ALESSANDRA MENDONÇA TELES DE SOUZA “APLICAÇÃO DE MÉTODOS COMPUTACIONAIS NO ESTUDO DA RELAÇÃO ESTRUTURA-ATIVIDADE E PERFIL TOXICOLÓGICO DE NOVOS COMPOSTOS ANTIPARASITÁRIOS E ANTIMICOBACTERIANOS” Orientadores: Prof. Dr. Carlos Rangel Rodrigues Prof. Dr. Vitor Francisco Ferreira Niterói Julho/2007 ALESSANDRA MENDONÇA TELES DE SOUZA “APLICAÇÃO DE MÉTODOS COMPUTACIONAIS NO ESTUDO DA RELAÇÃO ESTRUTURA-ATIVIDADE E PERFIL TOXICOLÓGICO DE NOVOS COMPOSTOS ANTIPARASITÁRIOS E ANTIMICOBACTERIANOS” Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de PósGraduação em Química Orgânica da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre em Química Orgânica. Orientadores Prof. Dr. Carlos Rangel Rodrigues Prof. Dr. Vitor Francisco Ferreira Niterói Julho/2007 S 729 Souza, Alessandra Mendonça Teles de Aplicação de métodos computacionais no estudo da relação estrutura-atividade e perfil toxicológico de novos compostos antiparasitários e antimicobacterianos/Alessandra Mendonça Teles de Souza. – Niterói: [s. n.], 2007. 96f. Dissertação – (Mestrado em Química Orgânica) – Universidade Federal Fluminense, 2007. 1. Naftoquinonas – Derivados. 2. Triazol – Derivados. 3. Modelagem molecular. 4. Antiparasitários. 4. Antimicobacterianos. I. Título. CDD. 547.71 “Jamais considere seus estudos como uma obrigação, mas como uma oportunidade invejável (...) para seu próprio prazer pessoal e para proveito da comunidade à qual seu futuro trabalho pertencer.” (Albert Einstein) Aos meus amados pais e à minha irmã, pelo amor e sinceridade. Dedico-lhes esta conquista como gratidão. Agradecimentos Embora uma dissertação seja, pela sua finalidade acadêmica, um trabalho individual, há contribuições de natureza diversa que não podem nem devem deixar de ser ressaltados. Por essa razão, expresso meus sinceros agradecimentos: À minha família, que é minha base. Aos meus pais pelo exemplo de vida e de caráter, traduzidos num consistente alicerce familiar. Agradeço por acreditarem em mim e nos meus sonhos, por todo apoio, incentivo, apostas e certezas de que nada seria tão impossível e por me ensinar que todo o sacrifício um dia será recompensado. Espero ter sido motivo de orgulho! Ao professor Carlos Rangel Rodrigues, pela orientação desde a iniciação científica, confiança, por acreditar em mim, sempre me incentivar e pelo total apoio para execução desta dissertação. Ao professor Vitor Francisco Ferreira, pela orientação e confiança para execução desta dissertação. À professora Helena Carla Castro pela acolhida no LABioMol, por todo conhecimento compartilhado, amizade, lições de simplicidade e paciência, pelos ensinamentos e colocações sempre pertinentes, constante disponibilidade em me ajudar e por sua tranqüilidade nos meus momentos de aflição. À minha irmã Sabrina, por sempre falar a verdade mesmo quando eu não quero ouvir. Por acreditar mais em mim do que eu mesma, por me alimentar e por ser minha amiga, além de irmã! À Nashara que mais que uma amiga, se fez irmã! Pelo cinema de domingo e pela companhia até na lama! A conquista de uma sempre foi comemoração para todas. O obstáculo de uma sempre reflete o auxílio e a dedicação de todas para a superação dele! À amiga e companheira de laboratório e congressos Paula Abreu, sempre calma quando estou a ponto de explodir! À Renata Dümpel, por só aparecer no laboratório no final dessa dissertação! Aos demais colegas do LABioMol, Rafael, Bruno, Reinaldo e André, pela ótima convivência, auxílio e conversas descontraídas. Em especial à Natália, pela convivência e crescente amizade durante esses anos. À Ingrid Toledo, uma amiga inesperada, por estar sempre disposta a me ouvir, mesmo com muito sono, e pelas palavras estimuladoras. A todos os amigos que me acompanham desde a graduação, agradeço pelos momentos de descontração, tornando minha vida mais divertida. Principalmente à Bianca Fraga, Renata Saraiva e Tatiana Gomes pela grande amizade e por estarem sempre ao meu lado quando preciso. Aos amigos Leandro Pedrosa e Rodrigo Tonioni, pelo apoio e presença constantes nessa etapa da minha vida. Agradeço por ouvirem minhas reclamações e me aturarem até aqui! Aos colegas do Mestrado pela excelente relação pessoal que espero que não se perca. À professora Magaly Girão Albuquerque, do laboratório 609 do IQ-UFRJ, pelos ensinamentos sobre modelagem molecular desde a iniciação científica. À aluna de doutorado Monique Brito, do laboratório 609 do IQ-UFRJ, por estar sempre disposta a ajudar. Ao Fabiano Malhard, pelo ‘suporte online’ nos momentos que eu precisava. Ao Pedro Nucci, pelas suas insistentes questões sobre modelagem molecular e discussões científicas. Aos demais docentes do Programa de Pós-Graduação em Química Orgânica, que contribuíram para minha formação. À secretária do Programa de Pós-Graduação em Química Orgânica, Liliane Cunha de Mello, pela disponibilidade nos momentos necessários. Índice Lista de Abreviaturas............................................................................................i Lista de Figuras...................................................................................................iii Lista de Esquemas..............................................................................................vi Lista de Tabelas.................................................................................................vii Resumo.............................................................................................................viii Abstract...............................................................................................................ix 1. Introdução ................................................................................................. 01 1.1 Doenças Tropicais ................................................................................ 01 1.1.1. Doença de Chagas........................................................................... 04 1.1.1.1. Ciclo Biológico do Trypanosoma cruzi......................................... 06 1.1.1.2. Fármacos antichagásicos clássicos .............................................08 1.1.1.3. Naftoquinonas antichagásicas......................................................10 1.1.2. Tuberculose ......................................................................................14 1.1.2.1. Tuberculose associada ao Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV)......................................................................................................... 16 1.1.2.2. Fármacos antituberculose clássicos............................................ 18 1.1.2.3. Tuberculose Resistente a múltiplos fármacos ............................. 23 1.1.2.4. Derivados triazóis antituberculose............................................... 23 1.2 Modelagem Molecular ........................................................................ 26 1.2.1. Métodos de cálculos de Modelagem Molecular .............................. .29 1.2.1.1. Mecânica Molecular..................................................................... 29 1.2.1.2. Mecânica Quântica...................................................................... 30 1.2.1.2.1. Cálculos ab initio ................................................................. 32 1.2.1.2.2. Cálculos semi-empiricos ..................................................... 34 1.2.1.2.3. Teoria do Funcional de Densidade – DFT .......................... 36 1.2.2. Descritores Moleculares.................................................................... 38 1.3 Parâmetros Farmacocinéticos .............................................................. 40 1.3.1. Absorção .......................................................................................... 43 1.3.2. Distribuição ...................................................................................... 44 1.3.3. Metabolismo e Excreção .................................................................. 44 1.4 Toxicidade ............................................................................................ 46 1.5 Propriedades Semelhantes a um Fármaco (Drug-likeness) ................. 47 2. Objetivos ................................................................................................. 49 3. Justificativa ............................................................................................... 50 4. Metodologia............................................................................................... 54 4.1 Análise Conformacional ........................................................................ 54 4.2 Cálculos semi-empíricos....................................................................... 55 4.3 Cálculos ab initio................................................................................... 55 4.4 Cálculos DFT ........................................................................................ 58 4.5 Sobreposição........................................................................................ 58 4.6 Propriedades Semelhantes a um Fármaco (Drug-likeness) ................ 59 4.7 Toxicidade ............................................................................................ 62 4.7.1. Descrição dos tipos de toxicidade .................................................... 64 4.8. Drugscore ............................................................................................... 64 5. Resultados e Discussão........................................................................... 66 5.1 Aplicação de modelagem molecular no estudo da Relação EstruturaAtividade de derivados da lapachona com perfil tripanocida ...................... 66 5.1.1. Análise dos dados obtidos a partir dos cálculos de modelagem molecular.................................................................................................. 66 5.2 Aplicação de modelagem molecular no estudos da Relação EstruturaAtividade de derivados 1,2,3-triazólicos com atividade antimicobacteriana 81 5.2.1. Análise dos dados obtidos a partir dos cálculos de modelagem molecular.................................................................................................. 81 5.2.2. Análise dos parâmetros físico-químicos e perfil toxicológico ........... 91 5.2.3. Drug-likeness ................................................................................... 94 5.2.4. Toxicidade........................................................................................ 95 6. Conclusões e Perspectivas...................................................................... 96 Lista de Abreviaturas 3D tridimensional ADME Absorção, Distribuição, Metabolismo e Excreção ADMET Absorção, Distribuição, Metabolismo, Excreção e Toxicidade AIDS Síndrome da Imunodeficiência Adquirida AM1 Austin Model 1 CADD Computer-Aided Drug Design, Desenvolvimento de fármacos auxiliado por computador CC50 Concentração que induz a morte de 50% das células viáveis clogP Lipofilicidade calculada CMI Concentração Mínima Inibitória D Debye DFT Density Functional Theory, Teoria do Funcional de Densidade DNA Ácido Desóxi-ribonucléico e elétrons eV Elétrons Volts HF Hartree-Fock HIV Vírus da Imunodeficiência Humana HOMO Orbital Molecular Ocupado de Maior Energia IC50 Concentração que inibe 50% da viabilidade parasitária IS Índice de Seletividade LUMO Orbital Molecular Desocupado de Menor Energia MDR Multiple Drug Resistent, Resistência a múltiplos fármacos MEP Molecular Elestrostatic Potential, Potencial Eletrostático Molecular MMFF Molecular Mechanics Force Field, Campo de Força de Mecânica Molecular NADPH Nicotinamida Adenosina Dinucleotídeo Fosfato OMS Organização Mundial da Saúde PM Peso Molecular PM3 Parametric Model 3 QSAR Correlação Quantitativa entre Estrutura Química e Atividade RMN Ressonância Magnética Nuclear RTECS Registry of Toxic Effects of Chemical Substances, Registro dos Efeitos Tóxicos de Substâncias Químicas i SAR Relação Estrutura-Atividade SEP Superfície de Energia Potencial SOD Superóxido Dismutase STO Orbitais do Tipo Slater T. cruzi Trypanosoma cruzi TB Tuberculose TDR Tropical Disease Research, Pesquisa em Doenças Tropicais TR Tripanotiona Redutase u.a. unidade atômica UNDP United Nations Development Programme, Desenvolvimento das Nações Unidas VM Volume Molecular Programa de ii Lista de Figuras Figura 1: Círculo vicioso entre pobreza e saúde.. ........................................................ 02 Figura 2: Impacto das doenças tropicais negligenciadas no mundo. Em cinza, países afetados apenas com uma doença tropical negligenciada; em azul, países afetados com duas; em verde, países afetados com três; em amarelo, países afetados com quatro; em laranja, países afetados com cinco e em vermelho, países afetados com seis doenças tropicais negligenciadas ............................. 03 Figura 3: Mapa das Regiões endêmicas da Doença de Chagas....... ........................... 05 Figura 4: Ciclo de vida do Trypanosoma cruzi. (A) Transmissão do parasita ao hospedeiro vertebrado; (B) Invasão de tripomastigotas; (C) Diferenciação de tripomastigotas em amastigostas; (D) tripomastigotas na corrente sangüínea; (E) Transmissão do parasita para o vetor; (F) Epimastigotas proliferativas; (G) Tripomastigotas metacíclicas infectantes. ......................................................... 07 Figura 5: Estrutura química do nifurtimox (1) e do benznidazol (2)............................... 08 Figura 6: Estrutura química das quinonas. Benzoquinona (3), 1,2-naftoquinona (4), 1,4-naftoquinona (5), antraquinona (6). ............................................................. 11 Figura 7: Naftoquinonas testadas contra a forma tripomastigotas de T. cruzi. ............. 13 Figura 8: Estimativa de incidência de tuberculose no ano de 2004. ............................. 15 Figura 9: Prevalência de casos de tuberculose em adultos co-infectados com HIV no ano de 2004. ..................................................................................................... 17 Figura 10: Fármacos utilizados no coquetel de primeira linha para o tratamento da tuberculose: isoniazida (13), pirazinamida (14), etambutol (15), rifampicina (16) e estreptomicina (17). ................................................................................ 18 Figura 11: Estrutura química dos fármacos utilizados no coquetel de segunda linha: ofloxacino (18), ciprofloxacino (19), etionamida (20), cicloserina (21), ácido pamino-salicílico (22), canamicina (23), capreomicina (24). ................................ 20 Figura 12: Estrutura química de derivados de diarilquinolina (25), fluorquinolona (26), rifampicina (27), oxazolidinona (28) e nitroimidazol (29), com atividade antituberculose.................................................................................................. 22 Figura 13: Equilíbrio tautomérico em 1,2,3- e 1,2,4-triazóis.......................................... 24 Figura 14: Estrutura química do derivado 1,2,3-triazol (30) com atividade antituberculose.................................................................................................. 25 Figura 15: Estrutura química de derivados 1,2,4-triazóis (31-34) com atividade antituberculose.................................................................................................. 26 Figura 16: Planejamentos de fármacos auxiliados por computador.............................. 28 Figura 17: Representação esquemática dos termos incluídos em um campo de força de mecânica molecular. (A) comprimento de ligação, (B) ângulo de ligação, (C) ângulo de torsão.......................................................................................... 30 Figura 18: Principais razões dos fracassos no desenvolvimento de fármacos. ............ 42 iii Figura 19: Exemplos de reações de Fase 1, (A), (B) e (C) Reações de oxidação, (D) reação de hidrólise e Fase 2, (E) conjugação com ácido glicurônico................. 46 Figura 20: Estrutura química da β-lapachona (35) e dos derivados modificados na posição orto da função quinona, oxazol (36a), imidazol (36b) e fenazina (37). . 51 Figura 21: Distribuição de drug-likeness de fármacos comerciais (em veRmelho) versus substâncias químicas do catálogo Fluka (em azul). ............................... 61 Figura 22: Cálculos de perfil toxicológico, propriedades físico-químicas, drug-likeness e drug-score pelo programa Osíris, utilizando como exemplo a isoniazida (17) 62 Figura 23: Vetor do momento de dipolo molecular dos derivados naftoquinônicos (35), (38-41). ..................................................................................................... 70 Figura 24: Mapa de Potencial Eletrostático Molecular (MEP) dos derivados naftoquinônicos (35), (38-41), gerados na faixa de energia entre -65(azul) e +23 (vermelho) kcal/mol. (A) frente e (B) verso dos derivados .......................... 71 Figura 25: Coeficiente de distribuição dos orbitais HOMO dos derivados naftoquinônicos (35), (38-41). ........................................................................... 71 Figura 26: (A) Coeficiente de distribuição dos orbitais LUMO e (B) densidade de LUMO dos derivados naftoquinônicos (35), (38-41), gerada numa superfície de densidade eletrônica constante de 0,002 e/ua³. ........................................... 71 Figura 27: Mapa de Potencial Eletrostático Molecular dos derivados naftoquinônicos oxiranos (35a), (38a-41a). gerados na faixa de energia entre -65(azul) e +23 (vermelho) kcal/mol. (A) frente e (B) verso dos derivados ................................. 75 Figura 28: (A) Coeficiente de distribuição dos orbitais LUMO e (B) densidade de LUMO dos derivados naftoquinônicos oxiranos (35a), (38a-41a), gerada numa superfície de densidade eletrônica constante de 0,002 e/ua³. ........................... 76 Figura 29: Coeficiente de distribuição dos orbitais HOMO dos derivados naftoquinônicos oxiranos (35a), (38a-41a). ....................................................... 