Baixar este arquivo PDF

Propaganda
1
A AÇÃO DOCENTE NO ENFRENTAMENTO DAS DIFICULDADES DE
APRENDIZAGEM DA ORALIDADE DE CRIANÇAS COM QUATRO
ANOS.
Mariane Medina Moreira1
Oziel de Souza2
Resumo
Este artigo relata um estudo bibliográfico em que se procurou identificar as principais
dificuldades encontradas pelas crianças na aprendizagem da oralidade, destacando
o papel que o professor pode desempenhar no enfrentamento dessa situação. Para
fundamentar teoricamente a pesquisa procurou-se ancorar nas contribuições de
diversos pesquisadores que já dedicaram ao estudo dessa temática, entre eles,
Vygotsky (1989), PCN (1997), RCNEI (1998), Sim-Sim (1998), Castro e Gomes
(2000). Ao fim da investigação observaram-se de maneira geral, recursos que
podem ser explorados tanto pela família, quanto pela comunidade escolar, para
facilitar e desenvolver a comunicação e a linguagem, promovendo a motivação e a
igualdade de oportunidades à criança de quatro anos, com dificuldade oral,
considerando as suas necessidades e especificidades no desenvolvimento da
linguagem.
Palavras-chave: linguagem oral; dificuldades da oralidade de crianças com quatro
anos; ação docente.
Abstract
This article reports a bibliographical study which sought to identify the main
difficulties encountered by children in orality learning, highlighting the role that
teachers can play in addressing this situation. Substantiating theoretically the
research sought to anchor the contributions of several researchers who have
devoted themselves to the study of this subject, among them, Vygotsky (1989), PCN
(1997), RCNEI (1998), Sim-Sim (1998), Castro and Gomes (2000). At the end of the
investigation, in general, resources were observed and they can be exploited both by
the family, the school community, to facilitate and develop communication and
language, promoting motivation and equal opportunities for 4 year old children, with
oral difficulty, considering their needs and specific language development.
Key-Words: oral language; oral difficulties in 4 year old children; teaching action.
1
Graduanda do Sexto Período do Curso de Pedagogia do Centro Universitário Metodista Izabela
Hendrix. E-mail: [email protected].
2
Mestre em Educação na Linha de Educação Matemática pela Universidade Federal de Minas
Gerais. E-mail: [email protected]
2
1 INTRODUÇÃO
A pesquisa que propus realizar tem por objetivo entender como o professor
pode contribuir no enfrentamento das dificuldades de aprendizagem da oralidade de
crianças com quatro anos. Durante a realização do estágio obrigatório, como um dos
requisitos para a conclusão da graduação no curso de Pedagogia, pude encontrar
crianças em idade pré-escolar com dificuldades relacionadas à linguagem oral.
Segundo Scott (2002), grande parte das perturbações na fala surgem em idade préescolar, tornando-se preocupações constantes que permeiam a prática docente na
Educação Infantil.
Este artigo busca compreender como ocorre o desenvolvimento da fala das
crianças, e as dificuldades em adquirir capacidades linguísticas adequadas para a
idade de quatro anos. Na maioria das vezes, por volta dos quatro anos de idade, as
crianças conseguem produzir e utilizar todos os sons, porém, as práticas em campo
de estágio me possibilitaram observar que é muito frequente encontrar crianças que
não dominam os sons de maneira natural, nem dentro da faixa etária.
O auxílio prestado à criança é essencial para o desenvolvimento da
consciência fonológica. Facilitando a interação e as relações sociais, que são muito
importantes para o processo de aprendizagem. Dessa forma, este estudo trata-se de
uma pesquisa bibliográfica, a respeito das dificuldades no desenvolvimento da fala e
da linguagem apresentadas na Educação Infantil, levando em conta a intervenção
do educador como mediador no processo de aprendizagem das crianças.
O interesse deste trabalho é colocar em destaque as dificuldades encontradas
na aprendizagem da oralidade, e a ação docente no apoio para a superação de
obstáculos encontrados pela criança neste processo de desenvolvimento da fala.
