Cobrança de cheques prescritos - BuscaLegis

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Cobrança de cheques prescritos
Armindo de Castro Júnior*
1. INTRODUÇÃO
O objetivo do presente artigo é o de tentar esclarecer quais são as medidas judiciais
para cobrança de cheques prescritos, abordando o prazo de prescrição dessas ações,
bem como os requisitos para propositura das mesmas.
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2. PRESCRIÇÃO DO CHEQUE
O cheque prescreve em seis meses, a contar do término do prazo de apresentação,
da data de emissão, que é de 30 ou 60 dias, sendo o título respectivamente emitido
na praça de pagamento ou fora dela, conforme prescreve a Lei do cheque (Lei nº
7.357/85):
Art. 33 - O cheque deve ser apresentado para pagamento, a contar do dia da
emissão, no prazo de 30 (trinta) dias, quando emitido no lugar onde houver de ser
pago e de 60 (sessenta) dias, quando emitido em outro lugar do País ou no exterior.
Art. 59 - Prescreve em 6 (seis) meses, contados da expiração do prazo de
apresentação, a ação que o art. 47 desta Lei assegura ao portador.
Para informações mais detalhadas sobre o tema, remetemos o leitor para nosso
artigo, intitulado "Prescrição do cheque. Análise da interpretação doutrinária e
jurisprudencial" [01].
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3. PROTESTO DE CHEQUE PRESCRITO
3.1. Protesto como Causa de Interrupção da Prescrição
Enquanto não estiver prescrito, é lícito o protesto do cheque, até como meio de
interromper a prescrição cambiária, conforme dispõe nosso Código Civil:
Art. 202 - A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, darse-á:
...
III - por protesto cambial;
O Código Civil de 1916 não trazia, no rol do artigo 172, o protesto cartorário como
uma das causas de interrupção da prescrição. Em 1963, interpretando tal
dispositivo legal, o Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que:
"Simples protesto cambiário não interrompe a prescrição", através da edição da
Súmula nº 153 [02]. Com a entrada em vigor do novo Código Civil, tal
entendimento encontra-se devidamente superado.
3.1. Ilegalidade do Protesto de Título Prescrito
Questão controvertida é a de se é lícito levar cheque prescrito a protesto. A
polêmica está na interpretação do final do caput do artigo 9º da Lei de Protestos
(Lei nº 9.492/97):
Art. 9º - Todos os títulos e documentos de dívida protocolizados serão examinados
em seus caracteres formais e terão curso se não apresentarem vícios, não cabendo
ao Tabelião de Protesto investigar a ocorrência de prescrição ou caducidade.
Sem a pretensão de esgotar o assunto, que merece estudo mais aprofundado,
entendemos que a impossibilidade de o tabelião conhecer da prescrição ou
caducidade, não autoriza o credor a levar a protesto cheque prescrito pelos
seguintes motivos:
3.1.1. Impossibilidade de o juiz conhecer de ofício da prescrição
Até 2006, não era possível ao juiz de conhecer, de ofício, da prescrição, conforme
dispunha o artigo 166 [03], do Código Civil de 1916, bem como o artigo 194 do
Código atual [04]. Seria no mínimo incoerente autorizar ao tabelião conhecer de
algo vedado ao magistrado [05].
3.1.2. Protesto não é meio de cobrança
O protesto não é uma forma extrajudicial de cobrança e, sim, um meio de prova
que visa a conservação e a ressalva de direitos. Nesse sentido, pode ser utilizado
para:
a) Provar a mora do devedor de um título de crédito, com o objetivo de conservar o
direito de regresso contra os coobrigados indiretos [06].
b) Requerer a falência de empresário, fundada em impontualidade injustificada.
Para tal, o título de crédito não pode estar prescrito (Lei nº 11.101/2005, artigos 94,
inciso I e 96, inciso II).
c) Execução de duplicata sem aceite (Lei nº 5.474/68, artigo 15, inciso II)
d) Interromper a prescrição do título, como já exposto (Código Civil, artigo 202,
inciso III).
