Fisiologia II Data: 3 de Março de 2008 (1ª aula)

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Fisiologia II
Data: 3 de Março de 2008 (1ª aula)
Docente: Prof. Dr. Mário Marques
Desgravado por: Ana Luísa Costa, Diana Bordalo, Liliane Rocha
Tema: Leis gerais da circulação e propriedades do coração
LEIS GERAIS DA CIRCULAÇÃO
Vamos começar pela área cardiovascular (e eu também costumo sempre
dizer e penso que isto é unânime, que todas as áreas são importantes). A
área cardiovascular tem algo de extremamente útil: o tipo de raciocínio
que nós utilizamos, que interessa muito à Fisiologia. Se percebermos
intimamente como funciona o nosso sistema circulatório, é relativamente
simples depois perceber as várias patologias relacionadas com o mesmo.
Vamos falar de forma muito geral, mas depois teremos aulas práticas para
falar de cada tema em maior pormenor.
Quais são as funções da circulação?
No fundo é:
 o transporte de O2, nutrientes, hormonas, todos tipos de
substâncias a todas as células do organismo;
 o transporte dos produtos provenientes do catabolismo para serem
removidos do nosso corpo. Obviamente, também todos nós
sabemos, que existem várias vias de eliminação, as principais
obviamente têm a ver com o rim, a urina, fezes, suor, e também,
por vezes, porque não, lágrimas e leite, e ainda substâncias voláteis
excretadas pela respiração, são tudo zonas de excreção.
Em suma, a função da circulação é transportar o que interessa de um lado
para o outro.
 transporte de calor de e para as células (vocês também vão ter
aulas específicas sobre este assunto). A regulação térmica do nosso
organismo é algo muito importante, e que nós temos de manter
dentro de um limite relativamente estreito para vivermos com
saúde.
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Alguns marcos históricos:
- É descrita, por um senhor chamado Ibn Nafis a pequena circulação por
volta de 1300.
- No entanto, é em 1543, que Vesálio descreve a anatomia do coração de
uma maneira já bastante eficiente.
- Em 1553 Miguel Servet e em 59 Mateo Colombo descrevem a pequena
circulação mas já relacionada com a hematose (ela já tinha sido descrita
por Ibn Nafis mas não tinha sido dado relevo à importância para as trocas
gasosas entre o sangue e o ar atmosférico).
- Em 1559, Cesalpino introduz o termo de circulação, de andar, de algo
que se movimenta, ainda é o termo que hoje usamos.
- Em 1603, Fabrizio d’Acquapendente descreve as válvulas venosas, vocês
também irão ter aulas onde irão ver que a importância extraordinária da
existência de válvulas venosas, nomeadamente a nível das veias dos
membros inferiores; quando isso não existe o que acontece é que o
sangue tem extrema dificuldade em chegar ao coração porque vai sempre
refluir pela força da gravidade, e portanto há a descrição das válvulas
venosas como aspecto muito relevante para a circulação.
- É em 1628, que aparece o considerado pai da fisiologia da circulação,
William Harvey que descreve pormenorizada e correctamente a grande e
a pequena circulações. Devo dizer-vos que para vocês acaba um bocado o
termo de pequena e grande circulação, muitas vezes é assim que nós
falamos, e não está incorrecto em termos médicos, mas nós falamos
muito mais em circulação sistémica e pulmonar porque são termos mais
relacionados com a fisiologia.
- Em 1661, Malphighi descreve os capilares, já havia a descrição da
circulação antes, mas ainda não havia descrição dos pequeníssimos vasos
onde se promovem as trocas de nutrientes entre células e a própria
circulação.