76 Figura 30: Vetor do momento de dipolo molecular dos derivados naftoquinônicos oxiranos (35a), (38a-41a). ................................................................................. 76 Figura 31: Índice de Seletividade para os compostos mais ativos, β-lapachona (35), e oxirano-α-lapachona (41a). ............................................................................... 79 Figura 32: (A) Comparação do vetor dipolo molecular e (B) Sobreposição da βlapachona (35), em azul, e do oxirano-α-lapachona (41a), em verde. ............... 80 Figura 33: Densidade de LUMO dos compostos N-fenil-1,2,3-triazóis-4-carbaldeídos (42a-42l), gerados numa superfície de densidade eletrônica constante de 0,002e/ua³......................................................................................................... 85 Figura 34: Densidade de LUMO dos compostos N-fenil-1,2,3-triazóis-4difluormetilênicos (43a-43l), gerados numa superfície de densidade eletrônica constante de 0,002e/ua³.................................................................................... 85 Figura 35: Mapa de Potencial Eletrostático Molecular dos derivados N-fenil-1,2,3triazóis-4-carbaldeídos (42a-42l), gerados na faixa de energia entre -65 (azul) e +23 (vermelho) kcal/mol. ................................................................................ 87 Figura 36: Mapa de Potencial Eletrostático Molecular dos derivados N-fenil-1,2,3triazóis-4-difluormetilenos (43a-43l), gerados na faixa de energia entre -65 (azul) e +23 (vermelho) kcal/mol. ...................................................................... 87 iv Figura 37: Vetor do momento de dipolo molecular dos derivados N-fenil-1,2,3triazóis-4-carbaldeídos (42a-42l)....................................................................... 88 Figura 38: Coeficiente de distribuição do HOMO dos derivados N-fenil-1,2,3-triazóis4-carbaldeídos (42a-42l). .................................................................................. 91 Figura 39: Potencial Drug-likeness dos compostos N-fenil-1,2,3-triazóis-4carbaldeídos (42a), (42f), (42i), (42j) e (42l) e do fármaco isoniazida (13)........ 94 Figura 40: Toxicidade dos compostos N-fenil-1,2,3-triazóis-4-carbaldeídos (42a), (42f), (42i), (42j) e (42l) e do fármaco isoniazida (13). ...................................... 95 v Lista de Esquemas Esquema 1: Ciclo redox do nifurtimox. ......................................................................... 09 Esquema 2: Ciclo redox parcial induzido por quinonas. ............................................... 12 Esquema 3: Modificações estruturais na β-lapachona (35). ......................................... 52 Esquema 4: Derivados N-fenil-1,2,3-triazóis-4-carbaldeídos (42a-42l) e N-fenil-1,2,3triazóis-4-difluormetilenos (43a-43l) sintetizados e testados frente cepas de Mycobacterium tuberculosis. ............................................................................. 53 Esquema 5: Fluxograma da metodologia aplicada no estudo de modelagem molecular. ......................................................................................................... 57 Esquema 6: Átomos utilizados na sobreposição dos compostos tripanocidas (35) e (41a). ................................................................................................................ 59 Esquema 7: Planejamento das naftoquinonas com modificações no anel pirano C e no centro redox. ................................................................................................ 67 vi Lista de Tabelas Tabela 1: Comparação da atividade antiparasitária (IC50), citotoxicidade em células VERO (CC50) e as propriedades eletrônicas moleculares (EHOMO, Dipolo, cLog P) dos derivados naftoquinônicos (35), (38-41). ................................................ 69 Tabela 2 Atividade antiparasitária (IC50), citotoxicidade em células VERO (CC50) e as propriedades eletrônicas moleculares (EHOMO, Dipolo, cLog P) dos derivados oxiranos (35a, 38a-41a). ................................................................................... 74 Tabela 3: Comparação da atividade mínima inibitória (CMI) e das propriedades eletrônicas dos compostos N-fenil-1,2,3-triazóis-4-carbaldeídos (42a-42l) e 4difluormetilenos (43a-43l).................................................................................. 83 Tabela 4: Parâmetros hidrofóbicos dos compostos N-fenil-1,2,3-triazóis-4-carbaldeídos (42a-42l) e 4-difluormetilênicos (43a-43l).......................................................... 93 vii Resumo Derivados naftoquinônicos e triazólicos foram sintetizados por nosso grupo e testados como agentes tripanocidas e antimicobacterianos, respectivamente. Com o intuito de obter as características estruturais e estereoletrônicas que podem influenciar no perfil de atividades desses compostos, foram utilizadas técnicas computacionais. Visando analisar o perfil toxicológico desses derivados, empregaram-se estudos teóricos in silico para os derivados triazólicos. No estudo dos derivados naftoquinônicos, tendo como protótipos α- e βlapachonas, o derivado oxirano da α-lapachona mostrou-se como o composto com melhor atividade tripanocida da série. Nos estudos por modelagem molecular, foram analisadas as modificações no anel pirano e no centro redox da sub-unidade quinona com o intuito de avaliar as propriedades que podem ser responsáveis pela atividade tripanocida. Os estudos demonstraram que a transposição do anel pirano da β-lapachona, e a inserção do anel oxirano, introduziram diferenças significativas no coeficiente de distribuição e na energia de HOMO, na densidade de LUMO, no mapa de potencial eletrostático molecular, no vetor dipolo molecular e na lipofilicidade calculada. O aumento da atividade tripanocida e a baixa citotoxicidade do derivado (41a), indicam esse composto como candidato a estudos adicionais sobre o mecanismo de ação. O estudo da Relação Estrutura-Atividade dos derivados 1,2,3-trazóis revela a importância da sub-unidade aceptora de ligação de hidrogênio nos derivados cabaldeídos (42a-42l), a posição do substituinte no anel aromático, a planaridade dos anéis triazol e fenila nesses derivados e a correlação entre o coeficiente de distribuição de HOMO e a atividade antimicobacteriana. No cálculo de drug-likeness dos compostos mais ativos (42a, 42f, 42i, 42j, e 42l) e da isoniazida (13), observou-se que apenas o derivado (42f) não apresentou um bom potencial drug-likeness enquanto o derivado (42i) apresentou o melhor valor, incluindo o fármaco isoniazida. Os estudos apontam os derivados triazóis (42a), (42i) e (42j), como moléculas protótipo para a proposta de novos compostos com perfil antituberculose. viii Abstract Naphtoquinones and triazoles derivatives were synthesized by our group and assayed as tripanocidal and antimicobacterial agents respectively. With the aim to obtain structural and estereoelectronic features that can influence the biological profile of these compounds, computational approaches were used. Aiming the study of the toxicological profile, theoretical studies in silico were performed for the triazoles derivatives. In the molecular modeling study of the naphtoquinones derivatives, starting from α- and β-lapachones, the oxyran derivative of α-lapachone (41a) showed to be one of the most potent compounds. In the Molecular modeling studies we analyzed the C-ring moiety and the redox center as the moieties responsible for the trypanocidal and cytotoxic effects on mammalian cell line. The methods used to delineate the structural requirements for the trypanocidal profile pointed out that the transposition of the C-ring moiety of β-lapachone, combined with its oxyran ring, introduced important molecular requirements for trypanocidal activity in the HOMO energy, HOMO orbital coefficient, LUMO density, electrostatic potential map, dipole moment vector, and calculated logP parameter. The significant trypanocidal activity and low cytotoxicity of derivative (41a) pointed this compound as a promising lead molecule for further studies on the mechanism of action. The Structure-Activity Relationship study of the 1,2,3-triazoles derivatives revealed the importance of the hydrogen bond acceptor subunit (42a–42l), the position in the aromatic ring, the planarity of triazole and phenyl rings in these compounds and a correlation between HOMO coefficient distribution and the antimicobacterial activity. In drug-likeness calculation of the most active compounds (42a, 42f, 42i, 42j, and 42l) and isoniazide (13), we observed that only derivative (42f) didn’t presented a good drug-likeness potential, while derivative (42i) presented the best value among them including isoniazide. The significant activity of the triazoles (42a), (42i) and (42j) as antituberculosis agents, pointed them as promising lead molecules for further synthetic and biological exploration. ix UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 1. Introdução 1.1. Doenças tropicais O estabelecimento e a adoção de prioridades na pesquisa em saúde são uma tarefa difícil, especialmente para aquelas doenças denominadas como negligenciadas e que atingem, sobretudo, a camada da população mundial com menor recurso financeiro. Atualmente, estas doenças ocorrem nas regiões tropicais e subtropicais, onde permanecem como prevalentes e se tornaram um grave problema de saúde pública1. A relação entre pobreza e saúde tem sido extensivamente estudada e analisada2. De forma geral, o impacto da pobreza sobre a saúde pode ser descrito através de dois amplos canais de transmissão. O primeiro deles se refere aos fatores de riscos que por sua vez determinam o perfil da doença. O outro se relaciona com a disponibilidade de recursos e, portanto, tem uma implicação direta nos meios de intervir na melhoria da saúde da população. 1 Nwaka, S.; Ridley, R.G.; “Virtual drug discovery and development for neglected diseases through public–private partnerships”, Nat. Rev. Drug Discov., 2003, 2(11), 919-928. 2 a) Ehrenberg, J.P.; Ault, S.K. “Neglected diseases of neglected populations: Thinking to reshape the determinants of health in Latin America and the Caribbean”, BMC Public Health. 2005, 5, 119; b) Franco-Paredes, C.; Jones, D.; RodriguesMorales, A.J.; Santos-Preciado, J.I.; “Commentary: improving the drug health of neglected populations in Latin America”, BMC Public Health, 2007, 7:11, 1 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Estes dois mecanismos integrados determinarão os resultados dos programas de saúde de uma determinada região3 (Figura 1). Figura 1: Círculo vicioso entre pobreza e saúde. O baixo interesse da indústria farmacêutica em buscar novas formas de tratamento de doenças consideradas como negligenciadas, nos últimos 20 anos, ocorre principalmente em função do baixo retorno financeiro, considerando que o lançamento de um novo fármaco no mercado pode levar entre 12 e 24 anos, desde o início das pesquisas até o lançamento no mercado, e custar aproximadamente 1,4 bilhões de dólares4. Uma nova abordagem, com o intuito de fixar prioridades nas pesquisas em doenças tropicais, tem sido adotada pelo Programa Especial para Pesquisa e Treinamento em Doenças Tropicais (The Special Programme for Research and Training in Tropical Diseases - TDR). TDR é um programa global de colaboração científica que se estabeleceu em 1975 e é co-patrocinado pelo Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas 3 Research and Development for Neglected Diseases – Lessons Learned and Remaining Challenges, International Federation of Pharmaceutical Manufacturers Associations (IFPMA), 2004. 4 a) Lombardino, J.G.; Lowe III, J.A.; “The role of the medicinal chemistry in drug Discovery – Then and Now”, Nat. Rev. 2004, 3(10), 853-62.; b) Renslo, A.R.; McKerrow, J.H.; “Drug Discovery and Development for neglected Parasitic Diseases”, Nat. Chem. Biol., 2006, 2(12), 701-710. 2 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza (United Nations Development Programme - UNDP), o Banco Mundial (World Bank) e a Organização Mundial da Saúde (World Health Organization WHO)5. Os recursos financeiros são extremamente limitados para as doenças tropicais, sendo a maioria delas referidas como doenças negligenciadas, tais como, malaria, leishmaniose, filaríase linfática, doença de Chagas e esquistossomose. Estas doenças são mais difíceis de prevenir ou controlar e afetam as populações das zonas rurais, comunidades carentes e zonas de conflitos e estão relacionadas atualmente aos sintomas de pobreza6 (Figura 2). Figura 2: Impacto das doenças tropicais negligenciadas no mundo. Em cinza, países afetados apenas com uma doença tropical negligenciada; em azul, países afetados com duas; em verde, países afetados com três; em amarelo, países afetados com quatro; em laranja, países afetados com cinco e em vermelho, países afetados com seis doenças tropicais negligenciadas7. 5 World Health Organization, WHO, http://www.who.int/tdr, acessado em 10 de março de 2007. 6 a) World Health Organization, “Global defense against the infectious disease threat”, Geneva 2002.; b) World Health Organization; “Intensified control of neglected diseases”, Report of an International Workshop. Berlim, 2003.; c) Fehr, A.; Thürmann, P.; Razun, O.; “Editorial: Drug Development for Neglected Diseases: a Public Health Challenge”, Trop. Med. Intern. Health, 2006, 11 (9), 1335-1338. 7 http://www.gnntdc.org/what/global.html, acessado em 07 de fevereiro de 2007. 3 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Menos de 10% dos recursos globais gastos em pesquisa em saúde são para as doenças negligenciadas, embora elas sejam responsáveis por cerca de 90% das doenças em todo o mundo8. O TRD auxilia financeiramente e ajuda a coordenar esforços globais para combater as principais doenças que atingem os países pobres. As prioridades são definidas a partir de uma análise compreensiva das necessidades e oportunidades de pesquisas para cada uma das dez doenças negligenciadas listadas pelo TDR - Leishmaniose, Esquistossomose, Filaríase Linfática, Oncocercose, Doença de Chagas, Lepra, Tuberculose, Malária, Tripanossomíase Africana e Dengue9. Aproximadamente 1 bilhão de pessoas – um sexto da população mundial – são acometidas de uma ou mais doenças tropicais negligenciadas. Situações de conflito ou desastres naturais agravam as condições que ajudam no processo de disseminação dessas doenças10. 1.1.1. Doença de Chagas A Doença de Chagas é uma das enfermidades parasitárias mais significantes em todo o mundo. A despeito da imposição dos programas de 8 Global Forum for Health Research, http://www.globalforumhealth.org, acessado em 02 de março de 2007; b) Remme, J.H.; Blas, E.; Chitsulo, L.; Desjeux, P.M.; Engers, H.D.; Kanyok, T.P.; Kengeya Kayondo, J.F.; Kioy, D.W.; Kumaraswami, V.; Lazdins, J.K.; Nunn, P.P.; Oduola, A.; Ridley, R.G.; Toure, Y.T.; Zicker, F.; Morel, C.M.; ”Strategic emphases for tropical diseases research: a TDR perspective”, Trends Parasitol., 2002, 18(10), 421-426. 9 Watkins, B. M.; “Drugs for the control of parasitic diseases: current status and development”, Trends in Parasitology, 2003, 19 (11), 477-478. 10 World Health Organization, Department of Control of Neglected Tropical Diseases, CDS, 2006. 4 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza saúde pública – por exemplo, o controle de vetores – ter diminuído a incidência de novas infecções, continua sendo endêmica em grande parte da América Latina onde mais de 40 milhões de pessoas estão expostas ao risco nas Américas do Sul e Central5. Estima-se que 18 a 20 milhões de pessoas estão infectadas (Figura 3). Além disso, cerca de 21 mil pessoas morrem da doença e mais de 200 mil novos casos surgem a cada ano11. 10 Figura 3: Mapa das Regiões endêmicas da Doença de Chagas . O Trypanosoma cruzi, o agente etiológico da Doença de Chagas, pode ser transmitido de três maneiras, a saber: a) pela picada do triatomídeo Rhodnius prolixus – vulgarmente chamado de barbeiro ou “kissing bug” –, b) por transfusão sangüínea ou c) por transmissão congênita12. 11 Paulino, M.; Iribarne, F.; Dubin, M.; Aguilera-Morales, S.; Tapia, O.; Stoppani, A.O.M.; “The Chemotherapy of Chagas‘ disease: An Overview”, Mini Rev. Med. Chem., 2005, 5(5), 499-519. 12 http://www.dpd.cdc.gov/dpdx/HTML/TrypanosomiasisAmerican.htm, acessado em 07 de fevereiro de 2007. 5 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 1.1.1.1. Ciclo biológico do Trypanosoma cruzi. O ciclo de vida do parasita envolve uma passagem obrigatória por hospedeiros vertebrados (mamíferos, principalmente humanos) e invertebrados (insetos triatomídeos hematófagos) 11. O triatomídeo infectado, ao realizar a hematofagia, libera tripomastigotas metacíclicas pelas fezes, próximo ao local da picada (A). As tripomastigotas penetram no hospedeiro através da ferida ou pelo contato com mucosas (B). Uma vez dentro do hospedeiro, as tripomastigotas invadem as células, onde se diferenciam na forma intracelular amastigotas (C). As manifestações clínicas ocorrem quando a célula se rompe e as amastigotas atingem a corrente sangüínea, transformando-se em tripomastigotas (D). Essa forma invade outros tecidos do hospedeiro, principalmente o tecido cardíaco. Quando a forma tripomastigota se encontra na corrente sangüínea, ela não se replica. A replicação só volta a acontecer quando o tripomastigota infecta outra célula do hospedeiro ou de um vetor não infectado. O “barbeiro” é infectado quando faz a hematofagia em indivíduo ou animal que possuem parasitas circulantes (E) 13 (Figura 4). As tripomastigotas ingeridas pelo inseto se diferenciam em epimastigotas proliferativas (F), as quais, ao alcançar a parte posterior do intestino, diferenciam-se em tripomastigotas metacíclicas infectantes (G) 13 (Figura 4). 13 Teixeira, A.R.L.; Nascimento, R.J.; Sturm, N.R.; “Evolution and pathology in Chagas disease - A Review”, Mem. Inst. Oswaldo Cruz, 2006, 101(5), 463-491. 