O Poder e a Política nas Organizações Há uma tendência

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O Poder e a Política nas Organizações
Há uma tendência para interpretar a empresa em termos racionais, mas muitos
observadores já perceberam que as personalidades e a política exercem nela um
papel decisivo. A empresa é uma estrutura política, ou seja, ela só funciona
enquanto distribui autoridade (poder de mandar e influenciar) e enquanto é um
palco para o exercício do poder. Isso explica por que pessoas altamente
motivadas para buscar e usar o poder encontram nas organizações um ambiente
hospitaleiro e familiar.
A atração pelo poder começa na infância quando a criança, ao experimentar fome
e outros desconfortos corporais, tem o seu medo primitivo de ser dominada por
essas experiências mitigado pela presença materna. A experiência cíclica (fome,
desconforto, mãe, segurança, novamente fome, etc.) constitui a base da confiança
em si mesma e do que se chama de segurança ontológica. Isso lhe dá capacidade
para suportar demoras cada vez maiores nesse ciclo. Os distúrbios psicológicos, o
eu fragmentado, a ansiedade ocorre quando, num ambiente turbulento, a privação
é constante. O indivíduo procura peitar de diversos modos a ansiedade causada
pela privação de segurança: os mecanismos de defesa: o bem descritos por Ana
Freud, o recurso às drogas e ao álcool, as perversões sexuais, o uso do sexo
como droga e o uso do poder como droga. O poder é para alguns um
compensador de ansiedade ou um instrumento de identificação própria. Atribui-se
a Kissinger a frase: “O poder é maior dos afrodisíacos”.
O poder é conseguido ou pela tomada do mesmo ou pela entrega passiva. O
conformismo político debaixo do fascismo é um exemplo do uso do poder como
droga.
As organizações são, pois, estruturas políticas que oferecem uma base de poder
para as pessoas. A acumulação pessoal do poder se dá através do
desenvolvimento da carreira e dos cargos aonde em cada nível vai sendo
facilitada a afirmação dos interesses de uma pessoa sobre outras.
O fato de o poder ser escasso faz com que ele seja distribuído ás custas dos
outros. As formas de poder na empresa são a parcela de capital de giro que a
área executiva absorve, a alocação dos investimentos, os produtos nobres, o
número ou importância de pessoas subordinadas, o espaço territorial de cada
domínio. Quanto mais se sobe na organização menos cargos existem e mais
pessoas são forçadas para fora, ou seja, o poder pressupõe escassez e
competição.
Quando uma pessoa é denominada superior de outras, ela passa a ser objeto de
poder. Apesar de a nomeação vir de cima, a afirmação e o apoio vêm de baixo.
Um superior representa um grupo de subordinados e, portanto, um grupo de
interesses. Os subordinados confirmam e apoiam seu chefe ou podem retirar o
apoio. O apoio representa um compromisso do superior, como na política
partidária: “O que você fez por mim ultimamente? ”. A única diferença entre a
política de partido e a política de partido e a política organizacional é a sutileza do
procedimento de votação.
Algum tempo após entrar numa organização percebe-se que ela é um sistema
bancário de poder. A “capitalização” do poder começa com o patrimônio que o
executivo leva para a empresa: A quantidade de autoridade formal de que é
inicialmente investido, a sua reputação profissional, a sua “expertise” e a atração
de sua personalidade.
Em seguida o indivíduo avalia o quanto é o seu “capital” e passa a jogar, isto é, a
assumir riscos para ganhar mais poder sobre os outros. Como a sua entrada
provocou um desequilíbrio no balanço de poder até então existente, ele precisa
consolidar o seu capital de estima através de resultados. Se falhar, produzirá uma
erosão de confiança, se acertar terá consolidado o seu “capital” inicial. Nesta fase
o executivo recém-ingresso não dá a impressão, nem está consciente talvez, de
ser um concorrente ao poder; pelo contrário, ele transmite a imagem de um
profissional desinteressado e apolítico, puramente um “técnico”.
Periodicamente a empresa passa por fases históricas que são ligadas a períodos
na vida dos dirigentes (mandatos) ou à sucessão de dirigentes. Essas fases são
iniciadas por um período de reorganização que pode levar 2 a 3 anos, quando
todas as premissas e políticas são questionadas e uma “nova ordem” é
instaurada. A estrutura de organização que resulta desse replanejamento
implementa uma coalizão entre um executivo principal e o grupo de colaboradores
de que se cercou. Essa coalizão é o acordo sobre uma forma de distribuir o poder
e a consolidação do poder em torno de uma figura central para a qual os outros
executivos principais prestam juramento de fidelidade.