Temos aqui o esquema geral da distribuição do sangue, em cada uma das
circulações, e reparem no seguinte:
 temos
na
circulação
pulmonar cerca de 9% do
total de sangue que temos
dentro dos vasos; chama-se à
quantidade de sangue que
nós temos nos vasos volémia;
 temos no coração cerca de
7% e no território arterial
cerca de 20%, isto é, nós
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temos no coração e no território arterial uma quantidade
relativamente pequena de sangue, e se olharmos aqui para as veias
e para as vénulas temos cerca de 64% de toda a quantidade de
sangue que temos nos nossos vasos. Isto tem uma importância
muito grande e é por isso que se designa muitas vezes o território
venoso de território de capacitância, porque nós temos a
capacidade de armazenar muito sangue nesse território, e face a
uma situação de hipovolémia, por exemplo por uma grande
hemorragia, é a venoconstrição que vai permitir que exista sangue
para ser expulso em todo o território arterial. Portanto há uma
capacidade do território venoso de venoconstrição para tentar
manter índices razoáveis de débito para todos os tecidos.
Outro aspecto muito importante é a distribuição do débito cardíaco versus
o consumo de O2 nos vários territórios. E reparem que:
 temos uma distribuição de cerca de 25% do débito cardíaco para o
rim (os rins são órgãos relativamente pequenos mas por dia
conseguimos fazer passar para dentro do sistema tubular renal
cerca de 180L de filtrado, isto quer dizer que temos de ter uma
grande quantidade de sangue a passar pelos rins para que haja uma
quantidade grande de filtrado, pois só assim conseguimos eliminar
rapidamente alguns produtos de catabolismo, e também toxinas ou
alguns fármacos);
 temos na pele cerca de
10%,
nas
coronárias
temos um débito cardíaco
muito elevado para o
volume
do
órgão
(coração), o que não
surpreende porque nós
estamos constantemente
a consumir muito O2 pelo
coração e portanto temos
que o alimentar pelas
coronárias;
 temos em todos os músculos 15%;
 no fígado também 15%, o que não surpreende uma vez que o
fígado é um órgão onde nós fazemos maior parte do metabolismo
das substâncias, considerado a fábrica do nosso organismo;
 no cérebro cerca de 15%.
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Se olharmos agora para o consumo de O2, reparem na diferença:
 é o músculo que de longe consome a maior parte do O2 do nosso
organismo, cerca de 40%;
 as coronárias mais ou menos o mesmo que o débito (10%) e o
fígado (15%) também;
 o cérebro praticamente o mesmo (10%);
 o rim, muito menos O2 (10%). Há um grande débito renal, mas há
um consumo relativamente escasso de O2 porque o consumo de
energia é relativamente escasso a nível do rim.
Vamos agora entrar propriamente nas leis gerais da circulação. Estas leis,
apesar de se referirem à circulação do nosso organismo, são no fundo leis
gerais da hidráulica. Muitas vezes temos de pensar no nosso coração e
vasos como um sistema hidráulico. As leis são no fundo 3 leis principais:
1. Lei da pressão
2. Lei da velocidade
3. Lei do débito.
1. Lei da Pressão
Esta lei diz-nos que a pressão que o sangue exerce na parede dos vasos,
depende do débito cardíaco.
Como sabem, o débito cardíaco é igual à frequência cardíaca vezes o
volume sistólico, isto é, o volume que é expulso em cada sístole pelo
ventrículo, e atenção quando falamos de circulação falamos de valores
apenas para uma das metades do coração, é evidente que as quantidades
de cada um dos lados são semelhantes, mas quando dizemos que o débito
cardíaco é de 5L/min, estamos a dizer que o coração esquerdo expulsa
5L/min e o coração direito expulsa também 5L/min.
A pressão depende ainda da resistência que se opõe à sua circulação.
Isto está ligeiramente incompleto, porque há mais um factor que pode
influenciar a pressão que é a viscosidade, é evidente que se nós deitarmos
água num tubo gera-se uma pressão dentro do tubo, se em vez de água
utilizarmos azeite com o mesmo débito, vai acontecer que a pressão
dentro do tubo é superior.
