Matheus Pereira Leite

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
ESCOLA DE ENGENHARIA
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA QUÍMICA E DE PETRÓLEO
CURSO DE ENGENHARIA DE PETRÓLEO
SANGUE-NEGRO – A RELAÇÃO E A INFLUÊNCIA DO PETRÓLEO NOS PRINCIPAIS
CONFLITOS BÉLICOS DA HUMANIDADE
MONOGRAFIA DE GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA DE PETRÓLEO
MATHEUS PEREIRA LEITE
Niterói, 2013
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
ESCOLA DE ENGENHARIA
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA QUÍMICA E DE PETRÓLEO
CURSO DE ENGENHARIA DE PETRÓLEO
MATHEUS PEREIRA LEITE
SANGUE-NEGRO – A RELAÇÃO E A INFLUÊNCIA DO PETRÓLEO NOS PRINCIPAIS
CONFLITOS BÉLICOS DA HUMANIDADE
Monografia apresentada ao Curso de
Engenharia de Petróleo da Universidade
Federal Fluminense, como requisito parcial
para a obtenção do título de Bacharel em
Engenharia de Petróleo.
Orientador: Albino Lopes d‟Almeida
Niterói
2013
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer primeiramente a Deus, por me abençoar em todas as minhas
ações e sempre me dar força para seguir em frente.
Aos meus pais, Sérgio e Rosa, ao meu irmão, Lucas, a minha namorada, Mayara, e
a todos os meus outros familiares, que estão sempre comigo, seja compartilhando bons
momentos ou me ajudando nos momentos difíceis, e sem os quais não seria possível
chegar até aqui.
Ao meu professor orientador, Albino Lopes d‟Almeida, e a todos os outros
professores que contribuíram para a realização desse trabalho.
E a todos os meus amigos, que também estão sempre presentes e contribuíram de
alguma forma para a realização dessa monografia.
"Por quase um século e meio o petróleo
vem trazendo à tona o melhor e o pior
de
nossa
civilização.
Vem
se
constituindo em privilégio e em ônus.
(...) Ele tem sido o palco para o nobre e
o desprezível do caráter humano. (...)
Foi isso que fez a era do petróleo."
Daniel Yergin
RESUMO
A ambição por hegemonia faz parte da natureza humana, assim como a guerra. O
petróleo, desde sua descoberta, se transformou em sinônimo de riqueza e poder. Como
conseqüência, ele sempre esteve relacionado com os principais conflitos da história da
humanidade. Desde a Antiguidade, passando pelas duas guerras mundiais, até os recentes
conflitos no Oriente Médio,
o petróleo sempre esteve presente, muitas vezes
desempenhando um papel-chave. Esse trabalho tem por objetivo relatar essa relação entre
petróleo e guerras, de forma a reiterar a importância dessa matéria-prima para a história da
humanidade.
Palavras-chave: petróleo, guerra, história.
ABSTRACT
The ambition for hegemony is part of human nature, as well as war. Oil, since its
discovery, has become synonymous with wealth and power. As a result, he has always been
related with the main conflicts in human history. Since ancient times, through the two world
wars, until the recent conflicts in the Middle East, oil has always been present, often playing
a key role. This paper aims to describe the relationship between oil and war in order to
reiterate the importance of this raw material for the history of mankind.
Keywords: oil, war, history.
LISTA DE SIGLAS E ABREVIAÇÕES
BP
British Petroleum
BPD
Barris por Dia
EUA
Estados Unidos da América
IEA
International Energy Agency
OAPEC
Organization of Arab Petroleum Exporting Countries
ONU
Organização das Nações Unidas
OPA
Office of Price Administration
OPEP
Organização dos Países Exportadores de Petróleo
OSCO
Oil Service Company of Iran
PAW
Petroleum Administration for War
PIB
Produto Interno Bruto
PLUTO
Pipeline Under the Ocean
PNAC
Projeto por um Novo Século Americano
RAF
Real Força Aérea Britânica
REP
Reserva Estratégica de Petróleo
LISTA DE FIGURAS
Figura 2.1
Mapa da 2ª Guerra Mundial na Europa e no Norte da África........................ 34
Figura 2.2
Mapa da 2ª Guerra mundial no Pacífico ....................................................... 39
Figura 3.1
O Canal de Suez .......................................................................................... 49
Figura 3.2
As Conquistas de Israel na Guerra dos 6 Dias ............................................ 55
Figura 4.1
O rio Shatt-al-Arab ....................................................................................... 73
Figura 4.2
O Campo Petrolífero de Rumaila ................................................................. 81
Figura 4.3
As ilhas de Warba e Bubiyan ....................................................................... 82
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..............................................................................................................................
12
I. Objetivo.................................................................................................................................... 12
II. Justificativa.............................................................................................................................
12
III. Metodologia...........................................................................................................................
12
IV. Relevância e Contextualização do Trabalho........................................................................
12
V. Estrutura do Trabalho............................................................................................................
13
CAPÍTULO 1 – DESDE A ANTIGUIDADE ATÉ A 1ª GUERRA MUNDIAL.................................
14
1.1. Na Antiguidade..................................................................................................................
14
1.2. Na Idade Contemporânea.................................................................................................
14
1.3. Na 1ª Guerra Mundial........................................................................................................
16
1.3.1. O Pré-Guerra.................................................................................................................
16
1.3.2. O Conflito.......................................................................................................................
19
1.3.2.1. O Petróleo nos Campos de Batalha........................................................................
20
1.3.2.2. O Suprimento Mundial de Petróleo Durante a 1ª Guerra Mundial...........................
21
1.3.2.2.1. O Suprimento dos Aliados.................................................................................
21
1.3.2.2.2. O Suprimento da Alemanha..............................................................................
24
1.3.3. O Fim do Conflito e a Consagração do Petróleo...........................................................
25
CAPÍTULO 2 – O PETRÓLEO E A 2ª GUERRA MUNDIAL........................................................
26
2.1. O Pré-Guerra......................................................................................................................
26
2.1.1. Na Alemanha.................................................................................................................
27
2.1.2. Na Grã-Bretanha...........................................................................................................
27
2.1.3. No Pacífico....................................................................................................................
28
2.2. As Batalhas do Petróleo...................................................................................................
30
2.2.1. Na Europa...................................................................................................................... 30
2.2.1.1. As Batalhas na União Soviética...............................................................................
31
2.2.1.1.1. A Operação Blau...............................................................................................
31
2.2.1.1.2. A Batalha de Stalingrado...................................................................................
32
2.2.1.2. A Batalha do Bulge..................................................................................................
32
2.2.2. Na África …………........................................................................................................
33
2.2.3. No Atlântico...................................................................................................................
34
2.2.4. No Pacífico…….............................................................................................................
35
2.2.4.1. Pearl Harbor….........................................................................................................
35
2.2.4.2. A Batalha de Balikpapan…......................................................................................
36
2.2.4.3. A Batalha de Midway...............................................................................................
37
2.2.4.4. A Batalha de Marus.................................................................................................
37
2.2.4.5. A Batalha das Ilhas Marianas..................................................................................
38
2.2.4.6. A Batalha das Filipinas............................................................................................
38
2.2.4.7. A Batalha de Okinawa.............................................................................................
38
2.3. Inovações Relacionadas ao Petróleo Feitas Durante o Conflito................................... 39
2.3.1. A Construção do Big Inch e do Little Inch...................................................................... 39
2.3.2. A Utilização da Gasolina de 100 Octanas.....................................................................
40
2.3.3. PLUTO...........................................................................................................................
41
2.4. O Suprimento de Petróleo Durante a 2ª Guerra Mundial...............................................
41
2.4.1. O Suprimento da Alemanha..........................................................................................
41
2.4.2. O Suprimento do Japão.................................................................................................
42
2.4.3. O Suprimento dos Aliados.............................................................................................
44
2.4.3.1. A Organização da Indústria Petrolífera Britânica..................................................... 44
2.4.3.2. A Organização da Indústria Petrolífera Americana.................................................
45
2.4.3.2.1. O Racionamento nos EUA.................................................................................
46
2.4.3.3. O Suprimento nos Fronts de Batalha......................................................................
47
CAPÍTULO 3 – O PETRÓLEO E OS CONFLITOS NO ORIENTE MÉDIO - PARTE 1................
49
3.1. A Guerra no Canal de Suez............................................................................................... 49
3.2. A Guerra dos Seis Dias.....................................................................................................
54
3.3. A Guerra do Yom Kippur................................................................................................... 57
3.3.1. O Pré-Guerra.................................................................................................................
57
3.3.1.1. No Oriente Médio..................................................................................................... 57
3.3.1.2. Nos EUA..................................................................................................................
58
3.3.2. O Conflito.......................................................................................................................
59
3.3.3. As Conseqüências do Conflito....................................................................................... 63
3.4. A Revolução Islâmica no Irã.............................................................................................
65
3.4.1. O Pré-revolução............................................................................................................. 65
3.4.2. Os Conflitos...................................................................................................................
66
3.4.3. As Consequências da Revolução Islâmica no Irã.........................................................
68
CAPÍTULO 4 – O PETRÓLEO E OS CONFLITOS NO ORIENTE MÉDIO - PARTE 2................
73
4.1. A Guerra Irã x Iraque.........................................................................................................
73
4.1.1. O Pré-guerra..................................................................................................................
73
4.1.2. O Conflito.......................................................................................................................
74
4.1.3. O Contrachoque do Petróleo.........................................................................................
75
4.1.4. O Fim da Guerra............................................................................................................
78
4.2. A Guerra do Golfo.............................................................................................................. 79
4.2.1. O Pré-guerra..................................................................................................................
79
4.2.2. O Início da Crise – A Invasão do Iraque ao Kuait.......................................................... 81
4.2.3. Operação Tempestade no Deserto...............................................................................
84
4.2.4. As Conseqüências da Guerra do Golfo.........................................................................
85
4.3. A Guerra do Iraque............................................................................................................
87
4.3.1. O Pré-guerra..................................................................................................................
87
4.3.2. A Relação do Petróleo com a Guerra do Iraque............................................................ 89
4.3.3. A Guerra........................................................................................................................
89
CAPÍTULO 5 – CONCLUSÃO......................................................................................................
91
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................................
93
INTRODUÇÃO
I – Objetivo
A presente monografia tem por objetivo relatar a relação e a influência do petróleo
nos principais conflitos bélicos da humanidade, desde a antiguidade até os dias atuais.
Através da abordagem do papel do petróleo antes, durante e após as principais guerras do
mundo, objetiva-se reiterar a importância dessa matéria-prima para a história da
humanidade.
II – Justificativa
A relação entre petróleo e guerras é um assunto de extrema importância, não só
para a indústria de petróleo, mas também para a sociedade em geral, uma vez que o mundo
atual é completamente dependente dessa matéria-prima. Apesar de ser um assunto
extremamente relevante, ainda não foi abordado em projetos finais do curso de Engenharia
de Petróleo da Universidade Federal Fluminense.
III – Metodologia
O presente trabalho foi feito através de revisão bibliográfica, cujas principais fontes
foram livros e artigos disponíveis na internet. Destaque para o livro “O Petróleo: Uma história
mundial de conquistas, poder e dinheiro”, de Daniel Yergin (2009), que por ser uma obra
que relata a história da indústria petrolífera mundial de forma profunda e detalhada, foi a
base para o desenvolvimento desse trabalho.
IV – Relevância e Contextualização do Trabalho
A guerra faz parte da natureza humana. Diversos são os motivos que levam o ser
humano a entrar em conflito com seus semelhantes: raça, religião, territórios, riquezas,
poder, etc. Entretanto, a ambição por poder e hegemonia pode ser considerada o principal
fator que há mihares de anos leva o ser humano à guerra.
O petróleo, a partir de sua descoberta, tornou-se uma grande fonte de riqueza. Com
o passar dos anos, ele deixou de ser apenas uma maneira de enriquecer, passou a ser vital
para civilização moderna e, com isso, tornou-se a maior fonte de poder e hegemonia
existente no mundo. E, consequentemente, a maior fonte de guerras.
13
V – Estrutura do Trabalho
A monografia proposta está dividida em 3 partes. Na primeira, é feita uma introdução
ao trabalho, na qual são apresentados objetivo, justificativa, relevância e metodologia do
mesmo.
Na segunda parte, é feito o desenvolvimento do assunto proposto em 4 capítulos. No
capítulo 1 é abordada, de forma sucinta, a influência do petróleo em conflitos na
Antiguidade, como a Guerra de Tróia e a tomada da Babilônia pela Pérsia, e também em
conflitos da Idade Contemporânea, como a Guerra de Secessão e a Guerra RussoJaponesa. Por fim, é relatada a influência do petróleo na 1ª Guerra Mundial, abordando o
seu papel no cenário pré-guerra, a transformação proporcionada por ele nos combates e a
questão do suprimento de petróleo dos principais países envolvidos na guerra.
No capítulo 2 é relatada a influência do petróleo na 2ª Guerra Mundial, abordando a
sua relevância no cenário pré-guerra e nas principais batalhas do conflito, as inovações
relacionadas ao petróleo ocorridas durante a guerra e o suprimento de petróleo dos
principais países participantes da guerra.
Nos dois capítulos seguintes é relatada a influência do petróleo nos principais
conflitos ocorridos no Oriente Médio após a 2ª Guerra Mundial, retratando os papéis que o
petróleo teve nessas guerras – desde motivador até arma política. No capítulo 3 são
abordados os principais conflitos ocorridos entre o fim da 2ª Guerra e o 2º Choque do
Petróleo: Guerra no Canal de Suez, Guerra dos Seis Dias, Guerra do Yom Kippur e
Revolução Islâmica no Irã. No capítulo 4 são analisados os principais conflitos a partir do
Contra-choque do Petróleo: Guerra Irã-Iraque, Guerra do Golfo e Guerra do Iraque.
Na terceira parte, capítulo 5, é feita uma avaliação final sobre a relação entre
petróleo e guerras.
CAPÍTULO 1
DA ANTIGUIDADE ATÉ A 1ª GUERRA MUNDIAL
1.1) Na Antiguidade
Milhares de anos antes de Edwin L. Drake encontrar petróleo em Titusville, na
Pensilvânia, a humanidade já conhecia essa preciosa substância. Os primeiros registros de
betume vieram da Mesopotâmia, três mil anos antes de Cristo. Já na Antiguidade, o betume
era um valioso artigo de comércio: era utilizado em paredes, como argamassa; em
embarcações, como impermeabilizante; na construção de estradas; e como remédio. No
século I D.C., o naturalista romano Plínio descreveu o uso farmacêutico do betume,
destacando a eficácia deste contra várias enfermidades, como hemorragias e feridas.
Data da antiguidade também uma função que se tornaria recorrente e decisiva na
história da humanidade: a bélica. O petróleo, convertido em chama, foi uma das principais
armas da Guerra de Tróia, conflito entre Grécia e Tróia, datado por volta de 1250 A.C.,
narrado de forma lendária e poética por Homero, na Ilíada. Muitos historiadores e estudiosos
ainda discutem se o conflito de fato ocorreu, apesar da descoberta das ruínas da cidade de
Tróia. O poder do fogo proveniente do petróleo também foi decisivo durante a tomada da
Babilônia pela Pérsia, em 539 A.C. A partir do século VII, o fogo grego – oleo incendiarum –
substância constituída pela mistura de petróleo e cal, foi utilizado pelos bizantinos para fins
bélicos, e foi considerado durante muito tempo mais destrutivo que a pólvora (YERGIN,
2009).
1.2) Na Idade Contemporânea
O grito que ecoou em agosto de 1859 através dos estreitos vales do oeste
da Pensilvânia – de que o maluco yankee, o Coronel Drake, havia
encontrado petróleo – deu início a uma imensa corrida ao petróleo, que
nunca mais teve fim desde então. E, daí em diante, na guerra e na paz, o
petróleo ganharia o poder de construir ou destruir nações e seria decisivo
nas grandes batalhas políticas e econômicas do século XX. (YERGIN, 2009,
p. 886)
A partir da descoberta de Drake, em 27/08/1859, o petróleo passou a estar
relacionado, de algum modo, com a maioria dos conflitos da humanidade. A Guerra de
Secessão – conflito civil ocorrido nos EUA de 1861 a 1865, entre os estados do sul e os do
norte, motivado principalmente pelas diferenças econômicas e pela questão da escravatura
– influenciou o primeiro boom do petróleo, ocorrido em Oil Regions, na Pensilvânia, a partir
de 1861. Com a guerra, os estados do norte não tiveram mais acesso à terebintina do sul,
da qual se obtinha o canfeno, um óleo iluminante barato, o qual foi substituído pelo
querosene proveniente do petróleo de Oil Regions. Além disso, devido ao conflito, os
15
estados do norte não tiveram mais participação nos lucros gerados pela exportação do
algodão; a exportação do petróleo da Pensilvânia para a Europa compensaria essa perda,
fornecendo uma nova fonte de lucros. E, com o fim da guerra, milhares de veteranos se
mudaram para Oil Regions, atraídos pelo sonho de riqueza proporcionado pelo petróleo.
Também nos EUA, ocorreu a chamada Guerra do Petróleo, em fevereiro de 1872,
devido à tentativa de John D. Rockfeller, presidente da Standard Oil Company, de
monopolizar a indústria de refino do país. Na ocasião, 3 mil homens, representando os
produtores independentes que estavam sendo extremamente prejudicados pela South
Improvement Company (empresa criada por Rockfeller com o único objetivo de possibilitar o
monopólio), se mobilizaram, boicotando refinadores e ferrovias aliados da Standard Oil.
Apesar do esforço ter resultado no fechamento da South Improvement, Rockfeller atingiu
seu objetivo. E, na primavera de 1872, converteu-se “no chefe do maior grupo de refinarias
do mundo” (YERGIN, 2009, p. 44).
Em março/1873, ocorreu outro fato que demonstrou como o petróleo estava ligado
com a atividade militar, mesmo que de forma indireta. Os suecos irmãos Nobel, donos de
uma grande fábrica de armamentos, entraram na indústria do petróleo quando Robert, o
irmão mais velho, estava em uma viagem pelo Cáucaso a procura de suprimentos de
madeira para a fabricação de coronhas de espingardas (a empresa havia fechado um
acordo lucrativo com o governo russo para o fornecimento de espingardas). Ele
desembarcou em Baku, onde a indústria de petróleo começava a proliferar, e foi atraído pelo
negócio. Posteriormente, os irmãos criariam a Companhia de Produção de Petróleo Irmãos
Nobel, que se destacaria na indústria petrolífera russa.
Outra demonstração da relação indireta entre petróleo e a guerra foi o fato de
Marcus Samuel, dono da companhia de transporte e armazenagem de petróleo M. Samuel
& Co., ter feito fortuna como um dos principais fornecedores de armas e suprimentos para o
Japão durante a guerra contra a China, ocorrida entre 1894 e 1895. Marcus foi o fundador
da Shell Transport and Trading Company, que mais tarde seria parte do Royal Dutch-Shell
Group, empresa que viria a ter uma posição de destaque na indústria petrolífera mundial.
No final do século XIX, duas guerras influenciaram o mercado petrolífero. A Guerra
dos Bôeres, conflito que ocorreu de 1899 a 1902 na África do Sul, entre as Repúblicas
Bôeres da África do Sul (compostas por colonos descendentes de holandeses e franceses)
e a Grã-Bretanha, ocasionou uma alta nos preços do petróleo. Já a Guerra dos Boxers,
movimento antipopular e antiocidental ocorrido entre 1899 e 1900 na China, arrasou o país e
sua economia, acabando com “um dos mais promissores mercados da Shell” (YERGIN,
2009, p. 131).
16
No início do século XX, ocorreu a Guerra Russo-Japonesa, com a qual a indústria
petrolífera também estava relacionada. O conflito, que ocorreu entre 1904 e 1905, teve
como principais motivadores a disputa pelo controle dos territórios da Manchúria e da Coréia
e a crise que o regime czarista de Nicolau II enfrentava na Rússia. A região do Cáucaso
(hoje Azerbaijão) era o centro dos descontentamentos e dos protestos russos – segundo
Yergin (2009, p. 144), Baku era a “estufa revolucionária do Cáspio”, onde a indústria do
petróleo propiciou o campo de treinamento para um grande número de líderes bolcheviques,
como Mikhail Kalínin, Klementi Voroshílov e Joseph Djugashvíli, que mais tarde seria
conhecido por Joseph Stalin. Diante da crise, o czar viu na guerra contra o Japão uma
solução para rechaçar os protestos e restaurar a paz no Império. Porém, a estratégia não
deu certo, e a guerra piorou o cenário russo.
Em 1905, ocorreu em São Petersburgo o chamado Domingo Sangrento, no qual
trabalhadores foram recebidos a tiros pela polícia quando se dirigiam ao Palácio de Inverno
para fazer reinvidicações ao czar. O Cáucaso foi tomado por greves e pelo conflito étnico
entre os armênios cristãos, que eram os principais líderes do petróleo na região, e os
tártaros mulçumanos, apoiados pelo governo. Durante o conflito, os tártaros incendiaram
centenas de torres e poços de petróleo, destruindo a indústria petrolífera de Baku. Com o
fim da revolução e da guerra, em 1905, o resultado se mostrou desastroso para a Rússia:
dois terços dos poços de petróleo do país foram destruídos.
Entretanto, foi a invenção do motor de combustão interna que tranformou o papel
estratégico do petróleo na arte da guerra. A revolução causada pela introdução do motor a
combustão interna no final do século XIX mudou dramaticamente a natureza do petróleo
para as nações e para a humanidade, e em poucos anos o “ouro negro” ascenderia ao seu
status de commodity estratégico vital para a segurança nacional das grandes potências
(MAUGERI, 2006).
1.3) Na 1ª Guerra Mundial
“Os Aliados flutuaram para a vitória em uma onda de petróleo.” (Visconde Curzon de
Kedleston)
1.3.1) O Pré-Guerra
No final do século XIX, o governo alemão tinha começado a sua tentativa em larga
escala em direção ao reconhecimento da Alemanha como potência mundial e à supremacia
global política, estratégica e econômica – a chamada Welpolitik. Porém, a Inglaterra possuía
a supremacia em alto-mar, com sua Armada Real movida a carvão galês e respeitada em
todos os mares do mundo. A Alemanha tinha consciência de que a supremacia inglesa em
17
alto-mar poderia impedir suas ambições e que, por isso, deveria construir uma armada que
pudesse competir com a inglesa. Assim, em 1897, os alemães começaram sua corrida
naval. O governo britânico, alarmado com a segurança do Império e com a possibilidade de
perder a liderança industrial, deu início à modernização de sua armada, através de um
amplo programa de reconstrução, que teve como personagens fundamentais John
Arbuthnot Fisher e Winston Spencer-Churchill.
John Fisher era um almirante inglês, que posteriormente passaria a ser conhecido
como “o chefão do óleo", e tinha como uma das paixões de sua vida a Armada Real Inglesa.
No início do século XX, defendia arduamente o avanço tecnológico da marinha, tendo como
principal objetivo a mudança da propulsão dos navios do carvão para o óleo, pois acreditava
que o óleo combustível provocaria uma revolução na estratégia naval (YERGIN, 2009).
Porém não tinha o apoio dos outros almirantes, que confiavam no carvão galês e relutavam
em mudar. Em meados de 1903, o primeiro teste de uso de óleo combustível num
encouraçado inglês foi feito, em Portsmouth, porém foi um fracasso. O objetivo do teste era
que o navio, chamado de HMS (His Majesty Ship) Hannibal, saísse do porto movido a
carvão e durante a viagem passasse a ser movido por óleo. Enquanto queimava carvão,
tudo ocorrera normalmente, porém quando passou a utilizar óleo, um queimador defeituoso
fadou o teste ao fracasso. Em 1904, Fisher, já como Primeiro Lorde do Mar, estava
convencido de que a Inglaterra enfrentaria a Alemanha imperial, e mais convencido ainda de
que o petróleo desempenharia um papel fundamental nessa inevitável guerra.
Apesar da ameaça alemã, a Inglaterra estava dividida em relação à corrida naval, e
nesse cenário surgiu Winston Churchill, à época Secretário do Interior. No início, ele era
contra a expansão naval, pois não acreditava num conflito inevitável contra a Alemanha, e
por isso defendia um acordo entre os dois países, para assim liberar dinheiro para reformas
sociais. Porém, após um ato imperialista do governo alemão – que mandou um navio
canhoneiro, Panther, ao porto marroquino de Agadir – Churchill concluiu que a Alemanha
tinha por real objetivo a guerra, e passou a defender arduamente o fortalecimento da
Armada Real, pois acreditava que se a Inglaterra perdesse sua supremacia naval, toda a
riqueza acumulada ao longo da história do império se perderia. (YERGIN, 2009).
Em 1911, Churchill se tornou Primeiro Lorde do Almirantado e, ao aliar-se a Fisher
no processo de modernização da armada, foi logo instruído por ele sobre a questão do óleo:
Lembre-se de que o óleo, ao contrário do carvão, não se deteriora, e assim
é possível acumular grandes estoques em tanques subterrâneos, de modo a
evitar a destruição por incêndio, bombardeios ou incendiários, e a leste de
Suez o óleo é mais barato que o carvão! (...) Quando um vapor de carga
pode economizar 78% em combustível e ganhar 30% em espaço para carga
com a adoção da propulsão por combustão interna e praticamente se livrar
18
dos foguistas e maquinistas, é óbvio que com o óleo uma prodigiosa
mudança está às nossa portas. (YERGIN, 2009, p. 173,174)
Ao chegar ao almirantado, Churchill se deu conta que os encouraçados de guerra –
a principal parte da frota – ainda eram propelidos a carvão, apesar de a Armada já possuir
embarcações propelidas somente a óleo (56 destróieres e 74 submarinos). Assim, decidiu
criar uma nova linhagem de encouraçados, com armamento e blindagem superiores e,
acima de tudo, mais rápidos, pois em sua concepção, a velocidade era a principal arma no
combate em mar. Essas mudanças só seriam possíveis com o petróleo. Além de oferecer
maior velocidade e aceleração mais rápida, o óleo admitia o reabastecimento no mar, com
menos energia humana necessária se comparado ao carvão, além de possibilitar um raio de
ação maior. E Churchill tinha consciência disso:
À medida que um navio a carvão usava seu carvão, precisava-se de um
número cada vez maior de homens, que eram retirados das armas para
transportar com pás o carvão de depósitos distantes e incômodos até outros
mais próximos das fornalhas ou até as próprias fornalhas, diminuindo assim
a eficiência do combate do navio talvez no momento mais crítico da batalha
(...) O uso do óleo possibilitava, em qualquer tipo de navio, mais poder de
fogo e mais velocidade contra menos tamanho ou menor custo. (YERGIN,
2009, p. 174)
Entretanto, Churchill criou uma comissão, liderada por Fisher, para avaliar as
questões relacionadas à conversão do carvão para o óleo, como preço, disponibilidade e
segurança do fornecimento. Após o comitê concluir que o óleo combustível era
extremamente mais vantajoso que o carvão, o governo britânico deu início, em 1912, ao
programa naval que seria referido por Churchill como o “mergulho do destino”: a criação de
uma divisão ligeira, a classe Queen Elizabeth, composta de cinco encouraçados movidos
somente a óleo. Posteriormente, mais dois programas navais seriam feitos (1913 e 1914),
com todos os navios movidos somente a óleo, constituindo, em termos de custo e de
mudança de rumo, “o maior acréscimo da história da Armada Real até aquela época”
(YERGIN, 2009, p. 175).
Após o governo britânico decidir que sua armada seria movida a óleo, a autosuficiência energética do país, que era baseada no carvão, fora perdida para sempre, e a
busca por fontes de petróleo estáveis e invulneráveis se tornou uma necessidade vital para
a Grã-Bretanha (MAUGERI, 2006). Havia apenas duas escolhas para o fornecimento de
petróleo: o poderoso Royal Dutch-Shell Group, liderado por Henri Deterding e Marcos
Samuel; e a Anglo-Persian Oil Company, empresa menor e em delicada situação financeira,
que tinha nos campos petrolíferos da Pérsia sua principal atividade, liderada por Charles
Greenway.
