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Tuberculose e outras Micobacterioses
TEMAS EM DESTAQUE
Estado atual da cirurgia da Tuberculose
Terapia com antagonistas de TNF-α e Tuberculose
Dia Mundial da Tuberculose
Jornada de Marketing e Finanças Médicas
2
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
DIRETORIA - BIÊNIO 2008/2009
DIRETORIA
Presidente: José Eduardo Delfini Cançado
Vice-Presidente: Jaquelina Sonoe Ota Arakaki
Secretária Geral: Regina Maria de Carvalho Pinto
1º Secretário: Ricardo Millinavicius
2ª Secretária: Valéria Cristina Vigar Martins
Diretor de Finanças: Oliver Augusto Nascimento
Diretor de Assuntos Científicos: Gustavo F. Prado
Diretor de Divulgação: Paulo Manuel Pêgo Fernandes
Diretor Informática: Eduardo Henrique Genofre
COMISSÕES
Assuntos do Interior: Alex Gonçalves Macedo
Defesa Profissional: José Eduardo Gregório Rodrigues
Ensino: Mônica Corso Pereira
Promoções: Nephtali Segal Grinbaum
Assuntos da Grande São Paulo: Sidney Bombarda
DEPARTAMENTOS
Cirurgia Torácica:
Roberto Saad Júnior; João Aléssio Juliano Perfeito; Rodrigo
Caetano de Souza
Endoscopia Respiratória:
Viviane Rossi Figueiredo; Miguel Lia Tedde; Nilza Sayuri Abe
Pediatria:
Maria Helena Bussamra; Marina Buarque de Almeida
Ana Clara Toschi Gianotti de Souza
Fisioterapia Respiratória:
Lara Maris Nápolis; Priscila Batista de Souza
Marisa Afonso A. Brunherotti
Conselho Fiscal - Efetivos:
Ana Luisa Godoy Fernandes; Alberto Cukier;
Carlos Alberto de Castro Pereira
Suplentes:
Rafael Stelmach; Roberto Stirbulov; Mário Terra Filho
Conselho Deliberativo
Fernando Augusto Fiuza de Melo; Francisco Vargas Suso
Jorge Nakatani; José Antônio Baddini Martinez; Manuel Lopes dos
Santos; Maria Vera Cruz de Oliveira Castellano
Miguel Bogossian; Nelson Morrone; Ricardo Beyruti; Sonia Maria
Faresin; Virgílio Alexandre Nunes de Aguiar
REGIONAIS
Regional do ABC
Presidente: Marcelo Gervilla Gregório
Secretário: Márcio Abreu Neis
Regional de Araraquara / Bauru / Botucatu
Presidente: Eduardo Ferraz Hage
Secretário: José Eduardo Bergami Antunes
Regional de Campinas
Presidente: Ricardo Kalaf Mussi
Secretária: Ana Maria Camino
Regional de Marilia
Presidente: Virgínia Maria Cavallari Strozze Catharin
Secretária: Gisele César de Rossi Agostinho
Regional de Ribeirão Preto
Presidente: Ana Carla Souza de Araujo
Secretário: Hugo Alejandro Veja Ortega
Regional de Santos
Presidente: Fabiola Gomes Rodrigues
Secretário: Thiago Fernandes Leomil
Regional de São José dos Campos
Presidente: Douglas Carlyle Belculfiné
Secretária: Maria Helena Magalhães Rezende
Regional de São José do Rio Preto
Presidente: Benedito Aparecido Caiel
Secretária: Elaine Mara Cesaretti de Paula
PNEUMOLOGIA PAULISTA
Órgão Informativo da Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia
Editor Responsável: Jaquelina Sonoe Ota Arakaki
Editoração Eletrônica: Miriam Miranda
Impressão: AquaPrint Gráfica e Editora • Tiragem: 1200 exemplares
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
SUMÁRIO
4
EDITORIAIS
6
TEMAS EM DESTAQUE
• Estado atual da cirurgia da Tuberculose
• Repercussões estruturais e funcionais das
sequelas de Tuberculose tóraco-pulmonar
em pacientes imunocompetentes
• Surtos de infecções por micobactérias de
crescimento rápido
• Terapia com antagonistas de TNF-ALFA e
Tuberculose
25
RESUMINDO E RECORDANDO
• Diagnóstico bacteriológico da
Tuberculose e outras micobacterioses
• Diagnóstico diferencial da Tuberculose na
infância
• Tuberculose extrapulmonar
42
RELATO DE CASO
Síndrome Lady Windemere ou bronquiectasias
difusas
45
IMAGEM EM PNEUMOLOGIA
Aspectos tomográficos da Tuberculose
pulmonar
48
EPIDEMIOLOGIA CLÍNICA
O que é análise multivariada?
50
FUTURO DA PNEUMOLOGIA
Biologia molecular no diagnóstico da
Tuberculose e outras micobacterioses
55
CONTROVÉRSIA
Marcadores de atividade da Tuberculose
pleural
58
ARTIGOS EM DESTAQUE
61
NOTÍCIAS
68
HISTÓRIA DA PNEUMOLOGIA
Os sanatórios e seu tempo
NOSSA CAPA
O Serviço de Pneumologia do Hospital do Servidor Público Estadual de
São Paulo conta com 22 médicos especialistas. Além da residência médica
há no hospital pós-graduação. A enfermaria conta com 38 leitos. O setor de
broncoscopia conta com dois pneumologistas. O Setor de Função Pulmonar,
dirigido por um especialista, conta com três técnicos certificados pela
SBPT. Dois cursos nacionais são oferecidos a cada semestre.
O ambulatório presta atendimento a 1800 pacientes mensalmente e
inclui pronto-atendimento e sub-especialidades (tosse crônica, dispnéia,
asma grave, DPOC, oxigenoterapia, distúrbios do sono, bronquiectasias,
tuberculose, doenças intersticiais, doenças da circulação pulmonar, câncer
de pulmão).
O serviço conta com a colaboração de uma patologista especializada e
um radiologista de tórax.
O serviço forma médicos residentes de alto nível desde 1972.
As atividades didáticas incluem:
1. Curso semanal básico de Pneumologia; 2. Reunião geral com discussão
de casos; 3. Curso semanal de radiologia; 4. Discussão semanal de artigos.
Diretor: Carlos AC Pereira
Fones: (011) 55746603; 50843387; 50888135
3
PALAVRA DO PRESIDENTE
SPPT 2009: reciclagem, atualização e
confraternização
Prezados sócios,
Começamos 2009 com muitos desafios, metas e projetos.
Será um ano de muito trabalho, mas temos a certeza que a
SPPT promoverá muitas atividades de reciclagem, atualização
e confraternização.
A primeira grande novidade do ano é uma parceria inédita
com a SOCESP e APM, criando um Programa de Educação
Continuada em Tabagismo. O curso elaborado por
especialistas da SPPT e SOCESP ocorrerá aos sábados, com
duração de aproximadamente 4 horas de aulas e discussões,
coordenadas por um pneumologista e um cardiologista de
cada Sociedade, nas Regionais da APM. Programamos
inicialmente 20 eventos para o Estado de São Paulo. Essa foi
uma idéia inovadora, que levará atualização e reciclagem de
alta qualidade aos colegas das Regionais da SPPT, SOCESP e
APM de todo nosso Estado, em uma das áreas mais
importantes da medicina respiratória e cardiovascular, o
tabagismo.
Continuaremos realizando em 2009 nossas reuniões de
Pizzas Cirúrgicas e Clínicas. A primeira Pizza Cirúrgica do ano,
que ocorreu dia 5 de março, foi a 100ª reunião de Pizza
Cirúrgica, motivo de muito orgulho e alegria para todos os
colegas da área respiratória, em especial aos colegas cirurgiões
torácicos que, ao longo de todos esses anos, transformaram
essa reunião em um encontro tradicional e fundamental para
o aprendizado e confraternização. Parabéns a todos que têm
participado e trabalhado para manter essa excelente atividade
científica da SPPT.
As Pizzas Clínicas foram reformuladas, manteremos a
discussão de 2 casos, apresentados por diferentes serviços
mas, como novidade, estaremos convidando 2 debatedores,
também de escolas distintas, com expertise no assunto do
caso, que irão enriquecer e promover uma maior discussão e
aprendizado nas reuniões.
Para 2009 programamos 3 Jornadas em São Paulo: a primeira
dia 25 de abril, sobre “Marketing e Finanças Médicas”, um
tema inovador, de grande importância na nossa atividade diária
profissional e pouco discutido pelos colegas. A segunda,
marcada para 6 de junho, sobre “Distúrbios Respiratórios do
Sono”, com uma parte teórica pela manhã e outra prática, à
tarde. E a terceira Jornada, dia 25 de agosto, sobre
“Emergências Respiratórias”, um tema de grande interesse
4
teórico e prático no nosso dia a dia. Nossas Regionais estão
agendando suas Jornadas, com temas variados, de acordo
com as necessidades locais.
Estamos dando continuidade às reuniões mensais do
Departamento de Fisioterapia e cada uma de nossas Regionais
está programando seu calendário de atividades. Veja a
programação completa no nosso site (www.sppt.org.br). E por
falar em nosso site, se você ainda não tem sua página pessoal
de sócio, entre em contato no 0800171618, é fácil, rápido,
contém informações de qualidade e você poderá divulgar como
seu site pessoal aos seus clientes. Também nosso site leigo,
www.pulmonar.org.br, foi totalmente reformulado, acesse-o,
envie suas dicas, sugestões e indique a seus pacientes.
Estamos trabalhando para fazer um excelente 130 Congresso
Paulista de Pneumologia e Tisiologia, que irá ocorrer de 19 a
22 de novembro, no Fecomércio. Já temos a confirmação dos
professores internacionais, Kevin K. Brown, do National
Jewish Medical and Research Center e Jerry A. Krishnan, da
University of Chicago, além do professor de cirurgia torácica,
Rodney Jerome Landreneau, do Shadyside Medical Center,
de Pittsburgh.
Nosso próximo livro “Atualização e Reciclagem em
Pneumologia”, está sendo elaborado e será lançado no 130
Congresso Paulista de Pneumologia e Tisiologia. Com um
formato diferente das edições anteriores, será direcionado para
pesquisa do diagnóstico e conduta dos principais temas da
medicina respiratória, devendo se tornar referência na área.
Em 2009 manteremos cada edição da revista Pneumologia
Paulista sobre um grande tema da área respiratória e em
homenagem ao Dia Mundial de Combate à Tuberculose,
comemorado em 24 de março, nessa primeira edição estamos
focando a Tuberculose e outras Micobacterioses. Temas que,
apesar da grande evolução no conhecimento, continuam
sendo um grande desafio na nossa prática diária.
Participe de nossas atividades, divulgue nossos eventos,
nossa revista e nossa especialidade. A SPPT é nossa e depende
de você.
Boa leitura e até breve,
José Eduardo Delfini Cançado
Presidente da SPPT
[email protected]
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
EDITORIAL
Aspectos atuais e perspectivas futuras
da Tuberculose
Todos os anos são registrados mais de 8 milhões de novos
casos de tuberculose (TB) em todo o mundo e 2,7 milhões de
óbitos, 98% nos países em desenvolvimento. A Organização
Mundial de Saúde classifica os países com alta carga de TB
pelo número absoluto de novos casos da doença. No Brasil,
são notificados aproximadamente 85.000 casos/ano,
colocando o país no 15º lugar entre os 22 países responsáveis
por 80% do total de casos de TB no mundo.
O paradoxo entre os avanços no diagnóstico e no tratamento
da TB e as altas taxas de incidência e mortalidade nos países
em desenvolvimento recai sobre a questão da vulnerabilidade.
A vulnerabilidade é o conjunto de fatores de natureza biológica,
epidemiológica, social, cultural e política, cuja interação amplia
ou reduz o risco ou a proteção de um grupo populacional,
frente a uma determinada doença, condição ou dano.
No Brasil, a TB acomete principalmente homens em idade
produtiva e, apesar do tratamento predominantemente
ambulatorial, é a 9a causa de hospitalização e a 4a causa de
mortalidade por doenças infecciosas com aproximadamente 5
mil mortes por ano. O Estado de São Paulo notifica cerca de
18.000 casos/ano, representando, em números absolutos, o
maior contingente de casos do Brasil. O coeficiente de
incidência no Estado, embora significativo, tem declinado e
situa-se em torno de 37/100.000.
Contextualizando esses paradoxos, essa edição da Revista
Pneumologia Paulista aborda os aspectos atuais e perspectivas
futuras do diagnóstico e do tratamento das micobacterioses,
os recentes surtos e a história da fase sanatorial da TB no
Estado de São Paulo.
Em relação ao diagnóstico, novos métodos de biologia
molecular têm sido desenvolvidos com a finalidade de reduzir
o tempo de diagnóstico das micobacterioses. Destaca-se a
importância dos marcadores de atividade na TB pleural e da
broncoscopia na TB endobrônquica e nos casos pulmonares
com baciloscopia negativa. Na tomografia computadorizada
de tórax, os sinais sugestivos de atividade de TB constituem
importante subsídio diagnóstico, especialmente no diferencial
com outras doenças pulmonares. Em crianças, é abordado o
diagnóstico diferencial da TB com outras doenças
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
respiratórias, de fundamental importância em nosso país.
Assim como em todo o mundo, no Brasil a resistência
medicamentosa é considerada um grande desafio no controle
da doença. Além da TB multirresistente (TBMR), ou seja,
resistência à rifampicina, isoniazida e a mais dos medicamentos
dos esquemas preconizados, recentemente foi definida a
TBXDR, “extensively drug-resistance tuberculosis”, em
pacientes com resistência a rifampicina, isoniazida, uma
quinolona e pelo menos uma droga de segunda linha injetável.
A abordagem cirúrgica nessas situações impõe-se como uma
perspectiva terapêutica atual. O impacto funcional das
seqüelas de TB também é abordado nessa edição assim como
a criteriosa avaliação dos pacientes candidatos ao uso de
drogas anti-TNFα.
As micobactérias não tuberculosas apresentam
patogenicidade variável, podendo desencadear colonização,
infecção ou doença. A doença pulmonar geralmente ocorre
em pacientes com doença pré-existente e a avaliação clínica é
dificultada pela similaridade da sintomatologia das
micobacterioses com essas outras doenças. Métodos de
identificação das micobactérias e de imagem tornam possível
a confirmação de doença nesses pacientes.
Jaques Chretien descreve que no curso de milhares de anos
a TB encerrou uma mensagem ainda não totalmente decifrada.
Pela sua influência cultural, seus efeitos sobre a obra humana,
suas implicações históricas, sociais, econômicas e políticas,
constitui modelo científico peculiar. Modernamente continua
causando as maiores devastações, cujo valor epistemológico é
imenso. Misteriosa e ameaçadora permanece o paradigma dos
temores das paixões e do conhecimento humano. Assim, compete
também a nós, pneumologistas, decifrar essa mensagem na
história contemporânea quando a grande maioria dos casos
de TB é pulmonar e pleural, nosso espaço, “nossa praia”.
Sidney Bombarda
Comissão de Tuberculose da SPPT
Médico da Divisão de Tuberculose da SES-SP/
HCFMUSP
[email protected]
5
TEMAS EM DESTAQUE
Estado atual da cirurgia
da Tuberculose
Autores:
Ricardo Mingarini Terra1; Israel Lopes de Medeiros2
Serviço:
Serviço de Cirurgia Torácica do Hospital das Clínicas da FMUSP
1
Médico Assistente, Doutor em Cirurgia Torácica e Cardiovascular pela FMUSP
Pós-Graduando da Disciplina de Cirurgia Torácica da FMUSP
2
INTRODUÇÃO
A tuberculose (TB) pulmonar já foi considerada a principal
causa de morte na sociedade ocidental. Durante a Revolução
Industrial ocorrida em Londres no século XIX, mais de 25%
dos óbitos eram atribuídos a TB. Nessa época, o tratamento
cirúrgico era a principal modalidade terapêutica. O
pneumotórax induzido e a toracoplastia eram as principais
técnicas empregadas no final do século XIX, e as técnicas de
ressecção pulmonar na primeira metade do século XX. Com o
advento da quimioterapia específica para TB nas décadas de
1950 e 60, a cirurgia foi abandonada como terapia de primeira
linha. O sucesso dos antibióticos foi tanto que, na década de
70, autoridades de saúde pública especulavam que a TB seria
erradicada do hemisfério norte. No entanto, 20 anos depois, a
epidemia de HIV/SIDA - Síndrome da Imunodeficiência
Adquirida - e o surgimento da tuberculose multirresistente
(TBMR) mostraram que essas especulações não se
concretizariam, e a cirurgia voltou a ter um papel maior na
terapia da TB. Atualmente, podemos resumir as indicações de
cirurgia na TB em 3 grupos: tratamento da TBMR; tratamento
das sequelas de TB e suas complicações; procedimentos
diagnósticos para confirmar TB e excluir outras afecções.
TUBERCULOSE MULTIRRESISTENTE
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS),
cerca de 20% dos casos de tuberculose estão associados a
microorganismos resistentes a algum dos agentes
antimicrobianos utilizados para seu tratamento. A TBMR,
que por definição está associada à resistência a isoniazida e
rifampicina, ocorre em 5,3% dos casos. Em alguns locais como
China, Índia, Rússia, países do Oriente Médio, Leste Europeu
e Ásia Central, a incidência de TBMR é particularmente alta,
ocorrendo em mais de 6,5% dos casos novos
diagnosticados.1,2 De acordo com o Consenso Brasileiro de
Tuberculose, o conceito de TBMR em nosso país é o de
resistência in vitro a pelo menos rifampicina, isoniazida e a
uma terceira droga dos Esquemas I, IR ou III, ou ainda
resistência a rifampicina, isoniazida e falência operacional do
6
Esquema III. 3 O grande contingente de pacientes
multirresistentes no país é de doentes que abandonaram o
tratamento anteriormente e que desenvolveram resistência
aos medicamentos.3 No Brasil, a multirresistência ocorre em
0,9% dos casos novos de tuberculose e em 5,4% dos casos
previamente tratados, correspondendo a cerca de 2% total de
pacientes 4 e, de acordo com a vigilância epidemiológica, 2600
novos casos foram notificados entre 2000 e 2006.5
O tratamento da TBMR é particularmente desafiador e a
taxa de sucesso do tratamento com drogas de segunda linha
varia entre 48 e 80%, enquanto que a taxa de sucesso para
pacientes com infecções por cepas sensíveis supera 90%.6 A
baixa efetividade das drogas associada à presença de
cavidades e/ou áreas de destruição pulmonar, que albergam
os bacilos e dificultam o acesso da medicação, justificam a
baixa eficácia do tratamento quimioterápico6. Neste contexto
insere-se a ressecção pulmonar adjuvante ao tratamento
medicamentoso como opção terapêutica para a TBMR e esta
tem sido a principal indicação de ressecção pulmonar
associada a TB nos EUA.
A literatura sobre este tema é baseada em séries de casos;
infelizmente, não foram publicados ensaios clínicos que nos
ofereçam evidências mais vigorosas sobre o papel da cirurgia
na TBMR. De qualquer maneira, os resultados dos estudos
nos quais a ressecção pulmonar foi associada à terapêutica
medicamentosa são animadores, com taxas de sucesso
variando entre 63 e 98%, definindo-se como curados os
pacientes que permaneceram com escarro negativo durante o
seguimento (Tabela 1). A grande preocupação relativa ao
tratamento cirúrgico seria o risco imposto ao paciente, visto
que procedimentos em pacientes com TB ativa estariam
associados a alta taxa de complicações. Como descrito na
Tabela 1, a mortalidade pós-operatória variou nos diversos
estudos entre 0 e 5% e a morbidade entre 11 e 34%. A principal
complicação pós-operatória observada foi a fístula de coto
brônquico e a maioria dos autores sugere estratégias para
reforço do coto como cobertura com retalho de pleura, gordura
pericárdica, músculo intercostal e outros. Empiema e hemotórax
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Tabela 1: Resultados do tratamento cirúrgico da tuberculose multirresistente
AUTOR
VAN LEUVEN7
ANO
1997
PACIENTES
62
MORTALIDADE
1,6%
MORBIDADE
23%
TAXA DE CURA
80%
SUNG8
POMERANTZ9
1999
2001
27
172
0%
3,3%
25,9%
12%
96,3%
98%
SHIRAISHI10
NAIDOO11
2004
2005
87
23
0%
0%
11,5%
17,4%
93%
95,6%
DEWAN12
KIR13
2006
2006
74
79
4,1%
2,5%
32%
25%
89,8%
94,5%
MOHSEN14
SOMOCURCIO15
2007
2007
23
121
4,3%
5%
34,7%
22,6%
96%
63%
Adaptado de Pezzella AT et al.6.
pós-operatório são outras complicações frequentemente
descritas.
A seleção adequada de pacientes para o tratamento
cirúrgico é fundamental e os principais critérios para inclusão
de pacientes estão discriminados na Tabela 2.16 Ainda que os
critérios de seleção sejam um pouco variáveis entre os
estudos, alguns pontos são consensuais: o paciente deve
ser submetido a avaliação pré-operatória completa e possuir
condição clínica que permita a ressecção completa de todas
as lesões visualizadas à tomografia de tórax (ainda que sejam
bilaterais); tratamento medicamentoso por pelo menos três
meses deve anteceder a cirurgia (Figura 1). Alguns estudos
sugerem fatores de risco associados à falha e complicações
do procedimento que, portanto, devem ser considerados em
sua indicação: presença de cavidade além da área a ser
ressecada, resistência à ofloxacina, índice de massa corpórea
inferior a 18,5 kg/m2, TB endobrônquica e a não utilização de
estratégias para reforço do coto brônquico.17, 18
Tabela 2: Indicação para o tratamento cirúrgico da TBMR
Escarro positivo apesar de terapia medicamentosa
adequada (acredita-se que a fibrose em volta da
cavidade possa abrigar microorganismos resistentes)
Doença localizada (geralmente cavitária) com alta
probabilidade de recidiva
Resistência a mais de 3 drogas
Múltiplas recidivas
Adaptado de Naidoo R 16
Ainda que após a cirurgia o escarro tenha ficado negativo,
sugere-se que a medicação seja mantida por 24 meses para
aumentar a chance de cura. Os bons resultados da terapêutica
combinada e a melhora das taxas de mortalidade e
complicações devido a critérios de seleção mais rígidos devem
aumentar o encaminhamento de pacientes para a ressecção
cirúrgica.6
SEQUELAS PULMONARES DA TUBERCULOSE
As sequelas da TB pulmonar ocorrem em pacientes com
história prévia de TB, como resultado do processo de
cicatrização e distorção da arquitetura normal do pulmão. Estão
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Fig. 1: Paciente portador de TBMR. Após 24 meses de tratamento
medicamentoso, o escarro tornou-se negativo, porém persistiram
cavidades em todo o pulmão esquerdo. Evoluiu com hemoptise
intermitente e foi submetido à pneumonectomia esquerda, evoluindo
sem complicações pós-operatórias. Não havia bacilos na peça.
(A)Cavidade em lobo superior esquerdo com aspergiloma;
(B)e(C)Cavidades em lobos superior e inferior esquerdos;
(D)Cintilografia (pré-op) mostrando mínima perfusão em pulmão
esquerdo.
incluídos nesse grupo casos de bronquiectasias e cavidades
pulmonares.
BRONQUIECTASIAS
A TB pulmonar pode levar à formação de bronquiectasias
em até 11% dos casos.6 Gomes Neto e cols. identificaram TB
como a causa de 31,3% dos casos de bronquiectasia em sua
série de 67 pacientes19; Bogossian e cols. mostraram que 42,7%
dos seus 314 casos de bronquiectasia eram sequela de TB.20
O tratamento clínico das bronquiectasias consiste
principalmente da fisioterapia respiratória, sendo que muitas
vezes se faz necessário o uso freqüente e prolongado de
antibióticos.
Apesar dos modernos antibióticos, a baixa aderência ao
tratamento e o surgimento de cepas mais resistentes, fazem
com que o manejo clínico das bronquiectasias esteja associado
7
a uma mortalidade de 19 a 31%. A ressecção total da doença
em sua forma localizada pode levar à cura em mais de 90% dos
casos, com uma mortalidade cirúrgica de 0 a 8%, e uma taxa de
complicações pós-operatórias de 9,4 a 24,6% 21; portanto, a
cirurgia estaria indicada para pacientes que, apesar do
tratamento clínico adequado, persistissem com tosse produtiva
crônica, pneumonia recidivante e hemoptise volumosa ou
recorrente, desde que a função pulmonar fosse compatível
com a ressecção proposta.
Vários autores mostraram que a ressecção completa, isto é,
a ressecção anatômica de todos os segmentos afetados é um
importante fator prognóstico do sucesso do tratamento
cirúrgico. Fujimoto e cols. estudaram retrospectivamente 92
ressecções pulmonares realizadas em 90 pacientes para
tratamento de bronquiectasias.22 A ressecção foi considerada
completa em 75 pacientes (81,5%). Houve desaparecimento
ou redução dos sintomas em 83,6% dos casos e persistência
dos mesmos em 16,4%. A análise multivariada de fatores
prognósticos identificou o tipo de ressecção (completa/
incompleta) como um determinante do sucesso do tratamento
cirúrgico (OR =0,044; CI 95%=0,006-0,300; p = 0,003). Esse
fato, aliado aos avanços nas técnicas cirúrgicas, bem como a
melhores cuidados perioperatórios, tem levado muitos
cirurgiões a realizarem ressecções completas mesmo em
pacientes com doença bilateral (Figura 2). Balkanli e cols., em
série com 205 pacientes operados por bronquiectasias, bem
como Prieto e cols., com 119 pacientes operados, fizeram
toracotomia bilateral em 2 tempos, em 14 e 2 casos
respectivamente, de forma a obter ressecção completa mesmo
nos casos com doença bilateral. Não houve mortalidade e a
cirurgia foi satisfatória em mais de 90% dos pacientes.21,23
Particularmente complexo é o tratamento de pacientes com
doença multissegmentar, sintomáticos apesar de tratamento
clínico adequado, nos quais a ressecção completa não é viável.
Nestes sugere-se a ressecção das áreas mais comprometidas,
pois apesar da taxa de cura com a ressecção incompleta ser
mais baixa, a qualidade de vida dos pacientes tratados
cirurgicamente é maior do que a daqueles tratados
clinicamente.24,25 Mazières e cols. estudaram 16 pacientes
operados com bronquiectasia multissegmentar bilateral.26
Foram realizadas 22 ressecções, sendo que 11 pacientes foram
submetidos a uma toracotomia, 4 submetidos à toracotomia
bilateral em dois tempos, e 1 paciente foi submetido à ressecção
em 3 tempos. O número médio de segmentos ressecados por
paciente foi 5,2, sendo que em todos os casos a ressecção foi
incompleta, ou seja, o número de segmentos retirados foi
inferior ao número de segmentos considerados doentes na
avaliação pré-operatória. Houve desaparecimento ou
regressão dos sintomas em 75% dos casos. A mortalidade foi
nula e a morbidade foi de 18%. Logo, percebe-se que mesmo
pacientes com bronquiectasia não localizada podem se
beneficiar do tratamento cirúrgico. A avaliação pré-operatória
é fundamental para selecionar as áreas que serão ressecadas.
Ashour e cols. sugerem que tomografia computadorizada de
alta resolução e a cintilografia de perfusão devem ser realizadas
8
Fig. 2: Paciente com cavidades bilaterais apicais e aspergiloma
apresentando hemoptise recorrente. Foi submetido à toracotomia
bilateral em dois tempos: inicialmente lobectomia superior direita
e, na sequência, lobectomia superior esquerda. (A)Radiografia de
tórax mostrando cavidades bilaterais; (B)Tomografia
computadorizada de tórax mostrando bola fúngica bilateral;
(C)Cavidade em lobo superior esquerdo após lobectomia superior
direita (paciente persistia com hemoptise); (D)Radiografia de tórax
após lobectomia superior esquerda (boa evolução pós-operatória,
sem hemoptise durante o seguimento).
nesses pacientes, devendo ser ressecados somente os
segmentos (ou lobos) com bronquiectasias císticas e nãoperfundidas.27
DOENÇACAVITÁRIA
A persistência da lesão cavitária após o tratamento clínico
da TB pode resultar em complicações graves. O aspergiloma,
ou bola fúngica, resulta da colonização saprofítica de
cavidades pulmonares por fungos da espécie Aspergillus
fumigatus.
A principal manifestação clínica do aspergiloma é a
hemoptise, cuja incidência varia de 50 a 83% dos casos, sendo
severa ou recorrente em 10%.28 O tratamento do aspergiloma
tem por objetivos controlar e prevenir a hemoptise, além de
evitar complicações sépticas decorrentes de aspergilose
invasiva. Em um estudo da década de 80, comparando os
tratamentos clínico e cirúrgico do aspergiloma, a sobrevida
em 5 anos foi semelhante – 65% naqueles tratados clinicamente
e 75% nos tratados cirurgicamente – em um grupo de pacientes
sem hemoptise. Entretanto, no grupo com hemoptise
recorrente ou severa, a sobrevida em 5 anos foi de 41%
naqueles com tratamento clínico e 84% nos pacientes
operados.29 Desde então, indica-se a cirurgia para todos os
pacientes sintomáticos, excetuando-se aqueles com alto risco
cirúrgico.
A controvérsia está na indicação de cirurgia para os
pacientes assintomáticos, uma vez que a história natural do
aspergiloma não está bem documentada. O temor em relação
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
às taxas de mortalidade e morbidade associadas ao tratamento
cirúrgico do aspergiloma, chegando a 22% e 78%
respectivamente em algumas séries publicadas, fez com que
muitos especialistas deixassem de indicar a cirurgia para os
pacientes sem hemoptise. Contudo, nos últimos anos,
observamos na literatura médica uma tendência a indicar a
cirurgia mesmo para os pacientes assintomáticos. Tal
tendência foi impulsionada pelos avanços técnicos na cirurgia
e anestesia, além de melhores cuidados perioperatórios
(antibioticoterapia, fisioterapia, analgesia), que resultaram em
redução significativa da morbidade e mortalidade cirúrgicas.
Em 2000, Babatasi e cols. publicaram uma série com 84
pacientes operados por aspergiloma, sendo 18%
assintomáticos. A mortalidade perioperatória foi 4% e
complicações foram observadas em 69% dos casos. A
sobrevida em 5 anos foi 84%.30 Na série de Brik e cols. de
2008, 42 pacientes foram operados, sendo 12% deles
assintomáticos. A mortalidade foi 3,3%, a morbidade 28,5%, e
a sobrevida em 5 anos foi superior a 80%.28 Contudo, essa
conduta e seus resultados devem ser melhor avaliados através
de estudos prospectivos, controlados e randomizados,
comparando pacientes assintomáticos submetidos a cirurgia
e tratados conservadoramente, a fim de avaliar mortalidade,
complicações e evolução em cada conduta.
