A inflação no Brasil tem uma longa história. Cronistas, economistas

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7/2/2005
A INFLAÇÃO NO BRASIL1
Eliana Cardoso
EESP-FGV
Os mistérios “do encilhamento aturdiram por alguns dias ou semanas;
mas desde que se descobriu que o dinheiro caía do céu, o mistério
perdeu a razão de ser. Quem, naquele tempo, pôs uma cesta, uma
gamela, uma barrica, uma vasilha qualquer, ao luar ou às estrelas, e
achou-se de manhã com cinco, dez, vinte mil contos, entendeu logo que
só por falsificação é que fazemos dinheiro cá embaixo”. (Machado de
Assis, A Semana, 16 de dezembro de 1894)
A inflação no Brasil tem uma longa história. Cronistas, economistas e historiadores
documentam uma primeira explosão inflacionária no final do século XIX. Sua origem foi
uma rápida expansão do crédito, controlada depois por um programa ortodoxo de
restrição monetária. No decorrer do século XX, a inflação brasileira ganhou notoriedade,
em particular durante a década de 1980. A instabilidade está associada ao desequilíbrio
crônico e estrutural do setor público. As três primeiras seções deste trabalho passam em
revista a experiência inflacionária no Brasil e seus modelos teóricos, que o apêndice
desenvolve. A seção quatro sumaria os planos de estabilização da década de 1980. As
seções cinco e seis discutem o Plano Real e os anos de estabilidade que se lhe seguiram.
A sétima seção apresenta algumas conclusões.
1
Agradeço a Ilan Goldfajn, Fábio Giambiagi, Lauro Faria e Gilmar Masiero pelos comentários e a José
Cunha pela assistência na pesquisa.
2
Pré-história
O Brasil chegou atrasado em 1900, com uma renda per capita que representava apenas
um décimo da renda per capita dos Estados Unidos (Maddison, 1995). A renda per
capita do Brasil não crescera entre 1820 e 1899, enquanto a dos Estados Unidos quase
quadruplicara naquele período.2 A precariedade dos transportes constrangia o
crescimento do país. A das finanças públicas constrangia o investimento do governo em
infra-estrutura.
A baixa capacidade de arrecadação do governo – cuja receita entre 1830 e 1885 provinha
em 70% de impostos sobre as exportações e importações – restringia os gastos. O
governo suplementava sua receita tomando emprestado de bancos domésticos e externos.
Mesmo assim, o gasto real do governo (medido em libras esterlinas, a preços de 1880)
subiu de apenas £ 0,20 per capita em 1823 para pouco mais de uma libra esterlina per
capita em 1900. É uma despesa pequena não apenas em termos per capita, mas também
em relação ao que o governo gasta hoje. Entre 1889 e 1900 a despesa do setor público
representava apenas algo em torno de 10% do PIB (Goldsmith, 1986), enquanto hoje gira
em torno de 40% do PIB.
O déficit orçamentário do governo central foi desprezível na década de 1850. Aumentou
para 6% do PIB em fins da década de 1860 por causa da guerra do Paraguai. Mas caiu
para 2% do PIB nos anos 1870 e para 1% na década de 1880 (Goldsmith, 1986).
Seria portanto difícil atribuir a explosão inflacionária de 1889-91 a um financiamento
inflacionário de déficits orçamentários do governo central, embora não tenha faltado
2
No Nordeste, onde metade da população brasileira residia, a renda caiu 30% entre 1820 e 1913. A receita
do açúcar e do algodão, que sustentava o Nordeste, caiu de 49% das exportações totais do país em 1822
para 3% em 1913. O café passou a ocupar 60% da pauta de exportações e a renda do Sudeste aumentou,
mas, até 1900, o crescimento no Sudeste não foi suficiente para compensar a queda da renda no Nordeste
(Leff, 1997).
3
quem atribuísse a instabilidade da época a problemas fiscais.3 Entretanto, a instabilidade
daquele período parece mais claramente ligada ao comportamento dos estoques
monetários e a um aumento generalizado do crédito.
Durante a segunda metade do século XIX, o estoque de moeda sofreu grandes flutuações,
que se refletiram em variações do produto real e do nível de preços. A figura 1 mostra o
comportamento da taxa de inflação anual entre 1871 e 1913 para os índices de preço por
atacado (Catão, 1992).4 Entre 1871 e 1888, os preços caem em média 1% ao ano e, nos
cinco anos entre 1889 e 1993, os preços dobram, crescendo em média 16% ao ano. A
inflação responde com algum atraso à extraordinária expansão monetária de 1889-90 e
atinge um pico de 25% ao ano em 1891.
Com a proclamação da República, Rui Barbosa, ministro da Fazenda, apoiou a doutrina
segundo a qual o estoque de papel-moeda no Brasil era pequeno porque o país era grande,
o uso de cheques limitado e os pequenos comerciantes não depositavam seu dinheiro em
bancos. A crescente demanda de crédito no final da década de 1880 veio em parte da
abolição da escravatura: mais dinheiro era necessário para sustentar um mercado de
trabalho assalariado. Além disso, dinheiro barato era uma forma de compensar os donos
de terra pela perda da mão-de-obra escrava (Cardoso; Dornbusch, 1989).
Em 1888-90, a liberalização da legislação bancária resultou na criação de numerosos
bancos que possuíam autonomia para a emissão de cédulas contra depósitos dos títulos
governamentais. Assim foi que o estoque de moeda praticamente dobrou em 1890. Na
ausência de controle por parte do governo, em três anos os bancos multiplicaram por
cinco seus depósitos e cédulas (um aumento equivalente a 12,5% do PIB) e expandiram
seus créditos de forma correspondente.
3
Diz Wileman (1896): “Deficits innumerable, annual, perennial, everlasting and ever increasing
deficits! In these three syllables is comprehended all the mystery of Brazilian finance, the head and
front of its offending”.