19
A Anglo-Persian ofereceu um contrato de abastecimento de 20 anos ao Almirantado,
em troca de uma ajuda financeira do governo inglês. Greenway, que tinha uma rivalidade
intensa com a Royal Dutch-Shell, defendia veementemente a idéia de que, sem a ajuda do
governo, a Anglo-Persian não teria outra saída senão ser absorvida pela empresa de
Deterding e Samuel, que assim teria o monopólio do óleo. Como consequência, a Armada
Real ficaria a mercê da Royal Dutch-Shell, sujeita a preços absurdos de petróleo. Além
disso, Greenway dizia que se a Anglo-Persian fosse absorvida, o governo alemão a
controlaria, uma vez que a Royal Dutch, liderada pelo holandês Deterding, controlava a
Shell, e o governo holandês era suscetível à pressão alemã. As teses de Greenway foram
aceitas por Fisher, e logo depois pelo Ministério das Relações Exteriores, mas não pelo
Almirantado. Porém, após crescerem as dúvidas sobre disponibilidade de petróleo em
outros lugares além da Pérsia, e a pressão de Churchill sobre o Almirantado – que
argumentava que o óleo era indispensável para o acesso do Império Britânico à outras
matérias-primas fundamentais para a economia, como milho e algodão – o Almirantado
mudou de idéia.
Assim, após Churchill conseguir a aprovação do Parlamento, a Anglo-Persian
passou a ter o governo britânico como acionista majoritário – segundo Maugeri (2006), esse
fato marcou pela 1ª vez na história a conexão estratégica entre petróleo, segurança nacional
e poder mundial.
1.3.2) O Conflito
A 1ª Guerra Mundial se iniciou em 28/07/1914. O estopim para o conflito foi o
assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando, herdeiro do Império Austro-Húngaro, e de
sua esposa, a duquesa Sofia de Hohenberg, ocorrido em Saravejo, em 28/06/1914, por um
estudante sérvio pertencente a um grupo nacionalista, que lutava pela unificação dos
territórios que continham sérvios. A guerra foi disputada entre as principais potências
européias, que se dividiram em 2 grupos: a Tríplice Aliança, inicialmente formada por
Alemanha, Império Austro-Húngaro e Itália, e a Tríplice Entente, inicialmente formada por
Rússia, França e Inglaterra. No decorrer do conflito, alterações ocorreram nessas alianças,
como a mudança de lado da Itália, em 1915, a saída da Rússia do conflito, em 1917, e a
entrada dos EUA, como aliados da Tríplice Entente, também em 1917.
Com o início dos combates, veio a revolução causada pelo petróleo nos campos de
batalha, como escreveu Yergin (2009, p. 187): “Durante a 1ª Guerra Mundial, o óleo e o
motor de combustão interna mudaram todas as dimensões do conflito armado, até mesmo o
próprio significado da mobilidade na terra, no mar e no ar.”
20
1.3.2.1) O Petróleo nos Campos de Batalha
Antes da 1ª Guerra, as operações militares em terra eram baseadas nos sistemas
ferroviários e na capacidade muscular de homens e animais: tropas e suprimentos eram
transportados até a extremidade da linha férrea, e a partir dali a movimentação se dava a
cavalo ou a pé. Essas operações estavam, portanto, sujeitas à inflexibilidade dos sistemas
ferroviários e à resistência física dos homens e dos cavalos.
A Alemanha dispunha de uma superioridade em ferro e carvão, e de um sistema
ferroviário bem estruturado e não atribuía importância estratégica ao petróleo; por isso, o
governo alemão acreditava que tomaria o Ocidente de forma rápida e decisiva. Porém, o
petróleo deu sua primeira demonstração de importância estratégica, de uma forma
inusitada, no início de setembro/1914, quando a Alemanha estava prestes a tomar Paris.
Com o exército alemão a apenas 64 km de distância, a cidade evacuada e o comandantechefe do exército francês considerando uma retirada, o governador militar de Paris, general
Joseph Gallieni, recusou-se a entregar a cidade aos alemães e iniciou um contra-ataque.
Apesar do sucesso inicial da ofensiva, as forças francesas precisavam de reforços que,
localizados nos arredores de Paris, estavam impossibilitados de chegarem ao front – o
sistema ferroviário francês fora destruído; os veículos militares disponíveis eram poucos; e,
com a chegada de mais tropas germânicas, não havia tempo para se deslocarem a pé.
Nesse momento crítico, Gallieni viu no motor a combustão interna dos 3 mil táxis de Paris
uma possível solução para a vitória, e decidiu que uma armada de táxis seria organizada
para deslocar milhares de soldados franceses até o front. Assim, de 06 a 08/09, os 3 mil
táxis saíram em comboios de 25 a 50 carros, levando rapidamente milhares de soldados ao
ponto crítico da batalha, sendo decisivos para o fortalecimento da linha francesa e a
conseqüente retirada alemã.
Quando a Alemanha suspendeu a retirada, a 1ª Guerra transformou-se numa guerra
estática de defesa, devido ao uso difundido da metralhadora e das trincheiras. O primeiro a
apresentar uma solução ao impasse da guerra das trincheiras foi o coronel inglês Ernest
Swinton que, juntando seu conhecimento sobre o potencial da metralhadora e experiências
militares com tratores da agricultura, idealizou um veículo militar, de motor de combustão
interna e movido sobre tratores, com blindagem resistente às balas de metralhadora: o
tanque. Essa solução não foi bem vista pelo alto comando inglês. Churchill, pelo contrário,
gostou da idéia, e passou a destinar os fundos da Armada para o desenvolvimento do
veículo. O tanque foi utilizado pela primeira vez na Batalha do Somme, em 1916, e teve
papel fundamental na Batalha de Amiens, em 08/08/1918, dia que seria chamado como o
“dia negro do exército alemão na história da guerra” pelo general Erich Ludendorff (YERGIN,
21
2009, p. 191). A importância do tanque foi tanta que o Alto Comando alemão atribuiu à
introdução deste como a primeira razão para a derrota na guerra.
O carro e o caminhão também foram de extrema importância para a vitória dos
aliados na 1ª Guerra Mundial, superando o bom transporte ferroviário alemão no
deslocamento de tropas e suprimentos. Em 1914, o exército inglês contava apenas com
827 carros a motor; no fim do conflito, a frota militar se expandiu para 56 mil caminhões, 23
mil carros a motor e 34 mil motocicletas e bicicletas motorizadas. Muitos dizem que a vitória
dos aliados sobre a Alemanha foi “a vitória do caminhão sobre a locomotiva” (YERGIN,
2009, p. 192).
Assim como os veículos terrestres, o avião também teve papel de destaque no
conflito. Antes da 1ª Guerra, a aviação não tinha utilização militar. Porém, após o início do
conflito, a situação mudou, como relatou um comentarista da aviação inglesa no início de
1915:
Desde que eclodiu a guerra, o aeroplano fez coisas tão surpreendentes que
até mesmo os menos imaginativos começam a perceber que ele constitui
um grande auxiliar das operações navais e militares, e possivelmente até
mesmo um veículo para uso corrente quando cessa a guerra. (YERGIN,
2009, p. 192)
O aeroplano desempenhou papel militar importante primeiramente nas áreas de
reconhecimento e observação. Logo depois, surgiu o avião de combate e, com ele, os
bombardeios tático e estratégico – o primeiro foi fundamental para o exército inglês devastar
os turcos e conter o avanço alemão no front em 1918, e o segundo foi iniciado pelos
alemães na “primeira batalha da Grã-Bretanha”.
Já no mar, apesar da corrida naval ter sido um dos motivadores do conflito, não
houve muitos confrontos – a Grande Frota Inglesa e a Armada Alemã de alto-mar se
enfrentaram uma única vez, em 31 de maio de 1916, na Batalha de Jutland.
1.3.2.2) O Suprimento Mundial de Petróleo Durante a 1ª Guerra Mundial
O petróleo mudou radicalmente os combates militares, tanto em terra quanto no ar e
no mar. Assim, devido à sua utilização nos campos de batalha, a questão do suprimento de
petróleo foi fundamental para o desfecho da 1ª Guerra.
1.3.2.2.1) O Suprimento dos Aliados
Um pouco antes da 1ª Guerra, a Inglaterra fechara um acordo com a Anglo-Persian,
na qual seria dona de 51% das ações da empresa. Porém, antes de a compra ser finalizada,
o conflito se iniciara e o empreendimento na Pérsia, que em 1914 representava apenas 1%
22
do petróleo mundial, não era prioridade do exército inglês. Apesar disso, a produção de
petróleo persa não sofreu perturbações intensas durante a guerra, representando, no final
de 1916, 1/5 da necessidade de óleo da Armada Inglesa, e aumentando mais de dez vezes
entre 1912 e 1918 – passou de 1,6 mil barris por dia para 18 mil.
Foi durante a guerra que a Anglo-Persian começou a gerar lucros e,
consequentemente, crescer: comprou a British Petroleum, uma das maiores redes de
distribuição de petróleo do Reino Unido e desenvolveu uma frota de petroleiros, passando
de uma empresa que produzia exclusivamente petróleo bruto para uma companhia
integrada de petróleo. Além disso, seu diretor administrativo, Charles Greenway, tinha por
objetivo transformar a Anglo-Persian numa empresa totalmente inglesa, que defenderia
patrioticamente o petróleo do Império Britânico. Greenway não media esforços para atacar a
sua rival, a Royal Dutch-Shell, frequentemente acusando o grupo de deslealdade, por lucrar
com a venda de produtos do petróleo para a Alemanha.
Apesar das acusações, a Royal Dutch-Shell foi peça-chave no fornecimento de
petróleo para a Inglaterra durante a guerra – adquiria e organizava, ao redor do mundo, os
suprimentos para o exército inglês – e foi fundamental para a vitória dos Aliados –
assegurava a entrega dos produtos oriundos de Borneu, Sumatra e EUA no ponto final das
linhas férreas e nos campos de aviação da França. Marcos Samuel, acusado de desleadade
por Greenway, mostrou-se um verdadeiro patriota inglês, ao arquitetar um plano em 1915
para assegurar o fornecimento de explosivos da Inglaterra. No início da guerra, o tolueno,
ingrediente essencial do explosivo TNT, era extraído do carvão, porém a produção mostrouse insuficiente. A Shell possuía uma fábrica que extraía tolueno do petróleo em Roterdam,
na Holanda, que estava sendo utilizada pelo exército alemão para a fabricação de
explosivos; uma equipe, liderada por Samuel, desmontou em uma noite a fábrica peça por
peça, transportando-a para Inglaterra. Mais tarde, a fábrica, junto com outra construída
posteriormente pela Shell, garantiria o fornecimento de TNT para o exército britânico, sendo
responsável pela fabricação de 80% do tolueno utilizado em combate.
Apesar do fornecimento de petróleo vindo da Anglo-Persian e da Royal Dutch-Shell,
a Inglaterra enfrentou uma escassez de petróleo a partir de 1916. Essa crise do petróleo
inglês aconteceu por duas razões principais: a ação dos submarinos alemães movidos a
diesel, que destruíram vários petroleiros (como o John D. Archbold, da Standard Oil of New
Jersey, e o Murex, da Shell); e o aumento exponencial da demanda, devido à utilização
massiva do petróleo nos campos de batalha. Em 1917, a situação era crítica, com os
alemães cada vez mais bem-sucedidos nos ataques de submarinos. Nesse cenário, o
secretário de Estado para as Colônias, Walter Long, constatou a importância do petróleo
23
para a guerra: “Pode-se ter homens, munições e dinheiro, mas se não se tem óleo, que hoje
é a grande força motriz, todas as demais vantagens com que se conta são de pouco valor”
(YERGIN, 2009, p. 198).
Diante da crise, vários comitês e órgãos foram criados, com o objetivo de coordenar
a política do petróleo, como o Poder Executivo do Petróleo. Na França, a crise também
estava grave, e foi criado o Comité Général Du Pétrole, inspirado no Poder Executivo do
Petróleo inglês. Em ambos os países, os EUA e seus navios-petroleiros surgiram como
solução para a crise. Em dezembro/1917, o primeiro-ministro, Geroges Clemenceau, ao ser
advertido que o país poderia ficar sem petróleo em março/1918, fez um apelo ao presidente
americano, Thomas Woodrow Wilson, dizendo que a gasolina era “tão vital quanto o sangue
nas próximas batalhas” (YERGIN, 2009, p. 198). Diante dessa situação, Estados Unidos,
Inglaterra, França e Itália se reuniram em fevereiro/1918, na Conferência de Petróleo
Interaliada, objetivando uma ação conjunta em relação ao suprimento de petróleo dos
aliados. A conferência, aliada ao combate aos submarinos alemães e à contribuição efetiva
da Standard Oil of New Jersey e da Royal Dutch-Shell, fizeram com que os problemas de
suprimento dos países aliados fosse resolvido.
Os EUA passaram então a ser responsáveis por 80% das necessidades bélicas de
petróleo dos aliados. Com isso, a produção americana, que em 1914 era de
aproximadamente 730 mil bpd e correspondia a 65% da produção mundial, passou para 918
mil bpd em 1917, correspondendo a 67% do total mundial. Porém, ao entrar na guerra e
“salvar” os aliados, os EUA se viram diante de um desafio: conciliar as demandas da guerra
com as da sua crescente economia industrial.
Para isso, foi criada em agosto de 1917 a Divisão de Petróleo da Administração do
Combustível, com o objetivo principal de estabelecer uma relação inédita de trabalho entre o
governo e a indústria de petróleo. Atuando em conjunto com o Comitê Nacional de Petróleo
para o Serviço de Guerra (que organizava o suprimento de óleo americano para a 1ª
Guerra), a Divisão de Petróleo criou um novo padrão de colaboração entre governo e
empresa privada, que contrastava com a guerra travada entre o governo e a extinta
Standard Oil, de John D. Rockfeller, há uma década atrás. Apesar de alguns problemas,
como aumento do preço do petróleo – que dobrou entre 1914 e 1918, mas foi controlado
posteriormente – e a restrição de atividades essenciais (como os “Domingos sem gasolina”),
que geraram protestos, os EUA não chegaram a enfrentar uma crise do petróleo.
24
1.3.2.2.2) O Suprimento da Alemanha
Se por um lado os países aliados não sofreram uma crise prolongada de petróleo, o
mesmo não pode se dizer da Alemanha. Após bloqueios dos Aliados, a única fonte de
petróleo possível para os alemães era a Romênia – segundo maior produtor europeu na
época, atrás da Rússia – que tinha declarado guerra contra a Áustria-Hungria e,
consequentemente, contra a Alemanha. O Alto Comando alemão tinha consciência de que a
vitória contra a Romênia era imprescindível para a continuidade da ofensiva alemã, assim
como o Comitê de Guerra do Gabinete Britânico tinha consciência de que não poderia medir
esforços para impedir que os alemães tomassem posse do petróleo romeno.
Com a inevitável vitória alemã nos campos de batalha da Romênia, o governo
britânico decidiu destruir a indústria petrolífera romena. A missão foi dada ao coronel John
Norton-Griffiths, conhecido como “Jack Império”. Segundo Daniel Yergin (2009, p. 204), Jack
Império cumpriu sua missão com sucesso:
O aparato dos campos foi destruído; dinamitaram-se torres; foram tapados
poços com pedras, pregos, lama, correntes quebradas, pedaços de broca e
o que estivesse à mão; os oleodutos foram inutilizados; e enormes tanques
de armazenamento foram incendiados, explodindo com grandes estrondos.
Quando os alemães chegaram, Norton-Griffiths já estava fora de alcance, e havia
deixado um rastro de detruição: cerca de 70 refinarias destruídas e aproximadamente 800
mil toneladas de petróleo bruto e derivados perdidos. A intenção do governo britânico fora
atingida, e a produção de petróleo romeno ficou extremamente debilitada durante todo o ano
de 1917, recuperando-se somente em 1918.
Assim que conseguiu recuperar a produção na Romênia, a Alemanha passou a
vislumbrar outra fonte de petróleo, para tentar reverter a situação na 1ª Guerra: Baku, no
Cáucaso. Inicialmente, os alemães tentaram chegar ao petróleo de Baku pacificamente,
através do Tratado de Brest-Litovsk, assinado com a Rússia revolucionária em março/1918,
que a esta altura já tinha se retirado do conflito. Porém, as forças turcas, aliadas da
Alemanha, avançaram em direção à região petrolífera, e o governo britânico novamente
interveio, enviando uma tropa, que tinha por objetivo impedir que os turcos chegassem ao
petróleo e, se necessário, repetir a façanha de Jack Império na Romênia. A luta entre
ingleses e turcos durou um mês, tempo necessário para enfraquecer a Alemanha ainda
mais. Quando os ingleses se retiraram e os turcos tomaram Baku, “já era muito tarde para
fazer algo em favor dos alemães e de seu suprimento de petróleo” (YERGIN, 2009, p. 204).
25
1.3.3) O Fim do Conflito e a Consagração do Petróleo
A perda de Baku foi um golpe duro para a Alemanha, que não tinha mais opções de
suprimento de petróleo e via suas reservas se esgotarem. Em outubro/1918, a situação era
desesperadora, e a vida da Alemanha na 1ª Guerra estava com os “dias contados”: o
suprimento para a indústria bélica, movida a óleo, esgotaria em dois meses. Diante dessa
situação, em 11/11/1918, a Alemanha se rendeu e o armistício foi assinado. Terminava
assim a 1ª Guerra Mundial.
Dez dias após o fim da guerra, a Conferência de Petróleo Interaliada se reuniu em
Londres, para um jantar, onde o senador Bérenger, diretor do Comité Général Du Pétrole,
resumiu a importância do petróleo, o qual chamava de “o sangue da terra”, no conflito e nos
anos que viriam:
O petróleo foi o sangue da vitória (...) A Alemanha se jactou
demasiadamente de sua superioridade em ferro e em carvão, mas não deu
a devida importância à nossa superioridade em petróleo. Como o petróleo
foi o sangue da terra, ele será do mesmo modo o sangue da paz. Nessa
hora, no início da paz, nossas populações civis, nossas indústrias, nosso
comércio, nossos fazendeiros estão pedindo mais petróleo, sempre mais
petróleo, mais gasolina, sempre mais gasolina. Mais petróleo, sempre mais
petróleo! (YERGIN, 2009, p. 205)
CAPÍTULO 2
O PETRÓLEO E A 2ª GUERRA MUNDIAL
“O petróleo foi um produto indispensável, em todas as suas formas, para as
campanhas aliadas ao redor do mundo. Sem ele, a 2ª Guerra Mundial nunca poderia ter sido
vencida pelos Aliados” (MILLER, 2002). Essa frase de Keith Miller resume a importância do
petróleo no “de longe maior, e provavelmente mais sanguinário, conflito” da história
(BALDWIN, 1959). A guerra, que iniciou-se em 01/09/1939 com a invasão da Polônia pela
Alemanha, foi disputada entre as principais potências mundiais, que se dividiram em 2
grupos: os Aliados, que tinham como principais forças os Estados Unidos, a Grã-Bretanha e
a União Soviética; e o Eixo, liderados pela Alemanha, Itália e Japão.
O petróleo, em suas diversas formas, foi a fonte de produtos bélicos indispensáveis,
como tolueno para as bombas, a borracha sintética para os pneus, o combustível utilizado
nos veículos terrestres (jipes, caminhões, tanques), navios e aviões, além de lubrificantes
para as armas e máquinas.
Enquanto a 1ª Guerra Mundial se caracterizou pela estaticidade, a 2ª Guerra Mundial
se caracterizou pela mobilidade. Devido a isso, muito mais petróleo foi consumido na 2ª
Guerra, como descreve Yergin (2009, p.427 e 428):
Durante a 2ª Guerra, nos momentos de pico, as forças americanas na
Europa usaram 100 vezes mais gasolina do que na 1ª Guerra. A tropa
americana típica, durante a 1ª Guerra, usava 4 mil HP; na 2ª Guerra, 187 mil
HP. (...) cerca da metade da tonelagem total embarcada pelos EUA durante
a guerra foi de petróleo. O Serviço de Inteligência calculava que, quando um
soldado americano partia para combater no exterior, ele necessitava de 30
kg de suprimentos e equipamentos para manter-se, e a metade era de
produtos derivados de petróleo.
Michael Klare (2001 apud FUSER, 2008, p. 41, 42) descreveu a importância do
petróleo para o conflito:
Embora as explosões nucleares em Hiroshima e Nagasaki tenham
determinado o fim da guerra, foi o petróleo que serviu de combustível para
os exércitos que derrotaram a Alemanha e o Japão. O petróleo deu às
forças aliadas uma vantagem decisiva sobre seus adversários, que não
dispunham de fontes seguras desse combustível.
2.1) O Pré-Guerra
Na véspera da 2ª Guerra Mundial, o petróleo já tinha assumido um papel importante
como estratégia militar nas economias modernas. Os EUA eram o “centro de gravidade” da
produção de petróleo do mundo, produzindo 3,6 milhões bpd – o equivalente a mais de 60%
da produção mundial (5,7 milhões bpd). O Oriente Médio ainda estava no início de sua
27
produção, com apenas 330 mil bpd, sendo superado pela União Soviética e pela Venezuela,
que eram, respectivamente, o 2º e 3º maiores produtores mundiais na época. Entretanto,
como fonte de energia, o petróleo ainda era superado significativamente pelo carvão, que
era responsável pelo fornecimento de aproximadamente 80% da energia primária mundial.
Porém, a 2ª Guerra Mundial iria mudar esse panorama e levaria o petróleo ao status de
recurso mais vital da história contemporânea (MAUGERI, 2006).
2.1.1) Na Alemanha
Em 1932, ainda como líder do Partido Nacional Socialista, Adolf Hitler já planejava
chegar ao poder como chanceler da Alemanha e transformá-la novamente numa potência
mundial. Porém, o país possuía mínimas reservas de petróleo. No final da década de 1930,
a matriz energética germânica ainda tinha como carro-chefe o carvão (90%), com o petróleo
correspondendo a cerca de 5%, sendo que a maioria desse óleo era importado,
principalmente do Ocidente. E Hitler sabia que isso era um grande obstáculo às suas
ambições. Por isso, passou a apoiar o programa de combustível sintético da I.G.Farben, a
principal indústria química alemã, que seria fundamental para a máquina de guerra nazista.
Ao chegar ao poder em 1933, o führer começou a construir bombardeiros, aviões de
combate, tanques e caminhões, todos movidos a petróleo.
Hitler, que já tinha a certeza de que o petróleo era crucial para seus planos,
vivenciou um acontecimento que comprovou ainda mais a importância dessa matéria-prima.
Em outubro de 1935, a Itália, liderada por Benito Mussolini, invadiu a Abissínia (hoje
Etiópia). A Liga das Nações impôs sanções econômicas à Itália e ameaçou um embargo às
exportações de petróleo, como modo de tentar frear o ditador italiano. Mussolini sabia que
sem petróleo, seu exército se tornaria inútil e a invasão fracassaria. Apesar das ameaças, o
embargo não aconteceu, e a Abissínia foi conquistada em 1936. Mais tarde, Mussolini
confidenciaria a Hitler que se o embargo tivesse ocorrido, o exército italiano não teria
condições de ficar na Abissínia por mais de uma semana (YERGIN, 2009).
Em 1936, Hitler inaugurou o Plano Quadrienal, que tinha com um dos principais
objetivos reduzir a dependência alemã de petróleo importado, através da produção
acelerada de combustíveis sintéticos.
2.1.2) Na Grã-Bretanha
Em 1937, já prevendo um conflito com a Alemanha, o governo britânico iniciou uma
avaliação em relação ao petróleo disponível para a guerra. Como a maior parte do petróleo
utilizado pelos ingleses era importado, uma corrente do governo passou a considerar a
possibilidade de a Inglaterra extrair óleo do carvão, uma vez que possuía extensas reservas
28
desse mineral. Porém, a estratégia dos combustíveis sintéticos foi rejeitada. Porque o custo
seria mais elevado, uma vez que o país tinha acesso ao petróleo mais barato em todas as
partes do mundo, além de sediar duas grandes companhias internacionais, a Royal DutchShell e a Anglo-Iranian (antiga Anglo-Persian). E também porque, na guerra, as usinas de
hidrogenação seriam alvos mais vulneráveis do que os navios e portos utilizados na
importação de petróleo convencional.
Durante o período de planejamento para a guerra, o futuro do grupo Royal DutchShell ficou indefinido, o que gerou um certo pavor no alto comando britânico, pois a
companhia fora o “quartel-general da Grã-Bretanha para o petróleo durante a 1ª Guerra
Mundial” (YERGIN, 2009, p. 413). Isso porque Henri Deterding, o presidente da companhia,
passou a admirar os nazistas e, particularmente, Hitler, em meados da década de 30. O
fascínio era tanto que em 1935 Deterding iniciou, por conta própria, negociações com o
governo alemão sobre a possibilidade de sua companhia fornecer petróleo a crédito para a
Alemanha, que não vingaram devido à veemente rejeição do conselho do grupo. Ainda
assim, ao se aposentar em 1936, Deterding se mudou para a Alemanha e passou a
cooperar com o regime nazista. Com sua morte, no início de 1939, os nazistas vislumbraram
a possibilidade de tentar tomar o controle da empresa, mas não tiveram sucesso. De acordo
com as normas da empresa, as ações que davam direito ao controle poderiam ficar somente
sob o domínio de diretores – com a morte de Deterding, suas ações foram rapidamente
distribuídas entre outros diretores.
Uma das medidas mais marcantes do governo britânico durante o planejamento para
a 2ª Guerra Mundial foi que as indústrias petrolíferas britânicas deveriam eliminar a
competição entre si no período de guerra – Royal Dutch-Shell, Anglo-Iraniana e a subsidiária
britânica da Standard Oil of New Jersey eram donas de 85% das refinarias e da distribuição
locais – e deveriam cooperar totalmente com o país.
2.1.3) No Pacífico
A partir de 1930, o Japão intensificou sua expansão imperial na Ásia Oriental
(iniciada no final do século XIX) motivado pela opressão econômica que vinha sofrendo –
devido à Grande Depressão e ao colapso do comércio mundial – e pelo espírito nacionalista
extremo pregado pelo exército e por segmentos importantes da sociedade.
Tomados pelo nacionalismo, os militares japoneses passaram a condenar o
liberalismo, o capitalismo e a democracia, defendendo uma doutrina de guerra total.
Entretanto, o Japão possuía mínimos suprimentos de petróleo – no final da década de 1930,
de todo o petróleo consumido no país, a produção interna correspondia a somente 7%, com
29
o restante sendo importado dos EUA (80%) e das Índias Orientais Holandesas [hoje
Malásia, Indonésia e Cingapura] (13%). E os militares nipônicos sabiam que o petróleo era
fundamental para suas pretensões expansionistas. Assim, com o objetivo de dominar a
indústria petrolífera no país, os militares aprovaram em 1934 a Lei Industrial do Petróleo – a
partir dessa lei, o governo passou a controlar importações, fixar preços e estabelecer quotas
no mercado de ações, além de exigir que as empresas estrangeiras mantivessem estoques
acima dos níveis comerciais normais. Simultaneamente, com o objetivo de pressionar as
companhias ocidentais, os japoneses criaram um monopólio de petróleo na Manchúria .
Entretanto, em 1937, o Japão entrou em guerra com a China, e se viu obrigado a
frear sua política de dominação da indústria petrolífera, reatando as relações com as
companhias estrangeiras. Desde o início da Guerra Sino-japonesa, o Japão foi considerado
o vilão da história pelos americanos, que pressionavam o presidente Franklin Roosevelt a
cessar a exportação de equipamentos militares ao Japão. Com a continuidade do conflito, a
pressão aumentava. E, em 1939, a maioria da população apoiava essa posição. Porém, o
presidente buscava uma solução menos enérgica, para não desencadear uma crise no
Pacífico, uma vez que os EUA já estavam se deparando com a ameaça da Alemanha
Nazista.