Assim, a ressecção pulmonar é o tratamento padrão para o
aspergiloma, pois possibilita o melhor controle dos sintomas
a longo prazo, com mortalidade e morbidade relativamente
baixas. Para pacientes com função pulmonar desfavorável e
doença pulmonar extensa, a cavernostomia é uma alternativa
à ressecção pulmonar. Gebitekin e cols. relataram 7 pacientes
com aspergiloma e hemoptise recorrente, os quais, por
apresentarem função pulmonar comprometida (VEF1<40%) ou
doença bilateral, foram submetidos à cavernostomia com
mioplastia em um único tempo. A mortalidade foi nula. Após
um seguimento médio de 57,2 meses, 6 pacientes estavam
vivos e sem hemoptise.31 Procedimentos menos invasivos
como a cavernoscopia, descrita por Iuchi e cols. e Sagawa e
cols., a drenagem percutânea com instilação de anfotericina
B e a embolização de artérias brônquicas são considerados
paliativos porque estão associados a altos índices de recidiva
de hemoptise.32,33
TUBERCULOSE ENDOBRÔNQUICA
A incidência de doença endobrônquica varia de 10 a 38%
dos casos de TB pulmonar. 6 A sua patogênese não está
completamente estabelecida, mas é provável que a tuberculose
endobrônquica (TBEB) aconteça pela implantação direta de
bacilos a partir de um foco no parênquima pulmonar ou
linfonodo mediastinal adjacentes, disseminação hematogênica
ou via linfáticos peribrônquicos. Ocorre inicialmente inflamação
da mucosa, hiperplasia, ulceração e necrose. Na sequência pode
haver formação de tecido de granulação, levando à fibrose e
estenose cicatricial. Uma estenose envolvendo mais de
50% da luz do brônquio pode provocar atelectasia distal,
infecções recorrentes e destruição do parênquima.
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Fig. 3: Paciente com tuberculose pulmonar tratada por 6 meses,
no seguimento dispnéia. Foi diagnosticada estenose de brônquio
principal esquerdo (BPE) e atelectasia total do pulmão ipsilateral.
Foi submetida a broncoscopia e dilatação com balão com bom
resultado. (A)Tomografia de tórax mostrando estenose em BPE;
(B)Reconstrução digital da árvore traqueobrônquica;
(C)Radiografia de tórax mostrando atelectasia de pulmão esquerdo;
(D)Radiografia de tórax após a dilatação, mostrando a reexpansão
pulmonar.
O tratamento da TBEB é clínico, semelhante ao da TB
pulmonar. Entretanto, a quimioterapia não consegue impedir
a progressão para estenose em boa parte dos casos, mesmo
com o uso adjuvante de corticóides. Um e cols. estudaram
retrospectivamente 67 pacientes com TBEB; após o tratamento
(6 meses), havia estenose residual em 41,8% dos casos. A
análise multivariada identificou a idade acima de 45 anos, o
subtipo fibroestenótico e o intervalo entre o aparecimento de
sintomas e o início da terapia superior a 90 dias como preditores
independentes de persistência de estenose brônquica. 34
Chung e cols. também mostraram que o aspecto endoscópico
da TBEB tem valor preditor após a terapia.35
A cirurgia está indicada para pacientes com estenose
traqueobrônquica residual, após o tratamento quimioterápico
da TB ativa. Consiste em ressecção da estenose
(broncoplastia), desde que a lesão seja proximal e o
parênquima distal seja viável, ou ressecção pulmonar nos
casos em há destruição do parênquima. Kato e cols. realizaram
broncoplastias em 36 pacientes com estenose pós-TBEB36,
com mortalidade de 2,8%; estenose da anastomose ocorreu
em 7 pacientes (19,4%).
A broncoscopia intervencionista é uma alternativa à
operação para pacientes com alto risco cirúrgico e para aqueles
com estenoses irressecáveis. Através de broncoscopia é
possível realizar dilatação com balão, laser, crioterapia, etc
(Figura 3). Estes procedimentos costumam produzir alívio
inicial dos sintomas em quase todos os pacientes, mas
precisam ser repetidos várias vezes devido às freqüentes
recidivas.37 Ryu e cols. analisaram retrospectivamente 80
pacientes com estenose traqueobrônquica pós-TBEB tratados
9
com broncoscopia. Após dilatação endoscópica, 75 pacientes
(94%) precisaram de próteses de silicone (Dumon) para manter
a patência da via aérea. Houve imediato alívio dos sintomas e
melhora da função pulmonar em 88% dos casos. As próteses
puderam ser removidas em 49 pacientes (65%) após um período
médio de 14 meses. As complicações com as próteses
(migração, granuloma, re-estenose) foram comuns. Todas
foram tratadas com broncoscopia e troca da prótese.38
CONCLUSÃO
Apesar da grande desaceleração sofrida após o
desenvolvimento de tratamentos medicamentosos eficazes,
novas fronteiras foram abertas no campo da cirurgia para
tuberculose. Em especial pelo aumento de casos da TBMR,
observaremos um recrudescimento das ressecções pulmonares
na TB ativa. O avanço das técnicas operatórias associado a um
melhor cuidado perioperatório impulsionou a cirurgia tanto para
a TBMR como para as sequelas pulmonares, em especial as
bronquiectasias multissegmentares e o aspergiloma. Finalmente,
o desenvolvimento da tecnologia endoscópica trouxe novas
armas para o tratamento da TB endobrônquica.
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Ricardo Mingarini Terra
[email protected]
CALENDÁRIO DE ATIVIDADES
DAS REGIONAIS
REGIONAL – CAMPINAS
Serviço de Pneumologia e Cirurgia Torácica do
Hospital de Clínicas da UNICAMP
• 4as feiras: 8h30 às 10h
Reunião das disciplinas de Pneumologia e Cirurgia
torácica para discussão de casos clínicos e
cirúrgicos, com a presença de radiologistas,
pneumologistas, cirurgiões torácicos,
radioterapeutas, residentes e alunos.
Local: anfiteatro de Radiologia, terceiro andar,
Hospital de Clínicas da Unicamp - Cidade
Universitária Zeferino Vaz, s/n, Barão Geraldo,
Campinas.
• 5as feiras (exceto a última do mês):
8h30 às 9h30
Reunião anátomo-clínica-radiográfica para
discussão de casos com comprovação histopatológica, com a presença de patologistas,
pneumologistas, cirurgiões torácicos,
radiologista, residentes e alunos.
Local: Anfiteatro de Anatomia Patológica,
segundo andar, Hospital de Clínicas da Unicamp.
Departamento de Pneumologia e Cirurgia Torácica
da Sociedade de Medicina e Cirurgia de Campinas
• Ultima 4a feira do mês, das 20h às 22h
(discussão de casos clínicos ou palestras sobre
temas diversos)
Local: Anfiteatro da Sociedade de Medicina e
Cirurgia de Campinas. Rua Delfino Cintra, 63,
Centro.
Telefone: (19) 3231 2811
REGIONAL - RIBEIRÃO PRETO
Reuniões - última quinta-feira do mês, às 20h
Discussão de Casos Clínicos com a participação
do HCFFMRP-USP, Hospital São Francisco e Santa
Casa.
Local: Chopp Time Street, Av. independência,
2579, 2° andar
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
11
Repercussões estruturais e funcionais das sequelas
de Tuberculose tóraco-pulmonar em pacientes
imunocompetentes
AUTORES:
Thulio Marquez Cunha1; J. Alberto Neder2
SERVIÇO:
Departamento de Medicina da UNIFESP
Médico pneumologista. Pós-graduando da Disciplina de Pneumologia do Depto. de Medicina da
UNIFESP-EPM
Professor Titular Livre-Docente da Disciplina de Pneumologia do Depto. de Medicina da UNIFESP-EPM
Coordenador do SEFICE (Setor de Função Pulmonar e Fisiologia Clínica do Exercício)
1. INTRODUÇÃO
A tuberculose (TB) representa a oitava causa de morte
(Tabela 1) e a nona causa de incapacidade (“DALYS” incapacidade ajustada por anos de vida) (Tabela 2) nos países
pobres e emergentes. Representa a sétima causa de morte
prematura no mundo (Figura 1).1 Atualmente, cerca de 1,86
bilhões de pessoas apresentam infecção latente por
Micobacterium tuberculosis. 2 Destes, 10% dos
imunocompetentes e 50% dos imunocomprometidos irão
desenvolver TB em algum momento da vida.3 Observa-se
que cerca de 80% dos casos concentram-se em 22 países
(Figura 2)4 e o Brasil, com incidência de 50 casos/100.000
habitantes e mortalidade de 4/100.000 casos/ano, está em
15º lugar neste ranking.5 Os principais fatores de risco para
a TB são: pobreza, desnutrição, infecção pelo HIV, tabagismo,
desigualdade social em países pobres e emergentes, diabetes
mellitus, e poluição. 4 Secundariamente, contribuem
exposição a sílica e silicose.6,7
Tabela 1: As dez causas mais prevalentes de morte nos países
pobres e emergentes1
Causa
Mortes
% total
(milhões) de mortes
1.Infarto agudo do miocárdio
5,70
11,8
2.Doença cerebrovascular
4,61
9,5
3.Pneumonia
3,41
7,0
4.SIDA
2,55
5,3
5.Causas Perinatais
2,49
5,1
6.DPOC
2,38
4,9
7.Diarréia
1,78
3,7
8.Tuberculose
1,59
3,3
9.Malária
1,21
2,5
10.Acidentes automobilísticos
1,07
2,2
12
Tabela 2: As dez causas mais prevalentes de anos vividos com
incapacidade (DALYS) nos países pobres e emergentes1
DALYS
% total de
(milhões de anos) DALYS
89,07
6,4
83,61
6,0
Causa
1.Causas Perinatais
2.Pneumonia
3.Infarto agudo do miocárdio
4.SIDA
5.Doença cerebrovascular
6.Diarréia
7.Depressão
8.Malária
9.Tuberculose
10.DPOC
71,88
70,80
62,67
58,70
43,43
39,96
35,87
33,45
5,2
5,1
4,5
4,2
3,1
2,9
2,6
2,4
A TB foi considerada uma emergência global em 1993 pela
Organização Mundial de Saúde. 8 Como é de amplo
conhecimento, após a cura microbiológica podem persistir
lesões sequelares tóraco-pulmonares que conferem morbidade
de diferentes graus a esses paciente. O impacto funcional e
econômico destas lesões sequelares é significativo,
acometendo principalmente adultos em idade produtiva.4
Fig. 1: As dez principais causas globais de morte prematura (YLL
- anos de vida perdidos) e mortes, 20011
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Fig. 2: Prevalência estimada de tuberculose em 20065
2. ALTERAÇÕES ESTRUTURAIS SEQUELARES
As sequelas pulmonares da TB são alterações estruturais
pouco reversíveis ou irreversíveis. Elas incluem: fibrose
parenquimatosa; distorção arquitetural (broncovascular e
parenquimatosa) com perda volumétrica; bronquiectasias;
acometimento pleural; enfisema; estenose brônquica e lesões
cavitárias residuais. 9-26 São decorrentes de respostas
inapropriadas à lesão pulmonar desencadeada pelo M.
tuberculosis.27
Os fatores de risco já identificados para o desenvolvimento
das sequelas são: má aderência ao tratamento20; extensão de
lesões iniciais 19,21; volume de expectoração durante o
tratamento19; número de episódios de TB22; e tempo de
doença prolongado, isto é, do diagnóstico à cura
microbiológica.11, 21
3. MECANISMOS CELULARES DA DOENÇA E SUAS
SEQUELAS
Na resposta adequada ao M. tuberculosis, há formação
de granuloma organizado, seguido por seu desligamento,
dissolução da matrix extracelular e retorno da arquitetura
pulmonar normal.
Ao ser inalado, o bacilo é fagocitado pelos macrófagos
alveolares, o que, somado a chegada ao local de linfócitos
ãä, linfócitos natural killers (NK) e outros granulócitos,
aumenta a concentração local de interferon (IFN) ã e fator
de necrose tumoral (TNF)α. Desencadeia-se, então, uma
cascata de citocinas que atraem mais macrófagos e
linfócitos T, o que leva a exsudação plasmática e formação
de coágulos de fibrina. Os macrófagos agregam-se
formando o granuloma, e sua ativação (via imunidade
celular - Th1), leva à apoptose e consequente destruição
do bacilo fagocitado. (necrose caseosa). Este processo
ocorre em cerca de 2-3 semanas, predominando no centro
do granuloma, gerando um ambiente pobre em oxigênio e
lesivo ao M. tuberculosis. Macrófagos, fibroblastos,
células endoteliais e neutrófilos produzem proteases que
ajudam na formação do granuloma, removem a matrix
extracelular e debris celulares, e metabolizam citocinas e
hormônios. São regulados em vários níveis: transcrição;
formação de pró-enzimas; controle de sinalização;
inibidores de metaloproteinases (TIMPs) (Figura 3).
O TNF-α é crucial para defesa do hospedeiro. Contribui
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Fig. 3: Mecanismos celulares de doença. Após fagocitose, o M.
tuberculosis desencadeia uma séries de reações via Th1 que leva
à destruição do bacilo. Vários fatores ligados ao bacilo e ao
hospedeiro desencadeiam uma resposta Th2. Tal resposta
desregula e amplifica a ação Th1, possibilitando a progressão da
doença com disseminação e transmissão. Adicionalmente, há o
desenvolvimento de fibrose parenquimatosa, que é a responsável
pelas alterações sequelares .
para integridade estrutural do granuloma pela formação da
cápsula fibrosa que o envolve. É responsável ainda pela
formação da necrose caseosa, ativação macrofágica e
mecanismos efetores CD3+, que levam à esterilização da
micobactéria.
Em alguns pacientes a doença progride e há
desenvolvimento de necrose por liquefação. Ao contrário
do que ocorre quando ocorre apoptose, este tipo de necrose
não leva à destruição do bacilo. Isto ocorre por vários
fatores:
• Proteólise desregulada: maior atividade que leva a
proteólise do parênquima;
• Toxicidade direta do M. tuberculosis: proteínas e toxinas
(ex.: ESAT-6) levam a lise de células epiteliais pulmonares;
• Reações de hipersensibilidade: re-exposição a antígenos
do M. tuberculosis (lipoarabinomannan) levando a necrose
(fenômeno de Koch e reação de Shwartzman);
• Citocinas e células efetoras do hospedeiro: Resposta
Th2, mediadas por IL-4, desencadeada por componentes do
M. tuberculosis, levam a lesões teciduais (proteólise) por
ação descontrolada do TNF-α (aumento de
metaloproteinases e uroquinase).
Forma-se então, um meio ideal para multiplicação
extracelular do M. tuberculosis e tóxico para os macrófagos.
As enzimas proteolíticas comprometem a integridade da
cápsula do granuloma, liberando o caseum para o sangue e
vias aéreas, o que resulta em disseminação e transmissão da
doença (Figura 3).
A resposta Th2 (via IL-4 e IL-13) possui ainda ação prófibrosante, com aumento da produção de colágeno pelos
fibroblastos. Nos pacientes com sequelas pulmonares, além
da resposta inicial via Th1 (TNF-α) que leva a formação da
cápsula fibrosa do granuloma, ocorre uma resposta via Th2
que tenta “cercar” o bacilo, e acaba levando à destruição
importante do parênquima pulmonar. Não se sabe ao certo
se esta resposta Th2 é desencadeada por um (ns) antígeno
(s) específico (s) ou se existe ação adjuvante do próprio M.
tuberculosis. A identificação deste mecanismo será
importante para desenvolvimento de novos alvos
terapêuticos no tratamento da TB (Figura 3).27
13
4. ALTERAÇÕES RADIOLÓGICAS
As lesões sequelares mais comuns observadas na
radiografia de tórax predominam em lobos superiores e são
caracterizadas por: estrias, retração, elevação dos hilos,
cavidades, calcificações e hiperinsuflação do pulmão
contralateral (Figura 4).21, 22, 28, 29, 30
Fig. 4: Radiografia de tórax de paciente com seqüela de TB.
Observam-se opacidades não homogêneas no ápice direito com
redução volumétrica do lobo superior direito, desvio da traquéia
para o lado da lesão e presença de nódulos calcificados
Infelizmente, não existe ferramenta padronizada para
avaliação da extensão das lesões sequelares consequentes
da TB. O escore mais utilizado consiste na graduação das
lesões de 0 a 18 pontos. Divide-se cada pulmão em 3 zonas,
quantificando cada uma: 0 ponto – sem infiltrados; 1 ponto
– infiltrado ≤ 1/3 da zona; 2 pontos – infiltrado de > 1/3 a ≤ 2/
3 da zona; e 3 pontos – infiltrado > 2/3 da zona. As notas de
cada zona são somadas resultando no escore final.12
Em 1971, Snider et al. avaliaram as radiografias de 78
pacientes no início e fim do tratamento. As lesões,
caracterizadas como mínimas, moderadas e avançadas, foram
assim distribuídas na admissão e alta respectivamente: 5%/
25%, 55%/55% e 40%/20%. Lesões mais extensas foram
observadas nos idosos.12
Plit et al, utilizando o mesmo escore em paciente pós
tratamento hospitalar, observaram valor médio antes e após
de 9,1 e 4,8, evidenciando clara melhora com o tratamento.31
Em pacientes com TB multiresistente (TBMR), avaliados
com a mesma ferramenta, o escore médio pós tratamento foi
de 6,5. Todos os pacientes apresentavam alterações
radiológicas, com acometimento médio de 36% dos pulmões,
e 60% apresentavam cavitações. Houve correlação entre o
escore radiológico e o tempo decorrente entre o diagnóstico
de tuberculose e o fim do tratamento.21
Willcox et al propuseram outra ferramenta de avaliação.
Nesta, o pulmão foi dividido em 6 zonas, quantificando as
lesões em 3 graus: grau 1, com alteração em apenas 1 zona e
sem cavitações; grau 2, com alterações em 2-3 zonas ou
presença de cavidade em 1 zona; e grau 3, com alterações em
mais de 3 zonas com ou sem cavitações. 18% dos pacientes
14
apresentavam grau 1 de alterações, 37,7% grau 2 e 44,3%
grau 3. Houve relação entre o grau de lesão e a quantidade
de expectoração crônica.19 Um estudo brasileiro utilizou esta
ferramenta e encontrou 35,3% dos pacientes com grau 1,
35,3% com grau 2 e 29,4% grau 3.32
Em relação às lesões pleurais, o espessamento (EP) (>2mm)
é a sequela radiológica mais comum. É encontrada em 3740% após tratamento.33 Não foi demonstrada correlação entre
o grau de EP e o tipo de tratamento, o uso de corticóides ou
a realização de toracocenteses terapêuticas. A quantidade
de pacientes pós tratamento de TB pleural que apresentam
EP >10 mm varia de 6-20%, e neste grupo há correlação com
presença de lisozimas e TNF-α no líquido pleural.33
Estudos utilizando tomografia computadorizada para
avaliação de sequelas pulmonares de TB são raros. Não há
escore específico para graduar as lesões encontradas. As
principais alterações encontradas são: estrias fibróticas de
graus variados de extensão, distorção broncovascular,
enfisema (paracicatricial ou lobular), nódulos, perfusão em
mosaico, cavidades (principalmente de paredes finas) e
bronquiectasias (Figura 5).10, 30, 34, 35 O provável mecanismo
de enfisema nestes pacientes é a estenose brônquica ou
bronquiolar evidenciada pela distorção arquitetural no local
onde eram observados nódulos centrolobulares e
espessamento bronquiolar. A perfusão em mosaico é
explicada pelo aprisionamento aéreo decorrente da
bronquiolite constritiva cicatricial. Podem ser encontradas
cavidades com paredes finas, bronquiectasias de tração e
estrias em até 21%, 86% e 77% respectivamente.30
Fig. 5: Tomografia computadorizada de tórax de paciente com
sequela de TB pulmonar. Notam-se estrias fibróticas nos lobos
superiores com distorção do parênquima e áreas de enfisema
paracicatricial, além de lesões cavitárias com paredes espessas.
Observam-se, ainda, áreas com perfusão em mosaico.
5. ALTERAÇÕES FUNCIONAIS
5.1. Alterações ventilatórias:
Nos pacientes com sequela de TB, podem ser encontrados
todos os padrões funcionais (normal, obstrução, restrição e
misto), com alterações desde leves até graves. As distribuições
médias encontradas na literatura são:12, 19, 28, 31, 32, 36
- padrão restritivo: 17-36%;
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
- padrão obstrutivo: 15-48%;
- padrão misto: 13-34%; e
- espirometria normal: 8-47%.
Em pacientes com TBMR, os padrões encontrados foram
similares, mas com tendência a maior prevalência de
distúrbios obstrutivos e mistos, com apenas 6 % de provas
normais. 21 De fato, quando pacientes com sequelas
pulmonares são comparados com controles sadios, observase que 5,4 (2,98-9,68) vezes mais alterações nas provas de
função pulmonar.36 Estudo populacional realizado em 5
cidades da América Latina, mostrou prevalência TB de 2,5%
em pacientes acima de 40 anos, com relação positiva entre
este diagnóstico e obstrução ao fluxo aéreo (razão de chance
= 4,06), independente do tabagismo.37
Em relação aos volumes pulmonares estáticos, observouse aumento do VR (volume residual) (126%) e da razão VR/
CPT (capacidade pulmonar total) (39%). Não se observou
CPT aumentada neste grupo de pacientes. Quando o paciente
apresentava volume expiratório forçado no primeiro segundo
(VEF 1) normal e radiografia com alterações mínimas,
comumente observou-se aumento de VR/CPT. Por outro lado,
quando o VEF1 era normal e a radiografia mostrava alterações
avançadas, observou-se queda da CV (capacidade vital) e
CPT com RV/CPT normal, sugerindo que sequela de TB grave
se comporta do ponto de vista mecânico, como ressecção
“bacteriológica” do parênquima pulmonar.26
Num estudo particularmente interessante comparando
pacientes com sequela de TB e pacientes com DPOC (doença
pulmonar obstrutiva crônica), pareados por VEF1, foram
encontradas maior relação VEF1/CVF, maior resistência de
vias aéreas e menor CVF no primeiro grupo.22,28 A CI
(capacidade inspiratória), entretanto, foi semelhante.28
O comportamento das alterações funcionais ao longo do
tempo foi analisado em alguns estudos. Observou-se que,
quanto maior o número de episódios de TB mais acentuadas
são as perda funcionais38 (Figura 6). Estas são maiores nos 6
primeiros meses pós tratamento e se estabilizam após 13-18
meses. 38 Quando comparados pacientes antes e após
tratamento, observou-se melhora da função pulmonar em
54% dos casos, mostrando que o tratamento adequado é
fundamental para diminuir morbidade futura.31 Em pacientes
com obstrução ao fluxo aéreo por sequelas de TB, observouse redução na CV de 54,3 ml/ano, redução de 35,3 ml/ano no
VEF1 e aumento de 44,7 ml/ano do VR em pacientes
acompanhados por 15 anos. Já em pacientes que não
apresentavam obstrução foram encontrados: redução CV de
27,7 ml/ano, redução da VEF1 de28,8 ml/ano e aumento do
VR de 26,9 ml/ano. Observou-se ainda redução da CPT, CV e
VEF1 e aumento do VR significativamente maiores no grupo
de pacientes que apresentavam obstrução al fluxo aéreo.39
Hiperreatividade brônquica (HRB) também é mais
comumente encontrada em pacientes com sequela de TB,
quando comparados a controles (47,3% e 0%
respectivamente). Neste estudo os pacientes foram avaliados
em média 15 meses pós tratamento. Nenhum paciente
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
apresentava resposta a BD (broncodilatador).
Adicionalmente, não houve correlação entre HRB e grau de
lesão.40
Fig. 6: Distribuição do VEF 1 e porcentagem de controles e
pacientes com TB apresentando valores abaixo de 80% do
previsto.32 Notar a associação entre frequência de episódios de
TB e redução da função pulmonar, ou seja, maior prevalencia de
VEF1 abaixo de 80% do previsto.
5.2. Relação entre função pulmonar e aspectos clínicos:
Pacientes com sequela de TB que apresentam
broncoespasmo possuem maiores valores de resistência das
vias aéreas.22 A quantidade de expectoração correlacionouse negativamento com o VEF1.19 A presença de sintomas
(tosse, dispnéia e/ou broncoespasmo) não se correlacionou
com alterações de função pulmonar.32 Presença de sintomas
não é um bom parâmetro para avaliar o grau de sequelas,
visto que são mais observados quando o VEF1 < 50%. 36 A
15
idade se relacionou com o grau de obstrução 12, 22 e alteração da
função pulmonar em geral nos pacientes com sequela de TB.38
5.3. Relação entre função pulmonar e alterações
radiológicas:
Foram observadas relações entre o grau de alteração
radiológica e as seguintes variáveis: VEF1, CV, VEF1/CV e
FEF 25-75 (fluxo respiratório forçado entre 25-75% da
expiração).12, 19, 22, 26, 31, 32 A extensão inicial das lesões também
mostrou-se um bom preditor da função pulmonar pós
tratamento31, mesmo em pacientes com TBMR.21
à incapacidade de pessoas em idade ativa. Existem poucos
estudos que abordam esta população de pacientes, não sendo
conhecida sua verdadeira incidência ou prevalência. Tornase, portanto, premente o desenvolvimento de ferramentas
para classificação da disfunção e da incapacidade neste
grupo, tanto para caracterizar a morbidade respiratória
associada à TB quanto para avaliar objetivamente o impacto
de intervenções terapêuticas específicas. Parafraseando
Pasipanodya et al., “para muitos pacientes com tuberculose,
a cura microbiológica é apenas o começo de sua doença”.36
7. REFERÊNCIAS
5.4. Relação entre função pulmonar e provas de atividade
inflamatória:
Há correlação negativa do VEF1% com α1-PI (alfa 1 antiproteinase) e PCR (proteína C reativa). Sem correlação entre
VEF1% e VHS (velocidade de hemossedimentação) ou entre
score radiológico e VHS ou α1-PI. Ao longo do tratamento é
observada queda significativa nos níveis de VHS, PCR, α1PI e leucócitos totais.31
1.
2.
3.
4.
5.5. Efeitos na capacidade de exercício:
A distância percorrida no teste de caminhada de seis
minutos foi semelhante em pacientes com sequela de TB e
pacientes com DPOC quando pareado pelo VEF 1 .
Similarmente, não houver diferenças entre saturação periférica
de oxigênio inicial e final, frequência cardíaca inicial e final e
escala de Borg inicial e final. Observada diferença significativa
na frequência respiratória (FR) inicial 7,8,19,22 e final.3,9,21,27 Houve
correlação linear significativa entre a FR e a escala de Borg.28
Não há dados publicados sobre o comportamento destes
pacientes no teste cardiopulmonar de exercício.
5.6. Impacto funcional da sequela de TB pleural:
A maioria dos pacientes com sequelas pleurais apresenta
EP leve, com pouco ou nenhum comprometimento da função
pulmonar. Restrição é o padrão predominante, acometendo
cerca de 10 % dos casos; e entretanto, há fraca correlação
entre CVF e grau de EP.32, 33 É possível observar restrição
sem presença de EP. A sensibilidade e especificidade de EP
para existência de restrição são respectivamente 50 e 64%
quando se adota ponto de corte de 2 mm para EP. Quando se
considera ponto de corte 10 mm, os valores encontrados
são 25% e 96%.33
Um estudo observou que, durante o tratamento da TB
pleural, houve aumento significativo da CVF (60% para
97,6%) e da CPT (71,4% para 95,4%). Pacientes com sequela
funcional apresentam níveis pleurais reduzidos de DHL e
aumentados de colesterol, triglicérides e linfócitos. Não se
encontrou relação entre pH, proteínas, glicose e volume de
líquido pleural e o desenvolvimento de sequelas funcionais.33
6. CONCLUSÃO
Lesões sequelares à TB tóraco-pulmonar estão presentes
em proporção significativa dos pacientes tratados, levando
16
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
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J. Alberto Neder
[email protected]
REUNIÕES CLÍNICAS
NA CAPITAL
UNIFESP/EPM
3ªs feiras, das 8h30 às 10h
Pr. Octávio de Carvalho
Anf. Nylceu Marques de Castro
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Anfiteatro
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Centro de Estudos do Hospital Mário Covas
Rua Henrique Calderazzo, 321 - Paraíso - Santo André
CLEMENTE FERREIRA
4ªs feiras, das 8h30 às 11h30
Auditório
Rua da Consolação, 717
DEPARTAMENTO DE FISIOTERAPIA DA SPPT
“Tópicos Avançados em Fisioterapia Respiratória”
Data: Toda última terça-feira do mês
Horário: 20h
Local: R. Machado Bittencourt, 205 - Térreo
17
Surtos de infecções por micobactérias
de crescimento rápido
AUTORES:
Denise Brandão de Assis1; Geraldine Madalosso2
SERVIÇO:
Divisão de Infecção Hospitalar da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo
1
Médica infectologista, mestre em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da USP,
Diretora Técnica da Divisão de Infecção Hospitalar-Centro de Vigilância Epidemiológica “Prof
Alexandre Vranjac” – Coordenadoria de Controle de Doenças – Secretaria de Estado da Saúde de
São Paulo.
2
Médica infectologista, mestre em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da USP,
médica técnica da Divisão de Infecção Hospitalar-CVE/CCD/SES/SP
1. INTRODUÇÃO
As espécies de micobactérias de crescimento rápido
(MCR) associadas a doenças em humanos são aquelas que
pertecem aos grupos Mycobacterium fortuitum, M.
chelonae/abscessus e M. smegmatis.1
Mycobacterium massiliense e Mycobacterium bolletti,
foram reconhecidas como espécies separadas do grupo M.
chelonae/abscessus em 2006.2
A primeira descrição clínica e laboratorial de Mycobacterium
fortuitum foi realizada por Costa Cruz em 1936 em um caso de
abscesso pós injeção de vitaminas.3
Surtos e pseudosurtos de infecções por MCR relacionados
a procedimentos cirúrgicos 3, 4, 5, 6 vêm sendo descritos há mais
de 20 anos em todo o mundo e são reconhecidos como um
importante problema de saúde pública.
As MCR são encontradas no ambiente, especialmente na
água, e podem contaminar soluções, medicamentos e
equipamentos médicos.1
A contaminação pode ocorrer devido a falhas no
reprocessamento de artigos médicos, contaminação de
medicamentos e soluções assépticas.
Deve-se suspeitar de infecção por MCR nos casos de
infecção cirúrgica não responsiva a antibioticoterapia
usualmente utilizada para tratamento deste tipo de infecção
As infecções por MCR podem ser superficial, atingindo
pele e tecido celular subcutâneo, com sinais e sintomas locais
de inflamação como dor, aumento de temperatura,
vermelhidão, nódulos, podendo evoluir com drenagem de
secreção, fístula ou deiscência de sutura com sintomas
sistêmicos pouco freqüentes.