Em qualquer das hipóteses aventadas, o protesto de título prescrito demonstra-se
como ineficaz como meio de conservação de direitos, configurando-se, portanto,
conduta abusiva do credor, passível de reparação civil. Sobre o tema, assim se
pronunciou o Superior Tribunal de Justiça:
Indenização. Protesto de cheque prescrito e sem a devida notificação. Dano moral
caracterizado.
1. O simples fato de enviar a protesto cheque prescrito e sem que feita a devida
notificação, como reconhecido nas instâncias ordinárias, acarreta o dever de
indenizar.
2. Recurso especial conhecido e provido.
(STJ. Órgão Julgador: Terceira Turma. Recurso Especial nº 602.136/PB. Relator:
Min. Carlos Alberto Menezes Direito. Data do julgamento: 07 dez. 2004.
Publicação: Diário de Justiça, 11 abr. 2005, p. 291) [07]
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4. COBRANÇA JUDICIAL DE CHEQUES PRESCRITOS
Existem, basicamente, três medidas judiciais para recebimento de cheques
prescritos; duas delas estão previstas, respectivamente, nos artigos 61 e 62 da Lei
do Cheque: as ações de enriquecimento ilícito e causal. A terceira trata-se da ação
monitória e está prevista nos artigos 1.102-A a 1.102-C do Código de Processo
Civil.
4.1. Características comuns
As ações para cobrança de cheques prescritos têm, em comum, as seguintes
características:
4.1.1. Não-cabimento de juros moratórios
Não é cabível a cobrança de juros moratórios a partir da apresentação do cheque ao
banco sacado (Lei do Cheque, artigo 52, inciso II [08]). Como o cheque está
prescrito, os juros somente são devidos a partir da citação (Código Civil, artigo
397, parágrafo único). Nesse sentido está o entendimento do STJ:
AÇÃO MONITÓRIA.
TERMO INICIAL.
CHEQUE
PRESCRITO.
JUROS
MORATÓRIOS.
- Os juros moratórios, na ação monitória, contam-se a partir da citação.
Recurso especial não conhecido.
(STJ. Órgão Julgador: Quarta Turma. Recurso Especial nº 554.694/RS. Relator:
Min. Barros Monteiro. Data do julgamento: 06 set. 2005. Publicação: Diário de
Justiça, 24 out. 2005, p. 329) [09]
Sobre o tema, interessante consultar o inteiro teor do Agravo Regimental no
Agravo de Instrumento nº 666.617/RS – STJ.
4.1.2. Incidência de correção monetária
A correção monetária (Lei do Cheque, artigo 52, inciso IV) é devida desde a data
de emissão do cheque, segundo jurisprudência mais recente do STJ:
COMERCIAL - PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO DE INSTRUMENTO AGRAVO REGIMENTAL - AÇÃO MONITÓRIA – CHEQUE PRESCRITO
ATÉ PARA AÇÃO DE LOCUPLETAMENTO – CAUSA DA DÍVIDA CORREÇÃO MONETÁRIA - TERMO INICIAL.
- O cheque prescrito serve como instrumento de ação monitória, mesmo vencido o
prazo de dois anos para a ação de enriquecimento (Lei do Cheque, Art. 61), pois o
Art. 1.102a. do CPC exige apenas "prova escrita sem eficácia de título executivo".
- Dispensa-se a indicação da causa de emissão do cheque prescrito que instrui ação
monitória.
- Na ação monitória para cobrança de cheque prescrito, a correção monetária corre
a partir da data do respectivo vencimento.
(STJ. Órgão Julgador: Terceira Turma. Agravo Regimental no Agravo de
Instrumento nº 666.617/RS. Relator: Min. Humberto Gomes de Barros. Data do
julgamento: 01 mar. 2007. Publicação: Diário de Justiça, 19 mar. 2007, p. 322)
[10]
No mesmo sentido, consultar os Recursos Especiais nº 55.932 e 365.061, ambos de
Minas Gerais.
