1 REFLEXÕES DO TRABALHO PROFISSIONAL DO ASSISTENTE SOCIAL NA REDE FEDERAL DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA BRASILEIRA Autora: Nathália Lopes Caldeira Brant1 RESUMO O Serviço Social no processo de desenvolvimento e amadurecimento do trabalho profissional se objetiva, predominantemente, no campo das políticas sociais. Dentre tais políticas, a Política de Educação tem proporcionado uma ampliação do campo de trabalho deste profissional que com suas particularidades e especialidades tem construído seu lugar e conquistando cada vez mais legitimidade dentro dos espaços educacionais. Com a ampliação da Política de Educação, principalmente no que diz respeito à educação profissional e tecnológica, os espaços de intervenção profissional se alargam, sobretudo com a criação dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia que se responsabilizam pela oferta dos cursos técnicos integrados, entre outros. A ampliação da Rede teve o respaldo do Decreto 7.234/2010 que apresenta o Programa Nacional de Assistência Estudantil, que estimula a formulação de ações que visam a garantia da permanência estudantil no espaço educacional. O Programa estimula que cada Instituição tenha as diretrizes de sua Política de Assistência Estudantil com a finalidade de apresentar como se darão as atividades e programas a serem desenvolvidas nessa garantia. O Programa de Auxílio Estudantil é o que requista o Serviço Social nas instituições, com o objetivo de atender os estudantes em situação de vulnerabilidade social. Porém, como este é o programa que tem ocupado o cotidiano profissional do assistente social, o Serviço Social tem sofrido uma redução ao ser confundido como apenas o Auxílio Estudantil. Além disso, a Política de Assistência Estudantil tem se reduzido aos programas de auxílio estudantil e assim, o profissional acaba sendo identificado como responsável pela execução e garantia da Política de Assistência Estudantil. Dessa forma, procurar-se-á apresentar o trabalho profissional do Assistente Social na educação profissional e tecnológica, com sua inserção em equipe interdisciplinar, inserindo na relação ensino-aprendizagem no intuito de facilitar o processo e garantir a permanência 1 Mestranda no Programa de Pós Graduação em Serviço Social da UNESP/Câmpus Franca. Graduada em Serviço Social pela UNESP/Câmpus Franca em 2010. Atualmente Assistente Social no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais (IFSULDEMINAS) Câmpus Machado. Membro do Grupo Assistido de Pesquisa e Extensão – GAPE/Agroecologia do IFSULDEMINAS-Câmpus Machado, Grupo de Estudo e Pesquisa em Políticas Sociais (GEPPS) e Teoria Social de Marx e Serviço Social da UNESP/Franca. Docente no Curso de Serviço Social do CESEP/FEM (Centro Superior de Ensino e Pesquisa de Machado). 2 do estudante no espaço educacional, sempre atento às suas dimensões social, política, econômica e cultural. A partir do referencial do direcionamento político e social do Projeto Ético Político profissional (PEP), importa perceber como tem se dado a inserção deste profissional nos espaços da Rede, elucidando seus embates e as possibilidades construídas no cotidiano profissional para a legitimação do Serviço Social na Educação, na afirmação de uma educação pública, gratuita e de qualidade à população brasileira. Palavras-chave: Educação Profissional e Tecnológica; Política de Assistência Estudantil; Permanência Estudantil; Trabalho profissional. 1. INTRODUÇÃO O trabalho profissional do assistente social encontra no campo das políticas sociais um extenso espaço da sua objetivação. Extenso pelas muitas políticas sociais hoje oferecidas pelo Estado e pelas possibilidades que cada política tem para a ampliação do acesso aos direitos sociais. No Brasil, a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, as políticas sociais adquirem um status mais elevado e consolidam os direitos sociais que ampliam a noção da dignidade da vida humana na sociedade brasileira. Entretanto, o avanço das políticas sociais no Brasil ao mesmo passo que mostra o avanço do social e a consolidação de um Estado democrático, traz um traço de controle social e reprodução da sociedade regida pela lógica da ampliação do capital. Reconhecer isso não nega, de modo algum, esse espaço enquanto espaço de objetivação do trabalho profissional, mas deve trazer uma importante reflexão a ser feita em todo instante pelo profissional do Serviço Social: qual a intencionalidade que o profissional tem se apropriado desses espaços e qual a sua percepção acerca da totalidade onde insere as políticas sociais. No campo das políticas sociais percebe-se um destaque para a Politica de Educação que tem recebido merecidamente uma maior atenção do Estado e adquirido diversas fragmentações que, ao atenderem particularidades, ampliam o acesso da população brasileira aos espaços e processos educacionais. 