Nas infecções relacionadas a cirurgias endoscópicas
podem ocorrer infecções em planos mais profundos com
presença de um ou múltiplos abscessos no plano muscular
ou intracavitários.
No Brasil há descrições de surtos de infecções por MCR
associados a procedimentos cirúrgicos 3,7 desde 2004.
Entretanto, a partir de 2007 o número de infecções por MCR,
principalmente relacionadas a cirurgias endoscópicas,
18
atingiu níveis alarmantes, totalizando 1937 notificações de
casos confirmados de infecções cirúrgicas até julho de 2008,
segundo dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(ANVISA).8
2. SURTOS DE INFECÇÃO POR MCR NO ESTADO DE
SÃO PAULO
Desde 2004 foram notificados 40 casos de infecção por
MCR no Estado de São Paulo. A Tabela 1 mostra a
distribuição destes casos segundo ano de notificação e
espécie de MCR identificada.
Tabela 1. Número de casos confirmados notificados segundo
ano de notificação e espécie de MCR identificada. Estado de
São Paulo, 2004 a 2008
2.1. SURTO DE INFECÇÕES POR MCR ASSOCIADAS A
IMPLANTE DE PRÓTESES MAMÁRIAS
Em 2004 a Divisão de Infecção Hospitalar do Centro de
Vigilância Epidemiológica “Prof. Alexandre Vranjac” (CVE),
o Centro de Vigilância Sanitária do Estado e o Instituto
Adolfo Lutz, órgãos da Coordenadoria de Controle de
Doenças da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo
(CCD/SES-SP), investigaram em parceria com as vigilâncias
epidemiológica e sanitária municipais, casos de infecções
por MCR relacionados a cirurgias para implante de próteses
mamárias na cidade de Campinas.
Foram confirmados 14 casos de infecção por MCR sendo
12 casos por M.fortuitum, 1 caso por M.porcinum e 1 caso
por M.abscessus.
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Os casos estavam distribuídos em diferentes instituições
e envolviam vários cirurgiões e vários fabricantes de
implantes mamários, não sendo possível definir a causa das
infecções pela investigação epidemiológica.
Exames de biologia molecular mostraram que o surto
apresentava dois perfis: monoclonal em uma instituição e
policlonal nas demais instituições com casos confirmados.
2.2. SURTO DE INFECÇÕES POR MCR ASSOCIADAS A
PROCEDIMENTOS ESTÉTICOS
Em 2005 houve a investigação de novos casos de
infecções por MCR na cidade de Campinas, desta vez
relacionados a outros procedimentos estéticos.
Nesta ocasião foram identificados 6 casos de infecção
por M.abscessus pós injeção de substâncias cosméticas para
redução de gordura localizada. Todos os casos ocorreram
em uma mesma clínica de estética.
A investigação epidemiológica mostrou várias falhas de
processo de trabalho na clínica e problemas na farmácia de
manipulação que fornecia medicamentos para a clínica.
Entretanto, não foi possível determinar a causa do surto.
2.3.SURTO DE INFECÇÕES POR MCR ASSOCIADOS A
PROCEDIMENTOS CIRÚRGICOS
Após 2 anos sem receber novas notificações de casos
por MCR , em 2008 a Divisão de Infecção Hospitalar do CVE
recebeu novas notificações de casos de infecções por MCR.
Do total de casos notificados confirmados, 12 estão
relacionados com cirurgia para implante de próteses
mamárias, 6 com colecistectomia laparoscópica, 1 com
artroscopia e 1 com cirurgia plástica sem implante de prótese.
É importante destacar que nos casos de cirurgias
endoscópicas foi isolada M.abscessus/M.bolletii/
M.massiliense e nos demais casos foram isoladas
M.abscessus e M.fortuitum.
A principal hipótese para a ocorrência destes casos é o
reprocessamento inadequado de artigos médicos.
3. DIAGNÓSTICO/TRATAMENTO
O diagnóstico definitivo das infecções cirúrgicas por MCR
é realizado por meio de cultura de aspirado de secreção ou
de material de biópsia coletado de maneira asséptica.
A realização de investigação diagnóstica complementar
com exames de imagem deve ser realizada para avaliar a
extensão das lesões, uma vez que infecções cirúrgicas por
MCR podem resultar em lesões profundas, como abscessos
intracavitários.
O tratamento das infecções por MCR é diferente daquele
utilizado para as micobactérias de crescimento lento, como
M.tuberculosis e varia de acordo com a espécie de MCR.1
Monoterapia para doença localizada por MCR é eficiente
com mínimo risco de desenvolvimento de resistência.
Entretanto, nos casos de doença disseminada é necessário
tratamento com mais de uma droga, incluindo a associação
de antimicrobianos por via intravenosa e oral.1
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
O grupo M.fortuitum apresenta menor resistência a drogas
quando comparado aos grupos M.abscessus e M.chelonae.1
As MCR do grupo M.fortuitum são sensíveis ou
apresentam sensibilidade intermediária in vitro a amicacina,
cefoxitina, ciprofloxacina, gatifloxacina, imipemem,
levofloxacina, linezolida, sulfametoxazol, sulfametoxazoltrimetoprim, claritromicina, doxiciclina e vancomicina.1
Já as MCR do grupo M.abscessus são sensíveis ou
apresentam sensibilidade intermediária in vitro a amicacina,
cefoxitina, claritromicina, ciprofloxacina, doxiciclina,
imipenem e linezolida.1
Finalmente, as MCR do grupo M.chelonae são sensíveis
ou apresentam sensibilidade intermediária in vitro a amicacina,
claritromicina, gatifloxacina, linezolida, tobramicina,
ciprofloxacina, doxiciclina e imipenem.1
A orientação terapêutica deve ser realizada sempre que
possível com base em testes de sensibilidade.
4. MEDIDAS DE PREVENÇÃO
Por tratar-se de uma doença emergente a ANVISA
recomenda a notificação dos casos suspeitos e confirmados
de infecções por MCR pós procedimentos cirúrgicos. Os
casos devem ser notificados às vigilâncias epidemiológicas
e sanitárias locais e por meio de formulário disponível no site
da ANVISA.9
A vigilância de base laboratorial também é recomendada
com a notificação de casos de infecções por MCR pelos
laboratórios às vigilâncias locais.
Além disso, foi colocada em consulta pública uma legislação
para contenção do surto no país que inclui regulamentação
sobre o uso de esterilizantes químicos, como o glutaraldeído.10
No Estado de São Paulo foi publicado em 2008 um manual
para prevenção e controle de infecções associadas a
procedimentos estéticos11 e nota técnica12 e comunicado
orientando sobre o reprocessamento de artigos médicos.13
É importante destacar que as medidas para prevenção e
controle de infecções cirúrgicas por MCR nos serviços de
saúde devem ser as mesmas já utilizadas para a prevenção e
controle das infecções cirúrgicas por outros agentes.14
Além disso, todos os artigos utilizados em cirurgias
endoscópicas devem ser cuidadosamente limpos e
obrigatoriamente esterilizados.12,13
5. CONCLUSÃO
As infecções cirúrgicas por MCR representam uma doença
emergente e de grande importância em saúde pública, tanto
pelo número de casos como pelas seqüelas nos pacientes
acometidos.
Dessa forma, é de fundamental importância a intensificação
das medidas de prevenção e controle de infecções cirúrgicas
com especial atenção no reprocessamento dos artigos
médicos.
REFERÊNCIAS
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dhqp/pdf/guidelines/SSI.pdf . Acessado em 16/02/
2008.
Denise Brandão de Assis
[email protected]
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Terapia com antagonistas de TNF-α
e Tuberculose
AUTORES:
Letícia Barbosa Kawano-Dourado1; Márcia Seiscento2
SERVIÇO:
Disciplina de Pneumologia da Faculdade de Medicina da Universidade de S. Paulo - Instituto do
Coração do Hospital das Clínicas.
1
2
Médica residente
Médica assistente. Doutora pela FMUSP
INTRODUÇÃO
A possibilidade de agentes biológicos neutralizarem as
citocinas inflamatórias, particularmente o fator de necrose
tumoral - alfa (TNF-α) é atualmente uma das mais importantes
alternativas na terapêutica de várias doenças autoimunes,
dentre elas artrite reumatóide, artrite reumatóide juvenil,
espondilite anquilosante, doença de Crohn e psoríase.1
O TNF-α é uma potente citocina pró-inflamatória liberada
por monócitos, macrófagos e linfócitos T e associada à
liberação de outras citocinas, proliferação de fibroblastos,
aumento da expressão de moléculas de adesão endotelial e
da atividade de metaloproteinases, além de promoção da
angiogênese. 1 Esta citocina apresenta também papel
fundamental na resposta inflamatória do tipo
hipersensibilidade tardia, desencadeada por patógenos
intracelulares, (micobactérias e fungos), estimulando o
recrutamento de macrófagos e linfócitos e consequente
formação do granuloma. Estes patógenos podem ser
eliminados por esta reação inflamatória ou manter-se de forma
latente dentro do granuloma, que impede a sua disseminação.
A inibição ou neutralização de TNF-α pode interferir na
manutenção do granuloma, em indivíduos infectados e ou
na formação do granuloma em recém infectados,
possibilitando maior risco de disseminação e
desenvolvimento de infecções por esses agentes.2,3,4
Entre as doenças infecciosas granulomatosas, a
tuberculose (TB) está amplamente associada ao risco de
reativação de infecção latente ou à progressão de infecção
recentemente adquirida, às vezes com formas disseminadas
e extrapulmonares.5 Outras infecções oportunistas também
podem ocorrer em pacientes tratados com agentes anti
TNFα. Entre 175.000 pacientes que utilizaram infliximabe
(anticorpo anti-TNF-α) foram descritos casos de
histoplasmose primária ou disseminada, pneumocistose,
aspergilose, candidíase sistêmica, coccidiomicose e
listeriose.6
Atualmente, três antagonistas de TNF-α estão
disponíveis em uso comercial, dois anticorpos monoclonais
anti-TNF (um anticorpo quimérico - infliximabe - e outro
anticorpo humano - adalimumabe) e um receptor solúvel do
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
TNF (etanercepte – proteína de fusão composta do receptor
solúvel ligado a porção Fc de uma imunoglobulina humana).1
Inicialmente, essas drogas foram utilizadas em países com
baixa incidência e prevalência da infecção pelo M.
tuberculosis. No Brasil, a aprovação em 2005 ao uso destas
drogas gera preocupação em relação a um risco muito maior
de ocorrência de TB. No país, a TB apresenta uma incidência
estimada de 60 casos por 100 mil habitantes e estima-se em
50 milhões o número de pessoas infectadas pelo bacilo.7,8
Dessa forma, o uso de drogas imunossupressoras, e
principalmente os antagonistas do TNF-α, sem uma
adequada avaliação de infecção prévia por TB, poderá levar
a um aumento de casos de tuberculose. Além disso, existe
também o risco dos pacientes serem infectados durante o
uso da medicação.
EPIDEMIOLOGIA
Após a liberação para uso comercial dos agentes antiTNF-α nos Estados Unidos em 1998, foram relatados ao
U.S. Food and Drugs Administration (FDA) 242 casos de
tuberculose até 2004. 9 Em torno de metade dos casos
reportados eram casos de tuberculose disseminada. O uso
de agentes anti-TNF-α eleva em média o risco de TB em
aproximadamente 4-5 vezes.5 Essa prevalência aumenta ainda
mais quando se consideram apenas os pacientes nascidos
em países onde a tuberculose é endêmica5,9, como é o caso
de Brasil.
No Brasil não existe notificação específica sobre a
incidência de tuberculose ou infecções oportunistas em
usuários de agentes anti-TNF-α; no entanto, em congressos
existem relatos de vários casos.
INDICAÇÕES GERAIS DE QUIMIOPROFILAXIA
PARA TUBERCULOSE
As indicações de quimioprofilaxia, segundo o II
Consenso Brasileiro de Tuberculose de 2004 são10:
- quimioprofilaxia primária (em não infectados) em recémnascidos contatos de adulto com doença ativa.
- Menores de 15 anos contato de TB bacilífera com teste
tuberculínico (TT) maior ou igual a 10mm nos não-vacinados
21
com BCG ou maior ou igual a 15mm nos vacinados.
- Viragem tuberculínica recente (últimos 12 meses) e que
apresentam aumento de no mínimo 10mm na resposta inicial.
- Em população indígena, contato de TB e com TT maior
ou igual a 10mm, independente da idade e status vacinal.
- Reatores forte ao TT sem sinais de doença ativa, mas
portadores de condições clínicas que favoreçam a infecção:
alcoolismo, diabetes, silicose, nefropatias graves, neoplasias
malignas de cabeça e pescoço, sarcoidose, linfomas, uso
prolongado de corticóides em doses imunossupressoras,
quimioterapia antineoplásica, uso de imunossupressores,
portadores de imagem radiológica compatível com TB inativa
sem história de quimioterapia prévia.
- Gestante HIV positivo contato de TB ativa ou reatora
ao TT
Nas orientações de quimioprofilaxia contidas no Guia de
Vigilância Epidemiológica do Ministério de Saúde11, aparecem
as mesmas indicações acima, acrescidas de:
- Imunossuprimidos por uso de drogas ou por doenças
imunossupressoras e contato com TB, sob criteriosa
avaliação médica (independente do TT).
- Infectados pelo HIV e: TT maior ou igual a 5mm, ou
contato com TB bacilífera, ou TT não reator mas havendo
registro de TT reator prévio sem medidas específicas a
respeito ou radiografia tórax sugestiva de TB prévia não
tratada (afastada a possibilidade de doença ativa).
Observa-se, portanto, que não foi abordada de maneira
específica, em nenhum dos dois textos, a questão do uso de
agentes anti-TNF-α. Há necessidade de se diagnosticar a
infecção ou a doença tuberculosa antes do início da
terapêutica com os referidos agentes.
PARTICULARIDADES NO RASTREAMENTO PARA
TUBERCULOSE EM CANDIDATOS AO USO DE
AGENTES ANTI-TNF-α
Contemplaremos abaixo algumas particularidades do
rastreamento da TB em candidatos ao uso de agentes antiTNF-α. O conhecimento dessas particularidades permitirá que
o rastreamento seja conduzido de maneira adequada e cumpra
com seu objetivo de diminuir TB doença nesses pacientes9:
Doença de Base
Os agentes anti-TNF-α são usados para tratamento de
doenças autoimunes como artrite reumatóide, artrite
reumatóide juvenil, espondilite anquilosante, doença de
Crohn e psoríase. 1 Existem relatos, por exemplo, de
anormalidades da função celular imune na artrite reumatóide,
levando a uma diminuição na formação da resposta de
hipersensibilidade cutânea tardia necessária para o teste
tuberculínico.12 Isso tornaria o uso do teste inapropriado
para o reconhecimento de formas latentes de TB no contexto
da artrite reumatóide.12,13
Uso de imunossupressores
Da mesma forma, os pacientes candidatos aos agentes
anti-TNF-α geralmente estão em uso de outros
22
imunossupressores, que podem diminuir a resposta ao TT9
e em caso de TB doença, tornar a apresentação clínica atípica.
REVISÃO E ANÁLISE CRÍTICA DA LITERATURA
Até o presente momento, existem publicadas algumas
sugestões de rastreamento e manejo de TB infecção e doença
em pacientes candidatos aos anti-TNF-α9,14,15.
As diretrizes da British Thoracic Society (BTS) de 2005
procuram, de maneira objetiva, orientar os clínicos em como
proceder em relação ao risco de tuberculose diante de
paciente candidato ao uso de drogas anti-TNF-α.9.Aborda
alguns aspectos interessantes sobre o assunto:
- Orienta não solicitar (desconsiderar) TT em pacientes
que já estão em uso de outros imunossupressores, tendo
em vista a possibilidade aumentada de um falso negativo. A
avaliação de risco para TB infecção deve se basear em outros
pontos da anamnese (radiografia de tórax, antecedentes,
contato).
- Considerar a origem do paciente, tendo em vista a maior
incidência de tuberculose em pacientes negros e de outras
etnias não-britânicas. A procedência de países onde a
incidência de TB é maior faz pesar a favor da introdução da
quimioprofilaxia.
No entanto, a extrapolação completa dessas orientações
para o contexto brasileiro esbarra em dois pontos:
- A diretriz britânica considera que a vacinação com BCG
influencia a leitura do TT em adultos. Dessa forma, um
paciente com TT menor que 15mm (por exemplo de 10mm)
que recebeu BCG, segundo a BTS, após descartada doença
ativa, não necessitaria de quimioprofilaxia, pois consideram
que seu TT foi secundário ao estímulo vacinal e não a
infecção por TB.
- No Brasil, diferente do Reino Unido, todos os pacientes
avaliados já partem de um risco aumentado para contrair
tuberculose, não havendo a possibilidade de estratificação de
risco baseada em nacionalidade, como a proposto pela BTS.
Sabe-se que a vacinação pelo BCG pode influenciar de
maneira significativa a resposta ao TT até dois anos após a
sua aplicação.10,14 Após esse período, a reatividade ao TT é
decorrente de infecção (doença manifesta ou não) por
micobactérias (mais provavelmente o M. tuberculosis).
Inquérito realizado em crianças menores de seis anos,
vacinadas e não-vacinadas com BCG, não observou
diferença estatisticamente significativa na resposta ao TT.16
Dessa forma, não é possível atribuir à vacina BCG recebida
na infância um resultado de TT de 10mm em paciente adulto.
Existem também recomendações nacionais para avaliar o
risco de TB em pacientes que irão iniciar a terapia com antiTNF13,14. Segundo esses autores, o que determina a decisão
por quimioprofilaxia para TB, após afastada a possibilidade
de doença, é a presença de TT maior ou igual a 5mm ou a
presença de alterações sequelares na radiografia de tórax
sugestivas de TB pregressa.
O ponto de corte de 5mm é utilizado por extrapolação já
que esse valor é utilizado em populações imunossuprimidas
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Colher história clínica completa:
- Sintomas atuais
- Comorbidades e uso de medicações
- Antecedentes
- Contato prévio com Tuberculose
tratar
Sim
TB doença ativa?
Não
Avaliar
quimioprofilaxia
Para rastreamento, realizar: TT, radiografia de tórax.
Oferecer quimioprofilaxia se:
TT> 5 mm
Rx tórax
sugestivo de passado
de TB não tratada
Contato prévio
Com TB
Algoritmo 1: seleção de pacientes para quimioprofilaxia para tuberculose em candidatos ao uso de anti-TNF-α
com o risco aumentado de desenvolver tuberculose
doença.10,14
Segundo os autores nacionais, se o paciente apresenta
TT inferior a 5mm e radiografia de tórax normal, está isento
da necessidade de quimioprofilaxia. 14 No entanto, em
concordância com recomendações americanas e inglesas,
observamos que o TT pode ser falsamente negativo, seja
pela própria doença que leva a alteração na resposta
imunológica13, seja pela imunossupressão promovida por
outras drogas associadas.9,15 Dessa forma, consideramos que
itens da história clínica como o antecedente de contato prévio
com tuberculose, independente do resultado do teste
tuberculínico, também devem ser um determinante na
indicação quimioprofilaxia nos pacientes com doenças autoimunes que receberão agentes anti-TNF-α no Brasil.
Como fazer o rastreamento de infecção e doença tuberculosa
em candidatos ao uso de agentes anti-TNF-α no Brasil?
Diante do exposto, sugerimos então a seguinte sequência
na avaliação de um paciente candidato ao uso de agentes
anti-TNF-α:
1. Colher história clínica completa: sintomas,
antecedentes, comorbidades, contato prévio com TB, uso
de outras medicações significativas (imunossupressores,
antibióticos)
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
2. Realizar TT: em busca de evidências de infecção por TB
3. Radiografia de tórax: comparar com radiografias
anteriores
4. Tomografia computadorizada de tórax se a radiografia
sugerir alterações no parenquima pulmonar
5. Em casos suspeitos descartar tuberculose em atividade
e principalmente diagnóstico diferencial com outras infecções
fúngicas. Em imunossuprimidos a positividade da
baciloscopia é reduzida e o TT pode estar falsamente
negativo. Assim, é necessária a realização de exames de
cultura de escarro e/ou outros materiais analisados, avaliação
de imagem de tórax/abdomem e busca por material histológico
para o diagnóstico.
Em qual paciente candidato ao uso de anti-TNF-α devese indicar quimioprofilaxia para tuberculose?
No paciente assintomático, todas essas condições
determinam necessidade de quimioprofilaxia:
- radiografia de tórax alterada, sugestiva de seqüela de TB
nunca tratada, após descartada doença ativa
- TT maior que 5 mm
- História de contato com tuberculose, independente do
TT e exames de imagem ( radiografia e tomografia de tórax
normal).
O racional de tornar esses achados indicações de
23
quimioprofilaxia é que todas as três situações identificam
contato prévio com tuberculose e por tanto infecção latente
(considerando que foi descartada TB ativa) dentro de um
contexto clínico de alto risco para desenvolvimento da
doença por tuberculose.
A respeito do TT, consideramos que este deve ser
realizado em todos os pacientes, pois apenas seus valores
negativos não devem ser valorizados considerando a
imunossupressão e doença de base do paciente. Valores
positivos acima de 5 mm devem ser sempre valorizados.
4.
5.
6.
Quando iniciar o agente anti-TNF-α se detectada TB
infecção ou doença?
O tempo ideal entre a realização da quimioprofilaxia e o
início do agente anti-TNF-α ainda está para ser definido.15
Alguns estudiosos recomendam o uso concomitante de
quimioprofilaxia e anti-TNF-α, outros definem como mais
adequado aguardar o término da quimioprofilaxia antes de
iniciar a o tratamento com o anti-TNF-α.15 A diretriz da BTS
recomenda que o uso concomitante da quimioprofilaxia e
do agente anti-TNF-α não deve ocorrer se a indicação de
quimioprofilaxia foi por conta de uma antecedente de TB
não tratada, onde o risco de reativação é maior.9 No entanto,
todas são recomendações de especialistas. Há a
necessidade de se estudar essa situação com estudos
comparativos.
7.
Seguimento
A droga de escolha para realização da quimioprofilaxia é
a isoniazida (INH) 5mg/kg ou máximo de 300mg/dia por
seis meses. O paciente deverá continuar em seguimento,
tendo em vista a necessidade de monitorizar potenciais
efeitos colaterais da medicação e a possibilidade de
desenvolver TB doença mesmo após o uso de
quimioprofilaxia, já que a proteção oferecida fica em torno
de 60%.9,10 Havendo manutenção do risco de TB (ex. novo
contato), a profilaxia pode ser prolongada ou reiniciada.14
13.
CONCLUSÃO
Com o uso crescente dos agentes anti-TNF-α, surge a
necessidade de vigilância para possibilidade de
desenvolvimento de TB doença. Um rastreamento realizado
de maneira adequada e a instituição de quimioprofilaxia,
quando indicada, levam a uma diminuição nos casos de TB
doença nesse grupo de pacientes já com comorbidades
clínicas significativas.
16.
REFERÊNCIAS
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Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
RESUMINDO E RECORDANDO
Diagnóstico bacteriológico da Tuberculose
e outras micobacterioses
AUTORES:
Erica Chimara1; Lucilaine Ferrazoli 2
SERVIÇO:
Instituto Adolfo Lutz - Seção de Bacteriologia – Setor de Micobactérias
1
2
Doutor em Ciências pela Universidade Federal de São Paulo
Doutor pelo Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de São Paulo
INTRODUÇÃO
O gênero Mycobacterium compreende uma grande
variedade de organismos, incluindo patógenos obrigatórios
que causam doença em homens e animais, patógenos
oportunistas e espécies saprófitas encontradas no meio
ambiente. A doença no homem pode ser causada pelas
espécies pertencentes ao complexo M. tuberculosis e por
algumas micobactérias não tuberculosas (MNT). As
micobactérias agrupadas no complexo M. tuberculosis são
caracterizadas por apresentar 99,9% de similaridade em seu
DNA e possuir sequências de 16S rDNA idênticas. No
entanto, apesar dessa estreita relação genética, estas
espécies diferem em sua epidemiologia, patogenicidade,
ocorrência geográfica e preferência de hospedeiro. 1 O
complexo M. tuberculosis é composto pelas espécies M.
tuberculosis, principal agente da tuberculose humana, M.
bovis subsp. bovis que causa tuberculose bovina, e que
pode também infectar o homem e outros animais, M. bovis
subsp. caprae, que causa tuberculose em caprinos, M. bovis
BCG, cepa vacinal BCG, M. africanum, agente da tuberculose
humana encontrado mais freqüentemente na África, M.
microti que infecta roedores, “M. canetti” encontrado na
região da Somália e o mais recentemente descrito M.
pinnipedii, que causa tuberculose em leões marinhos e no
homem.2
As MNT são diferenciadas dos membros do complexo M.
tuberculosis (e M. leprae) pelo fato de não serem patógenos
obrigatórios. Podem ser encontradas como saprófitas,
comensais ou simbiontes. As micobactérias são habitantes
normais de uma grande variedade de reservatórios que
incluem a água natural e de sistemas de abastecimento, solo,
aerossóis, protozoários, animais e humanos.3 Constituem
um grupo muito numeroso e heterogêneo, sendo que cada
vez é mais frequente a descrição de novas espécies. As MNT
são conhecidas desde o tempo de Robert Koch, e somente
recentemente a importância das infecções causadas por
essas bactérias tem sido reconhecida.4 As características
clínicas da doença pulmonar por MNT são, em muitos casos,
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
indistinguíveis da tuberculose. Uma vez que o tratamento e
a epidemiologia das infecções causadas por MNT são
significantemente diferentes da tuberculose causada pelas
espécies do complexo M. tuberculosis, a identificação correta
dos agentes causadores é imprescindível para o diagnóstico,
terapia e controle da doença.
O diagnóstico microbiológico da tuberculose e das
doenças causadas pelas MNT exige a detecção, isolamento
e identificação da espécie. Esta revisão apresenta os métodos
bacteriológicos para diagnóstico das micobacterioses,
mostrando sua importância e respectivas limitações.
1. Detecção
A sensibilidade e especificidade dos diferentes métodos
de detecção são variáveis e dependem da experiência de
cada laboratório e de sua rotina de trabalho. Em geral, o
exame microscópico direto das amostras clínicas
(baciloscopia), apesar de ser o método menos sensível, é o
mais barato e mais rápido para detecção dos pacientes
sintomáticos respiratórios que procuram o serviço de saúde
com tosse e expectoração há mais de três semanas.5,6 As
micobactérias coram-se fracamente com a coloração de Gram,
sendo que somente o método que utiliza álcool-ácido permite
a coloração destes organismos. O fenol e a alta temperatura
usados na coloração de Ziehl-Neelsen permitem que a
fucsina penetre mais facilmente na célula. Quando
contrastado com o azul de metileno, os bacilos vermelhos
são destacados, facilitando a visualização microscópica. As
micobactérias também são capazes de formar complexos
estáveis com corantes como a auramina O. Esta é usada na
microscopia de fluorescência, indicada como triagem para
reduzir o tempo de leitura dos exames negativos e é indicado
para laboratórios que realizam mais de 50 amostras de escarro
por dia.5 A confiabilidade da leitura da baciloscopia é
altamente dependente da experiência do profissional do
laboratório, da qualidade da amostra e do número de
organismos presentes na amostra. O número mínimo de
bacilos álcool-ácido resistentes (BAAR) necessário para
25
produzir um esfregaço com resultado positivo foi estimado
entre 5000 a 10000 por mililitro.5 A sensibilidade da baciloscopia
aumenta quando as amostras são concentradas.6 As boas
práticas de laboratório incluem a confirmação da baciloscopia
positiva por fluorocromo pelo método de Ziehl-Neelsen e
liberação do resultado em até 24 horas da chegada do material
ao laboratório.
Vários estudos testaram a utilidade da adição do hipoclorito
de sódio para liquefazer e concentrar o escarro por
centrifugação para aumentar a sensibilidade da baciloscopia.
No entanto, apesar do método ter mostrado aumento na
proporção de esfregaços positivos, não é usado na rotina de
muitos laboratórios.7
1.1 Características microscópicas
A morfologia dos BAAR pode diferir de acordo com a
espécie no que diz respeito ao tamanho, forma e padrão de
coloração. O M. tuberculosis apresenta-se como um bacilo
alongado e M. kansasii como um bacilo comprido e coloração
“zebrada” (Figura 1); M. avium aparece como coco-bacilos e
coloração uniforme; M. fortuitum e M. chelonae podem ser
muito polimórficos.
Fig. 1. Morfologia dos bacilos de M. kansasii corados por ZiehlNeelsen. Aumento 100x. (Fonte E. Chimara)
2. Isolamento
Apesar dos avanços na detecção molecular das
micobactérias, até o momento a cultura é indispensável, pois
confirma e melhora o diagnóstico, particularmente quando
métodos moleculares são utilizados; proporciona massa
bacteriana para posterior identificação da espécie e teste de
sensibilidade às drogas.8 O limite de detecção de bacilos na
cultura é de 100 bacilos por mililitro de escarro, sendo o método
padrão-ouro. O tempo de detecção é variável e dependente
do método utilizado. De modo geral o isolamento em meios
sólidos leva em torno de 20-30 dias e, em meios líquidos, 1015 dias.9
No Brasil, existem critérios para realização da cultura,
visando a melhoria no diagnóstico, permitindo o controle da
tuberculose e a vigilância de resistência às drogas. 5 A
26
realização da cultura está indicada para os casos HIV positivos,
pacientes imunodeprimidos, retratamento, em pacientes
indígenas ou crianças e contatos de casos com tuberculose
resistente as drogas.5
O exame de cultura possui cinco etapas sendo elas: a) prétratamento das amostras, b) fluidificação-descontaminação com
agentes químicos para eliminar contaminantes, c) semeadura
em meio de cultura, d) incubação em temperatura adequada
para o crescimento do organismo e e) leitura dos tubos,
verificando a presença de colônias ou contaminação. O
processamento destas amostras deve ser feito em cabine de
segurança biológica e por profissionais treinados. Devem ser
utilizadas medidas de controle tanto para evitar a contaminação
dos profissionais como também das amostras.
2.1 Meios de cultura
Os meios de cultura utilizados podem ser sólidos
(Lowenstein-Jensen - LJ, Ogawa-Kudoh, Stonebrink,
Middlebrook 7H10) ou líquidos (Kirchner, Middlebrook 7H9),
sendo os últimos mais atrativos por oferecerem um tempo
menor de detecção. Estes são mais enriquecidos e são
indicados tanto para amostras respiratórias quanto para
amostras paucibacilares como sangue, líquor e macerado de
tecidos. Apesar da maioria das espécies crescerem em
temperatura entre 35 e 37ºC, algumas espécies como M.
marinum, M. ulcerans, M. chelonae e M. haemophilum
crescem melhor entre 25 e 35ºC.10
A detecção do crescimento depende do tipo de meio
utilizado. Com os meios sólidos a base de ovo, a detecção é
feita mediante a observação macroscópica uma vez por semana.