4.1.3. Impossibilidade de cobrança de avalistas
Uma vez prescrito o título, desaparecem as relações puramente cambiárias, como o
aval. Assim, o avalista não poderá ser acionado, salvo se ficar provado que houve
enriquecimento sem causa. Nesse sentido, Fran Martins é bastante claro, ao ensinar
que:
... o portador que não exerceu a competente ação executiva contra sacador ou
endossantes, no prazo legal, tem o direito de agir, já não mais cambiariamente mas
em ação comum, contra o sacador ou endossantes que hajam feito lucros ilegítimos
à sua custa. Não poderá agir, contudo, contra os avalistas porque esses são sempre
obrigados cambiários e, prescrito o cheque, o documento perde a sua natureza
cambiária para transformar-se em um quirógrafo comum. Daí não ser devida a
ação de locupletamento contra os avalistas, sejam eles do emitente ou dos
endossantes, pois o aval, instituto cambiário, perece com a descaracterização do
cheque como título cambiariforme, segundo acima se explicou. [11]
No mesmo sentido está o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
DIREITO COMERCIAL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À AÇÃO
MONITÓRIA. CHEQUE PRESCRITO. PROPOSITURA DE AÇÃO CONTRA O
AVALISTA. NECESSIDADE DE SE DEMONSTRAR O LOCUPLETAMENTO.
PRECEDENTE.
- Prescrita a ação cambial, desaparece a abstração das relações jurídicas cambiais
firmadas, devendo o beneficiário do título demonstrar, como causa de pedir na
ação própria, o locupletamento ilícito, seja do emitente ou endossante, seja do
avalista.
- Recurso especial a que não se conhece.
(STJ. Órgão Julgador: Terceira Turma. Recurso Especial nº 457.556/SP. Relatora:
Min. Nancy Andrighi. Data do julgamento: 11 nov. 2002. Publicação: Diário de
Justiça, 16 dez. 2002, p. 331) [12]
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5. AÇÃO DE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO
5.1. Fundamento Legal
Também conhecida como ação de locupletamento injusto, esta ação tem como
fundamento a Lei do Cheque, que dispõe, in verbis:
Art. 61 - A ação de enriquecimento contra o emitente ou outros obrigados, que se
locupletaram injustamente com o não-pagamento do cheque, prescreve em 2 (dois)
anos, contados do dia em que se consumar a prescrição prevista no art. 59 e seu
parágrafo desta Lei.
5.2. Características
As principais características desta ação são as seguintes:
5.2.1. Ação cambial
A ação de enriquecimento ilícito é cambial, por estar prevista na Lei do Cheque e,
para sua propositura, dispensa a prova da existência da relação causal, bastando a
simples exibição do cheque prescrito.
5.2.2. Rito
Sendo uma ação de conhecimento, o rito da ação de locupletamento é de livre
escolha do credor: na justiça comum, pode ser manejada pelo rito ordinário ou
sumário – se o valor da ação for de até 60 salários mínimos (Código de Processo
Civil, artigo 275, inciso I). Nos juizados especiais, os requisitos são dois: o autor
deve ser pessoa física (Lei nº 9.099/95, artigo 8º, § 1º), microempresa ou empresa
de pequeno porte (Lei Complementar nº 123/2006, artigo 74; e o valor da causa
deve ser de até 40 salários mínimos (Lei nº 9.099/95, artigo 3º, inciso I)
5.2.3. Prescrição
O prazo para se propor a ação é de dois anos, a contar da prescrição da execução.
5.2.3. Aplicabilidade dos princípios de direito cambiário
Questão que causa controvérsia na doutrina é a aplicabilidade dos princípios da
autonomia, abstração e da inoponibilidade de exceções a terceiro de boa-fé, este
último consagrado pelo artigo 25 [13] da Lei do Cheque. Fábio Ulhoa Coelho
entende que tais princípios são aplicáveis:
Como a ação de enriquecimento indevido é cambial, se o demandante é o
endossatário do cheque e o demandado é o emitente, não poderá esse último, na
contestação, suscitar matérias pertinentes ao negócio originária do título, matérias
que, perante terceiros de boa-fé, não são oponíveis no regime cambiário. Frise-se,
entretanto, que se a demanda é promovida pelo tomador contra o emitente, será
lícito ao réu contestar o pleito discutindo a relação jurídica originária do título.