Esta pesquisa foi estruturada a partir do diálogo com Vygotsky (1989), PCN (1997),
RCNEI (1998), Sim-Sim (1998), Castro e Gomes (2000).
A
primeira
sessão
deste
trabalho
fala
sobre
oralidade:
algumas
compreensões teóricas. Em seguida será abordada a aprendizagem da oralidade
por crianças de quatro anos: algumas dificuldades encontradas neste processo. E
para finalizar apresentar-se-ão as ações que ajudam a criança enfrentar as
dificuldades de aprendizagem da oralidade: o papel do docente. Sendo assim, o
3
docente pode desempenhar um papel muito importante ao longo do processo de
construção do conhecimento, ao utilizar as ferramentas corretas.
2 ORALIDADE: ALGUMAS COMPREENSÕES TEÓRICAS
Desde os primórdios, a comunicação tem se mostrado essencial para o ser
humano. Assim, o homem foi construindo e apropriando-se de diversas formas de
linguagem, na busca por se comunicar e interagir com o ambiente e suprir suas
necessidades básicas. Para Morin (2000, p.56), é na linguagem que o discurso
“ganha seu sentido com relação à palavra, mas a palavra só fixa seu sentido com
relação ao discurso no qual ela se encontra encadeada”.
As linguagens podem ser classificadas em linguagem verbal e não verbal. É
considerada linguagem verbal aquela que se torna explícita por meio das palavras.
Enquanto a não verbal é a que se apresenta por meio de sinais ou signos que
prescindem do verbo. De acordo com Birck e Keske (2008), no processo de
comunicação verbal, o indivíduo, de modo em geral, está consciente de sua fala,
porém na comunicação não verbal, por ser silenciosa e transparente, ela é usada de
forma involuntária na maioria das vezes, sendo em alguns casos utilizada de forma
consciente e estratégica.
Destacar a existência da linguagem verbal e não verbal torna-se uma etapa
importante desse estudo no sentido de revelar que a temática não se trata de algo
trivial permitindo ao pesquisador adentrar por diversos caminhos. No entanto,
embora estejamos conscientes desse amplo espectro de possibilidades, procuramos
focar o olhar nesta pesquisa para as características da linguagem que se
manifestam por meio da oralidade.
A fala é algo estritamente pessoal, pois cada indivíduo tem sua própria
maneira de se expressar em meio a um grupo social. Aproveitando de seus
conhecimentos linguísticos, o sujeito torna-se apto a manifestar seu pensamento de
acordo com sua visão de mundo adquirida ao longo de sua experiência. Segundo
Oliveira
(1999,
p.42),
“é
a necessidade de
comunicação
que
impulsiona,
inicialmente, o desenvolvimento da linguagem”.
Segundo Pretti (1974), a fala é o principal recurso utilizado pelo homem em
sua vida social. Ter domínio da linguagem oral é saber se comunicar com exatidão,
4
com clareza. É ter a capacidade de persuasão e capacidade para distinguir o certo
do errado. Quem fala bem, pode refletir um pensamento organizado. Portanto, é
através da fala que as pessoas se apresentam de maneira racional para o mundo.
Na sociedade, não se lê e se escreve apenas, mas principalmente se fala. A
valorização social de uma pessoa, atualmente, está intimamente ligada ao seu
desempenho escrito, mas também ao oral, pela razão da ampla exposição aos
meios de comunicação. Conforme nos aponta Belintane,
A relevância e a produtividade pragmática da língua oral no mundo
contemporâneo pode ser facilmente percebida nas mídias, nas demandas
postas por uma vasta gama de profissões, no uso político da fala e até
mesmo nos jogos, brincadeiras e interações cotidianas (piadas, jogos de
palavras, chistes), nas quais os desejos de jovens e de adultos tecem e
entretecem suas subjetividades e, por meio delas, fortalecem ou
enfraquecem suas possibilidades de participação social. Sua importância é
tão evidente que não constitui um desafio enumerar ou mesmo classificar a
infinidade de gêneros dos quais o trabalho, as diversões e as artes
contemporâneas lançam mão (BELINTANE, 2000, p.55).