3 Na contemporaneidade do Serviço Social, as discussões e reflexões acerca da inserção do assistente social no âmbito da educação, têm ganhado mais densidade e amadurecido no sentido de dimensionar a inserção do Serviço Social não só no âmbito da escola, mas o Serviço Social no âmbito da Política de Educação. Um novo campo que tem surgido como espaço de objetivação desse trabalho é a educação profissional e tecnológica, consequência de uma significativa expansão da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica no Brasil. Assim, buscar-se-á apresentar como tem se dado o trabalho profissional do assistente social no campo da Política de Educação (inserida no universo das políticas sociais) especialmente no âmbito da educação profissional e tecnológica, seus desafios e caminhos percorridos. 2. A DIMENSÃO DA POLÍTICA DE EDUCAÇÃO BRASILEIRA E O SERVIÇO SOCIAL Uma primeira reflexão necessária a ser feita, no âmbito da Política de Educação, é qual o entendimento desta Política e a apreensão de sua concepção enquanto direito, que compõe a rede de proteção social e que deve ter no Estado sua maior referência de garantia e proteção para os cidadãos brasileiros. A partir dessa referência, faz-se necessário compreender como, hoje, a Política de Educação se organiza e como tem se efetivado o direito ao acesso a uma educação que deve ser ofertada como, prioritariamente, pública, gratuita e de qualidade. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), n. 9.394/1996 organiza os níveis de educação como educação básica e superior. A LDBEN, enquanto principal parâmetro para o desenvolvimento da Educação explana acerca do preceito legal do artigo 5º da Constituição Federal de 1988, que é direcionado pelo dever em preparar as pessoas para o exercício da cidadania, primando pelo seu desenvolvimento pleno e pela qualificação para o trabalho. Quando o Serviço Social se depara com tal referencial, há uma necessidade primordial em se identificar qual o entendimento acerca da Educação por parte desta categoria profissional. A perspectiva teórica e metodológica que predomina na profissão, a partir do seu Projeto Ético-Político Profissional (PEP), propõe a leitura da realidade social a partir de uma 4 perspectiva de totalidade que apreende o movimento contraditório do real e compreende sua determinação a partir do embate capital e trabalho, que constitui a questão social (campo da intervenção da profissão). O entendimento simples da Educação apenas para o trabalho não supera a imediaticidade do cotidiano educacional. É necessário então que se amplie plenamente a noção do exercício da cidadania e a noção de trabalho, ou seja, o meio pelo qual o indivíduo se tornaria capaz de desenvolver suas potencialidades, conseguindo então satisfazer suas necessidades enquanto ser social. Não há como pensar a Educação sem tais pontuações, definir o direcionamento social e político que se apropria para o desenvolvimento do trabalho profissional é um exercício diário do assistente social, para que no espaço de (re)produção (no âmbito das relações sociais) ele possa ampliar espaços de afirmação de direitos e contribuir com espaços de desenvolvimento de potencialidades dos indivíduos sociais. Pois, “[...] para pensar a educação é preciso tomar a realidade na perspectiva de totalidade, compreender que as diferentes dimensões que compõem a vida social mantêm com o trabalho uma relação de dependência ontológica, mas também de autonomia, de mútuas determinações.” (CFESS/CRESS, 2013, p.17). Outra questão de extrema importância a ser destacada é o entendimento da Política de Educação no âmbito da proteção social, como integrante do conjunto dos direitos sociais que constitui base para uma vida digna. A noção da proteção social, tendo a primazia de garantia no Estado, amplia e qualifica a noção de público, não reduzindo à apenas as pessoas em situação de vulnerabilidade social, mas com o seu caráter universal para todos os cidadãos. Tal consideração é necessária, pois “Na contemporaneidade, público e para pobres vêm se tornando sinônimos, com forte carga ideológica que mascara responsabilidades do Estado, impõe aos indivíduos papel de protagonista de sua vida, descolando-o da noção de história e de parte da totalidade histórica, sem falar que isso dificulta, na medida em