Porque é que nós quando falamos em fisiologia poucas vezes nos
referimos à viscosidade? Porque esta, em termos gerais, é muito
constante em todos nós. Algumas doenças, nomeadamente os
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plasmócitomas (tumores/leucemias de plasmócitos), que produzem
grandes quantidades de imunoglobulinas (o que mais contribui para a
viscosidade sanguínea são as proteínas plasmáticas), nestas situações
patológicas pode haver aumento significativo da viscosidade. Mas
estamos a falar de situações extremamente raras.
Portanto em termos globais quando pensamos em pressão arterial,
pensamos em frequência cardíaca, volume sistólico, e em resistência
periférica. Por isso, não esquecer que a pressão arterial é igual a todos
estes factores, e isto é muito importante quando falamos em
fisiopatologia. A hipertensão arterial é uma das situações clínicas mais
frequentes, qualquer medicamento usado para baixar a pressão arterial,
tem que actuar ou na frequência cardíaca, ou no volume sistólico ou na
resistência periférica, ou em 2 destes factores ou mesmo nestes 3
factores.
Reparem o que acontece em termos de pressões ao longo do sistema
circulatório. O coração é uma bomba pulsátil, mas podia não ser. Há
bombas mecânicas, com uma roda a girar, em que o fluxo que elas geram
é um fluxo perfeitamente contínuo. Mas nós temos uma bomba que é
intermitente, que expulsa apenas de vez em quando o sangue, e portanto
à saída do coração temos um traçado de pressão que é pulsátil: temos
uma pressão máxima que é a sistólica e uma pressão mínima, a diastólica.
Em termos dos vasos capilares, que é onde na realidade se dão as trocas,
será que teria algum interesse o sangue chegar aos impulsos? Não, o que
interessa é que ele chegue de uma maneira contínua, e como verão na lei
da velocidade, de uma maneira lenta, para haver tempo para as trocas.
Como é que é possível transformar uma pressão pulsátil numa pressão
progressivamente contínua? Há 2 razões principais:
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 uma tem a ver com a elasticidade dos grandes vasos arteriais, as
grandes artérias são muito ricas na sua camada média em fibras
elásticas (a elasticidade define-se como a propriedade que um
determinado objecto tem, quando submetido a uma força, de se
deformar e, quando essa força é interrompida, de voltar à sua
posição inicial, exactamente o contrário de plasticidade,
propriedade que um corpo tem de se deformar quando submetido a
uma força, e quando parar de se exercer a força, ficar com a forma
que adquiriu). Durante a sístole está a ser ejectado sangue, pelo
que as grandes artérias vão aumentar ligeiramente de calibre,
porque está entrar sangue. Quando se inicia a diástole, o sangue já
não está a ser expulso pelo que a artéria tem tendência a voltar a
sua posição inicial. Como temos válvulas, para impedir que o sangue
volte para trás (para o coração), o sangue mesmo durante a diástole
é empurrado para jusante, chama-se a isto o Efeito de Windkessel.
 para além disto, de também extrema importância, é a grande
resistência oferecida pelas pequeníssimas arteríolas e esfíncteres
pré-capilares (regulam muito o débito de determinadas regiões); se
tivermos uma resistência muito grande a tendência vai ser que o
fluxo a jusante dessa contracção seja um fluxo perfeitamente
contínuo.
Por estas duas razões, nós chegamos aos capilares com um débito
contínuo - a partir das arteríolas já não temos nenhuma pulsatilidade no
fluxo arterial.
Depois temos as vénulas e veias, em que a pressão é muito baixa, e temos
o mesmo a nível da pressão da circulação pulmonar.
Na circulação pulmonar as variações de pressão são semelhantes às da
circulação sistémica mas com valores de pressão menores (na circulação
sistémica varia entre 70 a 120mmHg, território de altas pressões, e na
pulmonar varia entre 20 a 30mmHg, portanto um território de baixas
pressões).