Exemplo: se Antonio tomou dinheiro emprestado de Benedito – agiota que cobra
juros usurários –, e procedeu ao pagamento do devido por cheques, que foram
regularmente endossados a Carlos, terceiro de boa-fé, na ação de enriquecimento
indevido que o último promover contra aquele não será cabível contestar a
pretensão, discutindo a limitação legal dos juros. Mas se o cheque não circulou, na
ação de enriquecimento indevido que Benedito aforar contra Antonio, será
perfeitamente discutível o excesso de juros. [14]
Em sentido diametralmente oposto, está Gladston Mamede que entende que os
princípios de Direito Cambiário não são aplicáveis à espécie:
Trata-se de ação ordinária, de processo de conhecimento: prescrito o cheque, não
há mais falar em declaração unilateral de vontade, nem nas garantias cambiais da
autonomia, da independência e da abstração. A pretensão se funda no negócio
subjacente, impedindo que uma parte se locuplete à custa da outra, ou seja, que se
enriqueça indevidamente, causando correlato empobrecimento indevido no
patrimônio do portador do cheque. Diante desse quadro, não é mais o cheque, por
si, a razão de ser do procedimento judicial, mas o fato jurídico no qual foi emitido.
[15]
A melhor solução, contudo, parece a dada por Fran Martins. Após discorrer sobre
as matérias de defesa na ação de execução, abordando o artigo 25 da Lei do
Cheque, o professor adotou o seguinte entendimento:
Nas ações de enriquecimento indevido não são aplicáveis estritamente as normas
acima enumeradas, já que tais ações fogem ao direito cambiário, integrando-se no
direito comum. Assim, as exceções apontadas podem ser opostas pelo réu ao autor,
mas a defesa daquele não se restringe apenas a tais exceções. Outros meios de
prova poderão ser argüidos e naturalmente, contestados pelo autor. Na ação de
enriquecimento as provas são as mais amplas para ambas as partes, cabendo ao juiz
afinal sentenciar a respeito, reconhecendo o direito do autor ou do réu, de acordo
com as provas apresentadas, o seu convencimento e as regras de direito. [16]
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6. AÇÃO CAUSAL
6.1. Fundamento Legal
A ação causal, tal qual a de enriquecimento ilícito, é uma ação de conhecimento,
estando prevista na Lei do Cheque:
Art. 62 - Salvo prova de novação, a emissão ou a transferência do cheque não
exclui a ação fundada na relação causal, feita a prova do não-pagamento.
6.2. Características
A ação causal tem as seguintes características:
6.2.1. Demonstração da causa debendi
Diferentemente da ação de locupletamento, para a propositura da ação causal, é
necessária a demonstração da relação fundamental, ou seja, do negócio que deu
origem ao cheque. O título, neste caso, serve apenas como prova da inadimplência
da relação fundamental.
6.2.2. Opções do credor
Sendo ação baseada na relação causal, existem duas opções para o credor: manejar
ação de cobrança, baseada na inadimplência do devedor ou promover a ação causal
propriamente dita, para discussão do negócio fundamental.
A ação causal propriamente dita pode ser promovida a qualquer tempo, inclusive
enquanto o cheque ainda tiver força executiva. Os requisitos são os mesmos da
ação de cobrança; os objetivos, contudo, são outros: discutir a relação fundamental,
promovendo seu desfazimento, por exemplo.
Explica-se: o cheque, como qualquer título de crédito, é emitido em caráter prosolvendo, ou seja, não quita desde logo a obrigação fundamental; a obrigação
somente se dará por satisfeita com a efetiva quitação do título pelo banco sacado.