que tem forte força de desmobilização coletiva das demandas sociais.” (SILVA, 2012, p.37). Entender a educação como direito social, qualifica a concepção dessa Política e fortalece os espaços que viabilizam suas ações e serviços. Diante disso, a afirmação de Educação não se reduz a escola e, portanto, não se deve dizer apenas o Serviço Social na 5 escola, mas sim o Serviço Social na Educação, pois assim o trabalho profissional fica mais bem delineado. Faz-se necessário pontuar as diversas formas que a Política de Educação tem se apresentado, com o intuito em atender especificidades e especialidades de demandas e ampliar o acesso da população aos espaços educacionais, a Educação tem se mostrado enquanto modalidade presencial, semipresencial e ensino a distância, contemplando suas diversas dimensões como: Educação do Campo, Educação Especial, Educação Básica, Educação Superior, Educação Profissional e Tecnológica, entre outras. Sem adentrar em questões referentes às modalidades e suas dimensões, procurar-seá aprofundar a discussão no âmbito da Educação Profissional e Tecnológica que se encontra em uma visível expansão e amadurecimento na oferta de espaços que têm possibilitado a formação, sobretudo, técnica e tecnológica. 3. A REDE FEDERAL DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA: a construção e (re)afirmação de espaços da intervenção profissional do assistente social A Política de Educação, no cenário nacional, tem adquirido uma nova roupagem no que diz respeito à Educação Profissional e Tecnológica. A formatação e expansão da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica, legitimada com a publicação da Lei 11.892/08, com a criação dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, juntamente com outros espaços, apresentam a da educação profissional tecnológica enquanto política pública no Brasil. Em 1909 inicia a trajetória da educação profissional e tecnológica no Brasil, com 20 instituições, com o intuito da oferta de uma educação voltada à qualificação do mercado de trabalho. A expressividade da expansão dessa Rede se inicia no final do século XX, sobretudo, nos mandatos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que incorpora à Rede 214 novas unidades quando já havia 140 unidades. (MEC, 2011, p.73-75). Os cursos ofertados são: nível técnico integrado, subsequente, concomitante, licenciatura, superior em tecnologia e pós-graduação com o objetivo de “[...] fortalecer os arranjos produtivos locais.” (MEC, 2011, p. 72). Cabe uma ressalva no que se refere à Politica de Educação ofertada na Rede Federal. Com a prioridade em atender a demanda de força de trabalho, no entorno onde se 6 encontra, a redução da educação somente como trabalho é quase inevitável. Como parte de uma política social seu caráter contraditório se torna ineliminável, mas não quer dizer que não haja meios e espaços onde se possa trabalhar e fortalecer a Educação enquanto política pública e como oportunidade de formação não para o trabalho prioritariamente, mas para a vida, enquanto cidadãos. Todas as ações devem ser associadas no tripé da educação ensino/pesquisa/extensão, e pensadas em uma perspectiva da formação integral do indivíduo contemplando suas dimensões: social, política, cultural e econômica. É então que a inserção do assistente social nesse espaço começa a ficar mais evidente e se legitima quando designado a ampliar e garantir a permanência estudantil no espaço acadêmico. Esse profissional é capaz de dimensionar que cada estudante, com sua particularidade, compõe uma realidade diversificada e complexa. Tal reflexão deve ser realizada em todas as ações. A materialização desse processo, que se encontra em leis e decretos, proporciona indicações para o desenvolvimento de tais ações e neste sentido, o decreto n. 7.234/10 é um importante exemplo, pois dispõe sobre o Programa Nacional de Assistência Estudantil – PNAES. A política estudantil apresentada nesse decreto sugere uma série de ações que buscam atender aos estudantes em suas diversas demandas e na sua totalidade. Porém, enquanto política e com seus limites, essa totalidade acaba sendo atendida parcialmente. Não que sejam irrelevantes as ações desenvolvidas no imediato, apenas não são suficientes. A proposta é que cada Instituição disserte acerca da Política de Assistência Estudantil, oferecendo programas que correspondam às seguintes áreas: moradia estudantil, alimentação, transporte, atenção à saúde, inclusão digital, cultura, esporte, creche, apoio pedagógico e acesso dos estudantes com deficiências, transtornos e altas habilidades. Diante