A linguagem é um sistema de comunicação específico e exclusivo da raça
humana, que está ligada ao pensamento. Vygotsky (1989) explica a relação entre o
pensamento e a fala a partir da passagem da fala exterior para a fala interior. Para
ele, o desenvolvimento acontece num movimento do social para o individual, isto é,
das experiências externas que são interiorizadas. A fala a princípio permite a
interação social, quando dita em voz alta.
A partir dessa explicação, Vygotsky (1989, p. 44) afirma que “o
desenvolvimento do pensamento é determinado pela linguagem”, colocando a
grande importância do uso dos instrumentos lingüísticos para o pensamento, pois, o
crescimento intelectual da criança ocorre na medida em que se apropria da
linguagem.
Sendo o interesse deste trabalho colocar em destaque as dificuldades
encontradas na aprendizagem da oralidade, e o papel docente no apoio para a
superação de obstáculos encontrados pela criança neste processo, torna-se
importante destacar alguns estágios da fala. Segundo Vygotsky (1998) o
desenvolvimento da fala comporta quatro estágios:
1. Natural ou primitivo - este é o estágio característico da fala pré-intelectual.
2. Psicologia ingênua - esta é a fase da inteligência prática (relacionada à
manipulação de objetos). Neste período temos a capacidade de manipular
os termos: porque, quando, se, mas, etc. Porém, esse domínio é
5
operacional, não havendo ainda uma apropriação das funções lógicas
(causais, temporais, condicionais, etc.) ligadas a estes termos; 3.
Operações externas - esta fase corresponde à fase egocêntrica piagetiana;
4. Crescimento interior - nesta fase há um deslocamento para dentro da
fala, com o aparecimento, na sua etapa final, da fala interior. Esta tem uma
função completamente diferente da fala externa: a sua função é uma função
planificadora. Este é o ponto em que aparece o pensamento verbal
(VYGOTSKY, 1989, p. 43).
Por ser considerado um aspecto natural da linguagem, intrínseca ao homem,
a oralidade nem sempre é foco de ações mais intensas do docente em sua prática
diária na sala de aula. Na maioria das vezes tende-se valorizar a linguagem escrita
em detrimento da linguagem falada. É comum ouvirmos sempre alguém dizer que
temos que ensinar as crianças a ler e escrever, como se falar e ouvir pudesse ficar
em segundo plano, por não ter tanta importância.
No campo educacional, a oralidade pode contribuir de maneira significativa no
desenvolvimento da criança, tanto no desenvolvimento cognitivo quanto no
desenvolvimento social, cultural e pessoal. O que pode favorecer na socialização,
comunicação e construção de pensamentos do educando.
Slama (1979, p.5) afirma “A língua é um bem pessoal, na medida em que é
um bem coletivo”. Quando se têm o domínio da fala, o processo de interação pode
ficar mais fácil, proporcionando o saber ouvir, respeitar a fala do outro, organizar as
ideias e transmitir com clareza e segurança os seus pontos de vista. Portanto, é
tarefa do docente desenvolver ações eficazes no ensino da oralidade. No entanto, é
fundamental conhecer as dificuldades encontradas pelas crianças que estão
inseridas no período de desenvolvimento humano em que a linguagem oral é
aprendida, para permitir ao educando um desenvolvimento pleno dessa importante
forma de manifestação da linguagem.
3 A APRENDIZAGEM DA ORALIDADE POR CRIANÇAS DE QUATRO ANOS:
ALGUMAS DIFICULDADES ENCONTRADAS NESTE PROCESSO
A linguagem oral surge não só como uma necessidade de aprendizagem,
mas também como uma necessidade social, de comunicar, de informar e ser
informado, de interagir com as pessoas próximas e com a sociedade em geral. São
diversos os fatores que podem influenciar as dificuldades relacionadas com a
6
oralidade (como deficiência mental, deficiência motora, paralisia cerebral, atraso
global de desenvolvimento, síndromes e lesões cerebrais), mas serão referidas
neste trabalho apenas as dificuldades que se vinculam diretamente com a linguagem
oral, ou seja, com as perturbações de linguagem.
