INTOXICAÇÕES MEDICAMENTOSAS REGISTRADAS

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INTOXICAÇÕES MEDICAMENTOSAS REGISTRADAS PELO CENTRO DE
INFORMAÇÕES TOXICOLÓGICAS DE GOIÁS
Naiana Kelly Silva Bitencourt1; Luciana de Melo Borges 1; Sueli Martins de Freitas Alves2;
Fabiane Hiratsuca Hiratsuka Veiga de Souza3.
1
Bolsista PBIC/UEG, graduandos do Curso de Farmácia, UnuCET Anápolis - UEG.
2
Orientadora, docente do Curso de Ciências Biológicas e Engenharia Agrícola, UnuCET
Anápolis - UEG.
3
Co-Orientadora, docente do Curso de Farmácia, UnuCET - Anápolis - UEG.
RESUMO
As intoxicações apresentam-se como grave problema de saúde pública em todo o mundo,
vitimando cerca de 500 mil pessoas a cada ano, de acordo com estimativas da Organização
Mundial da Saúde (OMS). Segundo estatísticas divulgadas anualmente pelo Sistema Nacional
de Informações Tóxico-Farmacológicas (SINITOX), os medicamentos se destacam como o
principal causador das intoxicações humanas registradas no Brasil. No estado de Goiás, os
estudos realizados acerca das intoxicações provocadas por medicamentos não caracterizam as
classes terapêuticas envolvidas nesses eventos, sendo de fundamental importância esta
caracterização para propor medidas de prevenção. O presente estudo teve como propósito
realizar uma análise descritiva dos casos de intoxicação medicamentosa registrados pelo
Centro de Informações Toxicológicas (CIT-GO), nos anos de 2004 e 2005, e identificar as
principais classes terapêuticas envolvidas. Verificou-se que a faixa etária mais acometida
pelas intoxicações foi de crianças com até cinco anos (31%). A circunstância determinante
das intoxicações foi a tentativa de suicídio (41%), seguida pelo acidente individual (35,3%).
Em relação às classes terapêuticas, os benzodiazepínicos foram os medicamentos que mais
promoveram intoxicações (14,8%), seguidos pelos anticonvulsivantes (9,6%), antidepressivos
(6,9%) e analgésicos (6,5%). Considerando-se a evolução do quadro clínico, 85% dos casos
evoluíram para a cura. Conclui-se que uma considerável parcela das intoxicações registradas
era passível de prevenção, visto que ocorreram de forma acidental e que há a necessidade de
orientação/aconselhamento para o uso racional de medicamentos, assim como medidas
eficazes na fiscalização, pois as principais classes terapêuticas envolvidas são compostas por
medicamentos cuja venda necessita de apresentação e/ou retenção da prescrição médica.
Palavras-chave: Intoxicação. Medicamentos. Centros de informações toxicológicas.
INTRODUÇÃO
A intoxicação caracteriza-se como uma manifestação clínica do efeito nocivo
produzido em um organismo vivo como resultado da interação de um agente tóxico com esse
organismo. A propriedade intrínseca que o agente tóxico apresenta em causar efeitos nocivos
ao organismo denomina-se toxicidade. Esta é dependente da dose ou concentração, das
propriedades físico-químicas da substância, da via, tempo e freqüência de exposição e da
suscetibilidade do organismo (Chasin & Pedrozo, 2004; Larini, 1997).
1
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 500 mil
pessoas morrem devido a intoxicações a cada ano, apesar do reconhecimento da inexistência
de estimativas válidas da incidência de intoxicações em nível mundial (WHO, 1997).
Segundo estatísticas divulgadas anualmente pelo Sistema Nacional de
Informações Tóxico-Farmacológicas (SINITOX), os medicamentos representam a principal
classe de agentes causadores de intoxicação humana no Brasil (Brasil, 2008).