Essa coalizão pode ser tácita ou latente, mas não aparece nos documentos
formais. Nenhum manual de organização, nenhuma circular interna a mencionará.
Dentro da empresa se estabelecerá uma cortina de silêncio oficial em torno do
assunto. Não é só o tabu, mas é deselegante falar em coalizão de poder dentro de
uma organização. Essa coalizão logo estabelecerá um novo conjunto de objetivos,
estratégias e políticas que não são nada mais do que uma racionalização para
legitimar e tornar credíveis as mudanças de poder que tiveram um significado mais
profundo para as pessoas envolvidas. A coalizão atendeu aos interesses dos
protagonistas e agora busca uma legitimação política.
Em cada empresa as coalizões diferem, mas todas elas são essenciais para o
bom andamento da organização. O fracasso em estabelecer uma coalizão, ou
resulta na paralisia das decisões, ou em rivalidades abertas entre os executivos
principais. Esse malogro pode levar a firma ao desastre. Eis por que a coalizão
política em torno de uma figura central é tão importante para o sucesso da
empresa.
Quando uma coalizão malogra, deve-se procurar causa na figura do executivo
principal. Ao lidar com seus colaboradores mais chegados, as defesas
psicológicas representam à sua maneira de aliviar a tensão.
Toda pessoa procura evitar objetos perturbadores ou estados de ansiedade
através de:
a) racionalização ou busca de justificativas idealizadas;
b) projeção, ou julgamento irreal das outras pessoas atribuindo-lhes intenções
malignas;
c) repressão ou repúdio a ideias molestas;
d) compensação ou busca de atividades substitutivas;
e) fuga ou devaneio para evitar a ansiedade;
f) regressão ou refúgio no comportamento infantil, e g) agressão ou tentativa de
destruir os objetos supostamente nocivos.
Os executivos principais têm demonstrado diversas manobras defensivas. Num
momento procuram apoiar-se numa consultoria externa de renome para dar
legitimidade a certas situações internas. Noutro momento desenvolvem
pensamentos paranoides projetando em outras as suas fantasias de perseguição.
Numa situação o isolamento presidencial passa a ser um mecanismo de
repressão ou fuga dos estados de ansiedade.
O planejamento organizacional e a reorganização da empresa são muito
vulneráveis ao pensamento paranoide porque estimulam comparações, evocam
nas pessoas antecipação de maior poder ou medo de perder o controle da
situação.
O malogro da situação retorna à fase das guerras intestinas pelo poder. Um dos
episódios críticos dessa fase é o parricídio. Os subordinados, agindo sob fantasias
de poder, conseguem o afastamento do superior. Essa “revolta palaciana” leva a
uma nova fase onde, ou um estranho herda o poder, ou um colegiado assume a
custódia até que uma nova disputa levará à afirmação de um sobre os demais.
Normalmente as “revoltas palacianas” engolem os seus próprios formadores.
Os executivos principais não percebem o quanto as fantasias dos seus
colaboradores são importantes para a sustentação da coalizão. O executivo
principal é um “objeto” das outras pessoas, ou seja, ele é o recebedor de fortes
apegos emocionais dos outros. O seu destino como objeto é governado por
emoções poderosas. Os seus associados têm para com ele uma mistura de
sentimentos positivos e negativos, que incluem: afeto, ódio, inveja, ciúme,
admiração, repúdio e carência afetiva. O executivo principal representa a figura
paterna, isto é, como objeto central no núcleo de uma estrutura política, cujo
protótipo é a família.
Neste breve ensaio empreendo uma interpretação das organizações onde, em vez
da abordagem da teoria administrativa, lancei mão da política e da psicanálise. A
fronteira entre as duas ciências é um terreno fértil para a germinação de ideias nas
empresas.
A análise do poder e da decisão tem usado os modelos da teoria de jogos, do
comportamento organizacional e dos imperativos burocrática. Weber, Merton,
Simon e Lasswell, entre outros, forneceram esquemas de grande valor explicativo,
mas que hoje estão exauridos.
