ANTROPOLOGIA HEMENÊUTICA E CULTURA ORGANIZACIONAL

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ANTROPOLOGIA HEMENÊUTICA E CULTURA ORGANIZACIONAL
Autor: Arismar Manéia, graduado em Sociologia e Ciências. Pós-graduado em
Filosofia existencial. Mestre em Educação e Tecnologia ambiental. Doutorando em
Ciências da Educação.
Esta resenha aborda “Um texto, múltiplas interpretações: antropologia hermenêutica
e cultura organizacional”, de Pedro Jaime Júnior, que é coordenador acadêmico das
Faculdades Jorge Amado, pesquisador do CETEAD, mestre em Antropologia Social
pela UNICAMP e graduado em Administração pela UFBA.
Em seu texto o autor busca entender o papel da dimensão simbólica na construção
da realidade organizacional. Descartando a abordagem gerencialista, o autor analisa
a perspectiva crítica ou socioantropológica, a qual não aceita que a cultura
organizacional possa ser gerenciada. O propósito é contribuir com o debate a
respeito da cultura organizacional.
Jaime Júnior revela que Clifford Geertz – o mais expressivo apologista da
antropologia interpretativa ou hermenêutica – sugere que as metáforas do jogo, do
drama e do texto têm sido privilegiadas pela teoria social contemporânea para que
se interprete a realidade social. Mas Geertz (1983a) ressalta que o recurso a essas
metáforas não se dá de forma excludente, já que se misturam na interpretação de
um mesmo autor, partindo do pressuposto de que as instituições sociais, os
costumes, as mudanças e os atos do cotidiano são passíveis de leitura em algum
sentido.
Partidário do conceito semiótico de cultura, Geertz se baseia na sociologia clássica
de Weber, para quem o homem só é capaz de viver em um mundo que para si seja
dotado de sentido. Para Geertz (1973), a cultura é a produção desse sentido, ou
seja, uma inextricável teia de significados que os homens tecem em suas interações
cotidianas e que funciona como um mapa para a ação social. Assim, Geertz enxerga
a cultura como um texto, ou um conjunto de textos, que os atores sociais leem para
interpretar o curso dos acontecimentos sociais.
Nesse viés a cultura é um texto e o antropólogo tem o papel de interpretar esse
texto, compreendendo não apenas o seu significado, mas como faz sentido, como
ganha significado para os sujeitos sociais. Assim, a Antropologia passa a ser
considerada uma ciência interpretativa à procura do significado. O antropólogo
passa a ser um intérprete, um tradutor cultural, cuja função é traduzir os significados
culturalmente construídos pelos sujeitos sociais, embora interprete interpretações,
pois são os próprios sujeitos sociais que interpretam em primeira mão sua própria
cultura.
Para interpretar uma cultura, continua Jaime Júnior, citando Geertz, o antropólogo
deve integrar-se para interpretar os textos, aprendendo a viver com os nativos,
sendo de outro lugar e tendo um mundo próprio, o que reflete a importância que
Geertz dá ao trabalho de campo etnográfico na Antropologia (GEERTZ, 1983b e
2001). Assim, o trabalho etnográfico consiste em ler nas entrelinhas, construir
interpretações, sempre provisórias, sempre passíveis de serem questionadas e/ou
reconstruídas.
Thompson, no entanto, crê que os fenômenos culturais estão implicados em
relações de poder e conflito, podendo ser vistos como expressões das relações de
poder, restando-se, assim, as múltiplas, e talvez divergentes e conflitantes,
interpretações. Na concepção de Thompson, o texto cultural está inserido em um
contexto sócio-histórico, por meio do qual ele é produzido, transmitido, recebido e
interpretado. Se a cultura é um texto, então presta-se a diferentes, e até mesmo
conflitantes, interpretações, de modo que os atores sociais sempre leem o mundo a
partir de um lugar, mais especificamente, do lugar que ocupam na estrutura social.