Em setembro/1940, após o Japão iniciar o avanço sobre a Indochina e,
paralelamente, conduzir um acordo com Alemanha e Itália, Roosevelt cortou toda a
exportação de ferro e aço aos japoneses, mas manteve a de petróleo. O motivo era evitar
uma guerra com o Japão na véspera das eleições presidenciais.
No final de 1940, os japoneses concluíram que, para que a vitória contra a China
fosse possível, precisariam do petróleo das Índias Orientais Holandesas. Mas sabiam que a
frota americana no Havaí significava um grande obstáculo à invasão e, por isso, começaram
a planejar o ataque à Pearl Harbor.
Em meados de 1941, o governo americano ainda debatia sobre um embargo de
petróleo ao Japão. De um lado, o Secretário do Interior Harold Ickes defendia o corte total
das exportações; do outro, o presidente Roosevelt argumentava que a suspensão do
fornecimento levaria os EUA a uma guerra, num momento em que o país já estava se
estava se preparando para outra guerra, a da Europa. Assim, para evitar o embargo e
manter o foco militar no Atlântico, mas tentando frear o avanço japonês na Indochina, o
presidente decidiu pelo congelamento de todas as operações financeiras do Japão nos EUA
em 25/07 – mas que no fim das contas, funcionaria como um embargo sobre o petróleo.
Grã-Bretanha e Holanda seguiram os EUA, congelando os bens japoneses e fazendo um
30
embargo de petróleo. Esse embargo, segundo Samuel Eliot Morison, tornou “a guerra com o
Japão inevitável” (BALDWIN, 1959).
Com o embargo, os estoques de petróleo do Japão começaram a cair drasticamente
e se esgotariam em 2 anos. A partir daí, os japoneses começaram a discutir sobre recuar e
obter uma conciliação com os EUA ou continuar a sua expansão e enfrentar os americanos
em uma guerra. Em outubro/1941, o primeiro-ministro príncipe Konoye, que era a favor da
conciliação, foi substituído pelo ministro da guerra Hideki Tojo, que descartava qualquer
acordo com os EUA. Em novembro, foi realizada uma Conferência Imperial, que aprovou
uma lista de exigências a serem feitas aos EUA para que um conflito não se deflagrasse. Ao
receber a lista de exigências, o governo americano propôs o reatamento do comércio
americano com o Japão, contanto que as tropas japonesas se retirassem da Indochina e da
China. O governo japonês considerou a proposta um ultimato e ordenou que uma forçatarefa, que estava reunida nas Ilhas Kurilas, zarpasse em direção ao Havaí. A guerra no
Pacífico entre EUA e Japão estava prestes a começar.
2.2) As Batalhas do Petróleo
Nos múltiplos fronts da guerra, o petróleo provou ser “a cartada da vitória”, seja nos
ataques e ocupações terrestres, nas campanhas aéreas ou nas batalhas navais (MAUGERI,
2006). Os esforços para conquistar áreas ricas em petróleo e/ou evitar que as tropas
inimigas tivessem acesso a elas foi um dos principais fatores que determinou a estratégia na
2ª Guerra Mundial – campanhas foram decididas ou influenciadas pela disponibilidade de
petróleo das tropas. (BALDWIN, 1959)
2.2.1) Na Europa
Diversas batalhas por petróleo ocorreram na Europa (figura 2.1). Segundo Yergin
(2009), a estratégia básica de guerra alemã, a blitzkrieg (guerra relâmpago), foi moldada
baseado na preocupação de Hitler com o petróleo – os ataques alemães tinham que ser
concentrados, violentos e rápidos, de maneira à alcançar a vitória antes que os problemas
com fornecimento de petróleo surgissem.
No início da guerra, o exército nazista conquistou a Polônia, a Noruega, os Países
Baixos e a França de maneira rápida e fácil, o que fez com que o fornecimento de petróleo
não fosse um problema no início da guerra para a Alemanha – o combustível gasto nas
invasões era consideravelmente inferior às quantidades capturadas.
31
Mesmo após a derrota nas Ilhas Britânicas em meados de 1940, Hitler tinha por
objetivo dominar completamente a Europa, e por isso direcionou seu exército para a União
Soviética.
2.2.1.1) As Batalhas na União Soviética
Diversos são os fatores que motivaram Hitler a invadir a União Soviética, mas podese dizer que o petróleo foi um dos principais, se não o principal. Hitler acreditava que se
tomasse posse das vastas reservas petrolíferas do Cáucaso, seu império se tornaria
invulnerável – assim como os japoneses acreditavam que o petróleo das Índias Orientais e
do Sudeste Asiático era o fator que os tornariam invencíveis. Além disso, os nazistas
consideravam os soviéticos uma ameaça aos campos de petróleo de Ploesti, na Romênia,
aliada da Alemanha. Fora da União Soviética, a maior produção de petróleo da Europa era a
dos campos de Ploesti, e a Alemanha dependia dessa produção – em 1940, 58% das
importações alemãs eram provenientes da Romênia.
Após Stálin ordenar a tomada de uma parte do nordeste da Romênia, usando como
justificativa o pacto Nazi-Soviético de 1939, Hitler concluiu que os campos de petróleo de
Ploesti estavam em perigo, e decidiu invadir a União Soviética. O ataque teve início em
22/06/1941 e, baseando-se no sucesso da blitzkrieg, os nazistas previam mais uma vitória
fácil e rápida. No início, suas previsões foram até superadas, porém os problemas
decorrentes do fornecimento de petróleo logo começaram a surgir. As estradas russas eram
de péssima qualidade e os terrenos eram de difícil acesso, o que fazia os veículos
consumirem mais combustível do que o normal – e os alemães não levaram isso em
consideração no cálculo de suas provisões. Apesar disso, Hitler estava entusiasmado com o
sucesso inicial da campanha e mandou seu exército ir em direção a Criméia e tomar Baku,
enquanto seus generais achavam que deviam direcionar as forças nazistas em Moscou.
Mais tarde, Hitler mudou de idéia e concordou com seus generais, mas essa demora teve
seu preço. A 30 km do Kremlin, o estoque de petróleo e outros suprimentos havia esgotado,
e o exército alemão ficou vulnerável ao inverno que se aproximava e aos contra-ataques
soviéticos, que se iniciaram em dezembro e impediram o avanço alemão.
2.2.1.1.1) A Operação Blau
Apesar do fracasso na tentativa de tomar Moscou, os nazistas planejaram um novo
ataque na União Soviética, que tinha por objetivo tomar o petróleo do Cáucaso, e
posteriormente os campos do Irã, Iraque e Índia – a chamada Operação Blau. Os alemães
sabiam que o petróleo soviético era fundamental para a continuidade da Alemanha na
guerra.
32
No final de julho/1942, os alemães interromperam, na cidade de Rostov, o oleoduto
proveniente do Cáucaso e no início de agosto chegaram a Maikop, a região petrolífera mais
ocidental do Cáucaso. Mas a produção dessa região era pequena e, além disso, os
soviéticos haviam destruído tudo, desde os campos de petróleo até as ferramentas das
oficinas, tornando a produção insignificante – em janeiro/1943, eram extraídos apenas 70
bpd.
A ofensiva alemã continuou e, em meados de agosto, os alemães chegaram ao topo
do Monte Elbrus, o ponto mais alto do Cáucaso e da Europa. Porém, nesse momento, a
escassez de petróleo foi novamente um problema – os alemães até se apossaram dos
tanques russos, mas estes continham diesel, inúteis para a divisão blindada alemã que,
movida a gasolina, ficou dias parada à espera de combustível. Os caminhões responsáveis
pelo reabastecimento não chegavam por falta de combustível para eles próprios. A situação
era tão desesperadora que o petróleo começou a ser transportado no dorso de camelos.
Assim, devido ao problema do suprimento de petróleo, a operação fracassou. “A ironia da
Operação Blau estava em que os alemães ficaram sem petróleo em sua busca pelo
petróleo” (YERGIN, 2009, p.376).
2.2.1.1.2) A Batalha de Stalingrado
Os alemães também enfrentaram o problema da escassez de petróleo na Batalha de
Stalingrado. O alto comando militar queria que as tropas do Cáucaso se movessem para o
front, mas Hitler ainda tinha a intensão de tomar o petróleo de Baku, pois acreditava que se
isso não acontecesse, a guerra estaria perdida. Quando o führer deu a ordem para as tropas
saírem do Cáucaso e partirem para Stalingrado, já era tarde. No início de fevereiro/1943, o
exército alemão estava encurralado e sem recursos – e principalmente, sem petróleo – o
que levou à sua rendição. Com a primeira derrota na guerra, os alemães passaram para a
defensiva. Era o fim da fase do blitzkrieg.
2.2.1.2) A Batalha do Bulge
Acuada e quase sem petróleo após a derrota na União Soviética, a Alemanha partiu
para sua última tentiva de mudar sua situação na guerra em 16/12/1944, nas florestas de
Ardennes, a leste da Bélgica e de Luxemburgo, na chamada Batalha de Bulge. Depositando
todas suas forças e suprimentos restantes nesse ataque, e utilizando a surpresa como maior
arma, os nazistas tiveram êxito no início, avançando sobre as linhas inimigas, mas logo a
escassez de petróleo impediu a continuidade do avanço.
Porém, nessa batalha, os alemães estiveram pertos de causar uma reviravolta na
guerra. Em 17/12, o coronel alemão Jochem Peiper e sua unidade Panzer, ao avançarem
33
sobre a área de Stavelot, no leste da Bélgica, chegaram a 300 m do “maior depósito de
combustível dos Aliados e certamente o maior posto de abastecimento da Europa” – 9
milhões de litros estavam estocados lá, além de 2 milhões de mapas rodoviários, e as
estradas a redor continham centenas de milhares de latões de combustível (YERGIN, 2009,
p. 390). Ao verem os nazistas se aproximando, um grupo de soldados aliados ateou fogo
num poço em uma tentativa desesperada de impedir o avanço das tropas alemães,
formando uma pequena parede de chamas; Peiper, que possuía mapas desatualizados e
por isso não tinha conhecimento do depósito, ordenou que sua unidade seguisse em outra
direção. Mais tarde, por ironia do destino, a unidade alemã ficou sem combustível e foi
capturada. Yergin (2009, p. 390) definiu o acontecimento da Batalha de Bulge como “um
daqueles incidentes de batalha com conseqüências monumentais”:
As provisões de combustível em Stavelot eram equivalentes às
necessidades dos primeiros 10 dias de toda a ofensiva alemã em Ardennes;
a sua captura teria dado aos alemães o combustível para prosseguirem em
direção a Antuérpia e ao canal da Inglaterra, no momento em que os aliados
ainda estavam vacilantes por efeito da desorganização e confusão.
2.2.2) Na África
Em fevereiro de 1941, tropas germânicas foram enviadas para o norte da África para
somar forças a uma tropa italiana, que estava sendo derrotada pelo exército britânico (figura
2.1). Liderados pelo general Erwin Rommel, as tropas alemãs, conhecidas como Afrika
Korps, tiveram êxito no início, avançando por mais de 500 km e fazendo as forças britânicas
recuarem. Rommel não tinha por objetivo principal ajudar os italianos, mas sim conquistar o
Cairo e o canal de Suez, depois Palestina, Iraque e Irã, e finalmente Baku e suas reservas
petrolíferas. Rommel estava travando uma guerra de movimento – avançava rapidamente e
por longas distâncias – o que exigia vastos estoques de petróleo.
Porém, ao avançarem rapidamente, os nazistas criaram um problema para si
próprios – as vias de reabastecimento do exército se tornaram muito longas, e os caminhões
de combustível, encarregados do reabastecimento dos veículos militares, gastavam mais
gasolina para ir ao front e voltar do que transportavam em seus tanques. Além disso, os
navios e aviões com suprimentos estavam sendo atacados pela Marinha Real e pela Real
Força Aéra Britânica (RAF), que fizeram uma base na ilha mediterrânea de Malta, ao largo
da costa da Líbia. Depois de longos conflitos – como as duas Batalhas de El Alamein e a
Batalha de Alan Halfa – os alemães, sem petróleo, foram obrigados a recuar e,
posteriormente, se render.
34
Após a morte de Rommel, foram encontradas anotações suas sobre as batalhas no
norte da África e, numa delas, o general alemão definira a importância do petróleo nos
conflitos:
O homem mais corajoso nada pode fazer sem armas, nada vale sem fartura
de munição, e tanto armas como munição têm pouca valia em uma guerra
móvel, a menos que haja veículos com petróleo em quantidade para
transportá-las. (YERGIN, 2009, p.383 e 384)
Figura 2.1 – Mapa da 2ª Guerra Mundial na Europa e no Norte da África.
Fonte: Yergin (2009, p. 378).
2.2.3) No Atlântico
O grande problema do esquema de suprimento de petróleo americano para a GrãBretanha eram as grandes extensões que os petroleiros e cargueiros tinham que navegar no
Atlântico, o que transformou esses navios em alvos fáceis para os submarinos alemães Uboat na chamada Batalha do Atlântico.
Já no início de 1941, a campanha dos submarinos alemães causou grandes perdas
que, somadas à crescente demanda gerada pela guerra, fizeram com que os estoques de
petróleo britânico chegassem a um nível crítico. Em julho do mesmo ano, a Marinha Real
tinha combustível para apenas mais dois meses de combate, sendo que o nível de
35
segurança era de 7 meses, e os estoques de gasolina eram suficientes para apenas 5
semanas.
Com o objetivo de combater os submarinos alemães, as forças militares americanas
estabeleceram bases em diversas partes do Atlântico, como Terra Nova, Groelândia,
Islândia e Bermudas. Com a ajuda dos britânicos, que decifraram os códigos navais
alemães e passaram a organizar comboios contras os U-boat‟s, os níveis dos estoques
britânicos deixaram de ser críticos, pelo menos temporariamente.
No decorrer de 1942, a Batalha do Atlântico se mostrava cada vez mais desastrosa
para os Aliados – ¼ da tonelagem dos petroleiros americanos fora destruída e em dezembro
a Grã-Bretanha possuía combustível para apenas mais 2 meses. Isso porque os alemães
alteravam seus códigos secretos, tornando-os indecifráveis, e conseguiam decifrar os
códigos dos inimigos. Além disso, os submarinos U foram aperfeiçoados – passaram a
operar com um maior raio de ação, maior capacidade de imersão e um sistema de
comunicação avançado – e grandes submarinos de abastecimento, os chamados Milchkuhs,
foram agregados à frota nazista.
Porém, no início de 1943, a situação mudou. Os Aliados passaram a decifrar os
códigos inimigos, ao passo que tornaram seus códigos indecifráveis. Paralelamente,
começaram uma contraofensiva que contava com radares aperfeiçoados e comboios
marítimos extremamente coordenados e precisos, além de aviões de longo alcance. Como
resultado, 30% dos submarinos alemães foram abatidos somente no mês de maio. Os
nazistas não tiveram outra alternativa senão bater em retirada em 24/05/1943. Assim, após
45 meses, terminava a Batalha do Atlântico.
2.2.4) No Pacífico
“No Pacífico, o petróleo – combustível para os navios e gasolina para os aviões – foi
o sangue da vitória” (BALDWIN, 1959).
2.2.4.1) Pearl Harbor
Na manhã de 07/12/1941, o Japão iniciou o bombardeio à Pearl Harbor, a base
americana no Havaí (figura 2.2). O ataque surpreendeu o governo dos EUA, que acreditava
que o Japão iria atacar o Sudeste Asiático, ou mesmo a União Soviética. O Japão havia
utilizado a mesma estratégia na Guerra Russo-Japonesa – iniciaram o conflito com um
ataque-surpresa sobre a frota russa em Port Arthur.
Os japoneses atacaram Pearl Harbor para que a invasão às Índias Orientais e ao
restante do Sudeste Asiático não fosse comprometida pela frota americana e, ao mesmo
36
tempo, para proteger as rotas marítimas – em especial, as rotas dos petroleiros que saíam
de Sumatra e Bornéu com destino às ilhas de base. Os resultados do ataque para os EUA
foram assustadores – “o choque mais devastador da história da América” (YERGIN, 2009, p.
365) – 8 encouraçados, 3 cruzadores, 3 destróires e 4 embarcações auxiliares afundados;
centenas de aviões destruídos; e 2.335 soldados e 68 civis mortos. Em contraste, o Japão
perdeu apenas 29 aviões. Com o ataque à Pearl Harbor, a guerra entre EUA e Japão se
iniciou.
Apesar do sucesso do ataque, os japoneses falharam em relação a um fator, talvez o
mais importante: o petróleo. Os japoneses, apesar da intensa e meticulosa preparação, não
planejaram atacar os estoques de petróleo da ilha de Oahu, o que foi um erro dos mais
graves. Considerando as reservas de combustíveis e os tanques de armazenamento, Pearl
Harbor continha cerca de 4,5 milhões de barris. Se os japoneses tivessem destruído essas
reservas, toda a frota americana da ilha ficaria imobilizada – uma vez que só poderiam obter
novos suprimentos de petróleo na Califórnia, muito distante – e a guerra poderia ter sido
prolongada por mais 2 anos (YERGIN, 2009).
Paralelamente aos ataques ao Havaí, os japoneses bombardearam Hong Kong,
Cingapura, Filipinas e as ilhas de Wake e Guam, invadiram a Tailândia e se preparavam
para invadir as Índias Orientais. Segundo Yergin (2009), toda essa campanha ofensiva tinha
os campos de petróleo das Índias Orientais como principal alvo.
2.2.4.2) A Batalha de Balikpapan
Um dos principais objetivos dos japoneses na 2ª Guerra era tomar posse do centro
refinador de petróleo de Balikpapan (um dos maiores centros do grupo Royal Dutch-Shell) e
dos campos de petróleo ao seu redor, em Bornéu, nas Índias Orientais Britânicas (figura
2.2). Os diretores da Royal Dutch-Shell sabiam disso e, antes mesmo do ataque à Pearl
Harbor, o complexo já possuía planos de evacuação e abrigos antiaéreos.
No início de 1942, as forças japonesas estavam se aproximando de Bornéu e as
primeiras ordens para a destruição dos campos de petróleo foi dada.
Arrancavam a tubulação, cortavam-na em pedaços, e colocavam-na de
volta dentro dos poços junto com bombas, bielas, parafusos, porcas e
brocas de perfuração que estivessem à mão e, além disso, jogavam uma
lata de TNT em cada poço. Os poços explodiam. (YERGIN, 2009, p.393)
Paralelamente, a demolição da refinaria fora planejada. Em 20/01/1942, com as
frotas nipônicas a menos de um dia de Balikpapan, iniciou-se a destruição. O depósito de
minas, o cais e os imensos tanques de armazenamento de petróleo foram detonados. Em
37
menos de um dia, os petroleiros de Bornéu destruíram 40 anos de construção industrial
(YERGIN, 2009).
No dia 24/01 aconteceu a Batalha de Balikpapan, a primeira entre EUA e Japão no
mar. Apesar das perdas no conflito – 4 destróires americanos destruíram 4 transportadores
de tropas nipônicos e um barco-patrulha – os japoneses tomaram toda a ilha de Bornéu.
Apesar das destruições de reservas de petróleo em Balikpapan e em outras
localizações das Índias Orientais, o Japão conquistou, em menos de 3 meses, todo o
Sudeste Asiático e seus recursos – em particular o petróleo, principal motivo da entrada do
Japão na guerra (YERGIN, 2009).
2.2.4.3) A Batalha de Midway
Com o sucesso da campanha japonesa, os EUA, que ainda se recuperavam do
ataque à Pearl Harbor, começaram a traçar a estratégia para combater o Japão no pacífico.
O principal objetivo era bloquear as rotas por onde o petróleo do Japão era transportado.
Os militares japoneses, cientes do poderio americano, sabiam que tinham que atacar
rapidamente para alcançarem a vitória. Assim, em junho/1942, iniciaram um ataque à Ilha de
Midway, localizada a 2.000 km do Havaí (figura 2.2). Porém, foram surpreendidos pela
rápida recuperação da marinha norte-americana, que saiu vitoriosa do conflito. Segundo
Yergin (2009, p.397), “Midway foi o verdadeiro momento decisivo da guerra do Pacífico, o
fim da ofensiva japonesa”.
2.2.4.4) A Batalha de Marus
O Japão considerava as Índias Orientais a sua fonte de petróleo para a guerra – os
estoques japoneses eram suficientes para apenas 2 anos de combate. Porém, a frota
mercante responsável pelas conexões entre as Índias Orientais e o país se mostrou
extremamente vulnerável aos submarinos americanos, o que foi considerado por muitos
historiadores o “calcanhar de Aquiles do Japão” (YERGIN, 2009).
Apesar dos esforços dos militares nipônicos em tentar combater os submarinos
americanos através de comboios, o resultado da chamada Batalha de Marus foi desastroso
para o Japão – 86% de sua frota foi afundada e outros 9% foram seriamente avariados,
sendo os petroleiros japoneses o principal alvo da marinha americana. A partir da Batalha
de Marus, o Japão começou a sofrer as conseqüências da falta de petróleo.
38
2.2.4.5) A Batalha das Ilhas Marianas
A escassez de petróleo obrigou os militares japoneses a mudar suas estratégias de
combate, o que resultou em perdas significativas para o Japão. Durante a batalha pelas
Ilhas Marianas, em junho de 1944, a frota japonesa ficou imobilizada pela falta de
combustível e as esquadrilhas aéreas, com o objetivo de poupar combustível, atacaram os
americanos em linha reta em vez de círculos. Resultado: 273 aviões japoneses abatidos,
contra apenas 29 americanos, e o perímetro de segurança interna do Japão penetrado.
2.2.4.6) A Batalha das Filipinas
No dia 15/09/1944, americanos e japoneses se enfrentaram na “maior das batalhas
na história das guerras marítimas” (BALDWIN, 1959), a Batalha das Filipinas, e a falta de
petróleo mais uma vez pesou contra o Japão. Enquanto alguns encouraçados nipônicos
nem entraram no conflito pela falta de combustível, outros se moveram vagarosamente,
para economizar combustível, e chegaram atrasados. E num momento em que o curso da
batalha poderia ter sido revertido para o Japão, o petróleo decretou a derrota japonesa – a
frota estava prestes a entrar no golfo Leyte, próximos às Ilhas Filipinas, porém foi obrigada a
bater em retirada devido à falta de combustível.
Foi nesse cenário de escassez de petróleo e economia de combustível a qualquer
custo que surgiram os Kamikazes – pilotos japoneses suicidas que arremessavam seus
aviões contra os navios americanos.
2.2.2.7) A Batalha de Okinawa
Praticamente sem petróleo, a marinha nipônica elaborou uma missão suicida. Com o
objetivo de impedir a conquista da ilha de Okinawa pelos americanos, os japoneses
planejaram uma Força Especial de Ataque, que teria como trunfo o Yamato, “o maior navio
de guerra do mundo e o orgulho da frota nipônica”, mas que teria combustível somente para
a ida.
A frota partiu para a missão no dia 06/04/1945, totalmente desprovida de suporte
aéreo, uma vez que os aviões disponíveis estavam sendo utilizados na campanha
Kamikaze. No dia 07/04, 300 aviões americanos afundaram o Yamato e a maioria dos
outros navios, impedindo a missão suicida de ter qualquer sucesso e marcando “o fim da
Marinha Imperial” (YERGIN, 2009, p. 405 e 406).
39
Figura 2.2 – Mapa da 2ª Guerra mundial no Pacífico.
Fonte: Yergin (2009, p. 402).
2.3) Inovações Relacionadas ao Petróleo Feitas Durante o Conflito
Devido à magnitude do petróleo no conflito, várias inovações foram feitas pelos
Aliados, como um sistema especial portátil para o transporte de petróleo para os fronts,
desenvolvido pela Royal Dutch-Shell, que continha bombas de sucção, o qual substituiu o
transporte por caminhões; e também a substituição dos latões com capacidade para 10
galões de gasolina pelos de 5 galões, que já eram utilizados pelos nazistas e por serem
mais leves, permitiam uma maior mobilidade.
Mas as maiores inovações feitas foram a construção de dois oleodutos nos EUA (o
Big Inch e o Little Inch) e a utilização da gasolina de aviação de 100 octanas, ao invés das
tradicionais de 75 ou 87 octanas, além do PLUTO (Pipeline Under the Ocean).
2.3.1) A Construção do Big Inch e do Little Inch
Em 11/12/1941, 4 dias após o ataque japonês a Pearl Harbor, a Alemanha declarou
guerra aos EUA, e os submarinos U passaram a atacar os petroleiros americanos. No
primeiro trimestre de 1942, os alemães afundaram o equivalente a 4 vezes o número de
petroleiros construídos. Para atenuar essa situação, comboios passaram a ser feitos ao
longo da Costa Leste. Porém, o governo americano sabia que tinha que diminuir a
quantidade de petróleo transportada via navios, pois caso contrário os estoques americanos
40
iriam chegar a níveis críticos. Como o transporte ferroviário não era uma alternativa devido
ao seu alto custo, a solução encontrada foi a construção de um oleoduto, chamado de Big
Inch (Grande Polegada), que se estenderia por 2.000 km, do Texas à Costa Leste. Sua
construção se iniciou em agosto/1942 e foi considerada por Yergin “um dos marcos
extraordinários da engenharia na 2ª Guerra Mundial”:
Nada semelhante havia sido feito antes. As transportadoras de petróleo e as
indústrias de construção foram mobilizadas para construir um oleoduto que
teria a capacidade de transportar 5 vezes mais petróleo que o convencional,
um duto que iria estender-se pela metade do país e exigir uma pletora de
equipamentos recém-desenhados. (YERGIN, 2009, p. 420)
No final de 1943, o Big Inch já era responsável pela metade do suprimento de todo o
petróleo bruto da Costa Leste. Entre abril de 1943 e março de 1944, outro oleoduto foi
construído, o Little Inch (Pequena Polegada), que se extendia por 2,3 mil km e transportava
gasolina e outros produtos refinados do sudoeste para a Costa Leste. Juntos, os dois
oleodutos responderam por 42% do transporte do petróleo americano no final de 1944.
Segundo Miller (2002), os dois oleodutos tiveram um papel importante na vitória dos
Aliados – um exemplo disso foi a grande quantidade de óleo cru e refinado que foi
transportada nos oleodutos e foram enviadas para a Europa para serem utilizados na
invasão da Normândia, no famoso Dia D.
2.3.2) A Utilização da Gasolina de 100 Octanas
O combustível de 100 octanas, desenvolvido na década de 1930 pela Royal DutchShell, fornecia maior velocidade de partida, decolagens mais rápidas, maior potência, maior
alcance, poder de manobras mais apurado e mais economia, se comparado aos
combustíveis tradicionais de 75 ou 87 octanas. A superioridade desse combustível foi
comprovada na Batalha da Grã-Bretanha em 1940.
Com o aumento da demanda, os EUA, que eram responsáveis por quase 90% do
fornecimento, lançaram um programa para a produção em larga escala da gasolina de 100
octanas – “um dos maiores e mais complexos empreendimentos industriais feitos na guerra”
(YERGIN, 2009, p. 429). Várias unidades de craqueamento catalítico – que tinha sido
descoberto no final de 1930, pelo francês Eugene Houdry e pela Sun Oil, e tinha a facilidade
na produção da gasolina de 100 octanas uma das principais vantagens em relação ao
craqueamento térmico – foram construídas em tempo recorde, e muitas das outras fábricas
já existentes foram convertidas. Além disso, um verdadeiro monopólio de gasolina de
aviação foi formado, com o objetivo de maximizar a produção. Como resultado, os EUA
conseguiram acompanhar a demanda, que em 1945 era 7 vezes maior do que o previsto no
41
início do conflito, e produziram 514 mil bpd de gasolina de 100 octanas no último ano da
guerra. Como comparação, em 1940, a produção era inferior a 40 mil bpd.