6 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Figura 4: Ciclo de vida do Trypanosoma cruzi. (A) Transmissão do parasita ao hospedeiro vertebrado; (B) Invasão de tripomastigotas; (C) Diferenciação de tripomastigotas em amastigotas; (D) tripomastigotas na corrente sangüínea; (E) Transmissão do parasita para o vetor; (F) Epimastigotas proliferativas; (G) Tripomastigotas metacíclicas infectantes14. A Doença de Chagas passa por dois estágios – uma fase aguda e uma fase crônica. A fase aguda dura de 6 a 8 semanas. Uma vez que essa fase cede, desaparecem as manifestações clínicas e a maioria dos pacientes infectados apresenta um aspecto saudável e nenhum dano pode ser observado nos órgãos pelos métodos padrões de diagnósticos clínicos. Nessa fase, a infecção somente pode ser detectada por testes parasitológicos ou sorológicos. Essa forma da fase crônica da doença é chamada de forma indeterminada, e na maioria dos pacientes, persiste indefinidamente. Entretanto, alguns anos depois do início da fase crônica, 10 a 40% dos pacientes infectados, desenvolvem lesões em vários órgãos, 14 http://www.who.int/tdr/diseases/chagas/lifecycle.htm, acessado em 06 de março de 2007. 7 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza principalmente no coração e no sistema digestivo. Essa condição é chamada de forma cardíaca ou digestiva da doença de Chagas crônica15. 1.1.1.2. Fármacos antichagásicos clássicos Atualmente, os fármacos disponíveis comercialmente para o tratamento da Doença de Chagas são o nifurtimox (LampitTM), e o benznidazol (RandanilTM, RochaganTM) (Figura 5), que possuem eficiência comprovada apenas contra a forma extracelular do parasita durante a fase aguda. Além disso, causam efeitos adversos importantes, como anorexia, perda de peso, vômitos, náuseas, diarréia e outros11. O O S O O2 N N N H O N N NO2 N (1) (2) Figura 5: Estrutura química do nifurtimox (1) e do benznidazol (2). O mecanismo de ação desses fármacos ocorre através da redução do grupo nitro. No caso do nifurtimox, a redução resulta em um ânion-radical nitrênio instável, que em seguida reage com oxigênio molecular produzindo superóxido, um metabólito altamente tóxico, que na presença da enzima Superóxido Dismutase (SOD), é transformado em peróxido de hidrogênio, o qual se acumula no interior da célula, gerando radicais hidroxila, num 15 World Health organization, Control of Chagas’ disease: second report of the WHO expert committee. Geneva, 2002. 8 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza processo conhecido como ciclo redox (Esquema 1). O mecanismo de ação do benznidazol também envolve a redução do grupo nitro, mas os intermediários reduzidos se ligam covalentemente as biomacromoléculas modificando-as16,17. T.R. T(SH)2 Ar NO2 e - Ar NO2 O2 O2 SOD 2H+ + e- H2O2 TS2 H2O + 1/2 O2 Fe2+ Fe3+ SOD= Superóxido Dismutase T.R.= Tripanotiona Redutase OH + -OH Esquema 1: Ciclo redox do nifurtimox16. Os efeitos adversos desses fármacos resultam de danos oxidativos ou redutores nos tecidos do hospedeiro, em função da ausência de seletividade desses fármacos em relação ao parasita18,19. Devido a sua alta toxicidade, o 16 Viodé,C.; Bettache,N.; Cenas, N.; Krauth-Siegel, R.L.; Chauvière,G.; Bakalara, N.; Périe, J.; “Enzymatic Reduction Studies of Nitroheterocycles”, Biochem. Pharmacol., 1999, 57(5), 549-57. 17 Boiani, M.; Boiani, L.; Denicola, A.; Ortiz, S.T.; Serna, E.; Bilbao, N.V. Sanabria, L. Yaluff, G.; Nakayama, H.; Arias, A.R.; Vega, C.; Rolan, M. Gómez-Barrio, A.; Cerecetto, H.; González, M.; “2H-Benzimidazole 1,3-Dioxide Derivatives: A New Family of Water-Soluble Anti-Trypanosomatid Agents”, J. Med. Chem., 2006, 49(11), 3215-3224. 18 DoCampo, R.; Mason, R.P.; Mottley, C.; Muniz, R.P.A.; “Generation of the free radicals induced by nifurtimox in mammalian tissues”, J. Biol. Chem., 1981, 256(21), 10930-10933. 19 Aguirre, G.; Boiani, L.; Cerecetto, H.; Fernández, M.; González, M.; Denicola, A.; Otero, L.; Gambino, D.; Rigol, C.; Olea-Azar, C.; Faundez, M.; “In vitro Activity an Mechanism of action against the protozoan parasite Trypanosoma cruzi of 5nitrofuryl containing thiosemicarbazones”, Bioorg. Med. Chem., 2004, 12(18), 48854893. 9 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza nifurtimox teve sua comercialização descontinuada no Brasil a partir da década de 80, e, em seguida, na Argentina, Chile e Uruguai20. Assim, a estratégia para o desenvolvimento de novos agentes terapêuticos, eficazes contra a Doença de Chagas, é a busca de compostos que possam levar à erradicação do parasita no hospedeiro vertebrado, agindo nas formas intracelular amastigota e extracelular tripomastigota, sem os efeitos colaterais dos fármacos que estão no mercado atualmente. 1.1.1.3. Naftoquinonas antichagásicas Nos últimos anos, o interesse pelas quinonas tem sido intensificado, devido à sua importância em diferentes processos bioquímicos celulares e sua diversidade farmacológica, destacando-se as que possuem propriedades microbicidas, tripanocidas, antitumorais, antiinflamatórias, e inibidores de sistemas celulares reparadores, processos nos quais atuam de diferentes formas. Com base na sua estrutura molecular, as quinonas são divididas em diferentes grupos, utilizando-se como critério o tipo de sistema aromático que sustenta o anel quinonoídico sendo benzoquinonas (3), derivadas do anel benzênico; naftoquinonas (4, 5) - derivadas do anel naftalênico, podendo ter 20 Coura, J.R.; Castro, S.L.; “A Critical Review on Chagas Disease Chemotherapy”, Mem Inst Oswaldo Cruz, 2002, 97(1), 3-24. 10 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza o arranjo 1,2 ou o arranjo 1,4, ou antraquinonas (6)- oriundas de um anel antracênico21(Figura 6). O O O O O O (6) O O (3) (4) (5) Figura 6: Estrutura química das quinonas. Benzoquinona (3), 1,2-naftoquinona (4), 1,4naftoquinona (5), antraquinona (6). O principal interesse nas quinonas advém da sua capacidade de induzir o estresse oxidativo nas células. Sob ação enzimática, um substrato quinonoídico (Q) reduz-se com um elétron para formar o ânion-radical semiquinona (Q-•), catalisada pelas enzimas flavinas NADPH citocromo P450 redutase, NADPH citocromo b5 redutase ou NADPH ubiquinona oxidoredutase. Uma vez formada, a espécie semiquinona (Q-•) reduz o oxigênio molecular ao ânion-radical superóxido (O2-•) que, na presença da enzima superóxido dismutase (SOD), é transformado em H2O2. Este ânionradical superóxido (O2-•), por catálise com metais de transição (reação de Fenton), ou por reação com H2O2 (reação de Harber-Weiss), gera HO• no interior da célula. Embora o H2O2 não seja um radical livre, é uma substância 21 Silva, M.N.; Ferreira, V.F.; Souza, M.C.B.V.; “Um panorama atual da química e da farmacologia de naftoquinonas com ênfase na β-lapachona e derivados”, Quím. Nova, 2003, 26(3), 407-416. 11 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza bastante reativa, podendo promover também a oxidação de algumas biomoléculas 11,21,22 (Esquema 2). O NADP+ FAD+red O (Q) Fe+2/Cu+1 O2 Fe+3/Cu+2 O2 OH + H2O2 + O2 SOD* NADP+ + H+ O2 FADoxid H2O2 O (Q) O SOD*= Superóxido-dismutase Fe(II) + H2O2 O2 + H2O2 Fe(III) + HO- + HO (reação de Fenton) O2 + HO- + HO (reação de Haber-Weiss) 21 Esquema 2: Ciclo redox parcial induzido por quinonas . A formação de intermediários reativos torna as quinonas uma classe de compostos tóxicos, que podem induzir diversos efeitos nocivos in vivo, incluindo citotoxicidade, imunotoxicidade e carcinogênese23. 22 De Moura, K.C.G.; Emery, F.S.; Neves-Pinto, C.; Pinto, M.C.F.R.; Dantas, A.P.; Salomão, K.; Castro, S.L.; Pinto, A.V.; “Trypanocidal Activity of isolated Naphtoquinones from Tabebuia and some heterocyclic Derivatives: A Review from a Interdisciplinary Study”, J. Braz. Chem. Soc., 2001, 12(3), 325-338. 23 Bolton, J.; Trush, M.A.; Penning, T.M.; Dryhurst, G.; Monks, T.J.; “Role of Quinones in Toxicology”, Chem. Res. Toxicol., 2000, 13(3), 135-160. 12 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Na busca de novos compostos com potencial atividade antichagásica, diversos análogos da naftoquinonas (7-12) têm sido sintetizados com o intuito de obter derivados mais ativos e sem os efeitos citotóxicos dos fármacos que estão atualmente no mercado 22,24 (Figura 7). O O O O NOH O H N HN HN O N (7) IC50= 2,42 µM N O O N (8) IC50= 2,40 µM (9) IC50= 199 µM O O O S N O OMe (10) IC50= 49,5 µM O (11) IC50= 3,7 µM O (12) IC50= 1,1 µM 22,24 Figura 7: Derivados de naftoquinonas testados contra a forma tripomastigota de T. cruzi . 24 a) Zani, C.L.; Chiari, E.; Krettli, A.U.; Murta, S.M.; Cunningham, M.L.; Fairlamb, A.H.; Romanha, A.J.; “Anti-plasmodial and anti-trypanosomal activity of synthetic naphtho[2,3-b]thiopen-4,9-quinones”, Bioorg. Med. Chem., 1997, 5(12), 2185-2192; b) Sperandeo, N.R.; Brun, R.; "Synthesis and Biological “Evaluation of Pyrazolylnaphtoquinones as New Antiprotozoal and Citotoxic Agents", ChemBioChem 2003, 4(1), 69-72.; c) Tapia, R.A.; Salas, C.; Morello, A.; Maya, J.D.; Toro-Labbe, A.; ”Synthesis of dihydronaphthofurandiones and dihydrofuroquinolinediones with trypanocidal activity and analysis of their stereoelectronic properties”, Bioorg. Med. Chem., 2004, 12(9), 2451-2458; d) Silva, R.S.; Costa, E.M.; Trindade, U.L.; Teixeira, D.V.; Pinto, M.C.; Santos, G.L.; Malta, V.R.; De Simone, C.A.; Pinto, A.V.; de Castro, S.L.; “Synthesis of naphthofuranquinones with activity against Trypanosoma cruzi”, Eur. J. Med. Chem., 2006, 41(4), 526-530. 13 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 1.1.2. Tuberculose A tuberculose (TB) afeta a humanidade desde os primórdios da sua existência e tornou-se, a partir do século XIX, uma das mais importantes causas de morte em todos os tempos25. Com aproximadamente 9 milhões de pessoas apresentando tuberculose ativa a cada ano e com cerca de 1,7 milhões de mortes por ano, essa enfermidade está longe de ser controlada26. A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a tuberculose como sendo um enorme problema de saúde pública mundial27. Trata-se Mycobacterium de uma doença tuberculosis, da infecto-contagiosa, família causada Mycobacteriaceae e pelo ordem Actinomycetales25, isolado e descrito em 1882 por Robert Koch. Existem várias formas de tuberculose (pulmonar, meníngea, miliar, óssea, renal, cutânea, genital, etc), no entanto a forma pulmonar é a mais freqüente e contagiosa28. Apesar da imensa aplicação dos antimicrobianos e os regimes terapêuticos eficazes no combate a tuberculose, assim como medidas e procedimentos para seu controle há várias décadas, nos últimos anos houve um recrudescimento em âmbito mundial28. As maiores taxas per capita estão na África (29% de todos os casos de tuberculose) e metade de todos os 25 Tavares, W.; Marinho, A.C.; Rotinas de Diagnóstico e tratamento das doenças infecciosas e parasitárias. Ed. Atheneu, RJ, 2005. 26 Médicos sem Fronteiras. “Development of new drugs for TB chemotherapy Analysis of the current drug pipeline”, 2006. 27 TDR. Diagnostics for tuberculosis: global demand and market potential, FIND SA., 2006. 28 Batista, R.S.; Igreja, R.P.; Gomes, A.P.; Huggins, D.W. Medicina Tropical: abordagem atual das doenças infecciosas e parasitárias. Vol.1. Ed. Culturo Médica, Rio de Janeiro, 2001 14 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza novos casos ocorrem em seis países asiáticos: Bangladesh, China, Índia, Indonésia, Paquistão e Filipinas29 (Figura 8). Figura 8: Estimativa de incidência de tuberculose no ano de 200430. A forma mais importante de transmissão ou contágio ocorre através das vias aéreas. A susceptibilidade é geral na espécie humana, dentre os quais se destacam: idade, estado nutricional, condições emocionais ou psicológicas, doenças concomitantes (sarcoidose, diabetes, silicose, neoplasias malignas, infecção pelo vírus da imunodeficiência humana - HIV), hábitos e estilo de vida (alcoolismo e tabagismo). A fonte de infecção ocorre através do indivíduo portador da forma pulmonar, em que o maior risco de transmissão se dá pela inalação de bactérias no ar, liberadas por gotículas expelidas pela tosse ou espirro25. 29 World Health Organization, Tuberculosis Fact Sheet Nº104, 2006. World Health Organization. WHO Report 2006: Global Tuberculosis Control Surveillance, Planning and Financing. http://www.who.int/tb, acessado em 02 de março de 2007. 30 15 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 1.1.2.1. Tuberculose associada ao Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) é uma infecção causada pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) e, no mundo inteiro, estima-se que 38,6 milhões de pessoas estão vivendo com o HIV, das quais cerca de 25 milhões desenvolvem a síndrome31,32. A infecção pelo HIV é caracterizada pela lenta destruição de células do sistema imunológico. O principal alvo do vírus é o linfócito T CD4+, célula responsável pela coordenação da resposta imune aos antígenos, patógenos e células cancerígenas, que quando infectadas pelo vírus HIV se deterioram continuamente, e conseqüentemente levam a perda da capacidade imunológica e propicia o desenvolvimento de infecções oportunistas, caracterizando a síndrome. Por essa razão, o quadro clínico da AIDS é caracterizado em função da contagem sanguínea de linfócitos T CD4+ no individuo infectado com o HIV e da caracterização das condições clínicas do paciente infectado32,33. Estima-se que cerca de 12 milhões de pessoas em todo o mundo estão co-infectadas com ambas as doenças e esta associação corresponde 31 Simon, V.; Ho, D.D.; Abdool Karim, Q.; “HIV/AIDS epidemiology, pathogenesis, prevention, and treatment”, Lancet., 2006, 368(9534), 489-504. 32 Castro, H.C.; Loureiro, N.I.V.; Pujol-Luz, M.; Souza, A.M.T.; Albuquerque, M.G.; Santos, D.O.; Cabral, L.M.; Frugulhetti, I.C.; Rodrigues, C.R.; “HIV-1 Reverse Transcriptase: A Therapeutical Target in the Spotlight”, Curr. Med. Chem., 2006, 13(3), 313-324. 33 Peçanha, E.P.; Antunes, O.A.C.; Tanuri, A.; “Pharmacological strategies for antiHIV therapy”, Quím. Nova, 2002, 25, 1108-1116. 16 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza a 13% das mortes relacionadas à HIV. A maioria dos casos se localiza no Sudeste da África34,35,36. Figura 9: Prevalência de casos de tuberculose em adultos co-infectados com HIV no ano de 200437. Essa associação pode prejudicar o diagnóstico precoce da tuberculose, além de provocar um aumento na freqüência das reações adversas do tratamento e altas taxas de reincidência e de re-infecção. A presença do HIV possibilita que o indivíduo se torne mais suscetível ao desenvolvimento e a progressão da tuberculose35,38. 34 http://www.tballiance.org, acessada em 07/02/2007. Bates, I.; Fenton, C.; Gruber, J.; Lalloo, D.; Medina Lara, A.; Squire, S.B.; Theobald, S.; Thomson, R. Tolhurst, R.; “Vulnerability to malaria, tuberculosis, and HIV/AIDS infection and disease. Part 1: determinants operating at individual and household level”, Lancet Infect. Dis., 2004, 4(5), 267-277. 36 Johnson, M.D.; Decker, C.F.; “Tuberculosis and HIV infection”, Dis. Mon., 2006, 52(11-12), 420-427. 37 http://www.tbcindia.org, acessado em 05 de março de 2007. 38 Glassroth, J.; “Tuberculosis 2004: Challenges and opportunities”, Trans. Am. Clin. Climatol. Assoc., 2005, 116, 293-310. 35 17 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 1.1.2.2. Fármacos antituberculose clássicos Os antimicrobianos recomendados pela OMS e mais comumente usados para o tratamento da tuberculose em países em desenvolvimento nas Américas são: isoniazida (13), pirazinamida (14), etambutol (15), rifampicina (16) e estreptomicina (17), sendo este último administrado por via parenteral (Figura 10). Estes fármacos são usados em combinação como um coquetel de primeira linha e com diferentes tempos de duração dependendo da situação clínica28. H2N H N O H2N O H N HN N OH OH N N Isoniazida (13) Pirazinamida (14) Etambutol (15) NH NH H2N HO AcO OH OH MeO O OH OH O Rifampicina (16) NH HN OH H H OH O H H O CHO NH N OH H H H CH3 OH H N NH2 H OH H O N O H O O CH2OH NHCH3 H H OH H Estreptomicina (17) Figura 10: Fármacos utilizados no coquetel de primeira linha para o tratamento da tuberculose: isoniazida (13), pirazinamida (14), etambutol (15), rifampicina (16) e estreptomicina (17). 18 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Uma vez que o tratamento não é satisfatório, devido à resistência do bacilo ou mesmo pela intolerância a um ou mais fármacos deste coquetel, são utilizados fármacos de segunda linha, como ofloxacino (18) e ciprofloxacino (19), etionamida (20), cicloserina (21), ácido p-amino-salicílico (PAS) (22), canamicina (23) e capreomicina (24)39,40 (Figura 11). 39 Schröeder, E.K.; de Souza, O.N.; Santos, D.S.; Blanchard, J.S.; Basso, L.A.; “Drugs that Inhibit Mycolic Acid Biosynthesis in Mycobacterium tuberculosis”, Curr. Pharm. Biotechnol., 2002, 3(3),197-225. 40 Zhang, Y.; Post-Martens, K.; Denkin, S.; “New drug candidates and therapeutic targets for tuberculosis therapy”, Drug Disc. Today, 2006, 11(1-2), 21-27. 19 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza O O F O OH N N HN O ofloxacino (18) S OH N N N O F ciprofloxacino (19) NH2 O H N O OH HO O N H2N NH2 etionamida (20) cicloserina (21) PAS (22) H2N NH2 NH2 HO O OH HO O O HO NH2 O O HO O NH2 NH O H2N O N H NH H N H O OH canamicina (23) O N H H N NH2 O NH NH2 HO H N NH2 capreomicina (24) Figura 11: Estrutura química dos fármacos utilizados no coquetel de segunda linha: ofloxacino (18), ciprofloxacino (19), etionamida (20), cicloserina (21), ácido p-amino-salicílico (22), canamicina (23), capreomicina (24). 20 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Os fármacos antituberculose atualmente utilizados no tratamento foram desenvolvidos há 40 anos e, existe uma grande necessidade de buscar novos agentes terapêuticos que não apresentem resistência40. Dessa forma, novos agentes antituberculose têm sido estudados, incluindo derivados de diarilquinolinas, como o R207910 (25)41, derivados de fluorquinolonas, como o MXF (26)42, derivados de rifampicina, como o rifalazil (27)43, derivados de oxazolidinonas, como o U-100480 (28)44 e nitroimidazóis, como o PA-824 (29)45 (Figura 12). 