Muita gente acha graça quando ouve uma criança falando (“amaieio”,
“figulinha”, “bebelo”), na maioria das vezes, pronunciar as palavras de maneira
errônea, sem um “L” aqui ou um “R”, faz parte do desenvolvimento normal de
meninos e meninas. Mas, se trocas e omissões de sons permanecem depois dos
três anos, isso pode se tornar um problema no futuro ou até mesmo indicar uma
doença mais grave.
Aneja (1999) indica alguns sinais de alerta para desordens da linguagem na
criança, tais como:
Nenhuma palavra emitida até os 18 meses; não colocação de duas palavras
juntas aos 2 anos; ausência de desempenho imitativo e simbólico aos 2
anos; não formação de sentenças aos 3 anos; discurso incompreensível aos
3 anos” (ANEJA, 1999, p. 887-888).
Oller e Cols (1999) mostraram que o balbuciar produzido por volta dos 10
meses de idade, quando atrasado, pode prognosticar desordens da fala. Balkwin
(1968) mostra que, por volta dos três anos, a criança já deve se expressar
oralmente, entretanto, um leve retardo nesta idade não é incomum. Cuberos (1997)
afirma que a aquisição da linguagem oral é determinada pela interação entre fatores
biológicos, cognitivos, psicossociais e ambientais, resultado de um processo
interativo que envolve a manipulação, combinação e integração das formas
linguísticas e das regras que são impostas.
Para Allen e Rapin (1988), quando a criança não faz uso de estruturas
linguísticas, ela pode se comunicar de outras maneiras: gestos, vocalizações, ou
algumas poucas palavras isoladas. Por volta de 18 meses, as crianças que
apresentam um desenvolvimento da linguagem compatível com a sua idade, vão
substituindo
os
gestos,
as
vocalizações,
ou
mesmo
suas
características
comportamentais, por palavras propriamente ditas. A insistência da criança nestes
meios de comunicação merece investigação por parte de um especialista.
De acordo com Lima (2000), o período de 0 aos 3 anos é crucial para o
desenvolvimento linguístico. Nele se verificam todas as etapas do desenvolvimento
7
da linguagem que vão permitir à criança apropriar-se das competências necessárias
e, a partir dos três anos e meio, ser capaz de dominar a estrutura da língua alvo.
Para enfim, ser capaz de falar inteligivelmente sem grandes dificuldades. As trocas
de sons fazem parte do processo de aquisição da fala e são esperadas até por volta
dos quatro anos, quando a criança já está apta a produzir todos os sons.
O Quadro 1 a seguir apresenta o percurso normal de aquisição da linguagem
ao longo do tempo, nas suas vertentes receptiva, expressiva, articulatória e
pragmática.
Quadro 1: O percurso normal de aquisição da linguagem ao longo do tempo.
Idade
(anos/mes
es)
0a6
meses
Desenvolvimento
Fonológico
- Reage à voz humana;
- Reconhece a voz
materna;
- Reage quando chama
pelo nome;
- Reage de maneiras
diferentes a entoações de
carinho ou zanga;
- Início das vocalizações
(palreio, lalação).
2 a 3 anos
Desenvolvimento
Pragmático
- Toma a vez durante o
processo de vocalizações.
_____________
-Produz alguns sons
- Compreensão de frases
simples (instruções);
- Produz frases isoladas
(holofrases).
- Produz pequenos
pedidos, ordens,
perguntas.
- Faz negações e
exclamações.
- Produz muito sons;
- Utiliza variações
entoacionais.
- Cumpre ordens simples;
- Compreende uma
dezena de palavras;
- Produz um discurso
telegráfico (2/3 palavras
com frases).
- Usa palavras de
pequenas frases.
- Produz muito mais sons;
- Melhoria no controle do
volume, ritmo e
intensidade da voz.
- Reconhece todos os
- Compreende uma
centena de palavras;
- Grande expansão no
vocabulário;
- Produz frases;
- Usa frases para realizar
pedidos, atos, ordens etc.
12 meses
18 meses
Desenvolvimento
Semântico/ Sintático
8
4 a 5 anos
sons da língua.
- Utiliza pronomes e
flexões nominais e
verbais;
- Respeita as regras
básicas de concordância.
- Completo domínio
articulatório.