Os registros das intoxicações, provocadas por diversos agentes tóxicos, ocorridas
no Estado de Goiás são notificados no Centro de Informações Toxicológicas (CIT-GO), que
corresponde a um dos 36 centros existentes no país. Estes são responsáveis pelo envio de
informações ao SINITOX e também desempenham as funções de prover informações sobre
intoxicações, auxiliar no manejo do paciente, desenvolver atividades de vigilância
toxicológica, pesquisa e treinamento para prevenção e tratamento da intoxicação (Azevedo,
2006; Werneck & Hasselmann, 2005).
Os dados enviados ao SINITOX pelos Centros de Assistência e Informações
Toxicológicas são compilados e divulgados sob a forma de tabelas, as quais apresentam os
casos de intoxicação relacionando os agentes tóxicos com as características do evento
ocorrido e do indivíduo intoxicado (Brasil, 2007). Entretanto, estas divulgações não
contemplam a caracterização minuciosa dos agentes tóxicos, o que impossibilita o
conhecimento das classes terapêuticas a que pertencem os medicamentos responsáveis pelos
registros de intoxicação.
Segundo Bortoletto & Bochner (1999), as classes terapêuticas que causam o maior
número de registros de intoxicações por medicamentos, em nosso país, são os
benzodiazepínicos, antigripais, antidepressivos e antiinflamatórios. No estado de Goiás, os
estudos realizados acerca das intoxicações provocadas por medicamentos não caracterizam as
classes terapêuticas envolvidas nesses eventos, sendo uma informação ainda não divulgada.
Tal conhecimento pode direcionar estratégias de controle e de implementação de assistência
adequada ao uso correto e discriminado de medicamentos, propondo melhorias para este
grave problema de saúde pública.
O presente estudo teve como objetivo descrever as intoxicações medicamentosas
ocorridas no Estado de Goiás em 2004 e 2005, e identificar as principais classes terapêuticas
envolvidas.
MATERIAL e MÉTODOS
2
Para elaboração deste trabalho, o levantamento de dados foi realizado durante
cinco visitas ao CIT-GO, realizadas nos meses de agosto e setembro de 2007. Os dados foram
obtidos por meio das fichas de notificação referentes à intoxicação por medicamentos nos
anos de 2004 e 2005 registradas pelo mesmo no Estado de Goiás.
Depois de analisar previamente das fichas, os dados foram transcritos para uma
planilha eletrônica em que as colunas representavam as características (variável) de cada
notificação e as linhas os dados para cada variável. Os dados foram analisados por meio de
estatística descritiva. Foram analisadas as seguintes variáveis: sexo, faixa etária e município; e
dados do evento toxicológico: agente tóxico, circunstância, via de exposição e evolução do
quadro clínico.
Os medicamentos foram classificados em relação à classe terapêutica segundo a
classificação utilizada e padronizada pelo Centro de Informações Toxicológicas do Rio
Grande do Sul (CIT-RS, 2006), o Dicionário de Especialidades Farmacêuticas (DEF, 2006), o
Bulário Eletrônico da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Brasil, 2005) e o P.R. VadeMécum® (P.R. VADE MÉCUM DE MEDICAMENTOS, 2006).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram analisados 1767 casos, dos quais 861 foram notificados no ano de 2004 e
906 no ano de 2005. As intoxicações medicamentosas ocorreram em 113 municípios goianos,
sendo que a maior incidência deu-se em Goiânia (917 casos; 51,84%), seguida por Anápolis
(198 casos; 11,2%) e Jataí (146 casos; 8,3%).
Nos registros, verificou-se a predominância do sexo feminino (64,7%),
corroborando estudos semelhantes (Bortoletto & Bochner, 1999; Gandolfi & Andrade, 2006;
Mendonça & Marinho, 2005).
Considerando a distribuição etária, a mais acometida foi de crianças menores de
cinco anos (31%). Resultados semelhantes foram encontrados em outros estudos (Bortoletto e
Bochner, 1999; Gandolfi & Andrade, 2006; Martins, Andrade & Paiva, 2006; Mena et al.,
2004).
