O custo de esterilizar reservas

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O custo de esterilizar reservas
VALOR ECONÔMICO 29/02/2008
O custo de carregamento das reservas cambiais, dado pelo
diferencial de taxa de juros interna e externa e pela valorização do real
frente ao dólar, chegou, em 2007, à casa dos R$ 50 bilhões, segundo
cálculos de alguns economistas do governo que estão avaliando os
impactos macroeconômicos da esterilização das reservas, que atingiram,
no dia 27 de fevereiro, o montante de US$ 190,49 bilhões.
Ao acumular maciçamente reservas no ano passado - quando o
Banco Central comprou, liquidamente, US$ 78,59 bilhões, injetou R$
155,39 bilhões em reais na economia e colocou papéis da dívida pública
para enxugar essa liquidez - a valorização da taxa de câmbio impôs um
custo fiscal equivalente a cerca de 1,1% do Produto Interno Bruto (PIB),
enquanto o diferencial de juros teria gerado aos cofres públicos uma
despesa de 0,7% a 0,8% do PIB. O impacto total, portanto, teria sido de
aproximadamente 1,9% do PIB, ou o equivalente a R$ 51 bilhões (cálculo
feito com base no PIB valorizado do Banco Central, de R$ 2,68 trilhões em
final de dezembro).
Como o país é credor em moeda estrangeira, a valorização da taxa
de câmbio provoca prejuízos. A desvalorização, conseqüentemente,
representa ganhos para o Tesouro Nacional.
A soma das reservas cambiais em janeiro deste ano, de US$ 187,5
bilhões aos US$ 2,8 bilhões de créditos brasileiros no exterior e mais US$
12,86 bilhões de haveres de bancos comerciais foi suficiente para cobrir
toda a dívida externa e ainda tornar o Brasil credor em US$ 6,98 bilhões no
mês passado.
A contrapartida do fim do endividamento externo, porém, foi o
aumento do endividamento interno, em reais. No ano passado, a dívida
líquida do setor público caiu para 42,8% do PIB, em comparação com os
44,7% do PIB de 2006. Em compensação, a dívida interna líquida cresceu
de 47,4% do PIB para 51,9% do PIB e a dívida interna não monetária
(excluída da base monetária) passou de 42,3% do PIB para 46,4% do PIB
nesse mesmo período. Do ponto de vista do endividamento, portanto,
houve uma troca de dívida em dólar por dívida em reais, mais cara, mas,
pelo menos em tese, mais controlável pelo governo.
Reservas chegaram a US$ 190,49 bilhões dia 27
Não há juízo de valor nessa discussão. O que alguns técnicos do
governo pretendem é compreender o universo da acumulação de reservas,
que é um processo novo no país, marcado por várias crises cambiais nos
últimos 30 anos.
O custo de comprar essa proteção é mensurável, já os benefícios, não. Mas é
evidente, e isso fica claro nos momentos de crise externa, que um país com US$
190 bilhões em reservas e taxa de câmbio flutuante tem uma série de vantagens a
começar pela menor vulnerabilidade aos humores dos mercados financeiros
internacionais e menores prêmios de riscos nos financiamentos tomados no exterior
tanto pelo Tesouro Nacional quanto pelas empresas.
O patamar em que as reservas chegaram, leva, contudo, a indagação sobre se já
não seria hora de parar o processo de acumulação que começou em 2004. Cada
dólar a mais, quando já se tem US$ 190 bilhões, adiciona menos proteção do país a
crises do que adicionava quando as reservas eram de US$ 17 bilhões. O Banco
Central avalia, no entanto, que mesmo com esse volume, a crise externa disparada
pelo colapso das "subprimes" americanas aumentou o risco-país e levou o mundo a
um momento de maiores incertezas. Assim, o efeito líquido da acumulação ainda
seria positivo, na avaliação do BC.
Na medida em que o mercado começar a dar indicações sobre o que pensa dessa
política e isso passar a se refletir nos preços do câmbio, o BC, certamente, levará
isso em conta. Se o mercado achar que a política de acumulação já é disfuncional e
que está piorando a situação fiscal, ele vai impor prejuízos ao BC. Isso ainda não
começou a acontecer.
O custo da esterilização das reservas, avaliam economistas oficiais, deve ser
encarado, portanto, como um programa de governo, assim como o Bolsa Família ou
o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Apenas para efeito de
comparação, o que foi gasto no ano passado para carregar as reservas equivale a
mais de cinco orçamentos anuais do Bolsa Família. É um seguro caro, porém
necessário. Uma forma de reduzir essa despesa seria reduzindo os juros. Uma Selic
mais baixa teria efeitos positivos tanto na valorização do câmbio quanto no
diferencial de juros. Mas, por enquanto, ninguém aposta em queda da taxa Selic.
Humildade
Numa reunião dos presidentes dos Bancos Centrais do mundo em Basiléia, Suíça,
pouco antes de transferir o cargo para Ben Bernanke, o lendário presidente do
Federal Reserve, Alan Greenspan, lançou uma pergunta provocativa. " Para que
serve a taxa de câmbio?", indagou. Cada presidente de banco central presente usou
sua argumentação teórica, umas mais, outras menos sofisticadas. Quando chegou
sua vez de responder, Greenspan disse: "Para mim a taxa de câmbio serve, na
verdade, para impor alguma humildade aos economistas."
Claudia Safatle é diretora de redação adjunta e escreve às
sextas-feiras
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