4
A expansão do crédito se fez acompanhar de um episódio notável na história financeira
do Brasil: uma alta repentina do mercado de ações e uma desenfreada criação de
empresas, cuja maioria nunca funcionou e logo entrou em falência. Esse episódio se
chamou encilhamento.
Entre 1889 e 1897, a expansão monetária foi acompanhada de forte desvalorização
cambial. Cardoso (1983) mostra que, além da expansão monetária, o declínio dos preços
do café influenciou a depreciação cambial. A inflação coincidiu também com uma queda
da produção da lavoura. Ao mesmo tempo, a depreciação cambial não favorecia a
importação de alimentos. A incerteza política dos primeiros anos da República também
desempenhou um papel na manutenção da instabilidade.
Entre 1898 e 1905, um arrocho monetário provocou deflação. Um empréstimo externo, a
melhora dos termos de intercâmbio e o arrocho monetário contribuíram para a apreciação
cambial e a moeda se estabilizou. O custo foi uma recessão. A política deflacionária de
Campos Salles provocou redução da oferta de empregos e salários (1898-1902). Apesar
da falta de popularidade de seu programa, a melhora da balança comercial (resultante da
melhora dos termos de intercâmbio e em boa medida do boom da borracha) impulsionou
a recuperação depois de 1903. O aumento do preço do café e um novo afluxo de
investimentos e empréstimos externos trariam prosperidade por alguns anos.
Modelos de inflação
Excesso de demanda, choques de oferta, expectativas e inércia
A experiência brasileira do final do século XIX, quando a criação de bancos e a expansão
do crédito ensejaram a inflação e o encilhamento, ilustra bem o princípio ensinado por
Milton Friedman: sem dinheiro não há inflação. A inflação é um fenômeno monetário,
4
O comportamento do índice de preços em Catão (1992) é similar ao do índice apurado por Lobo et al.
(1971). O índice de preços estimado por Contador e Haddad (1975) mostra uma inflação mais alta em
1888-89 e uma deflação mais acentuada nos anos seguintes.
5
mesmo quando a situação fiscal determina as expectativas de inflação ou a monetização
da dívida.
A inflação, entretanto, é muito mais difícil de prever do que em geral se imagina. A
instabilidade da demanda de moeda e as inovações financeiras, de um lado, e a
instabilidade do multiplicador bancário, de outro, transformam as taxas de crescimento
dos agregados monetários em variáveis que predizem muito mal o comportamento da
inflação no curto e no médio prazo.
No curto prazo, a inflação resulta primordialmente de cinco fatores:
•
As expectativas de inflação, π* (t)
•
A inércia inflacionária, π (t-1)
•
A taxa de depreciação da taxa de câmbio, ė(t)
•
O nível de atividade corrente em relação ao produto de pleno emprego, y(t) – y
•
Os choques de oferta, u(t).
π(t) = a π*(t) + (1-a) π(t-1) + b (ė(t)) +c (y (t) – y) + u(t)
(1)
Expectativas de inflação, π*, em baixa reduzem as pressões para aumentos de salários e
preços e contribuem para a queda da inflação. Essas expectativas dependem fortemente
dos objetivos e do desempenho do Banco Central. Por exemplo, no momento crítico da
transição política no final de 2002 e início de 2003, o Banco Central aumentou a taxa de
juros. Sinalizou, assim, o compromisso da política monetária com a redução da inflação.
O aumento da taxa Selic ajudou a coordenar as expectativas que se dispersavam frente ao
aumento da inflação no final de 2002 em relação à meta do governo. A partir daí, as
expectativas começaram a convergir para dentro da banda da meta de inflação em 2004.
A inércia, que deriva de arranjos institucionais e contratos, π (t-1), prolonga os efeitos de
choques inflacionários, u(t), de um período para o período seguinte. Por exemplo, entre
6
1968 e 1994, a inércia inflacionária no Brasil era forte, porque o câmbio, os salários e os
aluguéis se encontravam indexados à inflação passada.
A variação percentual da taxa de câmbio, ė(t), é chave para entender as oscilações da taxa
de inflação no Brasil, mesmo depois da abolição do sistema de indexação embutido nas
minidesvalorizações.5 Para exemplificar essa importância, as figuras 2 e 3 mostram a
correlação muito alta entre as expectativas de inflação e as expectativas de desvalorização
cambial em 2002 e 2003. A elevação do risco-país em 2002 provocou uma forte
desvalorização cambial, que empurrou a taxa de inflação para o alto. Esse processo se
reverteu em 2003.
Os choques de oferta também influenciam fortemente o comportamento da inflação no
curto prazo. Aumentos dos preços das importações e da energia elevam os custos de
produção. Como, muitas vezes, as autoridades monetárias acomodam esses choques, eles
se espalham para outros preços e impulsionam a inflação. Isso aconteceu, por exemplo,
com os choques de petróleo na segunda metade da década de 1970.
A inflação depende também das flutuações cíclicas do PIB (y(t)) ao redor do produto
potencial (y). Na figura 4, o produto potencial foi estimado pela metodologia da
suavização da série histórica do PIB através do uso do filtro de Hodrick-Prescott (com λ
= 100). A figura mostra as flutuações do PIB entre 1947 e 2004. As flutuações resultam
das variações da demanda. Os gastos de consumo privado e público, os investimentos e
as exportações de bens e serviços determinam o produto no curto prazo, que pode ficar
acima ou abaixo do potencial. Na figura 4, anos de expansão se alternam com anos de
resfriamento. Se o PIB observado excede o potencial por alguns anos, a economia sofre
pressões inflacionárias.
Observem-se, na figura 4, o crescimento acima do potencial nos anos JK e o ajustamento
entre 1964 e 1966. Depois, o PIB dispara. Entre 1968 e 1970, ainda se situava abaixo do
5
Para uma estimativa do efeito das desvalorizações cambiais na inflação brasileira, ver, por exemplo,
Muinhos (2001).
