratava de uma proposta de lei. O art. 9o definiu que a liberdade de expressão, e os debates ou procedimentos no Parlamento não deveriam ser impedidos ou questionados por qualquer tribunal ou local fora do Parlamento. A predominância burguesa neste parlamento gerou as condições esperadas para o desenvolvimento da indústria e do capitalismo (sécs. XVIII e XIX). Segundo Micheline R. Ishay,42 o Rei Jaime II empenhou‑se em destruir e extirpar a religião protestante e as leis e liberdades deste reino: 42 ISHAY, Micheline R. (org.). Direitos humanos: uma antologia. São Paulo: Edusp, 2006, p. 171-173. 1. Assumindo e exercendo o poder de revogar e suspender leis, e a execução das leis, sem o consentimento do Parlamento. 2. Prendendo e processando diversos prelados dignos, por solicitarem humildemente a dispensa de cooperar com o dito poder assumido. 3. Criando e fazendo executar uma comissão sob o grande selo para erigir um tribunal chamado Tribunal de comissários de causas eclesiásticas. 4. Fazendo arrecadação de dinheiro para uso da Coroa, sob pretexto de prerrogativa, em momento e de maneira diferentes daqueles feitos pelo Parlamento. 5. Criando e mantendo um exército permanente dentro deste reino em tempo de paz, sem o consentimento do Parlamento, e aquartelando soldados contrariamente à lei. 6. Fazendo que vários bons súditos, por serem protestantes, fossem desarmados, ao mesmo tempo que os papistas eram armados e empregados, contrariamente à lei. 7. Violando a liberdade de escolha de membros para servir no Parlamento. 8. Por acusações no tribunal do Rei, por questões e causas que apenas o Parlamento podia conhecer; e por diversas outras ações arbitrárias e ilegais. 9. E considerando que em anos anteriores pessoas parciais, corruptas e desqualificadas foram eleitas e serviram como jurados em julgamentos, e particularmente em diversos júris em julgamentos por alta traição, e que não eram donas de propriedades livres e alodiais. 10. E uma fiança excessiva tem sido exigida de pessoas presas em casos criminais, para eludir o benefício das leis feitas para a liberdade dos súditos. 11. E multas excessivas têm sido impostas; e punições cruéis e ilegais infligidas. 12. E diversas concessões e promessas feitas de multas e confiscos, antes de qualquer condenação ou julgamento das pessoas a quem seriam impostas. Tudo o que é contrário expressa e diretamente às leis e estatutos conhecidos, e à liberdade deste reino. E considerando que, tendo o dito falecido Rei Jaime abdicado do governo e estando vago, portanto, o trono, sua Alteza o príncipe de Orange (que aprouve a Deus Todo‑Poderoso ser o instrumento glorioso de libertação deste reino do papismo e do poder arbitrário) ordenou (a conselho dos lordes espirituais e temporais, e de diversas pessoas principais dos Comuns) que fossem escritas cartas aos lordes espirituais e temporais, que fossem protestantes; e outras cartas para vários condados, cidades, universidades, burgos, e aos cinco portos, para que escolhessem essas pessoas para representá‑los, com direito a serem enviadas ao Parlamento, para reunirem‑se e sentarem em Westminster no segundo e vigésimo dia de janeiro, neste ano de mil, seiscentos e sessenta e oito, a fim de que, com tal procedimento, suas religiões, leis e liberdades não estivessem ameaçadas de subversão; e com base em tais cartas, eleições foram devidamente realizadas. E, portanto, os ditos lordes espirituais e temporais, e os comuns, respeitando suas respectivas cartas e eleições, estando agora reunidos como plenos e livres representantes desta nação, considerando mui seriamente os melhores meios de atingir os fins acima ditos, declaram, em primeiro lugar (como seus antepassados fizeram comumente em caso semelhante), para reivindicar e garantir seus antigos direitos e liberdades: 1. Que é ilegal o pretendido poder de suspender leis, ou a execução de leis, pela autoridade real, sem o consentimento do Parlamento. 2. Que é ilegal o pretendido poder de revogar leis, ou a execução de leis, por autoridade real, como foi assumido e praticado em tempos passados. 3. Que a comissão para criar o recente Tribunal de comissários para as causas eclesiásticas, e todas as outras comissões e tribunais de igual natureza, são ilegais e perniciosos. 4. Que é ilegal a arrecadação de dinheiro para uso da Coroa, sob pretexto de prerrogativa, sem autorização do Parlamento, por um período de tempo maior, ou de maneira diferente daquela como é feita ou outorgada. 5. Que constitui um direito dos súditos apresentarem petições ao Rei, sendo ilegais todas as prisões ou acusações por motivo de tais petições. 6. Que levantar e manter um exército permanente dentro do reino em tempo de paz é contra a lei, salvo com permissão do Parlamento. 7. Que os súditos que são protestantes possam ter armas para sua defesa adequadas a suas condições, e permitidas por lei. 8. Que devem ser livres as eleições dos membros do Parlamento. 9. Que a liberdade de expressão, e debates ou procedimentos no Parlamento, não devem ser impedidos ou questionados por qualquer tribunal ou local fora do Parlamento. 10. Que não deve ser exigida fiança excessiva, nem impostas multas excessivas; tampouco infligidas punições cruéis e incomuns. 11. Que os jurados devem ser devidamente convocados e nomeados, e devem ser donos de propriedade livre e alodial os jurados que decidem sobre as pessoas em julgamentos de alta traição. 12. Que são ilegais e nulas todas as concessões e promessas de multas e confiscos de pessoas particulares antes de condenação. 13. E que os Parlamentos devem reunir‑se com frequência para reparar todos os agravos, e para corrigir, reforçar e preservar as leis. E reclamam, pedem e insistem que todas essas premissas constituem seus direitos e liberdades inquestionáveis; e que nenhumas declarações, julgamentos, atos ou procedimentos, para prejuízo do povo em alguma das ditas premissas, devem ser, de alguma maneira, tomadas no futuro como precedente ou exemplo. A essa demanda de seus direitos são particularmente encorajados pela declaração de sua Alteza o príncipe de Orange, como sendo o único meio de obter plena reparação e correção nessa questão. 12.3. DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DA VIRGÍNIA, DE 12 DE JUNHO DE 1776 Noções introdutórias É uma declaração de direitos, com inspirações iluministas, que se reveste do contexto histórico da independência dos Estados Unidos. Seu texto foi de autoria de George Naron. Nota‑se nos dois primeiros parágrafos o interesse por um Estado Democrático. Os primeiros reconhecimentos normativos da igualdade essencial da condução humana remonta justamente a esta Declaração de 1776, junto com a Declaração dos Direitos do Homem de 1789, da França, uma vez que proclamam as liberdades individuais e igualdade perante a lei. Já nesta época se preocupava com os privilégios e a hereditariedade dos cargos públicos. Artigos de maior relevância Art. 1o – Trata do direito de igualdade, quando aponta que todos os homens nascem igualmente livres e independentes, têm direitos certos, essenciais e naturais dos quais não podem, por nenhum contrato, privar nem despojar sua posteridade: tais são o direito de gozar a vida e a liberdade com os meios de adquirir e possuir propriedades, de procurar obter a felicidade e a segurança. Art. 2o – Relata o constitucionalismo, quando aponta o povo como titular do poder. Art. 3o – Dispõe que o governo é ou deve ser instituído para o bem comum, para a proteção e segurança do povo, da nação ou da comunidade. Dos métodos ou formas, o melhor será que se possa garantir, no mais alto grau, a felicidade e a segurança e o que mais realmente resguarde contra o perigo de má administração. Art. 4o – Versa que nenhum homem e nenhum colégio ou associação de homens pode ter outros títulos para obter vantagens ou prestígios, particulares, exclusivos e distintos dos da comunidade, a não ser em consideração de serviços prestados ao público, e, a este título, não serão nem transmissíveis aos descendentes nem hereditários, a ideia de que um homem nasça magistrado, legislador, ou juiz, é absurda e contrária à natureza. Art. 5o – Traz o equilíbrio e a separação dos poderes como ato norteador de segurança nas relações democráticas. Art. 6o – Apresenta as eleições livres o direito ao sufrágio. Art. 7o – Prestigia o direito da propriedade; e sua restrição por lei. Art. 8o – Relata que todo o poder de deferir as leis ou de embaraçar a sua execução, qualquer que seja a autoridade, sem o seu consentimento dos representantes do povo, é um atentado aos seus direitos e não tem cabimento. Art. 9o – Revela o princípio da anterioridade e da reserva legal. Art. 10o – Contempla que em todos os processos por crimes todo o acusado tem o direito de questionar a causa e a natureza da acusação que lhe é intentada; de apresentar ou requerer a apresentação de testemunhas e de tudo que for a seu favor, de exigir processo rápido por um júri imparcial e de sua circunvizinhança, sem o consentimento unânime do qual ele não poderá ser declarado culpado. Não pode ser forçado a produzir provas contra si próprio; e nenhum indivíduo pode ser privado de sua liberdade, a não ser por um julgamento dos seus pares, em virtude da lei do país. Art. 11o – Revela que não devem ser exigidas cauções excessivas, nem impostas multas demasiadamente fortes, nem aplicadas penas cruéis e desusadas. Art. 12o – Afirma que todas as ordens de prisão são vexatórias e opressivas se forem expedidas sem provas suficientes e se a ordem ou requisição nelas transmitidas a um oficial ou a um mensageiro do Estado, para efetuar buscas em lugares suspeitos, deter uma ou várias pessoas, ou tomar seus bens, não contiver uma indicação e uma descrição especiais dos lugares, das pessoas ou das coisas que dela forem objeto; semelhantes ordens jamais devem ser concedidas. Art. 13o – Relata que nas causas que interessem à propriedade ou os negócios pessoais, a antiga forma de processo por jurados é preferível a qualquer outra, e deve ser considerada como sagrada. Art. 14o – Traz que a liberdade de imprensa é um dos mais fortes baluartes da liberdade do Estado e só pode ser restringida pelos governos despóticos. (...) Art. 16o – Dispõe que o povo tem direito a um governo uniforme; deste modo não deve legitimamente ser instituído nem organizado nenhum governo separado, nem independente do da Virgínia, nos limites do Estado. Art. 17o – Versa que um povo não pode conservar um governo livre e a felicidade da liberdade, a não ser pela adesão firme e constante às regras da justiça, da moderação, da temperança, de economia e da virtude e pelo apelo frequente aos seus princípios fundamentais. Art. 18o – Contempla o direito de credo por convicção, e jamais pela força e pela violência. É dever recíproco de todos os cidadãos praticar a tolerância cristã, o amor à caridade uns com os outros. 12.4. DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DO HOMEM E DO CIDADÃO DE 1789 Noções gerais A Assembleia Nacional Constituinte da França, seguindo nortes idealizadores do iluminismo, da Revolução Francesa e da Revolução Americana de 1776, apresentou a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, codificada em um preâmbulo e 17 artigos contendo seus ideais de liberdade. Inspirou as Constituições Francesas da mesma forma que baseou‑se em instrumentos revolucionários. Foi premissa fundamental da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1789: Artigos de maior relevância Os representantes do povo francês, constituídos em Assembleia Nacional, considerando que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo dos direitos do homem são as únicas causas das desgraças públicas e da corrupção dos Governos, resolveram expor em declaração solene os Direitos naturais, inalienáveis e sagrados do Homem, a fim de que esta declaração, constantemente presente em todos os membros do corpo social, lhes lembre sem cessar os seus direitos e os seus deveres; a fim de que os atos do Poder legislativo e do Poder executivo, a instituição política, sejam por isso mais respeitados; a fim de que as reclamações dos cidadãos, doravante fundadas em princípios simples e incontestáveis, se dirijam sempre à conservação da Constituição e à felicidade geral. Por consequência, a Assembleia Nacional reconhece e declara, na presença e sob os auspícios do Ser Supremo, os seguintes direitos do Homem e do Cidadão: Art. 1o Os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem fundar‑se na utilidade comum. Art. 2o O fim de toda a associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis do homem. Esses direitos são a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão. Art. 3o O princípio de toda a soberania reside essencialmente na Nação. Nenhuma corporação, nenhum indivíduo pode exercer autoridade que aquela não emane expressamente. Art. 4o A liberdade consiste em poder fazer tudo aquilo que não prejudique outrem: assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão os que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes limites apenas podem ser determinados pela Lei. Art. 5o A lei não proíbe senão as ações nocivas à sociedade. Tudo que não é vedado pela lei não pode ser obstado e ninguém pode ser constrangido a fazer o que ela não ordene. Art. 6o A Lei é a expressão da vontade geral. Todos os cidadãos têm o direito de concorrer, pessoalmente ou através dos seus representantes, para a sua formação. Ela deve ser a mesma para todos, quer se destine a proteger quer a punir. Todos os cidadãos são iguais a seus olhos, são igualmente admissíveis a todas as dignidades, lugares e empregos públicos, segundo a sua capacidade, e sem outra distinção que não seja a das suas virtudes e dos seus talentos. Art. 7o Ninguém pode ser acusado, preso ou detido senão nos casos determinados pela Lei e de acordo com as formas por esta prescritas. Os que solicitam, expedem, executam ou mandam executar ordens arbitrárias devem ser castigados; mas qualquer cidadão convocado ou detido em virtude da Lei deve obedecer imediatamente, senão torna‑se culpado de resistência. Art. 8o A Lei apenas deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias, e ninguém pode ser punido senão em virtude de uma lei estabelecida e promulgada antes do delito e legalmente aplicada. Art. 9o Todo o acusado se presume inocente até ser declarado culpado e, se se julgar indispensável prendê ‑lo, todo o rigor não necessário à guarda da sua pessoa, deverá ser severamente reprimido pela Lei. Art. 10o Ninguém pode ser inquietado pelas suas opiniões, incluindo opiniões religiosas, contanto que a manifestação delas não perturbe a ordem pública estabelecida pela Lei. Art. 11o A livre comunicação dos pensamentos e das opiniões é um dos mais preciosos direitos do Homem; todo o cidadão pode, portanto, falar, escrever, imprimir livremente, respondendo, todavia, pelos abusos desta liberdade nos termos previstos na Lei. Art. 12o A garantia dos direitos do Homem e do Cidadão carece de uma força pública; esta força é, pois, instituída para vantagem de todos, e não para utilidade particular daqueles a quem é confiada. Art. 13o Para a manutenção da força pública e para as despesas de administração é indispensável uma contribuição comum, que deve ser repartida entre os cidadãos de acordo com as suas possibilidades. Art. 14o Todos os cidadãos têm o direito de verificar, por si ou pelos seus representantes, a necessidade da contribuição pública, de consenti‑la livremente, de observar o seu emprego e de lhe fixar a repartição, a coleta, a cobrança e a duração. Art. 15o A sociedade tem o direito de pedir contas a todo o agente público pela sua administração. Art. 16o Qualquer sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos, nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição. Art. 17o Como a propriedade é um direito inviolável e sagrado, ninguém dela pode ser privado, a não ser quando a necessidade pública legalmente comprovada o exigir evidentemente e sob condição de justa e prévia indenização. 12.5. A CONSTITUIÇÃO MEXICANA DE 1917 Venustiano Carranza (Primeiro‑Chefe do Exército, encarregado do poder executivo mexicano) convocou a Assembleia Constituinte, cumprindo o estipulado no plano de Guadalupe; vindo a substituir a Constituição Mexicana de 1857. Esta nova Contituição (a de 5 de fevereiro de 1917), oficialmente conhecida como Constitución Politica de los Estados Unidos Mexicanos que reforma la del 5 de febrero de 1857, é conhecida carta de representação popular, até porque promulgada. Ainda em termos de democracia, teve várias reformas após sua vigência. Em termos de concurso público, é importante o candidato saber que a Constituição Mexicana foi a primeira constituição da História a contemplar os direitos sociais, antes mesmo da Constituição de Weimar (em 1919). Tem características liberais, agrárias, nacionalista, de proteção do trabalhador e de senso social (direito à greve, jornada de oito horas, direito de associação em sindicatos, salário mínimo, limitação do trabalho infantil e feminino). Foi considerada inovadora porque anticlerical, por restringir a posse de explorações mineiras e de terras por estrangeiros. Foi alvo de diversas alterações desde a sua promulgação. Com a finalidade de melhor se localizar o leitor sobre as informações lançadas no capítulo II da Constituição Mexicana, são afirmadas algumas declarações de direitos: 1º – A fim de se realizar a socialização da terra, é abolida a propriedade privada da terra; todas as terras passam a ser propriedade nacional e são entregues aos trabalhadores sem qualquer espécie de resgate, na base de uma repartição igualitária em usufruto. As florestas, o subsolo e as águas que tenham importância nacional, todo o gado e todas as alfaias, assim como todos os domínios e todas as empresas agrícolas‑modelos passam a ser propriedade nacional. 2º – Como primeiro passo para a transferência completa das fábricas, das usinas, das minas, das ferrovias e de outros meios de produção e de transporte para a propriedade da República operária e camponesa dos Sovietes, o Congresso ratifica a lei soviética sobre a administração operária e sobre o Conselho Superior da Economia Nacional, com o objetivo de assegurar o poder dos trabalhadores sobre os exploradores. 3º – O Congresso ratifica a transferência de todos os bancos para o Estado operário e camponês como uma das condições de libertação das massas laboriosas do jugo do capital. 4º – Tendo em vista suprimir os elementos parasitas da sociedade e organizar a economia, é estabelecido o serviço do trabalho obrigatório para todos. 5º – A fim de assegurar a plenitude dos poderes das massas laboriosas e de afastar qualquer possibilidade de restauração do poder dos exploradores, o Congresso decreta o armamento dos trabalhadores, a formação de um exército vermelho socialista dos operários e camponeses e o desarmamento total das classes possuidoras. 12.6. CONSTITUIÇÃO ALEMà DE 1919 Noções gerais A Constituição do Império Alemão “Weimarer Verfassung”, ou simplesmente Weimar, foi o texto legal que governou a república de Weimar (1919-1933). Esta normatização instituiu a primeira república alemã, produto da guerra de 1914-1918. Apesar das boas intenções democráticas, ainda estava recalcada em detrimento do fato pós‑guerra, quando contou, além da derrota, com mais de dois milhões de homens mortos e uma multidão de mutilados. A Constituição de Weimar foi o marco do movimento constitucionalista que contemplava os direitos sociais, em plena ascensão do Estado Social, tais como educação, cultura, previdência, produção, trabalho etc. Redirecionou o Estado em prol da sociedade. Nota‑se este fato quando se verifica no texto a substituição do imperador pelo pesidente eleito democraticamente. Este nomeava o Chanceler do império que respondia ao parlamento (Reichstag). Esta Constituição não acabou com o histórico Império Alemão, entretanto lhe revestiu de democracia e perfil liberal. Observe que o nome do Estado Alemão ficou como Deutsches Reich até a derrota da Alemanha Nazista no final da Segunda Guerra Mundial. Hugo Preuss redigiu o projeto da Constituição, a qual foi considerada uma carta contraditória por confundir necessidades e momentos históricos distintos, pois tratava de ideias pré‑medievais com ideais socialistas e políticos. A assembleia ratificou o tratado de Versalhes, impondo à Alemanha indenizações decorrentes da guerra em montante insuportável causando um inevitável impacto financeiro. Uma década depois, com a queda da Bolsa de Nova York, não ocorreu outra coisa senão a destruição da República de Weimar (1933). Em que pese as contradições assinaladas e sua breve vigência, sua influência histórica exerceu decisiva importância sobre a evolução política no Ocidente. A implementação do Estado democrático social, juntamente com o já traçado dois anos antes pela Constituição do México de 1917, reestruturou uma nova Alemanha de 1919. A Constituição de Weimar tem estrutura dualista. Organiza o Estado em uma parte e declara direitos e deveres fundamentais em outra. Ademais, acrescentou as liberdades individuais e os direitos sociais. 12.7. DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS, de 1948 Noções gerais A Declaração Universal dos Direitos Humanos – DUDH, foi adotada pela ONU em 1948, quando proclamada pela Resolução no 217 A (III). Notabilizada pelo Canadá, Estados Unidos, França, China, Líbano entre, outros, traçou os direitos humanos básicos. Com o intuito de reconstruir o mundo, os dirigentes das nações emergentes do pós‑guerra definiram, na Conferência de Yalta, as bases de um futuro com paz bem como estabeleceram áreas de influência das potências e a criação de uma Organização que incentivasse a negociação nos conflitos internacionais, evitando guerras, promovendo a pacificação e a democracia e o engrandecimento dos Direitos Humanos. Pela leitura do seu preâmbulo, a DUDH foi influenciada decisivamente pelas atrocidades cometidas durante a 2ª Guerra Mundial. Nem todos os membros das Nações Unidas, à época, ratificaram a Declaração, porque os países comunistas da época (União Soviética, Ucrânia e Rússia Branca, Tchecoslováquia, Polônia e Iugoslávia), a Arábia Saudita e a África do Sul se abstiverem de votar. Trata-se de um documento com 30 artigos, típico direito de 3ª dimensão/geração. Porém, não tem força normativa internacional e nem executividade (não é um tratado internacional e não conduz à obrigatoriedade legal aos Estados). É uma recomendação principiológica, daí porque eventual descumprimento do mesmo só pode ser punido com base em costumes. No entanto, existem jusnaturalistas que entendem pela força jurídica da DUDH porque ela na verdade apenas declara direitos naturais que são obrigatórios mesmo sem reconhecimento estatal, muito embora não seja maioria. Por conta desta ausência de normatividade, os Estados resolveram criar dois importantes tratados internacionais, justamente para dar força normativa-executiva à Declaração Universal de 1948: Pacto de Direitos Internacional de Civis e Políticos, de 1966, destinados aos indivíduos, com aplicação imediata, e Direitos Econômicos Culturais e Sociais, de 1966, destinados aos Estados, com aplicação progressiva. Convenção Internacional de sobre a Erradicação de todas as formas de Discriminação Racial, de 1965, também é ato internacional que ajudou a executividade de direitos humanos, ante a inexistência de tal da Declaração Universal de 1948. Assim, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, formam a Carta Internacional dos Direitos Humanos, documento básico do sistema global de Proteção Internacional dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, aos quais se somam os tratados internacionais de direitos humanos, como a Convenção para Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio, a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, dentre outros. Objetivo proclamado A Assembleia Geral proclamou a Declaração Universal dos Direitos Humanos com os mesmos preceitos em comum a serem alcançados por todas as nações, objetivando que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta Declaração, se esforce, por meio da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, PREÂMBULO Com o interesse em vários pontos sociais, os dirigentes enfatizaram diversas considerações, que ora entendi prudente destacar: Preâmbulo Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo, Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os homens gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do homem comum, Considerando essencial que os direitos humanos sejam protegidos pelo Estado de Direito, para que o homem não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra tirania e a opressão, Considerando essencial promover o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações, Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na Carta, sua fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e no valor da pessoa humana e na igualdade de direitos dos homens e das mulheres, e que decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida em uma liberdade mais ampla, Considerando que os Estados-Membros se comprometeram a desenvolver, em cooperação com as Nações Unidas, o respeito universal aos direitos humanos e liberdades fundamentais e a observância desses direitos e liberdades, Considerando que uma compreensão comum desses direitos e liberdades é da mis alta importância para o pleno cumprimento desse compromisso, A Assembleia Geral proclama A presente Declaração Universal dos Diretos Humanos como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta Declaração, se esforce, através do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universais e efetivos, tanto entre os povos dos próprios Estados-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição. Artigo I Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade. Artigo II Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição. Artigo III Toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. Artigo IV Ninguém será mantido em escravidão ou servidão, a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as suas formas. Artigo V Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante. Artigo VI Toda pessoa tem o direito de ser, em todos os lugares, reconhecida como pessoa perante a lei. Artigo VII Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação. Artigo VIII Toda pessoa tem direito a receber dos tributos nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei. Artigo IX Ninguém será arbitrariamente preso, detido ou exilado. Artigo X Toda pessoa tem direito, em plena igualdade, a uma audiência justa e pública por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir de seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal contra ele. Artigo XI 1. Toda pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa. 2. Ninguém poderá ser culpado por qualquer ação ou omissão que, no momento, não constituíam delito perante o direito nacional ou internacional. Tampouco será imposta pena mais forte do que aquela que, no momento da prática, era aplicável ao ato delituoso. Artigo XII Ninguém será sujeito a interferências na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondência, nem a ataques à sua honra e reputação. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques. Artigo XIII 1. Toda pessoa tem direito à liberdade de locomoção e residência dentro das fronteiras de cada Estado. 2. Toda pessoa tem o direito de deixar qualquer país, inclusive o próprio, e a este regressar. Artigo XIV 1.Toda pessoa, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países. 2. Este direito não pode ser invocado em caso de perseguição legitimamente motivada por crimes de direito comum ou por atos contrários aos propósitos e princípios das Nações Unidas. Artigo XV 1. Toda pessoa tem direito a uma nacionalidade. 2. Ninguém será arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade. Artigo XVI 1. Os homens e mulheres de maior idade, sem qualquer restrição de raça, nacionalidade ou religião, têm o direito de contrair matrimônio e fundar uma família. Gozam de iguais direitos em relação ao casamento, sua duração e sua dissolução. 2. O casamento não será válido senão com o livre e pleno consentimento dos nubentes. Artigo XVII 1. Toda pessoa tem direito à propriedade, só ou 2.Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade. em sociedade com outros. Artigo XVIII Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, isolada ou coletivamente, em público ou em particular. Artigo XIX Toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras. Artigo XX 1. Toda pessoa tem direito à liberdade de reunião 2. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação. e associação pacíficas. Artigo XXI 1. Toda pessoa tem o direito de tomar parte no governo de seu país, diretamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos. 2. Toda pessoa tem igual direito de acesso ao serviço público do seu país. 3. A vontade do povo será a base da autoridade do governo; esta vontade será expressa em eleições periódicas e legítimas, por sufrágio universal, por voto secreto ou processo equivalente que assegure a liberdade de voto. Artigo XXII Toda pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social e à realização, pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento da sua personalidade. Artigo XXIII 1.Toda pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego. 2. Toda pessoa, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho. 3. Toda pessoa que trabalhe tem direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana, e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social. 4. Toda pessoa tem direito a organizar sindicatos e neles ingressar para proteção de seus interesses. Artigo XXIV Toda pessoa tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e férias periódicas remuneradas. Artigo XXV 1. Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle. 2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozarão da mesma proteção social. Artigo XXVI 1. Toda pessoa tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito. 2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos, e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz. 3. Os pais têm prioridade de direito à escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos. Artigo XXVII 1. Toda pessoa tem o direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar do processo científico e de seus benefícios. 2. Toda pessoa tem direito à proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de qualquer produção científica, literária ou artística da qual seja autor. Artigo XVIII Toda pessoa tem direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades estabelecidos na presente Declaração possam ser plenamente realizados. Artigo XXIV 1. Toda pessoa tem deveres para com a comunidade, em que o livre e pleno desenvolvimento de sua personalidade é possível. 2. No exercício de seus direitos e liberdades, toda pessoa estará sujeita apenas às limitações determinadas pela lei, exclusivamente com o fim de assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades de outrem e de satisfazer às justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática. 3. Esses direitos e liberdades não podem, em hipótese alguma, ser exercidos contrariamente aos propósitos e princípios das Nações Unidas. Artigo XXX Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada como o reconhecimento a qualquer Estado, grupo ou pessoa, do direito de exercer qualquer atividade ou praticar qualquer ato destinado à destruição de quaisquer dos direitos e liberdades aqui estabelecidos. A Declaração Universal dos Direitos Humanos – DUDH costuma ser bastante comum a comparação com os direitos nela previstos e aqueles constante do rol do art. 5º da CF/88. Por exemplo, a DUDH prevê o princípio da tipicidade penal, ao enfatizar que ninguém pode ser culpado por ação ou omissão que, no momento da sua prática, não constituía delito perante o direito nacional ou internacional, assim como direito à liberdade de opinião e expressão, a gratuidade da educação fundamental, o direito ao casamento, à organização de sindicato (muito embora não preveja unicidade sindical, como na CF-88), presunção de inocência, legalidade, vida privada, proteção do lar, ao trabalho, associação e reunião, direitos autorais, asilo, soberania popular etc. Não prevê, entretanto, vários direitos previstos no art. 5º da CF-88, como, por exemplo: a) o direito de resposta (prevê no art. XII direito à proteção da lei contra ofensas à vida privada, família, lar, correspondência e à honra e reputação, mas não diz expressamente sobre o direito de resposta); b) o direito à imagem; c) o direito do preso à assistência religiosa (prevê direito à liberdade religiosa, mas não cita esta assistência); d) desapropriação (prevê indiretamente quando garante que ninguém será privado arbitrariamente da sua propriedade); e) o direito à herança; f) a inafastabilidade da jurisdição (o art. X prevê direito a audiência justa e pública em um tribunal independente e imparcial, para decidir sobre seus direitos e deveres ou sobre os fundamentos da acusação criminal, mas não coloca tal tribunal no âmbito do Judiciário, daí porque o país que criar o sistema do contencioso administrativo, como na França, não estará violando a DUDH); g) o direito de petição; h) o direito à gratuidade de certidões (prevê apenas gratuidade para instrução fundamental, no art. XXVI); i) o direito ao “habeas corpus” e outros remédios heroicos etc. Questões de concursos 09) (SEJUS-ES, Cespe - Agente Penitenciário - 2009) Segundo a Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, julgue os itens que se seguem em (C) CERTO ou (E) ERRADO. a) Ninguém pode ser arbitrariamente detido, preso ou exilado. b) O direito à educação e o direito de participação na vida cultural da comunidade são expressamente consagrados, assim como o direito à igual proteção da lei e à liberdade de locomoção. c) O suspeito da prática de crime não é considerado inocente, ainda que não tenha havido pronunciamento judicial acerca do fato por ele praticado. a) C, C, C b) C, C, E c) C, E, C d) E, C, C 10) SEAD-AP, FMZ - Agente Penitenciário - 2010) Com base na Declaração Universal dos Direitos Humanos é CORRETO afirmar que a) tal Declaração constitui um ideal comum a ser atingido por todos os povos e nações ocidentais b) muito embora todas as pessoas nasçam livres e iguais em dignidade e direitos, nem todas são dotadas de razão e consciência; c) toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras; d) a proteção aos direitos assegurados através da Declaração não impede que a pessoa sofra interferências na sua vida privada ou em seu lar, sempre que tais interferências se mostrarem adequadas para resguardar os interesses do Estado; e) toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos na Declaração, salvo aquelas pessoas que ostentem condição especial, tal como os portadores de deficiência Questão 11. A Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948) constitui, do ponto de vista técnico-jurídico brasileiro, a) Uma recomendação; b) Um acordo internacional. c) Um decreto; d) Um pacto internacional; e) Um tratado internacional. 