2. Lei da velocidade
Dando como exemplo o rafting, temos um rio e existe um rápido porque
nessa zona o rio estreita, então temos o mesmo débito para uma zona
menor, o que faz com que a água adquira uma velocidade superior. A
seguir ao rápido, alarga e a velocidade diminui. Então, a lei da velocidade
da circulação é basicamente assim. No território arterial, a subdivisão dos
vasos é tal que a soma das secções dos ramos é sempre superior à do
tronco em que se originam, ou seja, o calibre da aorta é X, quando a aorta
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se começa a subdividir, se eu fizesse um corte em todas as zonas
correspondentes a uma determinada região, a soma das secções era
maior. E se fosse às arteríolas, então, a área de secções seria superior, e
nos capilares ainda maior. Embora, progressivamente, os calibres vão
diminuindo, a soma, na mesma zona é muito maior. Então, a velocidade
vai diminuindo progressivamente para a periferia: quanto maior é a soma
das secções, menor será a velocidade do líquido a passar, isto quer dizer
que no fundo é nos capilares que temos a velocidade mínima (e é o que
nos interessa pois é aí que se vão dar as trocas, e quanto menor a
velocidade, mais eficientes serão as trocas entre o sangue e as células).
Assim, a soma máxima das secções é a nível dos capilares.
Por outro lado, no território venoso, passa-se exactamente o oposto: a
junção dos vasos é tal, que a soma das secções dos ramos é sempre
superior à do tronco a que dão origem, isto é, os ramos que estão para
montante (isto é sempre em relação ao coração), há-de ser sempre
superior à veia maior a que vão dar origem, logo a velocidade vai
aumentando dos capilares para o coração.
No fundo, esta lei é muito simples e comum a toda a hidráulica, a
velocidade de um determinado caudal é inversamente proporcional à
soma das secções ou secção.
Há ainda um pormenor: como a secção das veias na sua desembocadura
nas aurículas é maior que a secção das artérias que saem dos ventrículos,
a velocidade a este nível é maior nas artérias que nas veias.
3. Lei do Débito
Para qualquer secção transversal completa do sistema circulatório,
passam iguais quantidades de sangue em intervalos de tempo iguais. Pois,
se assim não fosse, haveria um desequilíbrio, e seria expulsa uma
quantidade de sangue e depois chegava outra uma quantidade distinta à
outra circulação. E, portanto, se pela raiz da aorta passam 5L de sangue
por minuto (que é mais ou menos o valor de um adulto normal em
repouso; quando faz exercício, esse valor pode chegar a 22L/min; e um
maratonista pode atingir os 26L/min), igual quantidade estará a passar
nesse período de tempo no:
- tronco da pulmonar
- conjunto dos capilares aórticos
- conjunto dos capilares pulmonares
- e em qualquer secção horizontal que se traçasse passaria sempre o
mesmo débito.
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PROPRIEDADES GERAIS DO CORAÇÃO
Cada uma delas será analisada em pormenor relativamente aos temas a
que dizem respeito.
E, as principais propriedades do coração são:
- Automatismo ou cronotropismo (“cronos” significa tempo)
- Condutibilidade ou dromotropismo (“dromos” significa correr)
- Excitabilidade ou batmotropismo (“bathmos” significa limiar)
- Contractilidade ou inotropismo (“inos” significa fibra)
- Tónus e Lusitropia
- AUTOMATISMO
É a capacidade que uma
célula tem de, mesmo sem
ser submetida a um
estímulo, ela por si
desencadear um potencial
de acção e portanto alguma
resposta.
Existem várias células, no
nosso
organismo
com
automatismo, desde as do
sistema cardionector do coração até várias células a nível do tubo gastrointestinal (movimentos peristálticos estão muitas vezes associados a
disparos de células com automatismo).
O automatismo deve-se ao facto de as células que o produzem terem,
mesmo em repouso, alguma abertura aos canais de sódio, e quando esse
sódio permite que o interior da célula atinja um determinado limiar, por
exemplo passar de -60mV para -50mV, dispara um potencial de acção
(este obedece à lei do tudo ou nada).