Ulf Hannerz (1998) afirma que a cultura aprende-se, adquire-se na vida social, é
algo como um software de que necessitamos para programar o hardware que nos é
dado biologicamente, pois, para ele, ideia de que a cultura é bastante integrada e
pode ser captada como um todo não é plausível em uma época pós-moderna,
quando observamos vidas que incluem um conjunto notável de contradições,
ambiguidades, mal-entendidos e conflitos. Para Hannerz, à medida que as pessoas
se deslocam com seus significados, e que estes encontram formas de se
deslocarem ainda que as pessoas não se movam, os territórios não podem ser
demarcadores de uma cultura.
Jaime Júnior entende a cultura como uma rede de significados, tecida dentro de um
complexo jogo de interações que envolve os conflitos e as relações de poder. Para
ele, os atores sociais escrevem e reescrevem cotidianamente o texto cultural que,
dialeticamente, funciona como um contexto dentro do qual interpretam, organizam e
dão sentido a suas vidas. Ele crê que assumir uma abordagem hermenêutica é
entender que a cultura organizacional, tal como um texto, não é apenas passível de
leitura, como também presta-se a uma multiplicidade de interpretações e que a
organização produtiva é um espaço de socialização inserido em uma rede de
socialização mais ampla, por isso que a organização não pode ser vista como uma
microssociedade ou um sistema fechado.
Utilizar a metáfora do texto, prossegue Jaime Júnior, é chamar atenção para o fato
de que, se a cultura organizacional, que seria o texto, oferece múltiplas
possibilidades de interpretação a seus, não se pode conceber que se vai conseguir
levar todos os que compõem a organização a adotar uma visão comum ou
consensual do que seja essa. Seria exigir que todos lessem o texto da mesma
forma, ou seja, que negassem suas trajetórias particulares, seus panos de fundo
culturais, para efetuar uma interpretação orientada para a mesma direção.
Para o autor, as representações que os dirigentes constroem sobre a organização
são reelaboradas, ressignificadas, ressimbolizadas pelos diversos atores sociais, de
modo que não existem “verdadeiras” culturas organizacionais, muito menos culturas
fortes ou fracas, mas distintas versões sobre a cultura organizacional. Jaime Júnior
salienta que, de uma perspectiva hermenêutica, a cultura organizacional deve ser
vista, simultaneamente, como um texto polissêmico – que os indivíduos escrevem e
reescrevem por intermédio de suas interações cotidianas dentro e fora do espaço
organizacional.
O autor de “Um texto, múltiplas interpretações: antropologia hermenêutica e cultura
organizacional”, Pedro Jaime Júnior, discute com profundidade o trabalho de Geertz,
avaliando que um mesmo texto cultural é passível de múltiplas interpretações que a
leitura do texto cultural produz interpretações que serão sempre provisórias e
passíveis de serem questionadas e reconstruídas.
Assim, a cultura organizacional é caracterizada pela ambiguidade, com as fronteiras
das subculturas apresentando-se como altamente permeáveis e contendo
manifestações multifacetadas. Por isso, seus significados estão sujeitos a múltiplas
interpretações.
REFERÊNCIAS
GEERTZ, Clifford. Thick description: toward an interpretive theory of culture. In:
______. The interpretation of cultures. New York: Basic Books, 1973.
______. Blurred genres: the reconfiguration of social thought. In: ______. Local
knowledge: further essays in interpretive anthropology. New York: Basic Books,
1983a.
______. Centers, kings and charisma: reflections on the symbolics of power. In:
______. Local knowledge: further essays in interpretive anthropology. New York:
Basic Books, 1983b.
______, Clifford. Nova luz sobre a antropologia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
2001.
JAIME JÚNIOR, Pedro. Um texto, múltiplas interpretações: antropologia
hermenêutica e cultura organizacional. ERA, VOL. 42, Nº 4, OUT/NOV/DEZ/2002.
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