12.8. PACTO INTERNACIONAL SOBRE DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS Introdução Assembleia Geral das Nações Unidas, em 19-12-1966 adotou o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais pela XXI Sessão. O Brasil, pelo Decreto Legislativo n o 226/1991, o aprovou e, ato seguinte, em 6-7-1992, o promulgou pelo Decreto no 591/1992. O Pacto Internacional subdivide‑se em cinco partes, a saber: 1) à autodeterminação dos povos e à livre disposição de seus recursos naturais e riquezas; 2) ao compromisso dos Estados de implementar os direitos previstos; 3) aos direitos propriamente ditos; 4) ao mecanismo de supervisão por meio da apresentação de relatórios ao Conselho Econômico e Social – ECOSOC; e 5) às normas referentes à sua ratificação e entrada em vigor. Para garantir judicialmente os direitos aqui elencados, os direitos econômicos, sociais e culturais possuem eficácia dúbia, ou seja, contemplação dos direitos civis e políticos e, segundo a doutrina processual, a migração para os interesses jurídicos transindividuais, abordando instrumentalidade de dedução das contendas. O seu preâmbulo se apresenta por considerandos e acordam: (...) Considerando que, em conformidade com os princípios proclamados na Carta das Nações Unidas, o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo, Reconhecendo que esses direitos decorrem da dignidade inerente à pessoa humana, Reconhecendo que, em conformidade com a Declaração Universal dos Direitos do Homem. O ideal do ser humano livre, liberto do temor e da miséria. Não pode ser realizado a menos que se criem condições que permitam a cada um gozar de seus direitos econômicos, sociais e culturais, assim como de seus direitos civis e políticos, Considerando que a Carta das Nações Unidas impõe aos Estados a obrigação de promover o respeito universal e efetivo dos direitos e das liberdades do homem, Compreendendo que o indivíduo, por ter deveres para com seus semelhantes e para com a coletividade a que pertence, tem a obrigação de lutar pela promoção e observância dos direitos reconhecidos no presente Pacto, O Pacto procura estabelecer, por meio de dispositivos legais, as condições sociais, econômicas e culturais para uma vida digna. E assim estabelece: São direitos econômicos aqueles relacionados à produção, distribuição e consumo da riqueza, disciplinando as relações trabalhistas, condições justas e favoráveis (remuneração), sem diferença entre os sexos, higiene e segurança, lazer e descanso e promoção por tempo de serviço e capacidade, fundar ou se associar a sindicato (direito civil) e fazer greve, segurança social, proteção da família, das mães e das gestantes, proibição do trabalho infantil e restrição do trabalho de crianças e adolescentes (art. 10). Já os direitos sociais e culturais dizem respeito ao estabelecimento de um padrão de vida adequado, incluindo a instrução e a participação na vida cultural da comunidade, como preveem os arts. 11 a 15, destacando‑se a proteção contra a fome, o direito à alimentação, vestimenta, moradia, educação, participação na vida cultural e desfrutar do progresso científico etc. Artigos de maior relevância Após este breve comentário a respeito do Pacto, trataremos de verificar o que acordaram no instrumento, dentre outras, as seguintes normas de maior relevância: Artigo 1o 1. Todos os povos têm direito a autodeterminação. Em virtude desse direito, determinam livremente seu estatuto político e asseguram livremente seu desenvolvimento econômico, social e cultural. 2. Para a consecução de seus objetivos, todos os povos podem dispor livremente de suas riquezas e de seus recursos naturais, sem prejuízo das obrigações decorrentes da cooperação econômica internacional, baseada no princípio do proveito mútuo, e do Direito Internacional. Em caso algum, poderá um povo ser privado de seus próprios meios de subsistência. 3. Os Estados‑Partes do Presente Pacto, inclusive aqueles que tenham a responsabilidade de administrar territórios não autônomos e territórios sob tutela, deverão promover o exercício do direito à autodeterminação e respeitar esse direito, em conformidade com as disposições da Carta das Nações Unidas. Artigo 2o 1. Cada Estado‑Parte do presente Pacto compromete‑se a adotar medidas, tanto por esforço próprio como pela assistência e cooperação internacionais, principalmente nos planos econômico e técnico, até o máximo de seus recursos disponíveis, que visem a assegurar, progressivamente, por todos os meios apropriados, o pleno exercício dos direitos reconhecidos no presente Pacto, incluindo, em particular, a adoção de medidas legislativas. 2. Os Estados‑Partes do presente Pacto comprometem‑se a garantir que os direitos nele enunciados se exercerão sem discriminação alguma por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, situação econômica, nascimento ou qualquer outra situação. 3. Os países em desenvolvimento, levando devidamente em consideração os direitos humanos e a situação econômica nacional, poderão determinar em que garantirão os direitos econômicos reconhecidos no presente Pacto àqueles que não sejam seus nacionais. Artigo 3o Os Estados‑Partes do presente Pacto comprometem‑se a assegurar a homens e mulheres igualdade no gozo de todos os direitos econômicos, sociais e culturais enumerados no presente Pacto. Artigo 4o Os Estados‑Partes do presente Pacto reconhecem que, no exercício dos direitos assegurados em conformidade com o presente Pacto pelo Estado, este poderá submeter tais direitos unicamente às limitações estabelecidas em lei, somente na medida compatível com a natureza desses direitos e exclusivamente com o objetivo de favorecer o bem‑estar geral em uma sociedade democrática. Artigo 5o 1. Nenhuma das disposições do presente Pacto poderá ser interpretada no sentido de reconhecer a um Estado, grupo ou indivíduo qualquer direito de dedicar‑se a quaisquer atividades ou de praticar quaisquer atos que tenham por objetivo destruir os direitos ou liberdades reconhecidos no presente Pacto ou impor ‑lhe limitações mais amplas do que aquelas nele previstas. 2. Não se admitirá qualquer restrição ou suspensão dos direitos humanos fundamentais reconhecidos ou vigentes em qualquer país em virtude de leis, convenções, regulamentos ou costumes, sob pretexto de que o presente Pacto não os reconheça ou os reconheça em menor grau. Artigo 6o 1. Os Estados‑Partes do presente Pacto reconhecem o direito ao trabalho, que compreende o direito de toda pessoa de ter a possibilidade de ganhar a vida mediante um trabalho livremente escolhido ou aceito, e tomarão medidas apropriadas para salvaguardar esse direito. 2. As medidas que cada Estado‑Parte do presente Pacto tomará a fim de assegurar o pleno exercício desse direito deverão incluir a orientação e a formação técnica e profissional, a elaboração de programas, normas e técnicas apropriadas para assegurar um desenvolvimento econômico, social e cultural constante e o pleno emprego produtivo em condições que salvaguardem aos indivíduos o gozo das liberdades políticas e econômicas fundamentais. Artigo 7o Os Estados‑Partes do presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa de gozar de condições de trabalho justas e favoráveis, que assegurem especialmente: a) uma remuneração que proporcione, no mínimo, a todos os trabalhadores: i) um salário equitativo e uma remuneração igual por um trabalho de igual valor, sem qualquer distinção; em particular, as mulheres deverão ter a garantia de condições de trabalho não inferiores às dos homens e perceber a mesma remuneração que eles por trabalho igual; ii) uma existência decente para eles e suas famílias, em conformidade com as disposições do presente Pacto; b) a segurança e a higiene no trabalho; c) igual oportunidade para todos de serem promovidos, em seu trabalho, à categoria superior que lhes corresponda, sem outras considerações que as de tempo de trabalho e capacidade; d) o descanso, o lazer, a limitação razoável das horas de trabalho e férias periódicas remuneradas, assim como a remuneração dos feridos. Artigo 8o 1. Os Estados‑Partes do presente Pacto comprometem‑se a garantir: a) o direito de toda pessoa de fundar com outras, sindicatos e de filiar‑se ao sindicato de escolha, sujeitando‑se unicamente aos estatutos da organização interessada, com o objetivo de promover e de proteger seus interesses econômicos e sociais. O exercício desse direito só poderá ser objeto das restrições previstas em lei e que sejam necessárias, em uma sociedade democrática, no interesse da segurança nacional ou da ordem pública, ou para proteger os direitos e as liberdades alheias; b) o direito dos sindicatos de formar federações ou confederações nacionais e o direito destas de formar organizações sindicais internacionais ou de filiar‑se às mesmas; c) o direito dos sindicatos de exercer livremente suas atividades, sem quaisquer limitações além daquelas previstas em lei e que sejam necessárias, em uma sociedade democrática, no interesse da segurança nacional ou da ordem pública, ou para proteger os direitos e as liberdades das demais pessoas; d) o direito de greve, exercido de conformidade com as leis de cada país. 2. O presente artigo não impedirá que se submeta a restrições legais o exercício desses direitos pelos membros das forças armadas, da política ou da administração pública. 3. Nenhuma das disposições do presente artigo permitirá que os Estados‑Partes da Convenção de 1948 da Organização Internacional do Trabalho, relativa à liberdade sindical e à proteção do direito sindical, venham a adotar medidas legislativas que restrinjam – ou a aplicar a lei de maneira a restringir as garantias previstas na referida Convenção. Artigo 9o Os Estados‑Partes do presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa à previdência social, inclusive ao seguro social. Artigo 10 Os Estados‑Partes do presente Pacto reconhecem que: (...) 3. Devem‑se adotar medidas especiais de proteção e de assistência em prol de todas as crianças e adolescentes, sem distinção alguma por motivo de filiação ou qualquer outra condição. Devem‑se proteger as crianças e adolescentes contra a exploração econômica e social. O emprego de crianças e adolescentes em trabalhos que lhes sejam nocivos à moral e à saúde ou que lhes façam correr perigo de vida, ou ainda que lhes venham a prejudicar o desenvolvimento norma, será punido por lei. Os Estados devem também estabelecer limites de idade sob os quais fique proibido e punido por lei o emprego assalariado da mão de obra infantil. Artigo 11 (...) 2. Os Estados‑Partes do presente Pacto, reconhecendo o direito fundamental de toda pessoa de estar protegida contra a fome, adotarão, individualmente e mediante cooperação internacional, as medidas, inclusive programas concretos, que se façam necessárias para: a) melhorar os métodos de produção, conservação e distribuição de gêneros alimentícios pela plena utilização dos conhecimentos técnicos e científicos, pela difusão de princípios de educação nutricional e pelo aperfeiçoamento ou reforma dos regimes agrários, de maneira que se assegurem a exploração e a utilização mais eficazes dos recursos naturais; b) assegurar uma repartição equitativa dos recursos alimentícios mundiais em relação às necessidades, levando‑se em conta os problemas tanto dos países importadores quanto dos exportadores de gêneros alimentícios. (...) Artigo 13 (...) 2. Os Estados‑Partes do presente Pacto reconhecem que, com o objetivo de assegurar o pleno exercício desse direito: a) a educação primária deverá ser obrigatória e acessível gratuitamente a todos; b) a educação secundária em suas diferentes formas, inclusive a educação secundária técnica e profissional, deverá ser generalizada e torna‑se acessível a todos, por todos os meios apropriados e, principalmente, pela implementação progressiva do ensino gratuito; c) a educação de nível superior deverá igualmente tornar‑se acessível a todos, com base na capacidade de cada um, por todos os meios apropriados e, principalmente, pela implementação progressiva do ensino gratuito; d) dever‑se‑á fomentar e intensificar, na medida do possível, a educação de base para aquelas pessoas que não receberam educação primária ou não concluíram o ciclo completo de educação primária; e) será preciso prosseguir ativamente o desenvolvimento de uma rede escolar em todos os níveis de ensino, implementar‑se um sistema adequado de bolsas de estudo e melhorar continuamente as condições materiais do corpo docente. (...) Artigo 15 1. Os Estados‑Partes do presente Pacto reconhecem a cada indivíduo o direito de: a) participar da vida cultural; b) desfrutar o processo científico e suas aplicações; c) beneficiar‑se da proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de toda a produção científica, literária ou artística de que seja autor. 12.9. PACTO INTERNACIONAL SOBRE DIREITOS CIVIS E POLÍTICOS A XXI Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas adotou o texto do Pacto internacional sobre Direitos Civis e Políticos em 16-12-1966, entretanto, o Brasil só depositou a Carta de Adesão em 24-11992, o que vigorou somente em 24-4-1992. Foi aprovado por meio do Decreto Legislativo no 226, de 1212-1991, e consequentemente promulgado pelo Dec. no 592, de 6-7-1992. Preâmbulo e seus fundamentos Os Estados‑Partes do presente Pacto, Considerando que, em conformidade com os princípios proclamados na Carta das Nações Unidas, o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo, Reconhecendo que esses direitos decorrem da dignidade inerente à pessoa humana, Reconhecendo que, em conformidade com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, o ideal do ser humano livre, no gozo das liberdades civis e políticas e liberto do temor e da miséria, não pode ser realizado a menos que se criem condições que permitam a cada um gozar de seus direitos civis e políticos, assim como de seus direitos econômicos, sociais e culturais, Considerando que a Carta das Nações Unidas impõe aos Estados a obrigação de promover o respeito universal e efetivo dos direitos e das liberdades do homem, Compreendendo que o indivíduo por ter deveres para com seus semelhantes e para com a coletividade a que pertence, tem a obrigação de lutar pela promoção e observância dos direitos reconhecidos no presente Pacto. Da divisão do Pacto Apesar de não possuir títulos, pode‑se dividi‑lo por meio de seus temas, a saber: 1. Parte I (art. 1o): direito à autodeterminação; 2. Parte II (do art. 2o ao 5o): garantias dos direitos fundamentais; 3. Parte III (do art. 6o ao 27): direito à vida; à dignidade humana; à liberdade de locomoção; às liberdades de pensamento, consciência e religião; às liberdades de livre reunião e associação; proteção à família e à criança; à liberdade política; à igualdade; e das minorias étnicas; 4. Parte IV (do art. 28 ao 45): do Comitê e Comissão de Direitos Humanos; 5. Parte V (do art. 46 ao 47): interpretações do Pacto; e 6. Parte VI (do art. 48 ao 53): considerações finais. 9.3 Após o Preâmbulo, acordaram os seguintes direitos e garantias do Pacto Analisando o corpo do texto, percebe‑se que apresenta, dentre outros, os seguintes direitos e garantias, elencados em ordem de aparição: a) Direito de autodeterminação dos povos e de estes disporem “livremente de suas riquezas e recursos naturais” (art. 1o); b) Proibição de qualquer tipo de discriminação (art. 2o); c) Proibida restrição ou suspensão dos direitos humanos fundamentais (art. 5o); d) Direito à vida (art. 6o); e) Proibição de pena de morte (art. 6o, 2); f) Proibição de tortura e/ou tratamentos cruéis/desumanos (art. 7o); g) Proibição de escravidão, servidão, trabalho forçado e tráfico de escravos (art. 8o); h) Direito à liberdade e à segurança pessoais (art. 9o); i) Direito do encarcerado à dignidade da pessoa humana (art. 10); j) Não haverá prisão civil do depositário infiel (art. 11); k) Direito de permanecer em território nacional ou estrangeiro (art. 12); l) Proibida expulsão de estrangeiro (art. 13) – Com ressalvas; m) Todos são iguais perante tribunais e cortes de justiça (art. 14); n) Princípio nullum crimen sine lege (art. 15); o) Direito à privacidade, ao sigilo da correspondência e à honra (art. 17); p) Proibição de propaganda em favor da guerra (art. 20); q) Direito de reunião pacífica (art. 21), associação e sindicato (art. 22); r) Direito de proteção à família (art. 23) e às crianças (art. 24); s) Direitos políticos (art. 25); t) Sobre o Comitê de Direitos Humanos (do art. 28 ao 41); u) Sobre a Comissão de Direitos Humanos (do art. 42 ao 45); v) Disposições gerais (do art. 46 ao 53) “Nenhuma disposição do presente Pacto poderá ser interpretada em detrimento das disposições da Carta das Nações unidas” (sic). 12.10. CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE A ELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE DISCRIMINAÇÃO RACIAL A convenção foi adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 21 de dezembro de 1965, entrando em vigor em 4 de janeiro de 1969 e é considerado um dos principais tratados internacionais em matéria de Direitos Humanos dado ao seu conteúdo exaustivo. Texto do Preâmbulo Preâmbulo Os Estados‑Partes na presente Convenção, Considerando que a Carta das Nações Unidas baseia‑se em princípios de dignidade e igualdade inerentes a todos os seres humanos, e que todos os Estados‑Membros comprometeram‑se a tomar medidas separadas e conjuntas, em cooperação com a Organização, para a consecução de um dos propósitos das Nações Unidas que é promover e encorajar o respeito universal e observância dos direitos humanos e liberdades fundamentais para todos, sem discriminação de raça, sexo, idioma ou religião; Considerando que a Declaração Universal dos Direitos do Homem proclama que todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos e que cada indivíduo pode valer‑se de todos os direitos nela estabelecidos, sem distinção de qualquer espécie e principalmente de raça, cor ou origem nacional; Considerando que todos os homens são iguais perante a lei e têm o direito à igual proteção contra qualquer discriminação e contra todo incitamento à discriminação; Considerando que as Nações Unidas têm condenado o colonialismo e todas as práticas de segregação e discriminação a ele associadas, em qualquer forma e onde quer que existam, e que a Declaração sobre a Outorga de Independência, a Partes e Povos Coloniais, de 14 de dezembro de 1960 (Resolução 1.514 (XV), da Assembleia Geral) afirmou e proclamou solenemente a necessidade de levá‑las a um fim rápido e incondicional; Considerando que a Declaração das Nações Unidas sobre eliminação de todas as formas de Discriminação Racial, de 20 de novembro de 1963 (Resolu-ção no 1.904 (XVIII) da Assembleia Geral), afirma solenemente a necessidade de eliminar rapidamente a discriminação racial existente no mundo em todas as suas formas e manifestações e de assegurar a compreensão e o respeito à dignidade da pessoa humana; Convencidos de que qualquer doutrina de superioridade baseada em diferen-ças raciais é cientificamente falsa, moralmente condenável, socialmente injusta e perigosa, e que não existe justificativa para a discriminação racial, em teoria ou na prática, em lugar algum; Reafirmando que a discriminação entre os homens por motivos de raça, cor ou origem étnica é um obstáculo às relações amigáveis e pacíficas entre as nações e é capaz de perturbar a paz e a segurança entre povos, bem como a harmonia de pessoas vivendo lado a lado, dentro de um mesmo Estado; Convencidos de que a existência de barreiras raciais é incompatível com os ideais de qualquer sociedade humana; Alarmados por manifestações de discriminação racial ainda em evidência em algumas áreas do mundo e por políticas governamentais baseadas em superioridade ou ódio racial, como as políticas de apartheid, segregação ou separação; Resolvidos a adotar todas as medidas necessárias para eliminar rapidamente a discriminação racial em todas as suas formas e manifestações, e a prevenir e combater doutrinas e práticas raciais com o objetivo de promover o entendimento entre as raças e construir uma comunidade internacional livre de todas as formas de separação ou discriminação racial. Levando em conta a Convenção sobre Discriminação no Emprego e Ocupa-ção adotada pela Organização Internacional do Trabalho em 1958, e a Convenção contra discriminação no Ensino adotada pela Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a Cultura em 1960; Com o desejo de completar os princípios estabelecidos na Declaração das Nações Unidas sobre a eliminação de todas as formas de discriminação racial e assegurar o mais cedo possível a adoção de medidas práticas para esse fim. Como visto, o preâmbulo confirma a intenção das Nações Unidas em promover a observância universal aos Direitos Humanos, sem discriminação de raça, idioma, sexo, ou religião, evidenciando os princípios norteadores da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948). Lembra que todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos, sem distinção de raça, cor ou origem. Por fim, dispõe que qualquer doutrina de superioridade baseada em diferenças raciais será falsa, condenável, injusta e perigosa. Influências históricas para convenção Infelizmente, os maiores clamores da humanidade foi o desentendimento entre os povos das mais variadas nações em busca de um falso equilíbrio étinico. Com influências históricas, o interesse na erradicação do racismo tomou espaço, com: a) Ingresso de 17 países africanos na ONU, em 1960; b) Primeira Conferência dos Países Não Alinhados, em Belgrado, em 1961; c) atividades nazistas e fascistas na Europa tomando a atenção do mundo. Análise dos artigos de maior incidência relacionados ao tema Artigo 1o 1. Nesta Convenção, a expressão “discriminação racial” significará qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência fundadas em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por objetivo ou efeito anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício num mesmo plano (em igualdade de condição) de direitos humanos e liberdades fundamentais no domínio político econômico, social, cultural ou em qualquer outro domínio de vida pública. 2. Esta Convenção não se aplicará às distinções, exclusões, restrições e preferências feitas por um Estado ‑Parte nesta Convenção entre cidadãos e não cidadãos. 3. Nada nesta Convenção poderá ser interpretado como atentado as disposições legais dos Estados‑ Partes, relativas à nacionalidade, cidadania e naturalização, desde que tais disposições não discriminem contra qualquer nacionalidade particular. 4. Não serão consideradas discriminação racial as medidas especiais tomadas com o único objetivo de assegurar progresso adequado a certos grupos raciais ou étnicos ou de indivíduos que necessitem de proteção para igual gozo ou exercício de direitos humanos e liberdades fundamentais, desde que tais medidas não conduzam, em consequência, à manutenção de direitos separados para diferentes grupos raciais e não prossigam após terem sidos alcançados os seus objetivos. Este dispositivo esclarece a expressão “Discriminação Racial” como qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência, baseadas em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica, que tenha por objetivo ou efeito anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício em um mesmo plano (em igualdade de condição) de Direitos Humanos e liberdades fundamentais no domínio político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro domínio de vida pública. Desta forma, podemos assegurar que a expressão protegida tem por finalidade a anulação ou restrição do exercício dos Direitos Humanos e das suas liberdades fundamentais. Artigo 4o Os Estados‑Partes condenam toda propaganda e todas as organizações que se inspirem em ideias ou teorias que tenham como alicerce a superioridade de uma raça ou de um grupo de pessoas de uma certa cor ou de uma certa origem étnica ou que pretendam justificar ou encorajar qualquer forma de ódio e discriminação raciais e comprometem ‑se a adotar imediatamente medidas positivas destinadas a eliminar qualquer incitação a discriminação, ou quaisquer atos de discriminação, e para este fim, tendo em vista os princípios formulados na Declaração Universal dos Direitos do Homem e os direitos expressamente enunciados no artigo V da presente convenção, eles se comprometem principalmente: a) a declarar delitos puníveis por lei, qualquer difusão de ideias que estejam fundamentadas na superioridade ou ódio raciais, quaisquer incitamentos à dis-criminação racial, assim como atos de violência ou provocação dirigidos contra qualquer raça ou qualquer grupo de pessoas de outra cor ou de outra origem étnica, bem como qualquer assistência prestada a atividades racistas, inclusive seu financiamento; b) a declarar ilegais e a proibir as organizações, assim como as atividades de propaganda organizada e qualquer outro tipo de atividade de propaganda que incitar a discriminação racial e que a encorajar e a declarar delito punível por lei a participação nestas organizações ou nestas atividades; c) a não permitir às autoridades públicas nem às instituições públicas, nacionais ou locais, o incitamento ou encorajamento à discriminação racial. Impõe aos Estados‑Partes a condenação de toda organização ou propaganda que se inspirem, justifiquem ou incentivem a discriminação, baseada na ideia ou teorias de supremacia racial. Se comprometem a adotar medidas positivas para as incitações e para que sejam essas condutas tipificadas penalmente. Os Estados Unidos da América rejeitaram esse artigo sob o pretexto de ferir a liberdade de expressão, garantida por sua Constituição costumeira. Artigo 5º De conformidade com as obrigações fundamentais enunciadas no artigo 2, os Estados Partes comprometem-se a proibir e a eliminar a discriminação racial em todas suas formas e a garantir o direito de cada um à igualdade perante a lei sem distinção de raça, de cor ou de origem nacional ou étnica, principalmente no gozo dos seguintes direitos: a) direito a um tratamento igual perante os tribunais ou qualquer outro órgão que administre justiça; b) direito à segurança da pessoa ou á proteção do Estado contra violência ou lesão corporal cometida, quer por funcionários de Governo, que por qualquer indivíduo, grupo ou instituição; c) direitos políticos principalmente direito de participar às eleições - de votar e ser votado - conforme o sistema de sufrágio universal e igual, direito de tomar parte no Governo, assim como na direção dos assuntos públicos, em qualquer grau e o direito de acesso, em igualdade de condições, às condições, às funções públicas; d) outros direitos civis, principalmente, i) direito de circular livremente e de escolher residência dentro das fronteiras do Estado; ii) direito de deixar qualquer país, inclusive o seu, e de voltar a seu país; iii) direito a uma nacionalidade; iv) direito de casar-se e escolher o cônjuge; v) direito de qualquer pessoa, tanto individualmente como em conjunto, à propriedade; vi) direito de herdar; vii) direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; viii) direito à liberdade de opinião e de expressão; ix) direito à liberdade de reunião e de associação pacífica; e) direitos econômicos, sociais e culturais, principalmente: i) direitos ao trabalho, a livre escolha de seu trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho, à proteção contra o desemprego, a um salário igual para um trabalho igual, a uma remuneração equitativa e satisfatória; ii) direito de fundar sindicatos e a eles se afiliar; iii) direito à habitação; iv) direito à saúde pública, a tratamento médico, à previdência social e aos serviços sociais; v) direito à educação e à formação profissional; vi) direito a igual participação das atividades culturais. f) direito de acesso a todos os lugares e serviços destinados ao uso do público, tais como, meios de transportes, hotéis, restaurantes, cafés, espetáculos e parques. Artigo 7o Os Estados‑Partes comprometem‑se a tomar as medidas imediatas e eficazes, principalmente no campo de ensino, educação, da cultura e da informação, para lutar contra os preconceitos que levem à discriminação racial e para promover o entendimento, a tolerância e a amizade entre nações e grupos raciais e étnicos, assim como para propagar o objetivo e princípios da Carta das Nações Unidas da Declaração Universal dos Direitos Humanos, da Declaração das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial e da presente Convenção. A norma procura estabelecer aos Estados signatários desta Convenção o dever de tomar as medidas imediatas e eficazes nos campos do ensino, educação, cultura e informação, contra os preconceitos que levem à discriminação racial. A Convenção ressalva, dentre outras observações, a importância da educação, fundada no respeito à diversidade e dignidade humana. Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial A Convenção previu a criação do “Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial” composto por 18 peritos, eleitos para um período de quatro anos, para desempenhar o monitoramento dos direitos por ela reconhecidos. Os relatórios do Comitê sugerem medidas políticas, jurídicas e legislativas para os países que aderiram à Convenção. Depois da adesão, o primeiro relatório tem que ocorrer após um ano, os demais são devidos bianualmente. Direitos civis e políticos Artigo 3º - Direito ao reconhecimento da personalidade jurídica Toda pessoa tem direito ao reconhecimento de sua personalidade jurídica. Artigo 4º - Direito à vida 1. Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente. 2. Nos países que não houverem abolido a pena de morte, esta só poderá ser imposta pelos delitos mais graves, em cumprimento de sentença final de tribunal competente e em conformidade com a lei que estabeleça tal pena, promulgada antes de haver o delito sido cometido. Tampouco se estenderá sua aplicação a delitos aos quais não se aplique atualmente. 3. Não se pode restabelecer a pena de morte nos Estados que a hajam abolido. 4. Em nenhum caso pode a pena de morte ser aplicada a delitos políticos, nem a delitos comuns conexos com delitos políticos. 5. Não se deve impor a pena de morte a pessoa que, no momento da perpetração do delito, for menor de dezoito anos, ou maior de setenta, nem aplicá-la a mulher em estado de gravidez. 6. Toda pessoa condenada à morte tem direito a solicitar anistia, indulto ou comutação da pena, os quais podem ser concedidos em todos os casos. Não se pode executar a pena de morte enquanto o pedido estiver pendente de decisão ante a autoridade competente. Artigo 5º - Direito à integridade pessoal 1. Toda pessoa tem direito a que se respeite sua integridade física, psíquica e moral. 2. Ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada de liberdade deve ser tratada com o respeito devido à dignidade inerente ao ser humano. 3. A pena não pode passar da pessoa do delinquente. 4. Os processados devem ficar separados dos condenados, salvo em circunstâncias excepcionais, e devem ser submetidos a tratamento adequado à sua condição de pessoas não condenadas. 5. Os menores, quando puderem ser processados, devem ser separados dos adultos e conduzidos a tribunal especializado, com a maior rapidez possível, para seu tratamento. 6. As penas privativas de liberdade devem ter por finalidade essencial a reforma e a readaptação social dos condenados. Artigo 6º - Proibição da escravidão e da servidão 1. Ninguém poderá ser submetido a escravidão ou servidão e tanto estas como o tráfico de escravos e o tráfico de mulheres são proibidos em todas as suas formas. 2. Ninguém deve ser constrangido a executar trabalho forçado ou obrigatório. Nos países em que se prescreve, para certos delitos, pena privativa de liberdade acompanhada de trabalhos forçados, esta disposição não pode ser interpretada no sentido de proibir o cumprimento da dita pena, imposta por um juiz ou tribunal competente. O trabalho forçado não deve afetar a dignidade, nem a capacidade física e intelectual do recluso. 3. Não constituem trabalhos forçados ou obrigatórios para os efeitos deste artigo: a) os trabalhos ou serviços normalmente exigidos de pessoa reclusa em cumprimento de sentença ou resolução formal expedida pela autoridade judiciária competente. Tais trabalhos ou serviços devem ser executados sob a vigilância e controle das autoridades públicas, e os indivíduos que os executarem não devem ser postos à disposição de particulares, companhias ou pessoas jurídicas de caráter privado; b) serviço militar e, nos países em que se admite a isenção por motivo de consciência, qualquer serviço nacional que a lei estabelecer em lugar daquele; c) o serviço exigido em casos de perigo ou de calamidade que ameacem a existência ou o bem-estar da comunidade; d) o trabalho ou serviço que faça parte das obrigações cívicas normais. Artigo 7º - Direito à liberdade pessoal 1. Toda pessoa tem direito à liberdade e à segurança pessoais. 2. Ninguém pode ser privado de sua liberdade física, salvo pelas causas e nas condições previamente fixadas pelas Constituições políticas dos Estados-partes ou pelas leis de acordo com elas promulgadas. 3. Ninguém pode ser submetido a detenção ou encarceramento arbitrários. 4. Toda pessoa detida ou retida deve ser informada das razões da detenção e notificada, sem demora, da acusação ou das acusações formuladas contra ela. 5. Toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e tem o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo. 6. Toda pessoa privada da liberdade tem direito a recorrer a um juiz ou tribunal competente, a fim de que este decida, sem demora, sobre a legalidade de sua prisão ou detenção e ordene sua soltura, se a prisão ou a detenção forem ilegais. Nos Estados-partes cujas leis prevêem que toda pessoa que se vir ameaçada de ser privada de sua liberdade tem direito a recorrer a um juiz ou tribunal competente, a fim de que este decida sobre a legalidade de tal ameaça, tal recurso não pode ser restringido nem abolido. O recurso pode ser interposto pela própria pessoa ou por outra pessoa. 7. Ninguém deve ser detido por dívidas. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar. Artigo 8º - Garantias judiciais 1. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza. 2. Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: a) direito do acusado de ser assistido gratuitamente por um tradutor ou intérprete, caso não compreenda ou não fale a língua do juízo ou tribunal; b) comunicação prévia e pormenorizada ao acusado da acusação formulada; c) concessão ao acusado do tempo e dos meios necessários à preparação de sua defesa; d) direito do acusado de defender-se pessoalmente ou de ser assistido por um defensor de sua escolha e de comunicar-se, livremente e em particular, com seu defensor; e) direito irrenunciável de ser assistido por um defensor proporcionado pelo Estado, remunerado ou não, segundo a legislação interna, se o acusado não se defender ele próprio, nem nomear defensor dentro do prazo estabelecido pela lei; f) direito da defesa de inquirir as testemunhas presentes no Tribunal e de obter o comparecimento, como testemunhas ou peritos, de outras pessoas que possam lançar luz sobre os fatos; g) direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada; e h) direito de recorrer da sentença a juiz ou tribunal superior. 3. A confissão do acusado só é válida se feita sem coação de nenhuma natureza. 4. O acusado absolvido por sentença transitada em julgado não poderá ser submetido a novo processo pelos mesmos fatos. 5. O processo penal deve ser público, salvo no que for necessário para preservar os interesses da justiça. Artigo 9º - Princípio da legalidade e da retroatividade Ninguém poderá ser condenado por atos ou omissões que, no momento em que foram cometidos, não constituam delito, de acordo com o direito aplicável. Tampouco poder-se-á impor pena mais grave do que a aplicável no momento da ocorrência do delito. Se, depois de perpetrado o delito, a lei estipular a imposição de pena mais leve, o deliquente deverá dela beneficiar-se. Artigo 10 - Direito à indenização Toda pessoa tem direito de ser indenizada conforme a lei, no caso de haver sido condenada em sentença transitada em julgado, por erro judiciário. Artigo 11 - Proteção da honra e da dignidade 1. Toda pessoa tem direito ao respeito da sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade. 2. Ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, em sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra ou reputação. 3. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais ingerências ou tais ofensas. Artigo 12 - Liberdade de consciência e de religião 1. Toda pessoa tem direito à liberdade de consciência e de religião. Esse direito implica a liberdade de conservar sua religião ou suas crenças, ou de mudar de religião ou de crenças, bem como a liberdade de professar e divulgar sua religião ou suas crenças, individual ou coletivamente, tanto em público como em privado. 