2.3.3) PLUTO
Porém, nem todas as inovações foram bem sucedidas. O maior exemplo disso foi o
Pipeline Under the Ocean (oleoduto submarino), um sistema aquático de oleodutos
projetado para ligar o lado britânico do canal da Mancha ao francês. O PLUTO, como ficou
conhecido, tinha como objetivo fornecer metade do combustível necessário para o avanço
aliado através da França em direção à Alemanha. Entretanto, vários problemas técnicos
ocorridos durante sua instalação fizeram com que o PLUTO fosse um fracasso – de junho a
outubro de 1944, foram transportados no oleoduto apenas 150 mil bpd.
2.4) O Suprimento de Petróleo Durante a 2ª Guerra Mundial
“A logística da 2ª Guerra foi concentrada nos produtos do petróleo. A guerra
começou e terminou com grandes esforços em manter o sangue da guerra – o petróleo –
correndo nas veias das máquinas de guerra” (BALDWIN, 1959).
2.4.1) O Suprimento da Alemanha
Em 1939, quando a 2ª Guerra Mundial se iniciou, a Alemanha possuía 14 fábricas de
hidrogenação, sendo que mais 6 estavam sendo construídas. Em 1940, 72.000 bpd de
combustíveis sintéticos eram produzidos, correspondendo a 46% do fornecimento total do
combustível alemão. Essa produção era ainda mais fundamental no campo militar: 95% da
gasolina de aviação utilizada pela Luftwaffe, a Força Aérea Alemã, era proveniente da
hidrogenação.
Com as derrotas na União Soviética e no norte da África, o petróleo de Baku deixou
de ser uma opção para Hitler, que então voltou suas atenções para a produção de
combustíveis sintéticos. Novas tecnologias de produção e melhores catalisadores foram
empregados, possibilitando utilizar uma maior variedade de tipos de carvão como matériaprima, o que proporcionou um significativo avanço – a produção passou de 72.000 bapd em
1940 para 124 mil bpd em 1943. No primeiro trimestre de 1944, 92% da gasolina de aviação
utilizada pelos nazistas era proveniente dos combustíveis sintéticos, assim como 57% do
abastecimento total. Segundo Yergin (2009), os combustíveis sintéticos foram responsáveis
por metade da produção total de petróleo da Alemanha durante a 2ª Guerra Mundial.
A partir de maio/1944, os Aliados passaram a atacar a indústria de combustíveis
sintéticos alemã – anteriormente, estavam atacando outros alvos, como a indústria de
aviação, estações ferroviárias e fábricas de rolamentos, sem prejudicar significativamente a
42
máquina de guerra nazista. Os ataques se iniciaram em 12/05/1944 e se mantiveram
constantes durante maio e junho. Devido a isso, o Alto Comando nazista ordenou operações
de reconstrução e fragmentação das unidades – deveriam ser reconstruídas em lugares
escondidos e menores, para ficarem mais protegidas, como no subsolo, pedreiras e nos
escombros das fábricas destruídas. Apesar do esforço germânico, os ataques aéreos foram
implacáveis, e a produção de combustível sintético começou a declinar: passou de 92.000
bpd em maio para apenas 5 mil bpd em setembro. Os ataques afetaram principalmente a
Luftwaffe – a produção de gasolina de aviação em setembro/1944 foi de 3.000 bpd, fazendo
a companhia aérea operar com apenas 10% do mínimo de gasolina exigida. Com isso, não
havia combustível para os caças alemães, recém-inventados, protegerem as fábricas de
hidrogenação, o que fez a produção cair ainda mais. Ao mesmo tempo, os campos de
petróleo de Ploesti, na Romênia – a principal fonte de petróleo bruto dos nazistas – foram
capturados pela União Soviética.
Com o fracasso na Batalha de Bulge, a Alemanha estava praticamente sem petróleo.
Em fevereiro/1945, menos de 500 t de gasolina de aviação foram produzidas; em março,
apenas 40 t e em abril a produção cessou. A situação era desesperadora, como relatou
Baldwin (1959): “A força aérea alemã permaneceu no chão devido aos tanques vazios (...)
veículos terrestres passaram a ser movidos para o front por bois”. Diante desse cenário, a
derrota de Hitler foi apenas uma questão de tempo.
A escassez de petróleo não foi a única responsável pela derrota da Alemanha, mas
mesmo se o país não tivesse sofrido um colapso geral na primavera de 1945, a falta de
petróleo teria feito a máquina de guerra nazista parar posteriormente (BALDWIN, 1959).
2.4.2) O Suprimento do Japão
Apesar da destruição das reservas petrolíferas das Índias Orientais pelos Aliados no
início da ofensiva japonesa – Balikpapan pela Royal Dutch-Shell e Sumatra pela Stanvac os japoneses conseguiram restaurar a indústria petrolífera da chamada Zona Sul. Em 1940,
antes da destruição, a produção anual foi de 65,1 milhões de barris. Em 1942, já tomada
pelo Japão, essa região produziu apenas 25,9 milhões. Porém, em 1943, os japoneses
conseguiram produzir 49,6 milhões de barris – 75% do nível de 1940. No primeiro trimestre
de 1943, o Japão importou 80% a mais de petróleo que no mesmo período de 1941.
Para melhorar ainda mais a situação dos seus estoques de petróleo, os japoneses
encontraram uma vasta reserva de petróleo na Sumatra Central em 1943, a estrutura Minas.
Antes da deflagração da guerra, a Caltex, parceira da Standard Of California e da Texaco no
hemisfério leste, tinha conhecimento do potencial dessa jazida e mandou para lá todo o
43
aparato necessário para a perfuração, inclusive uma plataforma. Os japoneses, utilizando os
equipamentos da Caltex, perfuraram um poço exploratório – o único poço perfurado, em
zona pouco explorada, em toda a 2ª Guerra Mundial – e descobriram a maior reserva
existente entre a Califórnia e o Oriente Médio (YERGIN, 2009).
Porém, após a Batalha de Marus, a situação do Japão em relação ao petróleo
mudou drasticamente. A partir de 1943, cada vez mais petroleiros foram afundados, o que
teve consequência direta nas importações de petróleo. Com as perdas superando
significativamente a quantidade de navios construída, a importações caíram pela metade no
primeiro trimestre de 1944, comparadas ao mesmo período em 1943, e cessaram em 1945.
Diante do sucesso dos ataques dos Aliados, os japoneses tentaram diversas
improvisações para evitar uma escassez de combustível: transportaram petróleo em
tambores, recipientes de fibra, sacos de borracha e até mesmo em seus próprios
submarinos, além de forçar uma troca com os submarinos alemães (petróleo pelo acesso às
oficinas de reparo japonesas). O programa de combustíveis sintéticos, iniciado em 1937,
falhou, principalmente pela falta de aço, equipamentos e recursos humanos – em 1943,
somente 1 milhão de barris de combustíveis sintéticos foram produzidos, o equivalente a 8%
da marca de 14 milhões estabelecida no início do programa.
No decorrer de 1944, a crise de petróleo se intensificou, e os militares sofriam as
conseqüências cada vez mais. A esquadrilha aérea japonesa passou a utilizar gasolina
extraída da terebintina e misturada com álcool e o treinamento de pilotos foi gradativamente
eliminado. Na marinha, um princípio primário de estratégia militar – nunca dividir suas forças
frente a um inimigo superior – teve que ser violado devido à falta de petróleo. Uma parte da
tropa ficou estacionada no Japão, utilizando o combustível restante, e a outra em Cingapura,
à espera dos suprimentos das Índias Orientais – o que facilitou o avanço das forças aliadas.
Havia um abismo gigantesco entre a quantidade de petróleo utilizada pelo Japão e
pelos EUA. No segundo semestre de 1944, enquanto 120 mil barris de gasolina de aviação
eram enviados por dia para Guam, a maior base americana no Pacífico, toda a força aérea
japonesa consumia apenas 21 mil bpd. O que os japoneses utilizavam em todas as suas
frentes de batalha, os americanos possuíam 6 vezes mais, em apenas uma de suas bases.
A situação era tão desesperadora que alguns navios japoneses foram convertidos para
queimar carvão, o que garantiu segurança de combustível, mas resultou em perda de
velocidade e flexibilidade.
A população japonesa também sentiu as conseqüências da falta de petróleo: em
1944, o consumo de gasolina reduziu-se a apenas 4% do total de 1940 (257 mil barris).
44
Veículos a gasolina foram reequipados com combustores de carvão vegetal e lenha.
Passou-se a extrair óleo de soja, amendoim, coco e mamona para uso industrial, e até
estoques de batata, açúcar, vinho de arroz e saquê foram convertidos em álcool
combustível. Muitos livros foram queimados para servirem de combustível para o inverno de
1944-1945, assim como ruínas carbonizadas de cidades bombardeadas foram utilizadas
para cozinhar alimentos.
A situação era cada vez mais crítica para o Japão. No início de 1945, as ilhas de
Manila, nas Filipinas, e Iwo Jima foram reconquistadas pelos EUA, assim como Burma (atual
Mianmar) pelos ingleses. Além disso, os japoneses tiveram que abandonar o porto
petrolífero de Balikpapan, nas Índias Orientais.
Após a derrota na Batalha de Okinawa, desesperados pela falta de petróleo, os
japoneses lançaram uma campanha para extrair combustível de raiz de pinheiro. A
campanha foi um fracasso, com apenas 3 mil barris de gasolina de aviação extraídos do
óleo de raiz de pinheiro ao final da guerra, e nenhuma evidência que essa gasolina fora
realmente utilizada. (YERGIN, 2009).
Além dessa fracassada campanha, os japoneses tentaram negociar com a Stálin a
exportação do petróleo soviético. Porém, um acordo já tinha sido feito entre a União
Soviética e os Aliados. Em troca de concessões territoriais – Manchúria, Ilhas Kurilas e parte
das Ilhas Sakhalinas – Stálin declarou guerra ao Japão.
Apesar da falta de petróleo evidente – os estoques de petróleo, que em abril/1937
estavam no nível de 29,6 milhões de barris, estavam em apenas 800 mil barris em julho – e
da destruição causada pelos cada vez mais bem sucedidos ataques americanos, o Alto
Comando japonês rejeitava a rendição, defendendo o slogan “100 milhões de pessoas
unidas e dispostas a morrer pela nação”. Porém, após o lançamento das bombas atômicas
em Hiroshima e Nagasaki e a crescente ameaça soviética, o Japão se rendeu em
15/08/1945, encerrando a guerra no Pacífico.
2.4.3) O Suprimento dos Aliados
2.4.3.1) A Organização da Indústria Petrolífera Britânica
Com o início da guerra, uma cooperação entre governo e indústria petrolífera foi
colocada em prática rapidamente na Grã-Bretanha. Um verdadeiro monopólio nacional foi
criado – todas as companhias britânicas incorporaram suas produções à Petroleum Board,
as bombas foram pintadas de verde-escuro e o petróleo passou a ser comercializado sob a
marca única “Pool”, sob o controle da Shell-Mex House.
45
Antes da invasão da França, a Grã-Bretanha oferecera US$ 60 milhões à Romênia,
em troca da destruição de seus campos de petróleo, com o objetivo de impedir que os
alemães tomassem posse do petróleo romeno – assim como foi feito na 1ª Guerra. Porém,
as partes não chegaram a um acordo, e Hitler tomou posse da Romênia.
Em 1940, com os alemães prestes a conquistar o canal da Mancha, após terem se
apossado dos estoques de petróleo da França, o governo britânico elaborou planos para
destruir seus próprios estoques. Paralelamente, 17.000 postos de gasolina a leste e sudeste
do país foram rapidamente fechados e as vendas e estocagem de combustível passaram a
se concentrar em apenas 2.000 postos.
2.4.3.2) A Organização da Indústria Petrolífera Americana
Assim como na 1ª Guerra Mundial, os EUA e sua vasta produção de petróleo – no
início da década de 1940, a produção americana correspondia a quase 2/3 da produção
mundial (YERGIN, 2009) – seriam a garantia de suprimento de petróleo para a GrãBretanha.
Devido ao sistema de rateio federal – criado durante a década de 1930, em função
da produção descontrolada do leste do Texas que desestabilizou a indústria petrolífera
americana – os EUA possuíam uma capacidade de produção extra, de aproximadamente 1
milhão bpd, o equivalente a 30% da produção em 1941 (3,7 milhões de bpd). Segundo
Yergin (2009, p. 415), essa capacidade extra “revelou-se uma margem de segurança
valiosa, um recurso estratégico de imensa importância”, sem a qual “o curso da 2ª Guerra
poderia ter sido muito diferente”. Assim, apoiado pela Lei de Empréstimo e Arrendamento
(Lend Lease), os EUA começaram a abastecer a Grã-Bretanha: já na primavera de 1941, 50
petroleiros americanos, destinados ao abastecimento da Costa Leste, foram desviados para
a Grã-Bretanha.
Para organizar a indústria petrolífera americana para a guerra, o secretário do
Interior, Harold Ickes, foi nomeado Coordenador do Petróleo para a Defesa Nacional.
Primeiramente, Ickes teve que mudar o relacionamento conflituoso entre o governo de
Franklin Roosevelt (que era do partido Democrata) e a indústria do petróleo, causado pela
política do New Deal, que criticava veementemente o “monopólio” do petróleo: em 1940, o
Instituto Americano de Petróleo, 22 grandes companhias de petróleo e 345 companhias
menores sofreram um processo antitruste. Além disso, Ickes tinha que fazer com que a
indústria petrolífera americana maximizasse a produção, evitasse a escassez e cooperasse
totalmente com o governo, nos moldes do que foi feito na Grã-Bretanha.
46
Durante a 2ª Guerra, a Petroleum Administration for War (Administração do Petróleo
para a Guerra), chefiada por Ickes, teve como um dos principais objetivos aumentar a
produção americana e manter uma capacidade de expansão, uma vez que a duração do
conflito era desconhecida, bem como a quantidade de petróleo que seria usada pelos
Aliados. Porém, a PAW frequentemente sofria oposição de outras agências federais, como a
War Production Board (Conselho de Produção de Guerra), responsável pela distribuição de
aço e outros materiais; a War Shipping Administration (Administração de Transporte Bélico),
responsável pelos petroleiros; e o Office of Price Administration (Escritório de Administração
de Preços), órgão regulador dos preços do petróleo. A PAW e o OPA travaram uma batalha
particular. De um lado, Ickes defendendo um aumento de US$ 0,35 em todos os tipos de
petróleo, acima do máximo de US$ 1,19, com o objetivo de estimular a exploração e a
atividade de produção; do outro, o OPA rejeitando a proposta, com receio da inflação. No
final, o aumento não ocorreu, com exceção do óleo espesso da Califórnia, e toda a indústria
petrolífera criou uma aversão ao OPA. Apesar de tudo, a PAW conseguiu atingir seu
objetivo e a produção americana aumentou 30% em 5 anos, passando de 3,7 milhões bpd
em 1940 para 4,7 milhões bpd em 1945.
Yergin (2009, p. 424) relatou a importância do petróleo americano na 2ª Guerra
Mundial:
Ao todo, entre dezembro/1914 e agosto/1945, os Estados Unidos e seus
aliados consumiram quase 7 bilhões de barris de petróleo, dos quais 6
bilhões eram provenientes dos Estados Unidos. Sua produção no período
da guerra foi equivalente a mais de ¼ de todo o petróleo produzido nos
Estados Unidos, desde os tempos do poço do Coronel Drake até 1941.
2.4.3.2.1) O Racionamento nos EUA
Em meados de 1941, Harold Ickes lançou, com o apoio das companhias de petróleo,
uma campanha de redução do consumo de petróleo na Costa Leste americana, com o
objetivo de mandar mais petróleo para os britânicos, que estavam com os estoques de
petróleo em níveis críticos devido à campanha dos submarinos alemães no Atlântico. Os
postos de gasolina passaram a funcionar somente de 7h às 19h e adesivos com a frase
“Estou consumindo 1/3 de gasolina a menos” foram distribuídos aos montes; além disso,
tentou reinstaurar os “Domingos sem gasolina”, campanha utilizada durante a 1ª Guerra
Mundial, e fazer um programa de uso coletivo dos automóveis. Porém, o esforço de Ickes
pela economia voluntária fracassou, obrigando-o a pressionar as companhias a reduzir de
10 a 15% a distribuição de combustível aos postos de gasolina. Produtores, refinadores e
distribuidores independentes, imprensa e população não entendiam o por quê da redução,
visto que Ickes não tornou público o motivo – por questões estratégicas – e muitos protestos
ocorerram no país. Com a regularização dos níveis de seus estoques, os britânicos
47
passaram a devolver os petroleiros que tinham sido transferidos para a Grã-Bretanha e a
situação do abastecimento na Costa Leste melhorou.
Entretanto, apesar de todo o esforço do governo americano, a sombra de uma
escassez de petróleo frequentemente pairou sobre os EUA durante a 2ª Guerra. Assim, o
governo norte-americano, ao mesmo tempo em que trabalhava para aumentar a produção,
empenhava-se para que o consumo de petróleo por parte dos americanos diminuísse. “O
foco da contenção era a gasolina” (YERGIN, 2009, p.424).
As primeiras medidas tomadas pelo governo foram a proibição do uso de gasolina
nas corridas de automóveis e, posteriormente, o racionamento na Costa Leste, que foram
seguidos de veementes protestos por parte da população. A administração Roosevelt viu-se
forçada a encontrar algum fator que justificasse o racionamento e, assim, fizesse com que a
população cooperasse. Esse fator foi a borracha. Os EUA importavam borracha natural das
Índias Orientais e da Malásia, mas com a conquista desses territórios pelo Japão, a
importação foi reduzida em 90%, e o país passou a sofrer uma escassez de borracha.
Assim, o uso do carro (e consequentemente da gasolina) tinha que ser reduzido, para que a
demanda popular por pneus também reduzisse e as reservas de disponíveis de borracha
fossem direcionadas para as forças armadas. A estratégia do governo funcionou e,
juntamente com outras medidas, como a redução do limite de velocidade para 60 km/h, fez
com que o consumo médio de gasolina por carro de passeio fosse 30% menor em 1943 do
que em 1941.
2.4.3.3) O Suprimento nos Fronts de Batalha
O suprimento de petróleo dos Aliados na 2ª Guerra Mundial foi feito em conjunto
pelos EUA e pela Grã-Bretanha, a fim de não deixar faltar petróleo em nenhum front, como
descreveu Yergin (2009, p. 426):
Eles trabalhavam com o princípio de que, em cada área de conflito, apenas
um dos dois seria o responsável pelo abastecimento das tropas e das forças
aéreas de ambos os países. Dessa forma, no Reino Unido e no Oriente
Médio eram os ingleses que abasteciam os tanques de gasolina
americanos; no Pacífico e no norte da África, depois da invasão dos Aliados
no final de 1942, os americanos eram os responsáveis pelo abastecimento
de todas as forças.
Esse sistema conseguiu abastecer os principais pontos aliados (Europa, norte da
África, Pacífico e economia interna dos EUA), apesar de diversas falhas terem ocorrido
nesse sistema: suprimentos ficavam dias à espera de navios nos portos, ou navios
chegavam e não havia carga para ser transportada. E houve um momento em que o sistema
enfrentou uma séria crise.
48
Durante a invasão da Europa Ocidental, na primavera de 1944, os Aliados
avançaram de forma extremamente rápida pela França, excedendo seus estoques de
gasolina e, com isso, criaram um problema logístico para si. Os estoques de petróleo
estavam muito distantes das forças armadas e, como não havia estradas férreas
apropriadas, os caminhões estavam utilizando quantidades muito maiores de seu próprio
estoque de combustível para ir ao front e voltar. Como consequência, as principais unidades
do exército aliado – o Terceiro Exército, comandado pelo general George Patton Jr., que
estava prestes a invadir a Linha Siegfried, e o Primeiro Exército americano, liderado pelo
general Bernard Montgomery, que estava prestes a tomar posse da Antuérpia – enfrentaram
uma escassez de combustível no final de agosto/1944. Diante dessa situação, o alto
comando militar teve de priorizar uma das unidades, decidindo enviar os suprimentos para
Montgomery. Após a tomada da Antuérpia em 04/09, o exército de Patton finalmente
recebeu combustível para prosseguir em direção a Berlim, porém as tropas alemãs se
aproveitaram do tempo que o Terceiro Exército ficou imóvel para se agruparem. Como
resultado, mais 9 meses de batalha se seguiram, até que os soviéticos tomaram Berlim.
Muitos estudiosos e historiadores discutem se o alto comando militar aliado tomou a
decisão correta. Como argumenta Yergin (2009, p. 434 e 435):
Das milhões de baixas sofridas pelas Forças Aliadas durante a libertação da
Europa Ocidental, mais da metade ocorreu depois da completa interrupção
do avanço das tropas de Patton em setembro. Outros tantos milhões
morreream em consequência da ação militar e nos campos de concentração
alemães, nos últimos 8 meses de guerra. Além disso, caso os Aliados
tivessem invadido a Alemanha pelo Ocidente mais cedo, o mapa pós-guerra
da Europa teria sido desenhado de um modo bem diferente, pois as forças
soviéticas não teriam conseguido um avanço tão profundo no coração da
Europa.
Para o general Dwight Eisenhower, o Supremo Comandante dos Aliados, a decisão
foi correta, uma vez que havia muitos riscos globais e uma grande possibilidade de Patton
falhar em sua investida, o que levaria a uma “derrota inevitável” (YERGIN, 2009, p.435).
Para outros, a decisão correta era unir as forças e concentrar o ataque em Ruhr, em
direção a Berlim, o que poderia ter antecipado o fim da guerra.
CAPÍTULO 3
O PETRÓLEO E OS CONFLITOS NO ORIENTE MÉDIO – PARTE 1
3.1) A Guerra no Canal de Suez
Nos primeiros anos após a 2ª Guerra Mundial, uma corrente nacionalista rebelde
cresceu no mundo árabe e a ordem do petróleo começou a se desestabilizar. Esse
fenômeno teve maior intensidade no Egito, com a chegada ao poder, por meio da força, do
coronel Gamal Abdel Nasser, em 1954.
Nasser, que visionava a criação de uma nação árabe unificada e sem fronteiras
internas (inspirada nos princípios socialistas), defendia o uso do petróleo como arma para os
países árabes se libertarem no domínio ocidental – segundo ele, o controle do petróleo
deveria ser usado como uma ferramenta de chantagem política. Em seu livro, “Filosofia de
uma Revolução”, o líder egípcio definira o petróleo como um dos 3 pilares fundamentais do
poder árabe e como a arma mais eficiente para que os direitos da nação árabe
prevalecessem sobre os direitos das potências do Ocidente (MAUGERI, 2006).
O Canal de Suez – passagem construída em 1859 pelo francês Ferdinand De
Lesseps, que se extende por 161,5 km no meio do deserto egípcio e liga o mar Vermelho ao
mar Mediterrâneo – era uma das principais representações do domínio do Ocidente no
Egito, sendo controlado pela Grã-Bretanha e França (figura 3.1).
Figura 3.1 – O Canal de Suez.
Fonte: https://www.cia.gov/library/center-for-the-study-of-intelligence/csi-publications/csistudies/studies/vol51no2/the-art-of-strategic-counterintelligence.html.
50
O canal, além de ser uma importante fonte de renda para britânicos e franceses,
tinha uma importância geopolítica extraordinária. Grande parte do comércio internacional de
e para o Golfo Pérsico passava através do canal, e mais do que qualquer outra coisa, ele
era a principal via para o transporte de petróleo do Oriente Médio para os mercados
europeus (MAUGERI, 2006). Em 1955, 2/3 do petróleo utilizado na Europa passavam pelo
canal, que se tornou o “elo vital na estrutura pós-guerra da indústria internacional de
petróleo” (YERGIN, 2009, p. 540), sendo que quase todo o lucro da Companhia do Canal
era destinado aos acionistas da Europa, como o governo britânico.
O governo egípcio, sedento por novas fontes de capital, aspirava expulsar os
britânicos e assumir o controle do canal e, principalmente, dos lucros obtidos com as tarifas.
Assim, uma campanha anti-britânica foi colocada em prática, baseada em sequestros,
assassinatos e ataques terroristas à base militar que os britânicos mantinham na Zona do
Canal.
A rejeição de Nasser ao ocidente ficou clara em 1955, quando o ditador egípcio
assinou um acordo com a União Soviética, que forneceria armas em troca de algodão
egípcio, marcando o início do envolvimento direto da União Soviética no Oriente Médio
(FUSER, 2008). A partir desse acordo, a preocupação com a expansão da influência
soviética no Egito chegou aos EUA. Em 1956, foi colocado em pauta a revisão do Acordo
Voluntário de 1950 (feito em decorrência das perdas do fornecimento de petróleo do Irã),
que viabilizaria uma cooperação mútua, tanto entre as próprias companhias de petróleo
como entre as mesmas e o governo americano, caso o tráfego de petroleiros fosse
interditado no canal. Porém, temerosas com as ações antitrustes, as companhias desistiram
dessa possibilidade.
Tentando conter a repulsão de Nasser ao ocidente, os governos americano e
britânico, em uma ação conjunta, fizeram uma oferta de empréstimo para que o ditador
contruísse uma represa em Assuã, no rio Nilo. A oferta agradou Nasser, mas não os
políticos de Washington. Duas correntes se mostraram contra o empréstimo: os senadores
do sul, ligados à agricultura do país, que temiam um aumento da produção de algodão
egípcio (possibilitado pela barragem), o que prejudicaria as exportações de algodão
americano no mercado mundial; e os membros do Congresso simpatizantes de Israel, que
se negavam a aprovar uma ajuda externa à um país que se declarava inimigo dos
israelenses (FUSER, 2008). Devido à oposição de Washington, o governo americano, com o
consentimento do governo britânico, cancelou a oferta de empréstimo.
Nasser se sentiu traído e humilhado com o cancelamento do empréstimo e se vingou
em 26/07/1956, ao ordenar a tomada do canal pelas forças militares egípcias. Ao mesmo
51
tempo, congelou o tráfego no Golfo de Aqaba, no mar Vermelho, que era vital para o
fornecimento de petróleo para Israel. Com o Canal de Suez expropriado, uma crise no
fornecimento de petróleo para a Europa seria inevitável: em 1956, o Oriente Médio produziu
3,5 milhões bpd, exportando cerca de 90% do mesmo; cerca de 1,3 milhão de barris
passavam através do Canal de Suez a cada dia, fornecendo mais da metade do petróleo
utilizado na Europa (MAUGERI, 2006). Com isso, uma longa crise diplomática se iniciou.
De um lado, Inglaterra e França defendiam o uso da força para retomar a posse do
canal, mas não queriam agir de maneira que o fluxo no canal, principalmente de petróleo,
fosse interrompido. De outro, os EUA defendiam o uso da diplomacia para resolver a
situação.
Dwight D. Eisenhower, presidente americano, era o principal defensor da diplomacia,
se mostrando totalmente contra uma investida militar por parte dos britânicos e franceses.
Segundo ele, uma ação militar no Egito faria com que todo o mundo árabe se voltasse
contra o Ocidente, o que fortaleceria a União Soviética. E, mais importante ainda, poderia
fazer com que os líderes árabes simpatizantes ao Ocidente se tornassem inimigos, o que
colocaria em risco o fornecimento do petróleo proveniente do Oriente Médio. Além disso, as
eleições presidenciais americanas estavam se aproximando e Eisenhower, que concorria
como um presidente pacífico (acabara com a guerra na Coreia em seu governo), não
desejava ser responsável por uma crise militar (YERGIN, 2009).
Apesar da oposição de Eisenhower, Grã-Bretanha e França estavam cada vez mais
próximas de realizar uma intervenção militar no Egito. Os franceses estavam motivados em
derrotar Nasser para reinvidicarem o canal para si e também para acabar com influência que
o ditador exercia sobre os rebeldes no norte da África, território sob domínio francês. Os
israelenses também objetivavam derrotar Nasser, em represália ao congelamento do tráfego
no Golfo de Aqaba, além do fato de o ditador egípcio ser um inimigo declarado e ameaçar
um confronto com o país. Porém, os britânicos eram os que mais tinham a perder com a
crise de Suez, principalmente devido à questão do petróleo.