Para Bochner (2005), as intoxicações por medicamentos em crianças são
ocasionadas por três fatores: inerentes a própria infância, relacionados à sociedade, e os
relacionados ao estado. O primeiro reflete a curiosidade natural das crianças, a falta de noção
de perigo e o paladar pouco desenvolvido. O segundo deve-se principalmente a
automedicação, ao armazenamento inadequado e a falta de orientação em relação ao uso e
3
riscos oferecidos. Ao fator relacionado ao Estado, pode-se citar o difícil acesso aos centros de
saúde e a criação de leis que possibilitem a fiscalização mais rigorosa.
As residências foram os principais locais de ocorrência das intoxicações (76,3%),
com predominância para a área urbana (87,0%). A exposição aguda-única foi a mais freqüente
(62,2%) e a principal via de exposição foi oral (89,6%).
A principal circunstância determinante das intoxicações medicamentosas
registradas, em relação ao total de casos, foi à tentativa de suicídio, seguida por acidente
individual, uso terapêutico, erro de administração e automedicação. Entretanto, em outros
estudos o acidente individual apresenta-se como a principal circunstância dos eventos
(Gandolfi & Andrade, 2006; Medonça & Marinho, 2005).
A faixa etária que mais tentou suicídio foi dos 15 aos 20 anos, seguida por 20 aos
30, e 10 aos 15 anos. Corroborando estudo realizado sobre tentativa de suicídio no estado de
Goiás (Rios et al., 2005).
Em relação à tentativa de suicídio, houve predominância do sexo feminino, sendo
superior a 80%. Resultado semelhante foi encontrado em levantamento realizado no Estado de
Goiás (Rios et al., 2005), no qual os autores justificam o fato como sendo intrínseco a cultura
brasileira, visto que a mulher tenta suicídio dez vezes mais que o homem.
Do total de casos analisados, foram registrados 2.036 medicamentos, incluindo-se
as repetições, distribuídos em 59 classes terapêuticas. Observou-se que 1.225 (69,3%) das
intoxicações foram decorrentes da utilização de apenas um medicamento, 217 (12,3%)
envolveram dois medicamentos e 86 (4,9%) estiveram associadas a três ou mais
medicamentos.
Os benzodiazepínicos foram responsáveis por 14,8% das intoxicações registradas,
seguidos pelos anticonvulsivantes (9,6%), antidepressivos (6,9%) e analgésicos (6,5%). A
análise das classes terapêuticas em relação às principais circunstâncias mostra a expressiva
presença dos benzodiazepínicos nas tentativas de suicídio, acidentes individuais e nos casos
de automedicação.
Considerando a evolução do quadro clínico, mais de 80,0% dos casos evoluíram
para a cura, enquanto 1,2% evoluíram para o óbito. A taxa de óbitos foi considerada elevada,
em comparação a resultados encontrados em estudo nacional, em que a taxa de letalidade não
atingiu 0,5% (Bortoletto & Bochner, 1999).
Em relação aos óbitos, a faixa etária mais envolvida foi de 30 a 39 anos. A
letalidade foi mais acentuada em idosos, principalmente entre 70 a 79 anos (13,6%).
4
Resultados semelhantes foram encontrados por Bortoletto & Bochner (1999) em estudo
nacional.
CONCLUSÕES
O presente estudo revelou que as crianças menores de cinco anos foram as mais
acometidas nas intoxicações por medicamentos, e se intoxicaram principalmente de forma
acidental.
A tentativa de suicídio foi a circunstância mais expressiva seguida por acidente
individual, uso terapêutico, erro de administração e automedicação. O sexo feminino foi o
predominante nos registros.
Verificou-se expressiva participação de classes de medicamentos cuja venda
necessita de apresentação e/ou retenção da prescrição médica, alertando para a necessidade de
medidas mais acentuadas que envolvam maior conscientização e fiscalização dos
profissionais envolvidos nos processos de prescrição e dispensação.
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