Os meios à base de ágar não são tão bons para a realização do
primo-isolamento, mas são mais convenientes em locais onde
seja difícil a fabricação do meio à base de ovo.
Independente do tipo de meio utilizado, é importante
salientar a necessidade do controle de qualidade dos meios,
verificando as características do meio (coloração,
consistência, viabilidade, esterilidade) e usando uma cepa
padrão de M. tuberculosis.
2.2 Cultura automatizada
Os sistemas que realizam a cultura automatizada têm por
objetivo maximizar as taxas de positividade e minimizar o
tempo de detecção.11 Os kits possuem um frasco de meio de
cultura líquido com um sensor interno, que pode ser
colorimétrico, fluorimétrico ou de pressão, um frasco com
enriquecimento, um frasco com antibiótico e uma incubadora
que monitora continuamente o crescimento bacteriano.
MGIT 960 mycobacteria detection system (Becton
Dickinson Instrument Systems, Sparks, MD, EUA) é um
sistema que permite a incubação e monitoramento continuo
de até 960 tubos, detectando a fluorescência emitida pelos
sensores sensíveis à presença de oxigênio no meio. Com o
crescimento da bactéria, os níveis de oxigênio diminuem,
intensificando a fluorescência. Pode ser realizado o teste de
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sensibilidade para as drogas dos esquemas preconizados pelo
Ministério da Saúde (isoniazida, rifampicina, pirazinamida,
etambutol e estreptomicina). Vários estudos foram
conduzidos para avaliar o sistema. Rishi e cols12 compararam
o MGIT 960 com a cultura em LJ, mostrando uma taxa de
isolamento de 98,06% e 63,95%, respectivamente, dados
concordantes com outros trabalhos citados pelos autores.
Este método também pode ser utilizado como identificação
presuntiva com a incorporação do ácido p-nitrobenzóico
(PNB) no meio.13
Bact/Alert 3D system (bioMerieux, Durham, NC, EUA)
conhecido como MB/BacT System é um sistema baseado na
detecção colorimétrica de CO2, produzido pelo metabolismo
das micobactérias. A mudança de cor de verde para amarelo
indica uma reação positiva, e cada tubo é monitorado
continuamente por computador. Também é utilizado na
realização de teste de sensibilidade, porém possui diferentes
tempos de leitura.
VersaTREK® Mycobacteria detection and susceptibility
testing (TREK Diagnostic Systems, West Laki, OH, EUA)
conhecido como ESP culture system II, é um método que
detecta mudanças de pressão devido ao consumo de oxigênio
pelo organismo. Os tubos são automaticamente monitorados
a cada 24 minutos e pode detectar micobactéria de qualquer
tipo de material clínico. Também pode ser utilizado para
realização de teste de sensibilidade, porém somente para
isoniazida, rifampicina e etambutol. Falconi e col14 avaliaram
este método, comparando-o com o meio LJ. O tempo médio
de detecção foi 18,2% e 27,9% para as espécies de
micobactérias, e 19,8% e 27,3% para M. tuberculosis,
respectivamente. No entanto, a taxa de positividade foi de
84,8% para o sistema VersaTREK e 89,45 para o LJ.
2.3 Novos métodos
MODS (microscopic observation drug susceptibility).
É uma nova metodologia de cultivo utilizando meio líquido
em placas de 24 orifícios, recentemente desenhada para
utilização em centros de baixa renda para detecção e teste de
sensibilidade. Este método é mais barato que os meios de
cultura comerciais e incorpora o teste de sensibilidade a drogas
na fase inicial da cultura, permitindo a rápida detecção dos
isolados resistentes. O método mostrou sensibilidade superior
a cultura em meio sólido (LJ) com redução no tempo de
positividade15. Além disso, é um método seguro, pois envolve
a inoculação do escarro na placa, sendo que depois a mesma
é selada e não mais aberta até a finalização do teste.16 Arias e
cols17 avaliaram o método, comparando-o com o cultivo em
LJ e MGIT 960; os resultados foram obtidos em 7, 21 e 8 dias,
respectivamente. Neste estudo o MODS apresentou uma
sensibilidade de 97.5% e especificidade de 94.4%,
apresentando uma porcentagem de contaminação menor que
a cultura em LJ.17
Nitrato redutase é um método baseado na capacidade do
M. tuberculosis reduzir o nitrato a nitrito, detectado por uma
reação colorimétrica. Pode ser realizado diretamente da amostra
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
biológica e também pode ser utilizado para detecção de
resistência a isoniazida e rifampicina.18
FastPlaque TB assay (BIOTEC, Ipswich, Suffolk, Reino
Unido) é um método baseado na habilidade do M. tuberculosis
suportar o crescimento de um micobacteriófago. Este teste
comercial foi proposto para ser utilizado juntamente com a
baciloscopia para melhorar o diagnóstico da tuberculose.
Muitos estudos foram realizados para avaliar esta metodologia,
comparando-a com métodos tanto convencionais como
moleculares. Estes estudos mostraram que o método é um
pouco mais sensível que a baciloscopia, mas a união das duas
metodologias pode aumentar em 13% o diagnóstico em
materiais com baciloscopia positiva.8 Recentemente, Singh e
cols19 compararam o método com a baciloscopia e cultura em
LJ, obtendo a sensibilidade de 76,7%, 73,3% e 60%,
respectivamente. Estes dados foram obtidos tomando como
padrão ouro a técnica da reação em cadeia da polimerase (PCR).
O FastPlaque não detectou micobactérias a partir de amostras
paucibacilares. Os autores concluíram que, em vista de 93,3%
dos casos terem sido diagnosticados com base em mais de um
método, a combinação de três ou mais métodos é um nível
aceitação de detecção.
3. Identificação de espécies
3.1 Testes convencionais
A identificação da espécie de micobactéria isolada é
fundamental para assegurar o tratamento adequado. O primeiro
passo após isolamento é a separação das espécies
pertencentes ao complexo M. tuberculosis das espécies de
MNT.
A identificação do complexo M. tuberculosis pode ser
realizada com três provas fenotípicas: formação de corda,
aspecto macroscópico e inibição do crescimento em meio
contendo PNB. Muitos estudos avaliaram a utilidade da
formação de corda como identificação presuntiva (Figura 2),
uma vez que as espécies de MNT perderam esta característica
(Figura 3).20 A formação de corda é um efeito causado pela
maior molécula de ácido micólico, trealose 6,6-dimicolato, um
componente da parede celular. Algumas espécies de MNT,
como M. kansasii, M. marinum, M. terrae e M. phlei podem
eventualmente apresentar a formação de corda.21 O aspecto
macroscópico do cultivo das espécies do complexo M.
tuberculosis pode variar, como podemos verificar entre M.
tuberculosis e “M. canetti”, com colônias rugosas e lisas,
respectivamente. As espécies do complexo M. tuberculosis
são sensíveis ao PNB e, por isso, não crescem em meios com
este ácido, enquanto as MNT apresentam crescimento.
As espécies de MNT possuem diferentes padrões de
sensibilidade a drogas e, por esse motivo, a identificação ao
nível de espécie é clinicamente importante. Da mesma forma, é
importante reconhecer que nem todos os isolados de MNT
necessitam de grandes esforços para sua identificação, como
no caso de espécies de crescimento lento escotocromógenas
isoladas de sítios não estéreis uma única vez. O conhecimento
do contexto no qual um isolado de MNT foi obtido é
27
Fig. 2. Formação de corda em cultivo de M. tuberculosis.
Coloração de Ziehl-Neelsen, aumento 100x. (Fonte E. Chimara)
Fig. 3. Morfologia dos bacilos de uma cultura de MNT. Coloração
de Ziehl-Neelsen, aumento 100x. (Fonte E. Chimara)
criticamente importante para saber se há necessidade de
realizar a identificação. Por isso, a comunicação entre clínico
e laboratório é imprescindível para realizar esta determinação22.
A identificação convencional baseia-se nas características
fenotípicas, provas bioquímicas e de inibição de crescimento
por determinadas substâncias. Tradicionalmente as MNT
podem ser agrupadas em quatro categorias, de acordo com a
classificação de Runyon.23 Nesta classificação, as MNT são
divididas pelo tempo de crescimento e produção de pigmento.
Os grupos I a III são de crescimento lento e o grupo IV, de
crescimento rápido (colônias visíveis em menos de 7 dias).
As micobactérias de crescimento lento são divididas no grupo
I – fotocromógenas (produtoras de pigmento em presença de
luz), grupo II- escotocromógenas (produtoras de pigmento
em ausência de luz) e grupo III- acromógenas. Esta
classificação proporciona uma identificação presuntiva,
clinicamente importante. Espécies com importância clínica por
grupo incluem M. kansasii e M. marinum (grupo I), M. szulgai,
M xenopi e M. scrofulaceum (grupo II), complexo M. avium e
M. ulcerans (grupo III) e M. fortuitum, M. chelonae, M.
abscessus, M. boletti e M. massiliense (grupo IV).
As provas bioquímicas englobam uma série de testes para
28
observar o crescimento e utilização de diferentes substratos.
As principais provas utilizadas para identificação são:
crescimento em diferentes temperaturas (26, 37 e 42ºC),
inibição de crescimento em meio de Sauton com ácido pícrico,
inibição de crescimento em meio de ágar comum, inibição de
crescimento em meio com NaCl 5%, inibição de crescimento
em meio com ácido p-nitrobenzóico (PNB), inibição de
crescimento em meio com hidrazida do ácido tiofeno 2carboxílico (TCH), arilsulfatase 3 e 14 dias, hidrólise do Tween
80, β-galactosidase, redução do telurito de potássio,
pirazinamidase, redução do nitrato, produção de niacina e
urease.5
Estes testes foram propostos por um grupo de taxonomia
numérica, o International Working Group on Mycobacterial
Taxonomy (IWGMT), que avaliou diferentes grupos de
micobactérias e definiu as variações dentro de uma mesma
espécie, propondo testes selecionados para a identificação
de rotina.24,25 Nesse período, somente 20 das 54 espécies
conhecidas na época eram consideradas potencialmente
patogênicas e os testes recomendados eram aplicáveis a estas
espécies. Atualmente, a utilização destes testes somente não
permite a identificação de muitas das novas espécies descritas
e, portanto, novos métodos, incluindo HPLC e métodos
moleculares, devem ser usados.
3.2 Ácidos micólicos
A análise da composição lipídica por vários métodos
cromatográficos é reconhecidamente uma ferramenta útil na
diferenciação das espécies de micobactérias. Os ácidos
micólicos são ácidos graxos de alto peso molecular que formam
parte da parede celular das micobactérias e sua abundância
não é afetada pelas condições de cultivo. Esta produção
consistente de ácidos micólicos foi considerada uma
propriedade fenotípica estável das micobactérias.26 Cada
espécie possui um tipo diferente de ácido micólico, que pode
ser detectado pelos diversos métodos de cromatografia, como
a cromatografia líquida-gasosa (GLC), de camada fina (TLC) e
de alta performance (HPLC). No entanto, essa técnica
necessita de grande quantidade de massa bacteriana,
aumentando o tempo do teste devido à necessidade de
cultivos abundantes, além de serem técnicas caras, que
necessitam de pessoal capacitado para sua realização.
CONCLUSÃO
Os métodos bacteriológicos de diagnóstico das
micobacterioses continuam sendo ferramentas
imprescindíveis na detecção e identificação das
micobactérias. O diagnóstico confirmatório de tuberculose e
das doenças causadas pelas MNT é dado mediante a
positividade da cultura e identificação da espécie. Da mesma
forma, apesar dos métodos moleculares auxiliarem
grandemente na agilidade dos resultados, muitos métodos
necessitam de resultados fenotípicos para que possam ser
liberados com segurança. Mesmo que estes métodos possam
ser mais demorados e trabalhosos, eles ainda são
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
necessários, e sua completa inutilização pode levar a um
diagnóstico errôneo.
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Erica Chimara
[email protected]
29
Diagnóstico diferencial da
Tuberculose na infância
Autora:
Maria Helena Bussanrra1
Serviço:
Hospital Israelita Albert Einstein
1
Médica assistente. Doutora pela FMUSP
INTRODUÇÃO
O Ministério da Saúde preconiza o esquema de pontuação
para diagnóstico de tuberculose (TB) na infância, conforme
a norma publicada em 2002. Este esquema considera dados
clínicos e radiológicos, a história epidemiológica de contato
com adultos com TB, a interpretação do resultado da prova
tuberculínica de acordo com o tempo decorrido desde a
vacinação e o estado nutricional (quadro 1). Desta forma, na
prática, o diagnóstico é feito ambulatorialmente, com ênfase
nos dados clínicos, uma vez que a TB habitualmente não é
comprovada pelo encontro do bacilo em secreções.1
A coleta de suco gástrico para estudo bacteriológico
requer a hospitalização do paciente e o exame tem baixa
positividade e possibilidade de falso positivo devido ao
achado de outras micobactérias do trato digestivo. A taxa
de isolamento do M tuberculosis varia de 20 a 52%, em parte
pela falta de padronização do método.2 A coleta ambulatorial
de suco gástrico mostrou resultados semelhantes em um
estudo isolado, mas não foi incorporada à pratica clínica.3,4
Em estudo caso controle de 54 crianças brasileiras com
confirmação bacteriológica da TB, ficou demonstrado que o
sistema de pontuação tem sensibilidade de 58 e 89% e
especificidade de 98 e 86% quando adotados os pontos de
corte ≥ 40 e ≥30 pontos respectivamente. Em outra casuística
nacional, com a mesma metodologia, foi reafirmada a alta
sensibilidade do sistema pontuação para diagnóstico, com
a recomendação inclusive de aplicá-lo em todas as situações
de suspeita de tuberculose e não apenas naqueles com
resultado negativo da baciloscopia de secreção.6
Na infância, a hipótese de TB deve ser investigada nas
seguintes situações:
- Sintomas respiratórios de evolução lenta que não
melhoram com antibióticos para germes comuns ou quando
existem alterações radiológicas localizadas que também não
se resolvem com este tipo de tratamento.
Nestes casos, torna-se necessário afastar outras
patologias, algumas delas até mais freqüentes que a TB,
como as pneumonias atípicas, a tosse crônica e a asma.
Quadro 1- Sistema de pontuação para diagnóstico de tuberculose pulmonar em pacientes pediátricos negativos à baciloscopia
Quadro clínico-radiológico
Febre ou sintomas como tosse,
adinamia, emagrecimento,
sudorese >2 semanas
Adenomegalia hilar ou padrão miliar
Contato com adulto com
tuberculose
Teste tuberculínico e vacinação
BCG
Próximo, nos últimos 2
anos
Vac inação há mais de 2 an os :
- < 5mm = 0 pontos
Consolidação (com ou sem
escavação) inalterado >2 semanas
Estado nutricional
Desnutrição grave ou peso
abaixo do percentil 10
- 5mm a 9mm = 5 pontos
Adicionar 15 pontos
Consolidação (com ou sem
escavação) evoluindo com piora ou
sem melhora com antibióticos para
germes comuns
Adicionar 5 pontos
Adicionar 10 pontos
- 10 a 14 mm = 10 pont os
- 15mm ou mais = 15 pontos
Adicionar 15 pontos
Assintomático ou com
sintomas < 2 semanas
0 pont os
Consolidação de qualquer tipo <
2semanas
Vac inação há mais de 2 an os :
- < 10mm = 0 pont os
Adicionar 5 pontos
- 10mm a 14mm = 5 pontos
- 15mm ou mais = 15 pontos
Infecção respiratória com
melhora após uso de
antibióticos para germes
comuns ou sem antibiótiocos
Radiografia normal
Subtrair 10 pontos
Ocasional ou negativo
0 pontos
Não vacinados:
Peso igual ou acima do
- < 5mm = 0 pontos
percentil 10
0 pontos
- 5mm a 9mm = 5 pontos
Subtrair 10 pontos
- 10mm ou mais = 15 pontos
Interpretação: Maior ou igual a 40 pontos: TB muito provável; 30 a 35 pontos: TB possível; igual ou inferior a 25 pontos: TB pouco
provável
30
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Cabem ainda os diferenciais com a doença do refluxo gastroesofágico e mal formações pulmonares.
- Contato (comunicante) de doente com TB, mesmo
assintomáticos.
Além de detectar os indivíduos doentes, o objetivo nestes
casos é identificar a TB infecção e indicar as medidas
profiláticas.7
O teste tuberculínico (TT) realizado com uma preparação
padrão de proteína derivada purificada (PPD-Rt 23) indica
infecção pelo M tuberculosis. No Brasil, o resultado da reação
cutânea, registrado em milímetros, é classificado como não
reator (0 a 4 mm: indivíduo não infectado ou anérgico),
reator fraco (5 mm a 9 mm: vacinado com BCG ou infectado
pelo M tubercculosis ou outras micobactérias) e reator forte
(10 mm ou mais: infectado pelo M tuberculosis que pode
estar ou não doente e indivíduos vacinados com BCG). Se a
TB ativa for excluída, há indicação de quimioprofilaxia com
isoniazida (10 mg/kg/dia por 6 meses) nos contatos de TB
quando o TT for ≥10mm em crianças não vacinadas ou
vacinadas há mais de 2 anos com BCG e ≥15mm em crianças
vacinadas há menos de 2 anos. 1 Dados mais recentes
sugerem que o ponto de corte de 10mm parece ser mais
adequado, mesmo em crianças vacinadas, especialmente
quando a vacinação ocorre no período neonatal.8,9,10
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Infecções Bacterianas atípicas
Em pré-escolares e escolares, alguns patógenos como o
Mycoplasma pneumoniae e a Chlamydia pneumoniae
podem causar infecções pulmonares ditas atípicas, com
evolução insidiosa e pobre resposta aos antimicrobianos
habitualmente utilizados nesta faixa etária que são as
penicilinas e as cefalosporinas.11 Estes casos costumam
cursar com predomínio de sintomas constitucionais como
cefaléia, mal estar, tosse seca que se torna evolutivamente
produtiva e febre baixa. Sinais de faringite, laringite e
sibilância também são frequentes. Os achados radiológicos
são muito variáveis, desde um pequeno infiltrado
inflamatório para hilar até extensas opacidades alveolares e
comprometimento intersticial. O derrame pleural pode
acontecer em até 25% dos casos. O diagnóstico laboratorial
pode ser feito demonstrando-se a elevação de 4 vezes nos
títulos de anticorpos após 4 a 6 semanas do evento agudo.12
Estes resultados muitas vezes não são úteis para a tomada
de decisão terapêutica e recomenda-se o início de eritromicina
(30 a 50mg/kg/dia) ou claritromicina (15mg/kg/dia) por 10 a
14 dias.13
O Mycoplasma é um importante desencadeante de
exacerbações em asmáticos. Estudos demonstram evidência
de infecção aguda através de sorologia em até 18% das
hospitalizações por exacerbações, tanto em adultos quanto
em crianças. As infecções de vias aéreas inferiores pelo
Mycoplasma ainda cursam com declínio mais acentuado da
função pulmonar e alterações radiológicas podem persistir
por vários anos após o evento agudo, sugerindo um
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
substrato anatômico para perda funcional.14
Em pacientes com doenças respiratórias crônicas, a
Chlamydia pneumoniae pode infectar o tecido pulmonar e
contribuir para o mecanismo patológico.15 A pesquisa de
Chlamydia através de PCR ou cultura de lavado
broncoalveolar indica que a positividade é maior quando há
uma doença inflamatória de base como a asma.16 Especulase que os corticosteróides orais ou inalatórios interferem
com habilidade do indivíduo em erradicar patógenos
intracelulares e permitem que a infecção latente passe a um
fenômeno ativo, com liberação de citocinas pró-inflamatórias,
amplificando a inflamação já existente nas vias aéreas do
indivíduo asmático.17 A terapêutica com claritromicina
melhora a função pulmonar de doentes com PCR positivo
para Chlamydia ou Mycoplasma.14
A Chlamydia pneumoniae é mais freqüente em crianças
maiores de 10 anos e a Chlamydia trachomatis, em lactentes.
Dentre os recém nascidos infectados por C trachomatis,
15–25% desenvolvem sintomas clínicos clássicos como a
conjuntivite, nasofaringite e pneumonite. Alguns autores
sugerem que a sibilância também é um sintoma relacionado
a essa infecção e que estaria indicado o tratamento nos casos
em que a atopia não é demonstrada ou não há boa resposta
ao tratamento convencional para asma.18
Pensando nestas situações clínicas como diagnósticos
diferenciais de TB, se faz necessária a prova terapêutica
com macrolídeo e até um controle radiológico, antes de se
iniciar a investigação específica com teste tuberculínico e
até a pesquisa do bacilo em secreções.
Tosse crônica
A tosse é bastante freqüente na infância e estima-se que
uma criança saudável apresente-se com tosse
aproximadamente durante 50 dias no período de 1 ano,
relacionados principalmente às infecções de vias aéreas
superiores. Valorizar a tosse como um sintoma e caracterizála como crônica requer uma anamnese detalhada para uma
melhor orientação quanto à investigação da sua etiologia. A
tosse como um fenômeno inespecífico está presente em 10%
das crianças que vivem em aglomerados urbanos poluídos
ou locais com clima seco. Naquelas que se apresentam com
tosse crônica, cerca de 50% convivem com fumantes no
domicílio, sendo este o motivo do aparecimento do sintomas.
Os consensos sobre manejo de tosse crônica na infância
recomendam a realização de uma radiografia de tórax como
uma estratégia para identificar os casos de tosse específicos,
nos quais cabe o diagnóstico de tuberculose. A radiografia
normal orienta o diagnóstico para a tríade clássica da
etiologia da tosse crônica: rinossinusite, asma e RGE. Ao
passo que a radiografia de tórax alterada aponta para
investigação de aspiração de corpo estranho, malácias,
anomalias congênitas e tuberculose.19
Marais e cols, ao estudarem de forma sistemática os casos
de tosse crônica em uma população com alta prevalência de
tuberculose, distinguiram padrões distintos de apresentação
31
do sintoma e sua relação com o diagnóstico estabelecido
posteriormente. A tosse aguda com demora na recuperação,
que inicia de forma abrupta, muito intensa e que diminui de
intensidade gradativa e lentamente num período de 4
semanas até seu desaparecimento. Este padrão de tosse
está muito relacionado aos processos infecciosos,
especialmente os virais. A tosse aguda recorrente é aquela
que tem duração curta, de até 10 dias, mas que reaparece
após curtos intervalos de tempo. Este padrão está
classicamente presente nos asmáticos. A tosse persistente
é aquela que não remite, e ao contrário, tende a aumentar de
intensidade com o passar do tempo. Ao término da
investigação de 151 crianças com tosse há mais de 2 semanas
que não melhorou com amoxicilina, concluíram que a tosse
persistente só estava presente nos casos de tuberculose.20
Este mesmo grupo apresentou a seguir dados de uma
casuística de 1024 crianças com investigação sistemática
da tosse com as mesmas características e concluiu que a
presença do sintoma persistente por mais de 2 semanas,
associado à dificuldade de ganho de peso e fadiga, tem
sensibilidade de 62,6%, especificidade de 89,8% e valor
preditivo positivo de 83,6% no diagnóstico de tuberculose
numa comunidade com alta prevalência da doença. Ressaltase dessa forma a importância do dado clínico no diagnóstico
e a necessidade de se validar essas conclusões em grupos
de maior risco como soropositivos para HIV, desnutridos e
lactentes.21,22
Asma
Na avaliação de lactentes e pré-escolares com sintomas
respiratórios crônicos e/ou de repetição há uma maior
dificuldade em estabelecer o diagnóstico. A tuberculose
pode ser confundida com as de manifestações gerais de
doenças crônicas e a sua evolução costuma ser mais aguda,
lembrando uma pneumonia que não melhora com a
terapêutica habitual. Aproximadamente 17% dos pacientes
com tuberculose são admitidos em hospital com crise de
sibilância e recebem o diagnóstico de exacerbação de asma.23
Por outro lado, nesta faixa etária os quadros de sibilância
costumam complicar com processos infecciosos e podem
comprometer o ganho ponderal. Mesmo em países
desenvolvidos, em grupos atendidos por especialistas, com
prescrição adequada e disponibilidade de medicamentos para
controle da asma, pacientes menores de 3 anos são os que
apresentam, com maior freqüência, sinais de descontrole da
doença.24 Entretanto, quando a criança não responde a um
tratamento que é eficaz na maioria dos pacientes com mesma
condição, o caso deve ser revisto, para nos asseguramos
não somente de que os desencadeantes relevantes estão
sendo evitados e a adesão ao tratamento é satisfatória, mas
de que o diagnóstico está correto.25 Em nosso meio há a
descrição de um pré-escolar com sibilância persistente
causada pela tuberculose e inicialmente tratada como asma.
Quando a história clínica da sibilância persistente difere
daquela usual para asma e especialmente quando associada
32
a pneumonias de repetição, outras doenças devem ser
investigadas, entre elas a tuberculose, até mesmo antes de
iniciar o tratamento profilático para asma.26
CONCLUSÃO
As crianças com TB habitualmente não transmitem a
doença e do ponto de vista de saúde pública não costumam
ser consideradas como prioridade para programas de
intervenção. A dificuldade no diagnóstico e na compreensão
da TB primária contribui para que esta faixa etária seja
negligenciada até mesmo nas pesquisas sobre a doença.
Controlar hoje a TB na infância trará benefícios para esta
geração e para os futuros adultos. É preciso dedicar mais
tempo e recursos para este desafio.27
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Maria Helena Bussanrra
[email protected]
33
Tuberculose extrapulmonar
AUTORES:
Mauro Gomes1; Rodrigo Russo2; Rafael Faraco Rodrigues 3; Daniela De Lima Ogawa 4
SERVIÇO:
Clínica de Pneumologia da Santa Casa de São Paulo/Faculdade de Ciências Médicas da Santa
Casa de São Paulo
1
Professor
Médico Residente
3
Médica Estagiária
4
Médica Especializanda
2
1-INTRODUÇÃO
A tuberculose (TB) é a infecção causada pelo
Mycobacterium tuberculosis (MTb), o qual atinge o nosso
organismo geralmente por via inalatória, sendo o principal
órgão de expressão clínica nos adultos os pulmões. Após
penetrar no organismo, o MTb pode se disseminar por via
circulatória, por contigüidade ou intracanalicular e se instalar
em qualquer órgão. Isso pode ocorrer durante a primoinfecção
ou a qualquer momento da vida devido ao desequilíbrio entre
a imunidade do hospedeiro e o bacilo. Os sítios principais de
implantação extrapulmonar são aqueles com maior suprimento
sanguíneo e, portanto, de oxigênio.1
As formas extrapulmonares apresentam evolução lenta e
geralmente são pobres em bacilos, o que torna o diagnóstico
imediato e conclusivo bastante difícil. Geralmente obter material
para cultura necessita procedimentos invasivos e o índice de
cultura negativa é maior que nas formas pulmonares de doença.
Na maioria das vezes, o tratamento depende de critérios
diagnósticos de probabilidade e os especialistas das
respectivas áreas devem participar do diagnóstico e
tratamento. A concomitância com a TB pulmonar ativa é rara e
a apresentação clínica dependerá do órgão ou sistema
acometido. No ambulatório de TB da Clínica de Pneumologia
da Santa Casa de São Paulo, de 718 doentes que receberam
alta entre 1996 e 2003, 36,9% possuíam alguma forma
extrapulmonar da doença.2
Há estudos que sugerem possível fator genético envolvido
na disseminação extrapulmonar da TB. Comparação entre
doentes curados por TB extrapulmonar e por TB pulmonar
demonstrou uma expressão alterada dos genes para TNF-alfa,
catepsina W e TNFRSF7 (TNF-receptor superfamily member
7), que podem ser fatores de risco para a disseminação
extrapulmonar da doença.3 Outro estudo aponta que adultos
com anti-HIV negativo e TB extrapulmonar possuem menos
linfócitos CD4+ em comparação aos doentes por TB pulmonar
ou infecção latente. Isso sugere que pode existir uma
anormalidade inata na função imune que poderia identificar as
pessoas em risco para manifestações graves da TB.4
2-TUBERCULOSE LINFONODAL (OU GANGLIONAR)
É a segunda forma mais comum de TB extrapulmonar (TB/
EP) em pacientes HIV-negativos e a primeira em HIV-positivos.5
34
Ocorre mais comumente entre os 20 e 40 anos e no sexo
feminino.1 No ambulatório de TB da Clínica de Pneumologia
da Santa Casa de São Paulo, a TB linfonodal corresponde a
20,7% das formas de TB/EP.
Os sintomas variam de acordo com o território ganglionar
acometido, sendo a mais comum a região cervical direita1
(Figura 1). Nos doentes HIV-negativos, a evolução costuma
ser crônica, com febre baixa, emagrecimento e astenia. Há
aumento progressivo do volume ganglionar, o qual, de início,
é indolor e duro1; com a evolução os linfonodos se tornam
macios, podem fistulizar e drenar material seroso ou
purulento. 5 A baciloscopia do aspirado do gânglio tem
Fig.1:Tuberculose linfonodal acometendo região cervical direita
em paciente HIV positivo
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
sensibilidade entre 10 e 25%, elevando-se até 70% quando se
realiza a biópsia. Cultura do aspirado tem sensibilidade entre
50 e 80%, com maior rendimento após biópsia (55 a 90%).1
O diagnóstico diferencial deve ser feito com a
paracoccidiodomicose, sífilis e doenças linfoproliferativas. A
co-infecção com o HIV deve ser sempre investigada.5
3-TUBERCULOSE OCULAR
A TB ocular não é um evento comum e pode comprometer
qualquer estrutura do olho, sendo a úvea a mais acometida.5
Isso ocorre por disseminação hematogênica, por extensão local
de processo infeccioso da vizinhança ou até mesmo
secundariamente a reações de hipersensibilidade tipo IV a
constituintes do MTb. A apresentação ocular ocorre em 1 a
2% dos casos de TB sistêmica e é mais frequente na raça
negra, no sexo masculino, nas crianças e nos idosos, em
situações de baixo nível socioeconômico e em algumas
doenças sistêmicas como o diabetes mellitus, tumores,
alcoolismo, AIDS e silicose.6
A forma aguda da TB ocular se apresenta como uma
conjuntivite flictenular dolorosa. A forma subaguda pode
acometer qualquer parte do olho, sendo mais freqüente no
trato uveal (íris, corpo, ciliar e coróide), e tem como lesão mais
comum a uveíte anterior (irite ou iridociclite). A fundoscopia
mostra aspecto granulomatoso e o teste tuberculínico é
geralmente positivo. Os sintomas locais principais são o déficit
na acuidade visual, fotofobia e dor. 5 As principais
complicações são aumento da pressão intraocular,
descolamento de retina, edema macular, hemorragia vítrea e
catarata.7
O diagnóstico da TB ocular, na maioria das vezes, é
presuntivo e de exclusão; deve-se levar em consideração o
exame oftalmológico e o PPD forte reator. É muito difícil
diferenciar se a lesão ocular é causada por hipersensibilidade
ou pela presença do bacilo. O diagnóstico diferencial deve
ser realizado com toxoplasmose, sífilis, brucelose, toxocaríase
e sarcoidose.