No coração, as células que vão provocar a sístole estão localizadas no
nódulo sinusal ou sino-auricular, isto não quer dizer que em situações
patológicas não haja outras células que, por vezes, possam comandar o
coração (por exemplo, num bloqueio aurículo-ventricular completo, não
há passagem de sinal das aurículas para os ventrículos). É importante reter
a ideia de que o coração em termos eléctricos tem um isolamento entre as
aurículas e os ventrículos, não tendo entre as 2 aurículas e entre os 2
ventrículos - nestas situações o impulso transmite-se através do músculo -,
assim, se não passa sinal das aurículas para os ventrículos, cada um “bate”
para seu lado. Os ventrículos “batem” pois algumas células, habitualmente
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do sistema cardionector ventricular (feixe de His, na rede de Purkinje…)
estão a desencadear esse sinal.
Em suma, as células que vão comandar tudo são as que disparam mais
rapidamente, ou com frequência mais rápida, porque depois disparam
todas as outras, seguindo-se o período refractário, etc.
Em esquema, é a nível do nódulo sinusal que estão as células com
automatismo, isto é, com uma frequência maior, depois existem as
chamadas vias intermodais ou preferenciais (que são um pouco
discutidas), depois o nódulo aurículo-ventricular onde há atraso da
passagem do sinal eléctrico que por fim é transmitido aos ventrículos para
que se contraiam.
- CONDUTIBILIDADE
É a propriedade de um
estímulo fisiológico gerado
num coração, no nódulo
sinusal, se transmitir a todas
as células cardíacas.
O termo condutibilidade usase para qualquer tecido,
enquanto o dromotropismo,
habitualmente, se usa para o
coração.
Desta propriedade depende a
velocidade a que são transmitidos os estímulos na musculatura cardíaca.
Existem muitos problemas de desritmias cardíacas que são devidas a
problemas da condutibilidade (não é correcto referir “arritmia” pois este
termo tem a ver com ausência de ritmo, e o que ocorre na realidade é
uma desritmia , que implica um problema no ritmo cardíaco).
Frequência cardíaca tem a ver com o número de sístoles por minuto.
Ritmo cardíaco tem a ver com a periodicidade com que cada sístole é
efectuada.
Em suma, a frequência pode ser rítmica ou arrítmica.
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- EXCITABILIDADE
É a propriedade das células responderem a estímulos. As principais células
com esta capacidade são as nervosas, as musculares e também algumas
endócrinas.
Explicação do gráfico: numa célula cardíaca, existe:
 o potencial de repouso (fase 4);
 o potencial de acção (fase 0, em que ocorre abertura dos canais
rápidos de sódio);
 uma fase em que há pequeno decrescimento do potencial (fase 1);
 a fase de “plateau” (fase 2, que tem a ver com a abertura dos canais de
cálcio a nível do coração).
Porque é tão importante esta fase de “plateau” na célula cardíaca?
Porque, nesta, interessa-nos que o período refractário seja
relativamente longo, senão haveria o risco de termos contracções
muito próximas, e isso faria com que os ventrículos não tivessem
tempo para se encher e a eficácia da contracção seria praticamente
zero, assim, o sangue não chegaria a todas as partes do nosso
organismo, levando à morte.
No fundo, a fibrilhação ventricular causa imediatamente a morte, pois
as fibras estão a “bater” de uma maneira completamente
desorganizada, fazendo com que não haja qualquer aumento da
pressão a nível do ventrículo. Aqui não seria o caso, mas não haveria
tempo para encher e portanto não seria expulso sangue. Portanto, um
período refractário bastante longo das células musculares cardíacas faz
com que seja muito difícil uma contracção muito rápida. Mesmo assim,
em
taquicárdias,
nomeadamente
taquicárdias
paroxísticas
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ventriculares nós chegamos a 200 e tal contracções/minuto, só que é
uma situação de emergência médica, porque se o indivíduo tem esta
frequência cardíaca, está a expulsar muito pouco sangue em cada
sístole, e portanto não chega sangue suficiente aos tecidos, tendo a
situação de ser corrigida.