2. Ninguém pode ser submetido a medidas restritivas que possam limitar sua liberdade de conservar sua religião ou suas crenças, ou de mudar de religião ou de crenças. 3. A liberdade de manifestar a própria religião e as próprias crenças está sujeita apenas às limitações previstas em lei e que se façam necessárias para proteger a segurança, a ordem, a saúde ou a moral públicas ou os direitos e as liberdades das demais pessoas. 4. Os pais e, quando for o caso, os tutores, têm direito a que seus filhos e pupilos recebam a educação religiosa e moral que esteja de acordo com suas próprias convicções. Artigo 13 - Liberdade de pensamento e de expressão 1. Toda pessoa tem o direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito inclui a liberdade de procurar, receber e difundir informações e idéias de qualquer natureza, sem considerações de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer meio de sua escolha. 2. O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito à censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente previstas em lei e que se façam necessárias para assegurar: a) o respeito dos direitos e da reputação das demais pessoas; b) a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou da moral públicas. 3. Não se pode restringir o direito de expressão por vias e meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de frequências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de idéias e opiniões. 4. A lei pode submeter os espetáculos públicos a censura prévia, com o objetivo exclusivo de regular o acesso a eles, para proteção moral da infância e da adolescência, sem prejuízo do disposto no inciso 2. 5. A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitamento à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência. Artigo 14 - Direito de retificação ou resposta 1. Toda pessoa, atingida por informações inexatas ou ofensivas emitidas em seu prejuízo por meios de difusão legalmente regulamentados e que se dirijam ao público em geral, tem direito a fazer, pelo mesmo órgão de difusão, sua retificação ou resposta, nas condições que estabeleça a lei. 2. Em nenhum caso a retificação ou a resposta eximirão das outras responsabilidades legais em que se houver incorrido. 3. Para a efetiva proteção da honra e da reputação, toda publicação ou empresa jornalística, cinematográfica, de rádio ou televisão, deve ter uma pessoa responsável, que não seja protegida por imunidades, nem goze de foro especial. Artigo 15 - Direito de reunião É reconhecido o direito de reunião pacífica e sem armas. O exercício desse direito só pode estar sujeito às restrições previstas em lei e que se façam necessárias, em uma sociedade democrática, ao interesse da segurança nacional, da segurança ou ordem públicas, ou para proteger a saúde ou a moral públicas ou os direitos e as liberdades das demais pessoas. Artigo 16 - Liberdade de associação 1. Todas as pessoas têm o direito de associar-se livremente com fins ideológicos, religiosos, políticos, econômicos, trabalhistas, sociais, culturais, desportivos ou de qualquer outra natureza. 2. O exercício desse direito só pode estar sujeito às restrições previstas em lei e que se façam necessárias, em uma sociedade democrática, ao interesse da segurança nacional, da segurança e da ordem públicas, ou para proteger a saúde ou a moral públicas ou os direitos e as liberdades das demais pessoas. 3. O presente artigo não impede a imposição de restrições legais, e mesmo a privação do exercício do direito de associação, aos membros das forças armadas e da polícia. Artigo 17 - Proteção da família 1. A família é o núcleo natural e fundamental da sociedade e deve ser protegida pela sociedade e pelo Estado. 2. É reconhecido o direito do homem e da mulher de contraírem casamento e de constituírem uma família, se tiverem a idade e as condições para isso exigidas pelas leis internas, na medida em que não afetem estas o princípio da não-discriminação estabelecido nesta Convenção. 3. O casamento não pode ser celebrado sem o consentimento livre e pleno dos contraentes. 4. Os Estados-partes devem adotar as medidas apropriadas para assegurar a igualdade de direitos e a adequada equivalência de responsabilidades dos cônjuges quanto ao casamento, durante o mesmo e por ocasião de sua dissolução. Em caso de dissolução, serão adotadas as disposições que assegurem a proteção necessária aos filhos, com base unicamente no interesse e conveniência dos mesmos. 5. A lei deve reconhecer iguais direitos tanto aos filhos nascidos fora do casamento, como aos nascidos dentro do casamento. Artigo 18 - Direito ao nome Toda pessoa tem direito a um prenome e aos nomes de seus pais ou ao de um destes. A lei deve regular a forma de assegurar a todos esse direito, mediante nomes fictícios, se for necessário. Artigo 19 - Direitos da criança Toda criança terá direito às medidas de proteção que a sua condição de menor requer, por parte da sua família, da sociedade e do Estado. Artigo 20 - Direito à nacionalidade 1. Toda pessoa tem direito a uma nacionalidade. 2. Toda pessoa tem direito à nacionalidade do Estado em cujo território houver nascido, se não tiver direito a outra. 3. A ninguém se deve privar arbitrariamente de sua nacionalidade, nem do direito de mudá-la. Artigo 21 - Direito à propriedade privada 1. Toda pessoa tem direito ao uso e gozo de seus bens. A lei pode subordinar esse uso e gozo ao interesse social. 2. Nenhuma pessoa pode ser privada de seus bens, salvo mediante o pagamento de indenização justa, por motivo de utilidade pública ou de interesse social e nos casos e na forma estabelecidos pela lei. 3. Tanto a usura, como qualquer outra forma de exploração do homem pelo homem, devem ser reprimidas pela lei. Artigo 22 - Direito de circulação e de residência 1. Toda pessoa que se encontre legalmente no território de um Estado tem o direito de nele livremente circular e de nele residir, em conformidade com as disposições legais. 2. Toda pessoa terá o direito de sair livremente de qualquer país, inclusive de seu próprio país. 3. O exercício dos direitos supracitados não pode ser restringido, senão em virtude de lei, na medida indispensável, em uma sociedade democrática, para prevenir infrações penais ou para proteger a segurança nacional, a segurança ou a ordem públicas, a moral ou a saúde públicas, ou os direitos e liberdades das demais pessoas. 4. O exercício dos direitos reconhecidos no inciso 1 pode também ser restringido pela lei, em zonas determinadas, por motivo de interesse público. 5. Ninguém pode ser expulso do território do Estado do qual for nacional e nem ser privado do direito de nele entrar. 6. O estrangeiro que se encontre legalmente no território de um Estado-parte na presente Convenção só poderá dele ser expulso em decorrência de decisão adotada em conformidade com a lei. 7. Toda pessoa tem o direito de buscar e receber asilo em território estrangeiro, em caso de perseguição por delitos políticos ou comuns conexos com delitos políticos, de acordo com a legislação de cada Estado e com as Convenções internacionais. 8. Em nenhum caso o estrangeiro pode ser expulso ou entregue a outro país, seja ou não de origem, onde seu direito à vida ou à liberdade pessoal esteja em risco de violação em virtude de sua raça, nacionalidade, religião, condição social ou de suas opiniões políticas. 9. É proibida a expulsão coletiva de estrangeiros. Artigo 23 - Direitos políticos 1. Todos os cidadãos devem gozar dos seguintes direitos e oportunidades: a) de participar da condução dos assuntos públicos, diretamente ou por meio de representantes livremente eleitos; b) de votar e ser eleito em eleições periódicas, autênticas, realizadas por sufrágio universal e igualitário e por voto secreto, que garantam a livre expressão da vontade dos eleitores; e c) de ter acesso, em condições gerais de igualdade, às funções públicas de seu país. 2. A lei pode regular o exercício dos direitos e oportunidades, a que se refere o inciso anterior, exclusivamente por motivo de idade, nacionalidade, residência, idioma, instrução, capacidade civil ou mental, ou condenação, por juiz competente, em processo penal. Artigo 24 - Igualdade perante a lei Todas as pessoas são iguais perante a lei. Por conseguinte, têm direito, sem discriminação alguma, à igual proteção da lei. Artigo 25 - Proteção judicial 1. Toda pessoa tem direito a um recurso simples e rápido ou a qualquer outro recurso efetivo, perante os juízes ou tribunais competentes, que a proteja contra atos que violem seus direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição, pela lei ou pela presente Convenção, mesmo quando tal violação seja cometida por pessoas que estejam atuando no exercício de suas funções oficiais. 2. Os Estados-partes comprometem-se: a) a assegurar que a autoridade competente prevista pelo sistema legal do Estado decida sobre os direitos de toda pessoa que interpuser tal recurso; b) a desenvolver as possibilidades de recurso judicial; e c) a assegurar o cumprimento, pelas autoridades competentes, de toda decisão em que se tenha considerado procedente o recurso. Capítulo III - DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS Artigo 26 - Desenvolvimento progressivo Os Estados-partes comprometem-se a adotar as providências, tanto no âmbito interno, como mediante cooperação internacional, especialmente econômica e técnica, a fim de conseguir progressivamente a plena efetividade dos direitos que decorrem das normas econômicas, sociais e sobre educação, ciência e cultura, constantes da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires, na medida dos recursos disponíveis, por via legislativa ou por outros meios apropriados. Capítulo IV - SUSPENSÃO DE GARANTIAS, INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO Artigo 27 - Suspensão de garantias 1. Em caso de guerra, de perigo público, ou de outra emergência que ameace a independência ou segurança do Estado-parte, este poderá adotar as disposições que, na medida e pelo tempo estritamente limitados às exigências da situação, suspendam as obrigações contraídas em virtude desta Convenção, desde que tais disposições não sejam incompatíveis com as demais obrigações que lhe impõe o Direito Internacional e não encerrem discriminação alguma fundada em motivos de raça, cor, sexo, idioma, religião ou origem social. 2. A disposição precedente não autoriza a suspensão dos direitos determinados nos seguintes artigos: 3 (direito ao reconhecimento da personalidade jurídica), 4 (direito à vida), 5 (direito à integridade pessoal), 6 (proibição da escravidão e da servidão), 9 (princípio da legalidade e da retroatividade), 12 (liberdade de consciência e religião), 17 (proteção da família), 18 (direito ao nome), 19 (direitos da criança), 20 (direito à nacionalidade) e 23 (direitos políticos), nem das garantias indispensáveis para a proteção de tais direitos. 3. Todo Estado-parte no presente Pacto que fizer uso do direito de suspensão deverá comunicar imediatamente aos outros Estados-partes na presente Convenção, por intermédio do Secretário Geral da Organização dos Estados Americanos, as disposições cuja aplicação haja suspendido, os motivos determinantes da suspensão e a data em que haja dado por terminada tal suspensão. Artigo 28 - Cláusula federal 1. Quando se tratar de um Estado-parte constituído como Estado federal, o governo nacional do aludido Estado-parte cumprirá todas as disposições da presente Convenção, relacionadas com as matérias sobre as quais exerce competência legislativa e judicial. 2. No tocante às disposições relativas às matérias que correspondem à competência das entidades componentes da federação, o governo nacional deve tomar imediatamente as medidas pertinentes, em conformidade com sua Constituição e com suas leis, a fim de que as autoridades competentes das referidas entidades possam adotar as disposições cabíveis para o cumprimento desta Convenção. 3. Quando dois ou mais Estados-partes decidirem constituir entre eles uma federação ou outro tipo de associação, diligenciarão no sentido de que o pacto comunitário respectivo contenha as disposições necessárias para que continuem sendo efetivas no novo Estado, assim organizado, as normas da presente Convenção. Artigo 29 - Normas de interpretação Nenhuma disposição da presente Convenção pode ser interpretada no sentido de: a) permitir a qualquer dos Estados-partes, grupo ou indivíduo, suprimir o gozo e o exercício dos direitos e liberdades reconhecidos na Convenção ou limitá-los em maior medida do que a nela prevista; b) limitar o gozo e exercício de qualquer direito ou liberdade que possam ser reconhecidos em virtude de leis de qualquer dos Estados-partes ou em virtude de Convenções em que seja parte um dos referidos Estados; c) excluir outros direitos e garantias que são inerentes ao ser humano ou que decorrem da forma democrática representativa de governo; d) excluir ou limitar o efeito que possam produzir a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e outros atos internacionais da mesma natureza. Artigo 30 - Alcance das restrições As restrições permitidas, de acordo com esta Convenção, ao gozo e exercício dos direitos e liberdades nela reconhecidos, não podem ser aplicadas senão de acordo com leis que forem promulgadas por motivo de interesse geral e com o propósito para o qual houverem sido estabelecidas. Artigo 31 - Reconhecimento de outros direitos Poderão ser incluídos, no regime de proteção desta Convenção, outros direitos e liberdades que forem reconhecidos de acordo com os processos estabelecidos nos artigo 69 e 70 (...) Capítulo VII - COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS Seção 1 - Organização Artigo 34 - A Comissão Interamericana de Direitos Humanos compor-se-á de sete membros, que deverão ser pessoas de alta autoridade moral e de reconhecido saber em matéria de direitos humanos. Artigo 35 - A Comissão representa todos os Membros da Organização dos Estados Americanos. Artigo 36 - 1. Os membros da Comissão serão eleitos a título pessoal, pela Assembléia Geral da Organização, a partir de uma lista de candidatos propostos pelos governos dos Estados-membros. 2. Cada um dos referidos governos pode propor até três candidatos, nacionais do Estado que os propuser ou de qualquer outro Estado-membro da Organização dos Estados Americanos. Quando for proposta uma lista de três candidatos, pelo menos um deles deverá ser nacional de Estado diferente do proponente. Artigo 37 - 1. Os membros da Comissão serão eleitos por quatro anos e só poderão ser reeleitos um vez, porém o mandato de três dos membros designados na primeira eleição expirará ao cabo de dois anos. Logo depois da referida eleição, serão determinados por sorteio, na Assembléia Geral, os nomes desses três membros. 2. Não pode fazer parte da Comissão mais de um nacional de um mesmo país. Artigo 38 - As vagas que ocorrerem na Comissão, que não se devam à expiração normal do mandato, serão preenchidas pelo Conselho Permanente da Organização, de acordo com o que dispuser o Estatuto da Comissão. Artigo 39 - A Comissão elaborará seu estatuto e submetê-lo-á à aprovação da Assembléia Geral e expedirá seu próprio Regulamento. Artigo 40 - Os serviços da Secretaria da Comissão devem ser desempenhados pela unidade funcional especializada que faz parte da Secretaria Geral da Organização e deve dispor dos recursos necessários para cumprir as tarefas que lhe forem confiadas pela Comissão. Seção 2 - Funções Artigo 41 - A Comissão tem a função principal de promover a observância e a defesa dos direitos humanos e, no exercício de seu mandato, tem as seguintes funções e atribuições: a) estimular a consciência dos direitos humanos nos povos da América; b) formular recomendações aos governos dos Estados-membros, quando considerar conveniente, no sentido de que adotem medidas progressivas em prol dos direitos humanos no âmbito de suas leis internas e seus preceitos constitucionais, bem como disposições apropriadas para promover o devido respeito a esses direitos; c) preparar estudos ou relatórios que considerar convenientes para o desempenho de suas funções; d) solicitar aos governos dos Estados-membros que lhe proporcionem informações sobre as medidas que adotarem em matéria de direitos humanos; e) atender às consultas que, por meio da Secretaria Geral da Organização dos Estados Americanos, lhe formularem os Estados-membros sobre questões relacionadas com os direitos humanos e, dentro de suas possibilidades, prestar-lhes o assessoramento que lhes solicitarem; f) atuar com respeito às petições e outras comunicações, no exercício de sua autoridade, de conformidade com o disposto nos artigos 44 a 51 desta Convenção; e g) apresentar um relatório anual à Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos. Artigo 42 - Os Estados-partes devem submeter à Comissão cópia dos relatórios e estudos que, em seus respectivos campos, submetem anualmente às Comissões Executivas do Conselho Interamericano Econômico e Social e do Conselho Interamericano de Educação, Ciência e Cultura, a fim de que aquela zele para que se promovam os direitos decorrentes das normas econômicas, sociais e sobre educação, ciência e cultura, constantes da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires. Artigo 43 - Os Estados-partes obrigam-se a proporcionar à Comissão as informações que esta lhes solicitar sobre a maneira pela qual seu direito interno assegura a aplicação efetiva de quaisquer disposições desta Convenção. Seção 3 - Competência Artigo 44 - Qualquer pessoa ou grupo de pessoas, ou entidade não-governamental legalmente reconhecida em um ou mais Estados-membros da Organização, pode apresentar à Comissão petições que contenham denúncias ou queixas de violação desta Convenção por um Estado-parte. Artigo 45 - 1. Todo Estado-parte pode, no momento do depósito do seu instrumento de ratificação desta Convenção, ou de adesão a ela, ou em qualquer momento posterior, declarar que reconhece a competência da Comissão para receber e examinar as comunicações em que um Estado-parte alegue haver outro Estado-parte incorrido em violações dos direitos humanos estabelecidos nesta Convenção. 2. As comunicações feitas em virtude deste artigo só podem ser admitidas e examinadas se forem apresentadas por um Estado-parte que haja feito uma declaração pela qual reconheça a referida competência da Comissão. A Comissão não admitirá nenhuma comunicação contra um Estado-parte que não haja feito tal declaração. 3. As declarações sobre reconhecimento de competência podem ser feitas para que esta vigore por tempo indefinido, por período determinado ou para casos específicos. 4. As declarações serão depositadas na Secretaria Geral da Organização dos Estados Americanos, a qual encaminhará cópia das mesmas aos Estados-membros da referida Organização. Artigo 46 - Para que uma petição ou comunicação apresentada de acordo com os artigos 44 ou 45 seja admitida pela Comissão, será necessário: a) que hajam sido interpostos e esgotados os recursos da jurisdição interna, de acordo com os princípios de Direito Internacional geralmente reconhecidos; b) que seja apresentada dentro do prazo de seis meses, a partir da data em que o presumido prejudicado em seus direitos tenha sido notificado da decisão definitiva; c) que a matéria da petição ou comunicação não esteja pendente de outro processo de solução internacional; e d) que, no caso do artigo 44, a petição contenha o nome, a nacionalidade, a profissão, o domicílio e a assinatura da pessoa ou pessoas ou do representante legal da entidade que submeter a petição. 2. As disposições das alíneas "a" e "b" do inciso 1 deste artigo não se aplicarão quando: a) não existir, na legislação interna do Estado de que se tratar, o devido processo legal para a proteção do direito ou direitos que se alegue tenham sido violados; b) não se houver permitido ao presumido prejudicado em seus direitos o acesso aos recursos da jurisdição interna, ou houver sido ele impedido de esgotá-los; e c) houver demora injustificada na decisão sobre os mencionados recursos. Artigo 47 - A Comissão declarará inadmissível toda petição ou comunicação apresentada de acordo com os artigos 44 ou 45 quando: a) não preencher algum dos requisitos estabelecidos no artigo 46; b) não expuser fatos que caracterizem violação dos direitos garantidos por esta Convenção; c) pela exposição do próprio peticionário ou do Estado, for manifestamente infundada a petição ou comunicação ou for evidente sua total improcedência; ou d) for substancialmente reprodução de petição ou comunicação anterior, já examinada pela Comissão ou por outro organismo internacional. Seção 4 - Processo Artigo 48 - 1. A Comissão, ao receber uma petição ou comunicação na qual se alegue a violação de qualquer dos direitos consagrados nesta Convenção, procederá da seguinte maneira: a) se reconhecer a admissibilidade da petição ou comunicação, solicitará informações ao Governo do Estado ao qual pertença a autoridade apontada como responsável pela violação alegada e transcreverá as partes pertinentes da petição ou comunicação. As referidas informações devem ser enviadas dentro de um prazo razoável, fixado pela Comissão ao considerar as circunstâncias de cada caso; b) recebidas as informações, ou transcorrido o prazo fixado sem que sejam elas recebidas, verificará se existem ou subsistem os motivos da petição ou comunicação. No caso de não existirem ou não subsistirem, mandará arquivar o expediente; c) poderá também declarar a inadmissibilidade ou a improcedência da petição ou comunicação, com base em informação ou prova supervenientes; d) se o expediente não houver sido arquivado, e com o fim de comprovar os fatos, a Comissão procederá, com conhecimento das partes, a um exame do assunto exposto na petição ou comunicação. Se for necessário e conveniente, a Comissão procederá a uma investigação para cuja eficaz realização solicitará, e os Estados interessados lhe proporcionarão, todas as facilidades necessárias; e) poderá pedir aos Estados interessados qualquer informação pertinente e receberá, se isso for solicitado, as exposições verbais ou escritas que apresentarem os interessados; e f) pôr-se-á à disposição das partes interessadas, a fim de chegar a uma solução amistosa do assunto, fundada no respeito aos direitos reconhecidos nesta Convenção. 2. Entretanto, em casos graves e urgentes, pode ser realizada uma investigação, mediante prévio consentimento do Estado em cujo território se alegue houver sido cometida a violação, tão somente com a apresentação de uma petição ou comunicação que reúna todos os requisitos formais de admissibilidade. Artigo 49 - Se se houver chegado a uma solução amistosa de acordo com as disposições do inciso 1, "f", do artigo 48, a Comissão redigirá um relatório que será encaminhado ao peticionário e aos Estados-partes nesta Convenção e posteriormente transmitido, para sua publicação, ao Secretário Geral da Organização dos Estados Americanos. O referido relatório conterá uma breve exposição dos fatos e da solução alcançada. Se qualquer das partes no caso o solicitar, ser-lhe-á proporcionada a mais ampla informação possível. Artigo 50 - 1. Se não se chegar a uma solução, e dentro do prazo que for fixado pelo Estatuto da Comissão, esta redigirá um relatório no qual exporá os fatos e suas conclusões. Se o relatório não representar, no todo ou em parte, o acordo unânime dos membros da Comissão, qualquer deles poderá agregar ao referido relatório seu voto em separado. Também se agregarão ao relatório as exposições verbais ou escritas que houverem sido feitas pelos interessados em virtude do inciso 1, "e", do artigo 48. 2. O relatório será encaminhado aos Estados interessados, aos quais não será facultado publicá-lo. 3. Ao encaminhar o relatório, a Comissão pode formular as proposições e recomendações que julgar adequadas. Artigo 51 - 1. Se no prazo de três meses, a partir da remessa aos Estados interessados do relatório da Comissão, o assunto não houver sido solucionado ou submetido à decisão da Corte pela Comissão ou pelo Estado interessado, aceitando sua competência, a Comissão poderá emitir, pelo voto da maioria absoluta dos seus membros, sua opinião e conclusões sobre a questão submetida à sua consideração. 2. A Comissão fará as recomendações pertinentes e fixará um prazo dentro do qual o Estado deve tomar as medidas que lhe competir para remediar a situação examinada. 3. Transcorrido o prazo fixado, a Comissão decidirá, pelo voto da maioria absoluta dos seus membros, se o Estado tomou ou não as medidas adequadas e se publica ou não seu relatório. Capítulo VIII - CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS Seção 1 - Organização Artigo 52 - 1. A Corte compor-se-á de sete juízes, nacionais dos Estados-membros da Organização, eleitos a título pessoal dentre juristas da mais alta autoridade moral, de reconhecida competência em matéria de direitos humanos, que reúnam as condições requeridas para o exercício das mais elevadas funções judiciais, de acordo com a lei do Estado do qual sejam nacionais, ou do Estado que os propuser como candidatos. 2. Não deve haver dois juízes da mesma nacionalidade. Artigo 53 - 1. Os juízes da Corte serão eleitos, em votação secreta e pelo voto da maioria absoluta dos Estados-partes na Convenção, na Assembléia Geral da Organização, a partir de uma lista de candidatos propostos pelos mesmos Estados. 2. Cada um dos Estados-partes pode propor até três candidatos, nacionais do Estado que os propuser ou de qualquer outro Estado-membro da Organização dos Estados Americanos. Quando se propuser um lista de três candidatos, pelo menos um deles deverá ser nacional do Estado diferente do proponente. Artigo 54 - 1. Os juízes da Corte serão eleitos por um período de seis anos e só poderão ser reeleitos uma vez. O mandato de três dos juízes designados na primeira eleição expirará ao cabo de três anos. Imediatamente depois da referida eleição, determinar-se-ão por sorteio, na Assembléia Geral, os nomes desse três juízes. 2. O juiz eleito para substituir outro, cujo mandato não haja expirado, completará o período deste. 3. Os juízes permanecerão em suas funções até o término dos seus mandatos. Entretanto, continuarão funcionando nos casos de que já houverem tomado conhecimento e que se encontrem em fase de sentença e, para tais efeitos, não serão substituídos pelos novos juízes eleitos. Artigo 55 - 1. O juiz, que for nacional de algum dos Estados-partes em caso submetido à Corte, conservará o seu direito de conhecer do mesmo. 2. Se um dos juízes chamados a conhecer do caso for de nacionalidade de um dos Estados-partes, outro Estado-parte no caso poderá designar uma pessoa de sua escolha para integrar a Corte, na qualidade de juiz ad hoc. 3. Se, dentre os juízes chamados a conhecer do caso, nenhum for da nacionalidade dos Estados-partes, cada um destes poderá designar um juiz ad hoc. 4. O juiz ad hoc deve reunir os requisitos indicados no artigo 52. 5. Se vários Estados-partes na Convenção tiverem o mesmo interesse no caso, serão considerados como uma só parte, para os fins das disposições anteriores. Em caso de dúvida, a Corte decidirá. Artigo 56 - O quorum para as deliberações da Corte é constituído por cinco juízes. Artigo 57 - A Comissão comparecerá em todos os casos perante a Corte. Artigo 58 - 1. A Corte terá sua sede no lugar que for determinado, na Assembléia Geral da Organização, pelos Estados-partes na Convenção, mas poderá realizar reuniões no território de qualquer Estado-membro da Organização dos Estados Americanos em que considerar conveniente, pela maioria dos seus membros e mediante prévia aquiescência do Estado respectivo. Os Estados-partes na Convenção podem, na Assembléia Geral, por dois terços dos seus votos, mudar a sede da Corte. 2. A Corte designará seu Secretário. 3. O Secretário residirá na sede da Corte e deverá assistir às reuniões que ela realizar fora da mesma. Artigo 59 - A Secretaria da Corte será por esta estabelecida e funcionará sob a direção do Secretário Geral da Organização em tudo o que não for incompatível com a independência da Corte. Seus funcionários serão nomeados pelo Secretário Geral da Organização, em consulta com o Secretário da Corte. Artigo 60 - A Corte elaborará seu Estatuto e submetê-lo-á à aprovação da Assembléia Geral e expedirá seu Regimento. Seção 2 - Competência e funções Artigo 61 - 1. Somente os Estados-partes e a Comissão têm direito de submeter um caso à decisão da Corte. 2. Para que a Corte possa conhecer de qualquer caso, é necessário que sejam esgotados os processos previstos nos artigos 48 a 50. Artigo 62 - 1. Todo Estado-parte pode, no momento do depósito do seu instrumento de ratificação desta Convenção ou de adesão a ela, ou em qualquer momento posterior, declarar que reconhece como obrigatória, de pleno direito e sem convenção especial, a competência da Corte em todos os casos relativos à interpretação ou aplicação desta Convenção. 2. A declaração pode ser feita incondicionalmente, ou sob condição de reciprocidade, por prazo determinado ou para casos específicos. Deverá ser apresentada ao Secretário Geral da Organização, que encaminhará cópias da mesma a outros Estados-membros da Organização e ao Secretário da Corte. 3. A Corte tem competência para conhecer de qualquer caso, relativo à interpretação e aplicação das disposições desta Convenção, que lhe seja submetido, desde que os Estados-partes no caso tenham reconhecido ou reconheçam a referida competência, seja por declaração especial, como prevêem os incisos anteriores, seja por convenção especial. Artigo 63 - 1. Quando decidir que houve violação de um direito ou liberdade protegidos nesta Convenção, a Corte determinará que se assegure ao prejudicado o gozo do seu direito ou liberdade violados. Determinará também, se isso for procedente, que sejam reparadas as consequências da medida ou situação que haja configurado a violação desses direitos, bem como o pagamento de indenização justa à parte lesada. 2. Em casos de extrema gravidade e urgência, e quando se fizer necessário evitar danos irreparáveis às pessoas, a Corte, nos assuntos de que estiver conhecendo, poderá tomar as medidas provisórias que considerar pertinentes. Se se tratar de assuntos que ainda não estiverem submetidos ao seu conhecimento, poderá atuar a pedido da Comissão. Artigo 64 - 1. Os Estados-membros da Organização poderão consultar a Corte sobre a interpretação desta Convenção ou de outros tratados concernentes à proteção dos direitos humanos nos Estados americanos. Também poderão consultá-la, no que lhes compete, os órgãos enumerados no capítulo X da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires. 2. A Corte, a pedido de um Estado-membro da Organização, poderá emitir pareceres sobre a compatibilidade entre qualquer de suas leis internas e os mencionados instrumentos internacionais. Artigo 65 - A Corte submeterá à consideração da Assembléia Geral da Organização, em cada período ordinário de sessões, um relatório sobre as suas atividades no ano anterior. De maneira especial, e com as recomendações pertinentes, indicará os casos em que um Estado não tenha dado cumprimento a suas sentenças. Seção 3 - Processo Artigo 66 - 1. A sentença da Corte deve ser fundamentada. 2. Se a sentença não expressar no todo ou em parte a opinião unânime dos juízes, qualquer deles terá direito a que se agregue à sentença o seu voto dissidente ou individual. Artigo 67 - A sentença da Corte será definitiva e inapelável. Em caso de divergência sobre o sentido ou alcance da sentença, a Corte interpretá-la-á, a pedido de qualquer das partes, desde que o pedido seja apresentado dentro de noventa dias a partir da data da notificação da sentença. Artigo 68 - 1. Os Estados-partes na Convenção comprometem-se a cumprir a decisão da Corte em todo caso em que forem partes. 2. A parte da sentença que determinar indenização compensatória poderá ser executada no país respectivo pelo processo interno vigente para a execução de sentenças contra o Estado. Artigo 69 - A sentença da Corte deve ser notificada às partes no caso e transmitida aos Estados-partes na Convenção. 