Segundo Yergin (2009), o canal era a “veia jugular” do fornecimento de petróleo
proveniente do Oriente Médio. Se Nasser não fosse derrotado, ele poderia corromper outros
regimes árabes, e a posição do petróleo britânico estaria em risco no Oriente Médio – a GrãBretanha ficaria a mercê do Egito. Harold Macmillan, Ministro das Finanças, relatou a tensão
que pairou sobre a Inglaterra:
Se tomarmos uma atitude enérgica contra o Egito, e, como resultado, o
canal for fechado, os oleodutos para o Levante serão interrompidos, o Golfo
Pérsico se rebela e a produção de petróleo pára – e então o Reino Unido e
52
a Europa Ocidental estarão „fritos‟. No entanto, se sofrermos uma derrota
diplomática, se Nasser conseguir „escapar impune‟ – e os países do Oriente
Médio, na excitação, nacionalizarem o petróleo (...) nós também „estaremos
fritos‟. O que devemos fazer, então? A mim parece claro que devemos
aproveitar a única chance que temos – empreender uma ação enérgica e
torcer para que nossos amigos do Oriente Médio resistam, que nossos
inimigos sejam derrotados e que o petróleo possa ser salvo. (YERGIN,
2009, p. 547)
Paralelamente à preparação militar da França e Grã-Bretanha, o governo americano
elaborou planos para combater uma crise do petróleo que poderia ocorrer num futuro
próximo. Foi criado um comitê de emergência para o Oriente Médio, que trabalharia em
conjunto com o British Oil Supply Advisory Commitee (Comitê Consultivo para o
Fornecimento de Petróleo Britânico) e com a Organization for European Economic
Cooperation (Organização para Cooperação Econômica Europeia), caso o canal fosse
fechado e o fluxo de petróleo interrompido. Ao contrário do governo britânico, as
companhias de petróleo tinham no aumento da produção no Ocidente e na capacidade extra
de produção dos EUA e da Venezuela a razão para não estarem preocupadas com uma
possível falta de petróleo na Europa Ocidental.
Em setembro, o governo americano tentou convencer o rei da Arábia Saudita, Ibn
Saud, a pressionar Nasser para que um acordo pacífico fosse feito. A estratégia americana
foi o blefe: disseram aos sauditas que haviam feitos grandes avanços na área nuclear,
tornando essa energia mais barata e mais eficiente que o petróleo, e a disponibilizariam à
Europa, se necessário, o que faria o Oriente Médio perder seu grande trunfo estratégio. Mas
os sauditas não caíram no blefe.
No final de outubro/1956, o cenário de guerra começou a ser montado. Em 24/10, os
governos britânico, francês e israelense se reuniram secretamente em Sèvres, na França,
para planejar a ofensiva militar no Egito. Paralelamente, Egito, Síria e Jordânia selaram um
acordo de cooperação militar, sob a liderança dos egípcios. As ofensivas no Egito
começaram 5 dias após o encontro na França, com o ataque de Israel a Península do Sinai.
Um dia depois do ataque de Israel, britânicos e franceses deram um ultimato a Nasser: se o
conflito continuasse, invadiriam o canal. Como Nasser não se rendeu, a Grã-Bretanha
iniciou seus ataques, bombardeando os campos de aviação do Egito.
Porém, a invasão do canal demorou a ser feita pelos franceses e britânicos, dando
um tempo precioso para Nasser: ordenou o bloqueio total do canal, a fim de interromper o
fornecimento de petróleo do ocidente. Adicionalmente, ordenou operações de sabotagem
nas estações de bombeamento ao longo do oleoduto da Companhia Iraquiana de Petróleo.
53
As ofensivas franco-britânicas foram realizadas sem o conhecimento do governo
americano, para a ira de Eisenhower, que temia que o conflito em Suez levasse os EUA a
um confronto direto com a União Soviética, que estava envolvida em outra crise
internacional. Simultaneamente aos ataques franco-britânicos no Egito, os soviéticos
invadiram Budapeste (capital da Hungria) para acabar com uma revolução contra o controle
de Moscou, o que foi condenado por grande parte da comunidade internacional. Como
maneira de mostrar a reprovação americana ao conflito, nenhuma ajuda à França e GrãBretanha, em relação a suprimentos (principalmente petróleo), foi autorizada pelo
presidente. Além disso, o governo americano apresentou uma resolução à ONU
(Organização das Nações Unidas) em 01/11, exigindo a cessação das hostilidades no Egito
e a restauração da situação pré-conflito (MAUGERI, 2006).
Em 05/11, Sinai, o aeroporto de Gaza e o estreito de Tiran já estavam sobre o
controle de Israel, e britânicos e franceses iniciaram o ataque aéreo à Zona do Canal.
Porém, com os EUA inflexíveis em relação a qualquer ajuda no fornecimento de petróleo,
França e Grã-Bretanha selaram um cessar-fogo em 06/11. Mas Eisenhower estava decidido:
os EUA só iriam fornecer petróleo à Europa Ocidental se as tropas fossem retiradas do
Canal de Suez. O motivo da posição firme do presidente americano era simples – não
queria que os EUA fossem vistos como inimigos dos árabes, pois isso poderia acarretar em
um embargo de todo o petróleo do Oriente Médio.
Não demoraria muito para a Europa Ocidental ficar sem petróleo. Além do canal
(responsável pelo fornecimento de ¾ do petróleo) e dos oleodutos estarem bloqueados,
um embargo contra os britânicos e franceses foi feito pela Arábia Saudita. Nesse momento,
os estoques europeus eram suficientes para apenas algumas semanas. O auxílio dos EUA
era imprescindível, e por isso os europeus solicitaram a ativação do Comitê de Emergência
do Oriente Médio. Mas Eisenhower manteve sua posição. Além de impedir a ativação do
Comitê, influenciou na decisão do Fundo Monetário Internacional de negar uma ajuda
financeira emergencial para a Grã-Bretanha.
Com uma escassez de petróleo cada vez mais inevitável, britânicos e franceses se
renderam ao presidente americano e, no final de novembro, garantiram a retirada das forças
militares do canal.
Com a retirada das forças franco-britânicas do canal, deu-se início ao programa
emergencial de abastecimento, chamado de Alavanca do Petróleo. O hemisfério ocidental
(principalmente os EUA) seria a principal fonte de ajuda à Europa. Os petroleiros tiveram
seus trajetos alterados, e toda uma cooperação entre as companhias de transporte foi
54
colocada em prática, com o objetivo de fornecer petróleo o mais rápido possível para uma
Europa “à beira de uma crise energética” (YERGIN, 2009, p. 555).
Na Europa, foi criado um Grupo de Emergência para o Petróleo, responsável pela
distribuição do suprimento emergencial entre os países europeus. Paralelamente, várias
medidas para racionar o uso de petróleo nesses países foram feitas, como proibição do uso
de automóveis aos domingos, aumento nos preços da gasolina e óleo combustível e até
incentivos à substituição do petróleo pelo carvão nas centrais elétricas.
Apesar de várias complicações, a Alavanca do Petróleo funcionou. No início de
1957, 90% dos suprimentos perdidos haviam sido compensados, e a crise do petróleo havia
chegado ao fim na Europa. Em abril, o canal de Suez (sob controle total do Egito) já estava
livre para o tráfego de petroleiros e com isso a Alavanca do Petróleo foi suspensa.
Terminava assim a crise do Suez.
Segundo Yergin (2009), uma reflexão em torno da segurança no transporte de
petróleo foi feita na indústria petrolífera mundial após a crise de Suez. O canal e os
oleodutos do Oriente Médio se mostraram bastante vulneráveis, o que levou as companhias
internacionais a uma alternativa: fornecer petróleo para a Europa Ocidental através do cabo
da Boa Esperança. Mas para que a alternativa fosse viável, petroleiros com maior
capacidade de carga tinham de ser construídos, o que coube aos japoneses. Assim, umas
das principais conseqüências do conflito no Canal de Suez para a indústria petrolífera
mundial foi o surgimento dos superpetroleiros.
Além disso, a crise de Suez selou o “fim da hegemonia britânica no Oriente Médio” e
“estimulou os sentimentos nacionalistas no mundo árabe de uma forma nunca vista antes”
(FUSER, 2008, p. 111 e 112).
3.2) A Guerra dos Seis Dias
Na década de 60, Gamal Abdel Nasser ainda estava determinado a criar um mundo
árabe livre do domínio ocidental e a acabar com Israel, seu inimigo mortal - para ele, a
criação de Israel fora o “maior crime internacional da história” (YERGIN, 2009, p. 541).
Motivado pelo triunfo em Suez, mais uma vez o ditador egípcio desencadeou uma crise no
Oriente Médio, no ano de 1967.
Suas ações começaram em maio, ao expulsar os observadores das Nações Unidas
que estavam no Egito desde o conflito de 1956. Posteriormente, bloqueou o golfo de Aqaba,
impossibilitando que a frota mercante israelense tivesse acesso ao porto de Eilat, colocando
em risco a importação de petróleo por parte de Israel. Além disso, enviou tropas à Península
55
do Sinai. Paralelamente, fez uma aliança militar com a Jordânia (o Iraque se uniria a eles
posteriormente), além de ganhar o apoio de outros países árabes, que colocaram suas
forças militares à disposição do Egito.
Diante da ameaça de um conflito, Israel partiu para a ofensiva em 05/06/1967,
atacando a Síria, Jordânia e Egito, dando início a Terceira Guerra árabe-israelense. De
forma avassaladora, os exércitos israelenses destruíram todas as tropas árabes em apenas
6 dias (a força aérea egípcia fora totalmente abatida logo nas primeiras horas do conflito),
daí o nome de Guerra dos Seis Dias. Com a rápida vitória nos campos de batalha, Israel
tomou posse do Sinai, Jerusalém, Faixa de Gaza e das Colinas de Golan (figura 3.2).
Figura 3.2 – As Conquistas de Israel na Guerra dos 6 Dias (Modificada).
Fonte: http://www.mundovestibular.com.br/articles/4378/1/A-GUERRA-DOS-SEIS
DIAS/Paacutegina1.html.
O conflito, apesar de breve, “assinalou a primeira vez em que os governos árabes
recorreram à „arma do petróleo‟ em represália pelo apoio ocidental a Israel” (FUSER, 2008,
p.117), o que desencadeou mais uma crise na indústria petrolífera mundial. Um dia após o
início dos ataques israelenses, um embargo de petróleo foi feito pela Arábia Saudita, Kuait,
Iraque, Líbia e Argélia contra EUA, Grã-Bretanha e Alemanha Ocidental (países
simpatizantes de Israel). Segundo Maugeri (2006), essa decisão representou um fato
completamente novo na política internacional do pós-guerra. A intensidade dessa decisão
pôde ser comprovada na carta enviada pelo ministro árabe do petróleo, Ahmed Zaki
Yamani, às companhias que formavam a Aramco (Exxon, Móbil, Texaco e Standard of
Califórnia):
56
Solicitamos que suas companhias deixem de enviar, a partir de agora,
petróleo para os Estados Unidos da América e para o Reino Unido. Vocês
devem ter em mente que esta é uma decisão rigorosa e que essa
companhia será gravemente responsabilizada caso uma só gota de nosso
petróleo venha a ser desembarcada em qualquer das nações mencionadas.
(YERGIN, 2009, p. 627)
Simultaneamente,
diversos
distúrbios
ocorreram
nas
indústrias
petrolíferas
estrangeiras localizadas no Oriente Médio: sabotagem e destruição das instalações, motim
contra funcionários e greve nos campos de petróleo (como exemplo, a refinaria em Abadã,
uma das maiores do Oriente Médio, teve que ser fechada, pois os pilotos navais iraquianos
se recusaram a continuar operando no canal de Shatt-al-Arab). Além disso, o canal de Suez
e os oleodutos do Iraque e da Arábia Saudita estavam bloqueados. Como conseqüência,
houve uma redução de 40% no fluxo de petróleo árabe e uma perda total de 6 milhões bpd.
Esse cenário levou o subsecretário americano do Interior a declarar que a crise de 1967 era
muito mais grave que a de 1956, e que a Europa estava prestes a sofrer uma escassez de
petróleo (YERGIN, 2009). Para agravar ainda mais a situação, iniciou-se em julho a guerra
civil na Nigéria: devido ao conflito, o governo nigeriano cessou as exportações de petróleo,
causando mais uma perda no mercado (500 mil bpd).
Diante da ameaça de escassez de petróleo na Europa, o governo dos EUA, assim
como na crise de Suez, convocou um Comitê de Fornecimento de Petróleo Estrangeiro para
coordenar a distribuição de petróleo mundial. Esse comitê era formado por mais de 10
companhias de petróleo americanas, as quais teriam liberdade para formar um truste e
combater a crise em conjunto, se fosse necessário. O maior desafio a ser enfrentado pelo
comitê era a logística - para reorganizar o fluxo de petróleo, as rotas de petróleo tinham de
ser alteradas, principalmente devido ao bloqueio do canal de Suez e dos oleodutos do
Iraque e da Arábia Saudita. Esse desafio fora atenuado pela utilização dos superpetroleiros,
que surgiram após a crise de 1956 e foram aperfeiçoados ao longo dos anos: em 1967,
petroleiros 5 vezes maiores que os de 1956 já eram utilizados, e diante da crise, 6 novos
superpetroleiros, 7 vezes maiores que os utilizados em 1956, foram construídos.
Apesar do pavor inicial, a crise não fora tão grave. Os EUA, com suas reservas de
petróleo estocado, elevaram sua produção diária para aproximadamente 1 milhão de barris,
impedindo que a Europa sofresse uma escassez. Outros países também aumentaram sua
produção e auxiliaram os europeus, como Venezuela, Irã e Indonésia. Apesar de o Comitê
de Fornecimento de Petróleo Estrangeiro ter sido imprescindível, as leis antitrustes
americanas nem precisaram ser suspensas – a atuação individual das companhias
internacionais fora suficiente para conter a crise.
57
Com a contenção da crise por parte do Ocidente, os países árabes viram que a
“arma do petróleo” havia fracassado e que eles próprios foram os maiores perdedores (num
encontro da cúpula árabe em agosto, Nasser admitira que o Egito estava falido). Assim, os
líderes árabes decidiram acabar com o embargo no início de setembro.
Segundo Maugeri (2006), a derrota na Guerra dos Seis Dias freou a ascendência de
Nasser, mas não a sua mensagem de revolta contra o Ocidente, que se espalhou por todo o
Oriente Médio e teve como conseqüência imediata a militarização da sociedade civil árabe.
Fuser (2008) ressalta ainda que após o conflito de 1967, os EUA passaram a ser os vilões
para os árabes, uma vez que apoiaram os ataques israelenses e não pressionaram Israel a
devolver os territórios que conquistou: “os norte-americanos se tornaram um alvo do ódio
árabe tal como os ingleses depois da crise de Suez” (PALMER, 1992 apud FUSER, 2008, p.
117).
3.3) A Guerra do Yom Kippur
3.3.1) O Pré-Guerra
3.3.1.1) No Oriente Médio
Com a morte de Gamal Abdel Nasser em 1970, Anuar Sadat assumiu o poder no
Egito e encontrou um país politicamente humilhado e financeiramente falido. Ao contrário de
seu antecessor, não queria formar um novo mundo árabe, mas sim recuperar seu próprio
país. Para isso, sabia que era necessário acabar com a briga com Israel, que desgastava
frequentemente a imagem e os cofres egípcios. Apesar de seus sucessivos esforços, não
conseguiu chegar a um acordo com Israel. Tentou ganhar a simpatia do Ocidente ao
expulsar milhares de conselheiros militares soviéticos de seu país em meados de 1972, mas
também não obteve sucesso. Assim, no início de 1973, elaborou um plano para alcançar
seus objetivos: a guerra. Porém, Sadat não via a guerra como um fim, mas como um meio:
desencadearia o conflito não por interesses territoriais, mas sim para que uma crise fosse
iniciada e, posteriormente, as negociações que outrora falharam viessem a ter sucesso. A
intenção de Sadat “era muito mais psicológica e diplomática do que militar”, como relatou
Henry Kissinger, assessor de Segurança Nacional dos EUA (YERGIN, 2009, p. 671). Em
abril/1973, Sadat começou a elaborar com Hafez al–Assad, líder sírio, um ataque conjunto
de Egito e Síria, com o conhecimento do rei Faissal da Arábia Saudita.
Até o início da década de 70, o rei Faissal era contra a utilização do petróleo como
arma, principalmente devido ao fato de que isso afetaria os EUA, país com o qual possuía
um relacionamento que era fundamental para o seu reino. Entretanto, sua posição começou
a mudar no início de 1973. Nesse ano, a Arábia Saudita havia tomado o posto do Texas
58
como “produtor alternativo para o mundo inteiro” (YERGIN, 2009, p. 672), o que fez com que
suas exportações de petróleo aumentassem substancialmente (sua parte nas exportações
mundiais passaram de 13% em 1970 para 21% em 1973), assim como sua produção
(passou de 5,4 milhões bpd em julho de 1972 para 8,4 milhões bpd em julho de 1973).
Porém, uma corrente que defendia que esse aumento da produção não era lucrativo,
baseado nas sucessivas desvalorizações do dólar americano, passou a crescer na Arábia.
Paralelamente, Sadat, o líder egípcio, pressionava o rei constantemente para que esse
concordasse em utilizar a “arma do petróleo” em apoio aos futuros ataques de Egito a Israel.
Além da pressão de Sadat, o rei passou a sentir a pressão da sociedade árabe: sucessivas
sabotagens ocorreram em terminais petrolíferos e oleodutos.
Diante dessa situação, o rei Faissal decidiu iniciar a utilização do petróleo como
arma: a Arábia Saudita não iria aumentar sua produção de petróleo, de modo a não atender
a crescente demanda, se os EUA mantivessem seu apoio a Israel. Em entrevista a imprensa
americana, o rei justificou sua decisão:
Nós não desejamos, de nenhuma forma, restringir nossas exportações de
petróleo para os Estados Unidos, mas o total apoio da América ao sionismo
e sua atitude contra os árabes fazem com que seja extremamente difícil,
para nós, continuar fornecendo petróleo para os Estados Unidos ou até
mesmo permanecer amigos dos Estados Unidos. (YERGIN, 2009, p. 675)
3.3.1.2) Nos EUA
Ao assumir a presidência dos EUA em 1969, Richard Nixon se deparou logo com um
grande desafio: a questão do petróleo no mercado interno americano. O cenário não era
animador. A produção americana estava em declínio (o número de equipamentos de
perfuração, que já vinha diminuindo desde 1955, chegou, em 1970, a pouco mais de 1/3 da
quantidade utilizada na década de 50) e, com a demanda de energia crescendo cada vez
mais, a indústria produzia a quantidade máxima que podia, fazendo com que os EUA
perdessem sua capacidade extra de produção. Porém, a produção interna não estava
atendendo a demanda, o que acarretou num aumento das importações de petróleo.
Em abril/1973, diante de uma crise energética iminente, Nixon cancelou o sistema de
cotas de importação de petróleo, substituindo-o por um sistema de distribuição voluntária.
Segundo Yergin (2009, p. 668), esse ato do presidente simbolizou a mudança pela qual o
mercado petrolífero mundial estava passando: “As cotas destinavam-se a manipular e limitar
os suprimentos num mundo de produção excedente, enquanto a distribuição tinha o objetivo
de dividir proporcionalmente os suprimentos disponíveis num mundo de racionamento.”
Com as cotas abolidas, as empresas americanas, assim como os refinadores
independentes, lançaram-se no mercado mundial numa busca desenfreada por petróleo. As
59
importações americanas dispararam: de 3,2 milhões bpd em 1970 para 4,5 milhões bpd em
1972, chegando a 6,2 milhões bpd em 1973. No início de 1973, os EUA ultrapassaram o
Japão como o maior importador de petróleo do mundo (FUSER, 2008). Assim como os EUA,
outros países passaram a comprar petróleo freneticamente. Esse aumento exponencial da
demanda, num momento em que não havia excedente no mercado, fez os preços
dispararem. Com o aumento dos preços do petróleo, os países exportadores começaram a
se mobilizar para tirar proveito da situação.
Líbia, Iraque e Argélia começaram a pressionar as empresas para que os acordos de
Teerã e de Trípoli (nos quais o sistema de preços de petróleo se baseavam) fossem
revisados: com o aumento dos preços do petróleo, apesar de o lucro dos exportadores
aumentar, a parte das empresas nos lucros também estava aumentando, o que não era do
interesse dos exportadores. Assim, em setembro, os países da OPEP (Organização dos
Países Exportadores de Petróleo – grupo criado em 1960 por Arábia Saudita, Venezuela,
Kuait, Iraque e Irã, composto em 1973 por Argélia, Líbia, Nigéria, Emirados Árabes Unidos,
Qatar e Indonésia, além dos países fundadores) decidiram que um novo acordo de preços
com as empresas petrolíferas deveria ser feito, e uma reunião entre as duas partes fora
marcada para o dia 08/10 em Viena. Mas antes dessa reunião, o conflito no Oriente Médio
estourou.
3.3.2) O Conflito
Em 06/10/1973, no dia do feriado de Yom Kippur – um dos principais feriados
judaicos – iniciou-se a 4ª guerra árabe-israelense, a chamada Guerra do Yom Kippur. O
conflito teve início com os ataques-surpresa do Egito às forças israelenses localizadas no
Canal de Suez e na Península do Sinai, que foram seguidos por bombardeiros da força
aérea síria na fronteira norte de Israel.
Os ataques-surpresa foram muito bem planejados por Sadat. O líder egípcio
escolheu o feriado de Yom Kippur para iniciá-los pois pegaria o inimigo despreparado, uma
vez que nessa data Israel literalmente parava: todas as atividades eram suspensas para que
os israelenses meditassem e orassem em sua busca espiritual. Além disso, simulara
anteriormente movimentações militares de guerra, as quais fizeram com que as forças
militares de Israel se mobilizassem inutilmente, o que acarretou em gastos elevados
desnecessários e críticas da opinião pública. Assim, após os blefes de Sadat, o governo
israelense já não acreditava mais em uma guerra. Por isso os ataques foram tão chocantes
e bem sucedidos – segundo Yergin (2009, p. 682), “a magnitude da surpresa do ataque
árabe teria para os israelenses o que Pearl Harbor tivera, 32 anos antes, para os
americanos”.
60
No início do conflito, o governo dos EUA se mobilizou em prol de uma trégua entre
os países em guerra, mas logo viu que isso não seria possível. Entretanto, não queria se
envolver diretamente no conflito – ao contrário da União Soviética, que estava fornecendo
constantemente suprimentos e armamentos para Egito e Síria. Inicialmente, os EUA
acreditavam que uma ajuda a Israel não seria necessária, visto a superioridade militar desse
país. Mas com o desenrolar do conflito, a visão americana mudou.
As forças militares israelenses acreditavam que a guerra não duraria mais de 3
semanas e estocaram suprimentos somente para esse período, baseado na Guerra dos
Seis Dias. Porém, diferentemente do conflito de 1967, Israel fora pego de surpresa e estava
na defensiva, totalmente acuado, o que fez com que seus suprimentos se esgotassem
rapidamente, bem antes do tempo calculado. Diante dessa situação, o governo dos EUA
autorizou o abastecimento de aviões israelenses em território americano, desde que não
estivessem com a identificação da força aérea israelense. Porém, essa medida não se
mostrou suficiente, uma vez que os soviéticos estavam mandando cada vez mais
suprimentos para Egito e Síria. O Departamento de Estado americano começou então a
pressionar as companhias aéreas a enviar seus aviões comerciais com suprimentos para
Israel.
Em 08/10, com o conflito se intensificando no Oriente Médio, iniciaram-se as
negociações em Viena: os representantes da empresas ofereceram um aumento de 15%
em relação ao preço fixado, enquanto os países da OPEP queriam um aumento de 100%.
Como a diferença das propostas era muito grande, as empresas decidiram que os principais
governos do Ocidente deveriam ser consultados para que uma resposta fosse dada aos
árabes. Os principais líderes ocidentais consideraram a proposta árabe inviável e
concordaram que a proposta inicial das empresas deveria ser mantida. Essa resposta
provocou a ira dos árabes, e as conseqüências seriam sentidas brevemente.
Em 12/10, a situação era crítica. O presidente americano recebeu 2 cartas: uma dos
presidentes da Exxon, Móbil, Texaco e Standard of Califórnia (empresas que formavam a
Aramco), na qual advertiram Nixon de que “se os Estados Unidos aumentassem seu apoio
militar a Israel, poderia haver um „efeito bola de neve‟ que produziria uma grande crise no
fornecimento de petróleo” (YERGIN, 2009, p. 684); a outra era da primeira-ministra de Israel,
Golda Meir, na qual dizia que seu país estava a beira de um colapso e pedia
desesperadamente a ajuda dos EUA. Com a recusa das companhias aéreas americanas em
enviar seus aviões comerciais para uma zona de combate, o governo americano não tinha
outra saída a não ser utilizar sua força aérea para auxiliar Israel, afinal um aliado seu estava
sendo derrotado por um inimigo patrocinado pela União Soviética.
61
Washington prezava pelo sigilo de sua ajuda a Israel, para não desencadear uma
crise do petróleo. Assim, os aviões da força aérea norte-americana deveriam chegar à noite
em Israel e decolar pela manhã. Entretanto, logo no primeiro dia, condições climáticas
adversas atrasaram as decolagens dos aviões americanos, que chegaram em território
israelense durante o dia. A partir dali, os EUA foram considerados aliados de Israel na visão
dos árabes. Com o auxílio norte-americano, Israel conseguiu se reestruturar e partiu para a
ofensiva em 15/10.
Paralelamente, após o fracasso das negociações em Viena, uma delegação da
OPEP, composta por 6 países do Golfo Pérsico (Arábia Saudita, Irã, Iraque, Kuait, Emirados
Árabes Unidos e Qatar), se reuniu em 16/10 na cidade de Kuait e decidiu alterar
unilateralmente o preço o petróleo, sem consentimento das empresas: aumentaram em 70%
o preço do petróleo (passou de US$ 2,90 para US$ 5,11 por barril). Essa atitude foi um
marco na história da indústria petrolífera mundial – o 1º “choque do petróleo”, como ficou
conhecido. Segundo Gilpin (1981 apud FUSER, 2008, p. 123), esse acontecimento foi “a
maior redistribuição forçada de riqueza da história do mundo”. Para Kolko (1988 apud
FUSER, 2008, p. 123), foi “um ponto de virada histórico nas relações econômicas entre os
países produtores de petróleo do Terceiro Mundo e os principais países capitalistas, os EUA
em primeiro lugar”. Yergin (2009, p. 686) retratou a mudança que ocorreu no mercado
petrolífero mundial a partir desse momento:
A transição agora se completava partindo dos dias em que as companhias
fixavam o preço unilateralmente, passando pelos dias em que os países
exportadores tinham pelo menos direito a veto para os preços negociados
conjuntamente, até esta nova fase em que os exportadores assumiam a
condição de suseranos únicos.
Após a decisão de aumentar o preço do petróleo, os governantes árabes se reuniram
novamente para debater sobre uma outra questão, que afetaria ainda mais o mercado
petrolífero mundial: a utilização da “arma do petróleo”.
O rei Faissal, ao contrário de Sadat e dos outros governantes árabes, não queria
declarar “guerra” aos EUA através do petróleo. Assim, em 17/10, uma comitiva de ministros
de Relações Exteriores árabes foi para Washington discutir o impasse. Na reunião, o
governo dos EUA reiterou que o apoio americano a Israel se tratava de um modo de
combater a União Soviética, e não os árabes, e que Washington era a favor de um cessarfogo e de uma solução diplomática para o conflito. Os árabes se mostraram dispostos a
negociarem e a reunião terminou de forma positiva.
