O Esporte como Agente Transformador do Cidadão Carioca e seu Espaço Cotidiano Felipe Andrade Vilela e Silva Graduando do curso de Geografia – Pontifícia Universidade do Rio de Janeiro [email protected] INTRODUÇÃO O debate acerca do esporte vem sendo feito ao longo da história, sendo encaminhado de acordo com as grandes mudanças que o próprio esporte sofreu desde o início de sua prática até os dias de hoje. Os jogos gregos da antiguidade representavam bastante para aquela sociedade, sendo parte do ritual de honraria a Zeus e tendo o poder de interromper guerras entre cidades que, naquele período, passariam a confrontar suas forças por meio de seus representantes nos Jogos Olímpicos. As mulheres eram cerceadas de participar, ou mesmo, assistir as disputadas, que eram tão violentas e exigiam tanto do vigor físico do homem, que o vencedor era elevado ao status de herói. No entanto, o esporte, mais próximo do que conhecemos hoje, seria uma invenção capitalista datada do século XVIII, permeado pelos princípios da competição. Os primeiros processos de industrialização em países, como a Inglaterra, traziam a demanda pelo dinamismo, força e resistência da força de trabalho, que usava seus corpos para atender as necessidades de maior produção em curto espaço de tempo. Visto como fenômeno tipicamente moderno, as atividades esportivas foram sendo articuladas às mais diversas dimensões: sociais, políticas, culturais e econômicas e expressando sua expansão por meio da crescente influência que exerce na preocupação que se tem com a saúde nos dias atuais e no, não necessariamente relacionado, culto ao corpo, no vestuário e na postura moral de indivíduos. Compreendido como uma das mais relevantes manifestações culturais do século XX (Priore e Melo, 2009), o esporte hoje alcança um patamar plural, capaz de ser entendido como importante indústria do entretenimento, catalizador de fluxos mundiais de capital e ideologia, sem perder o papel de promotor do fortalecimento da identidade sociocultural de povos. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 1 OBJETIVOS O principal objetivo do trabalho é definir a importância do esporte para a qualidade de vida do carioca, a partir da transformação do seu espaço cotidiano. Tomando esse objetivo como ponto de partida, pode-se desdobrá-lo em três, porém com fortes correlações: dimensionar a relevância da prática esportiva presente como forma de educação de crianças, adolescentes e jovens; discutir o papel da prática e do convívio esportivo na formação do cidadão carioca e verificar as transformações espaciais observadas na cidade do Rio de Janeiro que, de alguma maneira, estariam associadas ou influenciadas pelo esporte. JUSTIFICATIVA Um dos motivos para se debruçar por esta temática é a escassez de trabalhos deste gênero na discussão geográfica, apesar da crescente relevância do esporte ao longo do século XX, que vem gerando intensos fluxos de capitais e grandes transformações de paisagens urbanas, definindo estratégias de valorização do espaço por obras monumentais, além de articular redes de adeptos ao redor do mundo, promovendo o bem estar social e influenciando nos costumes das populações. Particularmente para o Rio de Janeiro, no período atual, a temática ganha ainda mais importância. A eleição da cidade como sede dos Jogos Olímpicos de 2016 e uma das cidades-sede da Copa do Mundo de Futebol, em 2014, é propicia para se discutir a esportividade da cidade e os ganhos que a atividade esportiva e seus eventos relacionados podem gerar para vida pública do município. É prudente também focar nos esportes olímpicos, até porque eles nos oferecem uma gama de 34 modalidades (até a olimpíada de 2008, em Pequim) como universo de análise. O motivo seria o de sair um pouco da ideia da monocultura do futebol que prima no Brasil e em outros países. Portanto trabalhar com esses esportes, alguns já bastante conhecidos e/ou praticados pelo grande público mais ainda marginalizado pela grande mídia, nos faz perceber Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 2 melhor o quadro de desigualdades e distorções que vivemos em outras áreas do país, como a própria educação. METODOLOGIA Para desenvolver a pesquisa pretendida, inicialmente vem sendo realizadas revisões bibliográficas acerca dos conceitos e noções de: espaço, notadamente em Santos (1996); território, principalmente a partir de Souza (1995) e Saquet (2007); cidadania, entendida por Reis (1997) e interesse público, tendo como base Feres Junior (2008). A partir desta base teórico-conceitual, consultando leitura acadêmica, pretende-se um debate com a produção realizada no âmbito da Geografia dos Esportes, com importantes contribuições iniciais no Brasil por Mascarenhas (1999A, 1999B) e amplamente explorada, em suas diversas temáticas, em obras mais recentes do autor (2007, 2008A, 2008B e 2009), articulando a esta discussão a educação e a cidadania no cotidiano do esporte, por Martins (2002), Pires (2007) e Linhales (2009). O recorte espacial definido foi a cidade do Rio de Janeiro, já que abarcar o estado do Rio de Janeiro ou até mesmo a sua Região Metropolitana ampliaria por demais o recorte bastante amplo, e tal amplidão reduziria a possibilidade de sucesso da investigação neste momento inicial da pesquisa. É na cidade carioca que se pretende observar as transformações espaciais influenciadas pelo esporte. Para tal, a consulta de documentos oficiais é fundamental para entender a visão e atuação que o poder público tem, em suas diferentes esferas, sobre a gestão do esporte na cidade do Rio de Janeiro para os próximos anos. Além disso, serão consultados jornais, revistas e sítios da internet a fim de acompanhar o dinamismo das mudanças previstas para este período que antecede a Copa do Mundo de Futebol de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016. Ainda se pretende alguns trabalhos de campo em áreas ou projetos que tenham como foco essa associação entre esporte e educação no Rio de Janeiro, na perspectiva de observar como se dão as transformações espaciais na escala do lugar. A partir de