dessas áreas vão se desenvolvendo programas para contemplar as demandas e o Serviço Social encontra aquilo que ocupará a maior parte do seu cotidiano profissional, os programas de auxílio estudantil, ofertados aos estudantes em situação de vulnerabilidade social. Entretanto, é preciso um alerta, ainda que o processo de análise socioeconômica seja uma ação do Serviço Social, o Serviço Social na educação não se reduz à Assistência Estudantil e tampouco não se simplifica nos auxílios estudantis. A dimensão interventiva desse profissional vai muito além. 7 Porém com a grande demanda de estudantes nos espaços institucionais e com o número reduzido de profissionais, tais definições se confundem. A demanda do auxílio estudantil, desde o processo de elaboração, seleção até a concessão e acompanhamento tem reduzido o Serviço Social ao Auxílio Estudantil. Tal conclusão não tem a intenção de negar o papel do assistente social no auxílio estudantil, mas ao se reduzir o campo de intervenção ao programa de auxílio estudantil, dificulta, ao profissional do Serviço Social, trabalhar na perspectiva de ampliação de noção de cidadania e acesso às ações que dizem respeito a todo o universo estudantil. O auxílio estudantil é uma ação dentro da Política de Assistência Estudantil, devendo esta última apresentar um caráter abrangente a todos (as) estudantes. Como não podia ser diferente na história da profissão, a participação dos assistentes sociais na construção dessa política tem sido expressiva, a noção que a profissão traz de que é um processo a ser desenvolvido e amadurecido no desenrolar de suas ações, reconhece que não cabe a uma profissão isolada assegurar a garantia, mas cabe a profissões, por meio do Estado, lutar por uma garantia e qualidade dos serviços e ações. A Política de Assistência Estudantil traz um caráter do trabalho interdisciplinar que agrega todos os profissionais que compõem os espaços de assistência ao educando, a saber: assistentes sociais, psicólogos, pedagogos, assistentes de alunos, nutricionista, enfermeiros, entre outros. A construção das diretrizes das ações deve ser pensada nessa perspectiva interdisciplinar, pois, reforçando o que já foi dito, não compete a uma profissão isolada a garantia das ações. O Serviço Social, pensado assim, dentre suas atribuições no espaço institucional, intervêm, necessariamente, no processo ensino-aprendizagem. Qualquer que seja a interferência nesse processo, o profissional deve estar atento no intuito de facilitar e fortalecer a permanência do estudante na Instituição. “É nessas relações sociais que o assistente social pode contribuir para o trabalho do professor em sala de aula, já que a sala de aula espelha muitos fenômenos sociais tornando-se por vezes um problema a ser enfrentado pelo professor.” (SCHNEIDER, HERNANDORENA, 2012: p.73). Porém, há outras relações que se encontram na dinâmica de vida do estudante que também deve ter a atenção do assistente social, como por exemplo, as relações familiares, relações com a comunidade escolar e sociedade. “[...] a inserção do Assistente Social na educação pública constitui-se em uma das formas de garantir o exercício de cidadania ao 8 aluno, refletindo em sua família, por meio da disponibilidade de atendimento e acompanhamento individualizado, como também buscando a promoção da democracia através da abertura de espaços de participação e envolvimento na realidade escolar.” (SANTOS, 2012, p. 20). A capacidade de articular a família e a comunidade escolar é muito presente no trabalho profissional do Serviço Social. Conseguir trazer a família para dentro do espaço institucional e estimular seu envolvimento é uma das possibilidades que a intervenção profissão possui e que deve ser aproveitada na realidade educacional. Identificar demandas presentes na sociedade, sobretudo, no entorno onde a Instituição está presente, também é uma das ações que o assistente social pode desenvolver, possibilitando através da pesquisa e extensão a aproximação da instituição à realidade local. A participação em Conselhos locais, principalmente da Criança e do Adolescente e Assistência Social, permitem uma melhor aproximação dessa realidade e articulação com os serviços presente no município, estado e união. O reconhecimento da diversidade presente na comunidade escolar é vital para o desenvolvimento do trabalho profissional, a noção das configurações e historicidade das famílias, não caindo em modelos de família e padrão familiar, não deve ser ignorada por parte do profissional. Não é o assistente social quem irá atender todas as demandas e realizar