- Conhecimento passivo
de 25.000 palavras;
- Vocabulário ativo de
cerca de 2.500 palavras;
- Compreensão e
produção de frases
simples e complexas.
- Melhoria na eficácia das
interações
conversacionais.
Fonte: Sim-Sim, Silva e Nunes (2008, p.26).
Para Strick e Smith (2001), os atrasos da fala são definidos como problemas
que interferem no domínio de habilidades escolares básicas, e elas só podem ser
formalmente identificadas até que uma criança comece a ter problemas na escola.
As crianças com dificuldades de aprendizagem encontram muitas barreiras na
escola, por isso é muito importante que seja feito um o diagnóstico correto das
dificuldades de aprendizagem em relação a outros transtornos parecidos que
também dificulta o aprendizado do aluno. Souza (1996), afirma que as dificuldades
de aprendizagem aparecem quando a prática pedagógica diverge das necessidades
dos alunos. Por isso, Castro e Gomes (2000) alertam aos sinais:
Quando aos 18 meses a criança não compreende ordens simples; quando
com 2 anos completos a criança não diz nenhuma palavra; quando aos 3
anos não formula frases com três palavras;quando aos 4 anos produz frases
que não se submetem às regras gramaticais; quando aos 5 anos persistem
omissões ou alterações relativamente frequentes na articulação, em
particular nas consoantes sibilantes (s, z, x, y) e consoantes liquidas (l, m, n,
r) (CASTRO ; GOMES, 2000, p.60).
De acordo com Aimard (1998), crianças com atraso de linguagem, não
apresentam necessariamente o mesmo problema ou as mesmas dificuldades.
Algumas não irão precisar de atendimento terapêutico específico, e apenas com
orientações aos pais, poderão superar o atraso. Outras necessitarão de atendimento
terapêutico para superarem suas dificuldades e por outro lado, outras, mesmo com
atendimento, não conseguirão superar totalmente as dificuldades que poderão
persistir até a idade adulta. A observação de uma dificuldade de linguagem não
basta por si só para entender qual é o problema.
9
Após a identificação das dificuldades, a criança deverá ser indicada para
avaliação especializada, para depois se decidir se precisa ou não de um
acompanhamento adicional, por exemplo, de um terapeuta da fala ou um educador
especializado. Portanto, o papel do educador continua a ser o de estimular a
linguagem e as trocas linguísticas. Como afirmam Sim-Sim; Silva ; Nunes:
É através da interação comunicativa que as crianças adquirem a língua da
comunidade a que pertencem. As trocas conversacionais são, portanto,
determinantes no processo de desenvolvimento da linguagem. (…), a
interação com o adulto funciona como um “andaime” que lhe vai permitindo
caminhar no seu percurso de aprendiz de falante ( SIM-SIM, SILVA e
NUNES, 2008, p. 27).
Todas as crianças com história de distúrbios na linguagem e/ou fala devem
ser avaliadas, sabendo-se dos vários fatores que cercam essa criança. O
diagnóstico precoce permite o acompanhamento multidisciplinar e a instituição de
medidas terapêuticas eficazes. Desta maneira, médicos e profissionais da área da
saúde que lidam com crianças devem estar atentos para este tipo de distúrbio,
visando minimizar o impacto do problema no desenvolvimento global dessa criança.
Uma vez sendo feito o diagnóstico, a criança deve ser adequadamente
encaminhada, para introdução das condutas terapêuticas o mais rapidamente
possível.
4 AÇÕES QUE AJUDAM A CRIANÇA ENFRENTAR AS DIFICULDADES DE
APRENDIZAGEM DA ORALIDADE: O PAPEL DO DOCENTE
Ainda que a linguagem oral esteja presente no dia-a-dia das instituições de
Educação Infantil, nem sempre é tratada como algo a ser intencionalmente
trabalhado com as crianças. Embora, tenham sido produzidas orientações
curriculares oficiais para a educação escolar de crianças, como os Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCNs) e o Referencial Curricular nacional para a Educação
Infantil (RCNEI), que exigem o trabalho na sala de aula com a linguagem oral.