Em nosso serviço, entre 858 doentes tratados por TB entre
1996 e 2004, 6,4% apresentaram a forma ocular, sendo que
nenhum possuía doença pulmonar concomitante ou sorologia
anti-HIV positiva. A média do PPD foi de 22,2 mm nesses
doentes.8
4- TUBERCULOSE CUTÂNEA
As lesões cutâneas pela TB podem decorrer da inoculação
da pele pelo bacilo (TB cutânea propriamente dita) ou podem
ser conseqüência de processo de hipersensibilidade a foco
tuberculoso ativo, localizado em outra parte do organismo tuberculides facultativas.9
Entre as formas de inoculação, o cancro tuberculoso, o
escrofuloderma, o lúpus vulgar, a TB verrucosa e a TB gomosa
são as formas mais conhecidas.
4.1 Cancro tuberculoso.
O cancro tuberculoso é uma forma rara de doença e referese à TBC primária de pele. Há inoculação do bacilo em feridas
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
ou abrasões - que funcionam como porta de entrada -, ou até
mesmo por lesões orais (ulcerações pouco dolorosas)
oriundas de bacilos bovinos do leite. As lesões inicialmente
são em forma de pápula ou nódulo que evoluem para
ulcerações; há linfadenopatia regional que pode fistulizar
(abscesso frio). Raramente evolui para disseminação
hematogênica e o PPD, inicialmente negativo, positiva-se ao
longo da evolução.
4.2 Escrofuloderma
O escrofuloderma (TB coliquativa) decorre geralmente da
propagação do bacilo por focos subjacentes à pele (linfonodos,
ossos e articulações),10 e ocorrem mais frequentemente nas
regiões submandibular, cervical e supraclavicular. Inicialmente
formam-se nódulos subcutâneos eritematosos que fistulizam
e ulceram,5 liberando material purulento (Figura 2). O
diagnóstico pode ser confirmado pela cultura e histologia das
lesões. O diagnóstico diferencial é feito principalmente com
paracoccidioidomicose e actinomicose.9
Fig. 2:Escrofuloderma, representado pela pele adjacente ao
linfonodo com aspecto inflamatório
4.3 Lupus vulgar
O lúpus vulgar acomete geralmente a face, podendo haver
invasão da mucosa oral, nasal e conjuntival. A lesão inicial é
uma mácula ou pápula, com consistência mole, que pode
Fig. 3: Lúpus vulgar
35
coalescer e resultar em placas infiltradas com atrofia central e
ulcerações (Figura 3). O diagnóstico é feito pela clínica,
histopatologia, positividade das culturas e pode-se utilizar
também o PCR.
4.4 Tuberculose gomosa
A TB gomosa se refere à disseminação hematogênica do
MTb em situações de imunodeficiência, levando a surgimento
de nódulos subcutâneos amolecidos que podem fistulizar-se
(Figura 4).
Fig. 4: Nódulos subcutâneos amolecidos compatíveis com
tuberculose gomosa
5- TUBERCULOSE ÓSSEA
Ocorre mais em crianças e em idosos, sendo menos comum
no adulto jovem. O comprometimento ósseo na TB é uma
osteomielite determinada pelo processo inflamatório de
resposta à presença do bacilo. A artrite ocorre por extensão
deste processo para a articulação ou por contaminação direta
por via hematogênica. Apesar de possível comprometimento
simultâneo de vários locais, a TB óssea caracteristicamente é
localizada e acomete mais frequentemente a coluna vertebral,
as articulações do quadril e joelho e as epífises dos ossos
longos. A TB de coluna é responsável por 25 - 60% de todos
os casos de TB óssea.5
5.1 Espondilite tuberculosa ou Mal de Pott
Acomete mais frequentemente indivíduos na quarta e
quinta década. O quadro clínico característico é a tríade dor
lombar, dor à palpação e sudorese noturna.5 A dor é de
instalação lenta e progressiva quanto à sua intensidade.
Sintomas constitucionais são incomuns. As vértebras dorsais
baixas e lombares altas são as de localização preferencial; a
região cervical e o sacro são as áreas menos afetadas.
Paraplegia é a principal complicação da espondilite por TB.
Como a lesão compromete inicialmente a porção anterior
do corpo vertebral, há destruição óssea com formação de
cifose, característica do mal de Pott (Figura 6). O caseo
produzido invade os espaços ligamentares e forma-se um
abscesso paravertebral. Este abscesso, quando atinge a
epífise, resulta em aumento da pressão dentro do osso levando
à protrusão da cortical ou da cápsula articular. 1,5
4.5 Tuberculose verrucosa
A TB verrucosa decorre de um foco contíguo ou devido à
inoculação do bacilo pela pele, levando à formação de pápulas
que evoluem para placas verrucosas de crescimento
excêntrico. O diagnóstico diferencial se faz com leishmaniose,
esporotricose, cromomicose e paracoccidiodomicose.
4.6 Tuberculides facultativas
As tuberculides são manifestações de hipersensibilidade
à distância por foco de TB e as lesões são abacilares ou
paucibacilares. Apresentam uma diversidade de apresentação
clínica sendo as mais conhecidas o eritema nodoso e o eritema
indurado de Bazin (vasculite nodular), que é constituído por
nódulos inflamatórios preferencialmente na parte posterior
das pernas com tendência à ulceração5 (Figura 5).
Fig. 6: Mal de Pott, caracterizado por erosão dos bordos anteriores
do corpo vertebral com diminuição do espaço intervertebral
Fig. 5: Eritema nodoso associado a paniculite por tuberculose
36
A radiografia de coluna pode revelar sinais de necrose e
seqüestração óssea com osteoesclerose ao redor da necrose
e/ou imagens císticas metafisárias. O exame de maior acurácia
na suspeita de espondilite é a ressonância magnética.
A abordagem cirúrgica com biópsia deve ser o procedimento
de escolha para o diagnóstico, mesmo nos casos de abscesso
paravertebral que possa ser abordado por punção. O
diagnóstico definitivo é estabelecido através da cultura ou da
evidência histológica de granuloma no material obtido.
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Espondilite piogênica, brucelose, doença fúngica, além dos
processos neoplásicos, devem ser lembrados como
diagnósticos diferenciais da espondilite por TB.
5.2 Artrite tuberculosa
Acomete mais as articulações coxofemorais e o joelho.
Ocorre uma monoartrite crônica e de evolução lenta. O quadro
se inicia com pequena dor articular que piora à movimentação,
à palpação e no período vespertino. Febre é incomum.
A radiografia mostra distensão da cápsula pelo derrame
local. Posteriormente observa-se atrofia óssea com
espessamento do padrão trabecular e estreitamento do córtex.
A presença de BAAR positivo, cultura positiva no liquido
sinovial, em secreções de fistulas ou em material de biópsia
fecha o diagnóstico. Nenhum marcador parece ser útil para o
diagnóstico da TB articular.1,5 O diagnóstico diferencial deve
ser feito com artrites bacterianas, fungos e doença de Lyme.
6- TUBERCULOSE URINÁRIA
A TB renal é a terceira forma mais freqüente de doença
extrapulmonar, acometendo indivíduos na quinta década.
Apresenta evolução lenta e possui como sintomas mais
prevalentes disúria, polaciúria e dor lombar (pela distensão da
cápsula renal). Sintomas constitucionais como emagrecimento,
astenia, febre, sudorese noturna são pouco freqüentes.1,5 A
TB renal apresenta um dos maiores períodos de latência entre
a primoinfecção e as manifestações clínicas, podendo chegar
a 20 anos.1
O bacilo alcança o sistema urinário e implanta-se e
multiplica-se no córtex renal. A disseminação segue pelas
pirâmides até atingir o sistema coletor comprometendo cálice,
pelve, ureteres e bexiga. Permanece desconhecida a razão pela
qual o desenvolvimento da TB renal geralmente ocorre em
apenas um lado, tendo em vista o comprometimento bilateral
inicial.
A urografia excretora está alterada em 90% dos casos,
devendo ser solicitada na suspeita de TB renal.5 Cavidades
parenquimatosas, dilatação do sistema pielocalicial,
calcificações no parênquima renal, diminuição da capacidade
vesical e estenoses múltiplas dos ureteres são freqüentes. A
ultra-sonografia renal revela com mais detalhes a textura do
parênquima renal, suas delimitações e a presença de
microcalcificações.
A cistoscopia é importante para se afastar comprometimento
vesical e evidencia edema, hiperemia difusa, ulcerações
irregulares e ou infiltrações; é obrigatória em casos de
hematúria macroscópica. A biópsia deve ser indicada e os
fragmentos encaminhados para cultura e anatomopatológico.5
O exame de sedimento urinário revela hematúria e/ou
leucocitúria, sem bacteriúria. Hematúria isolada pode ocorrer
em 10 -15% dos casos, mas este achado isolado é inespecífico.1,5
A cultura de urina no meio de Lowenstein-Jensen é o teste
mais importante para o diagnóstico e deve-se cultivar o volume
total da primeira urina da manhã (maior concentração bacilar)
e não a urina de 24 horas. Um mínimo de cinco amostras, em
dias consecutivos, deve ser solicitado na investigação.5,11 A
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
detecção de ADA na urina é de pouco auxílio e os testes de
amplificação de ácido nucléico ainda estão não estão
padronizados nem validados.11,17
7- TUBERCULOSE DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL
Embora rara, é a forma mais grave de apresentação da TB/
EP e a principal causa de meningite crônica em nosso país.
A meningoencefalite e o tuberculoma intracraniano são as
formas de apresentação mais importantes. Representa 1% de
todos os casos de TB e 6% de todas as infecções
extrapulmonares em indivíduos imunocompetentes.18
Quando ocorrem disseminação e implante no SNC durante
a primo-infecção, na maioria das vezes isso é assintomático; a
imunidade específica competente bloqueia a multiplicação
bacilar e há a formação do granuloma, que contém bacilos
viáveis e latentes por toda a vida do indivíduo. Caso a
imunidade celular específica não se desenvolva
adequadamente, os bacilos podem se multiplicar e iniciar a
doença com comprometimento meníngeo e, posteriormente,
cerebral.
As manifestações clínicas dependerão da intensidade da
inflamação e do local acometido: edema, fibrose, trombose
vascular com infartos, hidrocefalia, hipertensão intracraniana.
A menigite é a forma clínica mais comum, mas tuberculoma
intracraniano e aracnoidite tuberculosa também podem ocorrer
(Figura 7). São mais encontradas em crianças e adultos jovens
em países com alta incidência de TB.
Fig. 7: Ressonância magnética demonstrando comprometimento
do cerebelo em quadro de tuberculose disseminada.
Os sintomas se instalam de maneira lenta (duas semanas):
febre, anorexia, adinamia, cefaléia, vômitos, confusão mental,
alterações do estado mental (geralmente sonolência),
convulsões, alterações visuais e da fala. Ao exame físico
observam-se sinais de irritação meníngea, comprometimento
de pares cranianos (II, III, IV, VI e VIII), alterações do equilíbrio,
37
sinais de hipertensão intracraniana e até decorticação e
descerebração. Ao exame de fundo de olho há edema de papila
e/ou a presença de tubérculos coróides na retina (presente
em até 80% dos casos). O exame do líquido cefalorraquidiano
(LCR) é fundamental para o diagnóstico.
Não há achados patognomônicos nos exames de imagem.
A tomografia computadorizada do crânio mostra a presença e
extensão da aracnoidite basilar, edema cerebral, infartos e a
presença e evolução da hidrocefalia. O diagnóstico se baseia
na análise do líquido cefaloraquidiano (LCR) que mostra
proteínas elevadas (100-500 mg/dl), glicose baixa (< 45 mg/dl) e
100-500 células/microL, com predomínio linfocitário. A cultura
do LCR, apesar de importante, não deve retardar a instituição
do tratamento. O PCR é o método mais rápido para a detecção
do bacilo com sensibilidade de 56% e especificidade de 98%.19
O tratamento se faz com as drogas de primeira linha
associadas aos glicocorticóides, estes recomendados por
diminuir mortalidade e diminuir as seqüelas neurológicas.20
Sem o tratamento, a morte pode ocorrer em 5-8 semanas.
8- TUBERCULOSE PERICÁRDICA
O principal sintoma é a dor torácica, precedida (dias ou
meses) por febre vespertina, sudorese noturna e fadiga.
Geralmente não é concomitante à TB pulmonar e pode
associar-se à forma pleural. A presença de taquicardia,
hipotensão arterial, pulso paradoxal, engurgitamento de veias
jugulares, ictus cardíaco impalpável e hipofonese de bulhas
sugerem tamponamento cardíaco, mas nem sempre estes
sinais estão presentes por ser doença de evolução subaguda.
Atrito pericárdico e insuficiência cardíaca direita
(hepatomegalia, ascite e edema de membros inferiores) podem
ocorrer. Na fase inicial o diagnóstico diferencial com a
pericardite viral aguda é obrigatório.
Leucocitose, aumento da área cardíaca a radiografia de
tórax, baixa voltagem do complexo QRS (ECG), teste
Fig. 8: Radiografia torácica e ecocardiograma demonstrando
derrame pericárdico em doença tuberculosa
38
tuberculínico reator forte e derrame pericárdico ao
ecocardiograma são freqüentemente encontrados (Figura 8).
A punção pericárdica com análise citológica, bioquímica,
pesquisa de BAAR e cultura do material têm baixo rendimento;
deve-se realizar a biópsia de pericárdio. Se não tratada, pode
evoluir para a pericardite constritiva com síndrome de restrição
diastólica. A pericardiocentese percutânea de urgência deve
ser realizada em caso de tamponamento cardíaco com choque
e risco de vida iminente, mesmo na ausência de confirmação
ecocardiográfica.
9- TUBERCULOSE INTESTINAL E PERITONEAL
É incomum e ocorre mais frequentemente na região ileocecal
ou jejunoileal, podendo levar à formação de aderências, massas
ou mesmo estenose da luz. A doença pode se apresentar com
quadro de diarréia intensa ou de suboclusão intestinal. Muitas
vezes é acompanhada de TBC pulmonar. Em algumas situações
o doente comparece devido às complicações tais como
perfuração, hemorragia ou fistulização. US e TC de abdômen,
além do enema opaco e colonoscopia, são úteis para o
diagnóstico (Figura 9). O diferencial deve ser realizado
principalmente com tumores e Doença de Chron; por isso é
fundamental o encaminhamento do material ressecado ou
biopsiado para cultura de micobactérias.
A TB peritoneal normalmente ocorre concomitantemente à
forma intestinal. Pode fazer parte do quadro de polisserosite,
que hoje em dia é mais rara. Ascite é comum, acompanhada
Fig. 9: Colonoscopia demonstrando ulcerações em mucosa em
tuberculose intestinal
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
pelos sintomas gerais próprios da TB e de doença pulmonar.
Punção do líquido ascítico revela exsudato linfocítico e, embora
a avaliação da ADA ainda não esteja validada, valores acima
de 40 U/L são muito sugestivos. O diagnóstico definitivo
ocorre através de biópsia do peritônio, geralmente por via
laparoscópica.
10- TUBERCULOSE GENITAL
TB genital ocorre quase sempre secundária a um foco
pulmonar ou extrapulmonar, como abdominal. O diagnóstico
bacteriológico é difícil por ser uma doença paucibacilar.21
10.1 Trato Genital Feminino
A TB do trato genital feminino é uma importante causa de
disfunção menstrual (oligomenorréia e amenorréia) e
infertilidade. A infertilidade secundária a TB genital é 10 - 15
vezes mais comum em países em desenvolvimento.21
As trompas de Fallopio são afetadas em 94% das mulheres
com TB genital, geralmente com envolvimento bilateral, por
via hematogênica. A disseminação da salpingite pode causar
peritonite, endometriose e raramente cervicite e vaginite. Podese apresentar com múltiplas estenoses ou obstrução da trompa
de Fallópio e calcificação de linfonodos da região anexial. É
recomendada a realização da histerossalpingografia para
identificação das lesões.22
O endométrio é o segundo local acometido (50-80%) das
mulheres com TB genital. Inicialmente as lesões
endometriais não são macroscopicamente visíveis, mas
caseificação e ulceração ocorrem com a progressão da
doença. Nos casos avançados ocorre adesão endometrial
com deformidade e obstrução da cavidade uterina. A
destruição total do endométrio leva a amenorréia secundária
(Síndrome de Asherman) e infertilidade, geralmente
irreversíveis.23
A TB mamária é uma doença rara mesmo em países onde a
TB ainda é prevalente como África e Índia,21 e apesar do
aumento dos casos de SIDA. Poucos relatos foram descritos
até hoje talvez devido ao difícil diagnóstico, já que se
apresentam clinicamente semelhantes aos carcinomas e
abscessos piogênicos.23 O tecido mamário é considerado
resistente à multiplicação do bacilo, sendo que a lactação
favorece a infecção por aumento da vascularização.22 Acomete
preferencialmente mulheres jovens com envolvimento
unilateral das mamas. O diagnóstico é feito por análise
microbiológica por pesquisa direta (bacterioscopia) e cultura
do material ou análise histopatológica.22
A infecção pode ocorrer de forma primária (quando o bacilo
penetra diretamente na mama através das aberturas dos ductos
mamários ou de abrasões) ou de forma secundária por via
hematogênica, linfática ou contigüidade. A mastite pode se
manifestar através da formação de nódulos ou massas
delimitadas, de crescimento lento, com envolvimento da pele
e ulceração, cujo diferencial se faz com fibroadenoma ou
carcinoma. Outra apresentação clínica seria a mastite
confluente ou disseminada, com múltiplos focos caseificados,
formação de fístulas e envolvimento linfonodal axilar.21
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Mulheres jovens podem apresentar a forma de abscesso
mamário.
10.2 Trato Genital Masculino
O envolvimento da próstata e vesículas seminais é
geralmente secundário a uma infecção do trato geniturinário
superior e pode se manifestar com necrose, calcificação,
caseificação e cavitação.22
A epididimite é a causa mais comum de TB de epidídimo,
cuja disseminação ocorre via hematogênica ou por contigüidade
com a próstata e vesículas seminais. A infecção se espalha
para o testículo ipsilateral, principalmente se o tratamento não
for instituído rapidamente. As lesões caracterizam-se por
nódulos necróticos, geralmente com calcificações. A orquituberculose é considerada a extensão da epididimotuberculose.22
O diagnóstico diferencial se faz com tumor, infecção bacteriana
e sarcoidose.24
As lesões da TB de bolsa escrotal geralmente são
semelhantes ao tumor testicular e infarto; podem mimetizar
torção testicular, com dor e edema.24
A TB do trato genital masculino responde bem ao tratamento,
porém a cirurgia será necessária nos casos graves de
epidídimo-orquituberculose.24
11- CONCLUSÕES
A TB extrapulmonar geralmente é de difícil diagnóstico e na
maioria das vezes o tratamento depende de critérios
diagnósticos de probabilidade. Estudos ainda são necessários
para se determinar os fatores envolvidos na disseminação
extrapulmonar da TB, embora resultados preliminares apontem
alguma expressão genética alterada ou anormalidade imune
para manifestações graves da TB.
Manter alto nível de suspeição, realizar radiografia torácica,
PPD e avaliação do estado imunológico são fundamentais
para o diagnóstico. Biópsia e cultura devem ser realizadas
sempre que possível para se confirmar o diagnóstico ou a
presença de micobactéria não tuberculosa.
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Mauro Gomes
[email protected]
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Glaxo
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
41
RELATO DE CASO
Síndrome Lady Windemere ou
bronquiectasias difusas
AUTORES:
Maria Inês Bueno de André Valery1; Flávio Gnecco Lastebasse2 ; Márcio Ferreira dos Santos3
SERVIÇO:
Serviço de Doenças do Aparelho Respiratório do Hospital do Servidor Público Estadual “Francisco
Morato de Oliveira”
1
Médica assistente - Pneumologista (TESBPT)
Médico assistente - Pneumologista (TESBPT)
3
Médico residente
2
INTRODUÇÃO
As micobactérias não tuberculosas (MNT) produzem
doenças em humanos, pássaros e outros animais. Estes agentes
são isolados do meio ambiente e mais de cem espécies já foram
identificadas. A maioria das espécies raramente produz doença
no homem e a prevalência dessas infecções não é conhecida.
A principal via da infecção é a inalatória.
Todas as micobactérias são ao exame direto à coloração de
Ziehl-Neelsen, bacilos álcool-ácido resistentes (BAAR), não
sendo possível a identificação apenas por este método. A
identificação da espécie é feita pela cultura de secreções ou
tecidos.
A infecção organismos do complexo M. avium ocorre por
via inalatória e digestiva e a doença pulmonar apresenta-se
principalmente sob duas formas clínicas: a clássica patologia
cavitária associada à doença pulmonar preexistente e a forma
não clássica ou de bronquiectasias difusas ou Síndrome de
Lady Windermere.
RELATO DO CASO
Paciente do sexo feminino, 43 anos, encaminhada ao
ambulatório com tosse crônica de fraca intensidade há mais
de seis meses, acompanhada de expectoração escassa, sem
outros sintomas. Ex - tabagista 12 maços/ano, sem fumar há 16
anos. O exame físico era normal. À radiografia de tórax
apresentava opacidades intersticiais pulmonares bilaterais com
predomínio nos terços inferiores. Realizada tomografia
computadorizada de tórax que evidenciou bronquiectasias,
nódulos e aspecto de “árvore em brotamento” (Figuras 1,2,3).
A prova tuberculínica com PPD foi positiva (17 mm). As coletas
de escarro requisitadas foram realizadas com pesquisa e cultura
para BAAR (três amostras), colhidas com intervalos entre duas
a quatro semanas. Foi realizada também broncoscopia quando
foi observada hiperemia por toda mucosa brônquica, com
moderada quantidade de secreção. As pesquisas de BAAR
nas três amostras de escarro foram positivas e, nas culturas
de escarro e do lavado broncoalveolar, foi identificado M.
42
avium. O diagnóstico de Síndrome de Lady Windermere ou
doença pulmonar por M. avium, apresentação não clássica,
de bronquiectasias difusas foi estabelecido. A paciente iniciou
tratamento preconizado pela American Thoracic Society (ATS)
por 13 meses com boa evolução e cura bacteriológica.
DISCUSSÃO
Infecção pulmonar não clássica ou bronquiectasias difusas
ou Síndrome de Lady Windermere
A doença geralmente ocorre em mulheres em cerca de 81%
dos casos. A idade média é de 66 anos e não há patologias
Fig 1. TC de tórax: nódulos em pulmão esquerdo
Fig 2. TC de tórax: bronquiectasias à esquerda
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Fig 3. TC de tórax: pequenos nódulos e aspecto de “àrvore em
brotamento” à esquerda
predisponentes. Quando acomete mulheres jovens há uma
associação com o prolapso de válvula mitral e o pectus
excavatum1,2. O quadro clínico caracteriza-se por tosse crônica
produtiva com ou sem escarro purulento. Habitualmente o
padrão radiológico é o de nódulos difusos ou localizados nos
terços inferiores dos pulmões. A tomografia computadorizada
de tórax evidencia pequenos nódulos centrolobulares, em torno
de 5 mm, presença de bronquiectasias cilíndricas no mesmo
lobo e imagem de aprisionamento aéreo. A combinação de
bronquiectasias com nódulos centrolobulares têm
sensibilidade de 80% e especificidade de 87% para a presença
de cultura positiva para o complexo M. avium.3
A infecção no indivíduo imunocompetente pelo complexo
M. avium leva a formação de granulomas peribronquiais na
grande via aérea e bronquíolos, aproximando-os. Os
granulomas ao romper a camada muscular levam a formação
das bronquiectasias. Os nódulos centrolobulares e
aprisionamento aéreo na tomografia computadorizada de alta
resolução representam a bronquiolite, secundária à infecção
pelo complexo M. avium na pequena via aérea.4
Critérios diagnósticos para doença por MNT
As MNT identificadas representam um grande número de
espécies, com amplo espectro de virulência e variabilidade de
sensibilidade o que torna os critérios a serem adotados
insuficientemente acurados para abranger a todas as
circunstâncias clínicas. As infecções por MNT são geralmente
de baixa virulência necessitando de seguimento longo para
decisão quanto ao início do tratamento. A diferenciação entre
colonização e doença necessita a realização de exames e
acompanhamento seriado de longo prazo.5 Pacientes com
sintomas transitórios ou autolimitados, com uma única amostra
de escarro positiva, que persistem assintomáticos, mantendo
radiografia de tórax normal, posteriormente múltiplas culturas
negativas, não possuem doença por MNT significativa.
Pacientes com isolamento de MNT repetidamente de material
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
respiratório, associado a alterações clínicas e radiológicas,
indicam doença.
Os critérios da ATS6,7 e da BTS8 estão resumidos nos
Quadros 1 e 2.
Os critérios da ATS são de difícil aplicação em populações
de alto risco e em populações de países em desenvolvimento,
pelo grande número de exames requeridos. O meio de cultura
para micobactérias mais utilizado no nosso meio é o de
Lowestein-Jansen, que necessita de períodos prolongados
para a obtenção do resultado. A decisão de tratamento deve
ser guiada pelo potencial patogênico da MNT isolada,
considerando-se, como exemplo, uma única cultura positiva
para M. kansasii realizada adequadamente como diagnóstica
quando associada a achados clínicos e radiológicos. Essa
condição provavelmente seja válida para M. abscessus, M.
szulgai, M. malmonense e talvez para o complexo M. avium. O
aumento da experiência, estudos de longo prazo com número
significativo de pacientes, permitirão adequar os critérios a
cada espécie encontrada.
A orientação terapêutica proposta para Infecção pulmonar
com bronquiectasias difusas pelo complexo M. avium difere
Quadro 1: Critérios da ATS
Diagnóstico da doença pulmonar por MNT
Critérios para pacientes sintomáticos com infiltrado
nodular ou cavitário ou tomografia evidenciando múltiplos
nódulos e/ou bronquiectasias
A) se 3 amostras de escarro ou lavado brônquico obtidos
nos últimos 12 meses
1.O exame direto é negativo e as 3 culturas são
positivas
2.1 exame direto é positivo e as 2 culturas são positivas
B) se apenas 1 lavado brônquico for disponível
1. O exame direto é positivo e 1 cultura é positiva
C) se exame escarro ou lavado brônquico evolutivos não
são diagnóstico ou patologia não pode ser descartada
2. biópsia transbrônquica ou pulmonar demonstrando
infecção por MNT ou
3. biópsia demonstrando alterações histológicas
compatíveis com infecção por micobactérias e 1 ou mais
amostras de material respiratório positivas para uma
MNT sempre em pequeno número
Quadro 2: Critérios da BTS
Diagnóstico da doença pulmonar por MNT
2 ou mais culturas positivas de escarro obtidas com
intervalo maior ou igual há 7 dias
Imagens radiográficas sugestivas de infecção por
micobactérias
Quadro clínico não obrigatório
43
entre as duas associações: A ATS sugere o tratamento com
claritromicina ou azitromicina, rifampicina e etambutol por um
período de 1 ano com culturas negativas; a BTS sugere um
esquema com rifampicina, etambutol e isoniazida (discutível)
por 2 anos. Sugere também como opção estreptomicina,
ciprofloxacino e claritromicina.
CONCLUSÃO
O diagnóstico de infecção e/ou doença pulmonar com
bronquiectasias difusas pelo complexo M. avium requer
cuidadosa observação clínica, radiológica e bacteriológica,
além de rigor no acompanhamento do paciente. A necessidade
da realização de culturas para a confirmação do diagnóstico
das MNT aponta para a necessidade da realização desse
método nos casos suspeitos de doença.
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opportunist mycobacterial infectious. Thorax 2000:210-8.
Maria Inês Bueno de André Valery
[email protected]
44
SUBCOMISSÕES SPPT
2008/2009
ASMA
Lilian Serrasqueiro Ballini Caetano
[email protected]
CÂNCER
Ilka Lopes Santoro
[email protected]
CIRCULAÇÃO
Adriana Ignacio de Padua
[email protected]
DISTÚRBIOS RESPIRATÓRIOS DO SONO
Sônia Maria G. P. Togeiro
[email protected]
DOENÇAS INTERSTICIAIS
Mariana Silva Lima
[email protected]
DPOC
Maria Vera Cruz de Oliveira Castellano
[email protected]
EPIDEMIOLOGIA
Valdelis Novis Okamoto
[email protected]
INFECÇÕES RESPIRATÓRIAS E MICOSES
Mauro Gomes
[email protected]
PLEURA
Alex Gonçalves Macedo
[email protected]
DOENÇAS AMBIENTAIS E OCUPACIONAIS
Ubiratan de Paula Santos
[email protected]
TABAGISMO
Sérgio Ricardo R. de Almeida Santos
[email protected]
TERAPIA INTENSIVA
Pedro Caruso
[email protected]
TUBERCULOSE
Sidney Bombarda
[email protected]
FUNÇÃO PULMONAR
Roberto Rodrigues Júnior
[email protected]
IMAGEM
Gustavo de Souza Portes Meirelles
[email protected]
DOENÇA PULMONAR AVANÇADA
Ilma Aparecida Paschoal
[email protected]
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
IMAGEM EM PNEUMOLOGIA
Aspectos tomográficos da
Tuberculose pulmonar
AUTOR:
Sidney Bombarda1
SERVIÇO:
Disciplina de Pneumologia do Hospital das Clínicas da FMUSP.
1
Doutor pela FMUSP. Médico assistente.
INTRODUÇÃO
A tuberculose (TB) é uma doença infecciosa ocasionada
por micobactérias do Complexo Mycobacterium
tuberculosis, que incluem M. tuberculosis, a mais frequente,
M. bovis, M. africanum, M. microti e M. canetti. As outras
micobactérias, mais de 120 espécies conhecidas, são
denominadas micobactérias não tuberculose (MNT).