Para relembrar:
 período refractário absoluto deve-se a uma
larga porção dos canais de sódio estar
inactivada por voltagem (canais inactivados
electricamente, que portanto não podem
abrir);
 período refractário relativo (representado
no gráfico): por um lado, no início, ainda há
alguns canais de sódio que estão
inactivados e precisam de um estímulo superior ao estímulo normal
para desencadear o potencial de acção; por outro lado, temos uma fase
de hiperpolarização, que exige que a condutância ao potássio esteja
aumentada, enquanto que a condutância ao sódio já está normal,
portanto a célula fica um pouco mais negativa do que no seu potencial
de repouso normal, sendo preciso um estímulo ligeiramente superior
para a célula disparar.
No fundo, o que é importante é que no período refractário absoluto, por
maior que seja o estímulo, não há resposta celular, enquanto que no
período refractário relativo, desde que o estímulo seja superior, conseguese desencadear uma resposta.
- CONTRACTILIDADE
Existe uma lei muito
importante, a Lei de
Frank-Starling, que
afirma que dentro de
determinados
limites, quanto maior
for o comprimento
inicial
da
fibra
miocárdica, maior é a
sua
força
de
contracção.
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Se pensarmos no ventrículo, pois é este o responsável pela expulsão do
sangue, o comprimento das células imediatamente antes da sístole tem a
ver com o volume de sangue que existe no fim da diástole – volume
telediastólico – (“tele” = fim). Quanto maior for o volume telediastólico,
maior é o comprimento das fibras no início da sístole e, portanto, a força
com que se contraem é maior (ver gráfico). Sabemos que a união entre as
pontes de actina e miosina no sarcómero (da célula muscular ventricular
cardíaca), ronda os 2,2µm, e quando é um bocadinho inferior nem todas
as pontes estão a fazer junção, pelo que a força é um pouco menor. Se
ultrapassar um dado limite, as células também vão contrair com menos
vigor (é o que acontece em doentes com insuficiência cardíaca congestiva
dilatada – o coração tem dificuldade em expulsar o sangue, o sangue
tende a acumular-se no coração, o ventrículo tende a dilatar-se e vai
começar a acontecer o que está representado pelo 3º exemplo).
No fundo, esta lei pode ser resumida num esquema simples: em que se
relaciona o comprimento inicial da fibra ou volume telediastólico com a
força ou pressão intraventricular, respectivamente (consoante o aumento
do volume telediastólico, a pressão intraventricular desenvolvida será
superior até um determinado limite, a partir do qual o indivíduo entra em
falência, a força desenvolvida já é menor).
Em suma, o aumento do comprimento da fibra miocárdica no final da
diástole provoca uma contracção ventricular mais forte. Esta lei só se
aplica na porção ascendente da curva de Frank-Starling (até aos 2,2 µm).
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- TÓNUS E LUSITROPIA
Tónus é a capacidade de um maior ou menor aumento de tensão com o
aumento do volume. O coração com insuficiência cardíaca desenvolve
menor tensão para um volume telediastólico equivalente.
Todos os nossos músculos têm um determinado tónus, isto é, têm uma
determinada tensão de base. Um autor importante, Katz, investigou muito
esta vertente das propriedades cardíacas; hoje tem-se a ideia de que
existem muitos problemas relacionados com a diástole e não só com a
sístole, na realidade, se um ventrículo se dilatar de maneira incorrecta
durante a diástole, a sua capacidade de receber sangue vai diminuir
também, o que faz com que o volume sistólico seguinte seja menor, e
portanto o rendimento cardíaco também será menor. É por isso que
surgiu a propriedade denominada Lusitropia (Katz), que se refere ao
lusitropismo, que é a capacidade que os ventrículos têm de se relaxar
durante a diástole, tendo-se verificado por estudos com O2, que o
relaxamento activo no início da diástole consome O2 (o relaxamento não é
completamente passivo, pois no início da diástole há consumo de O2, isto
é, actividade para relaxar as fibras).
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