26 Interdisciplinaridade e Transdisciplinaridade no atendimento ao idoso Cristina C. Ribeiro da Silva A evolução do conhecimento trouxe grande diversificação das possibilidades de assistência à saúde do idoso, o que ocasionou o surgimento e / ou desenvolvimento de áreas inexistentes ou pouco difundidas. Isto pôde ser verificado pelos seguintes fatores: • Multiplicidade de áreas profissionais ligadas à saúde, território antigamente habitado apenas por médicos, enfermeiros e dentistas; • Inúmeras subdivisões destas mesmas áreas, antigas e atuais, em especialidades. Com isto surge a necessidade, por parte dos profissionais, de aprenderem mais do que sua própria formação, sem o objetivo específico de exercerem novas atividades, mas para interagir com maior conhecimento em diferentes áreas. Consequências: • O conhecimento técnico se difunde não apenas em direção ao paciente, mas também aos outros profissionais, com o intuito de aumentar os conhecimentos do grupo; • A atuação deixa de ser centralizada em um ou poucos profissionais, e passa a ser dividida por aqueles com maior competência e eficiência; Mas, diante desta nova realidade, o profissional deve não deve abordar o paciente apenas como um conjunto de órgãos e aparelhos, sinais e sintomas. Pelo contrário, cada vez mais o idoso necessita ser visto de forma integral, não apenas física como psíquica e social. Surge daí uma nova proposta, a descentralização integrada. Um sistema de integração que permite não apenas adequada comunicação, mas também um controle eficiente dos objetivos e estratégias adotados como prioridade. Entretanto, os profissionais se deparam com um desafio: propiciar que múltiplas áreas do saber, com diferentes propostas de trabalho e diversas formas de atuação, possam agir conjuntamente sem que se instale obrigatoriamente um esquema hierárquico, mas que, por outro lado, as ações REVISTA PORTAL de Divulgação, n.5, Dez. 2010 - http://www.portaldoenvelhecimento.org.br/revista/index.php 27 sejam planejadas e executadas segundo um código de ética e de organização comum a todos os integrantes. Este campo de saber, relacionado ao trabalho em equipe precisa ser bem definido por meio de alguns conceitos. Quando se trata de uma equipe multiprofissional, estamos nos referindo a uma equipe formada por diferentes profissionais, ou seja, o profissional fisioterapeuta, fonoaudiólogo, médico, psicólogo, enfermeiro, entre outros. E esta equipe pode atuar de duas maneiras: a atuação pode ser interdisciplinar, ou seja, os profissionais se reúnem para discutir sobre o caso do paciente, a fim de melhor tratá-lo; ou a atuação pode ser multidisciplinar, ou seja, o paciente é atendimento por vários profissionais, entretanto eles não se comunicam, não se reúnem para discutir o caso do paciente, aumentando o risco do paciente ser abordado de forma fragmentada e não em sua totalidade. O ideal seria se todos os pacientes fossem atendidos por uma equipe multiprofissional com atuação interdisciplinar, mas isto nem sempre é possível, principalmente dos casos dos pacientes idosos, devido a maior diversidade de aspectos inerentes ao processo natural de envelhecimento, as inúmeras doenças crônicas que usualmente acometem o idoso, e os fenômenos psíquicos e sociais que freqüentemente se associam como causas e / ou conseqüências. Seria utópico pensar que um ou poucos profissionais, por melhor qualificados que fossem, poderiam se responsabilizar, globalmente, pela grande heterogeneidade de cada caso. Todas estas características do atendimento interdisciplinar refletem a magnitude de uma complexa inter-relação profissional, ainda em fase de desenvolvimento. Alguns preceitos fundamentais para o bom desempenho do profissional dentro da equipe: • Postura de abertismo: o profissional deve estar aberto a novas idéias e opiniões, ter permeabilidade ao conhecimento. Estar atualizado quanto aos acontecimentos do cotidiano; • Ter uma boa convivialidade, saber trabalhar em equipe e interagir tanto com os outros profissionais quanto com os pacientes; • Dividir o seu conhecimento e informações com as pessoas, sobre o seu fazer, sobre a sua prática, a fim de que conheçam o que está sendo realizado com o paciente, sem ter a insegurança de que alguém possa replicar a sua prática. Nos dias de hoje esta insegurança já não tem mais espaço; • Buscar novos conhecimentos