Exemplificando: Caio emite cheque a favor de Décio, para pagamento da compra
de um computador. O título resta devolvido por falta de provisão de fundos. Décio,
enquanto o cheque não tiver prescrito, pode executá-lo ou promover uma ação para
desfazimento do negócio, retomando o computador. Com a ocorrência da
prescrição, Décio poderá manejar ação de enriquecimento ilícito, ação de cobrança,
monitória, ou, ainda, a ação para desfazer a relação fundamental. O mesmo se dá
em cheque emitido para pagamento de aluguéis: o locador terá as mesmas opções
de cobrança ou, a qualquer momento, poderá ingressar com ação de despejo contra
o locatário.
6.2.3. Rito
A ação de cobrança pode seguir qualquer dos ritos descritos na ação de
locupletamento.
6.2.4. Prescrição
O prazo prescricional da ação causal é o mesmo da obrigação que deu origem ao
título, devendo o prazo ser contado a partir de quando a obrigação é exigível e,
não, da prescrição do cheque. Não havendo prazo inferior previsto por lei, a
prescrição da ação causal dar-se-á em 10 anos (Código Civil, artigo 205).
Inúmeras são as hipóteses previstas no artigo 206 de nosso estatuto civil que
prevêem prazos menores de prescrição. Por exemplo, se o cheque foi dado em
pagamento de: refeição consumida em restaurante, o prazo é de um ano (§ 1º,
inciso I); prestação alimentar, dois anos (§ 2º); aluguel ou reparação civil, três anos
(§ 3º, incisos I e V); contrato, honorários advocatícios ou custas processuais, cinco
anos (§ 5º, inciso I, II e III). A prescrição de título de crédito, prevista no § 3º, tem
pouca aplicação prática, na medida em que as leis especiais, em geral, dispõem
sobre a prescrição dos títulos de crédito.
6.2.5. Contra quem pode ser proposta
Regra geral, o portador do cheque poderá ingressar com a ação causal somente
contra o coobrigado com quem teve relação direta. Assim, o tomador poderá
ingressar contra o emitente, fazendo prova de sua relação negocial com ele; o
endossatário, contudo, somente poderá acionar o endossante, pessoa com quem
teve relação imediata, não podendo ingressar contra o emitente, salvo se fizer
prova da relação entre este e o endossante.
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7. AÇÃO MONITÓRIA
7.1. Fundamento legal
A ação monitória está prevista nos artigos 1102-A a 1102-C do Código de
Processo Civil.
7.2. Características
As principais características da ação monitória são as seguintes:
7.2.2. Função
A ação monitória tem como função principal, segundo Mandrioli [17], "eliminar a
complexidade do juízo ordinário de conhecimento derivada das exigências do
contraditório". Assim, na lição de Humberto Theodoro Júnior:
... o procedimento se desdobra em duas fases: na primeira fase, o juiz, sem
contraditório e de maneira rapidíssima, verifica o conteúdo do pedido e a prova do
autor, deferindo, se for o caso, a expedição do mandado de pagamento, inaudita
altera parte. Na segunda fase, fica assegurada ao réu a iniciativa de abrir o pleno
contraditório sobre a pretensão do autor, eliminando, dessa forma, todo e qualquer
risco de prejuízo que possa ter-lhe provocado a sumariedade de cognição operada
na primeira fase. [18]
7.2.3. Desnecessidade de demonstrar a causa debendi
Ao contrário do que ocorre com a ação causal, não é necessária, quando da
propositura da ação, a demonstração da relação fundamental (causa debendi). Um
cheque prescrito enquadra-se no conceito de "prova escrita sem eficácia de título
executivo", previsto no artigo 1.102-A do CPC. Nesse sentido, está a Súmula 299
do Superior Tribunal de Justiça. [19]
7.2.4. Citação e pagamento
O réu é citado para que pague a quantia determinada, no prazo de 15 dias (CPC,
artigo 1.102-B). Caso cumpra o mandado, de acordo com o disposto no artigo
1.102-C, § 1º, "ficará isento de custas e honorários advocatícios".