As organizações operam como estruturas políticas, onde a autoridade, em vez de
ser um meio para a alocação racional de recursos, se torna uma mercadoria
escassa, pela qual os indivíduos lutam. Os abusos de poder tornam-se sutis e
cruéis. O poder corrompe. O poder, que envolve todo o caráter, corrompe todo o
caráter.
Os antigos gregos criaram o termo Hubris para representar a falha que resulta da
arrogância do poder, quando se perde a noção dos limites do conhecimento e
quando começam a ser cometidos erros por falta de um sábio limite ao uso da
autoridade. A partir dessa hubris começam os atos falhos que vão desencadear a
tragédia.
O distúrbio do poder começa muito cedo - na primeira infância - quando um incerto
sentido de identidade pessoal e distúrbios de personalidade ligados ao
relacionamento paterno e materno levam à fragmentação de autoimagem. Esta
fragmentação do eu deforma a busca do poder, porque através dele o indivíduo
procura atingir a unidade do seu eu, ou pelo menos evitar maior fragmentação.
Para estes, o poder não é mais um instrumento de realização social e econômica,
mas um instrumento de salvação neurótica.
“Um dos dramas fascinantes da história da administração é a vida de Henry Ford.
Desde o desenvolvimento do Modelo T e da linha de montagem, Ford estava
determinado a buscar o controle completo da fabricação e da venda de seu carro.
Havia uma estranha qualidade nas relações humanas de Ford. Compare por
exemplo, o seu apego a Harry Bennett e o seu relacionamento com seu filho
Edsel. Bennett veio de um ambiente sombrio em Detroit, associado com
gângsteres e bandidos. Em contraste, Edsel era um homem sensível, bemeducado e avesso ao uso de táticas agressivas no trato com outras pessoas.
Bennett tomou a dianteira nas atividades fura-greves e no encorajar espionagem
sobre funcionários remotamente suspeitos de deslealdade a Ford. Este último
desenvolveu uma relação muito chegada a Bennet e rejeitou e humilhou seu
próprio filho. Quando a companhia Ford se encontrou em dificuldades, devido a
organização antiquada, Edsel tentou remediar a situação propondo novos
métodos. Ford rejeitou cruelmente a ajuda de seu filho Edsel e se aproximou ainda
mais de Bennett, cujo conselho apenas alimentou os pensamentos paranoico e as
desconfianças de Ford. ”
O autor conclui que esse bizarro e autodestruidor apego a Bennett era apenas
parte da compulsão em se defender contra objetos inconscientes representados
no eu. Ford não conseguiu resolver o seu relacionamento com seu pai, que ele
odiava. Ele dividiu a sua percepção dos pais, do mesmo modo como dividiu a sua
percepção de seus subordinados. Ele aceitou Bennett, como o seu lado odioso,
agressivo e duro, o que lhe permitiu controlar a ansiedade. Edsel Ford, que
representava a imagem de um bom filho, tinha de ser rejeitado e tratado
duramente, porque esse eu terno e amável refletia o próprio desejo de Ford de ter
um relacionamento mais estreito com o seu pai, o que ele temia.
A partir dessa proposição o autor passa a analisar o poder e a política nas
organizações com inúmeros casos onde estão envolvidos: problemas de
remuneração de executivos, aquisição de empresas, alocação de capital,
planejamento e organização empresarial. Só nos EUA é possível se ver exemplos
de empresas com o nome real dos empresários envolvidos em casos discutidos
publicamente.
Um exemplo da expulsão da figura paterna foi o que aconteceu com Marion
Harper: em novembro de 1967, os diretores do grupo Interpublic, uma grande
empresa no setor de publicidade e relações públicas, exigiram a demissão do líder
e do executivo principal, Marion Harper. Num período de 18 anos, Harper tinha
construído o maior conglomerado de serviços de marketing, publicidade e
informações a partir de uma carreira bem-sucedida na McCann-Erickson. A partir
dessa base, Harper fez aquisições, começou novas empresas e alargou sua órbita
até o nível internacional. Como frequentemente ocorre, a pessoa inovadora e
criativa se descuida de controlar o que construiu e assim os problemas financeiros
tornam-se evidentes. No caso de Harper, ele não se mostrou nem disposto nem
capaz de reconhecer a seriedade dos problemas financeiros. Harper mostrou-se
descuidado num outro modo. Em vez de desenvolver uma forte coalizão entre o
seu grupo de executivos, ele se apoiou em laços individuais, nos quais ele
claramente dominava o relacionamento. Se algum de seus executivos o traía,
Harper exilava o réu a das filiais remotas ou o colocava em aposentadoria parcial.
