“Transtornos Alimentares” Anorexia/Bulimia aspectos Flávia Seidinger 1. Informações sobre o serviço especializado em TA / HC Unicamp 2. Trazer aspectos desta clínica que facilite: IDENTIFICAÇÃO, ACOLHIMENTO, encaminhamento ou ACOMPANHAMENTO Objetivos Ambulatório de Transtornos Alimentares do HC – Unicamp Objetivo Promover pesquisa, assistência e ensino em Anorexia Nervosa, Bulimia Nervosa e Transtorno Alimentar Não Especificado Ambulatório de Transtornos Alimentares do HC – Unicamp • Criado em 2006 • Composto por quadro de profissionais voluntários • Atendimento multidisciplinar aos casos de TA diagnosticados pela equipe, com dificuldades de remissão na rede pública ou privada Composição da equipe - Coordenador (psiquiatra) - 2 psiquiatras na assistência (+ 2R4 e 1R3) - 2 endocrinologistas - [1 nutricionista – vaga ] - 2 psicólogas de orientação comportamental (atendimento em grupos) - 1 psicóloga terapeuta familiar especialista em criança e adolescente (+ aprimorando na área) - 1 psicóloga e psicanalista (atendimentos individuais) - 1 antropóloga (colaboradora) Critérios de Inclusão *IMC < 40 (peso/estatura 2) *Idade mínima: 12 anos *Ambos os sexos *Não estar participando de outro tratamento para transtorno alimentar ou obesidade (psiquiátrico, psicoterápico, nutricional e ou endocrinológico) *Disponibilidade semanal enquanto durar o tratamento *Entre 12 e 18 anos é obrigatória a participação do responsável Critérios de exclusão *Pacientes submetidos ou com indicação de cirurgia bariátrica *Presença de comorbidade psiquiátrica grave que comprometa o engajamento adequado às atividades do serviço *Indicação de internação hospitalar Ambulatório de Transtornos Alimentares do HC – Unicamp Critérios de Interrupção *Três faltas não justificadas consecutivas em qualquer das atividades *Ausência ou presença inadequada da família (adolescentes) Ambulatório de Transtornos Alimentares do HC – Unicamp Funcionamento Horário: Manhãs de terças-feiras Local: Ambulatório de Psiquiatria da Faculdade de Ciências Médicas Hospital das Clínicas da Unicamp FCM - Depto. de Psicologia Médica e Psiquiatria Triagens: pessoalmente com o encaminhamento de profissional da saúde em mãos; ou da mesma forma para agendamento (19) 3521-7514 Desafios e Questões E os casos ? • Atípicos? • Outras formas de apresentação dos sintomas alimentares? • Casos que escapam à descrição dos manuais diagnósticos e não se encaixam nos programas de tratamento de um ambulatório de especialidade? • Podem haver casos em que seja contraindicado estar em grupo que trata de anoréxicas e bulímicas? Introdução Anorexia nervosa e bulimia são conhecidas pelas mais altas taxas de mortalidade dentre os transtornos psiquiátricos. Incluídas na relação da OMS das doenças mentais prioritárias na infância e adolescência. As taxas de abandono do tratamento variam entre 30 e 50% (sendo muito mais elevadas entre as formas atípicas e dentre filhos de pais separados). As (controversas) classificações diagnósticas... Anorexia histérica (Charles Lasègue- França,1873) Anorexia Nervosa (Willian Gull - Inglaterra, 1874) Anorexia Mental (Huchard – França, 1883) Bulimia Nervosa (Gerald Russell, Inglaterra, 1979) Transtornos Alimentares (CID 10/DSMIV): AN, BN (principais entidades mórbidas) + TASOE e TCAP fatores afetivos e neurobiológicos como causa (entre 1937 e 1960)* • • • • • • • • • Aubrimont Babinski Bansi Von Bergmann Carrier Decourt Delay Dubois Falta : : : : : : : : : anorexia psicopática Partenoanorexia delgadez juvenil caquexia psicógena esquizosis caquexia psicoendocrina de la madurez endocrinoneurosis juvenil compulsión neurótica con caquexia anorexia primaria, delgadez endógena *MTTE-LEVY-VALENSI