41 Andries, K.; Verhasselt, P.; Guillemont, J.; Gohlmann, H.W.; Neefs, J.M.; Winkler, H.; Van Gestel, J.; Timmerman, P.; Zhu, M.; Lee, E.; Williams, P.; de Chaffoy, D.; Huitric, E.; Hoffner, S.; Cambau, E.; Truffot-Pernot, C.; Lounis, N.; Jarlier, V.; “A diarylquinoline drug active on the ATP synthase of Mycobacterium tuberculosis”, Science, 2005, 307(5707), 223-227. 42 Ji, B.; Lounis, N.; Maslo, C.; Truffot-Pernot, C.; Bonnafous, P.; Grosset, J.; ”In vitro and in vivo activities of moxifloxacin and clinafloxacin against Mycobacterium tuberculosis”, Antimicrob. Agents Chemother., 1998, 42(8), 2066-2069. 43 Rothstein, D.M.; Hartman, A.D.; Cynamon, M.H.; Eisenstein, B.I.; “Development potential of rifalazil”, Expert Opin. Investig. Drugs, 2003, 12(2), 255-271. 44 Barbachyn, M.R.; Hutchinson, D.K.; Brickner, S.J.; Cynamon, M.H.; Kilburn, J.O.; Klemens, S.P.; Glickman, S.E.; Grega, K.C.; Hendges, S.K.; Toops, D.S.; Ford, C.W.; Zurenko, G.E.; “Identification of a Novel Oxazolidinone (U-100480) with Potent Antimycobacterial Activity”, J. Med. Chem., 1996, 39(3), 680-685. 45 Stover, C.K.; Warrener, P.; VanDevanter, D.R.; Sherman, D.R.; Arain, T.M.; Langhorne, M.H.; Anderson, S.W.; Towell, J.A.; Yuan, Y.; McMurray, D.N.; Kreiswirth, B.N.; Barry, C.E.; Baker, W.R.; ”A small-molecule nitroimidazopyran drug candidate for the treatment of tuberculosis”, Nature, 2000, 405(6789), 962-966. 21 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza O O F OH OH Br N H N N O N H NH MXF (26) R207910 (25) N S N N O F O HO O2N N N HN O N N O O O OH O O O OH NH H3CO O H3C(O)CO OCF3 OH Rifalazil (27) U-100480 (28) PA-824 (29) Figura12: Estrutura química de derivados de diarilquinolina (25), fluorquinolona (26), rifampicina (27), oxazolidinona (28) e nitroimidazol (29), com atividade antituberculose. 22 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 1.1.2.3. Tuberculose Resistente a Múltiplos Fármacos (MDR) A resistência aos fármacos antituberculose é causada pelo tratamento parcial ou inconsistente, devido ao abandono do tratamento, prescrição incorreta ou devido ao fornecimento dos fármacos em doses inferiores às necessárias para o tratamento46. Uma forma particularmente perigosa de resistência é a chamada tuberculose resistente a múltiplos fármacos, na qual o bacilo é resistente a isoniazida e rifampicina, os dois fármacos mais potentes usados no tratamento da doença47,48. 1.1.2.4. Derivados triazóis antituberculose O desenvolvimento de resistência aos atuais fármacos antituberculose induz a busca por novas classes de compostos, mais eficazes e com diferentes mecanismos de ação, com o intuito de inibir a propagação da tuberculose. Os derivados heterocíclicos aromáticos nitrogenados de cinco membros, contendo um ou mais átomos de nitrogênio, pertencentes à classe de substâncias denominada genericamente de azol, podem ser considerados 46 Resch, S.C.; Salomon, J.A.; Murray, M.; Weinstein, M.C.; “Cost-Effectiveness of Treating Multidrug-Resistant Tuberculosis”, PLoS Med., 2006;3(7):e241 1048-1057. 47 Mukherjee, J.S.; Rich, M.L.; Socci, A.R.; Joseph, J.K.; Virú, F.A.; Shin, S.S.; Furin, J.J.; Becerra, M.C.; Barry, D.J.; Kim, J.Y.; Bayona, J.; Farmer, P.; Fawzi, M.C.S.; Seung, K.J.; “Programmes and principles in treatment of multidrug-resistant tuberculosis”, Lancet, 2004, 363, 474–81. 48 http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs104/en/, acessado em 06 de março de 2000=7. 23 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza como uma nova classe de compostos antimicobacterianos, que atuam através do bloqueio da biossíntese de alguns lipídios micobacterianos49. Os triazóis são substâncias heteroaromáticas, pois apresentam um sistema cíclico aromático, subclassificadas como vicinais – 1,2,3-triazóis – ou simétricos – 1,2,4-triazóis – que têm sido freqüentemente relatados com potencial atividade antituberculose50 (Figura 13). N N N N N N N H N H 1,2,3-1H-triazol 1,2,3-2H-triazol N 1,2,3-4H-triazol N N N N N H N N N N H 1,2,4-1H-triazol 1,2,4-4H-triazol 1,2,4-3H-triazol Figura 13: Equilíbrio tautomérico em 1,2,3- e 1,2,4-triazóis. Em 2003, Dabak e colaboradores sintetizaram uma série de derivados 1,2,3-triazóis testada contra cepas de Mycobacterium tuberculosis, apresentando um composto bromado (30) com Concentração Mínima 49 Shiradkar, M.; Kumar, G.V.S.; Dasari, V.; Tatikonda, S.; Akula, K.C.; Shah, R. “Clubbed triazoles: A Novel Approach to Antitubercular Drugs”, Eur. J. Med. Chem., 2007, 42(6), 807-816. 50 Melo, J.O.F.; Donnici, C.L.; Augusti, R.; Ferreira, V.F.; Souza, M.C.B.V.; Ferreira, M.L.G.; Cunha, A.C.; “Heterociclos 1,2,3-Triazólicos: Histórico, Métodos de Preparação, Aplicações e Atividades Farmacológicas”, Quim. Nova, 2006, 29(3), 569-579. 24 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Inibitória (CMI) inferior a 12,5 µg/mL (Figura 14), ressaltando o potencial antituberculose dessa classe de compostos51. O S N N N Br (30) Figura 14: Estrutura química do derivado 1,2,3-triazol (30) com atividade antituberculose51. Vale ressaltar que os 1,2,4-triazóis são os mais investigados como potenciais candidatos antituberculose (31-34) 49,50,52 (Figura 15). 51 Dabak, K.; Sezer, O.; Akar, A.; Anaç, O.; “Synthesis and investigation of tuberculosis inhibition activities of some 1,2,3-triazole derivatives”, Eur. J. Med. Chem., 2003, 38(2), 215-218. 52 a) Banfi, E.; Scialino, G.; Zampieri, D.; Mamolo, M.G.; Vio, L.; Ferrone, M.; Fermeglia, M.; Paneni, M.S.; Pricl, S.; “Antifungal and Antimycobacterial Activity of New Imidazole and triazole Derivatives. A Combined Experimental and Computational Approach”, J. Antimicrob. Chemother., 2006, 58(1), 76-84.; b) Klimesová, V.; Zahajská, L.; Waisser, K.; Kaustová, J.; Möllmann, U.; “Synthesis and Antimycobacterial Activity of 1,2,4-triazole 3-benzylsulfanyl Derivatives”, Farmaco, 2004, 59(4), 279-288.; c) Küçükgüzel, I.; Küçükgüzel, S.G.; Rollas, S.; Kiraz, M.; “Some 3-thioxo/Alkylthio-1,2,4-triazoles with a Substituted thiourea Moiety as Possible Antimycobacterials”, Bioorg. Med. Chem., 2001, 11(13), 1703-1707. 25 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza N N S N Cl N S N H Cl N H N H NO2 N S NO2 (31) (32) N NH N N N NH O H N O N N S N N S N HN N HN (33) (34) Figura 15: Estrutura química de derivados 1,2,4-triazóis (31-34) com atividade antituberculose51. 1.2. Modelagem Molecular Considerando-se tanto os benefícios para a saúde humana quanto os altos custos de tempo e dinheiro no processo de descoberta de novos fármacos, é preciso utilizar ferramentas ou técnicas, que otimizem o planejamento de novas entidades químicas que possam atuar como fármacos53. O planejamento de fármacos auxiliado por computador (Computeraided drug design, CADD) é uma dessas novas ferramentas que podem ser 53 Meek, P.J.; Liu, Z.; Tian, L.; Wang, C.Y.; Welsh, W.J.; Zauhar, R.J.; “Shape Signatures: speeding up computer-aided drug discovery”, Drug Disc. Today, 2006, 11 (19/20), 895-904. 26 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza utilizadas para otimizar a eficiência do processo de descoberta de novos fármacos54. As estratégias que utilizam CADD variam dependendo da extensão das informações estruturais disponíveis tanto sobre o alvo (enzima/receptor) quanto para os ligantes. O desenho “direto” e “indireto” são as duas estratégias que podem ser utilizadas no processo de desenho de novos fármacos54,55,56 (Figura 16). No método indireto, quando a estrutura do alvo é desconhecida, as informações sobre a atividade e características estruturais dos compostos ativos e inativos podem ser utilizadas para determinar características importantes, tais como grupos hidrofóbicos, ligação hidrogênio, momento dipolo e outros. A partir dessas informações, gera-se um modelo que pode ser utilizado para a seleção de compostos de bancos de dados ou orientar o processo de planejamento e síntese de novas entidades químicas57 (Figura 16). No método direto, consideram-se as características tridimensionais de um alvo conhecido, normalmente uma enzima ou receptor. A análise da estrutura cristal usando difração de raios-X é, em muitos casos, o método de avaliação mais avançado para obtenção de informações estruturais de macromoléculas, além de informaçõessobre o modo de interação com o 54 Ooms, F.; “Molecular Modeling and Computer Aided Drug Design. Examples of their applications in Medicinal Chemistry”, Curr. Med. Chem., 2000, 7(2), 141-158. 55 Cohen, N.C.; Blaney, J.M.; Humblet, C.; Gund, P.; Barry, D.C.; “Molecular modeling software and methods for medicinal chemistry”, J. Med. Chem., 1990, 33(3), 883-894. 56 Chavatte, P.; Farce, A.; “A computational view of COX-2 inhibition”, Anti-Cancer Ag. Med. Chem., 2006, 6(3), 239-249. 57 Jorgensen, W.L.; “The Many Roles of Computation in Drug Discovery”, Science, 2004, 303(5665), 1813-1818. 27 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza ligante pela co-cristalização com o mesmo56. As estruturas também podem ser obtidas usando outras técnicas, como a Ressonância Magnética Nuclear (RMN)58. Essas informações estruturais são normalmente obtidas do Banco de Dados de Proteínas56,59. Pelo método direto, analisa-se o complexo fármaco-receptor/enzima e identifica os principais modos de interação60. 61 Figura 16: Planejamentos de fármacos auxiliados por computador . Considerando-se que um fármaco se liga ao sítio ativo através de uma conformação, realiza-se uma análise conformacional, pois se acredita que por estar em maior número no meio biológico, a conformação mais estável será aquela que vai interagir com o sítio ativo62. A conformação mais estável é utilizada para o cálculo das propriedades geométricas e estereoeletrônicas, com o intuito de identificar o Acharya, K.R.; Lloyd, M.D.; “The advantages and limitations of protein crystal structures”, Trends Pharmacol Sci., 2005, 26(1), 10-14. 59 http://www.rcsb.org/pdb/home/home.do 60 Kontoyianni, M.; McClellan, L.M.; Sokol, G.S.; “Evaluation of docking performance: comparative data on docking algorithms”, J. Med. Chem., 2004, 47(3), 558-565. 61 Adaptado de: Veselovsky, A.V.; Ivanov, A.S.; “Strategy of Computer-aided drug design”, Curr. Drug Targets Infect. Disord., 2003, 3(1), 33-40. 62 Leach, A.R. “Molecular Modelling: Principles and Applications.” London: Addison Wesley Longman, 1996. 58 28 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza arranjo espacial dos átomos, grupos funcionais e características eletrônicas que podem ser responsáveis pela atividade biológica62. A interação eletrostática é um componente-chave que governa à complementaridade entre o ligante e o sítio ativo63. 1.2.1. Métodos de cálculos de Modelagem Molecular 1.2.1.1. Mecânica Molecular A Mecânica Molecular, também conhecida como método do campo de força, utiliza as leis clássicas da física para predizer as estruturas e as propriedades das moléculas, e constrói uma expressão de energia potencial em função apenas das posições dos núcleos, negligenciando a movimentação dos elétrons64. Atualmente, muitos campos de força usados podem ser interpretados em termos de quatro componentes das forças intra e intermoleculares dentro de um sistema: o comprimento de ligação, o ângulo de ligação, o ângulo de diedro e as interações não-ligantes (eletrostáticas e de van der Waals): Etot= El + Eθ + EW + Enl (Eq.1) onde El corresponde ao somatório da energia potencial em função da interação entre todos os pares de átomos ligados; Eθ corresponde ao 63 Hu, H.; Lu, Z.; Yang, W.; “Fitting Molecular Electrostatic Potentials from Quantum Mechanical Calculations”, J. Chem. Theory and Comput., 2007, 3(3), 1004-1013. 64 Foresman, J.B.; Frisch, AE.; “Exploring Chemistry with Electronic Structure Methods: A Guide to Using Gaussian”. Gaussian, Inc, USA, 1993. 29 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza somatório da energia potencial de todos os ângulos formados entre três átomos ligados consecutivamente na molécula; EW é o potencial de torsão que mostra a variação da energia em função da rotação das ligações e Enl é o termo das interações não-ligantes, que é calculado entre todos os pares de átomos que estão separados, no mínimo, por três ligações (Figura 17). Geralmente consideram-se essas interações como van der Waals e eletrostáticas62.O modelo da mecânica molecular assume que qualquer afastamento dos parâmetros de seus valores “ideais” resulta em penalidades energéticas para a geometria molecular, em função de constantes características daquele determinado parâmetro. Figura 17: Representação esquemática dos termos incluídos em um campo de força de mecânica molecular. (A) comprimento de ligação, (B) ângulo de ligação, (C) ângulo de torsão. 1.2.1.2. Mecânica Quântica Os resultados obtidos com os métodos clássicos são limitados pela qualidade e abrangência dos parâmetros e constantes usados na construção do modelo. Os perfis de energia potencial obtidos com estes métodos têm significados limitados, visto que normalmente apenas pontos extremos são 30 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza usados no procedimento de parametrização. Além disso, esses métodos não podem ser aplicados a problemas que envolvam quebra ou formação de ligações químicas. Nestes casos, é necessário o uso dos métodos de mecânica quântica que consideram explicitamente os núcleos e elétrons que compõe o sistema molecular. Os modelos quânticos são fundamentados em soluções aproximadas para a equação de Schrödinger: HΨ = EΨ (Eq. 2) onde H é o hamiltoniano, o operador que representa a energia da molécula e incorpora a energia cinética dos elétrons e a energia potencial das interações elétron-elétron e elétron-núcleo. Ψ é a função de onda molecular descrita em termos de coordenadas espaciais dos elétrons que constituem o sistema em um determinado estado. A solução exata dessa equação não é possível, mesmo para os sistemas mais simples, com exceção do átomo de Hidrogênio. Todavia, soluções aproximadas são possíveis para as moléculas de interesse64. A mecânica quântica é útil para o cálculo de valores de potencial de ionização, afinidade eletrônica, calor de formação e momentos de dipolo de átomos e moléculas. Também pode ser utilizado para o cálculo da probabilidade relativa de se encontrar elétrons (densidade eletrônica) numa estrutura, tornando possível a determinação dos locais mais prováveis para reações com eletrófilos e nucleófilos. O conhecimento da forma e da 31 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza densidade eletrônica de uma molécula também pode ser utilizado para caracterizar a natureza de um possível fármaco para um alvo específico65. 1.2.1.2.1. Cálculos ab initio O termo ab initio deriva do latim e significa “a partir do princípio”, ou seja, são cálculos realizados a partir deconstantes físicas fundamentais, sem o uso de parâmetros experimentais. O primeiro método desenvolvido de cálculo de estrutura eletrônica foi o método Hartree-Fock (HF). Esse modelo utiliza-se de um conjunto de bases (do inglês, basis set) empregado nos cálculos. Uma base mínima de dados, estritamente falando, conteria exatamente o número de funções que seriam necessárias para acomodar todos os orbitais preenchidos de um átomo. Na prática, uma base mínima de dados inclui todos os orbitais atômicos em uma camada. Assim, para o hidrogênio e o hélio, uma única função do tipo 1s seria necessária; para os elementos do lítio ao neônio, funções 1s, 2s e 2p seriam utilizadas e assim por diante. As bases de dados STO-3G, STO-4G, etc (em geral STO-nG) são todas bases mínimas de dados. As bases de dados mínimas são conhecidas por apresentarem diversas deficiências. Um problema em particular ocorre com compostos contendo átomos do final do período, como por exemplo, o oxigênio ou o flúor. Estes átomos são descritos utilizando-se o mesmo número de funções básicas para os átomos do inicio do período, apesar deles possuírem mais 65 Thomas, G. Fundamentals of Medicinal Chemistry. Chichester: John Wiley & Sons, 2003. 32 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza elétrons. O simples aumento do número de funções não necessariamente soluciona o problema ou aprimora o modelo. A solução mais comum deste problema é a introdução de uma base de dados com funções de polarização. Funções de polarização possuem um número quântico angular mais elevado e assim correspondem aos orbitais p para o hidrogênio e d para demais átomos. O uso de bases contendo funções de polarização é indicado por um asterisco (*). Assim, 6-31G* refere-se à base de dados 6-31G com funções de polarização para átomos pesados (isto é, não hidrogênio). Dois asteriscos (por exemplo, 6-31G**) indicam a aplicação de funções de polarização (isto é, p) para os átomos de hidrogênio e hélio. A base de dados 6-31G** é particularmente útil onde ocorrem ligações hidrogênio. Bases de dados com polarização parcial também foram desenvolvidas, por exemplo, 3-21G* que é a mesma base de dados mínima 3-21G com funções de polarização parcial. Estas bases de dados são suficientes para a maioria dos cálculos. Entretanto, para alguns cálculos de nível mais elevado, uma base de dados que efetivamente habilite o limite a ser alcançado deve ser considerada. Por outro lado, o custo computacional inerente a estas bases de dados deve ser avaliado, de modo a ter-se uma relação custo/benefício aplicável. Outras propriedades eletrônicas, particularmente aquelas descritivas de distribuição eletrônica na molécula (dipolo, cargas parciais) são menos relacionadas diretamente à função de base66. 66 Karelson, M.; Lobanov, V.S.; Katritzky, A.R.; “Quantum-Chemical Descriptors in QSAR/QSPR Studies”, Chem. Rev., 1996, 96(3), 1027-1044. 33 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza São cálculos mais demorados, que dão predições quantitativas de alta qualidade para uma grande extensão de sistemas. Por causa do custo computacional dos cálculos ab initio mais sofisticados, um recurso comumente empregado é o de se otimizar a geometria com um conjunto de bases mais simples e então executar cálculos de ponto único (Single Point) sobre a geometria resultante. Com este procedimento, é possível se determinar a energia e outras propriedades de um sistema molecular, usando bases de cálculos mais sofisticados apenas nessa etapa, caso contrário, o custo de cálculo seria muito alto para se ter uma otimização completa da geometria64. 