7
potencial e, portanto, sua taxa de crescimento podia exceder a taxa potencial, enquanto a
economia absorvia a capacidade ociosa.
Entre 1973 e 1976, o crescimento potencial é mais veloz do que em outros períodos.6
Veja-se a figura 5. A partir do final da década de 70, entretanto, a demanda agregada
desafia a lei da gravidade e as limitações impostas pelo segundo choque do petróleo. Em
1980, o PIB atinge um pico bem superior ao produto potencial. O desastre não demora. O
crescimento se torna negativo em 1981 e a economia entra em recessão.
Na década de 1980, com o crescimento potencial reduzido pela queda de nossos termos
de troca, basta o crescimento de 1985 e 1986 para colocar novamente o PIB acima do
produto potencial. Sem financiamento externo e com os gastos agregados acima do
produto potencial, os planos heterodoxos de estabilização estavam condenados ao
fracasso.
Os problemas acumulados a partir de 1979 cobraram um preço alto. A moratória de 1987
e o congelamento do governo Collor transformaram a recessão de 1990-92 num período
traumático. Depois de 1993, nosso herói volta a crescer. Segue em frente próximo do
produto potencial, agora reduzido pela falta de investimentos em infra-estrutura. O ano de
2003 empurra o PIB para baixo, mas um crescimento superior a 4% em 2004 poderá
reaproximá-lo de seu nível potencial. Ou não. Pois o PIB potencial também pode subir se
a taxa de investimento e a produtividade aumentam.
A tabela 1 mostra a taxa de inflação média em diferentes períodos. Entre 1958 e 1964, o
PIB excede o produto potencial e a inflação é o dobro da observada no período anterior.
Entre 1965 e 1973, o PIB situa-se abaixo do potencial e a inflação é a metade da inflação
do período anterior. Entre 1974 e 1981, o PIB está mais uma vez acima do potencial e a
inflação dobra em relação ao período anterior.
6
Para uma discussão do crescimento da produtividade no Brasil entre 1950 e 2000, ver Gomes e outros
(2003).
8
De 1982 a 1994, não parece possível estabelecer uma relação simples entre as taxas de
inflação e as oscilações do PIB em torno do PIB potencial em diferentes períodos. A
tendência da taxa de inflação é de alta acelerada, partindo de uma média de 200% ao ano
entre 1982 e 1985 até atingir uma média de 1.300% ao ano entre 1990 e 1994. Com
certeza, um modelo de oscilações cíclicas do PIB não explica o comportamento da
inflação nesse período.
Entre 1995 e 2002, a taxa de inflação (medida pelo IGP-DI, para permitir a comparação
com períodos em que o IPCA ainda não existia) cai para 13% ao ano em média. É
possível que as oscilações do PIB em torno do produto potencial a partir de 1995 estejam
mais bem correlacionadas com a inflação do que em períodos anteriores. Mas, como o
período é caracterizado por uma mudança do regime cambial em 1999, os cinco anos
entre 1999 e 2004 limitam o número de observações que permitiriam estimativas mais ou
menos precisas do PIB potencial. Por isso, ainda não temos boas estimativas no Brasil
para o trade-off entre a inflação e o hiato do produto (a distância entre o PIB e o PIB
potencial).
Supõe-se que os instrumentos da política monetária (a taxa Selic e a taxa de depósitos
compulsórios sobre os depósitos nos bancos comerciais) afetem o nível de atividade e as
expectativas de inflação. Em princípio, um aumento da Selic (ou do compulsório)
encarece o crédito e reduz o nível de atividade da economia. Numa recessão, os
trabalhadores não conseguem aumentar seus salários nem as firmas repassar aumentos de
custos. Por isso a recessão contribui para a redução da inflação.
Alguns economistas (como Blanchard, 2004) costumam não levar em conta o canal de
transmissão da taxa de juros para o nível de atividade no Brasil, porque a quantidade de
crédito na economia brasileira é baixa. De outro lado, o Banco Central argumenta que,
tendo contraído a política monetária no final de 2002 e início de 2003, observou em
seguida a queda da produção industrial e das vendas do comércio, enquanto o
desemprego aumentava e a inflação despencava. Voltaremos a essa discussão mais tarde.
9
Modelos de inflação: o financiamento inflacionário
O modelo na seção anterior explica o comportamento cíclico da inflação, mas deixa sem
explicação uma parte central do fenômeno inflacionário. É preciso indagar também sobre
o que determina uma taxa de inflação que se mantém em níveis elevados ano após ano.
Suponha-se uma situação em que a economia se encontre em pleno emprego (y(t) = y) e
não existam choques de oferta, u(t). Nesse caso, a equação (1) se reduz a:
π (t) = a π* (t) + (1-a) π (t-1)
(2)
A inflação pode persistir ano após ano se a expansão monetária acomoda a expectativa e
a inércia inflacionária. Mas o que faz com que a taxa de expansão monetária revalide a
cada ano uma expectativa de inflação de 200% ao ano, em vez de revalidar uma taxa de
10% ao ano?
A explicação dos livros-textos reside nos déficits fiscais financiados por expansão
monetária. Por exemplo, na segunda metade dos anos 50, a expansão monetária financiou
o déficit de JK, que comprou infra-estrutura com dinheiro impresso pelo Banco do Brasil.
Da boca do caixa do BB diretamente para o Tesouro. Entre 1955 e 1962, a base
monetária aumentou 300%. Assim JK contornou a dificuldade de arrecadação de
impostos e permitiu que a inflação financiasse o crescimento até que a crise eclodiu no
início dos anos 60.