Calcula-se que apenas 10% dos indivíduos infectados
pelo bacilo M. tuberculosis desenvolvem doença ativa,
cerca de 5% no decorrer nos primeiros 2 anos e outros 5%
no resto da vida. Este risco de reativação da infecção e
desenvolvimento de doença é mais elevado em indivíduos
cimunodeprimidos como aqueles infectados pelo vírus
HIV.1
O diagnóstico de certeza de TB pulmonar é obtido através
da identificação do M tuberculosis no escarro ou em fragmento
de tecido. No entanto, o Programa Nacional de Controle da
Tuberculose também considera como indicativo de doença o
encontro de bacilos álcool-ácido resistentes em duas amostras
de escarro ou ainda a presença de imagem radiológica sugestiva
e/ou outros exames complementares que, associados aos
achados clínicos e epidemiológicos, sugiram TB.2
Entre os métodos de imagem, a radiografia do tórax é o de
escolha na avaliação inicial da doença e no acompanhamento
da TB pulmonar. A tomografia computadorizada do tórax
(TC) é indicada nos casos em que existe a suspeita de TB
pulmonar e a radiografia inicial é normal, na diferenciação
com outras doenças torácicas e em pacientes com AIDS ou
outras doenças imunossupressoras, especialmente na
presença de febre de origem desconhecida, emagrecimento
ou linfonodomegalia.3
A tomografia por emissão de pósitrons (PET) utilizando o
18F-fluorodeoxiglicose (FDG) tem sido utilizada no
diagnóstico e estadiamento de vários tipos de câncer, com
alta sensibilidade no diagnóstico de nódulos ou massas
pulmonares de origem neoplásica. No entanto, outras
doenças inflamatórias ou infecciosas que cursam com
aumento do consumo de glicose, podem levar à captação
aumentada do radiofármaco e, entre essas, a TB.3
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
DESCRIÇÃO DOS ACHADOS
Ao serem inalados, os bacilos atingem os alvéolos
pulmonares e são fagocitados pelos neutrófilos ou
macrófagos alveolares onde podem ser eliminados ou evoluir
para doença ou permanecer em forma latente. A forma
primária da doença ocorre logo após a infecção de acordo
com a carga bacilar, a virulência do bacilo aspirado e a
imunidade do hospedeiro.
A presença do bacilo no parênquima pulmonar promove
inicialmente a formação de um processo inflamatório que se
manifesta radiologicamente como consolidações
parenquimatosas que, por vezes, podem ser indistinguíveis
das pneumonias de outra etiologia. Os bacilos atingem a
corrente sanguínea e podem desencadear a TB miliar,
especialmente em crianças ou em indivíduos
imunodeprimidos. Nessa forma são visualizados na TC
diminutos nódulos, de 2 a 3 mm, de distribuição randômica
em ambos os pulmões (Figura 1). Esses nódulos são
representativos da disseminação do M tuberculosis que
ocorre no pulmão e em outros órgãos.
As linfonodomegalias correm com maior freqüência em
crianças menores de 5 anos de idade e em indivíduos com
AIDS. Linfonodos aumentados com áreas de baixa
atenuação central correspondendo a focos de necrose
Fig. 1. TC de tórax: Micronódulos distribuidos randomicamente
em ambos os pulmões
45
caseosa são visualizadas na TC, com sensibilidade maior do
que a radiografia de tórax.4 A lifonodomegalia mediastinal
pode ocasionar a compressão dos brônquios e consequente
atelectasia ou ainda lesões na parede brônquica com
drenagem de material necrótico para dentro da luz brônquica
(TB endobrônquica).
A partir do foco parenquimatoso local ocorre a formação
de granulomas cuja função é conter os bacilos impedindo-os
de atingir outros locais do pulmão ou de outros órgãos. Na
evolução para doença ocorrem focos de necrose caseosa no
interior desses granulomas e a eliminação desse material
necrótico por brônquios de drenagem leva à formação de
cavidades pulmonares, onde os bacilos multiplicam-se com
maior intensidade.
As cavidades podem ser únicas ou múltiplas e suas
paredes geralmente são espessas na fase ativa da doença
(Figura 2). Na forma ativa da TB, as cavidades apresentamse em 40% a 45% dos casos e, após a cura, evoluem para
cicatrização, cujo aspecto residual são as estrias,
calcificações e retrações do parênquima acometido. As
cavidades podem também permanecer com suas paredes mais
delgadas após a cura, representando a sequela ou inatividade
do processo específico. Alguns autores sugerem que esses
achados devem ser descritos como “radiologicamente
estáveis” ao invés de “inativos”, pela possibilidade de
recrudescência futura de bacilos latentes.3
Fig.3. TC de tórax: Consolidação à direita. Nódulos cavitados em
ambos os pulmões
Fig. 4. TC de tórax: Massa à direita e nódulos em ambos os
pulmões
Fig. 2. TC de tórax: Cavidade de paredes espessas, pequenos
nódulos e aspecto de “árvore em brotamento” à direita. Pequenos
nódulos de distribuição segmentar à esquerda
A disseminação do M tuberculosis através dos brônquios
resulta em novos focos de infecção, em outros segmentos
pulmonares. Pequenos nódulos de distribuição segmentar
são o achado tomográfico mais frequente na fase ativa da
doença (82% a 100%). Esses nódulos tendem a confluir em
62% a 71% ou a formar nódulos maiores em até 66% dos
casos. O aspecto de consolidação segmentar ou lobar é
observado em 47% a 62% dos casos e pode ocorrer em
associação com linfonodomegalia hilar ou mediastinal. A
presença de múltiplos nódulos que coalescem resultam em
imagens tomográficas como nódulos, massas e
consolidações (Figuras 3 e 4).3
46
O espessamento da parede brônquica ocorre em
aproximadamente 62% dos casos e bronquiectasias são
observadas em 23% dos pacientes com TB pulmonar. O
aspecto de “árvore em florescência” está presente em até
57% dos casos (Figura 5). A distorção da arquitetura em
locais onde, previamente, eram observados nódulos
centrolobulares e espessamento broquiolar, sugere que a
estenose brônquica ou bronquiolar sejam responsáveis pelo
mecanismo de enfisema observado após a cura (Figura 6).3
A presença de bacilos ou proteínas do bacilo no espaço
pleural decorrente de disseminação hematogênica ou linfática
ou por contato anatômico pode ocasionar infecção e derrame
pleural. No Brasil, é a forma mais comum de apresentação
extrapulmonar da TB, representando cerca de 8% do total
de casos. Estudos tomográficos demonstram alta freqüência
de alterações parenquimatosas associadas na TB pleural,
sugerindo que freqüentemente esta é uma doença
pleuropulmonar.5
Em idosos o diagnóstico é mais difícil porque, além do
grande número de condições associadas, apresentações
atípicas podem ser observadas como o acometimento de
segmentos inferiores e menor número de cavidades. Também
em diabéticos os segmentos inferiores são mais acometidos,
porém com maior número de cavidades do que entre os não
diabéticos (Figura 7).6 Nos pacientes com alterações da
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
presença ou não de uma doença de base e da espécie da
micobactéria. Na doença causada pelo complexo M avium,
os achados mais frequentes são cavidades de paredes e
espessamento pleural apical, opacidades retículo-nodulares
bilaterais, nódulos centro lobulares e aspecto de árvore em
florescência além de bronquiecatsias. Na doença por M
kansasii geralmente são obervadas cavidades de paredes
finas nos lobos superiores e múltiplos pequenos nódulos.
Opacidades retículo-nodulares, pequenos nódulos,
bronquiectasias e consolidações são observadas na doença
por M abcessus, M fortuitum e M chelonae.7
Fig. 5. TC de tórax: Pequenos nódulos de distribuição segmentar
à esquerda. Nódulos e aspecto de “árvore em brotamento”
bilateralmente
CONCLUSÃO
A TC de tórax apresenta alta sensibilidade na
caracterização da TB pulmonar. Em pacientes com suspeita,
a TC complementa a investigação diagnóstica e pode
demonstrar pequenos focos de doença parenquimatosa e
ganglionar, além de lesões apicais pulmonares não
visualizadas na radiografia de tórax. É útil também na
avaliação da extensão da doença no parênquima pulmonar.
O adequado conhecimento dos sinais tomográficos
sugestivos de atividade de TB é um importante subsídio
para o diagnóstico da doença, especialmente nos casos em
que a radiografia de tórax inicial é normal e na ausência de
confirmação bacteriológica.
REFERÊNCIAS
1.
Fig. 6. TC de tórax: Redução volumétrica do pulmão esquerdo
com bronquiectasias de tração
2.
3.
4.
5.
6.
7.
Fig. 7. TC de tórax: Cavidade em lobo inferior direito em paciente
diabético
imunidade celular os achados radiológicos mais freqüentes
são a disseminação miliar e/ou consolidações difusas.
As doenças pulmonares por MNT podem apresentar
imagens radiológicas semelhantes à TB e dependem da
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Sonnenberg P, Glynn Jr, Fielding K et. al. How soon after
infection with HIV does the risk of tuberculosis start to
increase? A retrospective cohort study in South African
gold miners. J Infect Dis 2005;191:150-8.
Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. II
Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004. J Bras
Pneumol 2004;30(1):7-85.
Bombarda S, Figueiredo CM, Funari MBG et al. Pulmonary
tuberculosis imaging. J. Pneumologia 2001;27 329-40.
Kim WS, Choi JI, Cheon JE. et. al. Pulmonary tuberculosis
in infants: radiographic and CT findings. AJR Am J
Roentgenol 2006;187(4):1024-33.
Seiscento M, Bombarda S. Tuberculose. In: Vargas FS;
Teixeira LR; Marchi E. Derrame Pleural, 1. ed.rev São Paulo:
Roca, 2004. Cap. 30, p.271-84.
Perez-Guzman C, Torres-Cruz A, Villareal-Velaverde H,
Vargas MH. Progressive age-related changes in pulmonary
tuberculosis images and the effect of diabetes. Am J Respir
Crit Care Med 2000;162:1738-40.
Muller N. Nontuberculous Mycobacterial Pulmonary
Disease.In: Muller NL; Franquet T; Lee KS. Imaging of
Pulmonary Infections, editora Lippincott Willians &
Wilkins, 2007. Cap 4, p.79-93.
Sidney Bombarda
[email protected]
47
EPIDEMIOLOGIA CLÍNICA
O que é análise multivariada?
AUTORA:
Valdelis Novis Okamoto1
SERVIÇO:
Hospital AC Camargo – Unidade de Terapia Intensiva
1
Doutora em Ciências (Área de concentração: Pneumologia) pela Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo
Na última edição do Pneumologia Paulista, vimos que a
estatística analítica serve para fazermos comparações entre
grupos ou situações de interesse. O princípio dessas
comparações é sempre o mesmo, baseado em um teste de
hipóteses. A hipótese nula é a de que não existe diferença
entre os grupos na população da qual a amostra de estudo
foi retirada. A hipótese alternativa é a de que existe tal
diferença entre grupos. Partindo do princípio de que a
hipótese nula é verdadeira, avaliamos a magnitude da
diferença observada entre os grupos na amostra. Ora, se a
diferença observada entre os grupos na amostra for pequena,
é bem provável que ela possa ter ocorrido por acaso, mesmo
não havendo diferença entre grupos na população. Eu aceito
a hipótese nula. Mas, quanto maior for a diferença observada
entre os grupos da amostra, menor a probabilidade de que
essa diferença tenha acontecido por acaso, partindo do
pressuposto que, na população, não existe diferença entre
os grupos. Quanto menor essa probabilidade (que é o valor
de p), mais desconfortáveis ficamos com a hipótese nula. Se
a probabilidade for menor que 5% (p<0,05), rejeitamos a
hipótese nula. Os cálculos para se chegar ao valor de p variam,
mas sempre seguem esse princípio. Como clínicos, não
precisamos nos preocupar demais com a maneira pela qual
os softwares estatísticos fazem esses cálculos, mas sim com
a compreensão dos conceitos que os norteiam.
Análise multivariada é o nome genérico dado ao conjunto
de ferramentas estatísticas que permite a associação de uma
variável de desfecho (ou dependente) a um punhado de
variáveis preditoras (ou independentes). Os modelos
multivariados podem ser entendidos como uma versão
simplificada da realidade. Através da análise multivariada,
podemos conhecer a influência “líquida” de cada uma das
variáveis preditoras sobre a variável de desfecho. Na tabela
a seguir, temos exemplos de modelos lineares generalizados
(em inglês, generalized linear models – GLM para os íntimos)
muito conhecidos na literatura médica.
A primeira coisa interessante na Tabela 1 é que todos os
modelos lineares generalizados: regressão linear, regressão
logística, regressão de Cox e regressão de Poisson têm a
mesma equação básica: β0 + β1 * X1 +β2 * X2 + … +βk * Xk,
onde k é o número de variáveis independentes. Os pares β1
* X1, β2 * X2, ...,βk * Xk são as variáveis independentes (os
“X”) e os seus respectivos “pesos”, ou melhor, coeficientes
(os “β”).
Deu para perceber que o que muda entre os diferentes
tipos de modelos lineares generalizados é a variável
dependente e seu significado. Vamos conversar sobre isso
mais adiante.
Começando com a regressão linear, temos que Y= β0 + β1
* X1 +V2 * X2 + … + βk * Xk. Como exemplo, vamos usar um
modelo preditor da capacidade vital forçada (CVF),
utilizando-nos da regressão linear: CVF= 510 + 110* (sexo) +
22* (altura) – 18*(idade), onde, CVF= capacidade vital
forçada (em mL); sexo: masculino= 1, feminino= 0; altura: em
centímetros; idade: em anos. Qual a capacidade vital forçada
predita para um rapaz de 25 anos e 170 cm de altura?
CVF= 510 + 110* (sexo) + 19* (altura) – 18*(idade)
CVF= 510 + 110* (1) + 19*(170) – 18* (25)
CVF= 3400 mL
Notem que o fato da pessoa ser do sexo masculino
acrescenta 110mL à sua CVF, segundo o nosso modelo. A
cada centímetro a mais de altura, a CVF aumenta 22mL. Por
outro lado, a cada ano de vida, a CVF diminui em 18mL.
Com esse modelo de regressão linear, podemos predizer a
CVF de uma pessoa, através dos dados de sexo, idade e
altura. Como esse modelo foi derivado? Bem, conhecendo
CVF, sexo, altura e idade (respectivamente, Y, X1, X2 e X3) de
uma amostra representativa e suficientemente grande de
pessoas, chegamos aos nossos coeficientes 510, 110, 22 e 18 (respectivamente β0, β1 , β2 e β3).
Na próxima edição do Pneumologia Paulista,
Tabela 1: Modelos lineares generalizados
48
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
conversaremos em maior detalhe sobre os princípios a que
obedece a regressão linear.
4.
5.
REFERÊNCIAS
1.
2.
3.
MECOR Lectures. Level 1. Steve Mc Curdy. Disponíveis
no http://www.thoracic.org/sections/meetings-and-courses/
mecor-courses/resources/Biostatistics/Biostat5.pdf
Introdução à bioestatística para simples mortais. Ulysses
Doria Filho.Primeira edição, 1999. Editora Negócio.
Epidemiologia clínica: elementos essenciais. Robert H.
Fletcher, Suzanne W. Fletcher, Edward H. Wagner. Terceira
edição, 1996. Artes Médicas.
6.
Primer of biostatistics. Stanton Glantz. Fourth edition, 1996.
Mc Graw Hill.
Practical Statistics for Medical Research. Douglas G. Altman.
First edition, 1991. Chapman & Hall / CRC.
Epidemiology beyond the basics. Moyses Szklo & F Javier
Neto. Second edition, 2006. Jones and Bartlett Publishers.
Valdelis Novis Okamoto
[email protected]
INFORME
RELAÇÃO DOS CENTROS DE ATENDIMENTO
“PROTOCOLO DE DPOC”
ARARAQUARA
Núcleo de Gestão Assistencial
Dr. Marcos Abdo Arbex
Tel. (16) 3336 5228 - [email protected]
R. Voluntários da Pátria, 2104 Centro
Araraquara/SP - 14801-320
SOROCABA
Conjunto Hospitalar de Sorocaba
Dra. Sônia Ferrari Perón
Tel. (15) 3231 3221 - [email protected]
R. Salvador Correa, 421 Jardim Vergueiro
Sorocaba/SP - 18030-130
BAURU
Deborah Maciel Cavalcanti Rosa
Tel. (14) 3103 7777 (Hospital Estadual Bauru) [email protected]
Av. Luiz Edmundo Carrijo Coube, 1-100
Núcleo Geisel - Bauru/SP - 17.033-360
SANTOS
Hospital Guilherme Álvares
Dr. Virgílio Alexandre Nunes Aguiar
Tel. (13) 3237 0302 - [email protected]
Av. Pinheiro Machado, 430 - Santos/SP - 11075-000
BOTUCATU – UNESP
Dra. Irmã de Godoy
Tel.(14) 3882 2969 - [email protected] Dep Clínica Médica Fac de Med de Botucatu/UNESP
S/N Distrito de Rubião Júnior
Rubião Júnior/SP - 18618-970
CAMPINAS – UNICAMP
Dra. Ilma Aparecida Paschoal –
Tel. (19) 3521 7907 - [email protected]
Rua Serra da Bocaina, 178
Campinas/SP - 13100-449
MARÍLIA – FAMEMA
Dra. Virgínia Maria Cavallari Strozze Catharin –
Tel. (14) 3433 3412 - [email protected]
R. Vinte e Quatro de Dezembro, 435 Centro
Marilia/SP - 17500-060
RIBEIRÃO PRETO – FMUSP-RP
Dr. Elcio dos Santos Oliveira Vianna
Tel. (16) 3602 2706 - [email protected]
Av. Bandeirantes, 3900 Vila Monte Alegre
Ribeirão Preto/SP - 14049-900
SÃO JOSÉ DO RIO PRETO – FAMERP
Dra. Marisa Richard P. da Costa Lima
Tel. (17) 3235 1457 – [email protected]
R. Rubião Júnior, 2649 Centro
São José do Rio Preto - 15010-090
SÃO PAULO – FMUSP
Dr. Alberto Cukier
Tel. (11) 3069 7577 R. 32 - [email protected]
Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44 5º andar - Bloco 2
Cerqueira César – São Paulo/SP – 05403-000
SÃO PAULO – UNIFESP
Dr. José Roberto Jardim
Tel. (11) 5572-4301 / 5579-3412
[email protected]
Rua dos Assores, 310 Jd. Lusitânia
São Paulo/SP - 04032-060
SÃO PAULO – FCMSCSP
Dr. Roberto Stirbulov
Tel. (11)2176 7288 - [email protected]
R. Baronesa de Itú, 610 - Conj. 93 Santa Cecília
São Paulo/SP - 01231-000
TAUBATÉ
Hospital Regional de Taubaté
Dra. Denise Moreira de Andrade Cotrim
Tel. (15) 3634-2000 - [email protected]
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
49
FUTURO DA PNEUMOLOGIA
Biologia molecular no diagnóstico da
Tuberculose e outras micobacterioses
AUTORES:
Erica Chimara1; Sylvia Cardoso Leão2
SERVIÇOS:
Seção de Bacteriologia – Setor de Micobactérias Instituto Adolfo Lutz
Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia Universidade Federal de São Paulo
1,2
Doutor em Ciências pela Universidade Federal de São Paulo
INTRODUÇÃO
As micobactérias são organismos álcool-ácido
resistentes, aeróbicos, classificados em mais de 130
espécies atualmente.1 O agente causador da tuberculose,
considerada uma emergência global devido ao elevado
número de mortes e novos casos, pertence ao complexo
Mycobacterium tuberculosis (CMT). No entanto, outras
espécies citadas como micobactérias não tuberculosas
(MNT) também estão associadas à doença humana e sua
frequência tem aumentado nos últimos anos em todo o
mundo.2 Embora o diagnóstico destas doenças ainda seja
realizado primeiramente com base em métodos
convencionais, como baciloscopia e cultura, muitos métodos
moleculares estão sendo introduzidos e incorporados nas
rotinas dos laboratórios de micobacteriologia em todo o
mundo. Esses métodos têm por objetivo obter o diagnóstico
rápido com maior sensibilidade e especificidade.
Avanços nas técnicas de Biologia Molecular e a
informação proporcionada pelo sequenciamento do genoma
completo de Mycobacterium tuberculosis3 estimularam o
desenvolvimento de novas ferramentas para o diagnóstico
rápido da tuberculose, a diferenciação de M. tuberculosis
de outras micobactérias e a detecção rápida de resistência
a drogas.4
Neste trabalho, revisamos métodos moleculares utilizados
atualmente para o diagnóstico das micobacterioses,
verificando sua utilidade para o laboratório de
micobacteriologia.
1. Detecção e identificação de micobactérias a partir de
material clínico
Métodos convencionais de detecção de M. tuberculosis
baseados em cultivos em meios sólidos são demorados devido
ao crescimento lento dos bacilos. As técnicas de cultivo em
meio líquido diminuíram o tempo de detecção para 10-14 dias
ao invés de várias semanas, requeridas com os meios
convencionais. Vários testes moleculares baseados em
amplificação de ácidos nucléicos foram desenvolvidos para
diminuir ainda mais o tempo de diagnóstico.
50
1.1. Métodos “in-house”
Diferentes protocolos baseados em PCR (Polymerase Chain
Reaction) têm sido testados em laboratórios de todo o mundo,
para detecção e identificação de bactérias pertencentes ao
CMT, utilizando diferentes sequências de DNA ou RNA,
gênero ou espécies-específicas, com detecção dos produtos
amplificados realizada em géis de agarose ou acrilamida ou
com diferentes técnicas de hibridização. A maioria dos
protocolos utiliza a sequência repetitiva de inserção IS6110,
que é específica para o CMT e está presente em múltiplas
cópias (1-25) no genoma de isolados de M. tuberculosis.5 A
desvantagem está na existência de isolados de M. tuberculosis
que perderam as seqüências IS6110, observados
principalmente na Ásia.6 Estudos iniciais mostraram baixa
especificidade da PCR e falta de controles de qualidade
adequados, como demonstrado em um estudo multicêntrico
realizado em diferentes países. 7 Estudos mais recentes
mostraram resultados melhores com testes in house8, mas
uma meta-análise realizada com 36 trabalhos mostrou que a
baixa especificidade ainda é um problema a ser resolvido antes
da implantação destes testes em rotina.9
Nos últimos anos, sistemas de PCR em tempo real (RTPCR) foram introduzidos nos laboratórios de
micobacteriologia, permitindo a detecção do fragmento
amplificado já nas fases iniciais da reação. Esta técnica possui
diversas vantagens com relação à técnica de PCR
convencional, como redução da contaminação e rapidez, uma
vez que não se faz necessário o uso de géis e brometo de
etídio.10 Esta técnica está sendo utilizada na detecção de M.
tuberculosis a partir de amostras clínicas11, na identificação
das diferentes espécies de micobactérias, baseada nas
diferentes temperaturas de hibridação específicas para cada
espécie 12 e na detecção de mutações responsáveis pela
resistência do M. tuberculosis principalmente com relação a
isoniazida e rifampicina.11 No entanto, algumas limitações
ainda devem ser levadas em conta no momento da escolha
desta técnica: não necessariamente o RT-PCR é mais sensível
que o PCR convencional10, existe variação nas sequências
alvo necessitando vários iniciadores e sondas e pode haver
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
reação cruzada entre espécies diferentes impossibilitando sua
identificação.12
1.2. Métodos comerciais
COBAS Amplicor® MTB Test (Amplicor; Roche Molecular
Systems Inc., Branchburg, NJ).
Neste teste, um fragmento de 584 pb do gene 16S rRNA é
amplificado por PCR e os produtos amplificados e marcados
com biotina são hibridados com uma sonda específica para o
CMT. Os resultados podem ser obtidos após 6-7 horas. O
processo pode ser automatizado utilizando o equipamento
COBAS Amplicor analyzer, mas uma versão manual também
está disponível. A versão COBAS TaqMan MTB test usa realtime PCR e hibridização automatizadas e processa 48 amostras
simultaneamente em 2,5 h. A agência americana Food and Drug
Administration (FDA) aprovou este método para ser testado
em amostras respiratórias com baciloscopia positiva. O teste
mostrou elevada sensibilidade para amostras pulmonares com
baciloscopia positiva (90-100%), mas a sensibilidade foi muito
menor com amostras extrapulmonares (27,3-85%) e amostras
pulmonares com baciloscopia negativa (50-95,9%). 13 A
especificidade variou entre 91,3% e 100% no mesmo estudo.
Amplified MTD® (Mycobacterium tuberculosis Direct)
Test (AMTD; Gen-Probe Inc., San Diego, CA, EUA).
Este é um teste isotérmico de amplificação mediada por
transcrição (TMA), onde o alvo é o gene 16S rRNA. Todo o
processo é realizado a 42ºC e pode ser finalizado em 2,5 horas.
O FDA aprovou este método para ser testado em amostras
respiratórias com baciloscopia positiva ou negativa. Em vários
estudos realizados, a sensibilidade para amostras respiratórias
variou entre 90,9% e 95,2% e a especificidade entre 97,6% e
100% [apud14]. A maior desvantagem deste teste é a ausência
de um controle interno de amplificação, não permitindo a
detecção de inibidores na amostra. A reação cruzada com
outras espécies de micobactérias foi reportada.15
BD ProbeTec™ ET (energy transfer) System (BDProbeTec;
Becton Dickinson Bioscience, Sparks, MD, EUA).
Este é um método semi-automatizado baseado na
amplificação de fita simples de DNA (SDA) onde as
seqüências
alvo IS6110 e 16S rRNA são co-amplificadas.
A
A
B
amplificação simultânea e a detecção são realizadas em uma
única temperatura (52,5ºC) no instrumento ProbeTec, dentro
de 3,5 a 4 horas. O fabricante recomenda o uso em amostras
respiratórias. Este método não foi aprovado pelo FDA. Em
comparação com AMTD, Piersimoni e cols.16 relataram
sensibilidade do ProbeTec de 94,5% e 92,3% contra 88,0% e
74,3% para o AMTD, em amostras pulmonares e
extrapulmonares, respectivamente. Em comparação com o
Amplicor, a sensibilidade do ProbeTec foi de 86,2% contra
78% e a especificidade foi a mesma para os dois testes
(99,9%).17
GenoType® Mycobacteria Direct (Hain Lifescience GmbH,
Nehren, Germany).
Este teste é baseado na amplificação de ácidos nucléicos
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
aplicada à tecnologia DNA Strip® (DNA imobilizado em tiras
de membrana de nitrocelulose). O teste possui três etapas: 1)
isolamento do RNA, 2) amplificação do gene 23S rRNA, 3)
hibridação reversa dos produtos amplificados em tiras de
membrana. É possível detectar em um único teste a presença
de M. avium, M. intracellulare, M. kansasii, M. malmoense
e CMT. De acordo com Franco-Alvarez de Luna e cols. (2006)
o teste é útil, confiável e rápido, com sensibilidade e
especificidade de 92% e 100%, respectivamente.
Um estudo recente de meta-análise para avaliar a acurácia
dos testes moleculares comerciais descritos acima mostrou
sensibilidade geral de 85% (CI 36-100%) e especificidade de
97% (CI 54-100%).18 A principal conclusão foi de que a
acurácia em amostras respiratórias foi muito variável, não
justificando no momento a substituição dos testes
convencionais de diagnóstico da tuberculose por testes
moleculares.
1.3. Novos Métodos
Cross Priming Amplification (Ustar Biotechnologies Co.,
Hangzhou, China).
Utilizando vários iniciadores ligados cruzadamente, o DNA
alvo pode ser amplificado a uma temperatura constante. A
detecção dos produtos de amplificação é feita em uma fita
lateral, inserida dentro de um compartimento plástico,
prevenindo a ligação entre os produtos. Fang e cols. 19
avaliaram o teste em amostras pulmonares de pacientes com
suspeita de tuberculose, comparando com a baciloscopia,
cultura em Lowenstein Jensen e cultura líquida. As taxas de
detecção obtidas foram 50,6%, 36,1%, 38,9% e 53,9%,
respectivamente.
Loop-mediated isothermal amplification (LAMP) é um
teste de amplificação isotérmica que usa seis iniciadores
específicos derivados da sequência do gene 16S rRNA de
Mycobacterium tuberculosis. A detecção é visual pela
produção de um precipitado branco de pirofosfato de
magnésio. A sensibilidade e especificidade do teste em 200
amostras de escarro do Nepal, em comparação com resultados
de cultivo, foram de 100 % e 94.2 %, respectivamente.20
2. Identificação das
C espécies de micobactérias a partir da
cultura
Por muitas décadas, a identificação das micobactérias foi
realizada com base em observação de características
fenotípicas e reações bioquímicas, que são demoradas e
muitas vezes fornecem resultados ambíguos. Os métodos
moleculares para a identificação de micobactérias
proporcionam resultados mais rápidos e precisos e muitas
metodologias estão sendo utilizadas em laboratórios
clínicos.21
2.1 Sequenciamento de DNA
Este método é considerado o padrão ouro para a
identificação de micobactérias. Baseado na amplificação de
uma sequência alvo, seguida de sequenciamento dos
produtos amplificados, a identificação é feita pela comparação
51
da sequência de nucleotídeos obtida com sequências
disponíveis em bancos de dados, como GenBank e o European
Molecular Biology Laboratory (EMBL). O alvo mais comum é
o gene 16S rRNA, que contêm tanto regiões altamente
conservadas como regiões hipervariáves. Entretanto, a
similaridade de sequências das diferentes espécies do gênero
Mycobacterium é muito elevada e algumas espécies não
podem ser diferenciadas por possuírem sequências
indistinguíveis, como M. kansasii e M. gastri, M. marinum e
M. ulcerans, M. malmoense e M. szulgai e os membros do
CMT. Por isso, outros alvos para sequenciamento também
têm sido usados, como os genes rpoB22, hsp6523, gyrB 24 e a
região não transcrita entre os genes 16S e 23S rRNA (região
ITS)25. O banco de dados Ribosomal Differentiation of Medical
Microorganisms (RIDOM)26 reúne sequências do gene 16S
rRNA e da região ITS. Diferentemente de outros bancos de
sequências, este é rigidamente controlado e não permite
depósitos de novas sequências, mas infelizmente não foi
atualizado nos últimos anos.
2.2 Identificação por sonda genética
AccuProbe® Culture Identification Tests (Gen-Probe Inc.,
San Diego, CA, EUA) inclui sondas para identificação de M.
tuberculosis, M. kansasii, complexo M. avium, M. avium, M.
intracellulare e M. gordonae. Cada uma destas sondas é
uma molécula de DNA de fita simples com marcação
quimioluminescente e é complementar ao RNA ribossomal do
organismo alvo. O híbrido DNA/RNA marcado é detectado
pela emissão de luz medida pelo luminômetro GenProbe. Este
teste pode ser usado tanto com culturas líquidas como sólidas.
O método é de fácil realização, necessita somente de um
sonicador e um luminômetro e pode ser feito em até duas
horas.14
2.3 Hibridação em fitas de membrana
Esta tecnologia (line probe technology) inclui a amplificação
com iniciadores biotinilados, hibridação reversa com
diferentes sondas de DNA imobilizadas em linhas paralelas
em uma fita e detecção colorimétrica em instrumento
automatizado. O padrão de bandas permite a identificação da
espécie isolada. O tempo de realização é de aproximadamente
5 horas.