todas as ações, porém, a identificação e articulação das demandas, sem dúvidas constituem atribuições do profissional no espaço escolar. A expectativa então que se cria sobre esse profissional é muito além do que sua possibilidade de ação oferece, pois como dito, a demanda imposta no cotidiano profissional nem sempre permite que se atendam todas as interfaces da intervenção profissional. O acúmulo de trabalho, imposto pelos processos seletivos dos auxílios estudantis, ocupa o cotidiano profissional de tal forma que até o processo de acompanhamento dos estudantes, contemplados com o auxílio estudantil, que se encontra em situação de vulnerabilidade social, não se torna possível e efetivo. A vulnerabilidade social não deve apenas ser atendida com o repasse financeiro do auxílio, o acompanhamento aos estudantes nessa situação é essencial para a complementariedade do trabalho profissional no Programa de Auxílio Estudantil. 9 Assim, o profissional se depara com o antagonismo das expectativas do fazer profissional com as condições objetivas dadas a ele. Reconhecer o limite profissional é essencial para que nos espaços onde ele possa fazer algo, as ações que consiga desenvolver não sejam desprezadas, mas valorizadas. Isso ocorre porque há o movimento contraditório imposto ao profissional que, por vezes, atua apenas na singularidade e não tem possibilidades de desvendamento do imediato imposto no cotidiano o que dificulta uma possível aproximação das particularidades. Especialmente no espaço dos Institutos Federais, espaço público de oferta do direito à educação, é preciso outros apontamentos. Por se constituir um espaço público, a estrutura burocrática por vezes engessa e dificulta as ações. Dentro da hierarquia estatal, a execução de proposta por vezes é morosa e foge do alcance profissional. A ausência do profissional do Serviço Social no processo de construção de políticas que deverão ser executadas pela equipe interdisciplinar dificulta o cotidiano profissional e a visão das ações dentro de um processo maior - ligado a um Estado que se ocupa em garantir a manutenção de uma realidade que amplie e fortaleça o desenvolvimento do capital. A incompatibilidade da definição de Educação por parte do Estado com a do Serviço Social traz ao espaço de intervenção profissional sérios embates que dificilmente serão superados, mas que também permitem avançar na afirmação de uma Educação que não vise apenas à capacitação de certa força de trabalho para uma determinada ação, mas sim uma Educação que vislumbre a construção de cidadãos para o mundo do trabalho, contribuindo com a identificação e o sentido do trabalho que desenvolverão, e se, de fato, conseguem satisfação com a atividade que realizarão. Possibilitar a construção de cidadãos, além da superação do acúmulo de demandas imposto ao profissional, é um dos maiores desafios colocados a essa categoria. Entretanto, deve ser o foco do profissional, pois “[...] compreende-se que a inserção do Assistente Social no contexto escolar pode-se constituir em um agente integrador para que através da categoria participação, o profissional possa colaborar na construção de uma cultura de pertencimento, de significação e envolvimento da comunidade escolar no cotidiano da instituição educacional.” (SANTOS, 2012, p.25). Duas ressalvas essenciais devem ser feitas: a primeira diz respeito da construção de cidadãos. Quando se fala em cidadãos, é preciso remeter ao conceito de cidadania que diz 10 diretamente da possibilidade de conhecimento e acesso a todos os direitos, na esfera do direito a responsabilidade primeira de garantia, como já apontado, é do Estado. A total efetivação da cidadania não é exercício de uma profissão. E a segunda é que embora com as peculiaridades e atribuições do profissional, em nenhum momento da realização do trabalho profissional ele está sozinho, pois os parceiros dentro da comunidade escolar são indispensáveis para que se amplie o campo da intervenção profissional e a noção de cidadania. A urgência que se coloca para a profissão é a legitimidade do Serviço Social na Educação, no universo educacional. Há ainda certa falta de conhecimento, por parte da comunidade escolar, a respeito da definição da profissão e do diferencial e contribuição que o profissional traz à Instituição. É preciso que as atribuições sejam esclarecidas e definidas não por parte da demanda institucional, mas do conhecimento do que é o trabalho profissional e sua dimensão e na identificação da Educação e do espaço educacional que se insere. Para articular suas demandas de trabalho à luz do PEP, com