O modelo mais comum de financiamento inflacionário apóia-se na hipótese de que um
excesso de gastos sobre as receitas é financiado por senhoriagem, ou seja, um aumento da
base monetária. Portanto, a participação do déficit público no PIB, g, é igual à
participação da senhoriagem, H(t) – H(t-1), no PIB:
10
g(t) = [H(t) – H(t-1)]/ PIB(t)
(3)
Em equilíbrio de longo prazo, o produto igual corresponde ao produto potencial, não há
choques de oferta e a velocidade é constante. Nesse equilíbrio, a participação do déficit
fiscal no PIB, g, é igual à participação no PIB do imposto inflacionário, [π/(1+ π )].h (π),
onde h é a participação dos encaixes monetários no PIB.7
g = [π/(1+ π )]. h (π)
(4)
A linha reta na figura 6 representa o déficit, g.
A linha curva na figura 6 representa o imposto inflacionário. A receita desse imposto
depende da taxa de inflação (que determina a alíquota do imposto inflacionário, π/(1+ π))
e da quantidade de encaixes monetários reais que as pessoas mantêm em suas carteiras (a
base do imposto inflacionário, que é h (π), uma função decrescente da taxa de inflação).
O financiamento do déficit do governo determina, num primeiro momento, o ritmo de
expansão da base monetária nominal, mas os encaixes reais terão de ser iguais à sua
demanda. A demanda de encaixes reais cai quando a inflação aumenta. Ao longo da
curva de senhoriagem, [π/(1+ π )]. h (π), a receita do imposto inflacionário aumenta à
medida que a inflação sobe, até um determinado ponto, embora os encaixes reais
diminuam com o aumento da inflação. O imposto inflacionário atinge um ponto máximo
e começa a cair a partir de então, porque a redução dos encaixes monetários se torna
proporcionalmente maior que o aumento da taxa de inflação.
7
Nesse modelo simplificado, ignora-se a diferença entre M1 e a base monetária. Para um modelo em
que a distinção aparece, ver, por exemplo, Cardoso (1998).
11
O modelo admite a existência de dois equilíbrios. Um em que o déficit é financiado com
uma taxa de inflação baixa e encaixes reais relativamente altos e outro em que o déficit é
financiado com taxa de inflação alta e encaixes reais pequenos.
Um aumento do déficit fiscal desloca a linha reta para cima. Não há uma solução de
equilíbrio se ocorre um deslocamento grande da linha g – um deslocamento que
corresponda a um déficit só possível de ser financiado por um montante de senhoriagem
inconsistente com aqueles representados ao longo da curva [π/(1+ π )]. h (π). Nesse caso,
configura-se um processo hiperinflacionário com dinâmica explosiva, como observado,
por exemplo, nas hiperinflações européias do entreguerras ou na Bolívia na década de
1980.
Tanzi (1978) e outros autores representaram a linha do déficit orçamentário com uma
inclinação positiva, formulando a hipótese de que o déficit fiscal aumenta com a taxa de
inflação. Tanzi observou que atrasos na coleta de impostos podem reduzir os impostos
reais e dar origem a um aumento do déficit quando a inflação aumenta.
Mas a inflação afeta também os gastos reais. Patinkin (1993) mostra que, antes de 1985, o
governo de Israel usou a inflação para erodir gastos contratados em termos nominais.
Guardia (1992) mostra que, nos anos de inflação alta no Brasil, os déficits reais
observados eram menores do que os déficits programados. Bacha (1994) representa o
orçamento do governo como uma linha reta de inclinação negativa no modelo
reproduzido pela equação (4) e argumenta que os gastos programados no Brasil, durante
os anos de inflação alta, excediam os gastos reais realizados, porque a inflação era maior
do que a projetada e os gastos não eram indexados.
Uma reta de inclinação positiva ou negativa não muda a conclusão básica do modelo
clássico do financiamento inflacionário.8 Um grande aumento do déficit fiscal desloca a
8
A menos que a reta fosse muito inclinada, isto é, que o efeito Patinkin fosse muito forte, mesmo para uma
taxa de inflação próxima de zero, o que não faz sentido.
12
reta para o alto e, no caso de um forte deslocamento, inexiste equilíbrio possível e o
resultado é uma hiperinflação.
Para entender o processo de inflação extremamente alta que nunca culmina numa
hiperinflação aberta no Brasil, Cardoso (1998) introduz o conceito de déficit virtual (que
seria observado se a inflação fosse nula), modela os efeitos Tanzi e Patinkin através de
uma função não linear do orçamento fiscal e aplica o modelo ao caso brasileiro.
No modelo aqui apresentado, g, a participação do déficit no PIB corresponde à
participação da necessidade de financiamento do setor público (NFSP) em termos reais
no PIB real e pode ser facilmente medida, ao contrário do déficit operacional. Durante os
anos de inflação alta, os economistas utilizaram medidas diferentes do déficit
operacional, cuja estimativa exige a exclusão da correção monetária do serviço da dívida
pública. O modelo aqui apresentado dispensa uma medida do déficit operacional.
O déficit virtual, isto é, a NFSP real que seria observada se a inflação fosse nula e,
portanto, se os efeitos Tanzi e Patinkin fossem igualmente nulos, é um conceito teórico.
Uma medida do déficit virtual exigiria uma estimativa da resposta da NFSP real à taxa de
inflação. O modelo mostra que a NFSP e a inflação são determinadas simultaneamente, já
que a inflação também depende da NFSP e de seu financiamento. Essa simultaneidade
dificulta uma estimativa precisa dos efeitos Tanzi e Patinkin, mas não invalida as
conclusões do modelo, que podem ser verificadas de outras formas, como se discutirá
adiante.
O efeito Tanzi é mais forte que o efeito Patinkin quando a taxa de inflação é baixa; o
contrário ocorre quando a inflação é alta. Assim, a resposta à inflação da participação do
déficit no PIB, g(π), é não linear. A equação (4) deve ser reescrita como:
g (0, π) = [π/(1+ π )]. h (π)
(5)
13
Cardoso (1998) prefere representar esse modelo num gráfico diferente dos anteriores, que
facilita a análise dinâmica fora do steady state, quando a velocidade varia. Aqui, para
facilitar a comparação com o modelo clássico já discutido nesta seção, usam-se a
representação e eixos da figura 6 para ilustrar os equilíbrios que correspondem à equação
(5) na figura 7.