Quando os problemas financeiros se tornaram mais críticos, os executivos
removidos formaram a sua coalizão e procuram reunir os votos necessários para
expulsar o chefe. No tempo seguinte a essa “revolução palaciana”, a coalizão teve
os seus problemas que, se pode assumir, incluíam disputas pelo poder.
Outros episódios críticos incluem situações de suspeitas, ciúmes, e distorções
provocadas por pensamentos paranoicos de perseguição. O ritualismo também é
visto como um distúrbio do poder. A organização torna-se vítimas de rigidez, na
forma de procedimentos e cerimoniais rigorosos, onde se transmite a ilusão dos
problemas resolvidos. Essa abordagem ritualista aparece frequentemente na
minúcia de certas reuniões e convenções e no exame de certos problemas ou
planos. Os rituais são fórmulas mágicas para regular a ansiedade.
Um caso extremo de compulsão apareceu numa empresa onde um presidente
recém-nomeado assumiu a tarefa enorme de mudar de uma abordagem de
marketing tradicional e estagnada para inovações avançadas. A introdução das
mudanças colocou-o em conflito com vice-presidentes que tinha apoio formidável
e estavam bem entrincheirados. Em vez de escolher uma área para as mudanças,
o presidente tentou converter toda a empresa. Instituiu, com a ajuda de
consultores universitários, um método grupal de mudanças, semelhante ao
“treinamento de sensitividade”. Numa ocasião, para salientar a importância de
ouvir e de controlar a raiva, ele pregou fitas adesivas em sua boca, de modo a não
poder falar. Os vice-presidentes viram esse gesto com desprezo e assim o novo
presidente destruiu qualquer esperança que ele pudesse ter quanto à sua
confiança e credibilidade.
A crise da insubordinação é vista no estudo também à luz de uma metodologia
psicanalítica. O caso estudado é a famosa rebelião de MacArthur contra o
presidente Truman.
“O estilo de liderança do empresário projeta o seu persistente sentimento de
insatisfação. Mesmo o sucesso não produz satisfação, pois os temores de ganhos
ilegítimos e de recompensas não merecidas dominam o seu pensamento
inconsciente. Na sua busca de legitimidade e no domínio de suas frustrações
infantis, o empresário sentirá que as realizações são insuficientes. Ele precisa de
apoio social, da estima e da admiração que lhe foram negados tanto tempo, para
compensar os seus sentimentos de rejeição centrados na imagem do pai. Ele é
forçado a realizar suas ideias, e a empresa se torna o meio de atingir a autoestima
que ele deseja. Todavia, a materialização de suas ideias também é uma
proposição arriscada; o sucesso pode induzir à culpa que se origina de
sentimentos ambivalentes sobre a rejeição paterna. ”
“O conflito entre a realidade e a fantasia, a relação entre o mundo interior e o
exterior são a infraestrutura da formação do caráter. Quando é muito súbita a
saída, como é frequentemente o caso dos líderes institucionais, a atenção à
realidade é acompanhada de uma falta de confiança, o sentimento desagradável
de ser observado. O observador oculto é nada mais ou menos que a fantasia
inconsciente e ou dividido, que foi isolado e reprimido. Então uma ilusão toma
lugar: o pensamento dessa pessoa pode parecer realístico, sua atenção para ser
bem direcionada e sua solução de problemas eminentemente racional. Essa ilusão
é perigosa porque o líder está enfrentando o mundo real com uma atitude que,
apesar da aura de assertividade e autoconfiança, é defensiva. ”
“O problema de liderança é que o método institucional de selecionar e treinar
líderes perpetua o eu isolado. A antiga riqueza cultural para aprofundamento da
experiência pessoal foi depauperada pela programação do poder. O objetivo
consciente é atingir metas; o propósito implícito é a conservação do poder. A única
proteção para a autoestima nas circunstâncias em que o julgamento de
competência é tão vago e obscuro é o desligamento e a despersonalização. ”
“A parte do eu que fica atrás, procurando restaurar um estado idealizado, é
antagonista da outra parte do eu que bravamente enfrenta as lutas pelo poder,
agindo como se ela fosse a verdadeira representação pelo indivíduo. Se os reis
precisam ser filósofos, talvez eles possam chegar a sê-lo, redescobrindo a infância
e as delícias da intuição.”
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