N.M., “Anorexie mentale et image du corps”, Mémoires de CES de Psychiatrie, 1981-1982. apud Raimbault y Eliacheff • Heni • Korbosch • Kretschmer • Kundstadier • • • • • • Kylin Lafora Leichentritt Nicolle Pardee Schottry • Sollier • Soltmann : delgadez primaria psicógena : delgadez como consecuencia de la atrofia aguda gastromucocutánea de las jóvenes : distrofia pubertaria : delgadez hipofisiaria, enfermedad de V. Bergmann : delgadez de la pubertad femenina tardía : anorexia psicógena : neurosis pubertaria : anorexia prepsicótica : caquexia nerviosa : actos instintivos inhabituales en la perturbación del desarrollo : sitiergia : anorexia cerebral y neurosis de nutrición central Transtornos Alimentares Segundo a Classificação do DSM IV: *Anorexia Nervosa (AN) Subtipos: Restritivo e Purgativo *Bulimia Nervosa (BN) Subtipos: Purgativo e Não purgativo *Transtornos Alimentares Sem outra Especificação (TASOE) *Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica (TCAP) (tabela 1- critérios diagnósticos CID 10 e DSMIV) Claudino, AM & Borges MBF: “Critérios diagnósticos para os transtornos alimentares: conceitos em Evolução” in Rev Bras Psiquiatr 2002;24(Supl III):7-12 http://www.scielo.br/pdf/rbp/v24s3/13964.pdf Anorexia Etimologia: do grego orexis (apetite/ desejo) + AN = falta de/ negação) Registros históricos desde a Antigüidade Estatuto de entidade mórbida final séc IX Inúmeras descrições na medicina até o estatuto de TA: Bulimia Etimologia: bous (boi) limos (fome) = “fome de boi” fome excessiva (particularidade da compulsão, geralmente acompanhada de purgação) Há registros bíblicos das práticas de vomitorium, e comportamentos associados em outras descrições médicas anteriores à descrição BN. Critérios diagnósticos gerais* “perda de peso auto-induzida é necessária para o diagnóstico de TA”* Anorexia Bulimia 1. comportamentos visando a perda de peso e sua manutenção abaixo do normal; 2. medo de engordar; 3. distúrbio de imagem corporal e 4. distúrbio endócrino (ex. amenorréia). 1. impulso irresistível de comer excessivamente; 2. evitação dos efeitos “de engordar” da comida pela indução de vômitos e/ou abuso de purgativos, e 3. medo mórbido de engordar. Fonte: Claudino & Borges 2002 mortalidade “Os pacientes portadores de distúrbios alimentares têm um índice de mortalidade 12 vezes maior que o da população normal, da mesma faixa etária, e duas vezes maior do que pacientes portadores de outros transtornos psiquiátricos. A taxa de mortalidade precoce foi de 5%, mas chega a 20% em 20 anos de acompanhamento, principalmente devido a suicídios e doenças cardíacas”. (Oliva e Fagundes, 2001) OMS (site oficial/acesso em junho 2010) • Menção a AN e BN no documento sobre suicídio (2001) p/ uso especialmente de prof. e instituições. • Destaca alta incidência • Referência ao tema na defesa de políticas de saúde intergovernamentais. “Entre 1 e 2% dos jovens adolescentes sofrem de anorexia nervosa ou bulimia nervosa. As jovens anoréxicas sucumbem freqüentemente à depressão e o risco de suicídio é 20 vezes maior que para os jovens em geral.” Epidemiologia: ↑a incidência? Hay et al. (2002) levantamento de artigos entre 1995 e 2002: - ↑↑significativo entre mulheres jovens (1950 a 1992) - incidência mais elevada de BN – 1% em mulheres jovens ocidentais, enquanto que AN em torno de 0,5%. A afirmação recorrente sobre aumento generalizado dos TA nos últimos anos é controversa no meio científico e carece de maior investigação. Hay et al. (2008) na Austrália diminuição da AN (subtipo restritivo) e aumento do TANE, com destaque ao aumento generalizado de comportamentos purgativos, este sim, afirmado por este estudo. Também Keski-Rahkonen (2007) achados