Um aumento do déficit virtual desloca para cima a curva que representa o déficit, g (0, π),
na figura 7. Mas a inflação atua através do efeito Patinkin para reduzir os gastos reais a
partir de uma taxa de inflação alta e torna a curva do déficit negativamente inclinada a
partir desse ponto. Assim, é sempre possível encontrar uma inflação que permite
financiar o déficit. Através do efeito Patinkin, a inflação reduz o déficit ex-post, que pode
ser financiado com a senhoriagem menor correspondente aos encaixes reais mais baixos
desejados pelos agentes em suas carteiras quando a inflação aumenta.
Esse modelo permite entender melhor a persistência da inflação na economia brasileira,
que sempre esteve ligada ao desequilíbrio crônico e estrutural do setor público. A arte da
acomodação da política econômica brasileira abandonou a disciplina inaugurada em
meados dos anos 60 pelo PAEG (discutido no capítulo x deste volume), quando a
economia se defrontou com o choque do petróleo na segunda metade dos anos 70. Uma
vez impossível a tomada de empréstimos externos, a inflação dobrou várias vezes e
motivou inúmeros programas heterodoxos de estabilização entre 1985 e 1992. Com o
problema fiscal irresolvido, durante toda a década de 80, a inflação reconciliou o déficit
ao seu financiamento com atrasos de pagamentos que reduziam os gastos reais.
Durante o período JK, o déficit público foi financiado apenas por emissão monetária.
Inversamente, durante os anos 80 e primeira metade da década de 90, o financiamento se
fez sobretudo por emissão de dívida indexada à inflação passada através do mecanismo
chamado correção monetária.
A tabela 2 mostra três séries da participação da dívida líquida do setor público no PIB. A
primeira corresponde à participação no PIB da média da dívida nominal líquida do setor
14
público entre dezembro do ano corrente e dezembro do ano anterior.9 A série 2, não
revista e disponível em números antigos do Boletim do Banco Central, corresponde à
dívida líquida do setor público em final do período. A série 3 é a dívida líquida do setor
público como porcentagem do PIB, revista e disponível no site do Banco Central do
Brasil para o período de janeiro de 1994 a agosto de 2004.
De 1995 a 2003, as observações entre as séries 1 e 3 são bastante semelhantes e as
pequenas diferenças verificadas no gráfico refletem a diferença entre a dívida média no
ano e a dívida no final do período. Existem, porém, diferenças grandes entre as
observações da série 1 e da série 2 (que o Banco Central ainda não reviu),
particularmente entre 1988 e 1993, conforme figura 8. Como o período é de oscilações
violentas da taxa de inflação, parte da discrepância entre as duas séries pode ser atribuída
à diferença entre as medidas da dívida média no ano e da dívida no final do período e
parte ao índice de preço usado pelo Banco Central para corrigir o PIB no final do ano. É
possível também que a série ainda não revista tenha excluído do cálculo da dívida líquida
parte dos pagamentos de correção monetária.
A série 2 (os números não revistos para a participação da dívida líquida no PIB de
dezembro) parece não refletir de forma adequada o comportamento dessa variável.
Apesar de oscilações muito pequenas, a série mostra uma tendência declinante durante os
dez anos compreendidos entre 1984 e 1994.
A série 1 apresenta uma realidade muito mais consistente com as observações para a
necessidade de financiamento do setor público (NFSP). Nos anos de inflação galopante e,
portanto, de gastos muito grandes com a correção monetária, a participação da dívida no
PIB eleva-se de forma acentuada. Em 1990, quando o governo Collor congela os ativos
financeiros, a relação dívida/PIB despenca. A partir de 1991, à medida que a inflação e a
9
A série da dívida nominal encontra-se disponível no site do Ipea (Ipeadata) e a fonte é o Boletim do
Banco Central (diversos anos). Um acréscimo à dívida nominal média num determinado ano corresponde
de forma bem próxima à necessidade de financiamento do setor público (NFSP) naquele ano. As
participações desses acréscimos e da NFSP no PIB estão representadas na figura 9.
15
correção monetária sobem, a dívida volta a aumentar e só despenca quando a inflação e a
correção monetária desaparecem, nos meados de 1994.
A figura 9 mostra a evolução da necessidade de financiamento do setor público (NSFP) e
os acréscimos à dívida líquida desse setor, incluindo os aumentos da base monetária.10
É possível estender o modelo representado pela equação (5) à experiência brasileira pela
introdução do financiamento de parte do déficit fiscal através de dívida pública com
correção monetária. As taxas de inflação e de expansão monetária continuam a ser
determinadas endogenamente. O governo escolhe o déficit virtual (mas não o déficit expost, que depende da taxa de inflação de equilíbrio) e financia parte do déficit pela
emissão de dívida. O apêndice deriva a equação que descreve o financiamento
inflacionário do déficit fiscal em equilíbrio de steady state:
g (0, π) = α[π/(1+ π )]. h (π) + (1-α) [π/(1+ π )]. w
(6)
Onde w é a participação da riqueza no PIB, que se divide entre a participação dos
encaixes reais de moeda no PIB, h, e a participação da dívida pública no PIB. Observe-se
que existe um déficit primário, g, e que α representa a parcela da taxa de inflação que
corresponde à correção monetária da dívida pública existente no Brasil entre 1968 e
1994.