Entretanto, no mesmo dia, membros da OAPEC (Organization of Arab Petroleum
Exporting Countries – Organização dos Países Árabes Exportadores de Petróleo) – uma
62
OPEP paralela constituída somente por produtores árabes (MAUGERI, 2006) – se reuniram
no Kuait e decidiram fazer um embargo de petróleo a todos os países aliados de Israel, em
principal aos EUA: a produção seria diminuída em 5% (em relação ao nível de
setembro/1973) e posteriormente continuaria a diminuir 5% a cada mês, até que Israel se
retirasse dos territórios ocupados na Guerra dos Seis Dias, em 1967. Vários países
produtores concordaram com o embargo, comprometendo-se a cooperar ainda mais que o
combinado – cortariam a produção em 10%. Irã e outros países produtores se recusaram a
participar do embargo. Uma exceção foi o Iraque, que tinha planos mais radicais – além de
um embargo total de petróleo aos EUA e demais aliados de Israel, o governo iraquiano
objetivava estatizar todas as empresas americanas presentes em território árabe e retirar
todos os fundos árabes de bancos americanos – que não foram aceitos pelos outros
ministros. Porém, 2 dias mais tarde, os árabes tomariam uma atitude mais radical, como
objetivava Israel, devido a um ato dos EUA.
Em 19/10, o governo norte-americano anunciou mais um auxílio militar a Israel, desta
vez no valor de US$ 2,2 bilhões. A intenção de Washington era equilibrar o conflito (uma vez
que a União Soviética reabastecia constantemente Egito e Síria), para que assim nenhum
lado ficasse numa situação superior e então buscassem uma solução diplomática. Porém, o
resultado foi a ira dos árabes, que decidiram utilizar a “arma do petróleo” com força total: no
mesmo dia, a Líbia impôs um embargo de todas as remessas de petróleo aos EUA; no dia
seguinte, a Arábia Saudita fez o mesmo, seguida de vários outros países. Segundo Yergin
(2009), o embargo total surpreendeu Washington, apesar de várias evidências de que isso
estava por vir, como a tentativa fracassada em 1967 e a situação crítica do mercado
petrolífero a partir de 1970. De acordo com Fuser (2008), a ajuda militar americana foi o
estopim para a imposição do embargo.
Em 21/10, representantes de EUA e União Soviética, em reunião em Moscou,
decidiram que um cessar-fogo deveria acontecer no Oriente Médio. Entretanto, este não fora
cumprido de imediato, o que fez com que a relação EUA x União Soviética chegasse ao
limite da tensão. Com o avanço israelense, o Terceiro Exército do Egito estava prestes a ser
derrotado. Então, o líder da União Soviética, Leonid Brezhnev, considerando inadmissível a
derrota de um exército suprido por seu país – pois isso arruinaria a imagem da União
Soviética no Oriente Médio – exigiu que soviéticos e americanos interviessem no conflito,
ameaçando intervir unilateralmente em caso de recusa dos americanos.
Após a ameaça de Brezhnev, os americanos, além de descobrirem que tropas
soviéticas estavam de prontidão, detectaram uma possível ameaça de ataque nuclear.
Diante dessa situação, Washington decidiu que os EUA deviam responder às ameaças
63
soviéticas à altura, afinal a ordem internacional estava em jogo. Com isso, em 25/10, todas
as tropas americanas ao redor do mundo ficaram em alerta nuclear. A situação foi uma das
mais tensas da história da humanidade, como relatou Yergin (2009, p. 693): “Os Estados
Unidos e a União Soviética estavam diretamente se colocando em posição de ataque, o que
não acontecia desde a crise dos mísseis cubanos. Um simples erro de cálculo conduziria a
um confronto nuclear.”
Entretanto, em 26/10, após o reabastecimento do Terceiro Exército do Egito, o
cessar-fogo entrou em vigor e as partes entraram em negociação, colocando fim a Guerra
do Yom Kippur e a ameaça de um confronto nuclear entra EUA e União Soviética. Apesar
do fim do conflito, o embargo do petróleo continuou.
3.3.3) As Conseqüências do Conflito
Segundo Fuser (2008, p. 125), a Guerra do Yom Kippur “deu aos países
exportadores uma oportunidade de ouro para afirmar sua autonomia e exercer plenamente o
poder sobre o mercado que já vinham adquirindo desde 1970”.
De acordo com Maugeri (2006), o impacto ocasionado pelo “embargo seletivo” foi
relativamente pequeno. O autor argumenta que “o mercado de petróleo é como um mar,
cujas águas são provenientes de vários rios, cada qual com seus afluentes e seja qual for o
curso que as águas façam, todas elas acharão um caminho para esse mar” (idem, p. 113).
Ou seja, os países não afetados pelo embargo poderiam vender o petróleo para quem
quisessem, inclusive para os países afetados pelo embargo, com tanto que o fizessem de
maneira discreta. Além disso, o autor utiliza os números para sustentar seus argumentos:
em setembro/1973, a produção total árabe fora de 19,4 milhões bpd; em novembro, com os
cortes na produção, esse número caiu para 15,4 milhões bpd – uma perda de 4 milhões
bpd. Mas nesse período, outros países aumentaram suas produções e exportações,
adicionando 900.000 bpd ao mercado, fazendo com que o déficit efetivo de petróleo fosse
de 3,1 milhões bpd – cerca de 5,5% do consumo mundial. Segundo ele, essa quantidade
poderia ser compensada facilmente por outros países produtores. E, realmente, os EUA,
principais alvos do embargo, não sofreram uma escassez significativa de petróleo.
Porém, a ignorância e a confusão ampliaram os efeitos do embargo, gerando o
pânico no mercado e a elevação dos preços. Como argumentou o economista Morris
Adelman, não foi a falta de petróleo, mas sim o medo de uma possível falta que elevou os
preços (ADELMAN, The Genie, apud MAUGERI, 2006). Entre outubro e dezembro/1973, os
preços de petróleo atingiram valores absurdos, uma vez que as companhias e os países
mais afetados pelos cortes de produção árabes estavam desesperados por petróleo, em
64
clima de “„salve-se quem puder‟, para garantir seus suprimentos de energia” (FUSER, 2008,
p. 124). Como exemplo, em uma ocasião o Irã conseguiu obter o preço de US$ 17 por barril
ao vender, em um leilão, 450.000 barris. No final de dezembro, a OPEP decidiu aumentar o
preço oficial do petróleo para US$ 11,65, o que significou que o preço do petróleo
quadruplicou em menos de 4 meses e, se comparado ao valor de 1970, aumentou quase 10
vezes (MAUGERI, 2006).
Em abril/1974, os países árabes pararam com os cortes da produção e normalizaram
os cortes de petróleo, sem justificativas ou pronunciamentos. Entretanto, o “terremoto”
provocado por eles já havia quebrado algumas certezas econômicas do pós-guerra
(MAUGERI, 2006).
Fuser (2008) destaca as principais conseqüências do 1º “choque do petróleo”: crise
econômica nos principais países ocidentais; hegemonia global dos EUA desafiada;
aceleração no processo de nacionalização das concessões petrolíferas no Oriente Médio
(como exemplos, no Kuait o governo se apossou totalmente das concessões, antes
pertencentes a British Petroleum e a Gulf, e na Arábia Saudita a Aramco foi totalmente
nacionalizada e passou a se chamar Saudi Aramco); aumento exponencial da renda dos
países da OPEP: as receitas agregadas desses países aumentaram de US$ 14 bilhões em
1972 para US$ 23 bilhões em 1973, atingindo US$ 96 bilhões em 1974 (em particular, a
Arábia Saudita: nos anos após o “choque” suas receitas internacionais ultrapassaram
sucessivamente as de Japão, EUA e Alemanha, passando de US$ 3,9 bilhões em 1973 para
US$ 14,3 bilhões em 1974, atingindo US$ 49,6 bilhões ao final de 1976); e fortalecimento do
nacionalismo e do antiamericanismo em todo o Oriente Médio. Maugeri (2006) destaca
como consequência também a criação, em 1974, da IEA (Internacional Energy Agency –
Agência Internacional de Energia), uma associação governamental dos principais países
industrializados importadores de petróleo, que segundo Henry Kissinger tinha por principal
objetivo conter e, se possível, quebrar a OPEP. Entretanto, a agência passou a funcionar
mais como um fórum que reunia e processava dados sobre fornecimento e demanda de
energia, gerava estudos e cenários e sugeria políticas e medidas para seus membros
adotarem.
A Guerra do Yom Kippur e a crise do mercado petrolífero mundial ocorreram
paralelamente a outro acontecimento: o caso de Watergate – escândalo ocorrido nos EUA
em 1972, devido a tentativas frustradas do partido do presidente Richard Nixon em espionar
o Partido Democrata, cuja sede se localizava no edifício Watergate, em Washington
(GRANDE ENCICLOPÉDIA LAROUSSE CULTURAL, 1998). Esse escândalo ganhou
dimensões desastrosas, que “provocaram consequências diretas e graves para o Oriente
65
Médio e para o petróleo” (YERGIN, 2009, p. 691). Segundo o autor, Watergate consumiu a
imagem e a força do presidente americano, impedindo que este tomasse providências antes
e durante a guerra no Oriente Médio (como abrir uma mesa de negociações entre Egito e
Israel, negociar com os países da OPEP em relação à crise do petróleo e lidar com a
influência soviética no conflito).
A repercussão de todos esses acontecimentos gerou desconfiança e confusão na
opinião pública, dando espaço para o fortalecimento das “teorias de conspiração”: alguns
achavam que a crise do petróleo fora manipulada pelos políticos de Washington para
justificar a crise de energia americana, outros que a guerra no Oriente Médio era um artifício
de Nixon para que Watergate fosse “esquecido”. No fim, todos esses acontecimentos
simultâneos fizeram com que a indústria do petróleo saísse como a grande vilã, como
relatou Yergin (2009, p. 691):
(...) afluíam ao mesmo tempo na mente do público, ampliando grandemente
a já tradicional desconfiança na indústria do petróleo e levando muitos a crer
que a Guerra de Outubro, o embargo e a crise de energia haviam todos sido
criados e magistralmente manipulados pelas companhias petrolíferas em
nome da ambição.
3.4) A Revolução Islâmica no Irã
3.4.1) O Pré-revolução
Durante a década de 70, o Irã tinha uma produção de petróleo diária de 5,5 milhões
de barris (quase 10% da produção global, o que o tornava o 4º maior produtor mundial, atrás
de EUA, União Soviética e Arábia Saudita), dos quais 4,5 milhões eram exportados, o que
fez com que o país se tornasse o segundo maior exportador de petróleo do mundo, ficando
atrás somente da Arábia Saudita. Entretanto, todo o lucro proveniente do petróleo não fez
com que o Irã crescesse – de um ponto de vista mais crítico, pode-se dizer que todos os
petrodólares fizeram com que o país regredisse.
O governo do xá Mohammed Reza Pahlavi tinha por ambição tornar o Irã uma
potência militar e econômica, nos moldes ocidentais, e por isso gastava grande parte da
renda oriunda das exportações de petróleo em dispendiosos e ineficazes programas de
modernização. A militarização era apoiada, de acordo com Maugeri (2006), na política do
“Grande Pilar” feita pela Casa Branca, que considerava o Irã uma região estratégica para os
interesses americanos no Oriente Médio – segundo o autor, o xá recebeu “luz verde” de
Washington desde 1972 para comprar qualquer arma convencional que ele quisesse. Entre
1970 e 1978, o xá gastou US$ 20 bilhões em material bélico feito pelos EUA. Além disso, a
corrupção imperava no país. Somados a isso, havia o grande êxodo rural, motivado por uma
reforma agrária improdutiva, que ficou conhecida como a “Revolução Branca” (FUSER,
66
2008). Além de piorar as condições de vida nos centros urbanos, cuja infra-estrutura já era
precária, o deslocamento da massa rural fez a produção agrícola despencar e,
consequentemente, as importações de alimentos dispararem. Como conseqüência de todos
esses fatores, a inflação disparou e uma grave crise econômica tomou conta do país. Diante
desse cenário de crise e descontentamentos, a oposição se fortaleceu.
O principal opositor do governo do xá era o clero xiita (a seita islâmica dominante),
que tinha como principal líder Aiatolá Ruhollah Khomeini, que considerava o governo de
Pahlavi corrupto e ilegítimo. Suas críticas ao governo eram tão ferozes que Khomeini fora
exilado no Iraque. De lá, continuava sua oposição, cujas denúncias “eram moldadas na
retórica do sangue e da vingança” (YERGIN, 2009, p. 764) e incitavam a população iraniana
a se revoltar contra o governo do xá. Segundo Maugeri (2006), Khomeini foi o catalisador
político da revolução.
No final de 1977, o filho de Khomeini fora assassinado. Apesar de evidências não
terem sido encontradas, a Savak, polícia secreta do Irã, fora apontada como autora do
crime. Para incitar ainda mais sua ira, o líder xiita foi duramente criticado em um artigo de
jornal de Teerã em 07/01/1978. Segundo Yergin (2009), esse artigo foi o estopim para uma
nova etapa na luta pelo poder no Irã, que já havia sido tomado por uma sangrenta batalha
na década de 20, disputada entre a casa real (liderada por Reza Pahlavi, pai de
Mohammed) e os xiitas.
3.4.2) Os Conflitos
Após a publicação do artigo, uma onda de revoltas ocorreu na cidade de Quom, lar
espiritual de Khomeini, que terminou com vários manifestantes mortos diante da ação das
tropas do governo. A partir daí, o Irã foi tomado por uma onda de confrontos entre xiitas e o
exército iraniano, que acabavam com centenas de pessoas mortas. Para agravar a situação,
o governo retirou os subsídios às instituições religiosas xiitas. Em agosto, vários cinemas
foram incendiados por exibirem filmes de conteúdo impuro e pecador (em certas ocasiões,
as salas eram incendiadas com pessoas trancadas dentro). Em 08/09, a capital do país,
Teerã, foi cenário de protestos violentos que terminaram em um massacre, fazendo o dia
ficar lembrado como a “Sexta-Feira Negra” (MAUGERI, 2006). Segundo Yergin, (2009, p.
766), “esse foi o momento decisivo. Daí em diante, o governo do xá entrou em colapso
como força de controle efetiva”.
Juntamente com os protestos violentos, as greves estavam ocorrendo com força
total. O xá, enfraquecido por um câncer, não tomava as medidas necessárias para retomar o
67
controle de sua nação; ao invés disso, insistia em instaurar um programa de liberalização no
país.
Assim como o resto do país, a indústria petrolífera iraniana foi tomada pelas greves e
“caminhava numa escalada para o caos” (YERGIN, 2009, p. 768). A principal área de
produção de petróleo localizava-se no sudeste do país – conhecida como “The Fields”,
incluía Masjid-i-Suleiman, a região onde petróleo foi encontrado pela primeira vez na Pérsia,
em 1908, pela Anglo-Persian – e era controlada pela Oil Service Company of Iran, a OSCO.
Em outubro, um pequeno grupo de grevistas se mudou para o escritório central da empresa,
localizado na cidade de Ahwaz. Em novembro, centenas de grevistas estavam acampados
no edifício, orando e protestando. Devido a greve, as exportações iranianas caíram de 4,5
milhões bpd para menos de 1 milhão bpd. Diante dessa situação, o xá instalou um governo
militar. Com tropas nos campos de petróleo (e até no escritório central da OSCO), a
produção, temporariamente, voltou ao normal.
Entretanto, o mês de dezembro/1978 se iniciou com Khomeini prometendo “um mês
de vingança e de „torrentes de sangue‟” (YERGIN, 2009, p. 770). Diversos protestos
violentos, que resultaram em muitas mortes, ocorreram em todo o país. A onda de violência
chegou também à indústria de petróleo. No início de dezembro, um gerente geral da OSCO
sofreu um atentado na porta de casa. A partir daí, apesar de o gerente ter saído ileso, o
pânico assolou a indústria petrolífera iraniana: planos de evacuações para os mais de 1000
trabalhadores expatriados de The Fields e suas famílias passaram a ser traçados, as greves
voltaram com força total e a produção de petróleo caiu bruscamente. Para agravar a
situação, um outro executivo do petróleo foi morto com um tiro na cabeça quando estava em
seu carro indo para o trabalho, alguns dias depois. Logo após o assassinato, iniciou-se a
evacuação dos trabalhadores estrangeiros. No final de dezembro, as exportações de
petróleo iraniano cessaram completamente.
A queda na produção de petróleo, além de afetar o mercado internacional de
petróleo (os preços já começavam a subir em determinados lugares), passou a afetar o
consumo interno do Irã – a população passou a enfrentar longas filas para obter gasolina ou
querosene, utilizados para cozinhar. Diante desse cenário caótico, os governantes decidiram
que o xá deveria deixar o Irã e um governo de coalizão deveria ser formado. Ao mesmo
tempo, a Osco decidira que todos os funcionários expatriados deveriam sair do Irã.
Mohammed Pahlavi deixou o Irã em 16/01/1979, marcando o fim da dinastia Pahlavi. O país
ficou em festa. Entretanto, essa festa duraria somente algumas semanas. Em 01/02,
Khomeini regressou ao Irã, trazendo consigo um grupo de revolucionários que objetivavam
governar o país, liderado por Mehdi Bazargan. Na segunda semana de fevereiro, tropas do
68
governo de coalizão e de Khomeini se enfrentaram num conflito, que terminou com
Bazargan assumindo o governo do Irã. Assim como a dinastia Pahlavi entrou em colapso, o
mundo do petróleo estava entrando em pânico (MAUGERI, 2006).
3.4.3) As Consequências da Revolução Islâmica no Irã
Em 1978, o medo de uma escassez de petróleo já tinha criado uma psicologia
distorcida no mercado mundial, o que serviu para preparar o cenário para um 2º choque do
petróleo. Faltava somente um catalisador para iniciá-lo. A Revolução Islâmica no Irã foi
muito mais que um catalisador, foi uma tempestade que assolou o mercado mundial por
quase 2 anos e elevou os preços do petróleo para os maiores patamares jamais vistos
(MAUGERI, 2006). Como relatou Yergin (2009, p. 775):
E, do Irã, como se tivesse sido sacudido por um violento terremoto, uma
onda gigante espalhou-se pelo mundo, varrendo tudo (...) A onda gerou o
Segundo Choque do Petróleo, elevando os preços de US$ 13 para US$ 34
o barril, desencadeando mudanças maciças não apenas na indústria
petrolífera internacional, mas também, pela segunda vez em menos de uma
década, na economia e na política mundiais.
Para compensar a perda do petróleo iraniano no mercado, os países da OPEP
aumentaram sua produção – como exemplo, a Arábia Saudita aumentou sua produção de
8,5 milhões bdp para 10,5 milhões bpd no final de 1978, passando para 10,1 milhões bpd no
primeiro trimestre de 1979. Com isso, o mercado sofreu uma perda em torno de 2 milhões
bpd, o equivalente a 4% da demanda mundial (50 milhões bpd). Entretanto, apesar de a
perda ter sido pequena, o preço do petróleo sofreu um aumento de 150%. Para Yergin
(2009), o principal fator que ocasionou o aumento astronômico no preço foi o “forte poder da
emoção”: com a crise do petróleo iraniano, as pessoas se deixaram levar pelo medo
(acreditavam que uma profecia de escassez de petróleo a partir da década de 80 tinha se
cumprido) e pelas incertezas (não sabiam qual a repercussão e alcance a revolução iraniana
podia tomar).
Os compradores foram os que mais se deixaram levar pelo medo: receosos com os
aumentos progressivos dos preços e, mais ainda, com uma possível escassez de petróleo,
passaram a acumular petróleo desesperadamente. Companhias petrolíferas, usuários
industriais, servidores públicos, motoristas. Todos compartilhavam do mesmo medo e
tiveram a mesma atitude: conseguir petróleo além do que era realmente preciso. Isso
ocasionou uma demanda extra de 3 milhões bpd que, somada a perda de 2 milhões bpd do
petróleo iraniano, fez que com o mercado sofresse uma perda de 5 milhões bpd (10% do
consumo). “Em suma, as compras geradas do pânico para formar estoques mais que
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dobraram a escassez real, alimentando em seguida o próprio pânico. Esse foi o mecanismo
que elevou o preço do barril de US$ 13 para US$ 34” (YERGIN, 2009, p. 778).
Uma demonstração de quanto o medo estava tomando conta do mercado petrolífero
mundial foi invocação em massa da cláusula force majeure (força maior, também chamada
de “Ato de Deus”) no início de 1979 – temerosos com uma possível falta de petróleo, as
empresas começaram a cancelar seus contratos de fornecimento de petróleo. A 1ª a fazer
isso foi a British Petroleum, companhia petrolífera mais afetada pela crise no Irã (45% de
seu petróleo era extraído daquele país). Antes da crise, a BP obtinha petróleo muito mais
que o necessário e por isso vendia esse excedente, tanto para outras empresas como para
refinadores independentes. Porém, com a crise, a empresa deixou de ter essa capacidade
extra e cancelou vários contratos através da force majeure. A partir daí, houve um efeito
dominó. Todas as outras empresas fizeram o mesmo, pois além de serem afetadas pelos
cortes do Irã e da BP, foram tomadas pelo pânico. Com isso, vários refinadores
independentes ficaram subitamente sem petróleo (principalmente o Japão, que comprava
20% do seu petróleo do Irã). O resultado: companhias (privadas e estatais) e refinadores
independentes de vários países não tiveram outra saída a não ser entrar no mercado de
petróleo à vista.
Esse mercado – conhecido como “Mercado Roterdam” – que até então não tinha
expressão (em 1978, correspondia a apenas 4% do mercado total de petróleo), começou a
ser o centro das negociações. Consequentemente, os preços alavancaram: em fevereiro de
1979, os preços no mercado à vista eram o dobro dos oficiais. Diante do boom do mercado
à vista, os exportadores de petróleo viram, mais uma vez, uma oportunidade de lucrarem
ainda mais. Assim, passaram a acrescentar bônus aos preços oficias dos carregamentos
que possuíam contratos de longo prazo. E, paralelamente, passaram a invocar a force
majeure e cancelaram vários contratos de longo prazo, para vender petróleo à vista.
No início de março/1979, a produção do Irã começou a se estabilizar e o petróleo
desse país começou a voltar ao mercado. Com isso, os preços à vista recuaram e se
aproximaram dos preços oficiais. Mas como relatou Yergin, (2009, p. 780), “o pânico e a
competição febril do mercado haviam adquirido vida própria”. As dúvidas quanto à
estabilização da produção iraniana começaram a surgir, juntamente com rumores de que
vários países da OPEP diminuiriam suas produções. No final de março, com os preços à
vista 30% mais caros, os países da OPEP se reuniram. Após a reunião, ficou decidido que
cada país poderia acrescentar taxas e bônus nos preços oficiais “a seu bel-prazer” ou, nas
palavras de Yamani, a partir dali era “cada um por si” (YERGIN, 2009, p. 780). O ministro
árabe estava certo: os produtores começaram a disputar os maiores lucros, vendo quem
70
conseguia vender petróleo pelo preço mais alto. Aliado a isso, havia a busca frenética dos
compradores por fornecimento. A situação do mercado de petróleo em meados de 1979
pode ser resumida por um relato de um coordenador de suprimentos da Shell:
Ninguém controlava nada. Nós só brigávamos pelo óleo. Em todos os
níveis, tínhamos a sensação de que era preciso comprar agora, qualquer
que fosse o preço era bom se comparado com o que custaria amanhã.
Tínhamos que dizer „sim‟ ou fracassaríamos. Essa era a psicologia do
comprador. Por piores que fossem as condições do nosso ponto de vista,
amanhã seriam ainda mais terríveis. (YERGIN, 2009, p. 781)
Para piorar a situação do mercado petrolífero mundial, jovens iranianos fanáticos –
partidários de Khomeini – invadiram a embaixada dos EUA em Teerã em 04/11/1979,
fazendo 50 americanos reféns. Esse ato teve como principal motivador o exílio que o
governo dos EUA fornecera, em outubro, para o xá Mohammed Pahlavi. Segundo Yergin
(2009), Khomeini sabia do plano dos “estudantes” (como os jovens iranianos ficaram
conhecidos) e, mais ainda, o encorajou – afinal, seu “ódio ao xá era comparável apenas ao
horror que devotava aos Estados Unidos, que considerava o principal elemento de apoio ao
regime de Pahlavi” (YERGIN, 2009, p. 764). O governo dos EUA reagiu ao ataque à
embaixada embargando as importações de petróleo do Irã, além de congelar todos os bens
iranianos. Em retaliação, o Irã proibiu a exportação de petróleo para os EUA e qualquer
companhia americana. As atitudes dos 2 governos causaram uma redistribuição de petróleo
no mundo, o que serviu para aumentar o pânico e, consequentemente, os preços – em
determinadas situações, o petróleo passou a ser vendido por US$ 50 o barril.
No final de dezembro/1979, houve a 55ª reunião da OPEP. Reunidos em Caracas,
os ministros do petróleo estavam extasiados com os preços do petróleo e objetivavam
aumentá-lo ainda mais. Uma exceção era a Arábia Saudita. Os sauditas estavam temerosos
com o rumo que a situação estava tomando e com as conseqüências que poderiam ocorrer,
como perda de controle sobre o mercado e até uma grave crise econômica mundial. Assim,
defendiam a diminuição e estabilização dos preços – estavam aumentando sua produção
para forçar uma baixa nos preços, o que não estava ocorrendo. Na reunião, Yamani reiterou
aos outros ministros o ponto de vista da Arábia, advertindo que a demanda estava
diminuindo e que uma saturação poderia ocorrer em breve. Porém, não foi levado a sério.
Os exportadores estavam confiantes de que a demanda aumentaria cada vez mais,
possibilitando o aumento dos preços e, consequentemente, dos seus lucros. Nas palavras
de Maugeri (2006, p. 124), “estavam convencidos de que os preços do petróleo poderiam
desafiar a lei da gravidade enquanto não houvesse alternativa econômica para o petróleo”.
Após a reunião, a maioria dos países aumentou novamente os preços do petróleo. Para
Yergin (2009, p. 798), esse “foi o momento que os exportadores perderam contato com a
realidade do mercado”.
71
Também no final de 1979, vários acontecimentos ocorreram no Oriente Médio,
motivados pelo ódio aos EUA e ao Ocidente, como a tomada da Grande Mesquita de Meca
por 700 fundamentalistas armados e os protestos xiitas na região petrolífera de Al-Hasa, na
Arábia Saudita. Além disso, houve a invasão do Afeganistão pela União Soviética no final de
dezembro/1979, cujo principal alvo era o Golfo Pérsico e suas gigantescas reservas de
petróleo (MAUGERI, 2006) – “a primeira incursão em larga escala das forças militares
soviéticas fora do bloco comunista desde a 2ª Guerra Mundial” (YERGIN, 2009, p. 795).
Diante de todos esses fatos, em janeiro/1980 o presidente Carter, em seu discurso
anual The State of the Union, “vinculou o petróleo e a segurança do Golfo Pérsico em 2
parágrafos-chave” (FUSER, 2008, p. 139). No 1º parágrafo, o presidente reiterou a
importância daquela região para o mercado petrolífero mundial:
A região que agora é ameaçada pelas tropas soviéticas no Afeganistão é de
grande importância estratégica. Ela contém mais de 2/3 do petróleo
exportável no mundo. O esforço soviético de dominar o Afeganistão trouxe
as forças militares soviéticas a uma distância de 300 milhas do Oceano
Índico, perto do Estreito de Hormuz, por onde passa a maior parte do
petróleo do mundo. (CARTER, 1980 apud FUSER, 2008, p. 140)
No 2º parágrafo, anunciou a postura dos EUA em relação a situação, o que ficou
conhecido como a Doutrina Carter:
Vamos deixar absolutamente clara a nossa posição: qualquer tentativa de
uma força externa de obter o controle da região do Golfo Pérsico será
considerada um ataque aos interesses vitais dos Estados Unidos da
América, e esse ataque será repelido por todos os meios necessários,
inclusive a força militar. (CARTER apud FUSER, 2008, p. 140)
Em abril/1980, diante do impasse da crise dos reféns no Irã, o presidente decidiu que
os EUA interviriam militarmente. Assim, foi planejada uma operação de resgate: 8
helicópteros e 6 aviões de transporte Hercules C-130 seriam utilizados para que as forças
militares americanas retomassem o controle da embaixada e libertassem os reféns.