1.2.1.2.2. Cálculos semi-empíricos Os métodos semi-empíricos, tais quais os métodos ab initio, usam o formalismo quântico como estrutura básica. Estes, entretanto, usam parâmetros derivados de dados experimentais para simplificar os cálculos computacionais67. Solucionam de forma aproximada a equação de Schrödinger, que depende de parâmetros apropriados disponíveis para o tipo de sistema químico em estudo. Trata-se de cálculos rápidos e fornecem descrições qualitativas razoáveis dos sistemas moleculares64. São cálculos que empregam bases mínimas incluindo apenas os elétrons da camada de valência do sistema. Assim, a grande vantagem dos métodos semi-empíricos é a velocidade de processamento uma vez que os 67 Sant’anna, C.M.R.; “Glossário de Termos Usados No Planejamento de Fármacos (Recomendações da IUPAC para 1997)”, Quím. Nova, 2002, 25(3), 505-512. 34 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza cálculos são simplificados, reduzindo os custos de memória e tempo computacional64. Para os elementos do grupo principal, compreende uma única função do tipo s e um conjunto de funções p, por exemplo, 2s, 2px, 2py, 2pz para elementos do primeiro período e, para os elementos de transição, um conjunto de funções d, uma função s e um conjunto de funções p, por exemplo, 3dx2-y2, 3dz2, 3dxy, 3dxz, 3dyz, 4s, 4px, 4py, 4pz, para os metais de transição do primeiro período. O átomo de hidrogênio é representado apenas por uma função s (1s) 68. Aproximações adicionais são introduzidas para simplificar ainda mais o cálculo total e, o mais importante, para fornecer uma estrutura para a introdução dos parâmetros empíricos. Com exceção dos modelos para metais de transição, as parametrizações são baseadas na reprodução de diversos dados experimentais, incluindo geometrias de equilíbrios, calor de formação, momento de dipolo e potenciais de ionização68. Os métodos semi-empíricos mais comumente utilizados são AM1 (Austin Model 1) 69 e PM3 (Parametric Method 3)70. O método PM3 usa o mesmo formalismo e equações do método AM1. As únicas diferenças são: a) PM3 usa duas funções gaussianas para a função de repulsão do núcleo, ao invés do número variável usado pelo AM1 (que usa de 1 a 4 gaussianas por elemento); b) os valores numéricos dos parâmetros são diferentes. As outras 68 Hehre, W.J. A Guide to Molecular Mechanics and Quantum Chemical Calculations; Wavefunction, Inc., 2003. 69 Dewar, M.J.S.; Zoebisch, E.G.; Healy, E.F.; Stewart, J.J.P.; “AM1: a new general purpose quantum mechanical molecular model”, J. Am. Chem. Soc., 1985, 107(13), 3902-3909. 70 a) Stewart, J.J.P. “Optimization of parameters for semiempirical methods II. Applications”, J. Comp. Chem., 1989, 10(2), 221-264; b) Stewart, J.J.P.; “Optimization of parameters for semiempirical methods I. Method”, J. Comp. Chem., 1989, 10(2), 209-220. 35 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza diferenças consistem na metodologia usada durante a parametrização; c) enquanto o método AM1 obtém os valores de medidas espectroscópicas, o método PM3 as trata como valores otimizáveis62. 1.2.1.2.3. Teoria do Funcional de Densidade - DFT A Teoria do Funcional de Densidade (Density Functional Theory – DFT) é um formalismo muito bem sucedido, onde o principal objetivo é substituir a função de onda, usada para descrever os elétrons em métodos como o Hartree-Fock, pela densidade eletrônica: enquanto os cálculos HF consideram uma densidade eletrônica média, os cálculos DFT consideram as interações instantâneas de pares de elétrons com spins opostos62. Na Teoria do Funcional de Densidade, o termo de troca da equação de Hartree-Fock é substituída por uma integral (uma funcional) que é uma função da densidade eletrônica. O efeito prático é introduzir uma funcional dupla que trate ambos os termos de correlação e troca. Dessa maneira, a vantagem do DFT é a inclusão da correlação de elétrons. Embora essa alteração imponha uma etapa computacional extra, essas integrais são computacionalmente mais fáceis de tratar71. Trata-se de uma aproximação baseada na teoria de Hohenberg e Kohn que afirma que todas as propriedades de um sistema são funções da densidade de cargas. Assim, o teorema de Hohenberg-Kohn permite 71 Smith, W.B. “Introduction to Theoretical Organic Chemistry and Molecular Modeling”; Wiley-VCH, 1996. 36 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza escrever a energia eletrônica total como uma função da densidade eletrônica ρ: E(ρ)= EKE(ρ)+ EC(ρ)+ EH(ρ)+ Exc(ρ) (Eq. 3) onde EKE(ρ) é a energia cinética, EC(ρ) é o termo de interação núcleo-elétron, EH(ρ) é a energia de Coulomb e Exc(ρ) contem as contribuições de troca e correlação. Os orbitais moleculares nos cálculos de funcional de densidade são geralmente escritos como uma expansão linear dos orbitais atômicos (i.e. funções de base) que pode ser representado usando funções do tipo Gaussiana, orbitais de Slater ou orbitais numéricos62. Os modelos de Funcional de densidade, assim como os modelos Hartree-Fock, são aplicáveis em moléculas de 50-100 átomos68. O funcional exato não é conhecido, logo, existe um variado conjunto de funcionais diferentes que podem fornecer resultados diferentes para o mesmo problema. O método B3LYP72,73 (Becke, Lee, Yang e Parr) é um método híbrido amplamente aplicado, onde parte do funcional é obtido por mecânica-quântica (combina energia de troca HF com o termo de troca DFT) e parte é parametrizado (adiciona funcionais de correlação)64. 72 Lee, C.; Yang, W.; Parr, R.G.; “Development of the Colle-Salvetti correlationenergy formula into a functional of the electron density”, Phys. Rev. B, 1988, 37, 785-789. 73 Becke, A.D. “Density-functional thermochemistry. III. The role of exact exchange”, J. Chem. Phys., 1993, 98, 5648-5652. 37 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 1.2.2. Descritores moleculares As propriedades físico-químicas, assim como a atividade biológica de compostos orgânicos dependem de suas estruturas moleculares. Com a finalidade de se obter relações entre as estruturas químicas e a atividade biológica, utilizando-se abordagens computacionais, é necessário encontrar representações apropriadas da estrutura molecular dos compostos74. Um descritor molecular pode ser considerado como sendo o resultado obtido de procedimento lógico e matemático, aplicado às informações químicas codificadas através de uma representação de uma molécula75. • Energias dos Orbitais Moleculares: As energias do Orbital Molecular Ocupado de Maior Energia (HOMO) e do Orbital Molecular Desocupado de Menor Energia (LUMO) são descritores químico-quânticos bastante utilizados que desempenham um papel importante nas reações químicas e na formação de diversos complexos de transferência de cargas. A energia do HOMO está diretamente relacionada ao potencial de ionização do composto e caracteriza a capacidade da molécula em realizar ataques nucleofílicos. A energia do LUMO está diretamente relacionada à 74 Hansch, C.; Sammes, P.G.; Taylor, J.B. Comprehensive medicinal chemistry: the rational design. Mechanistic study and therapeutic application of chemical compounds; Oxford, 1990. 75 Consonni,V.; Todeschini, R.; Pavan, M.; “Structure/Response Correlations and Similarity/Diversity Analysis by GETAWAY Descriptors. 1. Theory of the Novel 3D Molecular Descriptors”, J. Chem Inf. Comput. Sci., 2002, 42(3), 682-692. 38 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza afinidade eletrônica, caracterizada pela susceptibilidade do composto em relação a ataques por nucleófilos76. O gap de HOMO-LUMO, obtido a partir da diferença entre as energias desses orbitais, é um importante indicador de estabilidade molecular. Alto valor de gap indica alta estabilidade da molécula, no sentido de baixa reatividade nas reações químicas, enquanto moléculas com baixo valor de gap são geralmente reativas77. • Densidade dos Orbitais de Fronteira A densidade eletrônica dos orbitais de fronteira nos átomos fornece uma forma útil para a caracterização detalhada das interações doadoraceptor. A maioria das reações químicas ocorre no local de maior densidade eletrônica nos orbitais de fronteira, que são definidos de acordo com o tipo de reação: a densidade de HOMO representa áreas suscetíveis a ataques eletrofílicos, enquanto a densidade de LUMO representa as áreas mais suscetíveis a ataques nucleofílicos 76. • Momento Dipolo Considerando que a interação de fármaco e receptor ocorre em função da complementariedade de cargas, a polaridade de uma molécula é 76 Grant, G.H.; Richards, W.G.; Computational Chemistry. Oxford Science Publications. 1996. 77 Zhang, G.; Musgrave, C.B.; “Comparison of DFT Methods for Molecular Orbital Eigenvalue Calculations”, J. Phys. Chem. A, 2007, 111, 1554-1561. 39 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza importante para várias propriedades físico-químicas e diversos descritores têm sido propostos para quantificar os efeitos de polaridade, dentre os quais, o momento dipolo da molécula – que reflete apenas a polaridade global da mesma – é o mais utilizado66. • Lipofilicidade A lipofilicidade de uma molécula, uma importante propriedade no processo farmacocinético, sendo considerada para o estudo de absorção intestinal, permeabilidade da membrana, ligação a proteínas e distribuição em diferentes tecidos. Esse descritor geralmente é definido pelo coeficiente de partição entre 1-octanol/água de um determinado composto, e é comumente expresso na sua forma logarítmica, como logP78. 1.3 Parâmetros farmacocinéticos A ação de um fármaco, quando administrado a humanos ou animais, pode ser dividida em três fases: fase farmacêutica, onde ocorre a desintegração da forma de dosagem; fase farmacocinética, que abrange os processos de absorção, distribuição, metabolismo e excreção (ADME); e a 78 Raevsky, O.A.; “Physicochemical Descriptors in Property-Based Drug Design”, Mini Rev. Med. Chem., 2004, 4(10), 1041-1052. 40 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza fase farmacodinâmica, que está relacionada com a interação do fármaco com o alvo79. A farmacocinética, a toxicidade e a observação dos efeitos adversos estão relacionadas à estrutura química do fármaco. Assim, a escolha apropriada do composto a ser avaliado na fase de ensaios clínicos é uma decisão chave. Atualmente estudos ADME vêm sendo aplicados em etapas anteriores no desenvolvimento de fármacos, a fim de se economizar tempo e delinear melhor o estudo de novos compostos. A otimização destas propriedades, através de modificações moleculares de compostos promissores, é essencial na seleção de compostos candidatos com maiores probabilidades de não serem descartados na fase clínica80. Na avaliação das principais razões para o fracasso no desenvolvimento de novos fármacos, metade foi atribuída principalmente às propriedades farmacocinéticas e à toxicidade (Figura 18). Essa análise indica claramente que essas duas áreas devem ser observadas em etapas anteriores no processo de desenvolvimento de novos fármacos, a fim de reduzir os custos81. 79 Pereira, D.G.; “Importância do Metabolismo no Planejamento de Fármacos”, Quím. Nova, 2007, 30(1), 171-177. 80 Davis, A.M.; Riley, R.J.; “Predictive ADMET studies, the challenges and the opportunities”, Curr. Op. in Chem. Biol., 2004, 8(4), 378–386. 81 Van de Waterbeemd, H.; Gifford, E.; “ADMET in silico modeling: towards predicition paradise?”, Nature Rev. Durg Discov., 2003, 2(3), 192-204. 41 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 81 Figura 18: Principais razões do fracasso no desenvolvimento de fármacos . A necessidade do estudo das propriedades farmacocinéticas em etapas anteriores na descoberta de novos fármacos tem atraído o desenvolvimento de diversos métodos de screening in vitro. Como esses métodos necessitam de compostos já sintetizados, os modelos computacionais são úteis para se racionalizar um grande número de observações experimentais, oferecem potencial para aplicações de screening virtual e conseqüentemente podem auxiliar na redução do tempo e do custo do processo de pesquisa e desenvolvimento de novos fármacos82. 82 a) Sitarama, B. Gunturi, S.B.; Narayanana, R.; Khandelwalb, A. “In silico ADME modelling 2: Computational models to predict human serum albumin binding affinity using ant colony systems”, Bioorg. Med. Chem., 2006, 14, 4118–4129. b) Tingjun Hou, T.H.; Wang, J.; Zhang, W.; Xu, X.; “ADME Evaluation in Drug Discovery. 7. Prediction of Oral Absorption by Correlation and Classification”, J. Chem. Inf. Model., 2007, 47, 208-218. 42 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 1.3.1. Absorção (A) A principal forma de administração de fármacos é a via oral. Após a administração, o fármaco deve se dissolver e ser solubilizado no trato gastrointestinal para que seja absorvido pela membrana intestinal. A absorção ocorre por dois mecanismos principais. O primeiro, chamado de mecanismo transcelular, é a difusão passiva através das membranas celulares. O segundo, chamado mecanismo paracelular, é a passagem entre as células intestinais. A absorção também pode ocorrer por transporte ativo, que requer energia e é mediado por carreadores83. A lipofilicidade e a solubilidade são as principais propriedades moleculares que influenciam a absorção. A primeira etapa no processo de absorção de um fármaco é a desintegração da forma farmacêutica – seja cápsula ou comprimido – seguido da dissolução do princípio ativo. Uma baixa solubilidade é prejudicial para uma boa absorção, assim, a avaliação dessa propriedade é importante no planejamento de fármacos. A lipofilicidade, associada ao coeficiente de partição, representa a passagem do meio extracelular para o meio intracelular através da bicamada lipídica81. Diversos estudos foram realizados para demonstrar o perfil de fármacos disponíveis no mercado em relação à absorção e permeabilidade. A abordagem teórica dos parâmetros farmacocinéticos foi iniciada em 1997, quando Lipinski e colaboradores da Pfizer desenvolveram a Regra dos Cinco 83 Li, A.P.; “Screening for human ADME/Tox Drug properties in Drug Discovery”, Drug Discov. Today, 2001, 6(7), 357-365. 43 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza (do inglês, Rule of Five), a partir do estudo das propriedades de 2245 fármacos do banco de dados do World Drug Index (WDI) os quais passaram para a Fase II dos ensaios clínicos. Com a finalidade de prever a biodisponibilidade oral de fármacos, essa regra é baseada em características físico-químicas dos compostos analisados, tais como peso molecular, lipofilicidade, sítios doadores e aceptores de ligação hidrogênio84. 1.3.2. Distribuição (D) Após serem absorvidos, os fármacos alcançam a circulação sistêmica e são distribuídos de maneira não uniforme entre os diferentes tecidos do organismo, transportados na forma livre no meio aquoso ou complexados a proteínas plasmáticas. A extensão da ligação às proteínas plasmáticas é um fator diretamente relacionado à concentração dos fármacos na circulação e, por conseqüência, afeta a magnitude da ação farmacológica65. 1.3.3. Metabolismo (M) e Excreção (E) As características lipofílicas dos fármacos, que promovem a passagem através das membranas biológicas e, subseqüente, acesso ao seu sítio de ação, impedem sua excreção do organismo. Assim, o 84 Lipinski, C.A. Lombardo, F.; Dominy, B.W.; Feeney, P.J.; “Experimental and Computational Approaches to Estimate Solubility and Permeability in Drug Discovery and Development Settings”, Adv. Drug Deliv. Rev., 1997, 23(1-3), 3-25. 44 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza metabolismo de fármacos em metabólitos menos lipofílicos é essencial para a eliminação e término da sua atividade biológica. O metabolismo ocorre principalmente no fígado. O metabolismo de fármacos ocorre em duas fases distintas bem caracterizadas. A primeira fase (Fase 1) engloba reações de oxidação, redução e hidrólise, levando a metabólitos menos lipofílicos (Figura 19). A segunda fase (Fase 2) compreende reações de conjugação, onde os produtos formados na Fase 1 são associados covalentemente com substâncias como a glutationa, ácido glicurônico, sulfatos ou aminoácidos, formando conjugados mais hidrossolúveis, geralmente inativos e são eliminados preferencialmente pela urina ou fezes85 (Figura 19). 85 Goodman & Gilman’s. The Pharmacological Basis of Therapeutics.; Brunton, L.L.; Lazo, J.S.; Parker K.L.; Buxton, L.L.; Blumenthals, D.; 10th ed. McGraw-Hill: New York, 2006. 45 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza (A) RNHCH3 (B) ROCH3 [O] [O] R1 ROH + CH2O R1 [O] NH (C) RNH2 + CH2O R2 N OH R2 O O [H2O] (D) O R1 R2 + R1 OH COOH COOH O O + R OH (E) OH R2 OH OH O OH UDP + UDPH OH OH O OH R Figura 19: Exemplos de reações de Fase 1, (A), (B) e (C) reações de oxidação, (D) reação de hidrólise e Fase 2, (E) conjugação com ácido glicurônico. 1.4. Toxicidade Um dos principais desafios do desenvolvimento de fármacos é a avaliação da toxicidade dos fármacos em humanos. Ocorre que muitas vezes, o próprio metabólito pode potencializar o efeito do fármaco ou ser mais tóxico do que o composto original86. O espectro de efeitos adversos dos fármacos é amplo e mal-definido. Na terapêutica, um fármaco produz tipicamente diversos efeitos, mas geralmente apenas um é o objetivo principal do tratamento; esses outros 86 Li, A.P.; “Accurate prediction of human drug toxicity: a major challenge in drug development”, Chem. Biol. Interact., 2004, 150(1), 3–7. 46 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza efeitos são definidos como efeitos indesejáveis. Os efeitos adversos dos fármacos geralmente não são deletérios, e incluem efeitos como boca seca, por exemplo. Os efeitos tóxicos podem ser classificados como farmacológico, patológico ou genotóxico (que causam alterações no DNA). Os efeitos farmacológicos geralmente desaparecem com a diminuição da concentração do fármaco no organismo, através do metabolismo e eliminação do mesmo. Os efeitos patológico e genotóxico podem ser revertidos, porém se um dano maior no DNA não for reparado, pode surgir câncer em animais de laboratório em poucos meses, ou anos, em seres humanos85. 