Biotecnologia de plantas medicinais: produção de biomoléculas

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Biotecnologia de plantas PALESTRA
medicinais: produção de biomoléculas.
BIOTECNOLOGIA DE PLANTAS MEDICINAIS: PRODUÇÃO DE BIOMOLÉCULAS
Miriam V. Lourenço
Universidade de Ribeirão Preto
Unidade de Biotecnologia Vegetal
E-mail: [email protected]
A maioria dos compostos presentes nas plantas
fazem parte do metabolismo primário. Esses compostos são polissacarídeos, açúcares, proteínas e graxas,
substâncias essenciais à sobrevivência e desenvolvimento das plantas (VERPOORTE & MEMELINK , 2002).
Além desses metabólitos as plantas produzem uma
grande variedade de metabólitos secundários. Esses
compostos, não necessariamente essenciais ao organismo produtor, têm um papel importante na sobrevivência da planta em seu ecossistema. (SANTOS, 2000).
Os metabólitos secundários estão assim envolvidos
na resistência contra pragas e doenças, na atração de
polinizadores, na interação com microganismos
simbióticos entre outros (VERPOORTE et al, 2000).
Embora os metabólitos secundários encontrem-se
presentes em concentrações bem menores nas plantas a maioria deles tais como alcalóides, terpenóides,
antocianinas, esteróides, flavonóides, quinonas e
ligninas têm encontrado aplicações comerciais como
fármacos, corantes, aromas, inseticidas etc. Esses
compostos apresentam uma ampla diversidade em
estruturas e tamanhos sendo encontrados e distribuídos por todo o reino vegetal (C OLLIN , 2001;
VERPOORTE et al, 2002).
Como esses compostos são utilizados em grandes
quantidades a produção pelas plantas nem sempre é
satisfatória. Os compostos freqüentemente estão restritos a uma espécie ou gênero e muitas vezes podem
ser ativados somente durante uma determinada fase
do crescimento ou um estádio do desenvolvimento
vegetal, ou ainda em estações específicas do ano, sob
condições de estresse ou de disponibilidade de nutrientes. Por essas razões nos últimos anos esforços têm
sido feitos dentro da cultura de células vegetais para
que essa se torne um método viável de produção de
metabólitos secundários de interesse comercial
(VERPOORTE & MEMELINK , 2002).
A cultura de células vegetais consiste na indução e
proliferação de células à partir de um fragmento da
planta em presença de substâncias nutrientes e reguladoras do crescimento vegetal. A cultura de células e
tecidos pode produzir compostos idênticos ou similares
àqueles presentes na planta, ou ainda os compostos de
interesse poderão estar ausentes (BOTA et al, 2001).
Em alguns casos tem se conseguido a produção
de biomoléculas via cultura de células em escala industrial, como é o caso da chiconina, berberina e taxol,
ou ainda, para biomassa como no caso de raízes de
ginseng. Entretanto, para muitos dos fármacos de
interesse a produção é muito baixa ou quase zero em
cultura de células vegetais. Isso geralmente é devido
ao fato de que a produção seja controlada de uma
maneira específica no tecido, desta forma a
desdiferenciação resultaria na perda da capacidade
de produção, por isso muitos estudos estão sendo
feitos na tentativa de otimizar os meios de crescimento
e produção ou ainda selecionando-se linhagens celulares mais produtoras. Além destas outras abordagens como o crescimento de células diferenciadas (cultura de raízes e brotos) e a indução de rotas
biossintéticas utilizando-se estimuladores são estratégias que têm mostrado excelentes resultados dentro
da cultura de tecidos vegetais.
A produtividade da cultura é um fator crítico para
a aplicação prática da cultura de células vegetais na
produção de metabólitos bioativos específicos de plantas,
por isso a necessidade de alternativas para intensificar
a produção.
Estimuladores são compostos ou tratamentos que
induzem as plantas a sintetizarem fitoalexinas em
níveis elevados, assim como ativar a síntese de novo
(EILERT & CONSTABEL, 1986; FUNK et al., 1987; TANI et al.,
1992). O efeito dos estimuladores depende de muitos
fatores, tais como a concentração do estimulador, o
estágio de crescimento da cultura no momento da
estimulação, o período de contato da cultura com o
estimulador e o tempo de estimulação.