12.11. CONVENÇÃO INTERAMERICANA PARA PREVENIR, PUNIR E ERRADICAR A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER – “CONVENÇÃO DE BELÉM DO PARÁ” (1994) Adotada pela Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA) no dia 6-6-1994, a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, Convenção de Belém do Pará, formalizou‑se em importante instrumento de proteção das mulheres. Foi ratificada pelo Brasil em 27-11-1995, vista como um marco visionário referente ao tema, dispondo sobre a definição de violência contra as mulheres, medidas protetivas, assecuratórias e repressivas. Foi um grande avanço no reconhecimento de direitos, culminando no fortalecimento da cidadania. A Convenção de Belém do Pará exerce significativo exemplo de proteção. Motivação da adoção da Convenção A Assembleia Geral, motivada pelas preocupações abaixo, adotaram a convenção: Considerando que o reconhecimento e o respeito irrestrito de todos os direitos da mulher são condições indispensáveis para seu desenvolvimento individual e para a criação de uma sociedade mais justa, solidária e pacífica; Preocupada porque a violência em que vivem muitas mulheres da América, sem distinção de raça, classe, religião, idade ou qualquer outra condição, é uma situação generalizada; Persuadida de sua responsabilidade histórica de fazer frente a esta situação para procurar soluções positivas; Convencida da necessidade de dotar o sistema interamericano de um instrumento internacional que contribua para solucionar o problema da violência contra a mulher; Recordando as conclusões e recomendações da Consulta Interamericana sobre a Mulher e a Violência, celebrada em 1990, e a Declaração sobre a Erradicação da Violência contra a Mulher, nesse mesmo ano, adotada pela Vigésima Quinta Assembleia de Delegadas; Recordando também a Resolução AG/RES.1128(XXI-0/91) “Proteção da Mulher Contra a Violência”, aprovada pela Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos; Levando em consideração o amplo processo de consulta realizado pela Comissão Interamericana de Mulheres desde 1990 para o estudo e a elaboração de um projeto de convenção sobre a mulher e a violência. Preâmbulo Os Estados‑Partes nesta Convenção, convieram motivados pelas seguintes assertivas: Reconhecendo que o respeito irrestrito aos Direitos Humanos foi consagrado na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e na Declaração Universal dos Direitos Humanos e reafirmado em outros instrumentos internacionais e regionais; Afirmando que a violência contra a mulher constitui uma violação dos direitos humanos e liberdades fundamentais e limita total ou parcialmente a observância, gozo e exercício de tais direitos e liberdades; Preocupados porque a violência contra a mulher constitui ofensa contra a dignidade humana e é manifestação de relações de poder historicamente desiguais entre mulheres e homens; Recordando a Declaração para a Erradicação da Violência contra a Mulher, aprovada pela Vigésima Quinta Assembleia de Delegadas da Comissão Interamericana de Mulheres, e afirmando que a violência contra a mulher permeia todos os setores da sociedade, independentemente de classe, raça ou grupo étnico, renda, cultura, idade ou religião, e afeta negativamente suas próprias bases; Convencidos de que a eliminação da violência contra a mulher é condição indispensável para seu desenvolvimento individual e social e sua plena igualitária participação em todas as esferas da vida; e Convencidos de que a adoção de uma convenção para prevenir e erradicar todas as formas de violência contra a mulher, no âmbito da Organização dos Estados Americanos, constitui positiva contribuição no sentido de proteger os direitos da mulher e eliminar as situações de violência contra ela. Definição Para os efeitos desta Convenção, entender‑se‑á por violência contra a mulher qualquer ato ou conduta, baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na esfera privada. Âmbito de aplicação Entender‑se‑á que a violência contra a mulher abrange a violência física, sexual e psicológica: a) ocorrida no âmbito da família ou unidade doméstica ou em qualquer relação interpessoal, quer o agressor compartilhe, tenha compartilhado ou não a sua residência, incluindo‑se, entre outras formas, o estupro, maus‑tratos e abuso sexual; b) ocorrida na comunidade e cometida por qualquer pessoa, incluindo, entre outras formas, o estupro, abuso sexual, tortura, tráfico de mulheres, prostituição forçada, sequestro e assédio sexual no local de trabalho, bem como em instituições educacionais, serviços de saúde ou qualquer outro lugar; e c) perpetrada ou tolerada pelo Estado ou seus agentes, onde quer que ocorra. Direitos protegidos Toda mulher tem direito a uma vida livre de violência, tanto na esfera pública quanto na esfera privada. Toda mulher tem direito ao reconhecimento, desfrute, exercício e proteção de todos os direitos humanos e às liberdades consagradas em todos os instrumentos regionais e internacionais relativos aos direitos humanos. Estes direitos abrangem, entre outros: a) direito a que se respeite sua vida; b) direito a que se respeite sua integridade física, mental e moral; c) direito à liberdade e segurança pessoais; d) direito a não ser submetida a tortura; e) direito a que se respeite a dignidade inerente à sua pessoa e a que se proteja sua família; f) direito à igualdade de proteção perante a lei e da lei; g) direito a recurso simples e rápido perante tribunal competente que a proteja contra atos que violem seus direitos; h) direito de livre associação; i) direito à liberdade de professar a religião e as próprias crenças, de acordo com a lei; j) direito a ter igualdade de acesso às funções públicas de seu país e a participar nos assuntos públicos, inclusive na tomada de decisões. Toda mulher poderá exercer livre e plenamente seus direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais e contará com a total proteção desses direitos consagrados nos instrumentos regionais e internacionais sobre direitos humanos. Os Estados‑Partes reconhecem que a violência contra a mulher impede e anula o exercício desses direitos. O direito de toda mulher a ser livre de violência abrange, entre outros: a) o direito da mulher ser livre de todas as formas de discriminação; e b) o direito da mulher a ser valorizada e educada livre de padrões estereotipados de comportamento e costumes sociais e culturais baseados em conceitos de inferioridade ou subordinação. Deveres dos Estados Os Estados‑Partes condenam todas as formas de violência contra a mulher e convêm em adotar, por todos os meios apropriados e sem demora, políticas destinadas a prevenir, punir e erradicar tal violência e empenhar‑se em: a) abster‑se de qualquer ato ou prática de violência contra a mulher e velar para que as autoridades, seus funcionários e pessoal, bem como agentes e instituições públicos ajam de conformidade com essa obrigação; b) agir com o devido zelo para prevenir, investigar e punir a violência contra a mulher; c) incorporar na sua legislação interna normas penais, civis, administrativas e de outra natureza, que sejam necessárias para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, bem como adotar as medidas administrativas adequadas que forem aplicáveis; d) adotar medidas jurídicas que exijam do agressor que se abstenha de fustigar, perseguir, intimidar e ameaçar a mulher ou de fazer uso de qualquer método que prejudique ou ponha em perigo a sua vida ou integridade ou danifique sua propriedade; e) tomar todas as medidas adequadas, inclusive legislativas, para modificar ou abolir leis e regulamentos vigentes ou modificar práticas jurídicas ou consuetudinárias que respaldem a persistência e a tolerância da violência contra a mulher; f) estabelecer procedimentos jurídicos justos e eficazes para a mulher sujeita a violência, inclusive, entre outros, medidas de proteção, um juízo oportuno e efetivo acesso a tais processos; g) estabelecer mecanismos judiciais e administrativos necessários para assegurar que a mulher sujeita a violência tenha efetivo acesso a restituição, reparação do dano e outros meios de compensação justos e eficazes; e h) adotar as medidas legislativas ou de natureza necessárias à vigência desta Convenção. Os Estados‑Partes convêm em adotar, progressivamente, medidas específicas, inclusive programas destinados a: a) promover o conhecimento e a observância do direito da mulher a uma vida livre de violência e o direito da mulher a que se respeitem e protejam seus direitos humanos; b) modificar os padrões sociais e culturais de conduta de homens e mulheres, inclusive a formulação de programas formais e não formais adequados a todos os níveis do processo educacional, a fim de combater preconceitos e costumes e todas as outras práticas baseadas na premissa da inferioridade ou superioridade de qualquer dos gêneros ou nos papéis estereotipados para o homem e a mulher, que legitimem ou exacerbem a violência contra a mulher; c) promover a educação e treinamento de todo pessoal judiciário e policial e demais funcionários responsáveis pela aplicação da lei, bem como do pessoal encarregado da implementação de políticas de prevenção, punição e erradicação da violência contra a mulher; d) prestar serviços especializados apropriados a mulher sujeita a violência, por intermédio de entidades dos setores público e privado, inclusive abrigos, serviços de orientação familiar, quando for o caso, e atendimento e custódia dos menores afetados; e) promover e apoiar programas de educação governamentais e privados destinados a conscientizar o público para os problemas da violência contra a mulher, recursos jurídicos e reparação relacionados com essa violência; f) proporcionar à mulher sujeita a violência acesso a programas eficazes de recuperação e treinamento que lhe permitam participar plenamente na vida pública, privada e social; g) incentivar os meios de comunicação a que formulem diretrizes adequadas, de divulgação que contribuam para a erradicação da violência contra a mulher em todas as suas formas e enalteçam o respeito pela dignidade da mulher; h) assegurar pesquisa e coleta de estatísticas e de outras informações relevantes concernentes às causas, consequências e frequência da violência contra a mulher, a fim de avaliar a eficiência das medidas tomadas para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, bem como formular e implementar as mudanças necessárias; e i) promover a cooperação internacional para o intercâmbio de ideias e experiências, bem como a execução de programas destinados à proteção da mulher sujeita a violência. Para adoção das medidas a que se refere este capítulo, os Estados‑Partes levarão especialmente em conta a situação da mulher vulnerável a violência por sua raça, origem étnica ou condição de migrante, de refugiada ou de deslocada, entre outros motivos. Também será considerada violência a mulher gestante, deficiente, menor, idosa ou em situação socioeconômica desfavorável, afetada por situações de conflito armado ou de privação de liberdade (art. 9o). Mecanismos interamericanos de proteção A fim de proteger o direito de toda mulher a uma vida livre de violência, os Estados‑Partes deverão incluir nos relatórios nacionais à Comissão Interamericana de Mulheres informações sobre as medidas adotadas para prevenir e erradicar a violência contra a mulher, para prestar assistência à mulher afetada pela violência, bem como sobre as dificuldades que observarem na aplicação das medidas e os fatores que contribuam para a violência contra a mulher. Os Estados‑Partes nesta Convenção e a Comissão Interamericana de Mulheres poderão solicitar à Corte Interamericana de Direitos Humanos parecer sobre a interpretação desta Convenção. Qualquer pessoa ou grupo de pessoas, ou qualquer entidade não governamental juridicamente reconhecida em um ou mais Estados‑membros da Organização, poderá apresentar à Comissão Interamericana de Direitos Humanos petições referentes a denúncias ou queixas de violação do artigo 7 o desta Convenção por um Estado‑Parte, devendo a Comissão considerar tais petições de acordo com as normas e procedimentos estabelecidos na Convenção Americana sobre Direitos Humanos e no Estatuto e Regulamento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, para a apresentação e consideração de petições. Questões de concursos 12) DPE/BA 2010 - CESPE - Defensor Público - Classe inicial Acerca dos mecanismos de proteção internacional de direitos humanos, julgue os itens subsequentes. A violação grave e sistemática dos direitos humanos das mulheres em um Estado pode ser investigada pelo Comitê sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher, que recebe petições com denúncias de violação a esses direitos. 12.12. CONVENÇÃO CONTRA A TORTURA E OUTROS TRATAMENTOS OU PENAS CRUÉIS, DESUMANOS OU DEGRADANTES Foi adotada pela Res. no 39/1946 da Assembleia Geral das Nações Unidas em 10-12-1984, na Sessão XL, realizada em Nova York, sendo aprovada no Brasil pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo no 4, de 23-5-1989. Foi promulgada pelo Dec. no 40, de 15-2-1991. Considerações da Convenção Com o desejo de tornar mais eficaz a luta contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes em todo o mundo, surgem os considerandos seguidos de 33 artigos, como seguem: de acordo com os princípios proclamados pela Carta das Nações Unidas, o reconhecimento dos direitos iguais e inalienáveis de todos os membros da família humana é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo. reconhecimento dos direitos que emanam da dignidade inerente à pessoa humana. obrigação que incumbe aos Estados, em virtude da Carta, em particular do art. 55, de promover o respeito universal e a observância dos direitos humanos e das liberdades fundamentais. ninguém será sujeito a tortura ou a pena ou tratamento cruel, desumano ou degradante. Termo tortura do art. 1o Para fins da presente Convenção, o termo “tortura” designa qualquer ato pelo qual dores ou sofrimentos agudos, físicos ou mentais, são infligidos intencionalmente a uma pessoa a fim de obter, dela ou de terceira pessoa, informações ou confissões; de castigá‑la por ato que ela ou terceira pessoa tenha cometido ou seja suspeita de ter cometido; de intimidar ou coagir esta pessoa ou outras pessoas; ou por qualquer motivo baseado em discriminação de qualquer natureza; quando tais dores ou sofrimentos são infligidos por um funcionário público ou outra pessoa no exercício de funções públicas, ou por sua instigação, ou com o seu consentimento ou aquiescência. Não se considerará como tortura as dores ou sofrimentos que sejam consequência unicamente de sanções legítimas, ou que sejam inerentes a tais sanções ou delas decorram. O presente artigo não será interpretado de maneira a restringir qualquer instrumento internacional ou legislação nacional que contenha ou possa conter dispositivos de alcance mais amplo. Medidas de cada signatário – art. 2o Cada Estado tomará medidas eficazes de caráter legislativo, administrativo, judicial ou de outra natureza, a fim de impedir a prática de atos de tortura em qualquer território sob sua jurisdição. Em nenhum caso poderão invocar‑se circunstâncias excepcionais, como ameaça ou estado de guerra, instabilidade política interna ou qualquer outra emergência pública, como justificação para a tortura. A ordem de um funcionário superior ou de uma autoridade pública não poderá ser invocada como justificação para a tortura. Medidas protetivas – arts. 3o e 4o Nenhum Estado‑Parte procederá à expulsão, devolução ou extradição de uma pessoa para outro Estado, quando houver razões substanciais para crer que ela corre perigo de ali ser submetida a tortura. A fim de determinar a existência de tais razões, as autoridades competentes levarão em conta todas as considerações pertinentes, inclusive, se for o caso, a existência, no Estado em questão, de um quadro de violações sistemáticas, graves e maciças de direitos humanos. Cada Estado‑Parte assegurará que todos os atos de tortura sejam considerados crimes segundo a sua legislação penal. O mesmo aplicar‑se‑á à tentativa de tortura e a todo ato de qualquer pessoa que constitua cumplicidade ou participação na tortura. Cada Estado‑Parte punirá esses crimes com penas adequadas que levem em conta a sua gravidade. Competência – art. 5o Cada Estado‑Parte tomará as medidas necessárias para estabelecer sua jurisdição sobre os crimes previstos no art. 4o, nos seguintes casos: a) quando os crimes tenham sido cometidos em qualquer território sob sua jurisdição ou a bordo de navio ou aeronave registrada no Estado em questão; b) quando o suposto autor for nacional do Estado em questão; c) quando a vítima for nacional do Estado em questão e este o considerar apropriado. Cada Estado‑Parte tomará também as medidas necessárias para estabelecer sua jurisdição sobre tais crimes, nos casos em que o suposto autor se encontre em qualquer território sob sua jurisdição e o Estado não o extradite, de acordo com o art. 8o, para qualquer dos Estados mencionados no § 1o do presente artigo. Esta Convenção não exclui qualquer jurisdição criminal exercida de acordo com o direito interno. Medidas repressivas – arts. 6o e 7o Todo Estado‑Parte em cujo território se encontre uma pessoa suspeita de ter cometido qualquer dos crimes mencionados no art. 4o, se considerar, após o exame das informações de que dispõe, que as circunstâncias o justificam, procederá à detenção de tal pessoa ou tomará outras medidas legais para assegurar sua presença. A detenção e outras medidas legais serão tomadas de acordo com a lei do Estado, mas vigorarão apenas pelo tempo necessário ao início do processo penal ou de extradição. O Estado em questão procederá imediatamente a uma investigação preliminar dos fatos. Qualquer pessoa detida de acordo com o § 1o terá asseguradas facilidades para comunicar‑se imediatamente com o representante mais próximo do Estado de que é nacional ou, se for apátrida, com o representante de sua residência habitual. Quando o Estado, em virtude deste artigo, houver detido uma pessoa, notificará imediatamente os Estados mencionados no art. 5o, § 1o, sobre tal detenção e sobre as circunstâncias que a justificam. O Estado que proceder à investigação preliminar, a que se refere o § 2o do presente artigo, comunicará sem demora os resultados aos Estados antes mencionados e indicará se pretende exercer sua jurisdição. O Estado‑Parte no território sob a jurisdição do qual o suposto autor de qualquer dos crimes mencionados no art. 4o for encontrado, se não o extraditar, obrigar‑se‑á, nos casos contemplados no art. 5o, a submeter o caso às suas autoridades competentes para o fim de este ser processado. As referidas autoridades tomarão sua decisão de acordo com as mesmas normas aplicáveis a qualquer crime de natureza grave, conforme a legislação do referido Estado. Nos casos previstos no § 2o do art. 5o, as regras sobre prova para fins de processo e condenação não poderão de modo algum ser menos rigorosas do que as que se aplicarem aos casos previstos no § 1o do art. 5o. Qualquer pessoa processada por qualquer dos crimes previstos no art. 4o receberá garantias de tratamento justo em todas as fases do processo. Extradição – art. 8o Os crimes a que se refere o art. 4o serão considerados extraditáveis em qualquer tratado de extradição existente entre os Estados‑Partes. Os Estados‑Partes obrigar‑se‑ão a incluir tais crimes como extraditáveis em todo tratado de extradição que vierem a concluir entre si. Se um Estado‑Parte que condiciona a extradição à existência do tratado receber um pedido de extradição por parte de outro Estado‑Parte com o qual não mantém tratado de extradição, poderá considerar a presente Convenção como base legal para a extradição com respeito a tais crimes. A extradição sujeitar‑se‑á às outras condições estabelecidas pela lei do Estado que receber a solicitação. Os Estados‑Partes que não condicionam a extradição à existência de um tratado reconhecerão, entre si, tais crimes como extraditáveis, dentro das condições estabelecidas pela lei do Estado que receber a solicitação. O crime será considerado, para o fim de extradição entre os Estados‑Partes, como se tivesse ocorrido não apenas no lugar em que ocorreu, mas também nos territórios dos Estados chamados a estabelecerem sua jurisdição de acordo com o § 1o do art. 5o. Característica assistencial – art. 9o Os Estados‑Partes prestarão entre si a maior assistência possível, em relação aos procedimentos criminais instaurados relativamente a qualquer dos delitos mencionados no art. 4o, inclusive no que diz respeito ao fornecimento de todos os elementos de prova necessários para o processo que estejam em seu poder. Os Estados‑Partes cumprirão as obrigações decorrentes do § 1o do presente artigo, conforme quaisquer tratados de assistência judiciária recíproca existentes entre si. Orientação das Forças Armadas – art. 10 Cada Estado‑Parte assegurará que o ensino e a informação sobre a proibição da tortura sejam plenamente incorporados no treinamento do pessoal civil ou militar encarregado da aplicação da lei, do pessoal médico, dos funcionários públicos e de quaisquer outras pessoas que possam participar da custódia, interrogatório ou tratamento de qualquer pessoa submetida a qualquer forma de prisão, detenção ou reclusão. Cada Estado‑Parte incluirá a referida proibição nas normas ou instruções relativas aos deveres e funções de tais pessoas. Interrogatório – art. 11 Cada Estado‑Parte manterá sistematicamente sob exame as normas, instruções, métodos e práticas de interrogatório, bem como as disposições sobre a custódia e o tratamento das pessoas submetidas, em qualquer território sob a sua jurisdição, a qualquer forma de prisão, detenção ou reclusão, com vistas a evitar qualquer caso de tortura. Reparação – art. 14 Cada Estado‑Parte assegurará em seu sistema jurídico, à vítima de um ato de tortura, o direito à reparação e a à indenização justa e adequada, incluídos os meios necessários para a mais completa reabilitação possível. Em caso de morte da vítima como resultado de um ato de tortura, seus dependentes terão direito à indenização. O disposto no presente artigo não afetará qualquer direito a indenização que a vítima ou outra pessoa possam ter em decorrência das leis nacionais. Criação do Comitê – art. 17 e ss. Será constituído um Comitê. Ele será composto por dez peritos de elevada reputação moral e reconhecida competência em matéria de direitos humanos, os quais exercerão suas funções a título pessoal. Os peritos serão eleitos pelos Estados‑Partes, levando em conta uma distribuição geográfica equitativa e a utilidade da participação de algumas pessoas com experiência jurídica. Os membros do Comitê serão eleitos em votação secreta, dentre uma lista de pessoas indicadas pelos Estados‑Partes. Cada Estado‑Parte pode indicar uma pessoa dentre os seus nacionais. Os Estados ‑Partes terão presente a utilidade da indicação de pessoas que sejam também membros do Comitê de Direitos Humanos, estabelecido de acordo com o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, e que estejam dispostas a servir no Comitê contra a Tortura. Os membros do Comitê serão eleitos em reuniões bienais dos Estados‑Partes convocadas pelo Secretário‑Geral das Nações Unidas. Nestas reuniões, nas quais o quorum será estabelecido por dois terços dos Estados‑Partes, serão eleitos membros do Comitê os candidatos que obtiverem o maior número de votos e a maioria absoluta dos votos representantes dos Estados‑Partes presentes e votantes. A primeira eleição se realizará no máximo seis meses após a data da entrada em vigor da presente Convenção. Ao menos quatro meses antes da data de cada eleição o Secretário‑Geral da Organização das Nações Unidas enviará uma carta aos Estados‑Partes, para convidá‑los a apresentar suas candidaturas, no prazo de três meses. O Secretário‑Geral da Organização das Nações Unidas organizará uma lista por ordem alfabética de todos os candidatos assim designados, com indicações dos Estados‑ Partes que os tiverem designado, e a comunicará aos Estados‑Partes. Os membros do Comitê serão eleitos para um mandato de quatro anos. Poderão, caso suas candidaturas sejam apresentadas novamente, ser reeleitos. Entretanto, o mandato de cinco dos membros eleitos na primeira eleição expirará ao final de dois anos; imediatamente após a primeira eleição, o presidente da reunião a que se refere o § 3o do presente artigo indicará, por sorteio, os nomes desses cinco membros. Se um membro do Comitê vier a falecer, a demitir‑se de suas funções ou, por outro motivo qualquer, não puder cumprir com suas obrigações no Comitê, o Estado‑Parte que apresentou sua candidatura indicará, entre seus nacionais, outro perito para cumprir o restante de seu mandato, sendo que a referida indicação estará sujeita à aprovação da maioria dos Estados‑Partes. Considerar‑se‑á como concedida a referida aprovação, a menos que a metade ou mais dos Estados‑Partes venham a responder negativamente dentro de um prazo de seis semanas, a contar do momento em que o Secretário ‑Geral das Nações Unidas lhes houver comunicado a candidatura proposta. Correrão por conta dos Estados‑Partes as despesas em que vierem a incorrer os membros do Comitê no desempenho de suas funções no referido órgão. O Comitê elegerá sua Mesa para um período de dois anos. Os membros da Mesa poderão ser reeleitos. Os Estados‑Partes submeterão ao Comitê, por intermédio do Secretário‑Geral das Nações Unidas, relatórios sobre as medidas por eles adotadas no cumprimento das obrigações assumidas, em virtude da presente Convenção, no Estado‑Parte interessado. A partir de então, os Estados‑Partes deverão apresentar relatórios suplementares a cada quatro anos, sobre todas as novas disposições que houverem adotado, bem como outros relatórios que o Comitê vier a solicitar. O Secretário‑Geral das Nações Unidas transmitirá os relatórios a todos os Estados‑Partes. Cada relatório será examinado pelo Comitê, que poderá fazer os comentários gerais que julgar oportunos e os transmitirá ao Estado‑Parte interessado. Este poderá, em resposta ao Comitê, comunicar ‑lhe todas as observações que deseje formular. O Comitê poderá, a seu critério, tomar a decisão de incluir qualquer comentário que houver feito, de acordo com o que estipula o § 3o do presente artigo, junto com as observações conexas recebidas do Estado‑Parte interessado, em seu relatório anual que apresentará, em conformidade com o art. 24. Se assim o cogitar o Estado‑Parte interessado, o Comitê poderá também incluir cópia do relatório apresentado, em virtude do § 1o do presente artigo. O Comitê, no caso de vir a receber informações fidedignas que lhe pareçam indicar, de forma fundamentada, que a tortura é praticada sistematicamente no território de um Estado‑Parte, convidará o Estado‑Parte em questão a cooperar no exame das informações e, nesse sentido, a transmitir ao Comitê as observações que julgar pertinentes. Levando em consideração todas as observações que houver apresentado o Estado‑Parte interessado, bem como quaisquer outras informações pertinentes de que dispuser, o Comitê poderá, se lhe parecer justificável, designar um ou vários de seus membros para que procedam a uma investigação confidencial e informem urgentemente o Comitê. No caso de realizar‑se uma investigação nos termos do § 2o do presente artigo, o Comitê procurará obter a colaboração do Estado‑Parte interessado. Com a concordância do Estado‑Parte em questão, a investigação poderá incluir uma visita ao seu território. Depois de haver examinado as conclusões apresentadas por um ou vários de seus membros, nos termos do § 2o do presente artigo, o Comitê as transmitirá ao Estado‑Parte interessado, junto com as observações ou sugestões que considerar pertinentes, em vista da situação. Todos os trabalhos do Comitê a que se faz referência nos §§ 1o ao 4o do presente artigo serão confidenciais e, em todas as etapas dos referidos trabalhos, procurar‑se‑á obter a cooperação do Estado ‑Parte. Quando estiverem concluídos os trabalhos relacionados com uma investigação realizada de acordo com o § 2o, o Comitê poderá, após celebrar consultas com o Estado‑Parte interessado, tomar a decisão de incluir um resumo dos resultados da investigação em seu relatório anual, que apresentará em conformidade com o art. 24. Todo Estado‑Parte na presente Convenção poderá declarar, em virtude do presente artigo, a qualquer momento, que reconhece a competência do Comitê para receber e examinar as comunicações enviadas por pessoas sob sua jurisdição, ou em nome delas, que aleguem ser vítimas de violação, por um Estado‑Parte, das disposições da Convenção. O Comitê não receberá comunicação alguma relativa a um Estado‑Parte que não houver feito declaração dessa natureza. O Comitê considerará inadmissível qualquer comunicação recebida em conformidade com o presente artigo que seja anônima ou que, a seu juízo, constitua abuso do direito de apresentar as referidas comunicações, ou que seja incompatível com as disposições da presente Convenção. O Comitê apresentará, em virtude da presente Convenção, um relatório anual sobre as suas atividades aos Estados‑Partes e à Assembleia Geral das Nações Unidas. Arbitragem – art. 30 As controvérsias entre dois ou mais Estados‑Partes, com relação à interpretação ou aplicação da presente Convenção, que não puderem ser dirimidas por meio de negociação, serão, a pedido de um deles, submetidas à arbitragem. Se, durante os seis meses seguintes à data do pedido de arbitragem, as partes não lograrem pôr‑se de acordo quanto aos termos do compromisso de arbitragem, qualquer das partes poderá submeter a controvérsia à Corte Internacional de Justiça, mediante solicitação feita em conformidade com o Estatuto da Corte. Cada Estado‑Parte poderá declarar, por ocasião da assinatura ou ratificação da presente Convenção, que não se considera obrigado pelo § 1o deste artigo. Os demais Estados‑Partes não estarão obrigados pelo referido parágrafo, com relação a qualquer Estado‑Parte que houver formulado reserva dessa natureza. Todo Estado‑Parte que houver formulado reserva, em conformidade com o § 2o do presente artigo, poderá, a qualquer momento, tornar sem efeito essa reserva, mediante notificação endereçada ao Secretário‑Geral das Nações Unidas. Forma de representação – art. 31 Todo Estado‑Parte poderá denunciar a presente Convenção mediante notificação por escrito endereçada ao Secretário‑Geral das Nações Unidas. A denúncia produzirá efeitos um ano depois da data do recebimento da notificação pelo Secretário‑Geral. A referida denúncia não eximirá o Estado‑Parte das obrigações que lhe impõe a presente Convenção relativamente a qualquer ação ou omissão ocorrida antes da data em que a denúncia venha a produzir efeitos; a denúncia não acarretará, tampouco, a suspensão do exame de quaisquer questões que o Comitê já começara a examinar antes da data em que a denúncia veio a produzir efeitos. A partir da data em que vier a produzir efeitos a denúncia de um Estado‑Parte, o Comitê não dará início ao exame de qualquer nova questão referente ao Estado em apreço. 12.13. PROTOCOLO ADICIONAL À CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS CONTRA O CRIME ORGANIZADO TRANSNACIONAL RELATIVO À PREVENÇÃO, REPRESSÃO E PUNIÇÃO DO TRÁFICO DE PESSOAS, EM ESPECIAL MULHERES E CRIANÇAS Ratificado pelo Decreto no 5.017/2004 que promulga por meio do Decreto Legislativo no 231, de 29-5-2003, o texto do Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças. Foi adotado em Nova York em 15-11-2000. O Governo brasileiro depositou o instrumento de ratificação junto à Secretaria‑Geral da ONU em 29-1-2004 e só entrou em vigor no Brasil em 28-2-2004. Informações históricas A partir de 1814 a preocupação legislativa, com o Tratado de Paris entre Inglaterra e França, se cerceou ao tráfico negreiro, para fins de escravidão. O desempenho desta diplomacia culminou, em 1926, com a Convenção firmada pela Sociedade das Nações, reafirmada, em 1953, pela ONU. No Brasil, o tráfico de pessoas tem uma expressiva atuação presente em todos os Estados. As regiões norte e nordeste são exemplos significativos deste crime, principalmente para fins de exploração sexual. Preâmbulo Declara que uma ação eficaz para prevenir e combater o tráfico de pessoas, em especial mulheres e crianças, exige por parte dos países de origem, de trânsito e de destino uma abordagem global e internacional, que inclua medidas destinadas a prevenir esse tráfico, punir os traficantes e proteger as vítimas desse tráfico, designadamente protegendo os seus direitos fundamentais, internacionalmente reconhecidos. Tendo em conta que, apesar da existência de uma variedade de instrumentos internacionais que contêm normas e medidas práticas para combater a exploração de pessoas, especialmente mulheres e crianças, não existe nenhum instrumento universal que trate de todos os aspectos relativos ao tráfico de pessoas. Preocupados com o fato de na ausência desse instrumento, as pessoas vulneráveis ao tráfico não estarem suficientemente protegidas. Recordando a Res. no 53/111 da Assembleia Geral, de 9-12-1998, na qual a Assembleia decidiu criar um comitê intergovernamental especial, de composição aberta, para elaborar uma convenção internacional global contra o crime organizado transnacional e examinar a possibilidade de elaborar, designadamente, um instrumento internacional de luta contra o tráfico de mulheres e de crianças. Convencidos de que para prevenir e combater esse tipo de criminalidade será útil completar a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional com um instrumento internacional destinado a prevenir, reprimir e punir o tráfico de pessoas, em especial mulheres e crianças, acordaram por este protocolo que assim segue: Crime organizado transnacional O presente Protocolo completa a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional e será interpretado em conjunto com a Convenção. As disposições da Convenção aplicar‑se‑ão mutatis mutandis ao presente Protocolo, salvo se no mesmo se dispuser o contrário. As infrações estabelecidas em conformidade com o Artigo 5 do presente Protocolo serão consideradas como infrações estabelecidas em conformidade com a Convenção. Objetivo Este instrumento tem por finalidade a confecção de um estudo sistematizado, codificado, com profundidade e base científica, possibilitando e auxiliando no combate à erradicação do crime organizado, iniciando por projetos preventivos. Os objetivos do presente Protocolo são os seguintes: a) Prevenir e combater o tráfico de pessoas, prestando uma atenção especial às mulheres e às crianças; b) Proteger e ajudar as vítimas desse tráfico, respeitando plenamente os seus direitos humanos; e c) Promover a cooperação entre os Estados‑Partes de forma a atingir esses objetivos. Definição da expressão “tráfico de pessoas” Significa o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, à servidão ou à remoção de órgãos. O consentimento dado pela vítima de tráfico de pessoas será considerado irrelevante se tiver sido utilizado qualquer um dos meios referidos. O termo “criança” significa qualquer pessoa com idade inferior a dezoito anos. Aplicabilidade O presente Protocolo aplicar‑se‑á, salvo disposição em contrário, à prevenção, investigação e repressão das infrações estabelecidas em conformidade com o Artigo 5 do presente Protocolo, quando essas infrações forem de natureza transnacional e envolverem grupo criminoso organizado, bem como à proteção das vítimas dessas infrações. Medidas preventivas Cada Estado‑Parte adotará as medidas legislativas e outras que considere necessárias de forma a estabelecer como infrações penais os atos descritos no Artigo 3 do presente Protocolo, quando tenham sido praticados intencionalmente. Adotará igualmente as medidas legislativas e outras que considere necessárias para estabelecer como infrações penais. Medidas de proteção às vítimas Nos casos em que se considere apropriado e na medida em que seja permitido pelo seu direito interno, cada Estado‑Parte protegerá a privacidade e a identidade das vítimas de tráfico de pessoas, incluindo, entre outras (ou inter alia), a confidencialidade dos procedimentos judiciais relativos a esse tráfico. Assegurará também que o seu sistema jurídico ou administrativo contenha medidas que forneçam às vítimas de tráfico de pessoas, quando necessário: Cada Estado‑Parte terá em consideração a aplicação de medidas que permitam a recuperação física, psicológica e social das vítimas de tráfico de pessoas, incluindo, se for caso disso, em cooperação com organizações não governamentais, outras organizações competentes e outros elementos de sociedade civil e, em especial, o fornecimento de criação de alojamento adequado; aconselhamento e informação, especialmente quanto aos direitos que a lei lhes reconhece, numa língua que compreendam; assistência médica, psicológica e material; e oportunidades de emprego, educação e formação. Deverá ter em conta a idade, o sexo e as necessidades específicas das vítimas de tráfico de pessoas, designadamente as necessidades específicas das crianças, incluindo o alojamento, a educação. Repatriamento das vítimas O Estado‑Parte do qual a vítima de tráfico de pessoas é nacional ou no qual a pessoa tinha direito de residência permanente, no momento de entrada no território do Estado‑Parte de acolhimento, facilitará e aceitará, sem demora indevida ou injustificada, o regresso dessa pessoa, tendo devidamente em conta a segurança da mesma. Esse regresso levará devidamente em conta a segurança da pessoa bem como a situação de qualquer processo judicial relacionado ao fato de tal pessoa ser uma vítima de tráfico, preferencialmente de forma voluntária. Cláusula de salvaguarda Nenhuma disposição do presente Protocolo prejudicará os direitos, obrigações e responsabilidades dos Estados e das pessoas por força do direito internacional, incluindo o direito internacional humanitário e o direito internacional relativo aos direitos humanos e, especificamente, na medida em que sejam aplicáveis, a Convenção de 1951 e o Protocolo de 1967 relativos ao Estatuto dos Refugiados e ao princípio do non‑refoulement neles enunciado. As medidas constantes do presente Protocolo serão interpretadas e aplicadas de forma a que as pessoas que foram vítimas de tráfico não sejam discriminadas. A interpretação e aplicação das referidas medidas estarão em conformidade com os princípios de não discriminação internacionalmente reconhecidos. Conflito entre Estados a respeito de controvérsias Envidarão esforços para resolver as controvérsias relativas à interpretação ou aplicação do presente Protocolo por negociação direta. As controvérsias entre dois ou mais Estados‑Partes com respeito à aplicação ou à interpretação do presente Protocolo que não possam ser resolvidas por negociação, dentro de um prazo razoável, serão submetidas, a pedido de um desses Estados‑Partes, a arbitragem. Critério de competência Se, no prazo de seis meses após a data do pedido de arbitragem, esses Estados‑Partes não chegarem a um acordo sobre a organização da arbitragem, qualquer desses Estados‑Partes poderá submeter o diferendo ao Tribunal Internacional de Justiça mediante requerimento, em conformidade com o Estatuto do Tribunal. Retratabilidade Qualquer Estado‑Parte que tenha feito uma reserva pode, a qualquer momento, retirar essa reserva por meio de notificação ao Secretário‑Geral das Nações Unidas. 