1.5. Propriedades semelhantes a um fármaco (Drug-likeness) O conceito de drug-likeness para a seleção de compostos tem estado recentemente em foco e empregado de formas ligeiramente distintas por diversos autores. Alguns definem compostos ‘drug-like’ como “compostos que possuem grupos funcionais e/ou têm propriedades físicas parecidas com a maioria dos fármacos conhecidos”87, enquanto Lipinski define como “compostos que possuem propriedades ADMET suficientemente aceitáveis para resistir à Fase II dos ensaios clínicos”84. O desenvolvimento da Regra dos Cinco pelos pesquisadores da Pfizer levou a realização de estudos similares por pesquisadores de diversas indústrias farmacêuticas, como GlaxoSmithKline, Boehringer Ingelheim, Astra Zeneca, Bayer e Lilly. Apesar de todos os estudos analisarem dados 87 Walters, W.P.; Murcko, M.A.; “Prediction of ‘drug-likeness’”, Adv. Drug Deliv. Rev., 2002, 54(3), 255–271. 47 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza ligeiramente diferentes de fármacos comerciais e/ou compostos na fase de desenvolvimento clínico, as conclusões são similares: compostos com características ‘drug-like’ apresentam propriedades físico-químicas que são importantes para o desenvolvimento de fármacos bem-sucedidos88. Essas propriedades, principalmente lipofilicidade, distribuição eletrônica, características de ligação hidrogênio, tamanho e flexibilidade molecular e a presença de comportamento várias da características molécula em um farmacofóricas organismo influenciam vivo, incluindo o a biodisponibilidade, propriedades de transporte, afinidade por proteínas, reatividade, toxicidade, estabilidade metabólica entre outras89. 88 Keller, T.H.; Pichota, A.; Yin, Z.; “A practical view of ‘druggability’”, Curr. Opin. Chem. Biol., 2006, 10(4), 357–361. 89 a) Biswas, D.; Roy, S.; Sen, S.; “A Simple Approach for Indexing the Oral Druglikeness of a Compound: Discriminating Druglike Compounds from Nondruglike Ones”, J. Chem. Inf. Model., 2006, 46(3), 1394-1401. b) Muegge, I.; “Selection Criteria for Drug-Like Compounds”, Med. Res. Rev., 2003, 23(3), 302-321. 48 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 2. Objetivos O objetivo principal deste trabalho é a aplicação de metodologias de simulação computacional que auxiliem no estudo da relação estruturaatividade (SAR) de novos compostos com atividade antiparasitária e antimicobacteriana e no perfil toxicológico deste último grupo de compostos. A primeira parte deste estudo consistirá no emprego de técnicas de modelagem molecular para a realização do estudo de SAR com o intuito de obter parâmetros estruturais e estereoletrônicos, tais como, a determinação dos mapas de potencial eletrostático molecular, os coeficientes e energias de HOMO e LUMO, cálculos de cLogP, momento de dipolo e outros que possam estar relacionados com a atividade tripanocida e antimicobacteriana dos compostos analisados. Estes estudos serão realizados utilizando o programa Spartan’04 (Wavefunction Inc, Irvine, CA, 2000). A outra etapa do trabalho consiste em calcular o perfil toxicológico dos derivados com atividade antimicobacteriana. Essa predição teórica analisará a mutagenicidade, a tumorogenicidade, efeitos na reprodução e propriedades como a lipofilicidade e a solubilidade que são importantes na seleção de novas substâncias bioativas candidatas a fármacos. O drug-likeness também será avaliado. Estes estudos serão realizados com o programa Osíris da Actelion Pharmaceuticals Ltda. 49 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 3.Justificativa Visto que existe um baixo interesse das indústrias farmacêuticas pela pesquisa e desenvolvimento de medicamentos para o tratamento das doenças consideradas como negligenciadas, surge a necessidade de intensificar a pesquisa de novos fármacos que sejam mais eficazes para o tratamento destas doenças e que apresentem menos efeitos colaterais. Isto se torna mais relevante para os países em desenvolvimento, localizados em áreas tropicais, onde existe maior incidência dessas doenças. O tratamento atual da Doença de Chagas envolve o uso de nifurtimox (1) e benznidazol (2). Entretanto, eles são altamente tóxicos para o hospedeiro. O desenvolvimento de novas entidades químicas para o tratamento da Doença de Chagas sempre despertou um grande interesse em nosso grupo de pesquisa, em especial, a busca de novos agentes tripanocidas a partir da β-lapachona (35). Este interesse foi consolidado com base em estudos recentes de que a atividade antichagásica pode aumentar quando a função orto-quinona pode ser modificada pela introdução de uma subunidade oxazol (36a), imidazol (36b) ou fenazina (37) (Figura 20). Foi observado, nesses derivados, a manutenção da atividade tripanocida sem os efeitos citotóxicos, geralmente atribuídos à subunidade orto-quinona. 50 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza NHPh N O O (35) N N X O Ph O (36a) X=O (36b) X= NH N O (37) Figura 20: Estrutura química da β-lapachona (35) e dos derivados modificados na posição orto da função quinona, oxazol (36a), imidazol (36b)90 e fenazina (37)91. Este estudo resultou na síntese de derivados modificados da βlapachona (35). A primeira etapa consistiu na alteração estrutural do anel pirano C. Na etapa seguinte, foi inserido um anel oxirano nesses derivados (Esquema 3). Assim, métodos computacionais serão empregados visando realizar um estudo destes compostos com atenção especial nas alterações realizadas no centro redox e nas modificações do anel pirano com intuito de investigar a importância das características estrutural e estereoeletrônica que resultaram em compostos com atividade tripanocida sem os efeitos tóxicos em linhagens de células de mamíferos. 90 De Moura, K.C.G. Salomão, K.; Menna-Barreto, R.F.; Emery, F.S.; Pinto, M.C.F.R.; Pinto, A.V.; de Castro, S.L.; “Studies on the trypanocidal activity of semisynthetic pyran[b-4,3]naphtho[1,2-d]imidazoles from beta-lapachone”, Eur J Med Chem., 2004, 39(7), 639-645. 91 Neves-Pinto, C.; Malta, V.R.; Pinto, M.C.F.R.; Santos, R.H.; de Castro, S.L.; Pinto, A.V.; “A trypanocidal phenazine derived from beta-lapachone”, J. Med Chem., 2002, 45(10), 2112-2115. 51 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza aaa inserção de anel oxirano O O O O A B C Modificação do anel pirano C: contração, substituição, transposição O Esquema 3: Modificações estruturais na β-lapachona (35). Os compostos 1,2,3-triazóis são uma importante classe de heterocíclicos devido ao seu amplo espectro de aplicações farmacêuticas, tais como agentes antiplaquetários, ligantes de receptor de dopamina D2 relacionado à esquizofrenia, agentes antiinflamatórios, anticonvulsivantes, inibidores de β-lactamase e agentes antivirais e antimicrobianos. Assim, uma nova série de derivados N-fenil-1,2,3-triazóis-4- carbaldeídos (42a-42l) foi sintetizada e o seu perfil antimicobateriano foi avaliado in vitro. Uma série de substituintes foi inserida na subunidade fenila visando observar o efeito sobre a atividade biológica. Uma vez que a introdução de átomo de flúor modifica as propriedades físicas, químicas e biológicas na molécula, e considerando que pode, inclusive, aumentar a atividade, também foi sintetizada uma série de derivados N-fenil-1,2,3triazóis-4-difluormetilenos (43a-43l). Estes derivados foram submetidos a um estudo de modelagem molecular com o intuito de observar as características 52 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza estruturais e estereoletrônicas que possam ser importantes para governar a interação com o alvo receptor do Mycobacterium. CHO N N CHF2 N N N R (42a-42l) N R (43a-43l) Esquema 4: Derivados N-fenil-1,2,3-triazóis-4-carbaldeídos (42a-42l) e N-fenil-1,2,3-triazóis4-difluormetilenos (43a-43l) sintetizados e ensaiados frente a cepas de Mycobacterium tuberculosis. 53 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 4. Metodologia Inicialmente a estrutura tridimensional de cada derivado foi construída no programa Spartan’04, utilizando o campo de força de Mecânica Molecular (MMFF, Mechanics Molecular Force Field). 4.1. Análise conformacional A análise conformacional de uma molécula é realizada pela rotação de uma ligação, com mudança paralela dos ângulos diedros das ligações, e cálculos correspondentes de energia estérica, decorrente da sobreposição espacial de átomos não-ligados e barreiras torsionais de rotação. Qualquer que seja o método de minimização de energia usado, não há como garantir que o mínimo encontrado seja o mínimo absoluto da superfície de energia potencial (SEP). Normalmente, muitos mínimos locais estão presentes e é comum que a aplicação de algum algoritmo de minimização de energia acabe conduzindo a um deles, dependendo da proximidade da geometria inicial do sistema. Isto é particularmente verdade no caso da energia em função da torsão dos ângulos diedros, ou seja, da energia conformacional. Em princípio, o mínimo absoluto só pode ser encontrado através de uma análise conformacional completa do sistema molecular. A maneira mais sistemática de realizar uma análise conformacional é varrer cada ângulo diedro da estrutura simultaneamente, a chamada 54 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza pesquisa de grade. A aplicação deste procedimento é, contudo, limitada. O número de confôrmeros a ser analisado equivale a (3600/θ)n, onde θ é o incremento usado no processo de varredura do ângulo diedro e n é o número de ligações avaliadas. Quanto menor o incremento θ, maior a quantidade de informações que se obtém sobre a energia conformacional, mas, na prática, apenas alguns confôrmeros são importantes. No caso de uma ligação saturada C-C, por exemplo, um incremento de pesquisa da energia conformacional de 60º é adequado, pois permite que as conformações mais próximas dos mínimos e máximos da SEP sejam encontradas62. Dessa forma, foi realizada a análise conformacional no derivado Nfenil-1,2,3-triazólico não substituído. 4.2. Cálculos semi-empíricos A partir do confôrmero mais estável e, por modificações apropriadas naestrutura desse confôrmero, obteve-se a estrutura tridimensional de cada derivado Todas as etapas de cálculo de otimização geométrica foram realizadas no vácuo, sem qualquer restrição geométrica, pelo método semiempírico usando o Hamiltoniano AM1, disponível no programa (Esquema 5). 4.3. Cálculos ab initio Após a otimização geométrica, as estruturas dos compostos analisados foram submetidas ao cálculo ab initio em ponto único (Single- 55 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Point), em que se calculam os parâmetros eletrônicos de um arranjo único dos átomos, utilizando o método Hartree-Fock na base 6-31G* (Esquema 5). As superfícies tridimensionais dos mapas de potenciais eletrostáticos moleculares (MEPs) representam os potenciais eletrostáticos sobrepostos na superfície de densidade de elétrons constante (0,002e/ua³) na superfície de contato de van der Waals e são geradas indicando o tamanho molecular total e a localização dos potenciais eletrostáticos negativos e positivos. As propriedades eletrônicas - energia e coeficiente de distribuição de HOMO e LUMO, momento dipolo e lipofilicidade – c LogP - serão calculadas para todas as moléculas objetivando obter parâmetros para o estudo da relação Estrutura-Atividade das moléculas estudadas. As superfícies tridimensionais do Mapa de Potencial Eletrostático molecular para os derivados da β-lapachona foram geradas na faixa de energia entre -65 e +23 kcal/mol. 56 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Esquema 5: Fluxograma da metodologia aplicada no estudo de modelagem molecular. 57 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 4.4. Cálculos DFT Após a otimização geométrica pelo método semi-empírico, as estruturas dos derivados 1,2,3-triazólicos foram submetidas a cálculos de Funcional de Densidade, usando o funcional híbrido de Becke-Lee-YangPark, B3LYP, na base 6-31G* (Esquema 5). Da mesma forma que os derivados antichagásicos, os mapas de potencial eletrostático moleculares e as propriedades eletrônicas dos derivados 1,2,3-triazólicos também foram gerados. Os mapas de potencial eletrostático moleculares para os derivados 1,2,3-triazólicos foram gerados na faixa de energia entre -25 e +30kcal/mol. 4.5. Sobreposição A sobreposição molecular tem um papel importante para a análise do potencial de ligação de compostos na ausência de dados sobre a estrutura do alvo em questão. Na ausência desses dados, podem ser empregadas 3 tipos de análise: a elucidação do farmacóforo, que fornece as principais características funcionais para a interação com o alvo; estudos quantitativos de relação estrutura-atividade tridimensional (QSAR-3D), que deriva modelos para avaliação de afinidades de ligação; e a modelagem do receptor, que fornece descrições do processo específico de ligação com o alvo92. 92 Lemmen, C.; Lengauer, T.; “Computational methods for the structural alignment of molecules”, J. Comp-Aided Mol. Design, 2000, 14, 215–232. 58 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza A partir da sobreposição estrutural de um grupo de compostos, comparam-se as características estereoeletrônicas relevantes dos compostos para análise da similaridade e diversidade dos mesmos, a fim de se propor um modelo farmacofórico, que será usado para possíveis ligantes com uma dada atividade biológica num banco de dados. Para a comparação visual das propriedades estruturais dos compostos antichagásicos estudados, foi realizada a sobreposição das estruturas no programa SPARTAN’04, a partir da seleção de 3 átomos não co-lineares conservados nas estruturas químicas em questão (Esquema 6). O O O a c O a c b (35) b O (41a) O Esquema 6: Átomos utilizados na sobreposição dos compostos tripanocidas (35) e (41a). 4.6. Propriedades semelhantes a um fármaco (Drug-likeness) Diversos métodos estimam o drug-likeness de um composto baseado parcialmente em descritores topológicos, dados estruturais ou outras propriedades como lipofilicidade e peso molecular93. No programa Osiris94, a freqüência de ocorrência de cada fragmento é determinada dentro de uma coleção de fármacos comerciais e dentro de um banco de compostos 93 Tetko, I. V.; “Computing chemistry on the web”, Drug Discov. Today, 2005, 10(22), 1497-1500. 94 http://www.organic-chemistry.org/prog/peo, acessado em 05 de março de 2007. 59 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza supostamente sem as características de drug-likeness. Assim, serão calculados o drug-likeness das moléculas mais ativas e também de fármacos já conhecidos (isoniazida, para Tuberculose) como controle positivo. O processo de predição é baseado numa lista de cerca de 5300 fragmentos distintos associados a uma classificação drug-likeness. O drug-likeness é calculado de acordo com a equação: d= Σνi √n (Eq. 4) onde se calcula a razão do somatório dos valores de drug-likeness (Σνi) dos fragmentos que estão presentes na estrutura em avaliação pela raiz do número de fragmentos (n). A lista de fragmentos é criada a partir de um banco de dados de 3300 fármacos comerciais (fragmentos druglike) assim como 15000 substâncias químicas comercialmente disponíveis no catálogo Fluka (fragmentos nãodruglike) formando uma lista completa com todos os fragmentos disponíveis. A geração dos fragmentos ocorre a partir da quebra das ligações simples. Todos os fragmentos com uma freqüência, acima de certo limite, foram agrupados a fim de se remover aqueles altamente redundantes. Para os demais fragmentos, o potencial de drug-likeness foi determinado como o logaritmo do quociente da freqüência nos fármacos comerciais versus as substâncias químicas do catálogo Fluka (Figura 21). 60 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Figura 21: Distribuição de drug-likeness de fármacos comerciais (em vermelho) versus substâncias químicas do catálogo Fluka (em azul). O processo de cálculo de drug-likeness se inicia a partir do desenho da estrutura química no programa Osiris (Figura 22). Em seguida, calculamse o perfil toxicológico, as propriedades físico-químicas, drug-likeness e drug-score – o somatório das propriedades calculadas -, conforme assinaladas na Figura 22. 61 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Figura 22: Cálculos de perfil toxicológico, propriedades físico-químicas, drug-likeness e drugscore pelo programa Osíris, utilizando como exemplo a isoniazida (17). 4.7. Toxicidade A toxicidade de um fármaco é um fator de extrema importância, uma vez que um número significativo de fármacos são reprovados nos ensaios clínicos. Enquanto desenha-se a estrutura a ser analisada no programa Osiris94, o preditor de risco de toxicidade avalia os riscos tóxicos potenciais, uma vez que a estrutura em análise seja uma entidade química válida (Figura 22). Os alertas de riscos toxicológicos indicam que os compostos em avaliação possuem determinados fragmentos que podem ter efeitos 62 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza irritantes, por exemplo, ou alto grau de tumorogenicidade (quando varia da coloração verde para a vermelha). O processo de predição conta com uma base pré-calculada de fragmentos estruturais que originam alertas toxicológicos, caso sejam encontrados na estrutura analisada. Essas listas de fragmentos foram criadas pela fragmentação rigorosa de todos os compostos do banco de dados do Registro de Efeitos Tóxicos de Substâncias Químicas (Registry of Toxic Effects of Chemical Substances - RTECS) conhecidos por apresentarem algum tipo de toxicidade. Durante a fragmentação as moléculas são quebradas nas ligações simples, originando também um conjunto de fragmentos nucleares. Esses, por sua vez, foram utilizados para reconstruir todos os fragmentos maiores possíveis sendo uma sub-estrutura da molécula original. Em seguida, um processo de busca por sub-estruturas determina a freqüência de ocorrência dos fragmentos (núcleo e fragmentos construídos) dentre todos os compostos daquela classe de toxicidade. As freqüências de fragmentos também são medidas através dos fragmentos de mais de 3000 fármacos comerciais. Considerando que fármacos comerciais são tidos como isentos ou com efeitos tóxicos mínimos, qualquer fragmento encontrado com alta freqüência no banco de compostos químicos, foi considerado como um fator de risco. Entretanto, caso eles quase não sejam observados em fármacos comerciais, os mesmos não são tidos como tóxicos95 (Figura 22). 