Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Administração Junta Comercial do Estado de Santa Catarina Procuradoria Geral Parecer n.º 132/04 Processo nº 04/202707-1 Aumento de capital. Integralização. Forma. Aspectos legais. O sistema legal erigido no novo CC, diante dos artigos 1005 e 1055, § 1o, estabelece uma lógica simples: cabe aos sócios realizarem a integralização do capital social de forma regular, sob pena de que eles mesmos venham a ser atingidos, em seu patrimônio, pelas dívidas sociais. Portanto, aos próprios sócios cabe vigiar a regularidade da integralização das quotas, porquanto eles, pessoalmente, arcarão com as conseqüências diretas de eventuais defeitos neste ato. Vista a questão sob este prisma, o papel da Junta Comercial, no controle dos atos societários, há que ser revisto. Se os sócios são responsáveis pela regular integralização do capital social, e se desta responsabilidade pode resultar a sujeição de seu patrimônio pessoal às dívidas sociais, disto resulta a presunção legal de que o ato de integralização é regular – salvo por questões de ordem formal, de resto consideradas em face de quaisquer atos trazidos a arquivamento. Esta é precisamente a lógica do sistema: sendo os sócios os maiores interessados na regularidade da integralização, não cabe às Juntas Comerciais observarem extremo rigor na análise do conteúdo destes atos – pois a presunção é a de que os sócios, na condição de pontenciais prejudicados em caso de qualquer defeito, zelarão 1 Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Administração Junta Comercial do Estado de Santa Catarina Procuradoria Geral por sua regularidade. Trata-se de pedido de reconsideração de exigências opostas ao arquivamento da 4a alteração contratual da empresa EBOCAM SUPER FLUTUADORES LTDA. Tais exigências foram as seguintes: i) esclarecer a forma do aumento de capital; ii) mencionar o regime de bens do sócio ingressante; iii) utilizar a expressão ‘administrador’ em lugar de ‘gerente’. O primeiro aspecto a observar, no caso, é a data em que firmada a alteração contratual em exame. Isto porque este ato contratual antecede a vigência do atual Código Civil; suas disposições se sujeitam, portanto, ao ordenamento legal anterior – conforme já decidiu o DNRC. Disto resulta o afastamento de duas das três exigências mencionadas. Não há que se exigir a menção ao regime matrimonial, porquanto tal requisito está vinculado à disposição do art. 977 do novo CC, sem que houvesse tal restrição legal no contexto jurídico anterior. Tampouco tem respaldo a exigência quanto à utilização da expressão ‘gerente’. Na sistemática anterior ao Código Civil, em que as sociedades limitadas eram reguladas pelo Decreto 3708/19, designava-se como ‘gerência’ o que a atual legislação define como ‘administração’. Logo, o ato contratual faz uso de expressão consagrada em texto legal vigente à época de sua pactuação, donde a ausência de irregularidade. Resta, entretanto, a exigência quanto à indicação da forma de integralização do capital aumentado. Segundo a alteração contratual em exame, a integralização do capital subscrito no aumento de capital se daria com “direitos creditórios que [o sócio] possui na sociedade”. De fato, tal indicação é vaga e obscura, dando ensejo à oposição da exigência. Esta procuradoria, diante desta questão, assumiu de início uma posição rigorosa, exigindo a demonstração efetiva dos ativos que, por 2 Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Administração Junta Comercial do Estado de Santa Catarina Procuradoria Geral ocasião da integralização do capital subscrito, eram acrescidos ao patrimônio da sociedade. Tal posição, no entanto, vem se flexibilizando. E esta tendência está se afirmando em razão do entendimento mais profundo da caracterização legal desta hipótese, sobretudo diante do conteúdo do art. 1055, § 1º, do CC. Este dispositivo legal traz um princípio fundamental, que revela a lógica do sistema criado pelo legislador para regular a hipótese de integralização do capital social. Eis o princípio: a exata estimação dos bens utilizados na integralização é responsabilidade solidária dos sócios. Tal princípio é complementado pela disposição do art. 1005 do CC, que imputa ao sócio que tenha integralizado as quotas sociais a responsabilidade pela evicção – no caso da transferência de domínio, posse ou uso de bem – e pela solvência do devedor no caso da transferência de créditos. Portanto, se os bens indicados para fins de integralização não tiverem o valor que lhes foi atribuído, ou não forem regularmente transmitidos, ou mesmo se não existirem – tudo isto implica a responsabilidade dos sócios perante a própria sociedade e terceiros. Portanto, a lógica do sistema legal é atribuir toda a responsabilidade aos sócios e, por conseqüência, eximir a Junta Comercial da conferência rigorosa e precisa dos ativos integralizados. Neste sentido, afigura-se bastante coerente a posição do legislador: atribuindo aos sócios a responsabilidade integral pela regular integralização do capital social, abre a possibilidade de que o patrimônio pessoal destes submeta-se à cobrança dos débitos sociais no caso de irregularidades no ato de integralização. Como se sabe, a responsabilidade dos sócios, nas sociedades limitadas, resulta da inexistência ou da insuficiência de integralização do capital subscrito. Nesta hipótese, os sócios podem responder solidariamente pelas dívidas da sociedade. Assim, interessa sobretudo aos sócios procederem à regular integralização do capital, sob pena de responderem pessoalmente perante os credores da sociedade. 3 Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Administração Junta Comercial do Estado de Santa Catarina Procuradoria Geral Em suma, o sistema legal erigido no novo CC estabelece uma lógica simples: cabe aos sócios realizarem a integralização do capital social de forma regular, sob pena de que eles mesmos venham a ser atingidos, em seu patrimônio, pelas dívidas sociais. Portanto, aos próprios sócios cabe vigiar a regularidade da integralização das quotas, porquanto eles, pessoalmente, arcarão com as conseqüências diretas de eventuais defeitos neste ato. Vista a questão sob este prisma, o papel da Junta Comercial, no controle dos atos societários, há que ser revisto. Se os sócios são responsáveis pela regular integralização do capital social, e se desta responsabilidade pode resultar a sujeição de seu patrimônio pessoal à cobrança das dívidas sociais, disto resulta a presunção legal de que o ato de integralização é regular – salvo por questões de ordem formal, de resto consideradas em face de quaisquer atos trazidos a arquivamento. Esta é precisamente a lógica do sistema: sendo os sócios os maiores interessados na regularidade da integralização, não cabe às Juntas Comerciais observarem extremo rigor na análise destes atos – pois a presunção é a de que os sócios, na condição de pontenciais prejudicados em caso de qualquer defeito, zelarão por sua regularidade. Assim, penso ser possível o arquivamento da alteração de que conste, ainda que de forma vaga e obscura, a forma de integralização do aumento do capital social. Diante do que foi dito, são os próprios sócios quem assumem o risco de uma eventual irregularidade deste ato; logo, não cabe à Junta imputar-lhes formalidades com vistas a evitar um risco que eles mesmos assumem. Diante disso, opina-se pela procedência do recurso. Florianópolis, 18 de agosto de 2004. Victor Emendörfer Neto Procurador da JUCESC 4