12.14. CONVENÇÃO AMERICANA SOBRE DIREITOS HUMANOS (PACTO DE SÃO JOSÉ DA COSTA RICA) Adotada no âmbito da Organização dos Estados Americanos, em São José da Costa Rica, em 2211-1969, entrou em vigor internacional em 18-7-1978, na forma do segundo parágrafo de seu art. 74. O Governo brasileiro depositou a Carta de Adesão a essa Convenção em 25-9-1992. Aprovada pelo Decreto Legislativo no 27, de 25-9-1992, e promulgada pelo Dec. no 678, de 6-11-1992. A Convenção Americana de Direitos Humanos, conhecida como Pacto de San José da Costa ou pela sigla CADH, é, apesar do termo (Pacto, Convenção), um tratado internacional entre os países‑ membros da Organização dos Estados Americanos. É considerada uma das bases do sistema interamericano de proteção dos Direitos Humanos. Foi subscrita na cidade de San José da Costa Rica em 22 de novembro de 1969 na Conferência Especializada Interamericana de Direitos Humanos Breve conteúdo normativo O art. 1o da Convenção, visando maior proteção, fez com que os Estados signatários se comprometessem a respeitar os direitos e liberdades nela reconhecidos e a garantir seu livre e pleno exercício a toda pessoa que está sujeita à sua jurisdição, sem qualquer discriminação. Neste sentido, estes Estados Signatários estão obrigados a legislar sobre medidas eficazes no combate aos preceitos aqui defendidos, ainda que tais direitos e liberdades não estiverem assegurados em seus ordenamentos. Impõe aos Estados, na medida de seus recursos e condições, o desenvolvimento progressivo dos direitos econômicos, sociais e culturais contidos na Carta da OEA, legislando a respeito e utilizando de outros expedientes para atingir o resultado almejado. Estabelece dois organismos internacionais para fazer valer os dispositivos de direitos e liberdades acolhidos na Convenção: a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Ao depositar a Carta de Adesão à Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), em 25 de setembro de 1992, o Governo brasileiro fez a seguinte declaração interpretativa sobre os arts. 43 e 48, alínea d: O Governo do Brasil entende que os arts. 43 e 48, alínea d, não incluem o direito automático de visitas e inspeções in loco da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, as quais dependerão da anuência expressa do Estado. O Pacto de São José da Costa Rica busca proteger direitos civis e políticos, codificados na seguinte ordem: direito ao reconhecimento da personalidade jurídica, à vida, à integridade pessoal, à liberdade pessoal e garantias judiciais, à proteção da honra e reconhecimento à dignidade, à liberdade religiosa e de consciência, à liberdade de pensamento e de expressão, e o direito de livre associação, entre outros. Direitos civis e políticos Direito ao Reconhecimento da Personalidade Jurídica; Direito à Vida; Direito à Integridade Pessoal; Proibição da Escravidão e da Servidão; Direito à Liberdade Pessoal; Princípio da Legalidade e da Retroatividade; Direito a Indenização; Proteção da Honra e da Dignidade; Liberdade de Consciência e de Religião; Liberdade de Pensamento e de Expressão; Direito de Retificação ou Resposta; Direito de Reunião; Liberdade de Associação; Proteção da Família; Direito ao Nome; Direitos da Criança; Direito à Nacionalidade; Direito à Propriedade Privada; Direito de Circulação e de Residência; Direitos Políticos; Igualdade Perante a Lei e Proteção Judicial. Suspensão de garantias Em caso de guerra, de perigo público, ou de outra emergência que ameace a independência ou segurança do Estado‑Parte, este poderá adotar disposições que, na medida e pelo tempo estritamente limitados às exigências da situação, suspendam as obrigações contraídas em virtude desta Convenção, desde que tais disposições não sejam incompatíveis com as demais obrigações que lhe impõe o Direito Internacional e não encerrem discriminação alguma fundada em motivos de raça, cor, sexo, idioma, religião ou origem social (item 1 do art. 27). A disposição precedente não autoriza a suspensão dos direitos determinados nos seguintes artigos: 3 (Direito ao Reconhecimento da Personalidade Jurídica), 4 (Direito à Vida), 5 (Direito à Integridade Pessoal), 6 (Proibição da Escravidão e Servidão), 9 (Princípio da Legalidade e da Retroatividade), 12 (Liberdade de Consciência e de Religião), 17 (Proteção da Família), 18 (Direito ao Nome), 19 (Direitos da Criança), 20 (Direito à Nacionalidade) e 23 (Direitos Políticos), nem das garantias indispensáveis para a proteção de tais direitos (item 2 do art. 27). Todo Estado‑Parte que fizer uso do direito de suspensão deverá informar imediatamente os outros Estados‑Partes na presente Convenção, por intermédio do Secretário‑Geral da Organização dos Estados Americanos, das disposições cuja aplicação haja suspendido, dos motivos determinantes da suspensão e da data em que haja dado por terminada tal suspensão (item 3 do art. 27). Normas de interpretação Nenhuma disposição desta Convenção pode ser interpretada no sentido de: a) permitir a qualquer dos Estados‑Partes, grupo ou pessoa, suprimir o gozo e exercício dos direitos e liberdades reconhecidos na Convenção ou limitá‑los em maior medida do que a nela prevista; b) limitar o gozo e exercício de qualquer direito ou liberdade que possam ser reconhecidos de acordo com as leis de qualquer dos Estados‑Partes ou de acordo com outra convenção em que seja parte um dos referidos Estados; c) excluir outros direitos e garantias que são inerentes ao ser humano ou que decorrem da forma democrática representativa de governo; e d) excluir ou limitar o efeito que possam produzir a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e outros atos internacionais da mesma natureza (art. 29). Alcance das restrições As restrições permitidas, de acordo com esta Convenção, ao gozo e exercício dos direitos e liberdades nela reconhecidos, não podem ser aplicadas senão de acordo com leis que forem promulgadas por motivo de interesse geral e com o propósito para o qual houverem sido estabelecidas (art. 30). Transcrição Em função da sua importância, a Convenção Americana deve ser conhecida na sua totalidade: PREÂMBULO Os Estados Americanos signatários da presente Convenção, Reafirmando seu propósito de consolidar neste Continente, dentro do quadro das instituições democráticas, um regime de liberdade pessoal e de justiça social, fundado no respeito dos direitos humanos essenciais; Reconhecendo que os direitos essenciais da pessoa humana não derivam do fato de ser ela nacional de determinado Estado, mas sim do fato de ter como fundamento os atributos da pessoa humana, razão por que justificam uma proteção internacional, de natureza convencional, coadjuvante ou complementar da que oferece o direito interno dos Estados americanos; Considerando que esses princípios foram consagrados na Carta da Organização dos Estados Americanos, na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e na Declaração Universal dos Direitos do Homem, e que foram reafirmados e desenvolvidos em outros instrumentos internacionais, tanto de âmbito mundial como regional; Reiterando que, de acordo com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, só pode ser realizado o ideal do ser humano livre, isento do temor e da miséria, se forem criadas condições que permitam a cada pessoa gozar dos seus direitos econômicos, sociais e culturais, bem como dos seus direitos civis e políticos; e Considerando que a Terceira Conferência Interamericana Extraordinária (Buenos Aires, 1967) aprovou a incorporação à própria Carta da Organização de normas mais amplas sobre os direitos econômicos, sociais e educacionais e resolveu que uma Convenção Interamericana sobre Direitos Humanos determinasse a estrutura, competência e processo dos órgãos encarregados dessa matéria; Convieram no seguinte: PARTE I - DEVERES DOS ESTADOS E DIREITOS PROTEGIDOS Capítulo I - ENUMERAÇÃO DOS DEVERES Artigo 1º - Obrigação de respeitar os direitos 1. Os Estados-partes nesta Convenção comprometem-se a respeitar os direitos e liberdades nela reconhecidos e a garantir seu livre e pleno exercício a toda pessoa que esteja sujeita à sua jurisdição, sem discriminação alguma, por motivo de raça, cor, sexo, idioma, religião, opiniões políticas ou de qualquer outra natureza, origem nacional ou social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição social. 2. Para efeitos desta Convenção, pessoa é todo ser humano. Artigo 2º - Dever de adotar disposições de direito interno Se o exercício dos direitos e liberdades mencionados no artigo 1 ainda não estiver garantido por disposições legislativas ou de outra natureza, os Estados-partes comprometem-se a adotar, de acordo com as suas normas constitucionais e com as disposições desta Convenção, as medidas legislativas ou de outra natureza que forem necessárias para tornar efetivos tais direitos e liberdades. Capítulo II - DIREITOS CIVIS E POLÍTICOS Artigo 3º - Direito ao reconhecimento da personalidade jurídica Toda pessoa tem direito ao reconhecimento de sua personalidade jurídica. Artigo 4º - Direito à vida 1. Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente. 2. Nos países que não houverem abolido a pena de morte, esta só poderá ser imposta pelos delitos mais graves, em cumprimento de sentença final de tribunal competente e em conformidade com a lei que estabeleça tal pena, promulgada antes de haver o delito sido cometido. Tampouco se estenderá sua aplicação a delitos aos quais não se aplique atualmente. 3. Não se pode restabelecer a pena de morte nos Estados que a hajam abolido. 4. Em nenhum caso pode a pena de morte ser aplicada a delitos políticos, nem a delitos comuns conexos com delitos políticos. 5. Não se deve impor a pena de morte a pessoa que, no momento da perpetração do delito, for menor de dezoito anos, ou maior de setenta, nem aplicá-la a mulher em estado de gravidez. 6. Toda pessoa condenada à morte tem direito a solicitar anistia, indulto ou comutação da pena, os quais podem ser concedidos em todos os casos. Não se pode executar a pena de morte enquanto o pedido estiver pendente de decisão ante a autoridade competente. Artigo 5º - Direito à integridade pessoal 1. Toda pessoa tem direito a que se respeite sua integridade física, psíquica e moral. 2. Ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada de liberdade deve ser tratada com o respeito devido à dignidade inerente ao ser humano. 3. A pena não pode passar da pessoa do delinquente. 4. Os processados devem ficar separados dos condenados, salvo em circunstâncias excepcionais, e devem ser submetidos a tratamento adequado à sua condição de pessoas não condenadas. 5. Os menores, quando puderem ser processados, devem ser separados dos adultos e conduzidos a tribunal especializado, com a maior rapidez possível, para seu tratamento. 6. As penas privativas de liberdade devem ter por finalidade essencial a reforma e a readaptação social dos condenados. Artigo 6º - Proibição da escravidão e da servidão 1. Ninguém poderá ser submetido a escravidão ou servidão e tanto estas como o tráfico de escravos e o tráfico de mulheres são proibidos em todas as suas formas. 2. Ninguém deve ser constrangido a executar trabalho forçado ou obrigatório. Nos países em que se prescreve, para certos delitos, pena privativa de liberdade acompanhada de trabalhos forçados, esta disposição não pode ser interpretada no sentido de proibir o cumprimento da dita pena, imposta por um juiz ou tribunal competente. O trabalho forçado não deve afetar a dignidade, nem a capacidade física e intelectual do recluso. 3. Não constituem trabalhos forçados ou obrigatórios para os efeitos deste artigo: a) os trabalhos ou serviços normalmente exigidos de pessoa reclusa em cumprimento de sentença ou resolução formal expedida pela autoridade judiciária competente. Tais trabalhos ou serviços devem ser executados sob a vigilância e controle das autoridades públicas, e os indivíduos que os executarem não devem ser postos à disposição de particulares, companhias ou pessoas jurídicas de caráter privado; b) serviço militar e, nos países em que se admite a isenção por motivo de consciência, qualquer serviço nacional que a lei estabelecer em lugar daquele; c) o serviço exigido em casos de perigo ou de calamidade que ameacem a existência ou o bem-estar da comunidade; d) o trabalho ou serviço que faça parte das obrigações cívicas normais. Artigo 7º - Direito à liberdade pessoal 1. Toda pessoa tem direito à liberdade e à segurança pessoais. 2. Ninguém pode ser privado de sua liberdade física, salvo pelas causas e nas condições previamente fixadas pelas Constituições políticas dos Estados-partes ou pelas leis de acordo com elas promulgadas. 3. Ninguém pode ser submetido a detenção ou encarceramento arbitrários. 4. Toda pessoa detida ou retida deve ser informada das razões da detenção e notificada, sem demora, da acusação ou das acusações formuladas contra ela. 5. Toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e tem o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo. 6. Toda pessoa privada da liberdade tem direito a recorrer a um juiz ou tribunal competente, a fim de que este decida, sem demora, sobre a legalidade de sua prisão ou detenção e ordene sua soltura, se a prisão ou a detenção forem ilegais. Nos Estados-partes cujas leis prevêem que toda pessoa que se vir ameaçada de ser privada de sua liberdade tem direito a recorrer a um juiz ou tribunal competente, a fim de que este decida sobre a legalidade de tal ameaça, tal recurso não pode ser restringido nem abolido. O recurso pode ser interposto pela própria pessoa ou por outra pessoa. 7. Ninguém deve ser detido por dívidas. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar. Artigo 8º - Garantias judiciais 1. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza. 2. Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: a) direito do acusado de ser assistido gratuitamente por um tradutor ou intérprete, caso não compreenda ou não fale a língua do juízo ou tribunal; b) comunicação prévia e pormenorizada ao acusado da acusação formulada; c) concessão ao acusado do tempo e dos meios necessários à preparação de sua defesa; d) direito do acusado de defender-se pessoalmente ou de ser assistido por um defensor de sua escolha e de comunicar-se, livremente e em particular, com seu defensor; e) direito irrenunciável de ser assistido por um defensor proporcionado pelo Estado, remunerado ou não, segundo a legislação interna, se o acusado não se defender ele próprio, nem nomear defensor dentro do prazo estabelecido pela lei; f) direito da defesa de inquirir as testemunhas presentes no Tribunal e de obter o comparecimento, como testemunhas ou peritos, de outras pessoas que possam lançar luz sobre os fatos; g) direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada; e h) direito de recorrer da sentença a juiz ou tribunal superior. 3. A confissão do acusado só é válida se feita sem coação de nenhuma natureza. 4. O acusado absolvido por sentença transitada em julgado não poderá ser submetido a novo processo pelos mesmos fatos. 5. O processo penal deve ser público, salvo no que for necessário para preservar os interesses da justiça. Artigo 9º - Princípio da legalidade e da retroatividade Ninguém poderá ser condenado por atos ou omissões que, no momento em que foram cometidos, não constituam delito, de acordo com o direito aplicável. Tampouco poder-se-á impor pena mais grave do que a aplicável no momento da ocorrência do delito. Se, depois de perpetrado o delito, a lei estipular a imposição de pena mais leve, o deliquente deverá dela beneficiar-se. Artigo 10 - Direito à indenização Toda pessoa tem direito de ser indenizada conforme a lei, no caso de haver sido condenada em sentença transitada em julgado, por erro judiciário. Artigo 11 - Proteção da honra e da dignidade 1. Toda pessoa tem direito ao respeito da sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade. 2. Ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, em sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra ou reputação. 3. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais ingerências ou tais ofensas. Artigo 12 - Liberdade de consciência e de religião 1. Toda pessoa tem direito à liberdade de consciência e de religião. Esse direito implica a liberdade de conservar sua religião ou suas crenças, ou de mudar de religião ou de crenças, bem como a liberdade de professar e divulgar sua religião ou suas crenças, individual ou coletivamente, tanto em público como em privado. 2. Ninguém pode ser submetido a medidas restritivas que possam limitar sua liberdade de conservar sua religião ou suas crenças, ou de mudar de religião ou de crenças. 3. A liberdade de manifestar a própria religião e as próprias crenças está sujeita apenas às limitações previstas em lei e que se façam necessárias para proteger a segurança, a ordem, a saúde ou a moral públicas ou os direitos e as liberdades das demais pessoas. 4. Os pais e, quando for o caso, os tutores, têm direito a que seus filhos e pupilos recebam a educação religiosa e moral que esteja de acordo com suas próprias convicções. Artigo 13 - Liberdade de pensamento e de expressão 1. Toda pessoa tem o direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito inclui a liberdade de procurar, receber e difundir informações e idéias de qualquer natureza, sem considerações de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer meio de sua escolha. 2. O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito à censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente previstas em lei e que se façam necessárias para assegurar: a) o respeito dos direitos e da reputação das demais pessoas; b) a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou da moral públicas. 3. Não se pode restringir o direito de expressão por vias e meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de frequências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de idéias e opiniões. 4. A lei pode submeter os espetáculos públicos a censura prévia, com o objetivo exclusivo de regular o acesso a eles, para proteção moral da infância e da adolescência, sem prejuízo do disposto no inciso 2. 5. A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitamento à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência. Artigo 14 - Direito de retificação ou resposta 1. Toda pessoa, atingida por informações inexatas ou ofensivas emitidas em seu prejuízo por meios de difusão legalmente regulamentados e que se dirijam ao público em geral, tem direito a fazer, pelo mesmo órgão de difusão, sua retificação ou resposta, nas condições que estabeleça a lei. 2. Em nenhum caso a retificação ou a resposta eximirão das outras responsabilidades legais em que se houver incorrido. 3. Para a efetiva proteção da honra e da reputação, toda publicação ou empresa jornalística, cinematográfica, de rádio ou televisão, deve ter uma pessoa responsável, que não seja protegida por imunidades, nem goze de foro especial. Artigo 15 - Direito de reunião É reconhecido o direito de reunião pacífica e sem armas. O exercício desse direito só pode estar sujeito às restrições previstas em lei e que se façam necessárias, em uma sociedade democrática, ao interesse da segurança nacional, da segurança ou ordem públicas, ou para proteger a saúde ou a moral públicas ou os direitos e as liberdades das demais pessoas. Artigo 16 - Liberdade de associação 1. Todas as pessoas têm o direito de associar-se livremente com fins ideológicos, religiosos, políticos, econômicos, trabalhistas, sociais, culturais, desportivos ou de qualquer outra natureza. 2. O exercício desse direito só pode estar sujeito às restrições previstas em lei e que se façam necessárias, em uma sociedade democrática, ao interesse da segurança nacional, da segurança e da ordem públicas, ou para proteger a saúde ou a moral públicas ou os direitos e as liberdades das demais pessoas. 3. O presente artigo não impede a imposição de restrições legais, e mesmo a privação do exercício do direito de associação, aos membros das forças armadas e da polícia. Artigo 17 - Proteção da família 1. A família é o núcleo natural e fundamental da sociedade e deve ser protegida pela sociedade e pelo Estado. 2. É reconhecido o direito do homem e da mulher de contraírem casamento e de constituírem uma família, se tiverem a idade e as condições para isso exigidas pelas leis internas, na medida em que não afetem estas o princípio da nãodiscriminação estabelecido nesta Convenção. 3. O casamento não pode ser celebrado sem o consentimento livre e pleno dos contraentes. 4. Os Estados-partes devem adotar as medidas apropriadas para assegurar a igualdade de direitos e a adequada equivalência de responsabilidades dos cônjuges quanto ao casamento, durante o mesmo e por ocasião de sua dissolução. Em caso de dissolução, serão adotadas as disposições que assegurem a proteção necessária aos filhos, com base unicamente no interesse e conveniência dos mesmos. 5. A lei deve reconhecer iguais direitos tanto aos filhos nascidos fora do casamento, como aos nascidos dentro do casamento. Artigo 18 - Direito ao nome Toda pessoa tem direito a um prenome e aos nomes de seus pais ou ao de um destes. A lei deve regular a forma de assegurar a todos esse direito, mediante nomes fictícios, se for necessário. Artigo 19 - Direitos da criança Toda criança terá direito às medidas de proteção que a sua condição de menor requer, por parte da sua família, da sociedade e do Estado. Artigo 20 - Direito à nacionalidade 1. Toda pessoa tem direito a uma nacionalidade. 2. Toda pessoa tem direito à nacionalidade do Estado em cujo território houver nascido, se não tiver direito a outra. 3. A ninguém se deve privar arbitrariamente de sua nacionalidade, nem do direito de mudá-la. Artigo 21 - Direito à propriedade privada 1. Toda pessoa tem direito ao uso e gozo de seus bens. A lei pode subordinar esse uso e gozo ao interesse social. 2. Nenhuma pessoa pode ser privada de seus bens, salvo mediante o pagamento de indenização justa, por motivo de utilidade pública ou de interesse social e nos casos e na forma estabelecidos pela lei. 3. Tanto a usura, como qualquer outra forma de exploração do homem pelo homem, devem ser reprimidas pela lei. Artigo 22 - Direito de circulação e de residência 1. Toda pessoa que se encontre legalmente no território de um Estado tem o direito de nele livremente circular e de nele residir, em conformidade com as disposições legais. 2. Toda pessoa terá o direito de sair livremente de qualquer país, inclusive de seu próprio país. 3. O exercício dos direitos supracitados não pode ser restringido, senão em virtude de lei, na medida indispensável, em uma sociedade democrática, para prevenir infrações penais ou para proteger a segurança nacional, a segurança ou a ordem públicas, a moral ou a saúde públicas, ou os direitos e liberdades das demais pessoas. 4. O exercício dos direitos reconhecidos no inciso 1 pode também ser restringido pela lei, em zonas determinadas, por motivo de interesse público. 5. Ninguém pode ser expulso do território do Estado do qual for nacional e nem ser privado do direito de nele entrar. 6. O estrangeiro que se encontre legalmente no território de um Estado-parte na presente Convenção só poderá dele ser expulso em decorrência de decisão adotada em conformidade com a lei. 7. Toda pessoa tem o direito de buscar e receber asilo em território estrangeiro, em caso de perseguição por delitos políticos ou comuns conexos com delitos políticos, de acordo com a legislação de cada Estado e com as Convenções internacionais. 8. Em nenhum caso o estrangeiro pode ser expulso ou entregue a outro país, seja ou não de origem, onde seu direito à vida ou à liberdade pessoal esteja em risco de violação em virtude de sua raça, nacionalidade, religião, condição social ou de suas opiniões políticas. 9. É proibida a expulsão coletiva de estrangeiros. Artigo 23 - Direitos políticos 1. Todos os cidadãos devem gozar dos seguintes direitos e oportunidades: a) de participar da condução dos assuntos públicos, diretamente ou por meio de representantes livremente eleitos; b) de votar e ser eleito em eleições periódicas, autênticas, realizadas por sufrágio universal e igualitário e por voto secreto, que garantam a livre expressão da vontade dos eleitores; e c) de ter acesso, em condições gerais de igualdade, às funções públicas de seu país. 2. A lei pode regular o exercício dos direitos e oportunidades, a que se refere o inciso anterior, exclusivamente por motivo de idade, nacionalidade, residência, idioma, instrução, capacidade civil ou mental, ou condenação, por juiz competente, em processo penal. Artigo 24 - Igualdade perante a lei Todas as pessoas são iguais perante a lei. Por conseguinte, têm direito, sem discriminação alguma, à igual proteção da lei. Artigo 25 - Proteção judicial 1. Toda pessoa tem direito a um recurso simples e rápido ou a qualquer outro recurso efetivo, perante os juízes ou tribunais competentes, que a proteja contra atos que violem seus direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição, pela lei ou pela presente Convenção, mesmo quando tal violação seja cometida por pessoas que estejam atuando no exercício de suas funções oficiais. 2. Os Estados-partes comprometem-se: a) a assegurar que a autoridade competente prevista pelo sistema legal do Estado decida sobre os direitos de toda pessoa que interpuser tal recurso; b) a desenvolver as possibilidades de recurso judicial; e c) a assegurar o cumprimento, pelas autoridades competentes, de toda decisão em que se tenha considerado procedente o recurso. Capítulo III - DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS Artigo 26 - Desenvolvimento progressivo Os Estados-partes comprometem-se a adotar as providências, tanto no âmbito interno, como mediante cooperação internacional, especialmente econômica e técnica, a fim de conseguir progressivamente a plena efetividade dos direitos que decorrem das normas econômicas, sociais e sobre educação, ciência e cultura, constantes da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires, na medida dos recursos disponíveis, por via legislativa ou por outros meios apropriados. Capítulo IV - SUSPENSÃO DE GARANTIAS, INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO Artigo 27 - Suspensão de garantias 1. Em caso de guerra, de perigo público, ou de outra emergência que ameace a independência ou segurança do Estadoparte, este poderá adotar as disposições que, na medida e pelo tempo estritamente limitados às exigências da situação, suspendam as obrigações contraídas em virtude desta Convenção, desde que tais disposições não sejam incompatíveis com as demais obrigações que lhe impõe o Direito Internacional e não encerrem discriminação alguma fundada em motivos de raça, cor, sexo, idioma, religião ou origem social. 2. A disposição precedente não autoriza a suspensão dos direitos determinados nos seguintes artigos: 3 (direito ao reconhecimento da personalidade jurídica), 4 (direito à vida), 5 (direito à integridade pessoal), 6 (proibição da escravidão e da servidão), 9 (princípio da legalidade e da retroatividade), 12 (liberdade de consciência e religião), 17 (proteção da família), 18 (direito ao nome), 19 (direitos da criança), 20 (direito à nacionalidade) e 23 (direitos políticos), nem das garantias indispensáveis para a proteção de tais direitos. 3. Todo Estado-parte no presente Pacto que fizer uso do direito de suspensão deverá comunicar imediatamente aos outros Estados-partes na presente Convenção, por intermédio do Secretário Geral da Organização dos Estados Americanos, as disposições cuja aplicação haja suspendido, os motivos determinantes da suspensão e a data em que haja dado por terminada tal suspensão. Artigo 28 - Cláusula federal 1. Quando se tratar de um Estado-parte constituído como Estado federal, o governo nacional do aludido Estado-parte cumprirá todas as disposições da presente Convenção, relacionadas com as matérias sobre as quais exerce competência legislativa e judicial. 2. No tocante às disposições relativas às matérias que correspondem à competência das entidades componentes da federação, o governo nacional deve tomar imediatamente as medidas pertinentes, em conformidade com sua Constituição e com suas leis, a fim de que as autoridades competentes das referidas entidades possam adotar as disposições cabíveis para o cumprimento desta Convenção. 3. Quando dois ou mais Estados-partes decidirem constituir entre eles uma federação ou outro tipo de associação, diligenciarão no sentido de que o pacto comunitário respectivo contenha as disposições necessárias para que continuem sendo efetivas no novo Estado, assim organizado, as normas da presente Convenção. Artigo 29 - Normas de interpretação Nenhuma disposição da presente Convenção pode ser interpretada no sentido de: a) permitir a qualquer dos Estados-partes, grupo ou indivíduo, suprimir o gozo e o exercício dos direitos e liberdades reconhecidos na Convenção ou limitá-los em maior medida do que a nela prevista; b) limitar o gozo e exercício de qualquer direito ou liberdade que possam ser reconhecidos em virtude de leis de qualquer dos Estados-partes ou em virtude de Convenções em que seja parte um dos referidos Estados; c) excluir outros direitos e garantias que são inerentes ao ser humano ou que decorrem da forma democrática representativa de governo; d) excluir ou limitar o efeito que possam produzir a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e outros atos internacionais da mesma natureza. Artigo 30 - Alcance das restrições As restrições permitidas, de acordo com esta Convenção, ao gozo e exercício dos direitos e liberdades nela reconhecidos, não podem ser aplicadas senão de acordo com leis que forem promulgadas por motivo de interesse geral e com o propósito para o qual houverem sido estabelecidas. Artigo 31 - Reconhecimento de outros direitos Poderão ser incluídos, no regime de proteção desta Convenção, outros direitos e liberdades que forem reconhecidos de acordo com os processos estabelecidos nos artigo 69 e 70. Capítulo V - DEVERES DAS PESSOAS Artigo 32 - Correlação entre deveres e direitos 1. Toda pessoa tem deveres para com a família, a comunidade e a humanidade. 2. Os direitos de cada pessoa são limitados pelos direitos dos demais, pela segurança de todos e pelas justas exigências do bem comum, em uma sociedade democrática. PARTE II - MEIOS DE PROTEÇÃO Capítulo VI - ÓRGÃOS COMPETENTES Artigo 33 - São competentes para conhecer de assuntos relacionados com o cumprimento dos compromissos assumidos pelos Estados-partes nesta Convenção: a) a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, doravante denominada a Comissão; e b) a Corte Interamericana de Direitos Humanos, doravante denominada a Corte. Capítulo VII - COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS Seção 1 - Organização Artigo 34 - A Comissão Interamericana de Direitos Humanos compor-se-á de sete membros, que deverão ser pessoas de alta autoridade moral e de reconhecido saber em matéria de direitos humanos. Artigo 35 - A Comissão representa todos os Membros da Organização dos Estados Americanos. Artigo 36 - 1. Os membros da Comissão serão eleitos a título pessoal, pela Assembléia Geral da Organização, a partir de uma lista de candidatos propostos pelos governos dos Estados-membros. 2. Cada um dos referidos governos pode propor até três candidatos, nacionais do Estado que os propuser ou de qualquer outro Estado-membro da Organização dos Estados Americanos. Quando for proposta uma lista de três candidatos, pelo menos um deles deverá ser nacional de Estado diferente do proponente. Artigo 37 - 1. Os membros da Comissão serão eleitos por quatro anos e só poderão ser reeleitos um vez, porém o mandato de três dos membros designados na primeira eleição expirará ao cabo de dois anos. Logo depois da referida eleição, serão determinados por sorteio, na Assembléia Geral, os nomes desses três membros. 2. Não pode fazer parte da Comissão mais de um nacional de um mesmo país. Artigo 38 - As vagas que ocorrerem na Comissão, que não se devam à expiração normal do mandato, serão preenchidas pelo Conselho Permanente da Organização, de acordo com o que dispuser o Estatuto da Comissão. Artigo 39 - A Comissão elaborará seu estatuto e submetê-lo-á à aprovação da Assembléia Geral e expedirá seu próprio Regulamento. Artigo 40 - Os serviços da Secretaria da Comissão devem ser desempenhados pela unidade funcional especializada que faz parte da Secretaria Geral da Organização e deve dispor dos recursos necessários para cumprir as tarefas que lhe forem confiadas pela Comissão. Seção 2 - Funções Artigo 41 - A Comissão tem a função principal de promover a observância e a defesa dos direitos humanos e, no exercício de seu mandato, tem as seguintes funções e atribuições: a) estimular a consciência dos direitos humanos nos povos da América; b) formular recomendações aos governos dos Estados-membros, quando considerar conveniente, no sentido de que adotem medidas progressivas em prol dos direitos humanos no âmbito de suas leis internas e seus preceitos constitucionais, bem como disposições apropriadas para promover o devido respeito a esses direitos; c) preparar estudos ou relatórios que considerar convenientes para o desempenho de suas funções; d) solicitar aos governos dos Estados-membros que lhe proporcionem informações sobre as medidas que adotarem em matéria de direitos humanos; e) atender às consultas que, por meio da Secretaria Geral da Organização dos Estados Americanos, lhe formularem os Estados-membros sobre questões relacionadas com os direitos humanos e, dentro de suas possibilidades, prestar-lhes o assessoramento que lhes solicitarem; f) atuar com respeito às petições e outras comunicações, no exercício de sua autoridade, de conformidade com o disposto nos artigos 44 a 51 desta Convenção; e g) apresentar um relatório anual à Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos. Artigo 42 - Os Estados-partes devem submeter à Comissão cópia dos relatórios e estudos que, em seus respectivos campos, submetem anualmente às Comissões Executivas do Conselho Interamericano Econômico e Social e do Conselho Interamericano de Educação, Ciência e Cultura, a fim de que aquela zele para que se promovam os direitos decorrentes das normas econômicas, sociais e sobre educação, ciência e cultura, constantes da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires. Artigo 43 - Os Estados-partes obrigam-se a proporcionar à Comissão as informações que esta lhes solicitar sobre a maneira pela qual seu direito interno assegura a aplicação efetiva de quaisquer disposições desta Convenção. Seção 3 - Competência Artigo 44 - Qualquer pessoa ou grupo de pessoas, ou entidade não-governamental legalmente reconhecida em um ou mais Estados-membros da Organização, pode apresentar à Comissão petições que contenham denúncias ou queixas de violação desta Convenção por um Estado-parte. Artigo 45 - 1. Todo Estado-parte pode, no momento do depósito do seu instrumento de ratificação desta Convenção, ou de adesão a ela, ou em qualquer momento posterior, declarar que reconhece a competência da Comissão para receber e examinar as comunicações em que um Estado-parte alegue haver outro Estado-parte incorrido em violações dos direitos humanos estabelecidos nesta Convenção. 2. As comunicações feitas em virtude deste artigo só podem ser admitidas e examinadas se forem apresentadas por um Estado-parte que haja feito uma declaração pela qual reconheça a referida competência da Comissão. A Comissão não admitirá nenhuma comunicação contra um Estado-parte que não haja feito tal declaração. 3. As declarações sobre reconhecimento de competência podem ser feitas para que esta vigore por tempo indefinido, por período determinado ou para casos específicos. 4. As declarações serão depositadas na Secretaria Geral da Organização dos Estados Americanos, a qual encaminhará cópia das mesmas aos Estados-membros da referida Organização. Artigo 46 - Para que uma petição ou comunicação apresentada de acordo com os artigos 44 ou 45 seja admitida pela Comissão, será necessário: a) que hajam sido interpostos e esgotados os recursos da jurisdição interna, de acordo com os princípios de Direito Internacional geralmente reconhecidos; b) que seja apresentada dentro do prazo de seis meses, a partir da data em que o presumido prejudicado em seus direitos tenha sido notificado da decisão definitiva; c) que a matéria da petição ou comunicação não esteja pendente de outro processo de solução internacional; e d) que, no caso do artigo 44, a petição contenha o nome, a nacionalidade, a profissão, o domicílio e a assinatura da pessoa ou pessoas ou do representante legal da entidade que submeter a petição. 