entrevistas esperamos responder de que maneira tais mudanças acontecem pelo viés social, através da conjugação de esporte, educação, cidadania, promovendo uma cultura esportiva capaz de Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 3 contribuir para o bem estar e a autonomia de segmentos da população em determinados lugares. DESENVOLVIMENTO Para entendermos a relevância da prática esportiva como estratégia de educação da sociedade, se faz necessário verificar de onde partem as iniciativas de conjugar esporte, educação e cidadania na área estudada. Dentro deste questionamento cabe dedicar um esforço especial para decifrar qual a pretensa e qual a real participação do Estado como promotor do bem estar da população carioca através do esporte, tendo em vista não só a obrigatoriedade das aulas de educação física nas escolas, como também a possibilidade dada à população de praticar esporte, seja ele instruído por meio de escolinhas públicas ou livre, meramente como lazer. É inegável a importância das políticas públicas para que seja possível promover educação e cidadania através do esporte; no entanto, não se deve subvalorizar os movimentos de iniciativas individuais ou de grupos sociais engajados nessa luta. A partir da promoção de projetos sociais com foco no esporte caminhando como aliado da escola no processo de formação educacional de indivíduos, algumas ONGs ou grupos formados por admiradores do esporte, praticantes e até ex-atletas renomados buscam contribuir para suprir parte da demanda da sociedade por esses serviços. Associações entre sociedade civil e empresas privadas e iniciativas de projetos sociais partindo de clubes são cada vez mais comuns nesta alçada de agir e financiar o esporte em áreas abandonadas pelas políticas públicas. Re-introduzindo o papel do Estado nesta discussão, se busca analisar o comprometimento do poder público em apoiar o esporte como carreira profissional, as políticas públicas voltadas para o esporte de alto rendimento, como o caso do programa Bolsa Atleta. Concluindo o questionamento sobre as incumbências do Estado na questão esportiva, pode-se investigar o movimento dos gestores públicos para realização dos grandes eventos esportivos que serão realizados na cidade. Os espaços da cidade podem ser transformados pelo fenômeno esportivo de diversas maneiras. Desde a simples construção de uma quadra poliesportiva em uma praça pública, Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 4 passando pelo comportamento da sociedade influenciado pelas propagandas e jogos que podem ser acompanhados pelos meios mediáticos, pela construção de um grande estádio que poderia desempenhar a função de nova centralidade urbana, até nas políticas públicas de promoção do esporte e lazer que resgatem e fortaleçam a esportividade na cidade do Rio de Janeiro. O território seria fundamental para entender as relações de poder que se dão nesse contexto. Somente considerando o território pode-se vislumbrar a importância do Estado como promotor de políticas e investimento, ou falta de política e investimento, no esporte. Na gestão pública, o jogo de poder é expresso pelo conceito de território. Pode-se pensar também em um território dos movimentos sociais e projetos de luta pela causa esportiva, a partir das relações de poder que se dão, por exemplo, em uma favela quando um projeto esportivo é implantado. A relação entre os lideres comunitários, ao acolherem ou não a iniciativa, com as crianças e jovens da favela, que seriam os principais beneficiários do projeto, com as famílias ao proibirem, permitirem ou incentivarem os seus filhos participarem desse convívio esportivo, até o professor, gestor ou idealizador da intervenção, que tem a responsabilidade de atender uma população carente de políticas públicas dessa natureza e tem poder de influenciar, positiva ou negativamente, gerações de moradores da área. CONCLUSÃO PARCIAL Considerando que esta é uma pesquisa em estágio inicial, o que podemos concluir a partir da revisão bibliográfica já realizada é que com a evolução e abrangência que o esporte vem sofrendo ao longo dos anos, notadamente a partir de meados do último século, este atingiu um papel importante nas mais diversas sociedades. Sendo assim, no caso brasileiro, mais especificamente do município carioca, este fenômeno passou a representar uma demanda social expressiva, atraindo assim, também um crescimento da preocupação do poder público. As transformações espaciais a partir do esporte na cidade no Rio de Janeiro vêm se intensificando e se materializando nos últimos anos. Os Jogos Pan-Americanos de 2007 representaram mudanças, que no entanto, devem ser dimensionalizadas, e a conquista do Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 5 direito de sediar outros megaeventos esportivos, destacadamente a Copa do Mundo de Futebol em 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016, deve ser encarada como marcos que concentrarão transformações expressivas no espaço da cidade. É preciso que o poder público se comprometa, e seja cobrado e fiscalizado pela sociedade civil, a extrapolar essas transformações para um legado efetivo para a cidade a longo prazo e atendendo as demandas do interesse público. Os grandes investimentos previstos para os próximos anos são uma grande oportunidade para que o esporte como estratégia de transformação espacial na cidade seja atingido de forma mais ampla, contemplando a educação e a cidadania. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS FERES JÚNIOR, J. . Interesse público. In: Leonardo Avritzer, Newton Bignotto, Juarez Guimarães e Heloisa Murgel Starling. (Org.). Corrupção: ensaios e críticas. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008, v. , p. 163-172. KORSAKAS, Paula; ROSE JUNIOR, Dante de. Os Encontros e Desencontros entre Esporte e Educação: uma discussão filosófico pedagógica. Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte – 2002, 1(1):83-93 LINHALES, M. A. . Esporte e escola: astúcias na "energização do caráter" dos brasileiros. 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