Ensinar língua oral deve significar para a escola possibilitar acesso a usos
da linguagem mais formalizados e convencionais, que exijam controle mais
consciente e voluntário da enunciação, tendo em vista a importância que o
10
domínio da palavra pública tem no exercício da cidadania (BRASIL, 1998,
p.67).
O PCN (1997) afirma que embora a linguagem oral seja um processo natural,
o professor deve atentar-se quanto a sua importância, para que seja desenvolvida
como objeto de trabalho propositado e metódico no processo de alfabetização. O
professor precisa primeiramente conhecer as habilidades e limitações de seus
alunos para poder traçar estratégias para ajudá-lo da melhor maneira possível. O
docente pode desempenhar um papel muito importante ao longo do processo de
construção do conhecimento, ao utilizar as ferramentas corretas. O RCNEI (1998)
propõe que a oralidade, a leitura e a escrita sejam trabalhadas de forma integrada e
complementar, potencializando-se os diferentes aspectos que cada uma dessas
linguagens solicita das crianças.
O docente deve desenvolver um trabalho tendo como objetivos: “encorajar o
uso da fala como forma de expressão; criar condições para a aprendizagem de
palavras novas; incentivar a compreensão e a produção de enunciados complexos”
(CASTRO ; GOMES, 2000, p.178-179). As técnicas mais usadas para desenvolver
estes objetivos são a modelação (o adulto serve de modelo linguístico para a
criança), a incitação (o adulto questiona diretamente a criança com perguntas que
contêm pistas para a resposta), a expansão (o adulto completa os enunciados
simples da criança) e a reformulação (o adulto repete o enunciado da criança,
alterando alguns elementos da estrutura produzida por esta) (CANTWELL ; BAKER,
1987, apud CASTRO ; GOMES, 2000).
Cabe ao educador infantil zelar pela expressão oral das narrativas infantis
desde muito cedo, aproveitando o momento privilegiado da roda de histórias. “...
ensinar a produzir textos orais significa organizar situações que possibilitem o
desenvolvimento de preparação prévia e monitoramento da fala” (BRASIL, 1997,
p.74). Por vezes, a roda de conversa é usada como meio de apresentação de
assuntos, de instrução do professor para uma atividade ou para as etapas de
trabalho de um projeto, mas a comunicação quase sempre fica centrada na fala do
adulto, restando à criança o lugar de ouvinte, tantas vezes respondendo em coro.
Para Castro e Gomes (2000), a detecção precoce de problemas linguísticos
permite
a
prevenção.
As
atividades
de
interação
comunicativa
e
de
desenvolvimento linguístico, especificamente as atividades de desenvolvimento da
11
consciência fonológica, são fundamentais para as crianças que apresentam
dificuldades ao nível da linguagem oral. Além de constituir uma oportunidade para
trabalhar questões linguísticas em situação natural e lúdica, estas atividades
permitem ao educador identificar problemas existentes a este nível.
Sim Sim (2008) defende que proporcionar ambientes linguisticamente
estimulantes e interagir verbalmente com cada criança da Educação Infantil, são os
dois caminhos que podem ajudar a combater as dificuldades que afetam o
desenvolvimento da linguagem. De acordo com a autora, a criança adquire os
modelos de linguagem do meio onde está inserida, sendo assim, o modelo da fala
do adulto é que dá forma aos progressos linguísticos da criança entre os três/quatro
anos. Por volta dos cinco/seis anos a criança atinge o nível e a qualidade de
produção fonológica de um adulto.
Tanto na escola como em casa o estímulo deve começar com a leitura de
histórias infantis dos pais para os filhos, a estimulação de jogos de rimas, que
ajudam na consciência fonológica, jogos com letras e desenhos, para a criança já ir
se familiarizando com a leitura de rótulos é uma estratégia que desenvolve a
memória visual como o processo de leitura e escrita. Mysak (1998) afirma que
desenvolverá a fala mais cedo a criança cujo ambiente propicie rica experiência
verbal com adultos e com outras crianças. O RCNEI apresenta alguns benefícios
que isso proporciona.