7.2.5. Embargos monitórios
No mesmo prazo de 15 dias, o réu poderá interpor embargos monitórios, hipótese
em que deflagrará o contraditório, seguindo o processo obrigatoriamente pelo rito
ordinário (CPC, artigo 1.102-C, § 2º). Os embargos monitórios têm natureza de
verdadeira contestação, devendo o réu trazer aos autos "prova de fato impeditivo,
modificativo ou extintivo do direito do autor" (CPC, art. 333, II). Sobre o tema,
bastante precisa é a lição de Gladston Mamede:
Dessa forma, o título prescrito implicará presunção relativa (iuris tantum) da
existência do crédito, sem que se exija do autor digressão e prova sobre o negócio
fundamental. A inserção desta relação jurídica de base na discussão deverá ser feita
pelo réu, por meio de impugnação, apontando defeitos e vícios, podendo alegar
questões como a prescrição. [20]
7.2.6. Revelia
Se ocorrer a revelia, "constituir-se-á, de pleno direito, o título executivo judicial,
convertendo-se o mandado inicial em mandado executivo" (CPC, artigo 1.102-C,
caput).
7.2.7. Rito
Conforme exposto, uma vez embargada, a monitória deve seguir pelo rito
ordinário. Esta ação é efetivamente vantajosa para créditos superiores a 60 salários
mínimos, na medida em que não é possível a propositura de ação de cobrança pelo
procedimento sumário – ou sumaríssimo, dos juizados especiais.
A ação monitória não deve ser proposta nos juizados especiais, por
incompatibilidade de ritos; uma vez interposta, contudo, o juiz deverá, ante os
princípios informadores dos juizados especiais (simplicidade, informalidade,
celeridade e economia processual), recebê-la como uma mera reclamação,
seguindo o próprio dos juizados (o réu será citado para comparecer à audiência de
conciliação e, não, para pagar). Note-se que se o cheque estiver prescrito há menos
de dois anos, apto, portanto, para a ação de enriquecimento ilícito (Lei do cheque,
artigo 61), o título será prova suficiente para a propositura da ação; caso a
prescrição tenha alcançado até a ação de locupletamento injusto, o autor deverá
fazer prova da relação fundamental (causa debendi), sob pena de inépcia da inicial.
7.2.8. Prescrição
Não existe jurisprudência firmada sobre a prescrição da ação monitória, alguns
entendendo que o prazo seria de dez anos (Código Civil, artigo 205); outros
entendem que a ação prescreveria em cinco anos (Código Civil, artigo 206, § 5º, I)
ou, ainda, em três anos (Código Civil, artigo 206, § 3º, IV ou VIII). Analisemos
caso a caso:
a) 10 anos (Código Civil, artigo 205 [21]) - o próprio dispositivo legal estabelece
que a prescrição decenária somente será aplicada quando a lei não fixar prazo
menor. Conforme veremos a seguir, o artigo 206 estabelece diversas hipóteses de
prescrição passíveis de enquadramento, o que afasta a incidência do artigo 205.
b) 3 anos (Código Civil, artigo 206, § 3º, IV [22]) - o fundamento da ação
monitória seria o enriquecimento sem causa (Código Civil, artigo 884) do emitente
ou do endossante. Entendemos que o dispositivo legal não pode ser aplicado
porque a Lei do Cheque já estabelece o prazo de dois anos para a ação de
enriquecimento ilícito, conforme já visto, além de o artigo 886 do Código Civil
claramente dispõe: "Não caberá a restituição por enriquecimento, se a lei conferir
ao lesado outros meios para se ressarcir do prejuízo sofrido".
c) 3 anos (Código Civil, artigo 206, § 3º, VIII [23]) - o dispositivo legal cuida
apenas da prescrição executiva dos títulos de crédito em que a lei especial não
estipulou prazo prescricional, não podendo ser aplicado à ação monitória.