2. As disposições das alíneas "a" e "b" do inciso 1 deste artigo não se aplicarão quando: a) não existir, na legislação interna do Estado de que se tratar, o devido processo legal para a proteção do direito ou direitos que se alegue tenham sido violados; b) não se houver permitido ao presumido prejudicado em seus direitos o acesso aos recursos da jurisdição interna, ou houver sido ele impedido de esgotá-los; e c) houver demora injustificada na decisão sobre os mencionados recursos. Artigo 47 - A Comissão declarará inadmissível toda petição ou comunicação apresentada de acordo com os artigos 44 ou 45 quando: a) não preencher algum dos requisitos estabelecidos no artigo 46; b) não expuser fatos que caracterizem violação dos direitos garantidos por esta Convenção; c) pela exposição do próprio peticionário ou do Estado, for manifestamente infundada a petição ou comunicação ou for evidente sua total improcedência; ou d) for substancialmente reprodução de petição ou comunicação anterior, já examinada pela Comissão ou por outro organismo internacional. Seção 4 - Processo Artigo 48 - 1. A Comissão, ao receber uma petição ou comunicação na qual se alegue a violação de qualquer dos direitos consagrados nesta Convenção, procederá da seguinte maneira: a) se reconhecer a admissibilidade da petição ou comunicação, solicitará informações ao Governo do Estado ao qual pertença a autoridade apontada como responsável pela violação alegada e transcreverá as partes pertinentes da petição ou comunicação. As referidas informações devem ser enviadas dentro de um prazo razoável, fixado pela Comissão ao considerar as circunstâncias de cada caso; b) recebidas as informações, ou transcorrido o prazo fixado sem que sejam elas recebidas, verificará se existem ou subsistem os motivos da petição ou comunicação. No caso de não existirem ou não subsistirem, mandará arquivar o expediente; c) poderá também declarar a inadmissibilidade ou a improcedência da petição ou comunicação, com base em informação ou prova supervenientes; d) se o expediente não houver sido arquivado, e com o fim de comprovar os fatos, a Comissão procederá, com conhecimento das partes, a um exame do assunto exposto na petição ou comunicação. Se for necessário e conveniente, a Comissão procederá a uma investigação para cuja eficaz realização solicitará, e os Estados interessados lhe proporcionarão, todas as facilidades necessárias; e) poderá pedir aos Estados interessados qualquer informação pertinente e receberá, se isso for solicitado, as exposições verbais ou escritas que apresentarem os interessados; e f) pôr-se-á à disposição das partes interessadas, a fim de chegar a uma solução amistosa do assunto, fundada no respeito aos direitos reconhecidos nesta Convenção. 2. Entretanto, em casos graves e urgentes, pode ser realizada uma investigação, mediante prévio consentimento do Estado em cujo território se alegue houver sido cometida a violação, tão somente com a apresentação de uma petição ou comunicação que reúna todos os requisitos formais de admissibilidade. Artigo 49 - Se se houver chegado a uma solução amistosa de acordo com as disposições do inciso 1, "f", do artigo 48, a Comissão redigirá um relatório que será encaminhado ao peticionário e aos Estados-partes nesta Convenção e posteriormente transmitido, para sua publicação, ao Secretário Geral da Organização dos Estados Americanos. O referido relatório conterá uma breve exposição dos fatos e da solução alcançada. Se qualquer das partes no caso o solicitar, serlhe-á proporcionada a mais ampla informação possível. Artigo 50 - 1. Se não se chegar a uma solução, e dentro do prazo que for fixado pelo Estatuto da Comissão, esta redigirá um relatório no qual exporá os fatos e suas conclusões. Se o relatório não representar, no todo ou em parte, o acordo unânime dos membros da Comissão, qualquer deles poderá agregar ao referido relatório seu voto em separado. Também se agregarão ao relatório as exposições verbais ou escritas que houverem sido feitas pelos interessados em virtude do inciso 1, "e", do artigo 48. 2. O relatório será encaminhado aos Estados interessados, aos quais não será facultado publicá-lo. 3. Ao encaminhar o relatório, a Comissão pode formular as proposições e recomendações que julgar adequadas. Artigo 51 - 1. Se no prazo de três meses, a partir da remessa aos Estados interessados do relatório da Comissão, o assunto não houver sido solucionado ou submetido à decisão da Corte pela Comissão ou pelo Estado interessado, aceitando sua competência, a Comissão poderá emitir, pelo voto da maioria absoluta dos seus membros, sua opinião e conclusões sobre a questão submetida à sua consideração. 2. A Comissão fará as recomendações pertinentes e fixará um prazo dentro do qual o Estado deve tomar as medidas que lhe competir para remediar a situação examinada. 3. Transcorrido o prazo fixado, a Comissão decidirá, pelo voto da maioria absoluta dos seus membros, se o Estado tomou ou não as medidas adequadas e se publica ou não seu relatório. Capítulo VIII - CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS Seção 1 - Organização Artigo 52 - 1. A Corte compor-se-á de sete juízes, nacionais dos Estados-membros da Organização, eleitos a título pessoal dentre juristas da mais alta autoridade moral, de reconhecida competência em matéria de direitos humanos, que reúnam as condições requeridas para o exercício das mais elevadas funções judiciais, de acordo com a lei do Estado do qual sejam nacionais, ou do Estado que os propuser como candidatos. 2. Não deve haver dois juízes da mesma nacionalidade. Artigo 53 - 1. Os juízes da Corte serão eleitos, em votação secreta e pelo voto da maioria absoluta dos Estados-partes na Convenção, na Assembléia Geral da Organização, a partir de uma lista de candidatos propostos pelos mesmos Estados. 2. Cada um dos Estados-partes pode propor até três candidatos, nacionais do Estado que os propuser ou de qualquer outro Estado-membro da Organização dos Estados Americanos. Quando se propuser um lista de três candidatos, pelo menos um deles deverá ser nacional do Estado diferente do proponente. Artigo 54 - 1. Os juízes da Corte serão eleitos por um período de seis anos e só poderão ser reeleitos uma vez. O mandato de três dos juízes designados na primeira eleição expirará ao cabo de três anos. Imediatamente depois da referida eleição, determinar-se-ão por sorteio, na Assembléia Geral, os nomes desse três juízes. 2. O juiz eleito para substituir outro, cujo mandato não haja expirado, completará o período deste. 3. Os juízes permanecerão em suas funções até o término dos seus mandatos. Entretanto, continuarão funcionando nos casos de que já houverem tomado conhecimento e que se encontrem em fase de sentença e, para tais efeitos, não serão substituídos pelos novos juízes eleitos. Artigo 55 - 1. O juiz, que for nacional de algum dos Estados-partes em caso submetido à Corte, conservará o seu direito de conhecer do mesmo. 2. Se um dos juízes chamados a conhecer do caso for de nacionalidade de um dos Estados-partes, outro Estado-parte no caso poderá designar uma pessoa de sua escolha para integrar a Corte, na qualidade de juiz ad hoc. 3. Se, dentre os juízes chamados a conhecer do caso, nenhum for da nacionalidade dos Estados-partes, cada um destes poderá designar um juiz ad hoc. 4. O juiz ad hoc deve reunir os requisitos indicados no artigo 52. 5. Se vários Estados-partes na Convenção tiverem o mesmo interesse no caso, serão considerados como uma só parte, para os fins das disposições anteriores. Em caso de dúvida, a Corte decidirá. Artigo 56 - O quorum para as deliberações da Corte é constituído por cinco juízes. Artigo 57 - A Comissão comparecerá em todos os casos perante a Corte. Artigo 58 - 1. A Corte terá sua sede no lugar que for determinado, na Assembléia Geral da Organização, pelos Estadospartes na Convenção, mas poderá realizar reuniões no território de qualquer Estado-membro da Organização dos Estados Americanos em que considerar conveniente, pela maioria dos seus membros e mediante prévia aquiescência do Estado respectivo. Os Estados-partes na Convenção podem, na Assembléia Geral, por dois terços dos seus votos, mudar a sede da Corte. 2. A Corte designará seu Secretário. 3. O Secretário residirá na sede da Corte e deverá assistir às reuniões que ela realizar fora da mesma. Artigo 59 - A Secretaria da Corte será por esta estabelecida e funcionará sob a direção do Secretário Geral da Organização em tudo o que não for incompatível com a independência da Corte. Seus funcionários serão nomeados pelo Secretário Geral da Organização, em consulta com o Secretário da Corte. Artigo 60 - A Corte elaborará seu Estatuto e submetê-lo-á à aprovação da Assembléia Geral e expedirá seu Regimento. Seção 2 - Competência e funções Artigo 61 - 1. Somente os Estados-partes e a Comissão têm direito de submeter um caso à decisão da Corte. 2. Para que a Corte possa conhecer de qualquer caso, é necessário que sejam esgotados os processos previstos nos artigos 48 a 50. Artigo 62 - 1. Todo Estado-parte pode, no momento do depósito do seu instrumento de ratificação desta Convenção ou de adesão a ela, ou em qualquer momento posterior, declarar que reconhece como obrigatória, de pleno direito e sem convenção especial, a competência da Corte em todos os casos relativos à interpretação ou aplicação desta Convenção. 2. A declaração pode ser feita incondicionalmente, ou sob condição de reciprocidade, por prazo determinado ou para casos específicos. Deverá ser apresentada ao Secretário Geral da Organização, que encaminhará cópias da mesma a outros Estados-membros da Organização e ao Secretário da Corte. 3. A Corte tem competência para conhecer de qualquer caso, relativo à interpretação e aplicação das disposições desta Convenção, que lhe seja submetido, desde que os Estados-partes no caso tenham reconhecido ou reconheçam a referida competência, seja por declaração especial, como prevêem os incisos anteriores, seja por convenção especial. Artigo 63 - 1. Quando decidir que houve violação de um direito ou liberdade protegidos nesta Convenção, a Corte determinará que se assegure ao prejudicado o gozo do seu direito ou liberdade violados. Determinará também, se isso for procedente, que sejam reparadas as consequências da medida ou situação que haja configurado a violação desses direitos, bem como o pagamento de indenização justa à parte lesada. 2. Em casos de extrema gravidade e urgência, e quando se fizer necessário evitar danos irreparáveis às pessoas, a Corte, nos assuntos de que estiver conhecendo, poderá tomar as medidas provisórias que considerar pertinentes. Se se tratar de assuntos que ainda não estiverem submetidos ao seu conhecimento, poderá atuar a pedido da Comissão. Artigo 64 - 1. Os Estados-membros da Organização poderão consultar a Corte sobre a interpretação desta Convenção ou de outros tratados concernentes à proteção dos direitos humanos nos Estados americanos. Também poderão consultá-la, no que lhes compete, os órgãos enumerados no capítulo X da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires. 2. A Corte, a pedido de um Estado-membro da Organização, poderá emitir pareceres sobre a compatibilidade entre qualquer de suas leis internas e os mencionados instrumentos internacionais. Artigo 65 - A Corte submeterá à consideração da Assembléia Geral da Organização, em cada período ordinário de sessões, um relatório sobre as suas atividades no ano anterior. De maneira especial, e com as recomendações pertinentes, indicará os casos em que um Estado não tenha dado cumprimento a suas sentenças. Seção 3 - Processo Artigo 66 - 1. A sentença da Corte deve ser fundamentada. 2. Se a sentença não expressar no todo ou em parte a opinião unânime dos juízes, qualquer deles terá direito a que se agregue à sentença o seu voto dissidente ou individual. Artigo 67 - A sentença da Corte será definitiva e inapelável. Em caso de divergência sobre o sentido ou alcance da sentença, a Corte interpretá-la-á, a pedido de qualquer das partes, desde que o pedido seja apresentado dentro de noventa dias a partir da data da notificação da sentença. Artigo 68 - 1. Os Estados-partes na Convenção comprometem-se a cumprir a decisão da Corte em todo caso em que forem partes. 2. A parte da sentença que determinar indenização compensatória poderá ser executada no país respectivo pelo processo interno vigente para a execução de sentenças contra o Estado. Artigo 69 - A sentença da Corte deve ser notificada às partes no caso e transmitida aos Estados-partes na Convenção. Capítulo IX - DISPOSIÇÕES COMUNS Artigo 70 - 1. Os juízes da Corte e os membros da Comissão gozam, desde o momento da eleição e enquanto durar o seu mandato, das imunidades reconhecidas aos agentes diplomáticos pelo Direito Internacional. Durante o exercício dos seus cargos gozam, além disso, dos privilégios diplomáticos necessários para o desempenho de suas funções. 2. Não se poderá exigir responsabilidade em tempo algum dos juízes da Corte, nem dos membros da Comissão, por votos e opiniões emitidos no exercício de suas funções. Artigo 71 - Os cargos de juiz da Corte ou de membro da Comissão são incompatíveis com outras atividades que possam afetar sua independência ou imparcialidade, conforme o que for determinado nos respectivos Estatutos. Artigo 72 - Os juízes da Corte e os membros da Comissão perceberão honorários e despesas de viagem na forma e nas condições que determinarem os seus Estatutos, levando em conta a importância e independência de suas funções. Tais honorários e despesas de viagem serão fixados no orçamento-programa da Organização dos Estados Americanos, no qual devem ser incluídas, além disso, as despesas da Corte e da sua Secretaria. Para tais efeitos, a Corte elaborará o seu próprio projeto de orçamento e submetê-lo-á à aprovação da Assembléia Geral, por intermédio da Secretaria Geral. Esta última não poderá nele introduzir modificações. Artigo 73 - Somente por solicitação da Comissão ou da Corte, conforme o caso, cabe à Assembléia Geral da Organização resolver sobre as sanções aplicáveis aos membros da Comissão ou aos juízes da Corte que incorrerem nos casos previstos nos respectivos Estatutos. Para expedir uma resolução, será necessária maioria de dois terços dos votos dos Estadosmembros da Organização, no caso dos membros da Comissão; e, além disso, de dois terços dos votos dos Estados-partes na Convenção, se se tratar dos juízes da Corte. PARTE III - DISPOSIÇÕES GERAIS E TRANSITÓRIAS Capítulo X - ASSINATURA, RATIFICAÇÃO, RESERVA, EMENDA, PROTOCOLO E DENÚNCIA Artigo 74 - 1. Esta Convenção está aberta à assinatura e à ratificação de todos os Estados-membros da Organização dos Estados Americanos. 2. A ratificação desta Convenção ou a adesão a ela efetuar-se-á mediante depósito de um instrumento de ratificação ou adesão na Secretaria Geral da Organização dos Estados Americanos. Esta Convenção entrará em vigor logo que onze Estados houverem depositado os seus respectivos instrumentos de ratificação ou de adesão. Com referência a qualquer outro Estado que a ratificar ou que a ela aderir ulteriormente, a Convenção entrará em vigor na data do depósito do seu instrumento de ratificação ou adesão. 3. O Secretário Geral comunicará todos os Estados-membros da Organização sobre a entrada em vigor da Convenção. Artigo 75 - Esta Convenção só pode ser objeto de reservas em conformidade com as disposições da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, assinada em 23 de maio de 1969. Artigo 76 - 1. Qualquer Estado-parte, diretamente, e a Comissão e a Corte, por intermédio do Secretário Geral, podem submeter à Assembléia Geral, para o que julgarem conveniente, proposta de emendas a esta Convenção. 2. Tais emendas entrarão em vigor para os Estados que as ratificarem, na data em que houver sido depositado o respectivo instrumento de ratificação, por dois terços dos Estados-partes nesta Convenção. Quanto aos outros Estados-partes, entrarão em vigor na data em que eles depositarem os seus respectivos instrumentos de ratificação. Artigo 77 - 1. De acordo com a faculdade estabelecida no artigo 31, qualquer Estado-parte e a Comissão podem submeter à consideração dos Estados-partes reunidos por ocasião da Assembléia Geral projetos de Protocolos adicionais a esta Convenção, com a finalidade de incluir progressivamente, no regime de proteção da mesma, outros direitos e liberdades. 2. Cada Protocolo deve estabelecer as modalidades de sua entrada em vigor e será aplicado somente entre os Estadospartes no mesmo. Artigo 78 - 1. Os Estados-partes poderão denunciar esta Convenção depois de expirado o prazo de cinco anos, a partir da data em vigor da mesma e mediante aviso prévio de um ano, notificando o Secretário Geral da Organização, o qual deve informar as outras partes. 2. Tal denúncia não terá o efeito de desligar o Estado-parte interessado das obrigações contidas nesta Convenção, no que diz respeito a qualquer ato que, podendo constituir violação dessas obrigações, houver sido cometido por ele anteriormente à data na qual a denúncia produzir efeito. Capítulo XI - DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS Seção 1 - Comissão Interamericana de Direitos Humanos Artigo 79 - Ao entrar em vigor esta Convenção, o Secretário Geral pedirá por escrito a cada Estado-membro da Organização que apresente, dentro de um prazo de noventa dias, seus candidatos a membro da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. O Secretário Geral preparará uma lista por ordem alfabética dos candidatos apresentados e a encaminhará aos Estados-membros da Organização, pelo menos trinta dias antes da Assembléia Geral seguinte. Artigo 80 - A eleição dos membros da Comissão far-se-á dentre os candidatos que figurem na lista a que se refere o artigo 79, por votação secreta da Assembléia Geral, e serão declarados eleitos os candidatos que obtiverem maior número de votos e a maioria absoluta dos votos dos representantes dos Estados-membros. Se, para eleger todos os membros da Comissão, for necessário realizar várias votações, serão eliminados sucessivamente, na forma que for determinada pela Assembléia Geral, os candidatos que receberem maior número de votos. Seção 2 - Corte Interamericana de Direitos Humanos Artigo 81 - Ao entrar em vigor esta Convenção, o Secretário Geral pedirá a cada Estado-parte que apresente, dentro de um prazo de noventa dias, seus candidatos a juiz da Corte Interamericana de Direitos Humanos. O Secretário Geral preparará uma lista por ordem alfabética dos candidatos apresentados e a encaminhará aos Estados-partes pelo menos trinta dias antes da Assembléia Geral seguinte. Artigo 82 - A eleição dos juízes da Corte far-se-á dentre os candidatos que figurem na lista a que se refere o artigo 81, por votação secreta dos Estados-partes, na Assembléia Geral, e serão declarados eleitos os candidatos que obtiverem o maior número de votos e a maioria absoluta dos votos dos representantes dos Estados-partes. Se, para eleger todos os juízes da Corte, for necessário realizar várias votações, serão eliminados sucessivamente, na forma que for determinada pelos Estados-partes, os candidatos que receberem menor número de votos. ____________ Adotada e aberta à assinatura na Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, em San José de Costa Rica, em 22.11.1969 - ratificada pelo Brasil em 25.09.1992 12.15. CONVENÇÃO INTERAMERICANA PARA PREVENIR E PUNIR A TORTURA Informações básicas sobre a Convenção Adotada e aberta à assinatura no XV Período Ordinário de Sessões da Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos, em Cartagena das Índias (Colômbia), em 9 de dezembro de 1985 e, promulgada pelo Dec. no 98.386, de 9-11-1989. A Lei no 9.455, de 7-4-1997 (conhecida como Lei dos Crimes de Tortura) codificou sistematicamente o estudo no Brasil. Nos termos desta Convenção, os Estados signatários obrigaram‑se a prevenir e a punir a tortura. Conceitua tortura, impõe responsabilidades aos autores dos delitos; cria medidas protetivas e preventivas, inclusive no âmbito legislativo; comenta sobre a extradição; estabelece critérios de jurisdição, da adesão e reserva. Preâmbulo Os Estados Americanos signatários da presente Convenção, convindo sobre o teor deste texto, são conscientes do disposto na Convenção Americana sobre Direitos Humanos, no sentido de que ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes. Reafirma que todo ato de tortura ou outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes constituem uma ofensa à dignidade humana e uma negação dos princípios consagrados na Carta da Organização dos Estados Americanos e na Carta das Nações Unidas, e são violatórios dos direitos humanos e liberdades fundamentais proclamados na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e na Declaração Universal dos Direitos do Homem. Assinalam que, para tornar efetivas as normas pertinentes contidas nos instrumentos universais e regionais aludidos, é necessário elaborar uma convenção interamericana que previna e puna a tortura. Reiteram seu propósito de consolidar neste Continente as condições que permitam o reconhecimento e o respeito da dignidade inerente à pessoa humana e assegurem o exercício pleno das suas liberdades e direitos fundamentais. Conceito de tortura Para os efeitos desta Convenção, entender‑se‑á por tortura todo ato pelo qual são infligidos intencionalmente a uma pessoa penas ou sofrimentos físicos ou mentais, com fins de investigação criminal, como meio de intimidação, como castigo pessoal, como medida preventiva, como pena ou com qualquer outro fim. Entender‑se‑á também como tortura a aplicação, sobre uma pessoa, de métodos tendentes a anular a personalidade da vítima, ou a diminuir sua capacidade física ou mental, embora não causem dor física ou angústia psíquica. Não estarão compreendidos no conceito de tortura as penas ou sofrimentos físicos ou mentais que sejam unicamente consequência de medidas legais ou inerentes a elas, contanto que não incluam a realização dos atos ou a aplicação dos métodos a que se refere este artigo. Segundo o mestre Damásio de Jesus, a tortura é meio cruel. Pode ser física ou moral. A Lei n o 9.455, de 7-4-1997, ao definir o crime de tortura, comina a pena de 8 a 16 anos de reclusão na hipótese de resultar morte (art. 1o, § 3o, 2a parte). Trata‑se de crime qualificado pelo resultado e preterdoloso, em que o primum delictum (tortura) é punido a título de dolo e o evento qualificador (morte), a título de culpa. Aplica‑se no caso de haver nexo de causalidade entre a tortura, seja física ou moral, e o resultado agravador. Ocorrendo dolo quanto à morte, seja direto ou eventual, o sujeito só responde por homicídio qualificado pela tortura (art. 121, § 2o, iii, 5a fig.), afastada a incidência da lei especial. Se, entretanto, durante a tortura o agente resolve matar a vítima, p. ex., a tiros de revólver, há dois crimes em concurso material: tortura (art. 1o da Lei no 9.455/1997) e homicídio, que pode ser qualificado por motivo torpe, recurso que impediu a defesa da vítima etc. Responsabilidade Serão responsáveis pelo delito de tortura: a) os empregados ou funcionários públicos que, atuando nesse caráter, ordenem sua execução ou instiguem ou induzam a ela, cometam‑no diretamente ou, podendo impedi‑lo, não o façam; b) as pessoas que, por instigação dos funcionários ou empregados públicos a que se refere a alínea a, ordenem sua execução, instiguem ou induzam a ela, cometam‑no diretamente ou nele sejam cúmplices. O fato de haver agido por ordens superiores não eximirá a responsabilidade penal correspondente. Não se invocará nem se admitirá como justificativa do delito de tortura a existência de circunstâncias tais como o estado de guerra, a ameaça de guerra, o estado de sítio ou de emergência, a comoção ou conflito interno, a suspensão das garantias constitucionais, a instabilidade política interna, ou outras emergências ou calamidades públicas. Nem a periculosidade do detido ou condenado, nem a insegurança do estabelecimento carcerário ou penitenciário podem justificar a tortura. Os Estados‑Partes assegurar‑se‑ão de que todos os atos de tortura e as tentativas de praticar atos dessa natureza sejam considerados delitos em seu direito penal, estabelecendo penas severas para sua punição, que levem em conta sua gravidade. Medidas protetivas preventivas Os Estados‑Partes tomarão medidas para que, no treinamento de agentes de polícia e de outros funcionários públicos responsáveis pela custódia de pessoas privadas de liberdade, provisória ou definitivamente, e nos interrogatórios, detenções ou prisões, se ressalte de maneira especial a proibição do emprego da tortura. Tomarão também medidas semelhantes para evitar outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes. Os Estados‑Partes assegurarão a qualquer pessoa que denunciar haver sido submetida a tortura, no âmbito de sua jurisdição, o direito de que o caso seja examinado de maneira imparcial. Quando houver denúncia ou razão fundada para supor que haja sido cometido ato de tortura no âmbito de sua jurisdição, os Estados‑Partes garantirão que suas autoridades procederão de ofício e imediatamente à realização de uma investigação sobre o caso e iniciarão, se for cabível, o respectivo processo penal. Uma vez esgotado o procedimento jurídico interno do Estado e os recursos que este prevê, o caso poderá ser submetido a instâncias internacionais, cuja competência tenha sido aceita por esse Estado. Os Estados‑Partes comprometem‑se a estabelecer, em suas legislações nacionais, normas que garantam compensação adequada para as vítimas do delito de tortura. Nada do disposto neste artigo afetará o direito de que possa ter a vítima ou outras pessoas de receber compensação em virtude da legislação nacional existente. Nenhuma declaração que se comprove haver sido obtida mediante tortura poderá ser admitida como prova em um processo, salvo em processo instaurado contra a pessoa ou pessoas acusadas de havê‑la obtido mediante atos de tortura e unicamente como prova de que, por esse meio, o acusado obteve tal declaração. Extradição Os Estados‑Partes tomarão as medidas necessárias para conceder a extradição de toda pessoa acusada de delito de tortura ou condenada por esse delito, de conformidade com suas legislações nacionais sobre extradição e suas obrigações internacionais nessa matéria. Competência e jurisdição Todo Estado‑Parte tomará as medidas necessárias para estabelecer sua jurisdição sobre o delito descrito nesta Convenção, nos seguintes casos: a) quando a tortura houver sido cometida no âmbito de sua jurisdição; b) quando o suspeito for nacional do Estado‑Parte de que se trate; c) quando a vítima for nacional do Estado‑Parte de que se trate e este o considerar apropriado. Todo Estado‑Parte tomará também as medidas necessárias para estabelecer sua jurisdição sobre o delito descrito nesta Convenção, quando o suspeito se encontrar no âmbito de sua jurisdição e o Estado não o extraditar, de conformidade com o art. 11. Esta Convenção não exclui a jurisdição penal exercida de conformidade com o direito interno. O delito a que se refere o art. 2o será considerado incluído entre os delitos que são motivo de extradição em todo tratado de extradição celebrado entre Estados‑Partes. Os Estados‑Partes comprometem ‑se a incluir o delito de tortura como caso de extradição em todo tratado de extradição que celebrarem entre si no futuro. Todo Estado‑Parte que sujeitar a extradição à existência de um tratado poderá, se receber de outro Estado‑Parte, com o qual não tiver tratado, uma solicitação de extradição, considerar esta Convenção como a base jurídica necessária para a extradição referente ao delito de tortura. A extradição estará sujeita às demais condições exigíveis pelo direito do Estado requerido. Os Estados‑Partes que não sujeitarem a extradição à existência de um tratado reconhecerão esses delitos como casos de extradição entre eles, respeitando as condições exigidas pelo direito do Estado requerido. Não se concederá a extradição nem se procederá à devolução da pessoa requerida quando houver suspeita fundada de que corre perigo sua vida, de que será submetida à tortura, tratamento cruel, desumano ou degradante, ou de que será julgada por tribunais de exceção ou ad hoc, no Estado requerente. Adesão e reserva Esta Convenção ficará aberta à adesão de qualquer outro Estado Americano. Os instrumentos de adesão serão depositados na Secretaria‑Geral da Organização dos Estados Americanos. Os Estados‑Partes poderão formular reservas a esta Convenção no momento de aprová‑la, assiná‑ la, ratificá‑la ou de a ela aderir, contanto que não sejam incompatíveis com o objeto e o fim da Convenção e versem sobre uma ou mais disposições específicas. Esta Convenção entrará em vigor no trigésimo dia a partir da data em que tenha sido depositado o segundo instrumento de ratificação. Para cada Estado que ratificar a Convenção ou a ela aderir depois de haver sido depositado o segundo instrumento de ratificação, a Convenção entrará em vigor no trigésimo dia a partir da data em que esse Estado tenha depositado seu instrumento de ratificação ou de adesão. 12.16. CONVENÇÃO SOBRE A ELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE DISCRIMINAÇÃO CONTRA A MULHER Foi aprovada pela Organização das Nações Unidas em 1979, entretanto, entrou em vigor somente em 1981. Hoje está presente em 179 países. A Convenção foi aprovada pelo Decreto Legislativo n o 26, de 22-6-1994, e promulgada pelo Dec. no 4.377, de 13-9-2002. O art. 372 e segs. da CLT contemplaram tais direitos. Considerandos aos Estados‑Partes na presente Convenção Na intenção de salvaguardar os interesses contemplados nesta Convenção, surgem vários considerandos para garantir a aplicação dos princípios enunciados, adotando as medidas necessárias a fim de suprimir essa discriminação em todas as suas formas e manifestações: Considerando que a Carta das Nações Unidas reafirma a fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor da pessoa humana e na igualdade de direitos do homem e da mulher, Considerando que a Declaração Universal dos Direitos Humanos reafirma o princípio da não discriminação e proclama que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos e que toda pessoa pode invocar todos os direitos e liberdades proclamados nessa Declaração, sem distinção alguma, inclusive de sexo, Considerando que os Estados‑Partes nas Convenções Internacionais sobre Direitos Humanos têm a obrigação de garantir ao homem e à mulher a igualdade de gozo de todos os direitos econômicos, sociais, culturais, civis e políticos, Observando as convenções internacionais concluídas sob os auspícios das Nações Unidas e dos organismos especializados em favor da igualdade de direitos entre o homem e a mulher, Observando, ainda, as resoluções, declarações e recomendações aprovadas pelas Nações Unidas e pelas Agências Especializadas para favorecer a igualdade de direitos entre o homem e a mulher, Preocupados, contudo, com o fato de que, apesar destes diversos instrumentos, a mulher continue sendo objeto de grandes discriminações, Relembrando que a discriminação contra a mulher viola os princípios da igualdade de direitos e do respeito da dignidade humana, dificulta a participação da mulher, nas mesmas condições que o homem, na vida política, social, econômica e cultural de seu país, constitui um obstáculo ao aumento do bem ‑estar da sociedade e da família e dificulta o pleno desenvolvimento das potencialidades da mulher para prestar serviço a seu país e à humanidade, Preocupados com o fato de que, em situações de pobreza, a mulher tem um acesso mínimo à alimentação, à saúde, à educação, à capacitação e às oportunidades de emprego, assim como à satisfação de outras necessidades, Convencidos de que o estabelecimento da nova ordem econômica internacional baseada na equidade e na justiça contribuirá significativamente para a promoção da igualdade entre o homem e a mulher, Salientando que a eliminação do apartheid, de todas as formas de racismo, discriminação racial, colonialismo, neocolonialismo, agressão, ocupação estrangeira e dominação e interferência nos assuntos internos dos Estados é essencial para o pleno exercício dos direitos do homem e da mulher, Afirmando que o fortalecimento da paz e da segurança internacionais, o alívio da tensão internacional, a cooperação mútua entre todos os Estados, independentemente de seus sistemas econômicos e sociais, o desarmamento geral e completo, e em particular o desarmamento nuclear sob um estrito e efetivo controle internacional, a afirmação dos princípios de justiça, igualdade e proveito mútuo nas relações entre países e a realização do direito dos povos submetidos a dominação colonial e estrangeira e a ocupação estrangeira, à autodeterminação e independência, bem como o respeito da soberania nacional e da integridade territorial, promoverão o progresso e o desenvolvimento sociais, e, em consequência, contribuirão para a realização da plena igualdade entre o homem e a mulher, Convencidos de que a participação máxima da mulher, em igualdade de condições com o homem, em todos os campos, é indispensável para o desenvolvimento pleno e completo de um país, o bem ‑estar do mundo e a causa da paz, Tendo presente a grande contribuição da mulher ao bem‑estar da família e ao desenvolvimento da sociedade, até agora não plenamente reconhecida, a importância social da maternidade e a função dos pais na família e na educação dos filhos, e conscientes de que o papel da mulher na procriação não deve ser causa de discriminação, mas sim que a educação dos filhos exige a responsabilidade compartilhada entre homens e mulheres e a sociedade como um conjunto, Reconhecendo que para alcançar a plena igualdade entre o homem e a mulher é necessário modificar o papel tradicional tanto do homem como da mulher na sociedade e na família, Resolvidos a aplicar os princípios enunciados na Declaração sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher e, para isto, a adotar as medidas necessárias a fim de suprimir essa discriminação em todas as suas formas e manifestações. 