Nas inúmeras interações com a linguagem oral, as crianças vão tentando
descobrir as regularidades que a constitui, usando todos os recursos de que
dispõem: histórias que conhec em, vocabulário familiar, etc. Assim, acabam
criando formas verbais, expressões e palavras, na tentativa de apropriar-se
das convenções da linguagem (BRASIL, 1998, vol. III, p.126).
A atividade lúdica pode ser um reforço, assim como todas as estratégias
mencionadas acima para estimular o desenvolvimento da linguagem oral. Com a
finalidade de melhorar as aprendizagens e a comunicação, fazendo com que a
criança tenha uma melhor relação escolar e social. O educador deve sempre propor
novas atividades, pois nesta idade, as crianças se cansam muito rápido das coisas.
A música é um artifício que pode ser utilizado de muitas formas, através
desta, a criança pode comunicar-se pela linguagem oral, ou mesmo pensar em
expressar-se com outras formas de linguagem como: a dança, gestos, mímicas, etc.
12
Como citado pelo RCNEI (1998), atividades que despertam, estimulam e
desenvolvem o gosto pelas atividades musicais, como (ouvir música, brincar de
roda, aprender uma canção, confecção de brinquedos rítmicos, dentre outros) vão
muito além das esferas afetivas e cognitivas. Estas atividades auxiliam nas
experiências de vivências, percepção e reflexão, conduzindo para níveis cada vez
mais avançados.
O professor ou terapeuta que trabalha com crianças que apresentam
problemas de linguagem, devem conhecer os estágios de desenvolvimento normal
da linguagem, como forma de situar este aluno, e também avaliar para conseguir
apresentar soluções e sugestões de trabalho. Segundo Andrade (2008), avaliar a
linguagem da criança significa estudar, registrar e medir o processo de
desenvolvimento desta competência.
Existem vários fatores que contribuem para que os alunos da Educação
Infantil criem certo bloqueio em seu processo de aprendizagem, como: métodos de
ensino inadequados, falta de percepção por parte da escola, nível de maturidade da
criança, professores que não dominam determinados assuntos, superlotação das
classes, dificultando a atenção do professor para todos os alunos. Sim-Sim (1998)
menciona que se a escola empregar mais tempo e esforço na promoção de
desenvolvimento da linguagem, as aprendizagens serão favorecidas em todas as
áreas curriculares.
O papel de todos os que trabalham dentro de uma instituição educacional têm
importância no processo de formação da criança. Todos que atuam neste ambiente
são responsáveis em tornar este meio, ainda mais aconchegante e saudável para
uma convivência mútua. As crianças possuem uma linguagem própria para interagir
com o outro, o docente deve respeitar o tempo de aprendizagem de todas as
crianças. Embora por vezes, seja conveniente intervir em algum momento neste
processo. Nunca se deve ignorar o tempo em que cada criança leva para adquirir
esta interação.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A intenção deste trabalho foi mostrar que a linguagem representa um dos
aspectos mais importantes a ser desenvolvido por qualquer criança, para que se
13
possa relacionar com as demais pessoas e interagir-se no seu meio social. A
estimulação adequada e a detecção precoce de problemas linguísticos permite a
prevenção das dificuldades na fala encontradas pelas crianças. O docente pode
desempenhar um papel muito importante ao longo do processo de construção do
conhecimento, ao utilizar as ferramentas corretas.
A análise realizada ao longo desta pesquisa indicou a relevância do
conhecimento pelo professor alfabetizador, dos níveis de desenvolvimento da fala,
por tratar-se de um tema de grande valor para o futuro pedagogo, possibilitando uma
reflexão teórica a respeito da prática observada em sala de aula. Neste sentido, este
estudo ajudou-me a perceber o procedimento e ação dos educadores sensibilizados
para esta problemática, através de estratégias e recursos que facilitem e
desenvolvam a comunicação e a linguagem.
Ainda que eu tenha me esforçado para tratar o tema, reconheço que minha
pesquisa não conseguiu abordar completamente o assunto, entretanto, tenho ciência
do caminho que deve ser trilhado, a fim de conseguir realizar um ensino que
promova a motivação e a igualdade de oportunidades à criança com dificuldade oral,
considerando as suas carências e necessidades no desenvolvimento do
planejamento pedagógico para todo o grupo.