Ademais, com a ocorrência da prescrição, o cheque não mais pode ser considerado
como título de crédito, sendo mero início de prova.
d) 5 anos (Código Civil, artigo 206, § 5º, I [24]) - para propositura da ação
monitória, cheque prescrito equivaleria a "prova escrita sem eficácia de título
executivo" (CPC, artigo 1102-A). A indagação está em saber se igualmente está
enquadrado no conceito de "dívida líquida constante de instrumento particular",
previsto no artigo em comento.
Não há dúvida que o cheque, mesmo prescrito, contém a expressão de uma "dívida
líquida", além de ser documento "particular". Resta saber se tal documento seria
um instrumento. Othon Sidou define cheque como sendo "instrumento de exação"
[25]; segundo Houaiss, "instrumento" é "qualquer título, auto, documento escrito,
que serve para fazer constar fato ou convênio de que derivam conseqüências
jurídicas" [26].
Não restam dúvidas, portanto, que a propositura de ação monitória fundada em
cheque sem força executiva prescreve em cinco anos, a contar da data da emissão
do título. Se, porém, o réu, em embargos monitórios, carrear ao processo a prova
da relação fundamental, a prescrição da ação monitória dar-se-á no mesmo prazo
dessa relação.
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8. CONCLUSÕES
O cheque é título executivo extrajudicial e, como tal deve ser utilizado. Inúmeras
são as vantagens em não deixá-lo prescrever: maior rapidez e eficácia do processo
de execução, cabimento de juros moratórios e legalidade de protestar o título.
Ocorrendo, porém, a prescrição, existe a possibilidade de o credor receber seu
crédito através de ação de enriquecimento ilícito, ação causal ou, ainda, ação
monitória. A opção por cada uma dessas ações deve levar em conta o valor do
título, a prova da relação fundamental, a qualidade do credor e o rito processual.
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9. BIBLIOGRAFIA
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça.
<www.stj.jus.br>. Acesso em 22 mar. 2009.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal.
<www.stf.jus.br>. Acesso em 22 mar. 2009.
Jurisprudência
Jurisprudência
disponível
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CASTRO JÚNIOR, Armindo de. Prescrição do cheque. Análise da interpretação
doutrinária e jurisprudencial. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1542, 21 set.
2007. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10438>.
Acesso em: 14 jan. 2009.
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial: Direito de empresa: empresa e
estabelecimento; títulos de crédito. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2008, v. 1.
HOUAISS, Antonio, VILLAR, M. S.. Dicionário Houaiss da língua portuguesa.
Disponível em <http://houaiss.uol.com.br/busca.jhtm>. Acesso em 25 fev. 2009.
MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: títulos de crédito. 4 ed. São
Paulo: Atlas, 2008, v. 3.
MANDRIOLI, Crisanto. Corso de Diritto Processuale Civile. 8 ed. Torino:
Giapichelli Editore, 1991, v. 3, apud THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de
direito processual civil. 17 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996, v. 3.
MARTINS, Fran. Títulos de crédito: cheques, duplicatas, títulos de financiamento,
títulos representativos e legislação. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, v. 2.
SIDOU, J. M. Othon. Do cheque. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1986.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 17 ed. Rio de
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--------------------------------------------------------------------------------
Notas
CASTRO JÚNIOR, Armindo de. Prescrição do cheque. Análise da interpretação
doutrinária e jurisprudencial. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1542, 21 set.
2007. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10438>.
Acesso em: 14 jan. 2009.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Órgão Julgador: Pleno. Súmula nº 153:
Simples protesto cambiário não interrompe a prescrição. Data do julgamento: 13
dez. 1963. Publicação: Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo
Tribunal Federal – Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional,
1964, p. 85. Jurisprudência disponível em <www.stf.jus.br>. Acesso em 22 mar.
2009.
Art. 166. O juiz não pode conhecer da prescrição de direitos patrimoniais, se não
foi invocada pelas partes.
Art. 194. O juiz não pode suprir, de ofício, a alegação de prescrição, salvo se
favorecer a absolutamente incapaz.