Inno LiPA ® Mycobacteria v2 (Innogenetics, Ghent,
Belgium).
Este teste é baseado em hibridação reversa e a sonda é
representada por um produto de 400-550pb da região ITS. Os
produtos biotinilados amplificados são hibridados com 14
sondas imobilizadas em uma fita. Doze sondas reagem
especificamente com o CMT, M. kansasii, M. xenopi, M.
gordonae, M. genavense, M. simiae, M. marinum/M. ulcerans,
M. celatum, M. avium, M. intracellulare, M. scrofulaceum,
M. malmoense, M. haemophilum, M. chelonae, complexo M.
fortuitum e M. smegmatis. Uma sonda é específica para o
gênero Mycobacterium e uma para o complexo MAIS (M.
avium, M. intracellulare, M. scrofulaceum e outros membros
do complexo M. avium). Populações mistas são facilmente
52
identificadas. Tortoli e cols.27observaram sensibilidade e
especificidade de 100% e 94,4%, respectivamente. As sondas
específicas para o complexo M. fortuitum, complexo MAIS e
para M. intracellulare tipo 2 apresentaram reação cruzada
com algumas micobactérias raramente isoladas de material
clínico.27
GenoType® Mycobacterium (Hain Lifescience GmbH,
Nehren, Germany).
O procedimento inclui uma amplificação por PCR multiplex
seguida de hibridação reversa em fita. Existem três kits: a)
GenoType MTBC para diferenciar membros do CMT, b)
GenoType Mycobacterium CM (commom mycobacteria) e c)
GenoType Mycobacterium AS (additional species). O
GenoType MTBC é baseado em polimorfismos do gene gyrB.
Os kits CM e AS utilizam o gene 23S rRNA como alvo, sendo
que o produto gerado no teste CM pode ser usado no teste
AS sem a necessidade de realizar nova amplificação. A
combinação dos testes CM e AS permite diferenciar 30
espécies de MNT: M. avium, M. chelonae, M. abscessus, M.
fortuitum, M. gordonae, M. intracellulare, M. scrofulaceum,
M. interjectum, M. kansasii, M. malmoense, M. peregrinum,
M. marinum/M. ulcerans, complexo M. tuberculosis M.
xenopi, M. simiae, M. mucogenicum, M. goodii, M. celatum,
M. smegmatis, M. genavense, M. lentiflavum, M.
heckeshornense, M. szulgai/M. intermedium, M. phlei, M.
haemophilum, M. gastri, M. asiaticum e M. shimoidei. Richter
e cols. 28 avaliaram a habilidade de o GenoType MTBC
diferenciar as espécies do CMT e demonstraram que todos
os membros do CMT podem ser diferenciados, com exceção
de M. tuberculosis, M. africanum tipo II e M. canetii que
possuem padrão idêntico de hibridação. De acordo com Russo
e cols. 29 a sensibilidade e especificidade do GenoType
Mycobacterium, comparada com aquela do sequenciamento
do gene 16SrRNA, foram de 97,9% e 92,4% para CM e 99,3%
e 99,4% para AS, respectivamente. Daley e cols.30 compararam
as técnicas de sequenciamento in-house e comercial
(Microseq) do gene 16S com as técnicas de high performance
liquid chromatography (HPLC) e Genotype CM e AS em 51
cepas de diferentes espécies de micobactérias, sendo que as
técnicas identificaram corretamente 70,6%, 80,4%, 42,0% e
72,7% cepas, respectivamente. Estes achados corroboram a
conclusão de que a identificação das espécies de
micobactérias não deve ser realizada com um único método.
2.4 PRA (PCR-Restriction Enzyme Analysis)
Telenti e cols.31 desenvolveram um método rápido, baseado
na amplificação do gene que codifica para a proteína de 65kDa
(hsp65), seguida de restrição por duas enzimas de restrição,
BstEII e HaeIII, e análise dos perfis eletroforéticos obtidos.
Podem ser utilizados organismos cultivados tanto em meio
líquido como em meio sólido. Os fragmentos da digestão
enzimática são analisados após separação por eletroforese
em gel de agarose e comparados com um algoritmo disponível
na internet.32,33 O teste pode ser realizado em dois dias. É um
teste custo-efetivo e confiável que pode ser utilizado em
laboratórios de média complexidade. 34 Uma avaliação
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
multicêntrica realizada em oito laboratórios da América Latina
eACaribe mostrou que a técnica B
foi facilmente implantada e
que o treinamento de pessoal e o cuidado na realização da
eletroforese são essenciais para que a técnica possa ser útil
em rotina35. Conflitos de interpretação dos perfis podem ser
minimizados pela observação das características culturais
básicas (pigmentação e tempo de crescimento) das cepas32.
Outros alvos foram propostos para este método, como o
fragmento ITS para identificação de MNT36 e o gene gyrB
para separação dos membros do CMT. 37
2.5 Pirosequenciamento
O pirosequenciamento é um método novo de
sequenciamento de ácidos nucléicos baseado na detecção de
pirofosfatos (PPi), liberados durante a síntese de DNA. A
cascata de reações enzimáticas produz luz, em quantidade
proporcional ao número de nucleotídeos incorporados. O
método é útil para determinação de sequências curtas (20-30
bases) em um formato rápido e semi-automatizado. Mesmo
que as sequências geradas por pirosequenciamento não sejam
tão discriminativas quanto sequências de 300-500pb geradas
por sequenciamento tradicional, é possível obter informações
importantes, como demonstrado por Tuohy e cols.38, que
puderam identificar 179 de 189 isolados (94.7%) pela análise
de uma sequência de 30 pb da região hipervariável A do gene
16S rRNA.
2.6 DNA Microarray
Nesta técnica, várias sondas para regiões específicas de
um gene alvo são imobilizadas em placas de vidro (DNA chip)
e usadas para hibridar com RNA obtido do organismo a ser
identificado e marcado com fluorescência. Os padrões de
hibridação produzidos com sondas complementares a 705
bases da sequência rpoB de M. tuberculosis foram usados
para a diferenciação de 121 isolados, compreendendo M.
avium, M. chelonae, M. fortuitum, M. gordonae, M.
intracellulare, M. kansasii, M. scrofulaceum, M. smegmatis,
M. tuberculosis e M. xenopi. A identificação obtida com as
placas foi compatível com a identificação inicial das espécies
baseada na análise de 180pb da sequência do gene 16S rRNA39.
Fukushima e cols.40 descreveram um teste de microarray
baseado em sequências do gene gyrB. Este microarray
produziu padrões de hibridação específicos para M.
tuberculosis, M. bovis, M. avium, M. intracellulare, M.
kansasii, M. gordonae, M. gastri, M. africanum, M. asiaticum,
M. malmoense, M. marinum, M. scrofulaceum, M. simiae e
M. szulgai. Os resultados foram correspondentes aos obtidos
pela identificação por métodos convencionais.
CONCLUSÃO
As técnicas moleculares são de grande importância para a
detecção e identificação das micobactérias devido à sua
rapidez e acurácia. Apesar destas técnicas ainda não terem
substituído completamente os métodos convencionais, como
a microscopia e o cultivo, elas trazem o benefício da rapidez.
Podem ser usadas para rápida confirmação da tuberculose em
pacientes com baciloscopia positiva no escarro. Em pacientes
com baciloscopia negativa, sua realização está indicada
Cquando a clínica é compatívelDcom suspeita de tuberculose. A
interpretação dos resultados sempre deve levar em conta os
dados clínicos. Testes comerciais têm a vantagem de serem
sistemas validados, com protocolos simplificados e muitas
vezes automatizados, elevando a qualidade dos procedimentos
e minimizando erros. A análise de várias amostras do mesmo
paciente, o uso de descontaminação apropriada e de
procedimentos adequados para isolamento de DNA são
fundamentais para evitar resultados falso-negativos.
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Erica Chimara
[email protected]
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
CONTROVÉRSIA
Marcadores de atividade da
Tuberculose pleural
AUTORAS:
Roberta Karla Barbosa Sales1; Leila Antonangelo2
SERVIÇO:
Disciplina de Pneumologia - HC e InCor - FMUSP
1
Doutora em Pneumologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
Livre-docente, Chefe da Citologia do Laboratório Central do HC FMUSP
2
INTRODUÇÃO
A tuberculose (TB) tem uma das maiores mortalidades
relacionada a um agente infeccioso. O Brasil, segundo a
OMS, ocupa o 15º lugar no mundo no número de casos.
Das apresentações extrapulmonares, a forma pleural é, nos
indivíduos acima de 15 anos, a mais frequente.1
Os parâmetros bioquímicos e citológicos encontrados
no líquido pleural na TB não são patognomônicos. As
proteínas totais habitualmente são superiores a 3,5g/dL, o
líquido raramente é hemorrágico, apresenta uma
predominância linfocitária, com escassas células
mesoteliais.2
O diagnóstico baseia-se na recuperação do bacilo ou no
achado histológico de um processo granulomatoso com
necrose caseosa. Os métodos usualmente utilizados
apresentam algumas limitações. A baciloscopia do líquido
pleural requer uma concentração bacilar de 10.000 bacilos/
mL e apresenta uma baixa sensibilidade, em torno de 5%.
Embora a cultura do líquido pleural (11 a 50%) seja mais
sensível, necessita de um número mínimo de bacilos viáveis
(10 a 100) e de 2 a 6 semanas para que ocorra o crescimento
do Mycobacterium tuberculosis.3-6
A cultura do fragmento pleural tem uma melhor
sensibilidade (30 a 79%), bem como a histologia do
fragmento (até 80%). Todavia é preciso que se realize uma
biópsia pleural com agulha de Cope, procedimento mais
invasivo que a toracocentese e que requer um médico
capacitado para realizá-lo.3-6
Pelos motivos explanados, a busca de novas técnicas
para o diagnóstico, que sejam mais rápidas, sem a
necessidade de realizar uma biópsia pleural ou outros
procedimentos invasivos e com melhor desempenho
diagnóstico, é premente. Entre essas técnicas encontra-se
a adenosina deaminase, a lisozina, a reação em cadeia de
polimerase e o interferon gama.
proveniente do catabolismo das purinas que catalisa a
conversão da adenosina em inosina e a deoxiadenosina em
deoxiinosina. A ADA é essencial para a diferenciação dos
linfócitos, principalmente os linfócitos T, tendo importante
função na maturação de monócitos e linfócitos.7
A ADA expressa a soma de duas isoenzimas: ADA1
(presente na maioria das células) e ADA2 (mais relacionada
com o complexo monócito-macrófago). Quantificando-se
as duas isoenzimas concluiu-se que a ADA 2 é a maior
responsável pelo aumento da atividade da ADA total nos
casos de TB pleural.8
Sabe-se que a atividade da ADA aumenta em líquidos
pleurais secundários a várias patologias que acometem a
pleura, dentre elas, a tuberculose. Nesta, o valor da ADA é
geralmente superior a 40,0 U/L. Valores semelhantes foram
observados em derrames pleurais secundários a artrite
reumatóide e nos casos de empiema.9,10 O comportamento
da adenosina deaminase nas doenças neoplásicas é
variável, podendo estar elevada em doenças
linfoproliferativas, especialmente o linfoma e em alguns
tumores sólidos.11
Em nosso meio, a utilização de um valor de corte de 40,0
U/L para a adenosina deaminase em derrames pleurais
linfocíticos oferece alta eficiência para o diagnóstico de
tuberculose pleural (sensibilidade de 87 a 100% e
especificidade de 81 a 97%).8,9,12
Greco e colaboradores numa metanálise na qual foram
incluídos trinta e um trabalhos (n= 2040) com valor de
corte de ADA de até 70,0U/L demonstraram uma
sensibilidade de 56 a 100% (92%) e especificidade de 55 a
100% (89%).13
Se considerarmos a alta sensibilidade do teste,
associada ao seu baixo custo e a facilidade de realização
e padronização, a dosagem da ADA representa uma
importante ferramenta para o diagnóstico da TB pleural.
ADENOSINA DEAMINASE
A Adenosina deaminase (ADA) é uma enzima
Lisozina
A lisozina é uma enzima bacteriolítica originada da
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
55
decomposição dos neutrófilos e monócitos e foi descrito o
aumento da sua atividade em várias doenças
granulomatosas, entre elas, a tuberculose.14 Os trabalhos
na literatura testando a sua utilidade no diagnóstico da
tuberculose pleural apontam para uma sensibilidade que
varia entre 66% e 100%, com especificidade entre 87,5% e
94%.14,15 Contudo, a dosagem de lisozima não é rotineira na
maioria dos laboratórios clínicos e ultimamente com o
surgimento de outros marcadores não está mais em uso na
maioria dos centros de pesquisa.
Reação em Cadeia da Polimerase
A Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) é um dos
métodos utilizados nos testes de amplificação de ácidos
nucléicos, baseados na detecção de pequenas seqüências
de material genético (RNA ou DNA) e de sua amplificação
in vitro. É um método rápido e altamente específico, porém
passível de contaminação, sendo esta uma das principais
causas de falsos-positivos.6 Uma outra causa de resultado
falso-positivo refere-se aos pacientes infectados (PPD
positivos) pelo M tuberculosis que não necessariamente
apresentam atividade da doença.6 Um outro fator limitante
no seu desempenho é a própria sensibilidade do teste, que
sofre interferência do número de bacilos presentes e viáveis
no líquido pleural e da padronização da técnica. A
sensibilidade da PCR no líquido pleural varia de 13% a 69%,
com especificidade entre 80% e 97%.6,16 Entretanto, no
fragmento pleural o desempenho deste exame é superior,
com sensibilidade estimada de 89% a 90% e especificidade
de 100%. 17 Apesar da boa faixa de sensibilidade e
especificidade descritas para o método, principalmente no
fragmento pleural, não é um exame disponível em grande
parte dos laboratórios, quer seja pelo alto custo que
apresenta, quer seja pela falta de laboratórios equipados
para a realização de testes de biologia molecular.
Interferon γ
O Interferon γ é uma citocina produzida pelos linfócitos
T CD4 ativados. Após o contacto com o M tuberculosis,
habitualmente ocorre aumento na produção desta citocina,
o que a torna um parâmetro laboratorial adicional para o
diagnóstico de tuberculose pleural.18
Na metanálise realizada por Greco e colaboradores, foram
selecionados 13 artigos (n= 1189 casos) que utilizaram o
interferon gamma no diagnóstico do derrame pleural; a
sensibilidade diagnóstica variou entre 57% a 100% (87%) e
a especificidade, de 90% a 100% (97%). 17 Dados
concordantes foram publicados por Jing Jiang numa outra
metanálise, que demonstrou uma sensibilidade de 89% e
especificidade de 87%.19
Quando se compara a eficiência do Interferon γ contra
adenosina deaminase no diagnóstico de tuberculose pleural,
encontram-se semelhantes valores de sensibilidade.
Entretanto, uma maior especificidade é atribuída ao
Interferon γ uma vez que esta citocina não estaria elevada
56
nos derrames pleurais secundários à artrite reumatóide e a
neoplasias sólidas.
Embora com desempenho altamente satisfatório para o
diagnóstico de TB pleural, este teste laboratorial tem como
maior limitação seu alto custo. Sharma e colaboradores
numa análise de custo/efetividade demonstraram que a
utilização do interferon para o diagnóstico de um único
paciente com tuberculose tem o mesmo custo do
tratamento completo de seis pacientes, não justificando
deste modo o seu uso no diagnóstico diferencial dos
derrames pleurais.20
Biópsia Pleural
A biópsia pleural percutânea seja por agulha de Cope
(usada no nosso meio) ou Abrams faz parte do arsenal de
investigação dos exsudatos pleurais e durante muito tempo
foi o principal exame para a confirmação diagnóstica de
tuberculose pleural.
Apesar de apresentar uma excelente especificidade, sua
sensibilidade pode variar de 45 a 80%. Entretanto, enquanto
nas doenças neoplásicas o aumento do número de
fragmentos colhidos (durante o mesmo procedimento ou
em biópsias subseqüentes) melhora o rendimento
diagnóstico, isto não ocorre na tuberculose.3-5, 21
Embora seja um método invasivo de baixa morbidade e
Chakrabarti e colaboradores 22 terem demonstrado que a
experiência prévia do médico que realiza o procedimento
não influencia na qualidade do fragmento pleural, Patis e
colaboradores23 revelaram que menos de 50% dos médicos
que participaram de programas de treinamento nos
Estados Unidos encontram-se aptos para realizar a biópsia
pleural.
A proliferação de novos marcadores com eficiência
diagnóstica semelhante ou superior torna premente uma
análise mais cuidadosa do uso rotineiro da biópsia pleural,
reservando-a para os exsudatos pleurais indeterminados.
CONCLUSÃO
Apesar da ADA e do interferon não serem marcadores
específicos de derrame pleural tuberculoso, quando
interpretados conjuntamente aos achados clínicos são
excelentes ferramentas diagnósticas.
No nosso meio, mediante uma suspeição clínica,
exsudatos linfocíticos com valores da ADA superiores a
40U/L e escassez de células mesoteliais são altamente
sugestivos de TB.
Nas outras situações clínicas que também podem cursar
com ADA elevada, uma história clínica prévia de artrite
reumatóide, um derrame pleural com predomínio neutrofílico
ou com aspecto purulento, uma citologia oncótica positiva
ou suspeita de células neoplásicas, bem como a presença
de linfoadenomegalias ou massas podem nos alertar para
outros possíveis diagnósticos.
Neste contexto concluímos que, em nosso meio, a
dosagem rotineira da ADA associada à análise citológica e
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
bioquímica do líquido pleural deve ser utilizada na
investigação dos derrames pleurais sugestivos de TB,
reservando a biópsia para os casos no qual os níveis da
adenosina deaminase suscitem dúvidas.
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Pulmonary/Critical Care Fellowships. Chest
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Roberta Karla Barbosa Sales
[email protected]
TRANSPLANTE PULMONAR NO
ESTADO DE SÃO PAULO
GRUPO DE TRANSPLANTE PULMONAR
INCOR – HCFMUSP
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Telefone: (11) 3069 5248
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Escola Paulista de Medicina – UNIFESP
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São Paulo – SP
Telefone: (11) 5549 1830
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Hospital Israelita Albert Einstein
Unidade Vila Mariana
Rua Madre Cabrini, 462 - Vila Mariana
Telefone: (11) 5089-0880 / 5089-0879
57
ARTIGOS EM DESTAQUE
AUTORES:
Viviane Rossi Figueiredo1; Hélio Minamoto1
SERVIÇO:
Serviço de Endoscopia Respiratória – Disciplina de Pneumologia e Disciplina de Cirurgia Torácica HCFMUSP
1
2
Diretora Técnica do Serviço de Endoscopia Respiratória do HCFMUSP
Médico assistente da Disciplina de Cirurgia Torácica- HCFMUSP
INTRODUÇÃO
Tuberculose é uma das maiores causas infecciosas de
morbidade e mortalidade do mundo. Mais de 8 milhões de
novos casos de tuberculose ocorrem anualmente, levando a
2 milhões de mortes/ano. Muitos desses pacientes
desenvolvem sequelas da tuberculose pulmonar, dentre elas
a estenose traqueobrônquica. A estenose de via aérea pós
tuberculose é uma questão importante da evolução pré e pós
tratamento antituberculose, podendo o paciente desenvolver
quadros de infecções pulmonares obstrutivas e insuficiência
respiratória alta. Os mecanismos de desenvolvimento da
patologia não são totalmente conhecidos, assim como a sua
abordagem terapêutica. Muito tem sido discutido a respeito
do tratamento endoscópico com dilatações e colocação de
próteses específicas, mas ainda não é prática disseminada na
condução terapêutica desses casos.
ARTIGO 1. Fatores preditores de estenose persistente de via aérea em pacientes com
tuberculose endobrônquica
Predictors of persistent airway stenosis in patients with endobronchial tuberculosis
Um SW, Yoon YS, Lee SM et al
Int J Tuberc Lung Dis 2007; 11 (12): 57-62
Tuberculose endobrônquica (TBEB) é definida como
infecção da árvore traqueobrônquica com confirmação
microbiológica ou evidência histopatológica. Embora tenha
sido relatada em 10 a 37 % dos pacientes com tuberculose
pulmonar, sua patogênese não está totalmente esclarecida e
sua abordagem terapêutica não estabelecida. Erradicar o bacilo
da tuberculose e prevenir sequelas traqueobrônquicas como
a estenose são as principais e primeiras condutas a serem
adotadas na TBEB. Embora a antibioticoterapia específica para
tuberculose seja efetiva no controle da infecção, a mesma não
previne sequelas da TBEB. A administração de corticóides
tem sido utilizada para evitar a evolução para estenoses, mas
sua efetividade é maior quando a administração é sistêmica
em comparação à administração oral.
O objetivo desse estudo foi avaliar os vários fatores
preditivos que contribuem para a estenose traqueobrônquica
persistente em pacientes com TBEB após antibioticoterapia
antituberculose.
Estudo retrospectivo, realizado em dois hospitais
universitários na Coréia do Sul, de 1997 a 2005, totalizando
214 pacientes com diagnóstico de TBEB, com
acompanhamento broncoscópico e tratamento específico
completo para tuberculose. O diagnóstico de TBEB foi
confirmado por microbiologia, histopatologia e por
broncoscopia que revelou lesões traqueobrônquicas
58
compatíveis com tuberculose. As alterações endoscópicas
foram classificadas quanto ao tipo, intensidade e localização
da lesão, de acordo com estudos prévios.
Os resultados obtidos quanto aos achados
broncoscópicos foram: lesão caseosa ativa em 46,3% dos
casos, lesão caseosa ativa associada a fibroestenose em 17,9%
e fibroestenose em 9%. Quanto à localização, a apresentação
foi em brônquio segmentar em 6%, brônquio lobar em 11,9%,
brônquio principal em 47,8% e traquéia em 34,3% dos casos.
A intensidade da estenose foi classificada em leve (43,3%),
moderada (17,9%) e grave (38,8%).
Após o tratamento com antibioticoterapia específica para
tuberculose,Cocorreram mudanças na avaliação broncoscópica
com melhora em 58,2% e piora em 1,5% dos casos. Em 40,3%
dos casos não houve mudança endoscópica depois do
tratamento quimioterápico.
Utilizando-se análise univariada, a estenose de via aérea
foi associada com múltiplos fatores. Idade > 45 anos foi mais
comum no grupo “sem melhora” (42,9%) que no grupo “com
melhora” (17,9%, p= 0,026). O uso de corticóide oral
(prednisolona > 30 mg/dia) não apresentou diferença entre os
dois grupos. Lesão caseosa ativa sem fibroestenose foi mais
comum no grupo “com melhora” do que no “sem melhora”
(59% vs. 28,6%, p=0,014). Lesão fibroestenosante pura ou
associada a lesão caseosa ativa foi mais comum no grupo
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
“sem melhora” do que no grupo “com melhora” (46,4% vs.
17,9%, p= 0,016). Alterações endoscópicas observadas na
broncoscopia antes do tratamento, como estenose moderada
e grave de traquéia, brônquios fontes ou brônquio intermédio
foram mais comuns no grupo “sem melhora” do que no grupo
“com melhora” (57,1% vs. 28,2%, p=0,017). Queixa principal
com duração maior que 90 dias antes da antibioticoterapia
para tuberculose foi mais freqüente no grupo “sem melhora”
que no grupo “com melhora” (64,3% vs 30,8%, p=0,007).
Na análise de regressão logística multivariada reanalisandose os fatores que foram significantes na análise univariada,
foram identificados como fatores preditores independentes
da estenose de via aérea persistente: idade > 45 anos, alteração
broncoscópica fibroestenosante e queixa principal com
duração maior que 90 dias antes do tratamento
antituberculose.
O mecanismo exato de resposta, de acordo com os tipos
de lesão observadas à broncoscopia na TBEB, ainda não
está esclarecido. Também o uso de corticóides sistêmicos na
prevenção de lesões estenosantes continua controverso, pois
vários estudos na literatura relatam resultados positivos
enquanto outros relatam resultados negativos.
ARTIGO 2 - Uso de próteses de silicone na abordagem da estenose traqueobrônquica
pós tuberculose
Use of silicone stents for the management of post-tuberculosis tracheobronchial stenosis
Ryu YJ, Kim H, Yu CM et al
Eur Respir J 2006; 28:1029-1035
Estenose traqueobrônquica pós tuberculose (ETBPT) é
a causa mais comum de estenoses benignas em áreas
endêmicas. Mesmo após a administração de medicação
específica anti-tuberculose, alguns casos de tuberculose
endobrônquica podem evoluir para obstrução de vias
aéreas. Ressecção cirúrgica após a erradiacação do M
tuberculosis tem sido o tratamento de escolha na maioria
dos pacientes com esse tipo de estenose.
Próteses traqueais e brônquicas têm sido desenvolvidas
para o tratamento da estenose de via aérea evitando-se a
morbidade de uma cirurgia aberta. Entretanto, o uso de
próteses metálicas têm resultado várias complicações
irreversíveis. A utilização da broncoscopia intervencionista
com a colocação de próteses de silicone tem trazido uma
opção para o tratamento desses pacientes.
O objetivo desse estudo foi investigar o papel da
broncoscopia intervencionista na abordagem das
estenoses traqueobrônquicas pós tuberculose.
Estudo retrospectivo conduzido em hospital de
referência terciária na Coréia do Sul, avaliou 80 pacientes
com estenose traqueobrônquica pós tuberculose, que se
submeteram à broncoscopia rígida com dilatação por balão
ou ressecção por laser, entre janeiro de 2000 e dezembro de
2003. Esses pacientes foram seguidos por uma média de 41
meses.
Foram indicadas broncoscopias intervencionistas em
pacientes com estenose traqueobrônquicas diagnosticadas
por tomografia computadorizada com reconstrução 3 D
volumétrica e/ou broncoscopia, segundo as seguintes
indicações: 1- deterioração progressiva dos sintomas
respiratórios como dispnéia progressiva; 2- pneumonia
recorrente pós obstrução (> 2 anos) ou 3- colapso agudo
completo de um pulmão com redução da função pulmonar
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Prótese de Dumont (BryanCorp, Woburn, MA, USA) ou
prótese Natural (TNO Co., Seoul, South Korea) de 12 a 14
mm de diâmetro foram utilizadas para estenoses traqueais
e de 10 mm para estenoses brônquicas. Tamanho e tipo
adequados foram selecionados caso a caso.
A técnica intervencionista foi realizada segundo a
padronização de Colt, Dumont e Kim. Após indução
anestésica, os pacientes foram submetidos a broncoscopia
rígida (Hopkins, Karl-Storz, Tuttlingen, Germany) e
broncoscopia flexível associadas para avaliação da estenose
de via aérea. Em seguida foi realizada dilatação por balão e
desobstrução a laser e colocação de prótese de silicone.
Indicações para a colocação de próteses de silicone: 1- malácea
> 180° da luz dilatada; 2- segmento estenótico maior que 2 cm
ou 3- recorrência de estenose em 1/3 depois da dilatação.
Após o procedimento, os pacientes tinham alta
hospitalar em 24 h e realizavam RX de tórax controle e
espirometria em 1, 3, 6, 9 e 12 meses após, e depois a cada
6 meses. Todos os pacientes foram acompanhados pelo
menos 2 anos.
A média do diâmetro da luz traqueal foi 9,5 (8 – 11) mm e
da luz brônquica foi 5 (4 – 6) mm, medidas por broncoscopia.
A dilatação por balão foi o método mais comum para o
tratamento endoscópico de estenose (77 de 109 casos). A
colocação de próteses, após dilatação traqueobrônquica
foi realizada em 75 de 80 casos (93,7%).
Alívio subjetivo da dispnéia ocorreu em 70 de 80
pacientes (88%). Após a intervenção, o diâmetro médio da
luz traqueal aumentou de 9,5 para 10 mm, enquanto da luz
brônquica aumentou de 5 para 7 mm. A duração média de
permanência das próteses foi de 24 meses (1-50). As
próteses puderam ser removidas em 54 de 75 pacientes
(72%) após uma média de 14 meses. Do grupo de 54
59
pacientes em que a prótese foi removida, 49 tiveram melhora
clínica durante um acompanhamento de 36 meses. Os 5
pacientes restantes apresentaram recorrência da estenose
com necessidade de novo procedimento com colocação de
nova prótese. Três pacientes não tiveram resposta após o
procedimento e tiveram que ser submetidos à ressecção
cirúrgica envolvendo anastomose término-terminal.
A maioria dos pacientes apresentou complicações
menores como tosse, rolhas de secreção e escarro
hemoptóicos. Entretanto, as próteses foram bem toleradas.
Oito de 80 pacientes (10%) apresentaram complicações
maiores como sangramento maciço (1 paciente) que reverteu
após ventilação mecânica, pneumotórax (5 pacientes) e
pneumomediastino (2 pacientes). Todos reverteram o quadro
de complicação após tratamento específico. Complicações
tardias, como migração das prótese (51%), presença de
tecido de granulação na borda da prótese (49%) e reestenose (40%) foram comuns e foram tratadas com novo
procedimento intervencionista.
Nenhuma diferença significativa foi observada na média
de idade dos pacientes, sexo, atividade de tuberculose,
localização da estenose e tipo de prótese utilizada (Dumon
ou Natural). Também não foi observada diferença
significativa nas complicações observadas com o tipo de
prótese utilizada. Maior freqüência de re-estenose foi
observada em pacientes com tuberculose em atividade em
comparação a aqueles com tuberculose não ativa (63 vs
37%, p= 0,005).
Esse estudo demonstrou que o procedimento de
broncoscopia intervencionista, incluindo a colocação de
próteses de silicone, pode ser um método de tratamento
em pacientes com ETBPT, com bons resultados.
ARTIGO 3 – Broncoscopia Intervencionista na Abordagem da Estenose de Via Aérea
devido a Tuberculose Traqueobrônquica
Interventional Bronchoscopy in the Management of Airway Stenosis Due to Tracheobronchial Tuberculosis
Iwamoto Y, Miyazawa T, Kurimoto N et al
CHEST 2004 Oct;126(4):1344-52.
É fundamental o acompanhamento de pacientes com
tuberculose endobrônquica, pois proporcionam a
identificação de sequelas como a estenose de vias aéreas.
Esta frequentemente pode ocasionar quadros de pneumonia
obstrutiva e dispnéia de grau variável. O tratamento de
escolha para esses casos tem sido a ressecção cirúrgica e
a reconstrução por broncoplastia. Mais recentemente,
técnicas de broncoscopia terapêutica têm sido
desenvolvidas incluindo a colocação endoscópica de
próteses, desobstrução por laser, plasma de argônio ou
crioterapia, dilatação mecânica ou com balão e avaliação
por ultra-sonografia endobrônquica.