12.17. CONVENÇÃO INTERAMERICANA PARA A ELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE DISCRIMINAÇÃO CONTRA AS PESSOAS PORTADORAS DE DEFICIÊNCIA O Congresso Nacional aprovou o texto da Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência por meio do Decreto Legislativo no 198, de 13-6-2001. No Brasil, a Convenção entrou em vigor em 14-9-2001. No Decreto foi determinado o cumprimento integral dos termos elencados. Foi ratificado pelo Decreto no 3.956/2001. Ableísmo Ableísmo vem do inglês able, que significa hábil. É expressão inglesa que reporta a habilidade, menosprezando as pessoas portadoras de deficiência. Um concurso público não pode fazer distinção se, para exercício do cargo ou função, não importar o grau de deficiência. Os Estados signatários nesta Convenção convieram sob os seguintes argumentos: reafirmaram que as pessoas portadoras de deficiência têm os mesmos direitos humanos e liberdades fundamentais que outras pessoas e que estes direitos, inclusive o direito de não serem submetidas a discriminação com base na deficiência, emanam da dignidade e da igualdade que são inerentes a todo ser humano; consideraram que a Carta da Organização dos Estados Americanos, em seu art. 3, j, estabelece como princípio que “a justiça e a segurança sociais são bases de uma paz duradoura”; declararam que preocupados com a discriminação de que são objeto as pessoas em razão de suas deficiências estão comprometidos a eliminar a discriminação, em todas suas formas e manifestações, contra as pessoas portadoras de deficiência. Conceito de deficiência Para os efeitos desta Convenção, entende‑se por “deficiência” a restrição física, mental ou sensorial, de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de exercer uma ou mais atividades essenciais da vida diária, causada ou agravada pelo ambiente econômico e social. Conceito de discriminação O termo “discriminação contra as pessoas portadoras de deficiência” significa toda diferenciação, exclusão ou restrição baseada em deficiência, antecedente de deficiência, consequência de deficiência anterior ou percepção de deficiência presente ou passada, que tenha o efeito ou propósito de impedir ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício por parte das pessoas portadoras de deficiência de seus direitos humanos e suas liberdades fundamentais. Não constitui discriminação a diferenciação ou preferência adotada pelo Estado‑Parte para promover a integração social ou o desenvolvimento pessoal dos portadores de deficiência, desde que a diferenciação ou preferência não limite em si mesma o direito à igualdade dessas pessoas e que elas não sejam obrigadas a aceitar tal diferenciação ou preferência. Nos casos em que a legislação interna preveja a declaração de interdição, quando for necessária e apropriada para o seu bem‑estar, esta não constituirá discriminação. Objetivo Esta Convenção tem por objetivo prevenir e eliminar todas as formas de discriminação contra as pessoas portadoras de deficiência e propiciar a sua plena integração à sociedade. Para alcançar os objetivos desta Convenção, os Estados‑Partes comprometem‑se a: 1. Tomar as medidas de caráter legislativo, social, educacional, trabalhista, ou de qualquer outra natureza, que sejam necessárias para eliminar a discriminação contra as pessoas portadoras de deficiência e proporcionar a sua plena integração à sociedade, entre as quais as medidas abaixo enumeradas, que não devem ser consideradas exclusivas: a) medidas das autoridades governamentais e/ou entidades privadas para eliminar progressivamente a discriminação e promover a integração na prestação ou fornecimento de bens, serviços, instalações, programas e atividades, tais como o emprego, o transporte, as comunicações, a habitação, o lazer, a educação, o esporte, o acesso à justiça e aos serviços policiais e as atividades políticas e de administração; b) medidas para que os edifícios, os veículos e as instalações que venham a ser construídos ou fabricados em seus respectivos territórios facilitem o transporte, a comunicação e o acesso das pessoas portadoras de deficiência; c) medidas para eliminar, na medida do possível, os obstáculos arquitetônicos, de transporte e comunicações que existam, com a finalidade de facilitar o acesso e uso por parte das pessoas portadoras de deficiência; e d) medidas para assegurar que as pessoas encarregadas de aplicar esta Convenção e a legislação interna sobre esta matéria estejam capacitadas a fazê‑lo. 2. Trabalhar prioritariamente nas seguintes áreas: a) prevenção de todas as formas de deficiência preveníveis; b) detecção e intervenção precoce, tratamento, reabilitação, educação, formação ocupacional e prestação de serviços completos para garantir o melhor nível de independência e qualidade de vida para as pessoas portadoras de deficiência; e c) sensibilização da população, por meio de campanhas de educação, destinadas a eliminar preconceitos, estereótipos e outras atitudes que atentam contra o direito das pessoas a serem iguais, permitindo desta forma o respeito e a convivência com as pessoas portadoras de deficiência. Para alcançar os objetivos desta Convenção, os Estados‑Partes comprometem‑se a: 1. Cooperar entre si a fim de contribuir para a prevenção e eliminação da discriminação contra as pessoas portadoras de deficiência. 2. Colaborar de forma efetiva no seguinte: a) pesquisa científica e tecnológica relacionada com a prevenção das deficiências, o tratamento, a reabilitação e a integração na sociedade de pessoas portadoras de deficiência; e b) desenvolvimento de meios e recursos destinados a facilitar ou promover a vida independente, a autossuficiência e a integração total, em condições de igualdade, à sociedade das pessoas portadoras de deficiência. 17.5 Termos de cooperação Os Estados‑Partes promoverão, na medida em que isto for coerente com as suas respectivas legislações nacionais, a participação de representantes de organizações de pessoas portadoras de deficiência, de organizações não governamentais que trabalham nessa área ou, se essas organizações não existirem, de pessoas portadoras de deficiência, na elaboração, execução e avaliação de medidas e políticas para aplicar esta Convenção. Os Estados‑Partes criarão canais de comunicação eficazes que permitam difundir entre as organizações públicas e privadas que trabalham com pessoas portadoras de deficiência os avanços normativos e jurídicos ocorridos para a eliminação da discriminação contra as pessoas portadoras de deficiência. Para dar acompanhamento aos compromissos assumidos nesta Convenção, será estabelecida uma Comissão para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, constituída por um representante designado por cada Estado ‑Parte. 13. Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH) Atualmente, estamos na terceira fase deste programa (PNDH I, PNDH II, PNDH III), cabendo comentários sobre cada um deles. 13.1. Programa Nacional de Direitos Humanos I (PNDH I) Considerações Seja a curto, médio e longo prazo, o Programa Nacional de Direitos Humanos, além do prefácio do Presidente e uma introdução motivadora, contempla: 1. Propostas de Ações Governamentais; 2. Políticas públicas para proteção e promoção dos direitos humanos no Brasil (Proteção do Direito à Vida e à Liberdade); 3. Proteção do direito a tratamento igualitário perante a lei (Direitos Humanos, Direitos de Todos); 4. Educação e cidadania. Bases para uma cultura de direitos humanos (Produção e Distribuição de Informações e Conhecimento; Conscientização e Mobilização pelos Direitos Humanos); 5. Ações internacionais para proteção e promoção dos direitos humanos: Ratificação de Atos Internacionais; Implementação e Divulgação de Atos Internacionais; Apoio a Organizações e Operações de Defesa dos Direitos Humanos; Implementação e Monitoramento do Programa Nacional de Direitos Humanos. Prefácio do Presidente Não há como conciliar democracia com as sérias injustiças sociais, as formas variadas de exclusão e as violações reiteradas aos direitos humanos que ocorrem em nosso país. A sociedade brasileira está empenhada em promover uma democracia verdadeira. O Governo tem um compromisso real com a promoção dos direitos humanos. No dia 7 de setembro, fiz um apelo a todos os brasileiros para uma mobilização ampla em favor dos direitos humanos. Criamos um Prêmio dos Direitos Humanos. E prometemos preparar um Programa Nacional dos Direitos Humanos, tal como recomendava a Conferência Mundial de Direitos Humanos, realizada em Viena em 1993, cujo Comitê de Redação foi presidido pelo Brasil. Iniciamos juntos, o Governo e a sociedade, uma caminhada para pregar os direitos humanos como um direito de todos, para proteger os excluídos e os desamparados. Realizamos uma campanha contra a violência sexual e convidamos para um debate em Brasília as mais altas autoridades de segurança e do Judiciário dos Estados. Participei pessoalmente das comemorações relativas ao terceiro centenário da morte de Zumbi. Naquela ocasião criei um Grupo de Trabalho Interministerial para a Valorização da População Negra. O Ministério do Trabalho tem exercido fiscalização sem trégua sobre o trabalho forçado, sobretudo o de crianças. Em junho de 1995, determinei a criação do Grupo Executivo de Repressão ao Trabalho Forçado – GERTRAF para permitir a coordenação dos esforços com vistas a banir o trabalho forçado. Em benefício das mulheres, o Governo assinou, em 8 de março de 1996, protocolos específicos na área de saúde, educação, trabalho e justiça. Em dezembro, fiz a entrega da primeira parte dos Prêmios Direitos Humanos, em um valor de 75 mil reais. Não obstante este conjunto expressivo de iniciativas, o passo de maior consequência certamente será o da adoção do Programa Nacional de Direitos Humanos. Este será, estou seguro, um marco de referência claro e inequívoco do compromisso do País com a proteção de mulheres e homens, crianças e idosos, das minorias e dos excluídos. Todos nós sabemos que não é possível extirpar, de um dia para o outro, com um passe de mágica, a injustiça, o arbítrio e a impunidade. Estamos conscientes de que o único caminho está na conjugação de uma ação obstinada do conjunto do Governo com a mobilização da sociedade civil. Este caminho, nós estamos decididos a trilhar, com determinação. O Programa Nacional dos Direitos Humanos foi elaborado a partir de ampla consulta à sociedade. Algumas dezenas de entidades e centenas de pessoas formularam sugestões e críticas, participaram de debates e seminários. A maior parte das ações propostas neste importante documento tem por objetivo estancar a banalização da morte, seja ela no trânsito, na fila do pronto‑socorro, dentro de presídios, em decorrência do uso indevido de armas ou das chacinas de crianças e trabalhadores rurais. Outras recomendações visam a obstar a perseguição e a discriminação contra os cidadãos. Por fim, o Programa sugere medidas para tornar a Justiça mais eficiente, de modo a assegurar mais efetivo acesso da população ao Judiciário e o combate à impunidade. Estou convencido de que o Programa Nacional dos Direitos Humanos será o guia a pautar as nossas ações, do Governo e da sociedade, para construir o que é a aspiração maior de todos nós: um Brasil mais justo. Fernando Henrique Cardoso Introdução Os Direitos Humanos são os direitos de todos e devem ser protegidos em todos os Estados e nações. Os assassinatos, as chacinas, o extermínio, os sequestros, o crime organizado, o tráfico de drogas e as mortes no trânsito não podem ser considerados normais, especialmente em um Estado e em uma sociedade que se desejam modernos e democráticos. É preciso dizer não à banalização da violência e proteger a existência humana. É neste contexto que o Governo brasileiro, sob a presidência de Fernando Henrique Cardoso, decidiu elaborar o Programa Nacional de Direitos Humanos. Direitos humanos são os direitos fundamentais de todas as pessoas, sejam elas mulheres, negros, homossexuais, índios, idosos, portadores de deficiências, populações de fronteiras, estrangeiros e migrantes, refugiados, portadores de HIV, crianças e adolescentes, policiais, presos, despossuídos e os que têm acesso à riqueza. Todos, enquanto pessoas, devem ser respeitados, e sua integridade física protegida e assegurada. Direitos humanos referem‑se a um sem‑número de campos da atividade humana: o direito de ir e vir sem ser molestado; o direito de ser tratado pelos agentes do Estado com respeito e dignidade, mesmo tendo cometido uma infração; o direito de ser acusado dentro de um processo legal e legítimo, onde as provas sejam conseguidas dentro da boa técnica e do bom direito, sem estar sujeito a torturas ou maus‑ tratos; o direito de exigir o cumprimento da lei e, ainda, de ter acesso a um Judiciário e a um Ministério Público que, ciosos de sua importância para o Estado democrático, não descansem enquanto graves violações de direitos humanos estejam impunes, e seus responsáveis soltos e sem punição, como se estivessem acima das normas legais; o direito de dirigir seu carro dentro da velocidade permitida e com respeito aos sinais de trânsito e às faixas de pedestres, para não matar um ser humano ou lhe causar acidente; o direito de ser, pensar, crer, de manifestar‑se ou de amar sem tornar‑se alvo de humilhação, discriminação ou perseguição. São aqueles direitos que garantem existência digna a qualquer pessoa. O entendimento deste princípio é indispensável para que haja uma mutação cultural e, em consequência, uma mudança nas práticas dos Governos, dos Poderes da República nas suas várias esferas e, principalmente, da própria sociedade. É justamente quando a sociedade se conscientiza dos seus direitos e exige que estes sejam respeitados e que se fortalecem a Democracia e o Estado de Direito. O esforço dos Governos federal, estaduais, municipais, das autoridades judiciárias, legislativas e da própria sociedade como um todo ainda não foram capazes de diminuir o desrespeito diário aos direitos humanos no Brasil. A falta de segurança das pessoas, o aumento da escalada da violência, que a cada dia se revela mais múltipla e perversa, exigem dos diversos atores sociais e governamentais uma atitude firme, segura e perseverante no caminho do respeito aos direitos humanos. O Programa Nacional de Direitos Humanos aponta nessa direção, e está dirigido para o conjunto dos cidadãos brasileiros. O Programa é uma clara afirmação do Governo Federal com os compromissos assumidos, pelo Brasil, externamente e com a população na luta contra a violência em geral. O Governo Federal, com a iniciativa do Programa Nacional de Direitos Humanos, quer ir além de um quadro profundamente preocupante, marcado no passado por um Poder Público deficiente e indiferente ao desrespeito à tranquilidade e segurança do cidadão comum. A inconformidade da sociedade brasileira com esta situação é essencial para que este estado inaceitável de coisas seja afinal superado. O objetivo do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH), elaborado pelo Ministério da Justiça em conjunto com diversas organizações da sociedade civil, é, identificando os principais obstáculos à promoção e proteção dos direitos humanos no Brasil, eleger prioridades e apresentar propostas concretas de caráter administrativo, legislativo e político‑cultural que busquem equacionar os mais graves problemas que hoje impossibilitam ou dificultam a sua plena realização. O PNDH é resultante de um longo e, muitas vezes, penoso processo de democratização da sociedade e do Estado brasileiro. A Constituição de 1988 estabelece a mais precisa e pormenorizada carta de direitos de nossa história, que inclui uma vasta identificação de direitos civis, políticos, econômicos, sociais, culturais, além de um conjunto preciso de garantias constitucionais. A Constituição também impõe ao Estado brasileiro reger‑se, em suas relações internacionais, pelo princípio da “prevalência dos Direitos Humanos” (art. 4o, II). Resultado desta nova diretiva constitucional foi a adesão do Brasil, no início dos anos noventa, aos Pactos Internacionais de Direitos Civis e Políticos, e de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, às Convenções Americana de Direitos Humanos e contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, que se encontram entre os mais importantes instrumentos internacionais de proteção aos direitos humanos. Paralelamente a esta mudança no quadro normativo, o Governo Federal vem tomando várias iniciativas nas esferas internacional e interna que visam a promover e proteger os direitos humanos. Por iniciativa do então Chanceler Fernando Henrique Cardoso reuniram‑se, no Ministério das Relações Exteriores, em maio de 1993, representantes do Ministério da Justiça, da Procuradoria‑Geral da República, além de parlamentares, e as mais importantes organizações não governamentais de direitos humanos, com a finalidade de elaborar um relatório com diagnóstico das principais dificuldades do país, de modo a definir a agenda do Brasil para a Conferência Mundial de Direitos Humanos realizada em Viena em junho de 1993. Após esta conferência, setores do Estado e diversas entidades de Direitos Humanos foram convocados pelo então Ministro da Justiça, Maurício Corrêa, com a finalidade de elaborar uma Agenda Nacional de Direitos Humanos. Em 7 de setembro último, o Presidente Fernando Henrique Cardoso reiterou que os direitos humanos são parte essencial de seu programa de Governo. Para o Presidente, no limiar do século XXI, a “luta pela liberdade e pela democracia tem um nome específico: chama‑se Direitos Humanos”. Determinou, então, ao Ministério da Justiça a elaboração de um Programa Nacional de Direitos Humanos, conforme previsto na Declaração e Programa de Ação de Viena, adotada consensualmente na Conferência Mundial dos Direitos Humanos, em 25 de junho de 1993, na qual o Brasil teve uma destacada participação. O Governo brasileiro, embora considere que a normatização constitucional e a adesão a tratados internacionais de direitos humanos sejam passos essenciais e decisivos na promoção destes direitos, está consciente de que a sua efetivação, no dia a dia de cada um, depende da atuação constante do Estado e da Sociedade. Com este objetivo se elaborou o Programa Nacional de Direitos Humanos que ora se submete a toda a Nação. Atualidade dos Direitos Humanos A adoção pela Assembleia Geral das Nações Unidas da Declaração Universal de Direitos Humanos, em 1948, constitui o principal marco no desenvolvimento da ideia contemporânea de direitos humanos. Os direitos inscritos nesta Declaração constituem um conjunto indissociável e interdependente de direitos individuais e coletivos, civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, sem os quais a dignidade da pessoa humana não se realiza por completo. A Declaração transformou‑se, nesta última metade de século, em uma fonte de inspiração para a elaboração de diversas cartas constitucionais e tratados internacionais voltados à proteção dos direitos humanos. Este documento, chave do nosso tempo, tornou‑se um autêntico paradigma ético a partir do qual se pode medir e contestar a legitimidade de regimes e Governos. Os direitos ali inscritos constituem hoje um dos mais importantes instrumentos de nossa civilização visando a assegurar um convívio social digno, justo e pacífico. Os direitos humanos não são, porém, apenas um conjunto de princípios morais que devem informar a organização da sociedade e a criação do direito. Enumerados em diversos tratados internacionais e constituições, asseguram direitos aos indivíduos e coletividades e estabelecem obrigações jurídicas concretas aos Estados. Compõem‑se de uma série de normas jurídicas claras e precisas, voltadas a proteger os interesses mais fundamentais da pessoa humana. São normas cogentes ou programáticas que obrigam os Estados nos planos interno e externo. Com o estabelecimento das Nações Unidas, em 1945, e a adoção de diversos tratados internacionais voltados à proteção da pessoa humana, os direitos humanos deixaram de ser uma questão afeta exclusivamente aos Estados nacionais, passando a ser matéria de interesse de toda a comunidade internacional. A criação de mecanismos judiciais internacionais de proteção dos direitos humanos, como a Corte Interamericana e a Corte Europeia de Direitos Humanos, ou quase‑judiciais, como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos ou o Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas, deixa claro esta mudança na antiga formulação do conceito de soberania. É certo, porém, que a obrigação primária de assegurar os direitos humanos continua a ser responsabilidade interna dos Estados. A natureza do Programa Nacional de Direitos Humanos O Programa Nacional de Direitos Humanos, como qualquer plano de ação que se pretenda exequível, deve explicitar objetivos definidos e precisos. Assim, sem abdicar de uma compreensão integral e indissociável dos direitos humanos, o Programa atribui maior ênfase aos direitos civis, ou seja, os que ferem mais diretamente a integridade física e o espaço de cidadania de cada um. O fato de os direitos humanos em todas as suas três gerações – a dos direitos civis e políticos, a dos direitos sociais, econômicos e culturais, e a dos direitos coletivos – serem indivisíveis não implica que, na definição de políticas específicas – dos direitos civis –, o Governo deixe de contemplar de forma específica cada uma dessas outras dimensões. O Programa, apesar de inserir‑se dentro dos princípios definidos pelo Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, contempla um largo elenco de medidas na área de direitos civis que terão consequências decisivas para a efetiva proteção dos direitos sociais, econômicos e culturais, como, por exemplo, a implementação das convenções internacionais dos direitos das crianças, das mulheres e dos trabalhadores. Numa sociedade ainda injusta como é a do Brasil, com graves desigualdades de renda, promover os direitos humanos tornar‑se‑á mais factível se o equacionamento dos problemas estruturais – como aqueles provocados pelo desemprego, fome, dificuldades do acesso à terra, à saúde, à educação, concentração de renda – for objeto de políticas governamentais. Para que a população, porém, possa assumir que os direitos humanos são direitos de todos, e as entidades da sociedade civil possam lutar por esses direitos e organizar‑se para atuar em parceria com o Estado, é fundamental que seus direitos civis elementares sejam garantidos e, especialmente, que a Justiça seja uma instituição garantidora e acessível para qualquer um. Serão abordados, no Programa, os entraves à cidadania plena, que levam à violação sistemática dos direitos, visando a proteger o direito à vida e à integridade física; o direito à liberdade; o direito à igualdade perante à lei. O Programa contempla, igualmente, iniciativas que fortalecem a atuação das organizações da sociedade civil, para a criação e consolidação de uma cultura de direitos humanos. Nada melhor para atingir esse objetivo do que atribuir a essas organizações uma responsabilidade clara na promoção dos direitos humanos, especialmente nas iniciativas voltadas para a educação e a formação da cidadania. Na elaboração do Programa foram realizados, entre novembro de 1995 e março de 1996, seis seminários regionais – São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Belém, Porto Alegre e Natal, com 334 participantes, pertencentes a 210 entidades. Foram realizadas consultas, por telefone e fax, a um largo espectro de centros de direitos humanos e personalidades. Foi realizada uma exposição no Encontro do Movimento Nacional dos Direitos Humanos, em Brasília, no mês de fevereiro de 1996. Finalmente, o projeto do Programa foi apresentado e debatido na I Conferência Nacional de Direitos Humanos, promovida pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, com o apoio do Fórum das Comissões Legislativas de Direitos Humanos, Comissão de Direitos Humanos da OAB Federal, Movimento Nacional de Direitos Humanos, CNBB, FENAJ, INESC, SERPAJ e CIMI. O Programa foi encaminhado, ainda, a várias entidades internacionais. Neste processo de elaboração, foi colocada em prática a parceria entre o Estado e as organizações da sociedade civil. Na execução concreta do Programa, a mesma parceria será intensificada. Além das organizações de direitos humanos, universidades, centros de pesquisa, empresas, sindicatos, associações empresariais, fundações, enfim, toda a sociedade brasileira deverá ter um papel ativo para que o Programa se efetive como realidade. O Programa Nacional de Direitos Humanos abre uma nova dinâmica. Governo e sociedade civil respeitam a mesma gramática e articulam esforços comuns. O Programa passa, desta forma, a ser um marco referencial para as ações governamentais e para a construção, por toda a sociedade, da convivência sem violência que a democracia exige. Propostas de ações governamentais 1. Políticas públicas para proteção e promoção dos direitos humanos no Brasil Proteção do direito à vida. Proteção do direito à liberdade. Apoiar a formulação e implementação de políticas públicas e privadas e de ações sociais para redução das grandes desigualdades econômicas, sociais e culturais ainda existentes no país, visando à plena realização do direito ao desenvolvimento. Criar um Cadastro Federal de Inadimplentes Sociais, que relacione os estados e municípios que não cumpram obrigações mínimas de proteção e promoção dos direitos humanos, com vistas a evitar o repasse de recursos, subsídios ou favorecimento a esses inadimplentes. 2. Proteção do direito a tratamento igualitário perante a lei Direitos Humanos, Direitos de Todos 3. Educação e cidadania. Bases para uma cultura de direitos humanos Produção e Distribuição de Informações e Conhecimento; Conscientização e Mobilização pelos Direitos Humanos. 4. Ações internacionais para proteção e promoção dos direitos humanos Ratificação de Atos Internacionais Implementação e Divulgação de Atos Internacionais Apoio a Organizações e Operações de Defesa dos Direitos Humanos Implementação e Monitoramento do Programa Nacional de Direitos Humanos 13.2. Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH II Introdução Decorridos quase seis anos do lançamento do Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH, pode ‑se afirmar com segurança que o Brasil avançou significativamente na questão da promoção e proteção dos direitos humanos. Graças ao PNDH, foi possível sistematizar demandas de toda a sociedade brasileira com relação aos direitos humanos e identificar alternativas para a solução de problemas estruturais, subsidiando a formulação e implementação de políticas públicas e fomentando a criação de programas e órgãos estaduais concebidos sob a ótica da promoção e garantia dos direitos humanos. A criação da Secretaria de Estado dos Direitos Humanos, no âmbito do Ministério da Justiça, possibilitou o engajamento efetivo do Governo Federal em ações voltadas para a proteção e promoção de direitos humanos. As metas do PNDH foram, em sua maioria, sendo incorporadas aos instrumentos de planejamento e orçamento do Governo Federal, convertendo‑se em programas e ações específicas com recursos financeiros assegurados nas Leis Orçamentárias Anuais, conforme determina o Plano Plurianual (PPA). Entre as principais medidas legislativas que resultaram de proposições do PNDH figuram o reconhecimento das mortes de pessoas desaparecidas em razão de participação política (Lei n o 9.140/1995), pela qual o Estado brasileiro reconheceu a responsabilidade por essas mortes e concedeu indenização aos familiares das vítimas; a transferência da justiça militar para a justiça comum dos crimes dolosos contra a vida praticados por policiais militares (Lei no 9.299/1996), que permitiu o indiciamento e julgamento de policiais militares em casos de múltiplas e graves violações, como os do Carandiru, Corumbiara e Eldorado dos Carajás; a tipificação do crime de tortura (Lei n o 9.455/1997), que constituiu marco referencial para o combate a essa prática criminosa no Brasil; e a construção da proposta de reforma do Poder Judiciário, na qual se inclui, entre outras medidas destinadas a agilizar o processamento dos responsáveis por violações, a chamada “federalização” dos crimes de direitos humanos. O PNDH contribuiu ainda para ampliar a participação do Brasil nos sistemas global (da Organização das Nações Unidas – ONU) e regional (da Organização dos Estados Americanos – OEA) de promoção e proteção dos direitos humanos, por meio da continuidade da política de adesão a pactos e convenções internacionais de direitos humanos e de plena inserção do País no sistema interamericano. O aumento da cooperação com órgãos internacionais de salvaguarda se evidenciou no número de relatores especiais das Nações Unidas que realizaram visitas ao Brasil nos últimos anos. Essas visitas resultaram na elaboração de relatórios contendo conclusões e recomendações de grande utilidade para o aprimoramento de diagnósticos e a identificação de medidas concretas para a superação de problemas relacionados aos direitos humanos no Brasil. Já visitaram o País os relatores da ONU sobre os temas da venda de crianças, prostituição e pornografia infantis; da violência contra a mulher; do racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância correlata; dos direitos humanos e resíduos tóxicos; tortura e, mais recentemente, sobre o direito à alimentação. No dia 19 de dezembro de 2001, o Presidente da República anunciou um convite aberto aos relatores temáticos da Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas para que visitem o Brasil sempre que assim o desejarem. Dando seguimento à cooperação com os mecanismos temáticos das Nações Unidas, a relatora especial sobre execuções extrajudiciais, sumárias e arbitrárias estará visitando o País no segundo semestre de 2002. Da mesma forma, a cooperação com os órgãos de supervisão da OEA tem ensejado a busca de soluções amistosas para casos de violação em exame pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, possibilitando a concessão de reparações e indenizações às vítimas dessas violações ou a seus familiares, bem como a adoção de medidas administrativas e legislativas para prevenir a ocorrência de novas violações. A aceitação da jurisdição compulsória da Corte Interamericana de Direitos Humanos representa, ademais, garantia adicional a todos os brasileiros de proteção dos direitos consagrados na Convenção Americana sobre Direitos Humanos, quando as instâncias nacionais se mostrarem incapazes de assegurar a realização da justiça. No plano interno, os resultados da elaboração e implementação do PNDH podem ser medidos pela ampliação do espaço público de debate sobre questões afetas à proteção e promoção dos direitos humanos, tais como o combate à exploração sexual de crianças e adolescentes, a reforma dos mecanismos de reinserção social do adolescente em conflito com a lei, a manutenção da idade de imputabilidade penal, o combate a todas formas de discriminação, a adoção de políticas de ação afirmativa e de promoção da igualdade e o combate à prática da tortura. Os esforços empreendidos no campo da promoção e proteção dos direitos humanos se pautaram na importância estratégica da coordenação entre os três níveis de governo e os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, assim como da parceria entre órgãos governamentais e entidades da sociedade civil. Ao adotar, em 13 de maio de 1996, o Programa Nacional de Direitos Humanos, o Brasil se tornou um dos primeiros países do mundo a cumprir recomendação específica da Conferência Mundial de Direitos Humanos (Viena, 1993), atribuindo ineditamente aos direitos humanos o status de política pública governamental. Sem abdicar de uma compreensão integral e indissociável dos direitos humanos, o programa original conferiu maior ênfase à garantia de proteção dos direitos civis. O processo de revisão do PNDH constitui um novo marco na promoção e proteção dos direitos humanos no País, ao elevar os direitos econômicos, sociais e culturais ao mesmo patamar de importância dos direitos civis e políticos, atendendo a reivindicação formulada pela sociedade civil por ocasião da IV Conferência Nacional de Direitos Humanos, realizada em 13 e 14 de maio de 1999 na Câmara dos Deputados, em Brasília. A atualização do Programa Nacional oferece ao governo e à sociedade brasileira a oportunidade de fazer um balanço dos progressos alcançados desde 1996, das propostas de ação que se tornaram programas governamentais e dos problemas identificados na implementação do PNDH. A inclusão dos direitos econômicos, sociais e culturais, de forma consentânea com a noção de indivisibilidade e interdependência de todos os direitos humanos expressa na Declaração e Programa de Ação de Viena (1993), orientou‑se pelos parâmetros definidos na Constituição Federal de 1988, inspirando‑se também no Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966 e no Protocolo de São Salvador em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ratificados pelo Brasil em 1992 e 1996, respectivamente. O PNDH II incorpora ações específicas no campo da garantia do direito à educação, à saúde, à previdência e assistência social, ao trabalho, à moradia, a um meio ambiente saudável, à alimentação, à cultura e ao lazer, assim como propostas voltadas para a educação e sensibilização de toda a sociedade brasileira com vistas à construção e consolidação de uma cultura de respeito aos direitos humanos. Atendendo a anseios da sociedade civil, foram estabelecidas novas formas de acompanhamento e monitoramento das ações contempladas no Programa Nacional, baseadas na relação estratégica entre a implementação do programa e a elaboração dos orçamentos em nível federal, estadual e municipal. O PNDH II deixa de circunscrever as ações propostas a objetivos de curto, médio e longo prazo, e passa a ser implementado por meio de planos de ação anuais, os quais definirão as medidas a serem adotadas, os recursos orçamentários destinados a financiá‑las e os órgãos responsáveis por sua execução. O PNDH II será implementado, a partir de 2002, com os recursos orçamentários previstos no atual Plano Plurianual (PPA 2000-2003) e na lei orçamentária anual. Embora a revisão do Programa Nacional esteja sendo apresentada à sociedade brasileira a pouco mais de um ano da posse do novo governo, os compromissos expressos no texto quanto à promoção e proteção dos direitos humanos transcendem a atual administração e se projetam no tempo, independentemente da orientação política das futuras gestões. Nesse sentido, o PNDH II deverá influenciar a discussão, no transcurso de 2003, do Plano Plurianual 2004-2007. O Programa Nacional servirá também de parâmetro e orientação para a definição dos programas sociais a serem desenvolvidos no País até 2007, ano em que se procederia a nova revisão do PNDH. As propostas de atualização foram discutidas em seminários regionais, com ampla participação de órgãos governamentais e de entidades da sociedade civil e, posteriormente, registradas e consolidadas pelo Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo – NEV/USP. Após esforço de sistematização, aglutinação e consulta aos Ministérios e órgãos da área social, sob a coordenação da Casa Civil da Presidência da República, chegou‑se a texto com 500 propostas, consideradas todas as categorias de direitos. A Secretaria de Estado dos Direitos Humanos realizou ainda, no período de 19 de dezembro de 2001 a 15 de março de 2002, consulta pública através da internet, dela resultando, após correções e ajustes finais, o texto do PNDH II com 518 propostas de ações governamentais, que ora se encaminha à publicação no Diário Oficial da União. Prefácio do Presidente A implementação das diretrizes do Programa Nacional de Direitos Humanos, ao longo dos últimos seis anos, abriu novas perspectivas de transformação no modo como a sociedade brasileira enfrenta o seu cotidiano, em sua busca constante por justiça e por melhores condições de vida. Fortaleceram‑se as garantias de que dispõem os brasileiros contra o arbítrio do Estado, a prática da violência, o desrespeito dos direitos fundamentais. Sabemos que a promoção e a proteção dos direitos humanos é tarefa que cabe a todos nós: cidadãos e autoridades. Temos aprofundado nossa participação nos instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos, inclusive mediante o reconhecimento da competência de órgãos dos sistemas internacionais de proteção, que proporcionam uma garantia adicional de respeito aos direitos humanos. Reconhecemos que o racismo ainda é um problema a ser enfrentado e que, nessa matéria, assim como em tudo que diz respeito à garantia de direitos humanos, é fundamental o engajamento de toda a sociedade brasileira, dos empresários e de todos aqueles que têm a possibilidade de estimular a diversidade nos ambientes de trabalho, de promover políticas de promoção de igualdade e inclusão, procurando assegurar oportunidades mais equitativas aos que, historicamente, são vítimas de discriminação. Inserimos, na pauta das políticas públicas, questões que até pouco tempo atrás eram consideradas tabus ou não recebiam a devida atenção, como a dos direitos dos homossexuais, a situação dos ciganos, a prática da tortura, a questão da violência intrafamiliar, a necessidade de fortalecermos o combate ao trabalho infantil e ao trabalho forçado e a luta pela inclusão das pessoas portadoras de deficiência. Inauguramos uma nova era no campo das políticas sociais. Deixamos para trás as políticas de cunho assistencialista. Estamos construindo uma autêntica rede de proteção social, implementando programas que possibilitam a transferência direta de renda aos mais pobres, garantindo‑lhes as condições de acesso aos bens e serviços. A atualização do Programa Nacional de Direitos Humanos traz avanços importantes relativos ao direito à educação, à saúde, ao trabalho, à moradia, à cultura e ao lazer. Ao mesmo tempo em que se realiza um balanço sobre os resultados já obtidos, sobre as dificuldades que têm impedido avanços ainda maiores, incorpora‑se no programa a questão dos direitos econômicos, sociais e culturais, em conformidade com a concepção moderna de direitos humanos, segundo a qual esses são direitos universais, indivisíveis e interdependentes. Essa atualização nos permite, além disso, lançar as bases daquelas que serão as