O artigo 194 do Código Civil foi revogado pela Lei nº 11.280/2006. Atualmente, o
artigo 219 do CPC, dispõe, in verbis: "§ 5º - O juiz pronunciará, de ofício, a
prescrição."
O prazo de protesto para conservação do direito de regresso é bastante exíguo. Para
a nota promissória e a letra de câmbio, de acordo com a interpretação doutrinária
adotada, o prazo é, ou o dia seguinte ao do vencimento (Decreto nº 2.044/1908,
artigo 28) ou de dois dias (artigo 44, do Anexo I, da Lei Uniforme de Genebra
(Decreto nº 57.633/66). O protesto da duplicata deve ser tirado em 30 dias, a contar
do vencimento (Lei nº 5.474/68, artigo 13, § 4º). No caso do cheque, para
conservação do direito de regresso é necessário que o cheque tenha sido
apresentado dentro do prazo de 30 ou 60 dias e que a recusa de pagamento seja
provada pelo protesto ou por carimbo comprovando o não pagamento do título,
aposto pelo banco sacado ou pela câmara de compensação (Lei do Cheque, artigos
33 e 47, inciso II). Observe-se que a Lei de Protestos exige, em seu artigo 6º, que
para se levar a cabo o protesto do cheque, é necessário que se prove a apresentação
do título ao banco sacado.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça.
<www.stj.jus.br>. Acesso em 22 mar. 2009.
Art. 52 - O portador pode exigir do demandado:
I - a importância do cheque não pago;
Jurisprudência
disponível
em
II - os juros legais desde o dia da apresentação;
III - as despesas que fez;
IV - a compensação pela perda do valor aquisitivo da moeda, até o embolso das
importâncias mencionadas nos itens antecedentes.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Op. cit.
Idem.
MARTINS, Fran. Títulos de crédito: cheques, duplicatas, títulos de financiamento,
títulos representativos e legislação. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, v. 2, p.
124.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Op. cit.
Art. 25 - Quem for demandado por obrigação resultante de cheque não pode opor
ao portador exceções fundadas em relações pessoais com o emitente, ou com os
portadores anteriores, salvo se o portador o adquiriu conscientemente em
detrimento do devedor.
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial: Direito de empresa: empresa e
estabelecimento; títulos de crédito. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2008, v. 1, p. 453453.
MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: títulos de crédito. 4 ed. São
Paulo: Atlas, 2008, v. 3, p. 299.
MARTINS, Fran. Op. cit., p. 125.
MANDRIOLI, Crisanto. Corso de Diritto Processuale Civile. 8 ed. Torino:
Giapichelli Editore, 1991, v. 3, apud THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de
direito processual civil. 17 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996, v. 3, p. 381.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 17 ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1996, v. 3, p. 381.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Órgão Julgador: Segunda Seção. Súmula nº
299: É admissível a ação monitória fundada em cheque prescrito. Data do
julgamento: 18 out. 2004. Publicação: Diário de Justiça, 22 nov. 2004, p. 425.
Jurisprudência disponível em <www.stj.jus.br>. Acesso em 22 mar. 2009.
MAMEDE, Gladston. Op. cit., p. 180.
Art. 205. A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo
menor.
Art. 206. Prescreve:
§ 3º - Em três anos:
IV - a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa;
Art. 206. Prescreve:
§ 3º - Em três anos:
VIII - a pretensão para haver o pagamento de título de crédito, a contar do
vencimento, ressalvadas as disposições de lei especial;
Art. 206. Prescreve:
§ 5º - Em cinco anos:
I - a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público
ou particular;
SIDOU, J. M. Othon. Do cheque. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1986, p. 28.
HOUAISS, Antonio, VILLAR, M. S.. Dicionário Houaiss da língua portuguesa.
Disponível em <http://houaiss.uol.com.br/busca.jhtm>. Acesso em 25 fev. 2009..
*advogado em Cuiabá (MT), professor universitário, mestre em Ciências JurídicoEmpresariais pela Universidade de Coimbra (Portugal)
Disponível http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12654
Acesso em: 24 de abril 2009.
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