O objetivo deste estudo foi analisar o diagnóstico e
tratamento da tuberculose endobrônquica através de
métodos de broncoscopia diagnóstica e terapêutica.
O estudo foi realizado de janeiro de 1991 a janeiro de
2002 em dois centros japoneses, totalizando 30 pacientes
com diagnóstico de tuberculose traqueobrônquica (TTB).
Deste grupo, 11 se submeteram a broncoscopia
intervencionista, incluindo colocação de próteses,
ressecção por laser ou plasma de argônio, dilatação por
balão, crioterapia e ultra-sonografia endobrônquica (EBUS).
Um paciente com obstrução brônquica completa necessitou
se submeter a pneumectomia esquerda.
Seis pacientes se submeteram a colocação de prótese
(Dumon) pós dilatação com balão, enquanto 5 pacientes
realizaram apenas dilatação com balão. As principais
60
complicações do uso da prótese de Dumon foram migração
e formação de tecido de granulação, necessitando remoção
da prótese ou seu reposicionamento ou aplicação de
crioterapia em granuloma na borda da prótese. Dois
pacientes que haviam se submetido à colocação de
próteses Ultraflex anteriormente, necessitaram realizar troca
para prótese de Dumon, devido à deterioração do metal e
formação de tecido de granulação com aparecimento de
tosse crônica incoercível. Em quatro pacientes, foi
observada destruição da cartilagem brônquica ou
espessamento da parede durante a realização do EBUS.
Broncoscopia intervencionista deve ser considerada na
abordagem da estenose traqueobrônquica pós
tuberculose. Próteses de Dumon sugerem ser mais
apropriadas, pois sua remoção e recolocação são sempre
possíveis. São consideradas, na literatura, as mais
indicadas para esses casos, pois são mais baratas, de fácil
recolocação e retirada se necessário. Também estão
disponíveis próteses de Dumon em Y que são indicadas
em casos com quadros complexos com mais de um sítio de
estenoses Próteses Ultraflex não devem ser usadas nesses
casos, pois são de difícil remoção e a segurança do seu
uso, a longo prazo, é incerta. EBUS pode acrescentar
informações para a avaliação da parede traqueobrônquica
no acompanhamento das estenoses pós tuberculose,
havendo concordância desses achados com a análise
histológica.
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
NOTÍCIAS
24 DE MARÇO
Dia Mundial da Tuberculose
A Tuberculose não é uma doença individual, mas sim social
que se espalha através do ar e contamina outros membros da
sociedade sem o seu conhecimento ou consentimento. É uma
doença passível de prevenção e cura, desde que diagnosticada
e tratada adequadamente dependendo, portanto, de um
adequado e responsável sistema de saúde (Sbarbaro,1997).
Todos os anos são registrados em torno de 8 milhões de
novos casos de tuberculose em todo o mundo. Minorias
étnicas, idosos e imigrantes estrangeiros são os mais atingidos
nos países desenvolvidos, enquanto que nos países em
desenvolvimento o predomínio é da população
economicamente ativa.
O Dia Mundial da Tuberculose foi lançado em 1982 pela
Organização Mundial da Saúde em homenagem a Robert Koch
que, em 24 de março de 1882, anunciou a descoberta da causa
da tuberculose. Nesta época, 1 em cada 7 mortes na Europa e
nas Américas era decorrente da TB. Atualmente, esta data é
uma ocasião de mobilização mundial, nacional, estadual e local
que busca envolver todas as esferas de governo e setores da
sociedade na luta contra a doença.
A Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia, em 2009,
estará participando dessa mobilização em parceria com as
Secretarias Estadual e Municipais de Saúde em diversas
cidades e com a sociedade civil, além da divulgação de
informações sobre o diagnóstico, tratamento e recursos
disponíveis para a população pelos meios de comunicação.
Sidney Bombarda
Comissão de Tuberculose da SPPT
[email protected]
Prêmio Destaque em transplante e captação de órgãos
Com a presença do governador José Serra foi entregue
no dia 17 de fevereiro de 2009 o Prêmio Destaque em
Transplante e Captação de Órgãos. A cerimônia aconteceu
no auditório “José Ademar Dias” da Secretaria da Saúde, em
São Paulo.
Além do governador, estiveram presentes o secretário da
Saúde, dr. Luiz Roberto Barradas Barata; o coordenador da
Central de Transplantes, dr. Luiz Pereira e o ex-ministro da
Saúde, prof. Adib Jatene. Eles premiaram as equipes de São
Paulo que se destacaram em Transplantes em 2008.
O Incor recebeu o prêmio em Transplantes de Pulmão
pela realização de 23 transplantes em 2008, ultrapassando a
marca total de 100 transplantes realizados.
O Prêmio foi entregue para a equipe Multidisciplinar de
Transplante de Pulmão do Incor HCFMUSP.
Essa premiação tem por objetivo incentivar o trabalho
dos profissionais da área e estimular o crescimento no número
de doadores e de cirurgias.
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
61
NOTÍCIAS
Jornada de Marketing e Finanças Médicas
Uma das principais missões da SPPT é promover encontros
científicos através das jornadas periódicas e do Congresso
bienal.
No último congresso, dedicamos algumas horas para
apresentar um tema não científico, mas que foi bastante
prestigiado, relacionado a marketing de consultório e defesa
profissional.
A sala lotada e o interesse demonstrado pelos participantes
durante a discussão motivaram a SPPT a realizar a primeira
jornada exclusivamente dedicada ao assunto.
A Jornada de Marketing Médico & Defesa Profissional
está agendada para o dia 25 de abril de 2009 no Hotel Matsubara
– SP.
Os assuntos serão discutidos por profissionais da área,
que darão uma visão geral sobre cada tema, complementado
por um colega médico pneumologista que discutirá aspectos
específicos da nossa realidade.
Em quatro horas de jornada discutiremos os quatro tópicos
a seguir descritos:
1-) Marketing Médico: Atitudes e mudanças que podem
ser aplicadas em clínicas e consultórios, dentro dos limites
éticos estabelecidos, que melhoram a relação com os nossos
pacientes e abrem perspectivas além do horizonte estreito que
enxergamos.
2-) Finanças de consultórios e pequenas empresas: A partir
de quando vale a pena constituir uma pessoa jurídica? Qual o
melhor regime tributário? Como estabelecer um contrato social
entre sócios que evite problemas futuros? Qual a importância
do controle (balanço) mesmo que este não seja exigido por
lei?
3-) Informática: A área da saúde sofre de verdadeira alergia
à informática, apesar dos nossos processos serem repetitivos
e lidarmos com uma quantidade enorme de dados! O uso
racional de ferramentas genéricas e específicas muda
radicalmente as rotinas que roubam o nosso tempo e
produtividade.
4-) Noções de Direito: Nas últimas décadas os pacientes
se tornaram muito mais informados e como cidadãos
reconhecem cada vez mais seus direitos de questionar os
serviços que prestamos. Qual a situação atual nos Conselhos
e na Justiça? Como podemos nos proteger de problemas? O
consentimento informado ajuda? Vale a pena fazer seguro
profissional?
Esperamos com esta manhã estimular os colegas a
estudarem respostas para questões que os cursos médicos
não se propuseram a ensinar, apesar da sua importância para
que a boa medicina seja praticada.
Marcelo Gervilla Gregório
José Eduardo Gregório Rodrigues
Miguel Lia Tedde
Pneumologia
Ambiental
De 4 a 6 de junho de 2009, acontece em Cuiabá, Mato
Grosso, o VI Congresso de Pneumologia e Tisiologia do
Centro-Oeste e a II Jornada de Fisioterapia Respiratória
do Centro-Oeste.
O evento terá a apresentação de temas relevantes da
especialidade que pretendem destacar a questão
ambiental e o estudo das doenças relacionadas à
qualidade do ar respirado.
A programação completa do evento será abrangente,
delineada com a intenção de dar aos participantes a
oportunidade de atualização, reciclagem e discussão da
questão ambiental.
Informações pelo site: wwwpneumoambiental.com.br.
62
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Dia
25/04/2009
Informações:
0800 171618
c/ Suzi ou
Wagner
PROGRAMA
JORNADA DE MARKETING E FINANÇAS MÉDICAS
Local:
Matsubara Hotel
Rua Cel. Oscar Porto, 838
Paraíso
São Paulo/SP
www.matsubarahotel.com.br
8h15 - 8h20:
PARTE l
8:20 -10:00h
8:20h - 8:50h:
8:50h - 9:20h:
9:20h - 10:00h:
Abertura
José Eduardo Delfini Cançado
(Presidente da SPPT)
Ética e Marketing Médico
Coordenador: José Eduardo
Gregório Rodrigues
Marketing médico a luz da Ética
Objetivos:
• Traçar um panorama do mercado
de trabalho do médico no Brasil
• Abordar o novo código de ética
médico
• Limites éticos do marketing
médico
Palestrante: Edson de Oliveira
Andrade
(Presidente do Conselho Federal
de Medicina)
Relação do médico com a indústria
farmacêutica
Objetivos:
• Limites éticos do médico
• Relação entre a indústria
farmacêutica e médicos
• Novas regulamentações da
ANVISA
Palestrante: Roberto Luiz D’ Ávila
(Vice-Presidente do Conselho
Federal de Medicina)
Responsabilidade Civil do Médico
Objetivos:
• Panorama atual das demandas
judiciais relacionadas à área de
saúde
• Consentimento informado
• Controvérsia: Seguro de
responsabilidade civil
Palestrante: José Marcelo Martins
Proença
(Professor Doutor da Faculdade de
Direito da USP)
Discussão: 10:00 -10:20h
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Intervalo: 10:20h -10:40h
PARTE II
10:40 - 13:00h
Informática e Contabilidade Médica
Coordenador: Marcelo Gervilla
Gregório
10:40h - 11:20h Informática no Consultório
Objetivos:
• Sistemas de Informação
aplicados à pequenas empresas
médicas
• Sistema BI (Business Intelligent)
• Questões éticas e de segurança
do uso da informática em saúde
Palestrante: Alexandre da Silva
Furtado Amaral
(Professor do MBA da FGV)
11:20h - 12:00h Marketing Médico
Objetivos:
• Ferramentas que podem ser
aplicadas na área médica
• Relação interpessoal (rede de
trabalho)
Palestrante: Áureo Vandré Trancoso Morada
(Assessor de Marketing da Medley)
12:00 - 12:40h:
Contabilidade Médica
Objetivos:
• Livro caixa
• Quando e como montar uma pessoa
jurídica
• Redução de carga tributária
• Controle financeiro
Palestrante: Olavo Romão da Silva
(Consultor em Ciências Contáveis)
Discussão: 12:40 - 13:00h
TAXA DE INSCRIÇÃO
Até 17/04/2009
Sócio SPPT
R$ 50,00
Res. Sócio SPPT
R$ 30,00
Não Sócio
R$ 100,00
Local do Evento
R$ 75,00
R$ 45,00
R$ 150,00
63
NOTÍCIAS
EVENTOS NAS REGIONAIS
REGINAL SÃO JOSÉ DOS CAMPOS
Data: 26/03 às 20h
Tema: “Poluição Atmosférica, Aquecimento Global e Saúde
Humana”
Palestrante: José Eduardo Delfini Cançado
Local: Intervale Othon Travel
Rua Lupércio Antonio dos Santos - 31 - Vila Bethânia
São José dos Campos - (12) 3925-5500
Data: 21/maio
Tema: Radiologia em Doenças Fúngicas
Palestrante: Dr. Gustavo Meirelles
Data:18/junho
Tema: Doenças Intersticiais
Palestrante: Dra. Mariana Silva Lima
CAMPINAS
Data: 25 de março às 20h
Tema: Asma e Saúde Pública
Palestrante: Prof. Dr.Alcindo Cerci Neto - Fac. de Londrina
Local: sede da Sociedade
Rua Delfino Cintra, em Campinas
Será realizada confraternização após a palestra
Data: Dia 22 de abril, às 19h30
Tema: Suporte Pressórico Não Invasivo e Ventilação
Mecânica Domiciliar
Demonstração prática do manejo dos aparelhos,
cedidos para o evento pela VITALAIRE
Palestrante:Ilma Ap. Paschoal
Local: Rua Delfino Cintra, em Campinas
REGIONAL DE MARÍLIA
Data: 06/agosto
Jornada de Infecções Respiratórias
Data: 27/agosto
Discussão de Casos II
Data: 24/setembro
Tema: Avaliação Pré-operatória em Asma / DPOC /
Gastroplastia
Palestrante: Dra. Sônia Faresin
Data: 01/outubro
Discussão de Casos III
Data: 29 e 30 de maio
Tema: Hipertensão Pulmonar
Palestrantes: Carlos Jardim e Hugo Hyung Bok Yoo
Local: Salão Nobre da FAMEMA
REGIONAIS SPPT 2008/2009
REGIONAL ABC
Av. Príncipe de Gales, 821 - Príncipe de Gales
09060-650 - Santo André - Telefone: (11) 4993-5469
[email protected]
Data:22/outubro
Tema: (Microbiologia / Oxigenoterapia)
REGIONAL ARARAQUARA / BAURU / BOTUCATU
Av. Prof. Dorival De Oliveira, 77 - Vila João Godoi
14802-378 - Araraquara - Telefone: (16) 3336-8953
[email protected]
Data: 12/novembro
Discussão de Casos IV
REGIONAL CAMPINAS
Zeferino Vaz, S/N - Barão Geraldo - 13086-002 - Campinas
Telefone: (19) 3521-7907 - [email protected]
Confraternização: 27/novembro
REGIONAL MARÍLIA
Rua 24 de dezembro, 435 - 17500-060 - Marília
Telefone: (14) 3433-3412 - [email protected]
REGIONAL RIBEIRÃO PRETO
Reuniões - última quinta-feira do mês às 20h00
Local: Chopp Time Street - Av. Independencia, 2.579 Piso Superior - (16 ) 3911 7898
REGIONAL SÃO JOSÉ DO RIO PRETO
Data: 23 de março às 20h
Tema: O dia a dia da Cirurgia Torácica
Palestrante: Aldemir Bilaqui
Local: Ultra X de São José do Rio Preto
Rua Cila, 3033 - (17) 4009-4444
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REGIONAL RIBEIRÃO PRETO
Av. Bandeirantes, 3900 - 14040-030 - Ribeirão Preto
Telefone: (16) 3602-2631 - [email protected]
REGIONAL SANTOS:
Av. Ana Costa, 484 Cj. 622 - Gonzaga - 11060-001 - Santos
Telefone: (13) 3284-4484 - [email protected]
REGIONAL SÃO JOSÉ DO RIO PRETO
Av. Vinte e Três, 1205 - 14780-000 - Barretos
Telefone: (17) 3322-8544 - [email protected]
REGIONAL SÃO JOSÉ DOS CAMPOS
Rua Cel. José Monteiro, 740 - 12243-730 - São José dos Campos
Telefone: (12) 3922-5935 - [email protected]
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
NOTÍCIAS
SPPT realiza sua
100a. Pizza Cirúrgica
Programa de Educação Continuada
em Tabagismo
SPPT/ SOCESP/APM
Cronograma
Presidente Prudente
São Paulo
Ribeirão Preto
Campinas
São Bernardo do Campo
São Caetano do Sul
Guarulhos
Marília
Jundiai
Barueri
Osasco
Cotia
Bauru
Botucatu
Avaré
São José dos Campos
Piracicaba
Americana
Limeira
Araçatuba
São José do Rio Preto
Catanduva
São Paulo
Sorocaba
Santos
Guarujá
Taubaté
Franca
Araraquara
São Carlos
Realizada no último dia 05 de março de 2009, na Charles
Pizza Grill, em São Paulo, a 100ª Reunião da Pizza Cirúrgica
da SPPT.
No evento, que contou com a presença de 120
participantes, entre médicos e residentes, foram apresentados
os casos do Serviço de Cirurgia Torácica da FCM da Santa
Casa de São Paulo.
Por ocasião da 100ª reunião, foi feita uma homenagem ao
Dr. Nagib Curi, símbolo da Reunião de Discussão de Casos:
“Reunião da Pizza” homenagem do Departamento de Cirurgia
Torácia da Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia.
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
25/Abr
09/Mai
09/Mai
23/Mai
23/Mai
23/Mai
30/Mai
30/Mai
20/Jun
20/Jun
20/Jun
20/Jun
27/Jun
27/Jun
27/Jun
27/Jun
01/Ago
01/Ago
01/Ago
01/Ago
15/Ago
15/Ago
29/Ago
19/Set
19/Set
19/Set
26/Set
26/Set
03/Out
03/Out
DATAS COMEMORATIVAS
24 DE MARÇO
Dia Mundial do Combate à Tuberculose
07 DE MAIO
Dia Mundial da Asma
31 DE MAIO
Dia Mundial sem Tabaco
21 DE JUNHO
Dia Nacional da Asma
65
NOTÍCIAS
PROGRAMAÇÃO ANUAL SPPT
MARÇO
AGOSTO
24
31
06
09
15
20
25
29
Dia Mundial de Combate à Tuberculose
Aula Depto. de Fisioterapia
ABRIL
02
X Curso Nacional de Atualização em
Pneumologia - SBPT
Pizza Cirúrgica
Páscoa
Tiradentes
Jornada Paulista de Finanças e Marketing Médico
Aula Depto. de Fisioterapia
02
12
21
25
28
29/04 a
02/05 Congresso Brasileiro de Cirurgia Torácica
Pizza Cirúrgica
Dia dos Pais
Jornada Paulista de Emergências Respiratórias
Pizza Clínica
Aula Depto. de Fisioterapia
Dia Nacional de Combate ao Fumo
SETEMBRO
03
07
12 a 16
29
Pizza Cirúrgica
Independência
ERS
Aula Depto. de Fisioterapia
OUTUBRO
MAIO
01
02
07
10
15 a 20
26
28
31
01
09 a 12
12
15
18
27
Dia do Trabalho
Dia Mundial da Asma
Pizza Cirúrgica
Dia das Mães
ATS
Aula Depto. de Fisioterapia
Pizza Clínica
Dia Mundial sem Tabaco
NOVEMBRO
JUNHO
02
04
06
11
11 a 13
21
30
Pizza Cirúrgica
Congresso Brasileiro - Asma / Tabagismo / DPOC
Nossa Senhora Aparecida
Pizza Clínica
Dia do Médico
Aula Depto. de Fisioterapia
Dia do Pneumologista
Pizza Cirúrgica
Jornada Paulista de Sono
Corpus Christi
XII Congresso Brasileiro de Pneumologia
Pediátrica
Dia Nacional da Asma
Aula Depto. de Fisioterapia
02
31/10 a
05/11
05
15
17
17
19 a 22
24
27
Finados
CHEST
Pizza Cirúrgica
Proclamação da República
Dia Nacional de Combate à Tuberculose
Dia Mundial da DPOC
XIII Congresso Paulista de Pneumologia e
Tisiologia
Aula Depto. de Fisioterapia
Dia Combate ao Câncer
JULHO
02
Pizza Cirúrgica
13
66
Congresso Paulista de
Pneumologia e Tisiologia
19 a 22 de novembro de 2009
Centro FeComércio de Eventos - São Paulo
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
PRÓXIMOS EVENTOS
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
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HISTÓRIA DA PNEUMOLOGIA
Os sanatórios e seu tempo
Sanatorium (do latim sanare – curar)
AUTOR:
Douglas Carlyle Belculfiné1
SERVIÇO:
Grupo de Vigilância Epidemiológica - GVE XXVII - São José dos Campos
1
Médico Pneumologista. Doutor em Saúde Pública FSP/USP
A tuberculose vem acompanhando a história do homem
há milênios. Esqueletos e múmias encontrados no antigo
Egito em 5000 aC e no Peru em 1100 aC já comprovavam a
presença da doença entre os homens.1
A partir da revolução industrial e do êxodo rural, em finais
do século XVIII, ocorreu uma concentração maior de
indivíduos nas cidades, que não apresentavam uma política
sanitária eficaz para ordenar o seu espaço físico, propiciando
condições para o alastramento de doenças infecciosas,
dentre estas, a tuberculose.2
Mesmo presente desde a era pré-cristã, desconhecia-se
sua etiologia, e, por sua característica potencialmente letal,
havia uma busca incessante pela cura, sendo utilizados os
mais variados tipos de tratamentos, chegando-se até aos
mais bizarros e agressivos.3 Na Roma Imperial, muitos já
sugeriam o tratamento climático, encaminhando doentes para
as regiões de clima quente e seco, encontrados na Palestina,
Sicília ou Egito.1
A origem da criação de locais de concentração para
tratamento de doentes com tuberculose não é precisa. Há
referências à provável existência de um “sanatório” no antigo
Egito, no delta do rio Nilo, pelo achado de inúmeros
esqueletos com erosões típicas de lesões tuberculosas
naquele local.1
Em Reims, na França, no ano de 1650, Marguerite
Rousselet, sensibilizada por inúmeros peregrinos portadores
de escrofulose que aportavam à cidade, recolhia-os ao Hotel
Dieu, que mais tarde se transformou no Hospital Saint
Marcoul. Estes doentes aproveitavam a ocasião das
cerimônias de coroação para receber o toque do rei, pois
acreditavam que isto promoveria a cura.4
Com a disseminação da doença, e a ausência de
medicamentos efetivos, fortaleceram-se os tratamentos
empíricos, dentre eles, a procura de locais climáticos com
finalidade terapêutica.
Em 1791, Lettson, médico inglês, construiu um
estabelecimento para crianças pobres com escrofulose, na
costa da Inglaterra, a partir da idéia de que o clima à beira68
mar seria benéfico, uma vez que os pescadores daquela
região não sofriam desta moléstia.4
George Bodington, em princípios de 1800, sugeria que a
tuberculose era curável com a utilização de medidas
higiênicas, como moradias arejadas e dieta alimentar
substanciosa. 4
Entretanto, este modelo de tratamento somente se
formalizou a partir das ações de Hermann Brehmer, médico
alemão que se curou nas montanhas do Himalaia, e trouxe
os conceitos de ar puro e altitude como tratamento. Ele criou
o primeiro sanatório para doentes com tuberculose pulmonar
localizado em Gobersdorf, Alemanha, com 40 leitos, em 1859.1
Brehmer se baseava na inexistência da doença em habitantes
das montanhas, fundamentando-se no fato de que havia
diminuição do oxigênio atmosférico no clima de altitude, o
que prejudicaria o bacilo e levaria à cura. Boa nutrição e
exercícios rigorosos fortaleceriam o coração e melhorariam a
circulação pulmonar.5 Peter Deitweiller, seu discípulo e expaciente, fundou outro sanatório em Falkenstein, inovando
algumas ações como a galeria de cura, o repouso prolongado
em cadeiras-longas e exercícios mais leves.5
Com a descoberta do agente etiológico por Robert Koch
em 1882, fortaleceu-se o conceito de transmissibilidade,
imperando a necessidade de ações preventivas, como o
isolamento do doente. Isto, no início, gerou preocupação
nestes locais de tratamento pelo risco de contágio, porém,
com a implantação de sistemas de desinfecção e
implementação de laboratórios de análises clínicas e
bacteriológicas, esta questão foi logo superada.
Os trabalhos de Bhremer e Deitweiller influenciaram a
criação de outros sanatórios na Alemanha e nos países
vizinhos, e também o início da construção de estruturas
populares, já que tais edificações normalmente eram de alto
luxo, com infra-estrutura que acarretava dispêndios
excessivos, tornando-as muito onerosas para os pacientes,
impossibilitando o acesso aos menos privilegiados.
Este modelo germânico se espalhou pelo mundo, e a Suíça
também se destacou, chegando a possuir inúmeros
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
Tuberculosis. The illustrated history of a disease.Vol 1. “Propos” Jacques Chrétien. Hauts de France. 1998.
sanatórios, principalmente em Leysin e Davos, local este
que ficou muito famoso por ser cenário do livro “A montanha
mágica” de Thomas Mann, que muito contribuiu na
divulgação dessas construções para o mundo, cujo enredo
expõe a rotina diária de um sanatório.3
O sanatório foi, durante muitos anos, associado à mística
do ar da montanha, e à medida que este conceito climático
foi se diluindo, eles passaram a ser construídos em cidades
de qualquer clima.3
Antes de acabar o século XIX, este modelo já tinha
chegado à América do Norte, e, como os Estados Unidos e o
Canadá já apresentavam índices alarmantes da doença
investiram maciçamente em suas construções. Logo a seguir,
os países da América do Sul também aderiram ao movimento
sanatorial.
No Brasil, as internações dos pacientes tuberculosos eram
feitas nas Santas Casas, não se levando em conta quaisquer
medidas de isolamento. A comprovação do aspecto
contagioso da tuberculose condicionou a criação de
enfermarias específicas nestas instituições.1
Com a chegada da família real ao Brasil, foram criadas as
faculdades de medicina e laboratórios de patologia e se
elaboraram leis para controle da entrada de doenças
infecciosas pelos portos1. A tuberculose, nesse período, por
suas características urbanas, comprometia os centros de
Pneumologia Paulista Vol. 22, No.5/2009
maior densidade populacional como Rio de Janeiro e São
Paulo, impulsionando a necessidade de soluções imediatas
pela preocupação com as altas taxas de morbi-mortalidade.1
No período republicano, preocupados com questões de
higiene e necessidade de isolamento de doentes, surgiram
iniciativas dos governos com uma nova política sanitária,
motivados, principalmente, pelos interesses do comércio
internacional.2
A partir desse período, grandes nomes da tisiologia
brasileira como Clemente Ferreira, Emílio Ribas, Victor
Godinho, Geraldo de Paula Souza, entre outros, se
destacaram e foram fundamentais na estruturação e
organização de ações contra a doença.1 A partir de então,
fundaram-se as Ligas de combate à doença, as Diretorias de
Higiene e Saúde Pública, os laboratórios e os dispensários,
estes com importantes funções na busca de novos casos,
educação sanitária e assistência médica e social aos doentes.1
As construções dos sanatórios somente se iniciaram a
partir da década de 1920, e o Brasil chegou a ter algumas
dezenas deles, sendo sua maioria na região sudeste,
principalmente nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e
Minas Gerais.2
Na cidade de São Paulo, foram de grande importância
histórica, no campo da tisiologia a Santa Casa, o Instituto de
Higiene de São Paulo, o Hospital do Mandaqui, o Instituto
69
Clemente Ferreira e o Hospital do Jaçanã.
Além da capital, duas cidades se destacaram na chamada
fase sanatorial: Campos do Jordão e São José dos Campos,
que, por esta razão, acabaram recebendo a denominação de
“Tisiópolis”.1
Campos do Jordão, que foi muito procurada para
tratamento, teve seu clima intensamente propagado pelos
seus administradores, recebendo até a denominação de Suíça
Brasileira.1 O município chegou a possuir quinze sanatórios,
construídos no período de 1929 a 1952, sendo a maioria
edificada por iniciativa particular.2 Toda essa infra-estrutura
hospitalar, juntamente com a utilização da cirurgia torácica,
transformou-o em um centro de referência tisiológica.
São José dos Campos, com uma localização estratégica,
maior proximidade da capital, melhor acesso e com um clima
mais ameno, além de não criar nenhuma barreira econômica
para a entrada de doentes, recebeu um número considerável
de enfermos para tratamento desde o início do século XX.1
A cidade era pobre, não tinha nenhuma infra-estrutura, e
essa visão de decadência econômica fez com que seus
administradores lutassem para criar uma estação de cura,
transformando-a em uma estância climática, o que acabou
ocorrendo em 1935. Este período sanatorial proporcionou à
cidade o tempo necessário para que desenvolvesse seu
verdadeiro potencial econômico, transformando-se hoje em
dia em um grande pólo industrial.1
Ali, foram construídos oito sanatórios, no período de 1924
a 1946.2 O mais importante deles, o Sanatório Vicentina
Aranha, foi o segundo sanatório do país e o primeiro do
estado de São Paulo.1 O primeiro construído no país foi em
Palmira (hoje Santos Dumont), estado de Minas Gerais,
apesar de existirem alguns registros de dois sanatórios
mineiros considerados anteriores a esse período, em Araxá
e Oliveira.5
Com o advento da quimioterapia, a partir do final da
década de 1940, a fase sanatorial começou a declinar. Porém,
a construção destas unidades perdurou até 1964, quando o
Serviço Nacional de Tuberculose encerrou esta medida
política, permitindo apenas o término daqueles que já
estavam em fase de conclusão, sendo que alguns deles
jamais foram utilizados para esta finalidade.1
O tratamento higieno-dietético realizado nestes
sanatórios, com longos períodos de internação, apenas
amenizaram os efeitos devastadores da doença. A grande
contribuição na melhora da sobrevida dos pacientes foi
mesmo a cirurgia, até surgirem os medicamentos específicos.5
Porém, é inegável que eles tenham tido significativa
participação na cura de muitos pacientes, e que
representaram um período marcante na história da
humanidade e no desenvolvimento do conhecimento desta
doença infecciosa.
Todo este contexto tisiológico, do qual fizeram parte os
sanatórios, contribuiu de maneira relevante na evolução da
pneumologia em vários campos, como Cirurgia Torácica,
Radiologia, Fisiologia, Bacteriologia, Farmacologia,
Imunologia, entre outras. Deve-se considerar também a
influência dos sanatórios nas questões sociais, culturais e
econômicas, e ainda na geração de necessidades que
influenciaram a expansão urbana.
Em seu período, eles representaram, na maioria das vezes,
a esperança, talvez a única existente naquele momento em
um contexto repleto de incertezas.
Hoje em dia, estas imponentes construções, muitas delas
em total abandono, representando marcas indeléveis na
paisagem urbana guardam dentro de si mais do que lamentos
de um passado não muito distante, mas também a missão de
lembrar ao homem a necessidade de um ciclo harmonioso
com o mundo em que vive.
REFERÊNCIAS
1.
2.
3.
4.
5.
Belculfiné DC. São José dos Campos: relação histórica do
seu desenvolvimento com a mortalidade por tuberculose, 1935
a 1999. [Tese de Doutorado]. São Paulo: Faculdade de Saúde
Pública da USP; 2001.
Bittencourt TMM. Arquitetura Sanatorial São José dos
Campos. São José dos Campos: Unida Artes Gráficas e
Editora Ltda;1998.
Rosemberg J. Tuberculose - Aspectos históricos, realidades,
seu romantismo e transculturação. Bol Pneumol Sanit. 1999;
7(2):5-29.
Cortazar IDG. Sanatórios para tuberculosos: auge y
decadencia. ARS méd. (Santiago). Universidad Católica de
Chile;(11):203-218, 2005
Resende JS. História da Pneumologia e Cirurgia Torácica em
Minas Gerais. Belo Horizonte: NB Edit.;2005.
Douglas Carlyle Belculfiné
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