Entretanto, a missão foi abortada antes mesmo de os militares chegarem na embaixada,
pois vários problemas ocorreram no caminho devido as condições climáticas: 3 helicópteros
tiveram problemas mecânicos e outro se perdeu numa tempestade de areia e colidiu com
um avião C-130, explodindo ambos e matando 8 soldados americanos (MAUGERI, 2006). A
operação (denominada “Garra da Águia”), apesar de ter fracassado, foi a primeira
intervenção militar norte-americana efetiva no Golfo Pérsico e “inaugurou uma nova era: o
emprego direto da força militar norte-americana, exatamente como propõe a Doutrina
Carter” (FUSER, 2008, p. 153).
A tentativa da operação de resgate e seu fracasso, juntamente com a queda da
produção iraniana, agravaram o pânico no mercado petrolífero mundial. Em junho/1980, os
72
países da OPEP se reuniram novamente. A Arábia Saudita mais uma vez tentou convencer
os outros países a abaixarem e estabilizarem os preços (desta vez com o apoio do Kuait), e
mais uma vez fracassou. O preço médio do barril estava em US$ 32, quase 3 vezes o preço
de meados de 1978, e o mercado já dava sinais de saturação: os estoques das empresas
estavam cada vez maiores e a demanda estava diminuindo.
Entretanto, o mercado de petróleo estava prestes a sofrer uma crise de proporções
inéditas e históricas.
CAPÍTULO 4
O PETRÓLEO E OS CONFLITOS NO ORIENTE MÉDIO – PARTE 2
4.1) A Guerra Irã x Iraque
4.1.1) O Pré-guerra
A rivalidade entre Irã e Iraque data da antiguidade. Há 5.000 anos atrás, quando a
civilização do Crescente Fértil ainda estava se iniciando, soldados de Elam (atual Irã) e
soldados da Mesopotâmia (atual Iraque) já guerreavam. Depois de quatro milênios, o
cenário não havia se modificado. Dentre as várias rivalidades entre os 2 países (étnicas,
religiosas, políticas, econômicas, etc.), “a geografia estava, sem dúvida, no coração do
conflito” (YERGIN, 2009, p. 801).
O rio Shatt-al-Arab, que funcionava como fronteira ao longo de 200 km entre os 2
países, era um dos principais motivos da disputa (figura 4.1). Primeiramente, pois o rio era o
único acesso iraquiano ao alto-mar e o principal meio de acesso iraniano ao Golfo Pérsico.
Além disso, grande parte das instalações petrolíferas (refinarias, tanques de estocagem,
estações de bombeamento, etc.), tanto do Irã quanto do Iraque, estavam localizadas nas
proximidades do rio e/ou eram dependentes dele. A maior parte do petróleo produzido no
Iraque era exportada pelo rio, com poucos oleodutos na Síria e na Turquia como
alternativas. Já a indústria iraniana, apesar de também ser dependente do rio, possuía mais
alternativas, como um terminal marítimo acessível a superpetroleiros, localizado na ilha de
Kharg, além de vários oleodutos.
Figura 4.1 – O rio Shatt-al-Arab.
Fonte: http://news.bbc.co.uk/2/hi/middle_east/4619604.stm
Em 1975, antes da revolução no Irã, o xá Pahlavi e os militantes Ba‟thistas (regime
que assumiu o poder do Iraque em 1968) fecharam um acordo, no qual foi reconhecido que
o limite entre os dois países era o meio do leito navegável o rio. Entretanto, o controle total
do rio continuava a ser uma ambição das 2 nações.
74
Além da disputa pela soberania sobre o Shatt-al-Arab, havia a disputa entre
Khomeini – líder da oposição xiita iraniana e responsável pela Revolução Islâmica no Irã no
final dos anos 70 – e Saddam Hussein – o homem forte do regime Ba‟thista, que assumiu a
presidência do Iraque em 1979. Durante seu exílio no Iraque, na década de 70, Khomeini
desenvolveu um ódio implacável ao regime iraquiano, cuja “ira se concentrava sobre o
presidente Saddam Hussein” (YERGIN, 2009, p. 802). Muito antes de chegar à presidência,
Saddam já era considerado um shaqawah: um homem cruel e frio, que utilizava qualquer
meio (principalmente a força) para alcançar seus objetivos e a quem todos deveriam temer.
Com a Revolução Islâmica no Irã, os xiitas do Iraque – que correspondiam a quase
metade da população – começaram a se agitar, uma vez que o partido Ba‟th era baseado na
minoria sunita. Em abril/1980, o vice-primeiro-ministro iraquiano sofreu uma tentativa de
assassinato. Em represália, o mais importante aiatolá xiita do Iraque foi executado, a mando
de Husseim.
Diante do caos pós-revolução que se instaurou no Irã (anarquia nas ruas e
desorganização das Forças Armadas, devido ao expurgo em massa de oficiais favoráveis ao
xá Pahlavi), o líder iraquiano vislumbrou a oportunidade de destruir um forte inimigo seu –
Khomeini – para assim acabar com a ameaça xiita no Iraque e, acima de tudo, de conquistar
o controle total do Shat-al-Arab. Além de proteger as instalações petrolíferas iraquianas, um
ataque ao Irã traria outro benefício relacionado ao petróleo: a região do Khuzistão,
localizada no sudoeste iraniano, a qual concentrava 90% das reservas petrolíferas do Irã.
Husseim planejou se apresentar como um “libertador” da minoria árabe da região e
incorporar seu território. Se saísse vitorioso do ataque, o Iraque poderia se tornar uma das
principais potências petrolíferas mundiais e o principal líder árabe. Nas palavras de Fuser
(2008, p. 166), “o que estava em jogo aos olhos do líder iraquiano era a hegemonia
regional”. Ainda segundo o autor, os EUA encorajaram, em sigilo, o Iraque, com o objetivo
de “arrancar definitivamente esse país da órbita soviética e usá-lo como um instrumento na
nova frente de combate contra os aiatolás iranianos” (idem, p. 167).
4.1.2) O Conflito
Em 22/09/1980, a força área iraquiana iniciou um ataque-surpresa a vários alvos em
território iraniano, ao mesmo tempo em que o exército iraquiano invadia a fronteira entre os
2 países e atacava várias cidades. Iniciava-se assim a Guerra Irã x Iraque, “colocando mais
uma vez em risco o sistema de fornecimento de petróleo, ameaçando um terceiro choque”
(YERGIN, 2009, p. 800).
75
A estratégia militar do Iraque era arrasar o Irã rapidamente, com vários ataques
simultâneos e pesados, no melhor estilo blitzkrieg alemão. Husseim calculara que a vitória
seria alcançada de maneira fácil e rápida. Porém, equivocou-se. O Irã resistiu a blitzkrieg
iraquiana e iniciou um contra-ataque igualmente violento. Khomeini conseguiu unir e
mobilizar a população em prol da República Islâmica: “certos de que „a maior alegria no Islã
é matar e ser morto por Deus‟” (YERGIN, 2009, p. 805), milhares de jovens e crianças se
lançavam aos fronts, a frente do exército iraniano.
Os principais alvos no conflito eram as instalações petrolíferas. O Iraque
bombardeou durante um mês a refinaria de Abadã (a maior do mundo), além de desferir
vários outros ataques a portos e cidades iranianas ligadas ao petróleo, como Ahwaz. O Irã
por sua vez destruiu várias instalações iraquianas na região do golfo, além de ter persuadido
a Síria (que era governada por um partido Ba‟th rival ao de Husseim) a sabotar os oleodutos
iraquianos que atravessam o país, deixando somente um oleoduto na Turquia como meio de
exportação de petróleo iraquiano. Como resultado, as exportações do Irã caíram e as do
Iraque quase cessaram, o que serviu para agitar o mercado mundial.
Inicialmente, a guerra causou uma perda no mercado de 4 milhões bpd (o
equivalente a 8% da demanda mundial), o que causou mais uma alta nos preços à vista – o
petróleo árabe leve atingiu o preço de US$ 42. Apesar de a demanda estar em declínio e as
companhias estarem com excesso de estoque, o medo que havia assolado o mercado
mundial e causado o 2º choque começava a ganhar força novamente. A IEA reiterava às
companhias a não agirem movidas pelo medo: deveriam recorrer aos seus estoques ao
invés de comprarem petróleo desnecessariamente. Entretanto, seus esforços não estavam
surtindo efeito. Em dezembro/1980, a OPEP se reuniu em Bali, e mais um aumento nos
preços fora decidido: o barril de petróleo seria vendido a US$ 36. Entretanto, enquanto a
guerra se desenrolava no Oriente Médio, o mercado petrolífero começou a mudar.
4.1.3) O Contrachoque do Petróleo
No final/1980, os estoques continuavam em excesso, assim como a demanda
continuava a cair. A Arábia Saudita, ainda contra os aumentos irrestritos dos outros países
da OPEP, aumentou sua produção. Além disso, vários países fora da OPEP também
aumentaram sua produção, como México, Inglaterra e Noruega. Diante desse cenário, as
companhias passaram a recorrer aos seus estoques ao invés do mercado à vista.
Consequentemente, os preços começaram a cair. Além disso, os produtores fora da OPEP
passaram a dar descontos em seus preços oficiais para ganhar mais mercado. Em
outubro/1981, os países da OPEP, diante da situação, decidiram baixar o preço para US$
34, enquanto a Arábia subiria o seu de US$ 32 para US$ 34, reunificando os preços. Mas
76
essa medida não seria suficiente para enfrentar as transformações pela qual o mercado
mundial estava passando.
A demanda por petróleo continuava em declínio nos primeiros anos da década de
80. Inicialmente, isso se deveu a grande recessão econômica que atingiu os países
industrializados do Ocidente entre 1980 e 1982. Diante dos altos preços decorrentes dos
choques, o petróleo começou a perder espaço no mercado de energia para outras fontes,
como o carvão e a energia nuclear. Além disso, após a recuperação econômica, os países
do Ocidente começaram a dar ênfase ao consumo de energia – como exemplos, em 1985
os EUA se tornaram 32% mais eficientes no consumo de petróleo do que em 1973, e o
Japão 51% no mesmo período. Como conseqüência, o consumo de petróleo dos países
ocidentais passou de 51,6 milhões bpd em 1979 para 45,7 milhões bpd em 1983 (uma
diminuição de quase 6 milhões de bpd). E a participação do petróleo na matriz energética
dos países industrializados caiu de 53% em 1978 para 43% em 1985.
Ao contrário da demanda, a produção de petróleo fora da OPEP só aumentava. Isso
porque os altos preços do petróleo estimularam o desenvolvimento de novas tecnologias e a
exploração em novas áreas. Assim, a produção em regiões como o Alasca e mar do Norte
aumentaram, bem como de vários outros países, como México, Egito, Angola e China.
Assim, entre 1979 e 1983, a produção extra-OPEP aumentou em 4 milhões bpd.
Diante dessas transformações, a OPEP começou a perder mercado. Porém, os
países produtores não aceitavam baixar os preços e então decidiram, em março/1982,
baixar a produção: um limite de 18 milhões bpd foi estabelecido (como comparação, a
organização produzira 31 milhões bpd em 1979), com cotas individuais de produção para
cada país. A única exceção foi a Arábia Saudita, cuja produção funcionaria como um
regulador do sistema. Segundo Maugeri (2006), com esse ato a OPEP se transformou em
um verdadeiro cartel. Mas a demanda mundial continuava a cair, bem como os preços à
vista. E a produção extra-OPEP só aumentava. Em março/1983, os países da OPEP tiveram
que tomar uma atitude histórica: baixaram seus preços de US$ 34 para US$ 29 o barril (um
corte de 15%).
No decorrer da década de 80, o petróleo estava cada vez mais abundante no
mercado e seu preço, consequentemente, estava caindo. Diante desse cenário, os lucros
dos países da OPEP começaram a cair e os mesmos começaram a burlar os sistemas de
cotas. Com as fraudes aumentando cada vez mais, a Arábia Saudita começou a sofrer os
prejuízos de tentar ser o controlador dos preços da OPEP: sua receita, que em 1981 era de
US$ 119 bilhões, caiu para US$ 26 bilhões em 1985. Além disso, o país estava perdendo
cada vez mais mercado. Com a perda de mercado, vinha a perda de influência no Oriente
77
Médio. Após advertirem os demais países da OPEP que não aceitariam mais essa situação
e não verem nenhuma mudança ocorrer, os sauditas tomaram uma atitude – não iriam mais
tentar manter os preços da OPEP, mas sim assegurar que sua produção alcançasse um
nível satisfatório. Para isso, passaram a fazer acordos de lucros garantidos: ao invés de
cobrar um preço fixo dos refinadores, cobrariam um preço baseado no que os produtos
refinados rendessem.
Os contratos de lucros garantidos fizeram com que não houvesse mais um preço
oficial do petróleo saudita, mas sim um preço que iria depender do mercado. Para competir
com a Arábia Saudita, os outros exportadores da OPEP passaram também a fazer os
contratos de lucros garantidos. Em novembro/1985, após uma reunião, a OPEP “anunciava
sua intenção de disputar com os países não membros a recuperação dos mercados
perdidos (...) e já não praticava o protecionismo nos preços” (YERGIN, 2009, p. 849). A
partir daí, os preços do petróleo começaram a cair bruscamente – como exemplo, a West
Texas Intermediate reduziu o preço do barril de US$ 31,75 para US$ 10, enquanto no Golfo
Pérsico o barril passou a ser negociado até a US$ 6. Iniciava-se assim o contrachoque do
petróleo.
Segundo Maugeri (2006), o contrachoque choque quebrou todas as regras e
percepções estratégicas que governaram a indústria petrolífera mundial durante todo o
período pós-guerra. Ao contrário dos outros 2 choques, foi a vez dos exportadores serem
tomados pelo pânico, os quais começaram a travar verdadeiras batalhas por mercado. E os
compradores, dessa vez, tiravam proveito da situação e tentavam conseguir petróleo pelo
menor preço possível. A única saída para os exportadores conseguirem mercado era
oferecer cada vez mais descontos e acordos. Pela primeira vez na história da indústria
petrolífera mundial, não havia estrutura de fixação de preços. Yergin (2009, p. 850) defende
2 fatores como as principais causas do contrachoque do petróleo:
Não era um tipo específico de acordo – o de lucros garantidos ou o que
fosse – que causava o colapso dos preços, mas sim 2 fatores fundamentais,
um deles que havia mais petróleo à procura de mercados do que mercados
à procura de petróleo e o outro que a mão de um regulador, no caso a
OPEP e em especial a Arábia Saudita, fora eliminada.
O colapso dos preços permaneceu até dezembro/1986, quando a OPEP se reuniu
em Genebra e decidiu que um “preço de referência” de US$ 18 seria adotado, bem como
uma quota individual a todos os países membros (com exceção do Iraque, que estava em
dissidência temporária com a OPEP por causa da guerra ainda em andamento com o Irã). A
medida tomada pela OPEP funcionou, apesar de em determinados momentos dos anos
seguintes uma sombra do colapso dos preços ter se formado no mercado. Enquanto o
78
contrachoque do petróleo chegava ao fim, a guerra entre Iraque e Irã chegava ao seu sétimo
ano de duração.
4.1.4) O Fim da Guerra
Em 1987, “a guerra transpôs barreiras que a tinham mantido restrita aos dois países
beligerantes e pela primeira vez internacionalizou-se, atraindo tanto os demais países
árabes do Golfo, quanto as duas superpotências” (YERGIN, 2009, p. 866).
No início de 1987, o Iraque, através de sucessivos ataques aéreos, estava arrasando
as frotas mercantes iranianas do Golfo, na chamada “guerra dos petroleiros”. O Irã – que
após conquistar em 1986 a península de Fao, no extremo sul do Iraque, não conseguia mais
avançar – concentrou seu contra-ataque no Kuait, que estava auxiliando o Iraque. Além do
próprio Kuait, as tropas iranianas tinham como alvo principal os petroleiros kuaitianos.
Diante do sucesso do Irã, o governo do Kuait pediu o auxílio dos EUA para proteger seus
navios: solicitou que 8 de seus petroleiros navegassem com bandeira norte-americana.
Como o mesmo pedido foi feito à União Soviética, o governo norte-americano logo acatou o
pedido. Os navios kuaitianos passaram então a navegar com bandeira norte-americana sob
proteção da Marinha dos EUA. Baseado no discurso do secretário de defesa Harold Brown –
“a proteção do fluxo de petróleo do Oriente Médio é claramente uma parte do nosso
interesse vital” e por isso “nós vamos levar a cabo qualquer ação que for necessária,
inclusive o uso da força militar” (BROWN, 1983 apud FUSER, 2008, p. 154), os EUA
mandaram vários navios de guerra para o Golfo. Para Palmer (1992 apud FUSER, 2008, p.
174), esse foi “um ponto de virada na história do envolvimento norte-americano no Golfo
Pérsico”, a partir do qual os EUA se tornaram os “guardiões do Golfo”. Outros países
também mandaram frotas militares para a região, como Inglaterra, França, Itália, Bélgica e
Países Baixos. O Irã respondeu a presença naval do Ocidente intensificando a utilização de
minas marítimas nas rotas dos petroleiros kuaitianos, além de passar a utilizar suas
plataformas de petróleo como base militar para bombardear os navios. Após uma
embarcação norte-americana ser avariada por uma mina marítima, as Forças Armadas
americanas reagiram “com a mais agressiva das suas ações militares na Guerra Irã-Iraque,
a Operação Louva-Deus” (FUSER, 2008 p. 173): metade da frota naval iraniana no Golfo foi
destruída, além de 2 plataformas de petróleo.
Em meados de 1988, o Iraque estava em vantagem na guerra, principalmente devido
ao intenso uso de armas químicas (como o gás mostarda e o gás dos nervos, em grande
parte fornecidas pelos EUA) e ao auxílio naval dos EUA no Golfo. O Irã, que fora expulso de
todas as posições anteriormente conquistadas, estava sendo cada vez mais devastado pela
guerra (em um só mês, a capital Teerã foi atingida por 140 mísseis iraquianos). Com isso, o
79
regime de Khomeini enfraqueceu (assim como o próprio aiatolá, que estava velho e doente).
Coube a Ali Akbar Hashemi Rafsanjani, o homem forte da República Islâmica após
Khomeini, tomar a liderança e decidir que a guerra tinha que acabar. Para reforçar ainda
mais a posição de Rafsanjani, durante uma batalha naval em julho/1988, um destróirer
norte-americano derrubou um airbus iraniano, que levava 290 passageiros, ao confundi-lo
com uma aeronave de combate. Para alguns líderes iranianos, não se tratou de um engano,
mas sim de um sinal de que se fosse preciso, os EUA interviriam diretamente no conflito.
Após o incidente, o Irã tentou ganhar apoio diplomático na comunidade internacional, mas
fracassou. Como relatou o historiador Charles Tripp (2003, apud FUSER, 2008, p. 174):
Aos olhos de Teerã, o Irã agora estava envolvido numa guerra não
simplesmente com o Iraque, mas também com as potências ocidentais com
as quais o Iraque vinha desenvolvendo um relacionamento cada vez mais
estreito durante a guerra.
O Irã estava arruinado, isolado e sem possibilidade de sair vitorioso. Assim, em
17/07, anunciou sua posição favorável a um cessar-fogo. Após semanas de negociações, o
Iraque aceitou o cessar-fogo em 20/08/1988, colocando fim “a mais longa guerra
convencional do século XX” (FUSER, 2008, p. 165). Para Yergin (2009), não houve vitorioso
no conflito, mas sim um empate com leve inclinação para o Iraque, que saiu da guerra com
a ambição de se tornar o principal poder no Golfo e uma das principais potências
petrolíferas mundiais. Ainda segundo o autor, o fim da guerra teve um significado muito mais
amplo:
Parecia que a ameaça à livre vazão de petróleo do Oriente Médio havia sido
afinal removida; e, com o silenciar das armas ao longo da costa do Golfo
Pérsico, a era da crise duradoura no mundo petrolífero iniciado com a
Guerra de Outubro, 15 anos antes, ao longo das margens de outro canal, o
de Suez, finalmente parecia ter chegado ao fim. (idem, p.869)
4.2) A Guerra do Golfo
4.2.1) O Pré-guerra
O início do ano de 1990 foi marcado pelo fim da Guerra Fria e por uma expectativa
de democracia e paz em todo o mundo. Essa calmaria também estava presente no mercado
mundial de petróleo. O preço havia se estabilizado em US$ 18 e as reservas mundiais
comprovadas aumentaram consideravelmente (de 670 bilhões de barris, em 1984, para 1
trilhão de barris em 1990). O petróleo parecia ter se tornado “apenas mais uma mercadoria”,
como a nova sabedoria convencional havia proclamado (MAUGERI, 2006).
Entretanto, o aumento das reservas comprovadas concentrou-se no Golfo Pérsico –
em 1990, 2/3 das reservas mundiais se localizavam nessa região. Assim, apesar de não
80
haver nenhuma previsão de crise no fornecimento de petróleo, havia a concepção de que o
mundo estava dependente do extremamente instável Golfo Pérsico. Ao contrário da Europa,
onde o otimismo era total, o Oriente Médio (e mais precisamente o Golfo Pérsico) enfrentava
problemas como rápido crescimento demográfico, estagnação econômica e pobreza da
maioria da população, com exceção das monarquias do petróleo – nas palavras de Fuser
(2008, p. 178), “a região permaneceu à margem da maré democrática que varreu o leste
europeu”. Segundo o então presidente norte-americano George H. W. Bush, “a região era „o
centro nervoso‟ das economias ocidentais desenvolvidas” – e o controle de seus recursos
petrolíferos era uma prioridade estratégica dos EUA (BROWN, 1994 apud FUSER, 2008, p.
176).
Após o contrachoque do petróleo, a maioria dos países exportadores passaram a se
aproximar dos países consumidores, com o objetivo de serem vistos como fontes seguras e
confiáveis de petróleo. Essa era a atitude mais racional, afinal “o petróleo precisava de
mercados e os mercados precisavam de petróleo” (YERGIN, 2009, p. 874). Uma exceção
era o Iraque.
O Iraque não admitia um relacionamento saudável com o mundo industrializado.
Apesar do “empate” na longa e dispendiosa guerra contra o Irã, Saddam Hussein ainda
tinha ambições totalitárias. Objetivava dominar o Golfo Pérsico e todo o mundo árabe, para
emergir como uma potência mundial, tanto petrolífera quanto militar. Desde 1985, o Iraque
havia se tornado o maior comprador de armas do mundo e, no início de 1990, Hussein
continuava sua corrida armamentista, destinando 30% do PIB (Produto Interno Bruto)
iraquiano para fins militares, com ênfase nas armas de destruição em massa (químicas,
biológicas e nucleares).
Entretanto, o país estava falido financeiramente, principalmente devido à guerra
contra o Irã (em 1980, no início do conflito, o Iraque possuía US$ 36 bilhões em reservas; no
final do conflito, possuía uma dívida de US$ 80 bilhões, da qual quase a metade era com
países produtores de petróleo do Oriente Médio, como Kuait e Arábia Saudita). Assim, para
sustentar sua máquina de guerra, Hussein precisava de um aumento no preço do petróleo –
o preço mínimo satisfatório para o Iraque era de US$ 25 o barril, sendo que o preço cotado
estava em torno de US$ 18. O ditador iraquiano afirmava que “cada dólar a menos no preço
do barril de petróleo significava, para seu país, uma perda anual de US$ 1 bilhão por ano”
(HIRO, 2002 apud FUSER, 2008, p. 182). Para que o preço fosse elevado, o Iraque passou
a pressionar os países da OPEP para que a cota de produção fosse respeitada (a cota total
proposta era de 24 milhões bpd, enquanto 26 milhões bpd estavam sendo produzidos).
Kuait e Emirados Árabes eram os principais responsáveis pela produção excedente
81
(aproximadamente 80% do excedente vinha desses 2 países), o que levou Saddam a
acusá-los de conjurar com os EUA para manter os baixos preços do petróleo e assim
prejudicar o Iraque (MAUGERI, 2006). Em julho/1990, o ditador iraquiano mandou 100 mil
homens de seu exército para as fronteiras com o Kuait. Diante desse ato, Kuait e Emirados
Árabes passaram a respeitar suas cotas, mas o exército iraquiano continuou em suas
posições.
4.2.2) O Início da Crise – A Invasão do Iraque ao Kuait
Saddam não havia deslocado seu exército só para que o Kuait respeitasse suas
cotas, mas sim para invadir e anexar o país. E assim o fez em 02/08/1990. Não houve muita
resistência (a família real kuaitiana fugiu rapidamente) e o país logo foi invadido pelos
iraquianos.
Hussein utilizou de vários argumentos para justificar sua invasão: além da questão
da dívida iraquiana com o Kuait (segundo o ditador, as mesmas deveriam ser perdoadas,
pois haviam sido feitas para proteger todo o mundo árabe de um inimigo em comum, o Irã) e
das cotas de produção, o Iraque acusava o Kuait de roubar petróleo do vasto campo de
Rumaila – localizado na fronteira dos 2 países, parte do campo se estendia pelo subsolo
kuaitiano (figura 4.2). Segundo Saddam, os kuiatianos estavam explorando o campo para,
além de roubar petróleo, diminuir a pressão do reservatório e, assim, dificultar a exploração
por parte do Iraque (MAUGERI, 2006).
Figura 4.2 – O Campo Petrolífero de Rumaila.
Fonte: http://www.voltairenet.org/article162816.html.
Além disso, o Iraque acusava o Kuait de ter roubado 2 ilhas no Golfo (Warba e
Bubiyan), que pertenceriam ao território iraquiano (figura 4.3). A reivindicação sobre a
soberania das 2 ilhas solucionaria um problema histórico da geografia iraquiana: seu
limitado acesso ao mar. Aumentar o acesso do Iraque ao mar era um dos principais
objetivos do ditador iraquiano, uma vez que isso era essencial para suas as exportações de
82
petróleo. Grande parte do petróleo iraquiano era exportado através de oleodutos que
cruzavam outros países – além de limitar as exportações, isso forçava Saddam a manter
uma política de “boa vizinhança”, diminuindo sua autonomia política.
Figura 4.3 – As ilhas de Warba e Bubiyan.
Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/File:Ku-map.gif.
No final das contas, o petróleo foi o principal motivo da invasão. Se o Iraque tomasse
o controle total do Kuait, passaria a deter 20% da produção da OPEP e, mais importante
ainda, 20% das reservas mundiais de petróleo. Com isso, o país dominaria o poder do Golfo
Pérsico e se tornaria uma das principais potências petrolíferas mundiais. Saddam então
influenciaria os preços e as condições de fornecimento do petróleo do Oriente Médio, e “os
países ocidentais teriam que se curvar diante dele” (YERGIN, 2009, p. 876). Além disso, os
vastos campos petrolíferos da Arábia Saudita estavam próximos do Kuait: os principais
poços estavam a apenas 40 km de distância da fronteira kuaitiana. Em caso de ofensiva de
Hussein, o exército saudita, muito menor, seria derrotado facilmente – enquanto 525 mil
soldados iraquianos estavam no Kuait, o exército saudita continha apenas 38 mil soldados.
Muita coisa estava em jogo com a invasão do Kuait, como relatou Michael Klare (2004 apud
FUSER, 2008):
Uma vez que ele (Saddam) adquiriu o Kuait e deslocou para lá um exército
tão grande, estará em posição de poder ditar o futuro da política de energia
em escala mundial, e isso dará a ele uma posição de controle sobre nossa
economia.
83
Assim como no início da guerra contra o Irã, o ditador iraquiano presumiu que a
vitória seria alcançada de forma simples e rápida. E mais uma vez, se equivocou. Apesar de
o Kuait não ter oferecido resistência, toda a comunidade internacional se voltou contra o
Iraque, principalmente os EUA. Como represália à invasão, a ONU impôs um embargo às
exportações de petróleo iraquiano e kuaitiano em 06/08, além de sanções econômicas.