consistentes sobre o aumento da prevalência. Tratamento Não existem tratamentos preconizados pelos órgãos oficiais de saúde no Brasil Diretrizes do Practice Guideline for the Treatment of Patients with Eating Disorders , 3ª. ed. 07/2006* http: //www.psych.org/psych_pract/pg/prac_guide.cfm * Para além do “programa comportamental” é reconhecida a eficácia do tratamento individual em psicanálise ou da psicologia transpessoal, sobretudo para Anorexia * assim como é consenso o tratamento da família *multicausalidade reconhecida: Fatores psíquicos, familiares e ambientais Tratamento Consensos: 1) equipe multiprofissional: abordagens: farmacológica nutricional e psicoterápica acompanhamento clínico acompanhamento psiquiátrico abordagem familiar 2) estabelecimento e manutenção de “aliança terapêutica” Aspectos sócio-culturais A anorexia nos tempos atuais não mais se apresenta na série dos sintomas gástricos das histéricas, mas fortemente marcada pela novidade de uma relação com a imagem e sua função na cultura contemporânea, com destaque para a função do corpo. (Costa Pereira, 1998 ; Silva, 2004; Becker et al 2002 e 2005) Percebe-se uma correlação das práticas alimentares e seus desvios com os hábitos de cada época, guardando relação, portanto, com a cultura. (Desde a anorexia santa até a contemporânea) (Weinberg, 2004) Aspectos psicológicos Sigmund Freud Morávia 1856 – Londres 1939 Jacques Lacan Paris, 1901-1981 distorção da imagem corporal; negação dos riscos, medo mórbido de engordar, auto-exigência extrema, imperiosidade, voracidade e obstinação Lacan (várias referências): “anorexia mental” Freud:: "neurose nutricional rechaço do alimento, da paralela à melancolia" fala, do inconsciente, (1895) Caso Emmy Von N: do Outro, do sexo; “excesso de presença Influência: discursos da materna” ciência e capitalismo na subjetividade e o corpo Complicações clínicas • Segundo Assumpção e Cabral (2002): Diversas complicações clínicas graves são decorrentes dos TA em função de: perda de peso e métodos compensatórios: • • • • • • • • • • Metabólicas Hidroeletrolíticas Neurológicas Oftalmológicas Gastrointestinais Renais Bucomaxilares Fâneros Pulmonares Hematológicas ANOREXIA/BULIMIA – na psicanálise • A e B como “toxicomanias do nada” • A e B são dois lados de uma mesma moeda (é comum que as pacientes passem de um quadro a outro durante o tratamento) • não é falta de apetite mas sim “voraz apetite de amor” (Lacan) • forma de inverter a potência na relação com o Outro • desencadeamento na adolescência (momento de convocatória para assumpção das questões sexuais) → diminuição dos caracteres secundários (rechaço à sexualidade, ao Outro, ao inconsciente (alexitimia como efeito?) • Outro materno (invasivo, devorador) / “devastação ou estrago materno”. Não contam com a função do Pai para isso (sem serem, muitas vezes, sujeitos psicóticos) O “Outro materno” na Anorexia • “muita mãe para pouco pai” • constitui um outro que não deixa faltar • não permitem a falta para que se “estabeleça a subjetividade dos filhos” • “confunde os cuidados com o dom do seu amor” • dá a “papinha sufocante” (Lacan) • Como o Outro da sociedade contemporânea (do capitalismo da chamada “sociedade de consumo” – demanda que o indivíduo consuma objetos (asfixiantes; não deixa lugar à falta); A e B da nossa época se coloca na série das patologias do consumo, das adicções... O que tratar? ... Assim, o sujeito anoréxico não teria atingido certo grau de “organização Fenômeno psíquica”. Necessita: perda de peso? - “dar um tratamento” a esta questão; não sai deste engodo se não encontra o [“multicausalida Outro; de reconhecida: - encontrar acolhimento e endereçamento para suas