participando de cursos e congressos; REVISTA PORTAL de Divulgação, n.5, Dez. 2010 - http://www.portaldoenvelhecimento.org.br/revista/index.php 28 • Registrar e publicar sobre a sua prática, cada um tem um jeito de atuar, por isto merece ser divulgado; Para ser um bom profissional no atendimento interdisciplinar não basta ser um bom profissional individualmente. Vantagens e Desvantagens do atendimento interdisciplinar: custos; limitações da formação acadêmica; necessidade de uma linguagem comum entre os membros da equipe; organização e manutenção da equipe; divisão das responsabilidades; controle de qualidade; Requisitos para a composição e organização da equipe: • A composição da equipe deve ser determinada pela própria equipe, ou seja, os profissionais selecionados para dela fazerem parte devem ser indicados, a fim de que já exista uma empatia prévia entre todos, minimizando assim possíveis conflitos; • Realização de reuniões, existência de um regulamento interno e a existência de um coordenador; • Cuidados com a saúde dos profissionais; Em se tratando de equipe interdisciplinar que atua com os pacientes idosos, podemos citar dois exemplos: o GAMIA (Grupo de Assistência Multidisciplinar ao Idoso); e PROVIDI (Programa de Visita Domiciliar do Idoso). Ambos programas do serviço de Geriatria da FMUSP. Estes são dois exemplos de equipes que existem há algum tempo e que obtém resultados muito satisfatórios e benéficos aos idosos participantes dos programas. Transdisciplinaridade Já a transdisciplinaridade é um desafio muito maior. Defini-se este termo, precedido pelo o prefixo trans, que além da acepção de “através” ou de “passar por”, encerra os sentidos de “para além”, “passagem”, ”mudança”, “transformação” etc. Ou seja, indicam aquelas situações do conhecimento que conduzem á transmutação ou ao traspassamento das disciplinas, à custa de suas aproximações e freqüentações. Sugere a idéia de movimento: da freqüentação das disciplinas e da quebra de barreiras; o cruzamento de especialidades; o trabalho nas interfaces; a superação das fronteiras, a migração de um conceito de um campo de saber para outro, além da própria unificação do conhecimento. Não se trata do caso da divisão de um mesmo objeto entre (inter) disciplinas diferentes (multi) que o recortariam e trabalhariam seus diferentes aspectos, REVISTA PORTAL de Divulgação, n.5, Dez. 2010 - http://www.portaldoenvelhecimento.org.br/revista/index.php 29 segundo pontos de vista diferentes, cada qual resguardando suas fronteiras e ficando (em maior ou menor grau) intocadas. Trata-se, portanto, de uma interação dinâmica contemplando processos de auto-regulação e de retroalimentação e não de uma integração ou anexação pura e simples. Este conceito da transdisciplinaridade ainda é muito complexo e desafiador na prática, seja ela na área da saúde, humanas ou exatas. Mas já existem estudos realizados no Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares (IEAT) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Enfim, tanto a atuação inter quanto transdisciplinar ainda precisam ser muito estudadas e vivenciadas, mas se o profissional tem como objetivo uma atuação mais completa e eficaz com o paciente, nos dias de hoje, deve caminhar rumo a integração dos saberes e profissionais, que se afirma como uma tendência para o futuro. Referências DOMINGUES, Ivan (org). Conhecimento Horizonte: Editora IEAT / UFMG, 2001. e Transdisciplinaridade. Belo NERI, Anita Liberalesso. Palavras Chave em Gerontologia. Campinas: Alínea Ed, 2002. ________________. A Formação Gerontológica no Brasil. In Revista A Terceira Idade. São Paulo: SESC, v. 17, nº 35, 2006. NETTO, P. M. “Interdisciplinaridade em Gerontologia: Aspectos Conceituais e Objetivos”. In Papaleo Neto, P. (org.) A Velhice e o Envelhecimento em Visão Globalizada. São Paulo: Ed. Atheneu, 2ª ed. 2007. pp 149-162. REVISTA KAIRÓS - Caderno Temático 4. Graduação em Gerontologia: desafios e perspectivas. São Paulo, agosto, 2009. pp.1-146. ________________________ Cristina C. Ribeiro da Silva - Fisioterapeuta; Profª do Curso de Fisioterapia da Cesufoz – PR; Especialista em Gerontologia - UNIFESP-SP; Mestranda em Gerontologia pela PUC-SP. E-mail: [email protected] Blog: http://fisiogerontologica.blogspot.com REVISTA PORTAL de Divulgação, n.5, Dez. 2010 - http://www.portaldoenvelhecimento.org.br/revista/index.php