Com o embargo imposto pela ONU, o mercado sofreu uma perda de 4 milhões bpd
(7% da demanda mundial, que girava em torno de 65 milhões bpd). Essa perda, assim como
nos outros choques, causou pânico, que foi seguido de um aumento significativo do preço
do petróleo – aumentou de US$ 20 o barril em julho/1990 para US$ 30 em agosto,
alcançando a marca de US$ 40 o barril em setembro, devido à ameaça de Hussein em
destruir o sistema de fornecimento de petróleo da Arábia Saudita. Diante dessa situação,
vários países exportadores aumentaram suas produções, principalmente os países da
OPEP – somente a Arábia Saudita aumentou em 3 milhões bpd sua produção (o equivalente
a ¾ da perda). Assim, em dezembro/1990, a produção perdida foi completamente
compensada. Simultaneamente, a demanda começou a baixar, devido à recessão
econômica que atingia os principais países consumidores. Além disso, o governo dos EUA
anunciou que se fosse preciso, usaria sua REP (Reserva Estratégica de Petróleo) –
constituída por 600 milhões de barris – para evitar mais um choque. Como resultado, o
mercado acalmou e os preços começaram a cair – nas primeiras semanas de janeiro/1991,
o preço era de US$ 30 o barril.
O foco das preocupações da comunidade internacional não era o Kuait, mas sim o
petróleo. Uma coligação contra o Iraque, composta por 33 países e liderada pelos EUA, foi
formada com o aval da ONU. Segundo Fuser (2008), os EUA entraram na guerra contra o
Iraque por 2 motivos: primeiramente, para manter a hegemonia norte-americana no mundo
pós-Guerra Fria; e mais importante, para garantir o acesso ao petróleo do Golfo Pérsico.
Inicialmente, a preocupação da coligação era defender os campos petrolíferos sauditas.
Para isso, o governo norte-americano enviou 200 mil soldados à Arábia Saudita (na
chamada Operação Escudo no Deserto). O presidente norte-americano George H. W. Bush
justificou a mobilização militar norte-americana no Golfo: “Nossos empregos, nosso modo de
vida, nossa própria liberdade e a liberdade dos países amigos ao redor o mundo, todos
sofreriam se o controle das grandes reservas de petróleo do mundo caíssem nas mãos de
Saddam Hussein” (MAUGERI, 2006, p. 148). Posteriormente, outros países, como GrãBretanha, França, Itália, Arábia Saudita, Síria e Egito enviaram tropas para o Golfo Pérsico
para se juntarem as forças americanas. Yergin (2009, p. 877) reitera sobre a importância do
petróleo naquele momento:
84
Este foi o real significado do “fator petróleo”, a forma pela qual o petróleo
seria traduzido em dinheiro e poder: político, econômico e militar. Se ele
(Saddam Hussein) mantivesse o controle sobre o Kuait, o Iraque seria a
potência dominante do petróleo no planeta (...) e ele poderia dar a palavra
final sobre a economia mundial. (...) Em suma, o petróleo era fundamental
para a crise, não o “petróleo barato”, mas sim o petróleo como um elemento
fundamental no equilíbrio global de poder, como tinha sido desde a 1ª
Guerra Mundial.
Enquanto isso, o exército iraquiano continuava em ação no Kuait. Saddam estava
convencido de que o tempo era um aliado seu: quanto mais tempo persistisse, mais fraca
ficaria a pressão internacional. O governo norte-americano, com o desenrolar da situação,
também chegou à conclusão de que o tempo era um aliado do Iraque. Assim, em 08/11,
Bush decidiu dobrar o contingente militar americano no Golfo, enviando mais 200 mil
soldados para o Golfo, com o objetivo de dar aos EUA e a coligação “uma opção militar
ofensiva” (EVEREST, 2004 apud FUSER, 2008, p. 186). Mesmo diante desse ato, Saddam
não se intimidou: não acreditava que os EUA entrariam num conflito direto, pois isso
acarretaria em muitas baixas. Segundo o ditador, ao contrário dele, os EUA eram um país
que não aceitavam muitas baixas em uma guerra (YERGIN, 2009).
Em 29/11/1990, o Iraque recebeu um ultimato do Conselho de Segurança das
Nações Unidas: baseado na Resolução 678, o país tinha até 15/01/1991 para se retirar do
Kuait, caso contrário “todos os meios necessários” seriam utilizados para que isso
ocorresse. Em dezembro, vários reféns foram libertados por Saddam, que acreditava que
isso seria suficiente para atenuar a situação. Porém, a ONU manteve sua posição.
Em 09/01/1991, o secretário de Estado norte-americano, James Baker, se reuniu
com o Ministro das Relações Exteriores do Iraque, Tariq Aziz, para tentar persuadir o Iraque
a acatar a resolução da ONU, mas as negociações fracassaram. Em 12/01, o Congresso
americano votou a favor da guerra, o que foi seguido de vários protestos no país e também
na Europa. Em 15/01, data limite, a situação não havia se alterado. Não havia mais saída,
senão a guerra.
4.2.3) Operação Tempestade no Deserto
Em 17/01, “os EUA transformaram a Operação Escudo no Deserto em Operação
Tempestade no Deserto” (FUSER, 2008, p. 186). A coligação desferiu um ataque aéreo
destruidor – 700 aeronaves, de diversos países da coalizão, atacaram simultaneamente
vários alvos iraquianos. Iniciava-se assim a Guerra do Golfo (apesar de alguns historiadores
considerarem que a guerra se iniciou com a invasão iraquiana ao Kuait, em 02/08/1990).
Em represália à ofensiva aérea da coalizão, o Iraque atacou Israel e Arábia Saudita
com mísseis soviéticos Scud modificados (num primeiro momento, houve grande apreensão
85
em todo o mundo, pois suspeitava-se que os mísseis Scud estavam transportando armas
químicas, o que não ocorreu) . A intenção de Saddam era trazer Israel para o conflito e
dividir os países árabes integrantes da coalizão. Porém, Israel foi persuadido a não contraatacar.
Nas primeiras horas do ataque ao Iraque, o preço do petróleo aumentou de US$ 30
para US$ 40. Entretanto, caiu para US$ 20 no mesmo dia, diante da atuação esmagadora
da coalizão. Além disso, a REP norte-americana estava à disposição. Com isso, “o preço do
petróleo foi simplesmente retirado da mesa no início da guerra” (YERGIN, 2009, p. 882).
Os ataques aéreos continuaram maciçamente por 1 mês – segundo Hiro (2003 apud
FUSER, 2008, p. 187), “141.000 t de explosivos foram despejadas no Iraque, o equivalente
a 7 vezes a bomba atômica lançada em Hiroshima em 1945”. Ao final, toda a capacidade de
defesa aérea iraquiana fora destruída, de forma fácil e rápida.
Após 5 semanas de guerra aérea, iniciaram-se os confrontos em terra. Segundo
Fuser (2008, p. 184), “o objetivo da Casa Branca já não era conter Saddam (...) mas sim
impor uma derrota inequívoca ao Iraque e remover Saddam Husseim do poder”. Bush
relatou isso posteriormente em seu livro:
Acreditávamos que uma campanha terrestre seria necessária não importa o
quanto o poder aéreo tenha alcançado, pois para nós era essencial destruir
a capacidade ofensiva do Iraque. Esse também era um objetivo importante,
embora não tenha sido viável dizer isso abertamente enquanto uma solução
pacífica para a crise ainda fosse possível. (BUSH & SCOWCROFT, 1998
apud FUSER, 2008, p. 187)
Segundo Saddam, essa seria “a mãe de todas as batalhas” (YERGIN, 2009, p. 882).
Entretanto, a batalha no solo durou aproximadamente 100 horas, com vitória esmagadora
da coalizão. Com isso, as forças iraquianas começaram a bater em retirada. Mas antes de
saírem completamente do país, Saddam ordenou, em 22/02, que a indústria petrolífera
kuaitiana fosse destruída. Em menos de uma semana, mais de 800 poços foram
incendiados, além de refinarias e tanques de estocagem (MAUGERI, 2006). Segundo Yergin
(2009), nesse período de destruição, mais de 6 milhões de barris de petróleo foram
incendiados por dia.
Em 28/02/1991, um cessar-fogo entrou em vigor, colocando fim a Guerra do Golfo.
4.2.4) As Conseqüências da Guerra do Golfo
O Iraque sofreu punições severas após a guerra. O país teve que pagar a
reconstrução do Kuait, além de ser investigado pela ONU quanto ao desenvolvimento de
armas de destruição em massa (químicas, biológicas e nucleares). Mas as sanções
86
econômicas impostas após o conflito foram as piores conseqüências. O país ficou proibido
de importar qualquer material que pudesse ser utilizado para a fabricação de armas
biológicas, como fertilizantes, máquinas agrícolas, pesticidas e até remédios essenciais para
a população. A importação de livros técnicos e científicos também foi proibida, bem como a
instalação de internet. E, mais importante, suas exportações de petróleo foram
completamente suspensas – a produção iraquiana ficou em torno de apenas 600 mil bpd,
cuja uma pequena parte era exportada, sob a forma de contrabando, para países vizinhos
como Jordânia e Turquia (MAUGERI, 2006). O Conselho de Segurança da ONU autorizou a
retomada das exportações iraquianas somente em 1996. Ainda assim, o país só podia
vender US$ 2 bilhões em petróleo, a cada 6 meses, para assim importar suprimentos (sendo
que 30% da receita das exportações eram destinadas ao Kuait, como reparação de guerra).
Esse esquema ficou conhecido como “petróleo em troca de comida” (FUSER, 2008, p. 194).
Logo após o fim da Guerra do Golfo, eclodiu a Guerra Civil no Iraque, em
março/1991: o norte do país foi tomado por um levante dos curdos, enquanto o sul foi
tomado por insurreições xiitas. Bush e Scowcroft (1998 apud FUSER, 2008, p. 190)
relataram a posição dos EUA diante dessa situação:
Ao mesmo tempo que tínhamos a esperança de que uma revolta popular ou
um golpe viesse a depor Saddam, nem os EUA nem os países da região
gostariam de ver a ruptura do Estado iraquiano. Estávamos preocupados
com o equilíbrio de poder no Golfo. A quebra do Estado iraquiano causaria
um sério problema de desestabilização.
Após dominarem cidades importantes como Karbala e Najaf, os xiitas foram
dizimados pelas tropas de Saddam. A mesma brutalidade foi usada contra os curdos, o que
causou um êxodo de 1,5 milhão de pessoas em direção à Turquia, a qual negou autorização
para o ingresso dos refugiados. Diante dessa situação, o Conselho de Segurança da ONU
aprovou, em 05/04, a Resolução nº 688, ordenando o fim das repressões no Iraque e a
entrada no país de forças de paz. Os EUA mandaram 5 mil soldados para a região, os quais
estabeleceram (junto com tropas de outros países) “abrigos seguros” para a população que
estava sendo perseguida por Saddam. Além disso, foram criadas as “zonas de vôo proibido”
em aproximadamente 2/3 do território iraquiano, para impedir que a força aérea dizimasse a
população.
Segundo Fuser (2008, p. 191), “essas medidas representaram um passo em direção
a um envolvimento militar dos EUA com o Iraque muito mais intenso e prolongado do que o
governo norte-americano imaginara inicialmente”. Ainda segundo o autor, uma das
conseqüências da presença militar norte-americana na região foi o surgimento da Al Qaeda
– “uma organização terrorista islâmica ousada e agressiva, que opera em escala
internacional e tem como alvo prioritário os EUA e seus aliados” (idem, p. 175).
87
4.3) A Guerra do Iraque
4.3.1) O Pré-guerra
Quando os EUA colocaram em ação a Operação Tempestade do Deserto, em 1991
no Iraque, o objetivo era depor Saddam Hussein do poder. Porém não o fizeram. Para Fuser
(2008), dois motivos impediram os EUA de acabarem com o regime do ditador iraquiano
ainda na Guerra do Golfo. Em primeiro lugar, pois o mandato concedido pela ONU para a
operação militar tinha por fim a libertação no Kuait – se os EUA invadissem e ocupassem o
Iraque, perderiam o apoio da comunidade internacional. Em segundo lugar, a Casa Branca
estava temerosa com um possível “2º Vietnã”: uma ocupação do Iraque gerava muitas
incertezas e medos, principalmente em relação às baixas militares e aos custos. “A aposta
de Washington se concentrava na expectativa da deposição de Saddam por seus próprios
generais” (FUSER, 2008, p. 190). Porém, Saddam continuou no poder. A partir daí, os EUA
passaram a utilizar 3 métodos para tirá-lo do poder de maneira “indireta”: sanções
econômicas, para gerar descontentamento popular; desarmamento do país, através de
inspeções da ONU; e apoio a conspirações contra o ditador (EVEREST, 2004 apud FUSER,
2008, p. 192).
Em 1997, foi formado nos EUA o Projeto por um Novo Século Americano (PNAC),
cuja uma das principais metas era uma ação militar contra o Iraque. Em 1998, em carta
enviada ao então presidente norte-americano Bill Clinton, os membros do PNAC alertavam
que as sanções econômicas não estavam funcionando, que o Iraque continuava a
desenvolver armas de destruição em massa e que, se nenhuma medida mais enérgica fosse
tomada, “a segurança das tropas norte-americanas na região, de nossos amigos e aliados...
e uma porção significativa dos suprimentos mundiais de petróleo correrão perigo” (PNAC,
1998 apud FUSER, 2008, p. 220).
Em setembro/2000, no manifesto “Reconstruindo as Defesas da América”, o PNAC
mais uma vez reiterou a questão do Iraque:
Os EUA têm procurado há décadas desempenhar um papel mais
permanente na segurança regional do Golfo. Embora o conflito não
resolvido com o Iraque proporcione a justificativa imediata, a necessidade
da presença de uma força norte-americana no Golfo transcende a questão
do regime de Saddam Hussein. (apud FUSER, 2008, p. 220)
No início de 2001, George W. Bush foi eleito presidente dos EUA e, segundo relatos
de Paul O‟Neil (secretário do Tesouro nos primeiros anos do governo) em sua biografia,
assim que tomou posse, o presidente passou a estudar meios de depor Saddam através da
força militar. Ainda segundo O´Neil, o secretario de Defesa Donald Rumsfeld ordenou a
88
elaboração de um mapa com os principais campos petrolíferos iraquianos e de uma lista de
empresas que poderiam explorá-los (FUSER, 2008).
Em 11/09/2001, “pela primeira vez desde a invasão de Pearl Harbor, em 07/12/1941
(...) os EUA foram atacados, e com perdas de vidas em quantidades enormes” (YERGIN,
2009, p. 890). Dois aviões comerciais foram seqüestrados por terroristas do movimento AlQaeda e colidiram propositalmente contra as torres do centro comercial World Trade Center,
em Nova York (um outro avião também foi seqüestrado e atingiu o Pentágono). Era o início
da “Guerra Santa”, inspirada por Osama Bin Laden – fundador do Al-Qaeda. Para Maugeri
(2006), um dos principais motivadores da “Guerra Santa” era a presença militar norteamericana na terra sagrada da Arábia Saudita durante e após a Guerra do Golfo que, para
Bin Laden, era um símbolo tanto de impiedade quanto da subjugação muçulmana aos
interesses americanos e ocidentais. Osama demonstrou seu sentimento de ódio aos EUA
em uma carta aberta à civilização norte-americana:
Vocês (americanos) roubam nossa riqueza e nosso petróleo a preços
insignificantes devido às suas influências internacionais e ameaças
militares. Esse roubo é de fato o maior roubo jamais testemunhado pela
humanidade em toda a história do mundo. (apud MAUGERI, 2006, p. 185)
Em represália aos ataques de 11/09, os EUA iniciaram a “guerra contra o terror”.
Tropas militares (dos EUA e de aliados) foram enviadas ao Afeganistão (país onde a base
da Al-Qaeda operava) e, de forma rápida, depuseram os Talibãs, aliados do movimento
terrorista. Após a rápida vitória no Afeganistão, o Iraque voltou a ser o centro das atenções.
Richard Clarke (assessor da Casa Branca para o combate ao terrorismo no governo de
Bush) conta em seu livro que somente horas após os ataques de 11/09, um ataque ao
Iraque foi colocado em pauta:
O secretário Rumsfeld reclamou que o Afeganistão não tinha alvos decentes
para serem bombardeados e que deveríamos pensar no Iraque que, disse
ele, tinha alvos melhores. A princípio, achei que Rumsfeld estava brincando.
Mas ele estava sério e o presidente não rejeitou de imediato a idéia de
atacar o Iraque. Ao contrário, ele observou que o que precisávamos fazer
com o Iraque era mudar o governo, não só atingi-lo com mais mísseis de
cruzeiro, como Rumsfeld havia sugerido. (2004 apud FUSER, 2008, p. 221)
Defensores de uma ação militar no Iraque passaram a argumentar que Saddam
Hussein possuía ligações com a Al-Qaeda e outros movimentos terroristas, além de estar
desenvolvendo armas de destruição em massa secretamente. Apesar de nenhuma
evidência de que as acusações tinham fundamento ter sido descoberta, “o ímpeto em
direção à guerra era muito forte” (YERGIN, 2009, p. 891).
89
4.3.2) A Relação do Petróleo com a Guerra do Iraque
Em abril/2001, um relatório intitulado Strategic Energy Policy – Challenges for the
21st Century (Política Estratégica de Energia – Desafios para o Século XXI) foi feito por dois
importantes institutos norte-americanos. Esse relatório, que “serviu de base para a
elaboração da política do governo Bush para o setor” (FUSER, 2008, p. 205), apontava o
problema que o Iraque representava para a segurança estratégica dos EUA:
O Iraque permanece uma influência desestabilizadora para os aliados dos
EUA no Oriente Médio, assim como para a ordem regional e global e para o
fluxo do petróleo para os mercados internacionais. Saddam Hussein
também demonstrou uma disposição de ameaçar usar a arma do petróleo e
de usar seu próprio programa de exportações para manipular os mercados
de petróleo. (RELATÒRIO BAKER/CFR apud FUSER, 2008, p. 226)
Não há dúvidas de que o petróleo foi um dos principais motivadores da Guerra do
Iraque. John Duffield (2005 apud FUSER, 2008, p. 227) relatou os benefícios relacionados
ao petróleo que a guerra traria para os EUA e que, consequentemente, motivaram a
operação militar:
Primeiro, eles (os norte-americanos) poderiam esperar que a eliminação do
regime de Saddam Hussein viesse acabar, de uma vez por todas, com a
persistente ameaça do Iraque de dominar diretamente ou por meio da
coerção os vastos recursos petrolíferos do Golfo. Em segundo lugar, era
possível esperar que a mudança de regime viesse a liberar um potencial
significativo da produção petrolífera do Iraque, que tinha sido artificialmente
limitada pelos danos de guerra, pelas sanções e pela falta de investimento.
Ambas as mudanças poderiam, por sua vez, trazer a expectativa de uma
maior estabilidade nos mercados mundiais de petróleo do médio para o
longo prazo.
Além disso, havia o interesse dos EUA de “fortalecer (sua) posição no mercado
petroleiro em relação à Arábia Saudita, dona de 27% das reservas mundiais” (FUSER, 2008,
p. 227). Os EUA estavam receosos de que os sauditas usassem sua soberania no mercado
de petróleo para pressioná-los em relação à política com Israel.
4.3.3) A Guerra
Em 20/03/2003, iniciou-se a Guerra do Iraque (também chamada de 2ª Guerra do
Golfo). Assim como 12 anos antes, uma coalizão, liderada pelos EUA, foi feita contra o
Iraque. Entretanto, dessa vez o número de países participantes era menor. França e
Alemanha, por exemplo, considerados aliados-chave dos americanos, ficaram de fora –
segundo Yergin (2009), a justificativa desses países para a não participação foi o excesso
de otimismo dos americanos, que estavam subestimando as conseqüências do pós-guerra.
Para EUA e Inglaterra (principal aliado), a vitória na “Liberdade Iraquiana” (codinome
da operação militar) seria rápida. O conflito entre as tropas da coalizão e as de Saddam
90
realmente não se prolongou – em 09/04, a estátua do ditador iraquiano no centro de Bagdá
foi derrubada, colocando fim ao seu regime. Saddam conseguiu escapar – foi capturado
somente em 13/12/2003 e executado em 30/12/2006, após ser considerado culpado por
crimes contra a humanidade. Mas, ao invés de anunciar o início de uma nova era de paz e
estabilidade, a conclusão da guerra foi o início de um novo pesadelo para o Iraque e sua
indústria petrolífera (MAUGERI, 2006).
Uma violenta guerra civil eclodiu no país, entre os sunitas e os xiitas. Ataques
terroristas em todo o território iraquiano viraram rotina, sendo as instalações petrolíferas o
principal alvo. A indústria petrolífera iraquiana sofreu com escassez de tecnologia,
qualificação e segurança (o que acarretou em níveis de produção inferiores aos dos anos
antes da guerra), privando o mercado de uma importante parcela de petróleo. Como relatou
J. Robinson West (2003 apud MAUGERI, 2006, p. 186):
Mesmo com Saddam deposto, pessoas como o CEO da ExxonMobil, Lee
Raymond, alertaram de que levariam alguns anos para que as empresas
confiassem na estabilidade política e comercial do Iraque antes de
quaisquer novos grandes investimentos serem feitos.
A indústria petrolífera iraquiana iniciou sua recuperação somente em 2007, quando
conseguiu superar os níveis de antes da invasão – atualmente a indústria já está
completamente recuperada, com o Iraque sendo o 2º maior produtor de petróleo da OPEP.
Após mais de 8 anos de ocupação do Iraque, nenhuma arma de destruição em
massa foi encontrada – segundo Fuser (2008, p. 222), os governos de EUA e Inglaterra
manipularam “informações, ocultando dados relevantes ou veiculando informações falsas, a
fim de obter apoio político e diplomático à guerra e de influenciar a opinião pública”. A
intenção dos EUA de estabilizar o Iraque e implantar um regime sob sua influência, para
assim fortalecer sua posição energética global, falhou. As tropas americanas, após
permaneceram no país por um longo período (sujeitas a ataques terroristas e rebeliões, que
causaram milhares de baixas), se retiraram do país em 15/12/2011, colocando fim a Guerra
do Iraque.
Para Maugeri (2006), a Guerra do Iraque foi o prelúdio do 1º choque do petróleo do
século 21 – o aumento exponencial do preço do petróleo, que passou de US$ 30 o barril em
2003 para US$ 145 em 2008. Essa crise do petróleo, somada a crise de crédito nos setores
bancários e hipotecários dos EUA, causou “uma crise financeira pior do que a Grande
Depressão, uma retração econômica mundial” (YERGIN, 2009, p. 894).
CAPÍTULO 5
CONCLUSÃO
“Uma gota de petróleo vale uma gota de sangue” (PÉAN, 1975). Essa afirmação –
feita por Georges Clemenceau, então primeiro-ministro francês, durante a 1ª Guerra Mundial
– mostra a relação do petróleo com a guerra. Isso se deve ao fato de o petróleo ser, além de
principal fonte de energia, o principal símbolo de poder e hegemonia do mundo, como
descreve Fuser (2008, p. 228):
A questão do acesso e controle das principais reservas de petróleo do
mundo envolve uma questão que transcende a importância puramente
econômica do petróleo como commodity e fonte de energia – envolve a
disputa pelo poder em escala internacional.
Essa relação iniciou-se na 1ª Guerra Mundial, quando o petróleo causou uma
revolução nos campos de batalha – substituiu o carvão como combustível nos navios de
guerra e foi o combustível para o recém-inventado motor de combustão interna, utilizado nos
tanques, aviões e veículos de combate – e foi peça-chave para o desfecho do conflito. Na 2ª
Guerra Mundial, o petróleo foi ainda mais imprescindível, devido à sua utilização como
matéria-prima para os mais variados materiais bélicos, além de combustível para a máquina
de guerra. A partir daí, o petróleo se tornou a fonte de soberania para as nações, que então
passaram a buscar e disputar reservas dessa matéria-prima.
Após a 2ª Guerra Mundial, a maior parte das reservas de petróleo do mundo
passaram a se localizar no Oriente Médio, que se transformou no centro petrolífero mundial.
Essa região, que desde a Antiguidade era palco de guerras motivadas por religião e
disputas territoriais, passou a ser a principal detentora da maior fonte de poder existente.
Como consequência, o Oriente Médio se tranformou no palco dos principais conflitos da
humanidade. Desde a Crise de Suez, em 1956, até a Guerra do Iraque, que só terminou no
final de 2011, o petróleo esteve diretamente relacionado com os diversos conflitos que
ocorreram na região. E esse cenário não tem previsão para se alterar.
De acordo com dados da BP do final de 2011, quase metade das reservas mundias
provadas de petróleo (48,1%) estão localizadas no Oriente Médio. E a região continua a
sediar crises e conflitos. No final de dezembro/2010, iniciou-se a “Primavera Árabe”: onda de
protestos populares contra os governos ditatoriais em todo o Oriente Médio (e também no
Norte da África). Apesar de diversos ditadores terem sido depostos até o final de 2012
(como Zine el-Abdine Ben Ali, da Tunísia; Hosni Mubarak, do Egito; Muamar Kadafi, da
Líbia; e Ali Abdullah Saleh, do Iêmen), diversas revoltas e conflitos eclodiram no início de
2013 (com maior intensidade na Síria, Egito e Tunísia), deixando a região a beira do caos
92
total e sem previsão de calmaria. Além disso, há uma enorme tensão devido às alegadas
ambições nucleares do Irã. O vice-ministro dos Negócios Estrangeiros de Israel, Danny
Ayalon, resumiu a situação no Oriente Médio no início de 2013: “A Primavera Árabe está se
tornando o Inverno Islâmico” (EURONEWS, 2013).
Além da instabilidade do Oriente Médio, há a crescente tensão entre EUA e China:
enquanto os EUA querem se manter como a única superpotência mundial, a China, que vem
crescendo espantosamente nos últimos anos, aspira chegar ao patamar de superpotência.
Em novembro/2011, o presidente norte-americano Barack Obama declarou que o foco dos
EUA passaria a ser a manutenção do poderio militar e da consequente hegemonia na Ásia e
no Pacífico. No final de 2011, Michael Klare relatou no artigo Playing With Fire – Obama`s
Risky Oil Threat to China as consequências que a nova política norte-americana poderia
desencadear:
Em uma tentativa de virar a página em duas guerras desastrosas no Grande
Oriente Médio, ele (Barack Obama) pode ter acabado de lançar uma nova
guerra fria na Ásia, mais uma vez, vendo o petróleo como a chave para a
supremacia global.
No início de 2013, Klare novamente alertou para a situação entre EUA e China no
artigo The Military Powder Keg in the Pacific:
As condições estão se deteriorando no Pacífico. As coisas estão ficando
feias, com consequências que podem ser fatais e catastróficas para a
economia global. (...) A possibilidade de uma crise iraniana continua em
destaque por causa do risco óbvio de desordem no Oriente Médio e da
ameaça à produção e ao transporte de petróleo mundial. Uma crise nos
mares do leste ou do sul da China (essencialmente, extensões ocidentais do
oceano pacífico) poderia, no entanto, representar um maior risco devido à
possibilidade de um confronto militar entre EUA e China e à ameaça a
estabilidade econômica da Ásia.
Assim, podemos concluir que a relação entre petróleo e guerra está longe de chegar
ao fim. Enquanto o petróleo continuar desempenhando seu papel de principal matéria-prima
e principal fonte de poder do mundo moderno, manterá uma profunda relação com a guerra.
Como relatou Monteiro Lobato (1948 apud FUSER, 2008):
Esse produto é o sangue da terra; é a alma da indústria moderna; é a
eficiência do poderio militar; é a soberania; é a dominação. Tê-lo é ter o
Sésamo abridor de todas as portas. Não tê-lo é ser escravo. Daí a fúria
moderna na luta pelo petróleo.
93
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