REFERÊNCIAS
AIMARD, Paule. O Surgimento da linguagem na criança. Tradução de Cláudia
Schiling. Porto Alegre: Artmed, 1998.
ALLEN, D.A.; RAPIN, I. Communication disorders of preschool children: the
physician’s responsibility. Journal of Developmental and Behavioral Pediatrics, v.
9, n.3, p. 164-170, 1988.
ANDRADE, F.. Perturbações da linguagem na criança: análise e caracterização.
Universidade de Aveiro. Comissão editorial. 2008.
ANEJA S. Evaluation of a child with communication disorder. Indian Pediatr
1999; 36: 891-900.
14
BAKWINN HS. Delayed speech - developmental mutism. Pediatr Clin North Am
1968; 15: 627-38.
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria da Educação
Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC/SEF, 1997.
BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação
Fundamental. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, 1998.
BELINTANE, Claudemir. Linguagem oral na escola em tempo de redes.
Educação e Pesquisa. São Paulo, v.26, n. 1, janeiro de 2000.
BIRCK, V. R.; KESKE, H. I.. A Voz do Corpo: A Comunicação Não-Verbal e as
Relações Interpessoais. Anais do XXXI Congresso Brasileiro de Ciências da
Comunicação.
Retrieved
August
20,
2008,
from
http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2008/resumos/R3-0900- 1.pdf.
CASTRO, S. L.; GOMES, I.. Dificuldades de Aprendizagem da Língua Materna.
Lisboa. Universidade Aberta. 2000.
CUBEROS, M.; Garrido, A.; Rivas, A.. Necessidades Educativas Especiais.
Dinalivro. 1997.
DAVIS, Flora. A Comunicação Não-Verbal. 7. ed. São Paulo: Summus, 1979.
198p.
KISHIMOTO, Tizuko Morchida. O brincar e a linguagem. In FARIA, Ana Lúcia
Goulart de; MELLO, Suely Amaral. O mundo da escrita no universo da pequena
infância. Campinas, SP: Autores Associados, 2005.
LEUNG AKC, KAO CP. Avaliação e gestão de criança com atraso na fala. Am
Fam Physician. 1999.
LIMA, R. (2000). A Linguagem Infantil – Da Normalidade à Patologia. Braga:
Edições APPACDM, Distrital de Braga.
MORIN, Edgar; LE MOIGNE, Jean Louis. A inteligência da complexidade. 2. ed.
São Paulo: Petrópolis, 2000.
15
MYSAK. ED. Patologias dos sistemas da fala. Identificação dos distúrbios da
fala, princípios de exame e tratamento. 2. ed. São Paulo: Atheneu, 1998.
OLIVEIRA, Marta Kohl. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um processo
sócio-histórico. 4 ed. São Paulo: Scipione, 1999.
OLLER DK, Eilers RE, Neal AR, Schwartz HK. Precursors to speech in infancy:
the prediction of speech and language disorders. J Commun Disord 1999; 32: 22345. 1999.
PRETTI, Dino. Sociolingüística: os níveis da fala. São Paulo: Nacional, 1974.
SCOTT, C. Triagem para fala e da linguagem transtornos: confiabilidade,
validade e precisão da língua geral. Vol. 37,2002.
SIM-SIM, I.. Desenvolvimento da Linguagem. Lisboa: Universidade Aberta. 1998.
SIM-SIM, I.. Comunicar para Crescer. In: Maturidade Linguística e Aprendizagem
da Leitura. Braga. Universidade do Minho. 1998.
SLAMA, Tatiana Cazacu. Psicolinguística aplicada ao ensino de línguas. São
Paulo: Pioneira, p.5, 1979.
STRICK, Corinne. ; SMITH. Dificuldades de Aprendizagem de a a z. Porto Alegre:
ARTMED, 2001.
SOUZA, S. J. Infância e linguagem: Bakhtin, Vygotsky e Benjamin. Campinas:
Papirus, 1996.
VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo, Martins Fontes, 1989.
WERTZNER, H.F. Estudo da aquisição do sistema fonológico: crianças de três a
sete anos. Revista de Atualização Cientifica, v.7, 1995.
Download