95 http://www.organic-chemistry.org/prog/peo/tox.html, acessado em 10 de maio de 2007. 63 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 4.7.1. Descrição dos tipos de toxicidade. • Irritação primária: as informações são obtidas de resultados de testes de Draize; esses testes fornecem informações sobre irritação da pele e olhos. Os estudos são realizados em espécies de mamíferos selecionadas, principalmente coelhos. • Efeitos mutagênicos: as informações são referentes apenas a testes positivos. Inclui 20 sistemas de testes específicos, tanto in vitro quanto in vivo. • Efeito reprodutivo: não inclui apenas informações teratogênicas, mas efeitos em ambos os sexos, efeitos na fertilidade, desenvolvimento de anormalidades, efeitos no embrião ou feto, efeitos tumorigênicos e efeitos no recém-nascido. • Efeito tumorigênico: tem 3 tipos principais “carcinogênico por critério RTECS” “neoplásico por critério RTECS” e “resultados tumorigênicos equivocados”96. 4.8. Drugscore O valor de drugscore, obtido a partir do programa Osiris, é resultante da combinação dos valores de drug-likeness, lipofilicidade, solubilidade, peso molecular e riscos toxicológicos em um único valor que pode ser usado para avaliar o potencial total de um composto a fim de qualificá-lo como um 96 http://www.cdc.gov/niosh/rtecs/RTECSfeatures.html, acessado em 10 de maio de 2007. 64 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza possível fármaco. Esse valor é calculado multiplicando-se as contribuições individuais das propriedades descritas através da equação: ds = Π 1 + 1 Si 2 2 Π ti (Eq. 5) onde ds é o drugscore, si são as contribuições calculadas diretamente das propriedades, a partir da equação: s = ________ 1 1 + eap+b (Eq. 6) e os parâmetros a e b são (1, -5), (1, 5), (0.012, -6) e (1, 0) para lipofilicidade, solubilidade, peso molecular e drug-likeness, respectivamente. Os valores ti são as contribuições obtidas dos 4 tipos de riscos toxicológicos, sendo 1, 0,8, e 0,6 cujos valores correspondem: fora de risco, risco médio e alto risco, respectivamente. 65 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 5. Resultados e Discussões 5.1. Aplicação de modelagem molecular no estudo da Relação Estrutura-Atividade de derivados da lapachona com perfil tripanocida. 5.1.1. Análise dos dados obtidos a partir dos cálculos de modelagem molecular Uma série de naftoquinonas, tendo como precursor a β-lapachona, foi sintetizada pelo grupo de Ferreira97. Neste trabalho, foram propostas modificações estruturais no anel pirano C e alteração eletrônica no centro redox, com adição de um anel oxirano na carbonila da naftoquinona (Esquema 7) com o intuito de identificar as características estruturais e eletrônicas importantes para a atividade tripanocida nesta série de derivados. Na primeira parte deste trabalho, foram realizadas modificações no anel pirano C da β-lapachona. Inicialmente o anel pirano foi removido, mantendo-se apenas uma metoxila (38). Em seguida, efetuou-se a contração do anel C de 6 para 5 membros, com obtenção da nor-β-lapachona (39). Foi realizada a adição de um substituinte polar e volumoso, como o metanossulfonato no anel C (40) e procedeu-se a transposição do anel pirano C, com a obtenção da α-lapachona (41). Considerando que a literatura descreve a forte influência do centro redox do grupo quinona sobre 97 Jorqueira, A.; Gouvêa, R.M.; Ferreira, V.F.; Silva, M.N.; Souza, M.C.B.V.; Zuma, A.A.; Cavalcanti, D.F.B.; Araújo, H.P.; Santos, D.O.; Bourguignon, S.C.; “Oxyrane derivative of α-lapachone is potent growth inhibitor of Trypanosoma cruzi epimastigote forms”, Parasitol. Res., 2006, 99, 429–433. 66 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza a atividade biológica, uma das carbonilas foi substituída por um anel oxirano nas respectivas naftoquinonas modificadas (38a-41a) (Esquema 7). Alguns autores têm demonstrado que derivados oxiranos apresentam atividade tripanocida e atuam em alvos específicos de algumas proteinases98. O composto natural E-64, por exemplo, e muitos outros derivados sintéticos demonstram potente atividade tripanocida99. O O O 38 OCH3 O 38a OCH3 O O O 39 35 Modificação no anel C O O B A O O O O 40 O C 35a Modificação no centro redox O O B A O O 39a O O C O 40a O SO3CH3 O O O O 41 O SO3CH3 41a O Esquema 7: Planejamento das naftoquinonas com modificações no anel pirano C e no centro redox. 98 Cazzulo, J. J.; “Proteinases of Trypanosoma cruzi: patential targets for the chemotherapy of Chagas disease”, Curr. Top. Med. Chem., 2002, 2 (11), 12611271. 99 Iacobuzio-Donahue C.A.; Shuja S.; Cai J.; Peng P.; Murnane M.J.; “Elevations in cathepsin B protein content and enzyme activity occur independently of glycosylation during colorectal tumor progression”, J. Biol. Chem., 1997, 272(46), 29190-29199. b) Roush, W. R.; González, F. V.; McKerrow, J. H.; Hansell, E.; “Design and synthesis of dipeptidyl alpha',beta'-epoxy ketones, potent irreversible inhibitors of the cysteine protease cruzain”, Bioorg. Med. Chem. Lett., 1998, 8(19), 2809-2812. 67 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Os compostos foram testados in vitro frente à forma epimastigota Dm28c do T. cruzi (Tabela 1). Os resultados demonstraram que apenas o derivado 38 possui atividade tripanocida (IC50= 11 µM) comparado à βlapachona (35) (IC50=0,9 µM) e ao controle (cristal violeta, IC50<3,1 µM). Esses dados indicam a importância da subunidade do anel pirano considerando que modificações nessa região provocaram mudanças diretas no perfil antiparasitários de todas as naftoquinonas testadas, incluindo o derivado (38) que foi cerca de 10 vezes menos ativo do que a β-lapachona (35). A avaliação da influência do centro redox, nos derivados (35a), (38a41a), no perfil tripanocida demonstrou que todos os oxiranos são capazes de inibir o crescimento do parasita em uma faixa de IC50 entre 1,3 a 39 µM. Estes dados estão em concordância com aqueles da literatura que descrevem o grupo oxirano como um componente estrutural importante presente em inúmeros compostos que possuem atividade biológica100. Embora ainda em menor proporção, o derivado (35a) também apresentou atividade tripanocida (IC50=12 µM) quando comparado à β-lapachona (35) (IC50=0,9 µM). Este resultado reforça a importância do anel C para manter a atividade antiparasitária de (35a). Vale ressaltar que a α-lapachona (41) (IC50=50 µM) é descrita como uma molécula incapaz de gerar radicais livres, entretanto o seu derivado oxirânico (41a) (IC50= 1,3 µM), foi o composto mais ativo entre os oxiranos testados nesse trabalho. 100 Marco-Contelles, J.; Molina, M. T.; Anjum, S.; “Naturally occurring cyclohexane epoxides: sources, biological activities, and synthesis”, Chem. Rev., 2004, 104(6), 2857-2899. 68 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza A presença de centros quirais no derivado naftoquinônico 40 e nos derivados oxirânicos pode estar influenciando a atividade biológica, visto que a interação com o alvo é estereosseletiva e a presença dos demais enantiômeros pode reduzir a atividade em questão101. Nos ensaios de citotoxicidade (CC50) contra as células VERO de mamíferos foi observado que todas as naftoquinonas, exceto o derivado (39), apresentaram uma citotoxicidade menor do que à da β-lapachona (35) (CC50<3,1 µM) e o cristal violeta (CC50=8,9 µM). Tabela 1: Comparação da atividade antiparasitária (IC50), citotoxicidade em células VERO (CC50) e as propriedades eletrônicas moleculares (EHOMO, Dipolo, cLogP) dos derivados naftoquinônicos (35), (38-41). Experimental Composto Teórico IC50 CC50 EHomo Dipolo (µM) (µM) (eV) (Debye) 35 0,9 <3,1 -9,22 5,56 1,66 38 11 22 -9,60 5,59 1,04 39 >50 <3,1 -9,23 5,24 1,24 40 >50 >50 -9,51 6,31 0,61 41 >50 >50 -9,61 0,55 0,90 cLog P Os estudos computacionais dos derivados (35, 38-41, 35a, 38a-41a) foram realizados e as propriedades estruturais e estereoeletrônicas foram avaliadas com o intuito de obter informações importantes sobre a modulação da atividade tripanocida e o perfil citotóxico desses derivados. Uma análise global dos parâmetros teóricos obtidos para as 101 Kulig, K.; Nowicki, P.; Malawska, B.; “Influence of the absolute configuration on pharmacological activity of antihypertensive and antiarrhythmic drugs”, Pol. J. Pharmacol., 2004, 56(5), 499-508. 69 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza naftoquinonas (35, 38-41) mostrou que a energia de HOMO e a lipofilicidade (cLogP) diminuíram para a maioria dos compostos assim como a atividade antiparasitária, com exceção do composto (39). No entanto, tanto o momento de dipolo (0,55-6,31 D) quanto o vetor dipolo, que está orientado para a mesma direção em todos os compostos (com exceção do derivado 41) (Figura 23), não apresentaram uma correlação direta com a atividade antiparasitária (Tabela 1). Figura 23: Vetor do momento de dipolo molecular dos derivados naftoquinônicos (35), (3841). O mapa de potencial eletrostático molecular (MEP) (Figura 24), o coeficiente de distribuição do HOMO (Figura 25) e a densidade de LUMO (Figura 26) para os derivados naftoquinônicos mostraram uma similaridade global, com exceção do derivado (41). 70 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Figura 24: Mapa de potencial eletrostático molecular (MEP) dos derivados naftoquinônicos (35), (38-41), gerados na faixa de energia entre -65(azul) e +23 (vermelho) kcal/mol. (A) Frente e (B) verso dos derivados. Figura 25: Coeficiente de distribuição dos orbitais HOMO dos derivados naftoquinônicos (35), (38-41). Figura 26: (A) Coeficiente de distribuição dos orbitais LUMO e (B) densidade de LUMO dos derivados naftoquinônicos (35), (38-41), gerada numa superfície de densidade eletrônica constante de 0,002 e/ua³. 71 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Numa análise mais específica, a eliminação do anel C da β-lapachona (35), com a conservação de uma metoxila (38), não mostrou diferenças muito significativas na densidade eletrônica no MEP em comparação com o derivado (35) (Figura 25), indicando a importância estrutural do anel C para a atividade antiparasitária. No derivado (39) foi realizada uma contração do anel C de 6 para 5 membros, resultando na nor-β-lapachona. Isso revelou a influência da restrição da flexibilidade nesse anel e seu impacto no perfil antiparasitário. Não houve variações significantes nas propriedades eletrônicas (Figura 24), que são comparáveis com a β-lapachona (35), entretanto o derivado (39) não apresentou atividade antiparasitária e foi o mais citotóxico da série (Tabela 1). Assim, pode-se inferir que a disposição do anel de 6 membros define uma orientação específica para o átomo de oxigênio e mostra a sua importância para a interação com o alvo no parasita. Essa região é mais rígida no derivado (39) e está orientada de forma diferente em (38), devido a uma maior liberdade conformacional do grupo metoxila. A substituição do átomo de hidrogênio, próximo ao grupo dimetila no anel C, por um substituinte metanossulfonato (-SO3CH3) (40), um grupo mais polar e volumoso, resultou na diminuição da densidade eletrônica no sistema de anéis (representado por uma intensa cor azul) e aumentou a possibilidade de um maior impedimento estérico para interagir com o alvo no parasita (Figura 24). Logo, tanto o efeito eletrônico quanto o impedimento estérico parecem ser deletérios para atividade tripanocida. Semelhante aos compostos (38) e (39), o vetor do momento de dipolo está orientado para o 72 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza átomo de oxigênio do anel C (Figura 23). Por último, a transposição do anel pirano C, no composto (41), mostrou que ocorreu uma distribuição do centro eletrofílico pelas duas carbonilas e, portanto, em direções opostas do anel (Figura 24). Esta modificação estrutural também introduziu uma diminuição significativa da atividade antiparasitária, já descrito na literatura99 (Tabela 1). Isto reforça a importância de uma orientação correta do anel pirano para que ocorra uma interação adequada com o sítio de interação na célula do parasita. Foi realizada a análise do coeficiente de distribuição tridimensional dos orbitais de fronteira HOMO e LUMO das naftoquinonas, com o intuito de analisar a contribuição atômica de ambos os orbitais de fronteira, considerando que o mecanismo de ação desses compostos apresenta um componente eletrônico importante (Figuras 25 e 31). A análise dos dados de modelagem molecular mostrou uma distribuição de HOMO pelo sistema de anéis, com exceção do composto (41), que apresentou uma maior contribuição de HOMO na ligação insaturada entre os anéis B e C próximo ao átomo de oxigênio do anel pirano (Figura 25). A análise da densidade de LUMO não mostrou diferenças significativas entre as naftoquinonas da série estudada, com exceção do composto (41) (Figura 26). A outra proposta desse trabalho foi obter as propriedades eletrônicas e estruturais que podem estar envolvidas na atividade tripanocida quando o centro redox do núcleo quinona é substituído por um anel oxirano. Uma análise geral dos parâmetros teóricos obtidos por estudos de modelagem molecular, tais como o momento de dipolo, com exceção para o composto 73 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza (40a), e a lipofilicidade diminuíram para a maioria dos derivados oxiranos (Tabela 2), porém, não foi possível observar uma correlação com a atividade antiparasitária. Tabela 2 Atividade antiparasitária (IC50), citotoxicidade em células VERO (CC50) e as propriedades eletrônicas moleculares (EHOMO, Dipolo, cLog P) dos derivados oxiranos (35a, 38a-41a). Composto IC50 CC50 EHomo Dipolo cLog P (µM) (µM) (eV) (Debye) 35a 12 >50 -9,02 4,15 1,58 38a 4,0 32 -9,37 4,30 0,96 39a 3,5 25 -9,03 3,93 1,17 40a 39 >50 -9,31 5,54 0,54 41a 1,3 >50 -9,35 2,33 0,83 O MEP (Figura 27) e o mapa tridimensional de densidade de LUMO (Figura 28) dos derivados oxiranos apresentaram diferenças significativas em relação às naftoquinonas correspondentes. Os MEPs mostraram um potencial mais negativo estendendo-se pelo sistema de anéis em todos os oxiranos, quando comparados com os derivados naftoquinonas. 74 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Figura 27: Mapa de potencial eletrostático molecular dos derivados naftoquinônicos oxiranos (35a), (38a-41a). gerados na faixa de energia entre -65 (azul) e +23 (vermelho) kcal/mol. (A) frente (B) verso dos derivados. A densidade de LUMO descreve áreas deficientes em elétrons que podem ser suscetíveis à interação com regiões de alta densidade eletrônica do alvo receptor no parasita. A área deficiente em elétrons (cor azul) dos derivados naftoquinonas está concentrada em ambas as carbonilas e no átomo de carbono ligado ao átomo de oxigênio do anel pirano (Figura 26). Nos oxiranos, esta área está restrita ao carbono próximo ao átomo de oxigênio do anel pirano C (Figura 28). Entretanto, os coeficientes de distribuição de HOMO (Figura 29) e o vetor do momento de dipolo molecular dos oxiranos (Figura 30) não mostraram nenhuma modificação aparente quando comparados às naftoquinonas correspondentes. Uma análise do composto (35a) mostrou um efeito antiparasitário com menor valor de IC50, porém consistente, em relação à naftoquinona correspondente (Tabela 2), sugerindo que o sistema quinona não é essencial para esta atividade. 75 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Figura 28: (A) Coeficiente de distribuição dos orbitais LUMO e (B) densidade de LUMO dos derivados naftoquinônicos oxiranos (35a), (38a-41a), gerada numa superfície de densidade eletrônica constante de 0,002 e/ua³. Figura 29: Coeficiente de distribuição dos orbitais HOMO dos derivados naftoquinônicos oxiranos (35a), (38a-41a). Figura 30: Vetor do momento de dipolo molecular dos derivados naftoquinônicos oxiranos (35a), (38a-41a). Diferentemente dos derivados naftoquinonas (38) e (39), a presença do anel oxirano, junto com a modificação estrutural no anel pirano, não 76 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza suprimiu a atividade antiparasitária dos compostos (38a) e (39a). O composto (40a) ainda apresentou atividade antiparasitária consistente, embora o substituinte volumoso possa impedir interações favoráveis com o alvo receptor do parasita. A atividade antiparasitária desses compostos (Tabela 2) reforça a importância de outras características estruturais do que apenas a presença do núcleo quinona. Dentre os oxiranos, o composto (41a) apresentou-se como o composto mais ativo com melhor perfil antiparasitário cerca de 40 vezes maior do que a α-lapachona (41) e foi semelhante à β-lapachona (35), além de apresentar baixa toxicidade (CC50 >50 µM), indicando este composto como o melhor candidato para estudo do seu mecanismo de ação (Tabela 2). A análise dos estudos de modelagem molecular destacou a variação de todas as propriedades eletrônicas e moleculares quando (41a) é comparado com a β-lapachona (35). O derivado (41a) apresentou melhor atividade antiparasitária dessa série de compostos sem apresentar efeito tóxico significante. Aparentemente a presença do anel oxirano diminuiu a lipofilicidade (clog P= 0,83) e o momento de dipolo (2,33D) de (41a) e também a sua citotoxicidade (Tabela 2). O momento de dipolo e o vetor dipolo molecular também constituem parâmetros relevantes para avaliar a aproximação dos ligantes ao sítio de ligação. Os compostos (35a), (38a), (39a) e (40a) apresentaram momentos dipolo e também citotoxicidade menor que seus precursores. O vetor de momento de dipolo está apontado para a mesma direção demonstrando que 77 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza a separação de cargas é semelhante nas moléculas. A única exceção foi o composto (41a), que apresentou um momento de dipolo maior do que a naftoquinona correspondente, enquanto seu vetor dipolo está na direção oposta a dos outros derivados oxiranos (Figura 30). Essa orientação do vetor mostrou que a polaridade da molécula é diferente quando comparada ao composto protótipo (β-lapachona - 35). Essa característica pode ser extremamente relevante para maximizar a interação com o alvo receptor no T. cruzi, indicando o composto (41a) como o mais potente da série dos oxiranos e aquele que apresentou o perfil biológico análogo à β-lapachona (35). Todos os derivados oxiranos testados apresentaram valores menores de citotoxicidade, entre 25 e 50 µM, quando comparados as naftoquinonas correspondentes (Tabela 1). Estes dados estão de acordo com relatos da literatura que retratam a direta correlação do centro redox com o nível de citotoxicidade das naftoquinonas. Assim, a substituição de uma das carbonilas do grupo quinona por um anel oxirano levou a compostos menos tóxicos. Vale ressaltar que o composto mais potente (41a) apresentou o menor perfil de citotoxicidade ao qual resultou no mais alto índice de seletividade (CC50/IC50) comparado à β-lapachona (35) (Figura 31). Isto aponta o derivado (41a) como um protótipo promissor para planejar novos compostos tripanocidas e com baixa citotoxicidade. 