Se a taxa de juros real é nula11 e a correção monetária é igual à inflação, α = 1, o
pagamento da correção monetária é do mesmo tamanho que o imposto inflacionário que
recairia sobre a dívida. Nesse caso, substituindo-se α por 1 na equação (6), obtemos
10
A NSFP/PIBN, onde PIBN é o PIB nominal, é publicada pelo Banco Central do Brasil e Ipeadata. O
acréscimo à dívida é calculado a partir da variação da dívida média dividida pelo PIBN. A medida da
dívida corresponde à série 1 na tabela 2. Mas, por definição, o aumento da dívida dividido pelo PIB é
diferente do aumento da participação da dívida no PIB. A participação da NFSP no PIBN corresponde ao
aumento da dívida média/PIBN e não à diferença da relação dívida/PIBN entre dois períodos. O uso da
dívida média no ano evita distorções que poderiam ser introduzidas pela inflação, porque tanto a dívida
quanto o PIB estão sendo medidos a preços médios do ano.
11
Assumimos que no steady state desse modelo, onde a taxa de crescimento da população é nula, a taxa de
crescimento real da economia é nula e a taxa de juros real também. Um modelo equivalente com uma taxa
de juros real positiva em steady state encontra-se em Cardoso e Helwege (1999).
16
novamente a equação (5), que já é nossa conhecida. E assim estaríamos de volta ao
modelo do déficit inflacionário, onde a senhoriagem financia o déficit primário.
Se α>1, o pagamento da correção monetária excede o imposto inflacionário sobre a
dívida e pode caracterizar uma situação de dominância fiscal, em que o aumento do
financiamento do déficit primário por um aumento de dívida levaria a um deslocamento
da curva de senhoriagem para baixo e a um aumento da inflação.
Mas, se α<1, o governo tem mais uma base de financiamento, porque o imposto
inflacionário que recai sobre o estoque da dívida excede o pagamento da correção
monetária.12 Nesse caso, uma mudança na forma de financiamento do déficit, através da
colocação de dívida pública, altera a inclinação da curva de senhoriagem e a desloca para
cima, como na figura 10. A introdução de dívida permite uma redução na taxa de
inflação, mas a queda da inflação aumenta o déficit observado através do efeito Patinkin,
como ilustrado na figura 10.
A figura 11 ilustra um exemplo teórico em que o aumento concomitante do déficit e de
seu financiamento através de dívida com correção monetária leva a um aumento da
inflação e do déficit. Esse pode ter sido o caso do Brasil em alguns períodos, como nos
faz crer a figura 12, que mostra a correlação positiva entre NFSP/PIB e a taxa de inflação
no Brasil entre 1983 e 2003.
A figura 12 representa uma forma reduzida e, certamente, existe causalidade tanto na
direção da NFSP para a inflação quanto da inflação para a NFSP, através do pagamento
de correção monetária (o que já ficou claro no exemplo teórico da figura 11). O
importante é ilustrar como a dívida com correção monetária tornou possível financiar o
desequilíbrio fiscal numa economia cuja inflação reduzia cada vez mais a demanda por
encaixes monetários, sem que se tornasse uma hiperinflação aberta, em que o uso da
moeda desaparece.
17
O modelo e sua aplicação também sugerem que o mecanismo de financiamento
inflacionário dos déficits fiscais teve um papel-chave na inflação brasileira e que a taxa
de inflação não era indeterminada, como se apregoou em modelos que representaram a
inflação brasileira como um random walk. O poder dos testes econométricos é fraco para
rejeitar tal hipótese. Mas o fracasso dos programas heterodoxos, em que a inflação
desaparecia durante os períodos de congelamento para retornar com força redobrada
quando estes eram suspensos, aponta para a existência de mecanismos de perpetuação da
inflação que vão além da pura inércia e da aleatoriedade dos choques.
Programas de estabilização
É costume dividir os programas de estabilização em ortodoxos e heterodoxos. Os
ortodoxos enfatizam o papel do desequilíbrio fiscal nos processos de inflação crônica.
Para pôr fim à inflação seria preciso eliminar os déficits fiscais e produzir um arrocho
monetário. Os programas heterodoxos enfatizam o papel da inércia inflacionária criada
por mecanismos de indexação, endêmicos em economias que sofrem de inflação
crônica.13 Para estancá-la seria preciso eliminar a memória inflacionária a partir de um
congelamento de preços, por exemplo.
Entre 1979 e 1992, o Brasil experimentou 11 planos de estabilização, que Bresser (1992)
lista e classifica. O Plano Delfim I, em 1979, teria sido ao mesmo tempo populista,
ortodoxo, monetarista e baseado na prefixação da taxa de câmbio. O Plano Delfim II, em
1981, um programa ortodoxo clássico acompanhado de forte recessão, enquanto a
inflação permanecia em 100% até o final de 1982. O Plano Delfim III, em 1983, um
programa ortodoxo monitorado pelo FMI. Com a maxidesvalorização em fevereiro de
1983, a inflação dobra para 200% ao ano.
12
Fora do steady state, é fácil verificar que, se a correção monetária se faz com base na inflação passada,
quando a inflação do ano corrente excede a do ano anterior o governo recolhe um imposto inflacionário
sobre a dívida que excede o pagamento da correção monetária.
18
Já o Plano Dornelles, em 1985, teria sido um plano parcialmente heterodoxo dotado de
uma política monetária um pouco mais apertada, mas baseado no congelamento apenas
dos preços públicos e dos preços de alguns setores oligopolísticos. A inflação caiu de
10% ao mês para 7% ao mês e retornou com força quando o congelamento foi suspenso.
O Plano Cruzado, em março de 1986, programa heterodoxo baseado no congelamento de
preços, perdeu-se com o aquecimento da demanda. A inflação caiu a zero com o
congelamento de preços e explodiu quando este chegou ao fim. O plano Bresser, em
junho de 1987, também foi um plano heterodoxo que prometia uma reforma tributária
que não se realizou.