um direcionamento político e social claro, sobretudo, desvelar a complexidade do cotidiano em que se insere, a perspectiva de totalidade é fundamental e deve ser norteadora do trabalho profissional. Não pode deixar de lado a origem da profissão e o que ainda a permeia, a questão social. “Os problemas que pressionam os espaços educacionais agora desenvolvidos em rede e na história, o que evoca a necessidade de, tanto na interpretação dos problemas como na resolução deles, ser imprescindível encará-los através da compreensão da totalidade social.” (SILVA 2012, p. 38). Não há como dissociar o Serviço Social da questão social, pois, “[...] é a questão social que dá concretude ao Serviço Social.” (MOTA, 2010 p.45). Essa dimensão deve ser destacada sempre quando se faz considerações a respeito do trabalho profissional. Para que, primeiro, o profissional tenha a noção do seu limite profissional e para que compreenda a complexidade em que se insere seu fazer profissional. “A profissionalização do Serviço Social pressupõe a expansão da produção e de relações sociais capitalistas, impulsionadas pela industrialização e urbanização, que trazem, o seu verso, a questão social.” (IAMAMOTO, 2008, p.171, grifo do autor). Lidar com o campo das políticas sociais, particularmente da política de Educação, ocupar espaços que ampliem a permanência estudantil e possibilite o maior acesso de toda população à educação, será sempre um desafio a ser superado no cotidiano profissional. O 11 comprometimento de fato com o direcionamento político e social da profissão garante então que se esclareçam os caminhos que o profissional deve seguir. A clareza do limite profissional e do espaço em que se insere é crucial para que o profissional de fato avance com aquilo que lhe é proposto, profissionalmente, e ainda garanta seu lugar dentro do espaço institucional. CONSIDERAÇÕES FINAIS A realidade está sempre em processo de transformação, assim o compromisso profissional em desvendar tal realidade deve ser reafirmado em todo momento. Por isso, é necessário que seja garantido ao profissional capacitação continuada, para que tenha condições de apreender elementos teóricos e metodológicos necessários para encarar a complexidade do real. Além de instrumentalizar a intervenção profissional e qualificar as ações desenvolvidas. Com isso, é possível delimitar, dentro do espaço institucional, as atribuições e competências do Serviço Social. Se por um lado o Serviço Social avança e é requisitado a assumir funções no espaço institucional, por outro, a falta de percepção da dimensão profissional pode reduzir o fazer profissional a apenas executor de ações e pode receber demandas de trabalho que não condizem com o PEP. Assim, o profissional se afirma e reafirma no espaço institucional, ganhando espaço, alargando suas possibilidades e limites na luta constante da afirmação de direitos. No espaço dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, vai legitimando, conquistando espaços e superando a impressão de que o fazer profissional é tão somente e simplesmente a Política de Assistência Estudantil. Mas que a partir das diretrizes e ações dessa Política no universo maior da Política de Educação, a contribuição que essa profissão traz, na articulação com outras categorias, é essencial para a garantia de fato da permanência estudantil. O saber profissional é um diferencial na construção de propostas e ações a ser desenvolvidas na Instituição. A profissão não é apenas a Política da Assistência Estudantil, mas o fazer profissional perpassa por ela e, então, se torna um importante espaço para a objetivação do trabalho profissional na Política de Educação. 12 Direcionado pelos princípios teóricos e metodológicos do Projeto Profissional (PEP), o assistente social delineia seu cotidiano profissional na Educação e se legitimando como importante profissional integrante de uma equipe interdisciplinar cuja função é facilitar a relação ensino-aprendizagem, essencial do espaço educacional, e “[...] tornar a educação estatal para o público uma educação efetivamente de interesse público.” (SANFELICE, 2012, p. 07) Com qualidade e com as particularidades do saber profissional, o assistente social se ocupa da Política de Educação com a responsabilidade de efetivar o direito de acesso à Educação, e mais do que o acesso, a permanência, contribuindo para a inserção no mundo do trabalho, referenciando-se na formação de sujeitos sociais em todas suas dimensões, social, política, econômica e cultural. 13 REFERÊNCIAS ALMEIDA, N. 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