Os estimuladores podem ser divididos em duas
classes: os de origem não biológica tais como metais
pesados e luz ultravioleta, sendo denominados agentes
abióticos, e os estimuladores de origem biológica, como
material de parede de fungos e células vegetais ou
enzimas microbianas conhecidos como agentes
bióticos (BHAGWATH &. HJORTSO, 2000).
O mecanismo de ação entre os estimuladores
biótico e abióticos são diferentes e complexos, existindo
muitas hipóteses com relação à forma de ação de cada
tipo, assim o efeito de um elicitor sobre as células ou
tecidos vegetais ainda não são totalmente conhecidos
(EILERT, 1987).
O limitado suprimento de paclitaxel (Taxol ) uma
importante droga anticancer que é extraída de plantas do gênero Taxus proporciona um intenso esforço
na busca de novas fontes e meios alternativos de produção dessa molécula. Taxanos produzidos por células de Taxus spp. podem ser usados como material
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de partida para semi síntese desses compostos (DONG
& Z HONG, 2001 ). O acúmulo desses taxanos em plantas
de Taxus é aumentado como resposta a estímulos
externos específicos. Os jasmonatos tem um importante papel no processo de tradução de sinais que
regulam os genes de defesa nas plantas. Por isso
estão sendo utilizados como agentes estimuladores
de metabólitos secundários em cultura de células
vegetais. Assim o perfil de concentrações transientes
de vários metabólitos secundários mudaram drasticamente em resposta à estimulação (GUNDLACH, et
al,1991; DITTRICH, et al, 1992).
O acúmulo de um taxano (taxuyunnanine C) em
suspensões celulares de Taxus chinensis foi aumentado
após estimulação com metil jasmonato (MJ) ou
dihidrometil jasmonato (HMJ) principalmente quando
associado à sacarose (DONG & Z HONG , 2001).
Alguns jasmonatos (metil jasmonato e ácido
jasmônico) tem mostrado efeito positivo também no
aumento da produção de antocianinas em cultura de
células. O acúmulo de antocianinas em suspensões
celulares de Vittis vinífera foi aumentodo cerca de 8,3
vezes quando as culturas foram estimuladas pela
adição de ácido jasmônico e irradiadas com luz contínua (ZHANG et al, 2002). Desta forma a iluminação
também mostra-se como um importante agente
controlador da biossintese de antocianinas, tendo
exibido significante influência no acúmulo dessas
moléculas por cultura de células de morango (Sato et
al, 1996), Perilla frutescens (ZHONG et al, 1993), Daucus
carota (TAKEDA, 1990) e Centaurea cyanus (KAKEGAWA et
al,1987).
A utilização de estimuladores biológicos também
apresentaram resultados promissores. Assim o fungo
Alternaria alternata intensificou a produção da enzima
fenilalanina amônialiase (PAL) levando a um maior
acúmulo de fenilpropanóides, quando utilizados na
estimulação de plantas de Citrus (CASTAÑEDA & P ÉREZ,
1996).
A eliciação de plântulas de Murraya paniculata com
o fungo endofítico Aspergillus flavus mostrou que a
planta intensifica seu metabolismo secundário no
sentido de acumular cumarinas já existentes principalmente após 24 horas após a estimulação (PEREIRA
et al, 2002).
Um novo caminho para se aumentar a produtividade de metabólitos secundários vegetais é pela transformação genética usando o sistema de vetor natural
mediado pelo Agrobacterium rhizogenes ou A.
tumefaciens. O A. rhizogenes é causador do fenótipo
hairy roots (raízes em cabeleira) em plantas. Essas
raízes oferecem um sistema promissor para a produção
de metabólitos secundários, uma vez que elas possuem
crescimento rápido assim como estabilidades genética
e biossintética Assim essas raízes podem ser usadas
como uma fonte contínua para a produção de
metabólitos secundários valiosos (GIRI & NARASU,
2000).
Alguns genes, tais como triptofano descarboxilase,
estrictosidina sintase, tropinona redutase,
berbamunina sintase já foram isoladas e estão sendo
usados para a engenharia de rotas metabólicas.
WONGSAMUTH & DORAN (1997) reportaram a produção
de anticorpos monoclonais (IgG) por hairy roots obtidas de plantas de tabaco transgênico expressando o
anticorpo.
Assim vemos que a biotecnologia vegetal constitui uma ferramenta importante na produção de
biomoléculas de interesse farmacológico e industrial,
mostrando-se importante ainda na descoberta e
manipulação de enzimas chaves em rotas metabólicas
o que proporcionará um controle e intensificação na
produção de moléculas bioativas.
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