O Plano de Maílson da Nóbrega, conhecido como Arroz com Feijão, em janeiro de 1988,
baseou-se na tentativa de ajuste fiscal e de um acordo sobre a dívida externa. A inflação
de 14% ao mês em dezembro de 1987 subiu em pequenos saltos até chegar a 30% ao mês
no final de 1988. O Plano Verão, em janeiro de 1989, usou o congelamento de preços,
uma reforma monetária e taxas de juros altas. Não houve reforma fiscal. O aumento das
taxas de juros aumentou a NFSP e o programa chegou ao fim com um agravamento da
inflação.
O Plano Collor I, em março de 1990, combinou a retenção de ativos monetários com um
rápido congelamento e introduziu, alguns meses depois, um ajuste fiscal e um arrocho
monetário. A inflação cedeu, mas voltou aos 20% ao mês em dezembro de 1990. O Plano
Collor II, em janeiro de 1991, aumentou os impostos e reduziu temporariamente a
inflação, que retornou aos 10% ao mês em junho de 1991. Em 1992, o Plano Marcílio
tentou, por algum tempo e sem sucesso, medidas ortodoxas.
Atribui-se o fracasso dos programas ortodoxos no Brasil à existência de indexação com
base na inflação passada. A inflação crônica gera mecanismos de indexação que
13
Simonsen (1995) analisa em detalhe os mecanismos de indexação salarial compulsória, de indexação
tributária e cambial, e de correção monetária no Brasil durante três décadas.
19
perpetuam a inflação passada. De acordo com esse diagnóstico, um programa ortodoxo
no Brasil era insustentável, pois implicaria desemprego por um tempo muito prolongado.
Também se poderia atribuir o fracasso das tentativas ortodoxas à insuficiência dos
ajustamentos fiscais e à sua falta de credibilidade. Como Sargent (1986) argumenta, se a
autoridade monetária não pode influenciar os resultados fiscais presentes e futuros, uma
política monetária mais apertada num determinado momento pode até contribuir para
aumentar a inflação se o setor privado acredita que a dívida pública pode se tornar
insustentável.
Os programas heterodoxos também falharam ao enfatizar apenas a inércia inflacionária,
que faz com que a inflação corrente repita a inflação passada. Com certeza, a inércia era
um elemento importante na inflação brasileira e se encontrava institucionalizada nos mais
diferentes mecanismos de indexação de salários, câmbio, aluguéis e ativos financeiros.
Tentar eliminá-la através de uma contração da demanda agregada sem um mecanismo
que eliminasse ao mesmo tempo a memória inflacionária seria um desastre e um
programa insustentável em termos sociais e políticos. Mas os planos heterodoxos se
repetiram sem sucesso porque se limitaram a tentar eliminar a inflação via congelamento
de preços e salários.
O congelamento de preços deveria, em princípio, eliminar o efeito da inflação passada
sobre a inflação presente. Se a inflação fosse simplesmente inercial, deveria desaparecer
com o congelamento. Tal não ocorreu em nenhum dos programas heterodoxos. Ao
contrário, na ausência de uma contração da demanda durante os programas heterodoxos,
o congelamento gerava racionamentos e inflação reprimida e a inflação retornava com
força total quando o congelamento era suspenso.
Mais importante para a eliminação da memória inflacionária teria sido o uso da taxa de
câmbio como uma âncora para a qual as expectativas inflacionárias pudessem convergir.
O contexto internacional não permitiu que esse mecanismo fosse utilizado até perto de
1994.
20
O Plano Real
Em 1994, o Plano Real substituiu o congelamento de preços dos programas heterodoxos
pela âncora cambial. A base conceitual do plano fora a proposta de Arida e Lara Resende
(1985). Seus princípios: um programa preanunciado, a introdução de uma nova moeda e a
livre conversão de contratos para a nova moeda. De acordo com essa concepção, a nova
moeda serviria como instrumento para remover a inércia inflacionária.
O Plano Real apresentou uma inovação em relação à proposta inicial de Arida e Lara
Resende: a introdução de uma fase de transição, em que uma moeda virtual (a URV)
serviu de base para cálculo e denominação de contratos. Essa fase deu tempo aos agentes
para refazerem seus contratos na moeda que viria a ser emitida.
O Plano Real também diferia da proposta de Arida e Resende no que se refere à âncora
para a estabilidade de preços. A proposta inicial propunha fixar o montante de um
agregado monetário definido pela soma da base monetária no sentido estrito e dos
passivos denominados em dólar do Banco Central, que seriam livremente negociáveis no
mercado doméstico em reais. O plano, no entanto, recorreu à âncora cambial.
Pode-se descrever e analisar o Plano Real pela distinção de fases na sua implementação:
um ajuste fiscal em 1994, a introdução da Unidade Real de Valor em março de 1994 para
a conversão dos preços, a reforma monetária que criou o real em 1º de julho de 1994, e o
uso da âncora cambial a partir de então.14
A redução dos desequilíbrios fiscais (talvez em parte como conseqüência do plano
Collor, mas principalmente devido ao ajuste iniciado no final de 1993) contribuiu para a
credibilidade do Plano Real. Embora o plano Collor, em 1990-91, tenha obtido uma
redução da dívida do setor público com o bloqueio dos ativos financeiros, esta voltou a
14
Ver, por exemplo, Bacha (1997), Bresser Pereira (1994) e Franco (1995).
21
crescer em 1992 e 1993, à medida que a correção monetária aproximava-se cada vez mais
da inflação e os juros reais subiam.15
Um ajuste fiscal entre dezembro de 1993 e março de 1994 produziu um superávit
primário igual a 5,2% do PIB e contribuiu para o sucesso do Plano Real e a estabilização
a partir de julho de 1994 (ver tabela 3).
A introdução da URV (durante o período de transição entre o início do programa e a
reforma monetária) foi necessária porque os contratos em moeda nacional tinham
cláusulas de indexação diferentes e usavam diferentes índices de correção de seus
valores, com reajustamentos em períodos diferentes. A Medida Provisória 434
determinou que todos os novos contratos fossem feitos em URV e facultou aos existentes
a conversão, lembrando que no momento da emissão do real todas as obrigações
pecuniárias seriam convertidas em real e assim criou incentivos para a conversão em
URV.