78 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Figura 31: Índice de Seletividade para os compostos mais ativos, β-lapachona (35), e oxirano-α-lapachona (41a). Para uma avaliação mais detalhada dos compostos mais ativos, foi realizada a sobreposição da β-lapachona (35) e do oxirano-α-lapachona (41a) (Figura 32). Dessa forma, foi possível observar diferenças estéricas entre os compostos. A análise da figura 32 revela que o anel de seis membros dos compostos ocupa regiões diferentes. 79 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Figura 32: (A) Comparação do vetor dipolo molecular e (B) Sobreposição da β-lapachona (35), em azul, e do oxirano-α-lapachona (41a), em verde. A adição do anel oxirano modificou a polaridade do composto juntamente com a lipofilicidade, o que pode estar relacionado com sua menor citotoxicidade. Além disso, a comparação espacial do anel pirano mostrou que o mesmo ocupa espaços tridimensionais diferentes nos dois compostos e que, juntamente com a orientação do vetor dipolo, pode indicar diferentes mecanismos de ação para os dois compostos analisados. 80 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 5.2. Aplicação de modelagem molecular no estudos da Relação Estrutura-Atividade de derivados 1,2,3-triazólicos com atividade antimicobacteriana. 5.2.1. Análise dos dados obtidos a partir dos cálculos de modelagem molecular Duas séries de derivados N-fenil-1,2,3-triazóis foram sintetizada pelo grupo do professor Vitor Francisco Ferreira, com diferentes substituintes na posição 4 do anel triazólico. Uma das séries sintetizadas foi a do 1,2,3triazóis carbaldeÍdo (42a-42l) que foram, então, posteriormente convertidas na série difluormetilenos (43a-43l). Os compostos carbaldeídos e difluormetilenos foram testados frente à atividade antimicobacteriana em cepas de Mycobacterium tuberculosis, com obtenção da concentração mínima inibitória – CMI (Tabela 3). Todos os 24 compostos foram ativos contra o Mycobacterium tuberculosis, embora os derivados (42a-42l) tenham sido significantemente mais ativos do que a série (43a-43l). Este resultado indica que o átomo de flúor pode contribuir de forma negativa para a atividade antimicobacteriana. Já os compostos (42a) e (42l) foram os mais ativos com 100% de inibição e CMI de 2,5 µg/mL, comparável ao controle positivo (Tabela 3). Os compostos (42f) (R=4-CN), (42i) (R=4-Cl), e (42j) (R=4-Br) também apresentaram CMI= 5,0 µg/mL cujo valor é inferior do que 6,25 µg/mL, o qual é tido como o valor limitante para a avaliação de novos agentes antituberculose pelo Programa Global de Descoberta de Novos 81 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Fármacos Antituberculose34,102. A análise global dos parâmetros teóricos dos compostos apontou que os valores de energia de HOMO e LUMO de todos os compostos variaram bastante, e nenhuma correlação direta com a atividade antimicobacteriana foi observada (Tabela 3). 102 http://www.taacf.org/data-interpretation.htm 82 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Tabela 3: Comparação da atividade mínima inibitória (CMI) e das propriedades eletrônicas dos compostos N-fenil-1,2,3-triazóis-4-carbaldeídos (42a-42l) e 4-difluormetilenos (43a-43l). CHO CHF2 N N N N N Composto R 42a 4-CH3 42b 4-OCH3 42c 3,4-(OCH3)2 42d 2-OCH3 42e 2,5-(OCH3) 2 42f 4-CN 42g 3-CN 42h 4-NO2 42i 4-Cl 42j 4-Br 42k 3-Cl 42l 3,5–diCl 43a 4-CH3 43b 4-OCH3 43c 3,4-(OCH3) 2 43d 2-OCH3 43e 2,5-(OCH3) 2 43f 4-CN 43g 3-CN 43h 4-NO2 43i 4-Cl 43j 4-Br 43k 3-Cl 43l 3,5-diCl Rifampicina Etambutol ND*= não-determinado N R R (42a-42l) (43a-43l) CMI Inibição Dipolo (%) (µg/mL) (debye) 2,5 100 5,28 10,0 100 5,72 80,0 0 6,99 40,0 94 6,32 80,0 59 5,32 5,0 ND* 0,59 20,0 ND 3,82 20,0 ND 0,84 5,0 ND 3,04 5,0 100 2,93 10,0 100 3,77 2,5 100 2,76 40,0 87 4,81 10,0 93 5,01 80,0 66 3,11 40,0 86 5,95 80,0 74 4,84 20,0 ND 1,42 80,0 ND 2,96 40,0 ND 1,68 40,0 ND 2,68 20,0 75 2,58 80,0 54 5,13 80,0 55 2,46 1,0 3,25 - EHOMO (eV) -6,61 -6,24 -6,10 -6,44 -5,94 -7,31 -7,34 -7,46 -6,81 -6,81 -6,99 -7,23 -6,54 -6,17 -6,93 -6,37 -5,88 -7,26 -7,33 -7,44 -6,74 -6,74 -6,51 -7,18 - ELUMO (eV) -1,92 -1,85 -1,75 -1,70 -1,70 -2,61 -2,40 -2,94 -2,15 -2,19 -2,17 -2,34 -1,41 -1,28 -1,74 -1,29 -1,30 -2,37 -2,11 -2,81 -1,72 -1,77 -1,31 -1,96 - 83 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Os derivados difluormetilenos (43a-43l) apresentaram a maior densidade LUMO comparado aos derivados carbaldeídos (42a-42l) (Figura 33). A densidade LUMO encontra-se distribuída ao longo de toda a estrutura nos derivados difluormetilenos (43a-43l) enquanto que nos compostos carbaldeídos (42a-42l) encontra-se localizada no anel triazol (Figuras 33 e 34). Estes resultados indicam que a localização da densidade LUMO em uma parte da estrutura pode ser importante para a atividade antimicobacteriana. 84 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Figura 33: Densidade de LUMO dos compostos N-fenil-1,2,3-triazóis-4-carbaldeídos (42a42l), gerados numa superfície de densidade eletrônica constante de 0,002e/ua³. Figura 34: Densidade de LUMO dos compostos N-fenil-1,2,3-triazóis-4-difluormetilênicos (43a-43l), gerados numa superfície de densidade eletrônica constante de 0,002e/ua³. 85 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza A análise do mapa de potencial eletrostático molecular (MEP) das duas séries de compostos mostrou que a introdução dos átomos de flúor no substituinte da posição 4 do anel triazólico modificou a distribuição eletrônica nos compostos (43a-43l), que apresentaram a perda da região negativa na parte superior da molécula e resultou numa baixa atividade biológica (Figura 35 e 36 e Tabela 3). A análise individual dos compostos que apresentaram melhor atividade (42a-42l) revelou o vetor dipolo direcionado do anel benzênico para o núcleo triazol, com exceção dos compostos (42f) e (42h), que apresentam grupos retiradores de elétrons na posição para do anel (Figura 37). A introdução de grupo metila na posição para do anel aromático (42a), um fraco doador de elétrons, fez surgir um potencial levemente negativo no anel aromático, como pode ser observado no MEP (Figura 35), e aumentou a atividade inibitória. 86 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Figura 35: Mapa de Potencial Eletrostático Molecular dos derivados N-fenil-1,2,3-triazóis-4carbaldeídos (42a-42l), gerados na faixa de energia entre -65 (azul) e +23 (vermelho) kcal/mol. Figura 36: Mapa de Potencial Eletrostático Molecular dos derivados N-fenil-1,2,3-triazóis-4difluormetilenos (43a-43l), gerados na faixa de energia entre -65 (azul) e +23 (vermelho) kcal/mol. 87 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Figura 37: Vetor do momento de dipolo molecular dos derivados N-fenil-1,2,3-triazóis-4carbaldeídos (42a-42l). A avaliação dos efeitos estereoeletrônicos na presença do oxigênio na posição para (42b) revelou que, apesar do análogo metoxila permitir a participação do par de elétrons livres do átomo de oxigênio na ressonância e aumentar a densidade eletrônica no sistema aromático, o composto (42b) apresentou uma diminuição cerca de 4 vezes na atividade, quando comparado com o composto (42a). A adição de outro grupo metoxila na posição meta levou a um composto ainda menos ativo (42c) revelando a importância do efeito estérico na atividade antimicobacteriana (Figura 35). A adição de um grupo metoxila na posição orto (42d) provocou uma torsão de 28° do anel fenila provocando uma descoplanaridade com o anel triazol em função do efeito orto. Isto provocou uma diminuição da atividade biológica em cerca de 16 vezes quando comparado o composto mais ativo. Uma perda maior na atividade foi observada quando outro substituinte metoxila foi 88 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza adicionado (42e). Os resultados para os compostos (42c) e (42e) sugerem que um alto volume molecular compromete a interação com o alvo receptor. Além disso, a presença de efeitos estereoeletrônicos dependentes da posição do anel aromático também pode afetar a atividade biológica (Figura 35 e Tabela 3). A presença de substituintes aceptores de elétrons alterou a atividade antimicobacteriana dos compostos, em comparação àqueles substituídos com grupos doadores de elétrons. A substituição de uma nitrila na posição para (42f) induziu mudanças significantes no volume molecular, com um aumento do potencial inibitório quando comparado com os análogos substituídos com metoxila. Este substituinte também provocou uma diminuição do potencial negativo do anel. A transposição do substituinte para a posição meta (42g) levou a uma perda de 8 vezes na atividade e deslocamento do coeficiente de HOMO para o núcleo carbaldeído. (Figura 35). Esse resultado reforçou a importância do substituinte na posição para do anel aromático para a atividade antimicobacteriana. A presença do grupo nitro na posição para (42h) diminuiu 4 vezes o potencial inibitório do composto quando comparado com seu análogo (42f). Uma vez que o grupo nitro é um forte aceptor de elétrons, o deslocamento do coeficiente de HOMO para o núcleo aldeído era esperado. A presença de um grupo aceptor de elétrons fraco, como cloro (42i) ou bromo (42j) na posição para aumentou a lipofilicidade dos compostos, porém diminuiu em 2 vezes a atividade em comparação com o composto mais ativo. O átomo de cloro na 89 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza posição meta (42k) diminuiu ainda mais a atividade, mostrando que a posição do substituinte é tão importante quanto as características eletrônicas e lipofílicas. A adição de um substituinte cloro extra na posição 5 (42l) levou a um melhor perfil de atividade inibitória e introduziu características eletrônicas, tais como densidade de LUMO (Figura 46), MEP (Figura 35) e coeficiente do orbital HOMO (Figura 38) semelhantes ao composto (42a). Aparentemente há uma correlação clara entre o coeficiente de distribuição de HOMO e o perfil biológico dos compostos. Isto pode ser caracterizado por uma extensa distribuição de HOMO pela estrutura dos compostos, apontando uma região provável para interações do tipo stacking com o alvo receptor do parasita, que apresentaram um perfil antimicobacteriano significante, enquanto que a localização desse coeficiente em apenas uma parte pode levar a compostos menos ativos (Figura 38). 90 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Figura 38: Coeficiente de distribuição do HOMO dos derivados N-fenil-1,2,3-triazóis-4carbaldeídos (42a-42l). 5.2.2. Análise dos parâmetros físico-químicos. Para avaliar a natureza hidrofóbica, foram calculados clogP, peso molecular (PM) e volume molecular (VM), e o número de doadores e aceptores de ligação hidrogênio, de acordo com a Regra de Lipinski103 (Tabela 4). Os valores obtidos indicaram que todos os compostos são suficientemente hidrofóbicos para penetrar as membranas biológicas, inclusive a parede celular do Mycobacterium. A análise de doadores e aceptores de ligação Hidrogênio mostrou que os derivados carbaldeídos 103 Costa, M. S.; “Síntese e Avaliação Farmacológica de novos derivados 1,2,3triazólicos e imidazólicos com potencial atividade inibitória do Mycobacterium tuberculosis e das formas promastigotas de Leishmania amazonensis”, Tese de Doutorado, IQ, UFF, Niterói, 2005. 91 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza (42a-42l) e os difluormetilenos (43a–43l) diferem no número de aceptores de ligação hidrogênio devido à presença do aldeído na posição 4 do anel triazólico da primeira série citada. Uma vez que os derivados desta série foram mais ativos, o grupo aldeído parece ser importante para a interação com o alvo e conseqüentemente influencia o perfil inibitório desses compostos. 92 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza Tabela 4: Parâmetros hidrofóbicos dos compostos N-fenil-1,2,3-triazóis-4-carbaldeídos (42a42l) e 4-difluormetilênicos (43a-43l). Composto PM c logP Nº doador lig. H Nº aceptor 42a 187,20 2,12 0 3 42b 203,20 1,62 0 4 42c 233,22 1,23 0 5 42d 203,20 1,62 0 4 42e 233,22 1,57 0 5 42f 198,18 1,20 0 4 42g 198,18 1,20 0 4 42h 218,04 1,47 0 3 42i 207,62 2,36 0 3 42j 252,07 2,51 0 3 42k 207,62 2,36 0 3 42l 243,06 3,08 0 3 43a 209,19 2,38 0 2 43b 225,19 2,11 0 3 43c 255,22 1,79 0 4 43d 225,19 2,11 0 3 43e 255,22 2,13 0 4 43f 220,18 1,72 0 3 43g 220,18 1,72 0 3 43h 240,17 1,99 0 2 43i 229,61 2,77 0 2 43j 274,06 2,92 0 2 43k 229,61 2,77 0 2 43l 264,06 3,54 0 2 lig. H 93 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 5.2.3. Drug-likeness O potencial drug-likeness dos compostos mais ativos (42a, 42f, 42i, 42j e 42l) e da isoniazida (13) foram calculados, sendo essa última utilizada como controle positivo por ser um fármaco amplamente utilizado no tratamento da tuberculose e devido a sua semelhança estrutural com os compostos analisados. Apenas o composto (42f) (CMI = 5,0 µg/mL) não apresentou um bom potencial drug-likeness, enquanto (42i) apresentou o melhor potencial druglikeness entre todos, inclusive a isoniazida (Figura 39). Figura 39: Potencial Drug-likeness dos compostos N-fenil-1,2,3-triazóis-4-carbaldeídos (42a), (42f), (42i), (42j) e (42l) e do fármaco isoniazida (13). 94 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 5.2.3. Toxicidade Também foi realizada a predição dos riscos toxicológicos mutagênico, tumorigênico e risco tóxico na reprodução - desses compostos (Figura 40). Apenas o composto (42f) apresentou algum tipo de risco, sendo esse, mutagênico, o que pode explicar seu baixo potencial drug-likeness. Os baixos riscos teóricos de mutagenicidade, tumorogenicidade, efeitos na reprodução e efeitos irritantes dos demais compostos avaliados (42i, 42j e 42l) indicaram um perfil de baixo risco, similar à isoniazida (13), que nos aspectos analisados também se apresentou segura. É importante ressaltar que a toxicidade predita não é totalmente confiável nem garante que esses compostos são completamente isentos de efeitos tóxicos. Contudo, ressalta o perfil promissor desses compostos para estudos experimentais mais aprofundados. Figura 40: Toxicidade dos compostos N-fenil-1,2,3-triazóis-4-carbaldeídos (42a), (42f), (42i), (42j) e (42l) e do fármaco isoniazida (13). 95 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza 6. Conclusões e Perspectivas Uma série de novos derivados modificados da lapachona e compostos triazólicos foram previamente sintetizados e avaliados quanto ao seu potencial tripanocida e antimicobacteriano, respectivamente. Os estudos de modelagem molecular dnos derivados naftoquinônicos revelaram que as mudanças estruturais no anel pirano C e a alteração do perfil redox do grupo quinona, através da incorporação do anel oxirano, introduziram diferenças significativas nas características estereoeletrônicas desses compostos. Os resultados mostraram que, apesar das propriedades eletrônicas totalmente diferentes, os compostos (35) e (41a) apresentaram perfil tripanocida semelhantes com distintos níveis de reatividade. Entretanto, o derivado oxirânico (41a) além de manter o mesmo potencial de atividade quando comparado a β-lapachona, apresentou baixa citotoxicidade, o que torna esse composto como uma molécula candidata a estudos adicionais para a compreensão do seu mecanismo de ação. Os resultados do estudo da Relação Estrutura-Atividade utilizando modelagem molecular dos derivados 1,2,3-triazóis mostraram a importância da sub-unidade aceptora de ligação de hidrogênio nos derivados carbaldeídos (42a-42l), a posição do substituinte no anel aromático. Outros fatores importantes identificados no estudo teórico foram a planaridade entre os anéis triazol e fenila como também a correlação entre o coeficiente de distribuição de HOMO e a atividade antimicobacteriana. 96 UFF – IQ – PGO – Dissertação de Mestrado Alessandra Mendonça Teles de Souza No cálculo de drug-likeness dos triazóis mais ativos da série (42a, 42f, 42i, 42j, e 42l) e da isoniazida (13), observou-se que apenas o derivado (42f) não apresentou um bom potencial drug-likeness enquanto o derivado (42i) apresentou o melhor valor entre todos, incluindo o fármaco isoniazida. Da mesma forma, na avaliação do perfil toxicológico desses derivados, o composto (42f) apresentou possível risco mutagênico. Ainda que os alertas de riscos toxicológicos do programa Osiris não signifiquem uma predição totalmente segura, o perfil teórico de baixa toxicidade e os estudos de modelagem molecular indicam estas moléculas como protótipos para o planejamento racional de novos agentes antituberculose. 97