próximas conquistas, as próximas transformações, definidas em conjunto pelo Governo e pela sociedade, no mesmo espírito que marcou a elaboração do Programa em 1996. O novo Programa Nacional dos Direitos Humanos oferece um mapa das rotas que deveremos trilhar, nos próximos anos – mediante ações do Governo e da sociedade –, para avançar, com impulso ainda maior, no projeto de construção de um Brasil mais justo. Propostas de ações governamentais 1. Propostas Gerais 2. Garantia do Direito à Vida 3. Garantia do Direito à Justiça 4. Garantia do Direito à Liberdade 5. Garantia do Direito à Igualdade 6. Garantia do Direito à Educação 7. Garantia do Direito à Saúde, à Previdência e à Assistência Social 8. Garantia do Direito ao Trabalho 9. Garantia do Direito à Moradia 10. Garantia do Direto a um Meio Ambiente Saudável 11. Garantia do Direito à Alimentação 12. Garantia do Direito à Cultura e ao Lazer 13. Educação, Conscientização e Mobilização 14. Inserção nos Sistemas Internacionais de Proteção 15. Implementação e Monitoramento 13.3. Programa Nacional de Direitos Humanos III Foi instituído pelo Decreto 7.037, de 21 de dezembro de 2009, atualizado pelo Decreto 7.177, de 12 de maio de 2010. Seus eixos orientadores e diretrizes são estes: Eixo Orientador 01: Interação democrática entre Estado e sociedade civil Eixo Orientador 02: Desenvolvimento e Direitos Humanos Eixo Orientador III: Universalizar direitos em um contexto de desigualdades Eixo Orientador IV: Segurança Pública, Acesso à Justiça e Combate à Violência Eixo Orientador V: Educação e Cultura em Direitos Humanos Eixo Orientador VI: Direito à Memória e à Verdade Criou-se o Comitê de Acompanhamento e Monitoramento do PNDH-3 Atualmente, existem algumas polêmicas envolvendo o PDNH3, já que: Institui a Prévia mediação para o caso de invasões de terras, o que acabou tentando limitar o acesso ao Judiciário Proibiu a divulgação de símbolos religiosos Criou o marco legal para regulamentar os meios de comunicação Iniciou estudo para criação de imposto sobre grandes fortunas (afastaria investidores) Tratou do aborto como preocupação de saúde pública 14. Comissão Nacional da Verdade Criação da Lei 12.528, de 18 de novembro de 2011 (o Decreto 7.919, de 14 de fevereiro de 2013, para fortalecer a Comissão, remanejou cargos em comissão para a mesma). Abaixo, um resumo geral sobre a CNV: Finalidade geral: “Examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos praticadas no período fixado no art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (18.09.1946 a 05.10.1988), a fim de efetivar o direito à memória e à verdade histórica e promover a reconciliação nacional”. Composição: “A Comissão Nacional da Verdade, composta de forma pluralista, será integrada por 7 (sete) membros, designados pelo Presidente da República, dentre brasileiros, de reconhecida idoneidade e conduta ética, identificados com a defesa da democracia e da institucionalidade constitucional, bem como com o respeito aos direitos humanos”. Proibição de participação para aqueles que: - exerçam cargos executivos em agremiação partidária, com exceção daqueles de natureza honorária; - não tenham condições de atuar com imparcialidade no exercício das competências da Comissão; - estejam no exercício de cargo em comissão ou função de confiança em quaisquer esferas do poder público. Objetivos específicos: I - esclarecer os fatos e as circunstâncias dos casos de graves violações de direitos humanos mencionados no caput do art. 1o; II - promover o esclarecimento circunstanciado dos casos de torturas, mortes, desaparecimentos forçados, ocultação de cadáveres e sua autoria, ainda que ocorridos no exterior; III - identificar e tornar públicos as estruturas, os locais, as instituições e as circunstâncias relacionados à prática de violações de direitos humanos mencionadas no caput do art. 1o e suas eventuais ramificações nos diversos aparelhos estatais e na sociedade; IV - encaminhar aos órgãos públicos competentes toda e qualquer informação obtida que possa auxiliar na localização e identificação de corpos e restos mortais de desaparecidos políticos, nos termos do art. 1o da Lei no 9.140, de 4 de dezembro de 1995; V - colaborar com todas as instâncias do poder público para apuração de violação de direitos humanos; 15. VI - recomendar a adoção de medidas e políticas públicas para prevenir violação de direitos humanos, assegurar sua não repetição e promover a efetiva reconciliação nacional; e VII - promover, com base nos informes obtidos, a reconstrução da história dos casos de graves violações de direitos humanos, bem como colaborar para que seja prestada assistência às vítimas de tais violações. Poderes I - receber testemunhos, informações, dados e documentos que lhe forem encaminhados voluntariamente, assegurada a não identificação do detentor ou depoente, quando solicitada; II - requisitar informações, dados e documentos de órgãos e entidades do poder público, ainda que classificados em qualquer grau de sigilo; III - convocar, para entrevistas ou testemunho, pessoas que possam guardar qualquer relação com os fatos e circunstâncias examinados; IV - determinar a realização de perícias e diligências para coleta ou recuperação de informações, documentos e dados; V - promover audiências públicas; VI - requisitar proteção aos órgãos públicos para qualquer pessoa que se encontre em situação de ameaça em razão de sua colaboração com a Comissão Nacional da Verdade; VII - promover parcerias com órgãos e entidades, públicos ou privados, nacionais ou internacionais, para o intercâmbio de informações, dados e documentos; e VIII - requisitar o auxílio de entidades e órgãos públicos. Sigilo:“Os dados, documentos e informações sigilosos fornecidos à Comissão Nacional da Verdade não poderão ser divulgados ou disponibilizados a terceiros, cabendo a seus membros resguardar seu sigilo”. Natureza da Comissão: “As atividades da Comissão Nacional da Verdade não terão caráter jurisdicional ou persecutório”. Dever de colaboração e dispensa: “É dever dos servidores públicos e dos militares colaborar com a Comissão Nacional da Verdade”; “A designação de servidor público federal da administração direta ou indireta ou de militar das Forças Armadas implicará a dispensa das suas atribuições do cargo”. Tribunal Penal Internacional É velha a utilização da soberania para a proteção de crimes. Santo Agostinho (“De civitate Dei, de 1426), já perguntava: “Qual é o elemento que distingue o Reino de um bando de criminosos?” Ambos tinham poder de emitir ordens, poderia constranger para que as mesmas fossem cumpridas, por meio de ameaça ou violência, e poderia adotar regras de organização, disciplina e hierarquia e ainda aplicar sanções em caso de desobediência. A única diferença é que o Estado tem o poder de fazer valer a justiça e não impor a vontade do mais forte. Esta situação sempre deixou claro que o Estado, após seu conceito moderno e reconhecimento da soberania, foi o principal fator de destruição, morte, perseguição, e toda uma série de atos horrendos contra o ser humano. O próprio desenvolvimento do conceito de soberania, ao longo dos anos, levou à sua utilização para proteção total dos governantes, independentemente dos crimes que viessem a cometer. Nicolau Maquiavel (1469-1527), em O Príncipe, de 1513, publicado em 1532, dizia que era necessária a manutenção do príncipe no poder, para tomar atitudes diferentes dos homens comuns e manter a unidade da Itália, daí porque “os fins justificavam os meios”. Jean Bodin (1530-1596), em “Os Seis Livros da República”, de 1576, dizia que soberania é o poder absoluto e perpétuo do Estado, nas mãos do Rei, daí porque “o Rei não está submetido a condições postas pelo povo”. Tomas Hobbes (1588-1679), em “Leviatã”, de 1651, enfatizava a necessidade de concentração do poder no Estado, representando pelo soberano, para segurança de todos (“O Estado deve ser absolutista”). Jacques-Bénigne Bossuet (16271704), em “A Política tirada da Sagrada Escritura”, deixava claro o direito divino dos reis, porque os governantes são representantes de Deus na Terra ( “Governantes só devem satisfação a Deus”). Otto von Bismark (1815-1898), por sua vez, justificava suas atitudes com base em “razões do Estado” (“os superiores interesses do Estado justificam os atos dos governantes”. Por isso, a ideia de um Tribunal Penal Internacional é antiga43, fazendo a humanidade perceber, ao longo dos anos, a formação de verdadeiras organizações criminosas com base na soberania e na estrutura do Estado. Na 1ª Guerra Mundial, mais de 10 milhões de mortos e 20 milhões de feridos. O Estado foi o fator decisivo para o desencadeamento do Holocausto, com perseguição e morte de judeus, militantes comunistas, homossexuais, ciganos, eslavos, deficientes motores e mentais, prisioneiros de guerra soviéticos. Na 2ª Guerra Mundial: morte de mais de 50 milhões de pessoas: bombardeiros, massacres, doenças, fome, genocídio. As ditaduras militares, incontáveis, foram responsáveis por perseguição, tortura, restrição a direitos fundamentais, desaparecimentos forçados e toda uma série de ferimentos a direitos humanos. Atualmente, ainda se vê Campos de Refugiados espalhados pelo mundo: na Jordânia: 280 mil refugiados (10 campos), na Síria: 112 mil refugiados (10 campos, atualmente em Guerra Civil); no Líbano: 210 mil refugiados (12 campos); na Cisjordânia: 181 mil refugiados (19 campos), na Faixa de Gaza: 417 mil refugiados (8 campos, sendo que somente em Campo de Camp Beach, com 1 Km2, são mais de 80 mil refugiados. Na África, ainda campeia guerras, genocídios e ditadores locais, todos protegidos pela soberania. A criação do Tribunal Penal Internacional, portanto, foi impulsionada por dois motivos básicos: 43 Como antecedente longínquo, é citado primeiro tribunal internacional de 1474, para julgar, na Alemanha, Peter von Hagenbach, por permitir o estupro, o assassinato e o saque das propriedades civis. Como antecedente direto do Tribunal Penal Internacional, é bastante citada a proposta formal apresentada por Gustavo Moynier, um dos fundadores da Cruz Vermelha, na Conferência de 1872, para julgar crimes de guerra, cuja repercussão foi pequena, vindo mesmo a ser difundida apenas no Século XX. Por isso, foi mesmo depois da 1ª Guerra Mundial é que surgiram iniciativas de levar indivíduos à justiça internacional, incluindo altos funcionários dos Estados, uma vez que, após o Tratado de Versalhes, que pôs fim à 1ª Guerra Mundial, houve intensa pressão social para punição dos responsáveis pelas inúmeras violações de direitos humanos no período. Neste Tratado, assinado em Versalhes em 28.06.1919, foi previsto, em seu art. 227, a criação de um tribunal penal internacional “ad hoc” para julgar Kaiser Wilhelm II por ter iniciado a guerra e ferir a Convenção de Genebra de 1864, mas não se efetivou por conta da fuga deste para a Holanda, que se negou a entregá-lo. O mesmo ocorreu com o Tratado de Sèvres, cuja Comissão, em 1919, defendeu a criação de um tribunal superior, em especial diante do massacre de 600.000 armênios na Turquia, mas os EUA se opuseram, devido a inexistência de lei internacional prevendo os crimes e a violação da soberania, não sendo ratificado, inclusive, pela Turquia, fracassando finalmente com o Tratado de Lausanne, de 1927, que concedeu anistia geral aos oficiais turcos. Neste período pós 1ª Guerra Mundial, foi criada a Convenção contra o Terrorismo pela Liga das Nações, em 1937, com previsão, em seu Estatuto, de criação de um Tribunal Criminal Internacional, que novamente naufragou porque apenas a Índia ratificou a Convenção (Flávia Piovesan, Temas de Direitos Humanos, 5ª edição, Saraiva, 2012, pp. 221/222; Pablo R. Alflen da Silva, Tribunal Penal Internacional: Aspectos fundamentais e o novo Código Penal Internacional alemão. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2004. cap. I. p.1718; Antônio Cassese, “De Nuremberg a Roma: dos Tribunais Militares Internacionais ao Tribunal Penal Internacional”; em O Direito Penal no Estatuto de Roma: Leituras sobre os Fundamentos e a Aplicabilidade do Tribunal Penal Internacional, de Salo de Carvalho (organizador), RJ, Ed. Lumen Juris, 2005. cap. I. p. 03). a) evitar julgamentos realizados por tribunais de exceção (sem imparcialidade, que se transformavam em verdadeiras “vinganças dos vencedores”), como ocorrido pelo Tribunal de Nuremberg em 1945, Tribunal de Tóquio, de 194644, e os Tribunais da Ex-Iugoslávia, de 1993 e de Ruanda, de 199445; b) necessidade de se fazer justiça diante de crimes bárbaros contra a humanidade, cometidos sob os auspícios da soberania e com impunidade, em especial pelos horrores cometidos na 2ª Guerra Mundial. Sua criação surgiu após aprovação do Estatuto de Roma, em 17 de julho de 1998, por 120 votos favoráveis, 07 votos contrários (China, EUA, Filipinas, Índia, Israel, Sri Lanka e Turquia) e 21 abstenções, entrando em vigor em 1º de julho de 2001, com participação do Brasil nas negociações46. O Estatuto foi aprovado no Brasil pelo Decreto Legislativo 112, de 06 de junho de 2002, e promulgado pelo Decreto Presidencial 4.388, de 25 de setembro de 2002. Como foi visto, a intenção do poder constituinte brasileiro é claro em sua aceitação, tanto do originário, porque no art. 7º do ADCT enfatizou que o Brasil deveria propugnar pela formação de um tribunal internacional dos direitos humanos, quanto o reformador, porque a EC 45/04 incluiu o §4º ao art. 5º, submetendo o Brasil à jurisdição do TPI. Tem sede em Haia, Holanda, mas poderá funcionar em outro local sempre que entender conveniente. Seus principais pontos podem assim ser resumidos: Órgãos internos: O TPI tem em sua composição 04 órgãos internos: Presidência, integrada por três juízes, que faz a administração e gestão do TPI; Câmaras, dividas em Câmara de Questões Preliminares (admissibilidade dos processos), Câmara de 1ª Instância (julgamento) e Câmara de 2ª Instância (apreciação dos recursos) Promotoria, órgão autônomo, competente para receber as denúncias, examiná-las, investigá-las e propor ação penal junto ao Tribunal; Secretaria, para questões administrativas internas. Juízes: 44 Com o término da 2ª Guerra Mundial, a opinião pública tomou ciência das atrocidades cometidas pelo Japão, na China, e pela Alemanha, contra judeus, ciganos, negros e outras minorias, criando, assim, um clima favorável ao julgamento dos responsáveis. Por isso houve criação dos Tribunais Militares Internacionais de Nuremberg e Tóquio. O Tribunal de Nuremberg julgou o destino dos principais dirigentes do partido nazista, e foi subscrito pelas grandes potências mundiais da época (Aliados e mais a França), além de outros 19 Estados. O Estatuto do Tribunal de Nuremberg, aprovado em 06.08.1945, previu uma Corte quadripartite, uma vez que cada país aliado deveria enviar um juiz titular e um suplente, com presidência rotativa entre eles. a Acusação foi feita pelo Ministério Público e a defesa se deu por algumas personalidades do Direito na Alemanha. O Tribunal de Tóquio foi previsto já na Declaração do Cairo, em 1º de janeiro de 1943, no decorrer da Guerra, pelos representantes dos EUA, Grã-Bretanha e China, com intenção de revidar as agressões japonesas e punir os criminosos, em especial contra as crueldades contra os prisioneiros. Com a rendição do Japão em 02.09.1945, foram estipulados procedimentos, o tratamento e a detenção de suspeitos, com recomendação da ONU para criação do Tribunal, que ocorreu em 19.01.1946, com estatuto semelhante ao Tribunal de Nuremberg, com julgamentos que duraram mais de 03 anos, envoltos em grandes polêmicas no sentido de sua parcialidade, vingança dos vencedores e retaliação ao ataque japonês em Pearl Harbor (o Tribunal de Nuremberg não condenou soltados americanos e ingleses por crimes de guerra, mesmo diante de provas semelhantes contra os alemães, além de desconsiderar o bombardeio atômico dos EUA em Hiroshima e Nagasaki). Apesar de todas as polêmicas, estes Tribunais abandonaram a doutrina da imunidade dos atos estatais e a doutrina da “responsabilidade superior (“respondeat superior”), no sentido de que não poderia haver responsabilidade porque as ordens superiores deveriam ser seguidas rigidamente, encerrando-se, assim, a fase de total impunidade de governantes criminosos. Nesse sentido: José Cretella Neto, Curso de Direito Internacional Penal. RS, Ed. Unijuí, 2008. p. 114-115. 45 No início da década de 1990, o Conselho de Segurança da ONU deliberou, com voto favorável do Brasil, pela criação de outros dois Tribunais Internacionais: da Ex-Iugoslávia (Resolução da ONU n. 827, de 25.05.1993), instalado na Holanda, para julgar as atrocidades praticadas em seu território, e de Ruanda (Resolução da ONU n. 955, de 09.11.1994), instalado na Tanzânia, para julgar os graves crimes cometido naquele país e países vizinhos. Diferentemente dos Tribunais de Nuremberg e Tóquio, nitidamente criados sob forte influência dos “vencedores” da Guerra, os Tribunais da Ex-Iugoslávia e Ruanda não tiveram esta marca, porque criados no âmbito da ONU em período bastante longe da 2ª Guerra Mundial e ainda houve criação de uma Câmara de Apelação, em um processo mais justo e imparcial, muito embora com ferimento ao princípio do juiz natural porque criados após os fatos. 46 O Brasil foi visto como um like minded country, porque atuou, junto com os demais países propensos a aceitar o Tribunal, aceitando a jurisdição automática do TPI sobre crimes de genocídio, crimes de guerra e contra a humanidade, a eliminação do veto do Conselho de Segurança e ainda a presença de um promotor independente e afastamento das reservas. Como se verá, o TPI não foi criado com competência para julgar os fatos passados. Tem 18 juízes, escolhidos pela Assembleia Geral da ONU, para representação dos principais sistemas judiciais do mundo. Eles devem possuir os seguintes requisitos: a) Pessoas com elevada consideração moral, imparcialidade e integridade; b) Domínio de uma das línguas oficiais da Corte (inglês, francês, espanhol, russo e árabe); c) Reconhecida competência em Direito Penal e Processual Penal; d) Experiência como juiz, promotor ou advogado (ou competência em direito internacional humanitário).47 O mandato é de 09 anos Promotoria É de escolha da Assembleia Geral, para mandato de 09 anos, devendo possuir alta idoneidade, experiência na persecução penal e domínio de uma das línguas citadas. O início do processo se dá por representação à Promotoria, por meio dos Estados-partes ou do Conselho de Segurança da ONU, ou ainda de ofício pela própria Promotoria, após analisar denúncias e colher provas. Jurisdição A jurisdição do TPI se dá sobre nacionais que se encontrem no território dos países que ratificaram o Estatuto de Roma (ou nos navios e aviões das bandeiras dos respectivos países), desde que maiores de 18 anos. O julgamento não pode ser à revelia e restringe-se ao julgamento dos chamados “crimes de lesa humanidade”: a) Genocídio48: intenção de destruir grupo nacional, étnico, racial ou religioso; b) Contra a Humanidade: ataque generalizado ou sistemático contra população civil, como homicídios, extermínios, escravidão, tortura, agressão sexual, prostituição e gravidez forçadas, desaparecimento forçado de pessoas, apartheid; c) Crimes de Guerra: violação da Convenção de Genebra de 1949, em especial quando cometidos como parte integrante de um planto ou de uma política ou como parte de uma prática em larga escala desse tipo de crimes (guerra sem quartel; morte ou ferimento dos adversários rendidos; uso de armas ou métodos que causem danos supérfluos ou sofrimentos desnecessários; uso de gases asfixiantes ou armas tóxicas; emprego de escudos humanos; morte de civis por inanição; organização de tribunais de exceção; recrutamento de crianças menores de 15 anos; tortura e tratamentos desumanos; deportação ou transferências ilegais, homicídio, tortura, tomada de reféns e outros relacionados no art. 8º do ER); d) Crime de Agressão (em relação ao crime de agressão, o Estatuto de Roma não o definiu, e previu que isto ocorreria após 07 anos de sua entrada em vigor, mas até o presente momento isto não ocorreu). A previsão apenas destes crimes demonstra a adoção do direito penal mínimo, em especial quanto ao TPI, que só pode interferir nos bens jurídicos penais mais importantes que afetam toda a humanidade. Penas aplicáveis As penas aplicáveis são de reclusão, de até 30 anos, prisão perpétua e confisco de bens Princípios fundamentais a) Princípio da complementariedade: o TPI atua quando o Estado-Parte não inicia o processo ou não tem condições de julgar e investigar com isenção, ou ainda quando a pessoa já foi julgada49 47 Entre 2003 e 2010, juíza brasileira Sylvia Steiner atuou no TPI. “No que toca ao crime de genocídio, o Estatuto acolheu a mesma definição estipulada pelo artigo 2º da Convenção para a Prevenção e Repressão do Genocídio adotada pelas Nações Unidas em 09 de dezembro de 1948, e ratificada pelo Brasil em 4 de setembro de 1951. Costumava-se diferenciar o crime de genocídio dos crimes contra a humanidade, pois estes últimos estavam restritos aos períodos de guerra. Com a ampliação do conceito de crimes contra a humanidade também para períodos de paz, o crime de genocídio passou a ser considerado a mais grave espécie de crime contra a humanidade. O fator distintivo do crie de genocídio perante outros crimes é encontrado em seu dolo específico, concernente ao ‘intuito de destruir, total ou parcialmente, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso. A destruição pode ser física ou cultural” (Piovesan, cit., p. 227). Perceba, por exemplo, que se determinada pessoa cometer assassinato contra todos os índios restantes de determinada etnia, para extinção da mesma, estará cometendo o genocídio (neste sentido, lembre-se que em Goiás, no Município de Minaçu, seis remanescentes índios da etnia Avá-Canoeiro persistem reunidos em determinado local). 49 Como se viu, para o julgamento pela Corte Interamericana, dos Estados-Partes da Convenção Americana, é preciso o exaurimento dos recursos internos. Para o julgamento do TPI, não há esta exigência, não podendo o princípio da complementaridade ser confundido com esta situação. 48 (neste caso, pode ser feita comparação com a subsidiariedade para fins de deslocamento de competência para a Justiça Federal dos crimes com violação de direitos humanos, do art.109, V-A e seu §5º, da CF/88). Por isso, existe a regra da publicidade, porque o TPI deve notificar o Estado-Parte que tem jurisdição sobre o acusado, sempre que iniciar as investigações, para que se manifeste sobre o exercício da sua jurisdição, podendo este Estado impugnar, por uma única vez e na primeira oportunidade que tiver, a jurisdição do TPI; b) Princípio da universalidade: Estados-partes não podem subtrair a jurisdição do TPI, ou parte dela; c) Princípio da responsabilidade penal individual: Indivíduos é que respondem (a responsabilização dos Estados pode ocorrer no Tribunal Internacional de Justiça); d) Princípio da irrelevância da função oficial: possibilidade de punição a Chefes de Estado ou de Governo, Ministro, Parlamentares e qualquer autoridade; e) Princípio da responsabilidade dos comandantes e outros superiores: chefes militares respondem, mesmo não estando presentes (devem envidar esforços para evitar os crimes); f) Princípio da imprescritibilidade: não há extinção da punibilidade pela prescrição. Porém, a jurisdição do TPI só para delitos posteriores à sua vigência (2002); g) Princípio da anterioridade: o TPI não julga os crimes ocorridos antes da sua entrada em vigor. No entanto, o Estatuto de Roma permitiu que os países o ratificassem sem aceitar sua jurisdição por um período de 07 anos depois de entrar em vigor, quanto aos eventuais crimes de guerra cometidos por seus nacionais ou em seu território (a França, por exemplo, se utilizou desta possibilidade); h) Princípio da territorialidade: o TPI só pode julgar crimes cometidos nos territórios dos Estados que ratificaram o Estatuto. Assim, se determinado nacional é de Estado que não ratificou o Estatuto e nem tenha aceitado a jurisdição do TPI, ainda assim poderá ser julgado pelo mesmo, já que o crime praticado foi no território dos países signatários; i) Princípio da cooperação: o TPI não tem poder de polícia para fazer buscas e prisões, dependendo da cooperação dos Estados-partes envolvidos. Assim, estes devem cooperar totalmente para a investigação e o processamento, inclusive entrega de pessoas, prisões preventivas, produção de provas, execução de buscas e apreensões e proteção de testemunhas Principais polêmicas As principais polêmicas jurídicas do TPI envolvem a incompatibilidade de algumas normas com a Constituição de 1988: a) prisão perpétua. O art. 77, 1, “b” do Estatuto de Roma, prevê que: “Sem prejuízo do disposto no artigo 110, o Tribunal pode impor à pessoa condenada por um dos crimes previstos no artigo 5o do presente Estatuto uma das seguintes penas: b) Pena de prisão perpétua, se o elevado grau de ilicitude do fato e as condições pessoais do condenado o justificarem”. A Constituição brasileira de 1988, no art. 5º, XLVII, “b”, prevê que “não haverá penas: de caráter perpétuo”. Desta forma, a primeira incongruência contra o Estatuto de Roma seria esta incompatibilidade com a Lei Fundamental brasileira; b) imprescritibilidade. O artigo 29 do Estatuto de Roma diz que “Os crimes da competência do Tribunal não prescrevem”. O art. 5º, XLII e XLIV diz que: “a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”; “constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático”. Portanto, não haveria como o Estatuto de Roma impor a imprescritibilidade; c) tipicidade. O art. 5º, XXXIX, da CF/88, diz que “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”, instituindo o princípio da tipicidade, mas o Estatuto prevê de forma vazia os crimes de lesa humanidade, sem definição dos seus elementos, o que seria impossível por não transbordar nenhuma garantia mínima ao acusado; d) entrega. O art. 58, 5, do Estatuto, prevê que “Com base no mandado de detenção, o Tribunal poderá solicitar a prisão preventiva ou a detenção e entrega da pessoa em conformidade com o disposto na Parte IX do presente Estatuto”. O art. 59, 1, ratifica: “O Estado Parte que receber um pedido de prisão preventiva ou de detenção e entrega, adotará imediatamente as medidas necessárias para proceder à detenção, em conformidade com o respectivo direito interno e com o disposto na Parte IX”. Finalmente, o art. 89, 1: “O Tribunal poderá dirigir um pedido de detenção e entrega de uma pessoa, instruído com os documentos comprovativos referidos no artigo 91, a qualquer Estado em cujo território essa pessoa se possa encontrar, e solicitar a cooperação desse Estado na detenção e entrega da pessoa em causa. Os Estados Partes darão satisfação aos pedidos de detenção e de entrega em conformidade com o presente Capítulo e com os procedimentos previstos nos respectivos direitos internos”. No entanto, a CF/88, no art. 5º, LI, diz que “nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei”. Assim, como um brasileiro poderia ser entregue ao TPI, se há proibição de extradição? e) imunidades. O art. 27 do ER prevê a total irrelevância da qualidade oficial do suposto acusado, mesmo sendo Chefe de Estado ou de Governo, não podendo se eximir da responsabilidade criminal e nem pode ser motivo de redução da pena. Porém, a CF/88, com base na soberania, cria um regime de imunidades, em especial aquelas referentes às imunidades formais e materiais dos parlamentares (art. 53 e parágrafos) e a imunidade especial do Presidente (art. 86 e parágrafos). Como poderia um parlamentar brasileiro ser processado e julgado, por exemplo, com violação da inviolabilidade material ou ainda desconsiderando as fórmulas processuais constitucionais? 50 Estas polêmicas são alimentadas pelos seguintes argumentos favoráveis e contrários à constitucionalidade do Estatuto de Roma. Argumentos favoráveis à constitucionalidade: a) O Estatuto de Roma adota regras já incluídas em outros Tratados já ratificados pelo Brasil, como as Convenções de Genebra e seus protocolos de 1977, Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, Convenção contra Tortura e outros tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, Convenção de Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio, Convenção pela Eliminação de Todas as formas de Discriminação Racial, Convenção pela Eliminação de Todas as formas de Discriminação contra a Mulher, Convenção Americana de Direitos Humanos, Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura e a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; b) Extradição é diferente de Entrega, porque esta se dá entre país soberano e organismo internacional, e aquele se dá entre países soberanos, de modo que não há proibição de entrega na CF/88. Ademais, a Lei 6.815/80 (Estatuto do Estrangeiro) prevê a comutação da pena para privativa de liberdade, para fins de extradição, apenas quando há previsão de morte ou de castigo corporal, nada se referindo à prisão perpétua, e o STF permite a extradição mesmo quando no país de origem há prisão perpétua, mesmo sem comutação; 50 Apenas a título de exemplo, imagine-se o TPI iniciar investigação contra um parlamentar brasileiro, porque ele teria participação, mediante incitação após emitir opinião na tribuna do Senado ou da Câmara, em algum genocídio ou em algum crime, dentre tantos, previstos no Estatuto de Roma ou na Convenção de Genebra? c) a EC 45/04 ratificou os termos do Decreto 4.388/02, submetendo o Brasil ao TPI, deixando clara sua intenção, até porque já conhecia seus termos; d) é preciso utilizar a mutação constitucional para adaptar os termos constitucionais aos novos temos, à nova realidade, e não seria crível que uma interpretação afastada do que acontece no mundo pudesse ser aceita, especialmente para fins de proteção dos direitos humanos; e) a CF/88 expressamente protege a dignidade humana (art.1º, III), e esta vontade constitucional vem ao encontro das previsões do Estatuto de Roma, todo ele construído com base na proteção e prevenção de riscos à dignidade humana; f) necessário fazer uma interpretação sistemática do art. 5º, que prevê regras sobre prescrição, extradição, tipicidade e prisão perpétua, com o art. 5º, §4º e com art. 7º, ADCT, ponderando-se os valores em jogo; g) o Estatuto de Roma não impõe aos Estados-Partes que adotem, internamente, a prisão perpétua, a imprescritibilidade dos crimes ou outro tema de direito material incompatível com as constituições respectivas; h) o ER prevê os princípios do nullum crimen sine lege, nulla poena sine lege e da não retroatividade personae, em seus arts. 22-151 e 2352, razão porque não cabe alegar que há ferimento ao princípio constitucional brasileiro da tipicidade penal, ou da reserva legal, e ainda prevê os chamados “elementos constitutivos dos crimes”, circunstâncias que auxiliam na interpretação e aplicação dos crimes; Por outro lado, existem argumentos contrários à constitucionalidade, que podem assim ser resumidos: a) o Decreto 4.388/02, que promulgou o Estatuto, é anterior à EC 45/04, de modo que somente poderia ser aceita tal promulgação, e, com se sabe, a constitucionalidade se analisa com base no texto constitucional vigente à época da norma atacada, quando não havia previsão de submissão ao TPI; b) o Estatuto de Roma não foi ratificado como as emendas constitucionais, de modo que tem, no máximo, natureza supralegal, não se contrapondo às normas constitucionais originárias do Brasil; c) a interpretação deve ser favorável aos direitos individuais, e a submissão de nacionais ao TPI é francamente desfavorável; d) as proibições do art. 5º faz parte dos “limites dos limites”, de modo que são núcleos essenciais que não podem ser feridos nem mesmo por tratados internacionais; e) o art. 5º, da CF/88, se insere nas cláusulas pétreas, imune até mesmo ao poder constituinte reformador, quanto mais ao legislador supralegal; f) na França e na Bélgica, houve declaração de inconstitucionalidade de estatutos internacionais aprovados antes das reformas constitucionais, daí porque ocorreram reformas constitucionais na França, na Alemanha, em Portugal e em Luxemburgo justamente para se adaptar ao TPI, o que não ocorreu no Brasil; É possível afirmar que, a par dos argumentos contrários, a maioria doutrinária entende constitucional e legítimo os termos do Estatuto de Roma, não só pelos argumentos acima, mas especialmente porque ele representou e representa um fator primordial para o desenvolvimento da justiça penal universal. Está claro que, depois da sua criação, a preocupação com os direitos humanos aumentou e os próprios ditadores, antes totalmente imunes à responsabilidade penal, já se incomodam com a presença Art. 22-1: “Nullum crimen sine lege: Nenhuma pessoa será considerada criminalmente responsável, nos termos do presente Estatuto, a menos que a sua conduta constitua, no momento em que tiver lugar, um crime da competência do Tribunal.” 52 Artigo 23: “Nulla poena sine lege: Qualquer pessoa condenada pelo Tribunal só poderá ser punida em conformidade com as disposições do presente Estatuto”. 51 do Tribunal Penal Internacional. Ademais, o ritmo de sua implantação não pode sofrer solução de continuidade, porque em todas as constituições modernas, há uma preocupação com os direitos fundamentais das pessoas, controle do poder estatal, adaptação à justiça penal universal e mecanismos de punição de crimes contra a humanidade. Questões de concurso 13) Prova: TRF - 4ª REGIÃO - 2010 - TRF - 4ª REGIÃO - Juiz Federal Dadas as assertivas abaixo, assinale a alternativa correta. I. O Tribunal Penal Internacional, com sede em Haia, criado pelo Estatuto de Roma, tem competência para os crimes mais graves que afetam a comunidade internacional no seu conjunto e abrange os crimes de genocídio, os crimes contra a humanidade, os crimes de guerra, os crimes de agressão e os crimes de tráfico internacional de drogas que afetem mais de 2 (dois) países. II. Para a competência do Tribunal Penal Internacional, é considerado como crime de “genocídio”, qualquer ato praticado com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo religioso enquanto tal, por meio de transferência à força de crianças do grupo para outro grupo. III. São consideradas línguas oficiais do Tribunal Penal Internacional somente o inglês e o francês. IV. São consideradas como línguas de trabalho do Tribunal Penal Internacional o árabe, o chinês, o espanhol e o russo, sendo que o regulamento processual pode também definir os casos em que outras línguas oficiais podem ser usadas como língua de trabalho. V. O Tribunal Penal Internacional poderá funcionar em outro local sempre que entender conveniente. a) Estão corretas apenas as assertivas I e II b) Estão corretas apenas as assertivas I e III. c) Estão corretas apenas as assertivas II e V d) Estão corretas apenas as assertivas III e IV e) Estão corretas apenas as assertivas III e V. “c” 14) Prova: MPT - 2013 - MPT - Procurador Considerando-se o Sistema Internacional de Proteção aos Direitos Humanos e o Estatuto do Tribunal Penal Internacional, é CORRETO afirmar que: a) O indivíduo singularmente considerado não é sujeito internacional de direitos humanos, uma vez que não é destinatário direto de direitos, obrigações e deveres na esfera internacional. b) O Tribunal Penal Internacional é uma instituição permanente, com jurisdição universal sobre Estados, nações, pessoas, coletividades, organizações estatais e não- estatais e demais autores ou vítimas de atentados contra os direitos humanos em relação aos crimes graves que prescreve o seu respectivo estatuto. c) A escravidão, a agressão sexual, a escravatura sexual, a prostituição forçada e o crime de apartheid são expressamente previstos como crimes contra a humanidade no referido Estatuto. d) O Tribunal Penal Internacional possui ampla competência ratione materiae (em razão da matéria) para os crimes que afetam a comunidade internacional em seu conjunto e) Não respondida Gabarito das questões: 01-A; 02-D; 03-B; 04-“ERRADO”;05-D;06-D; 07-E;08-D; 09-B; 10-C; 11-B; 12-“CERTO”; 13C; 14-C