questões, ser “alojado” para Fatores que possa constituir ferramentas para psíquicos, lidar com os impasses da adolescência, familiares e da assumpção de sua sexualidade e de ambientais”] seu lugar no mundo, para poder abrir mão deste recurso (mortífero) que desenvolveu para seu enfrentamento. Para a adesão e permanência no tratamento são apontados como fundamentais: a aliança terapêutica e seu manejo clínico como alvo do tratamento Conclusão de pesquisa de • revisão bibliográfica sobre abandono do tratamento em TA destaque A avaliação do tratamento indicado para cada caso, considerando: avaliação da psicodinâmica interpessoal aspectos familiares o diagnóstico (com pacientes bulímicos as abordagens mais coercitivas são mais toleradas e encontram maior eficácia; ao contrário de anoréxicos, indicadas abordagens mais ‘brandas’). Referências Bibliográficas • Associação Brasileira de Psiquiatria – site oficial Copyright 2005-2008 ABP [acesso em 10 de junho 2010] Disponível em: http://www.abpbrasil.org.br/medicos/clipping/exibClipping/?clipping=109 80 • Assumpção, CL, Cabral, MD. Complicações clínicas da anorexia nervosa e bulimia nervosa. Rev Bras Psiquiatr 2002; 24 (Supl III): 29-33. • Ambulim – Site oficial do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Copyright 2009. [acesso em 09 junho 2010]. Disponível em: http://www.ambulim.org.br/transtornos_alimentares.php • Claudino AM & Borges. Critérios diagnósticos para os transtornos alimentares: conceitos em evolução. Rev Bras Psiquiatr 2002; 24 (Supl III): 7-12. • Cordás TA, Claudino AM. Transtornos alimentares: fundamentos históricos. Rev Bras Psiq. 2002; 24 (Supl III): 3-6. • Hay P. Epidemiologia dos TA: estado atual e desenvolvimentos futuros. Rev Bras Psiq 2002. • Hay, PJ, Mond J, Buttner P, Darby A. Eating disorder behaviors are increasing: findings from two sequential community surveys in South Australia. Plos One 2008; Issue 2 e 1541: 1-5. • Keski-Rahkonen A, Hoek HW, Susser ES, Linna MS, Sihvola E, Raevuori A, et al. Epidemiology and course of anorexia nervosa in the community. Am J Psychiatry. 2007 Aug;164(8):1259-65. • Lasègue, C. Da Anorexia histérica. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, v. 1, n. 3, p. 158-171, set. 1998. • Oliva CAG & Fagundes U. Aspectos clínicos e nutricionais dos Transtornos Alimentares. Psiquiatria na Prática Médica – Órgão Oficial do Centro de Estudos - Departamento de Psiquiatria da UNIFESP/EPM; 34 (2) 2001. [acesso em 09 junho 2010] disponível em: http://www.unifesp.br/dpsiq/polbr/ppm/atu1_06.htm • Organização Mundial de Saúde. Genebra, 2001: Instrumento da OMS para prevenção do Suicídio. [acesso em 09 de junho 2010]. Copyright WHO 2010. Disponível em: http://www.who.int/mental_health/media/en/63.pdf. • Organização Mundial de Saúde (WHO) E. Mental health of children and adolescents: Facing the challenges and finding solutions. Geneva: World Health Organization Regional Office for Europe; 2005. (19) 3384-3673 9114-9259 [email protected] Equipe Ada Letícia Murro - médica endocrinologista (mestre FCM) Ana Luísa Marques Traballi - médica psiquiatra Anna Beatriz R. F. Sampaio - psicóloga aprimoranda criança e adolescente Bruna A. A. Ximenez Pereira – médica psiquiatra (residente) Celso Garcia Jr. – médico psiquiatra (doutorando FCM) Daniela Araújo – antropóloga (doutoranda IFICH) Flávia Machado Seidinger – psicanalista (mestranda FCM) Luciana Garcia – psicóloga Fátima T. Munhoz D´Ottaviano – médica psiquiatra Maria Marta M. Battistoni - psicóloga (Profa. Doutora FCM) Marisa F .Fabri Mauro – psicóloga (Doutora FCM) Olímpia Ferreira Galvão Araújo – médica endocrinologista Rafaella Oliveira de Almeida – médica psiquiatra (residente)