A disciplina LIBRAS no currículo do curso de Licenciatura em Matemática Luís Antônio Benedetti Universidade Federal de Uberlândia - Faculdade de Matemática Professor Titular benedetti@ ufu. br Resumo: Em cada número da FAMAT em Revista, esta seção se propõe a abordar questões que estejam relacionadas ao curso de Matemática, no que a tange estrutura curricular vigente, a LDB (Lei de Diretrizes e Bases), as reformulações curriculares em andamento e sua influência no processo de ensino-aprendizagem. O que vem a ser LIBRAS? Trata-se da Língua Brasileira de Sinais que é uma das formas pelas quais a pessoa surda, por ter perda auditiva, pode manifestar sua cultura, compreender e interagir com o mundo e expressar suas experiências visuais. A LIBRAS foi por muito tempo desprestigiada, ficando seu uso restrito ao convívio de surdos, como associações e pontos de encontros. Apenas familiares de surdos a aprendiam de forma bem superficial para a comunicação interna. Os primeiros cursos visavam apenas o ensino do vocabulário sem uma orientação didática. Há muito tempo os portadores de deficiência auditiva vinham reivindicando o direito do uso da LIBRAS como sua forma de se expressar. Desejavam que a LIBRAS fosse utilizada no espaço escolar como meio de instrução, porém as políticas linguísticas do Brasil sempre coibiram as diversas línguas que aqui coexistiam e promoveram o Português escrito e oral. Os diversos movimentos sociais em favor da adoção de uma língua oficial dos surdos lutaram até que passaram a ser ouvidos e puderam participar das negociações junto aos órgãos governamentais (Quadro, 2006). O decreto 5.626, de 22 de dezembro de 2005, que regulamenta a lei de LIBRAS, define várias ações com o objetivo de promover a inclusão social, e reconhece a LIBRAS como língua dos surdos brasileiros. Atualmente o Brasil já a possui como uma língua oficial do país, se bem que as primeiras pesquisas de descrição linguística já fossem publicadas no final da década de 80 e os livros didáticos e formação de professores a partir de 2000, aproximadamente. No Brasil, a deficiência auditiva é definida como a perda bilateral, parcial ou total, de 40 dB ou mais. Uma das ações determinadas no decreto no 5626/2005 é a obrigatoriedade do ensino dessa disciplina em cursos de licenciatura em todo o país. No art.3 estabelece que “A Libras deve ser inserida como disciplina curricular obrigatória nos cursos de formação de professores para o exercício do magistério, em nível médio e superior, e nos cursos de Fonoaudiologia, de instituições de ensino, públicas e privadas, do sistema federal de ensino e dos sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”. A Lilicenciatura em Matemática e nas diferentes áreas de conhecimento fazem parte dos cursos de formação de professores. Além disso, os currículos dos demais cursos de formação superior devem oferecer esta disciplina como optativa. Como o número de docentes com título de pós-graduação ou de graduação em Libras para o ensino dessa disciplina em cursos de educação superior ainda é pequeno, o Decreto também estabelece o perfil do profissional que deve ministrar esta disciplina, nos próximos dez anos: professor de Libras (usuário dessa língua com curso de pós-graduação ou com formação superior) ou instrutor de Libras (usuário dessa língua com formação de nível médio), ou professor ouvinte bilíngue (Libras - Língua Portuguesa, com pós-graduação ou formação superior) em todos os casos o profissional deve ter certificado obtido por meio de exame de proficiência em Libras, promovido pelo Ministério da Educação. Assim, as instituições de educação superior, devem viabilizar cursos de pós-graduação para a formação de professores para o ensino de Libras e sua interpretação e, nos próximos dez anos, todos 170 FAMAT em Revista os cursos devem ter incluída esta disciplina em seus currículos, iniciando-se nos cursos de Pedagogia e Letras, ampliando-se progressivamente para as demais licenciaturas. O objetivo do Governo com essas medidas é garantir o direito a educação e a inclusão de alunos surdos ou com deficiência auditiva, remetendo às instituições federais de ensino a responsabilidade de assegurar a esses alunos o acesso à comunicação, à informação e à educação, através de equipamentos e tecnologias viáveis, proporcionando inclusive serviços de tradutor e intérprete de Libras - Língua Portuguesa em sala de aula e em outros espaços educacionais. Na modalidade de educação à distância, a programação visual dos cursos de nível médio e superior, preferencialmente os de formação de professores, deverá dispor de sistemas de acesso à informação como janela com tradutor e intérprete de Libras - Língua Portuguesa e subtitulação por meio do sistema de legenda oculta, de modo a reproduzir as mensagens veiculadas às pessoas surdas. Do ponto de vista psicológico, sabe-se que os estudos sobre o processo de aprendizagem apontam à influência de vários fatores: dos cognitivos e metacognitivos, dos afetivos e emocionais, de desenvolvimento e sociais, contudo no currículo das licenciaturas a disciplina Psicologia da Educação trata da relação entre a aprendizagem e o desenvolvimento de crianças, adolescentes, jovens e adultos, sem levar em conta características especiais como a deficiência auditiva. A disciplina LIBRAS vem preencher uma lacuna considerável auxiliando o processo de aprendizagem, contribuindo para que o egresso possa selecionar e produzir recursos e materiais didáticos, levando em conta tais aspectos da educação especial e adequando metodologias que propiciem o desenvolvimento destes alunos. No âmbito da Universidade Federal de Uberlândia a responsabilidade pela disciplina LIBRAS está a cargo da Faculdade de Educação, porém compete às unidades acadêmicas a reformulação curricular que permita a inserção desta componente curricular em harmonia com o Projeto Pedagógico do Curso e que leve em conta as especificidades de cada área de conhecimento. Particularmente, observam-se dificuldades na utilização de LIBRAS no ensino de Matemática, não somente porque o professor de Matemática em geral não tem conhecimento da língua de sinais, mas também em virtude da pouca formação matemática dos professores intérpretes que muitas vezes não têm conhecimento dos conteúdos que deverão traduzir para os alunos surdos, podendo assim prejudicar a aprendizagem, caso tenham alguma dúvida de qual sinal a ser utilizado para uma determinada informação de caráter matemático. Tais dificuldades devem ser vencidas na medida em que as pesquisas nessa nova linguagem forem avançando e novos significados incorporados. Evidentemente a interação entre os professores de matemática e de LIBRAS trará subsídios para o processo de formação e qualificação dos intérpretes que atuam nas aulas. No Ensino fundamental, os professores de surdos costumam considerar que a matemática é a disciplina que menos apresenta dificuldades para as suas crianças à exceção dos problemas, cujos entraves são atribuídos, não sem razão, às dificuldades óbvias de interpretação dos enunciados (Nogueira e Machado, 1996). A Matemática é a que mais se assemelha em objetivos, conteúdos, metodologia e forma de avaliação à que é tradicionalmente ofertada a alunos ouvintes entre todas as disciplinas presentes na estrutura curricular de uma escola para surdos. Não é raro encontrar alunos surdos que têm sucesso em matemática e fracassam nas demais disciplinas. A adaptabilidade do surdo fica prejudicada em sala de aula por dificuldades óbvia de comunicação, que os leva a buscar o isolamento e a proteção do grupo (Nogueira, 1999). O professor da disciplina deve identificar o aluno surdo observando as características que apresenta. Demonstrar conhecimentos sobre a metodologia do ensino para o surdo. Comunicar-se com o surdo. Dominar os aspectos linguísticos da Língua Brasileira de Sinais, como a fonologia, a morfologia e a sintaxe além de discutir o papel social da educação inclusiva. Apresentar instrumentos de comunicação não verbal através de sinais com a pessoa surda. O Projeto Pedagógico do Curso de Matemática deverá passar por uma reformulação que dimensione o perfil do egresso, estendendo as competências como forma de mobilizar conhecimentos também através da Educação Especial, que passa a ser necessária para uma atuação profissional com qualidade. Tal reformulação vai além da simples inclusão da disciplina LIBRAS; as diretrizes gerais para o desenvolvimento metodológico do ensino devem ser repensadas para tornar a aprendizagem significativa também para o aluno especial. Neste contexto, o Projeto Integrado de Prática Educativa que Universidade Federal de Uberlândia Faculdade de Matemática FAMAT em Revista 171 visa articular os conhecimentos teóricos e práticos dos núcleos de formação específica e pedagógica, terá um papel essencial ao propor atividades que favoreçam a inclusão do aluno através de leituras especiais, da reflexão e da resolução de problemas advindos da sua realidade escolar. Portanto, a problemática é extensa, mas as ações tomadas que visem a qualificação da sala de aula no Ensino Básico, em especial nas aulas de Matemática, para a inclusão do surdo, dependerá em muito da formação que daremos ao egresso de nossa Licenciatura, será fundamental buscar formas de interagir teoria e prática e de integrar a LIBRAS com a Língua Portuguesa e Matemática, sem esquecer as múltiplas questões afetivas que integram o pano de fundo desse processo complexo de aprendizado. Referências Bibliográficas [1] Língua Brasileira de Sinais. Brasília. SEESP/MEC, 1998. [2] BRITO, Lucinda Ferreira. Por uma gramática de línguas de sinais. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1995. [3] COUTINHO, Denise. LIBRAS e Língua Portuguesa: Semelhanças e diferenças. João Pessoa. Arpoador, 2000. [4] NOGUEIRA, C. M. I. e MACHADO, E. L. O ensino de matemática para deficientes auditivos: uma visão psicopedagógica.160p. Relatório Final de Projeto de Pesquisa - Universidade Estadual de Maringá, Maringá/Pr. 1996 [5] NOGUEIRA, C.M.I. As mútuas implicações entre surdez, linguagem e cognição. In: ENCONTRO NACIONAL DE DIDÁTICA E PRÁTICA DE ENSINO, 13, 2006, Recife. Anais eletrônicos. Recife, 2006. [6] NOGUEIRA, C. M. I. A matemática como contribuição educacional ao desenvolvimento cognitivo da criança surda. In: BERGAMASCHI, R. I.;MARTINS, V. R (Org.). Discursos atuais sobre a surdez: II Encontro a propósito do fazer, do saber e do ser na infância. Canoas: La Salee, 1999, p.159. [7] OLIVEIRA, Janine Soares de. A comunidade surda: perfil, barreiras e caminhos promissores no processo de ensino-aprendizagem em matemática. Rio de Janeiro: CEFET, 2005. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências e Matemática), Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca, 2005. [8] Portal de LIBRAS: http://www.libras.org.br/leilibras.php , acesso em: 02/12/2009. [9] QUADRO, Ronice Muller de. Políticas Lingüísticas : O impacto do decreto 5626 para os surdos brasileiros. ESPAÇO, Rio de Janeiro: n. 25/26, p. 19-25, jan./dez., 2006. Faculdade de Matemática Universidade Federal de Uberlândia