O período de transição entre março e julho de 1994 permitiu a solução de dois problemas
que contribuíram para o fracasso de planos anteriores: a política salarial e a indexação de
contratos.
A Medida Provisória 434 determinou a conversão do salário mínimo e dos benefícios da
Previdência em URV da data de pagamento pela média dos valores em cruzeiros reais
dos últimos quatro meses. Como os salários estavam sendo convertidos em URV, tudo
contribuía para a adoção de um só índice de indexação e a “taxa de câmbio” entre o
cruzeiro real e a URV passou a ser fixada diariamente pelo Banco Central, tomando
como base a perda de valor aquisitivo do cruzeiro real.
A vantagem da URV foi tornar desnecessários, na introdução do real, o congelamento, a
prefixação ou o uso de tablitas de deflação destinadas a manter o equilíbrio de obrigações
15
A série 1 na tabela 2 mostra que a dívida cai em 1990, mas volta a crescer entre 1991 e 1993. A série 2
na tabela 2 mostra uma tendência de queda da relação dívida/PIB entre 1984 e 1994, mesmo antes do plano
22
prefixadas e usadas em programas heterodoxos. A URV e o período de transição
evitaram, assim, os problemas judiciários de programas heterodoxos anteriores.
A conversão compulsória dos salários e o reajuste diário da URV poderiam ter causado
um choque hiperinflacionário. A exigência da expressão dos preços no varejo em
cruzeiros reais contornou esse risco. O governo apostou que a remarcação diária dos
preços não ocorreria por causa dos chamados “custos de cardápio”. A presunção se
revelou correta. Franco (1995) atribui o aumento da inflação de 39% em janeiro para
46% em março de 1994 ao temor de que alguma forma de controle de preços fosse
introduzida junto com a URV. Mas, nos meses seguintes, a inflação permaneceu no
mesmo ritmo, em torno de 40% ao mês e aumentou novamente para 46% em junho,
quando surgiu o receio da introdução de controle de preços no momento da reforma
monetária. Mas, nesse momento, os preços do setor público foram congelados e
estabeleceu-se que a taxa de câmbio não poderia depreciar-se abaixo da paridade US$ 1/
R$ 1.
A Medida Provisória 542 introduziu limites quantitativos para a nova moeda. O câmbio
flutuou e a apreciação da taxa de câmbio contribuiu para a estabilização.
Durante todo o segundo semestre de 1994, o Banco Central manteve a liquidez sob
controle e impôs um aumento dos recolhimentos compulsórios, que travaram as
operações de crédito do sistema bancário.16 O aumento incluiu o recolhimento de 100%
dos depósitos à vista, um compulsório sobre depósitos de poupança e a prazo de 20% e, a
partir de outubro, o recolhimento de 15% sobre operações de crédito e de 30% sobre
qualquer espécie de captação.
A apreciação do câmbio era inevitável, porque o Banco Central manteve uma política
monetária apertada e não interveio no mercado de câmbio nesse momento em que os
fluxos de capitais estrangeiros retornavam ao país.
Collor, e não mostra uma variação mais acentuada no ano do congelamento dos ativos financeiros.
16
Ver Cardoso (2003).
23
Entre 1983 e 1991, o Brasil não tivera acesso ao capital estrangeiro e o saldo em conta
corrente no balanço de pagamentos mantivera-se em torno de zero. Os planos
heterodoxos anteriores fracassaram não apenas porque, em sua maioria, não se fizeram
acompanhar de uma política macroeconômica restritiva, mas também porque o contexto
internacional desfavorável não permitira o uso da âncora cambial por um período
suficientemente longo. Os fluxos de capitais para a América Latina, e para o Brasil em
particular, tinham-se estancado durante a década de 1980. Em 1992 a dívida foi
renegociada. Com a solução da moratória externa, a redução das taxas de juros nos
Estados Unidos e o aumento da liquidez internacional, as entradas de capital anuais
passaram a aproximadamente 2% do PIB entre 1992-94. Fluxos de capitais abundantes
permitiram o uso da âncora cambial até 1998.
O Plano Real controlou a inflação com notável rapidez: de quatro dígitos em 1994 caiu
para dois dígitos em 1995 e para menos de 2% ao ano em 1998. De fato, a ampla
popularidade que Fernando Henrique Cardoso obteve em razão do sucesso da
estabilização garantiu sua reeleição em 1998.
Em 1994, iniciou-se também um boom econômico, apesar de taxas de juros reais muito
altas. O boom teve sua origem no aumento dos salários reais. Entre 1993 e 1995,
ocorreram vários ajustes salariais com aumentos do salário mínimo e dos salários
governamentais. Por exemplo, o salário mínimo subiu 43% em 1995, quando a taxa de
inflação era de apenas 15%.
O imposto inflacionário e os pobres
A renda real dos pobres aumentou depois do Plano Real e a proporção de pobres na
população declinou nas áreas metropolitanas.17 O aumento da renda real dos pobres se
explica pelo aumento dos salários no final de 1994 e início de 1995. Como a inflação caiu
fortemente, esses aumentos salariais foram em boa parte preservados e não eliminados,
como costumava acontecer no período anterior.
17
Ver, por exemplo, Rocha (1996).
24
Seria um erro atribuir a redução da pobreza à queda do imposto inflacionário. Entre 1950
e 1995, a receita do governo decorrente de senhoriagem foi, em média, de 2% do PIB.
Entre 1950 e 1995, o Banco Central e os bancos comerciais juntos puderam extrair um
imposto inflacionário de 4% do PIB por ano.18 Quem pagava o imposto inflacionário
eram as classes médias. Os ricos dispunham de informação e flexibilidade para evitar a
manutenção de encaixes monetários, enquanto os que viviam abaixo da linha de pobreza
não mantinham em suas carteiras encaixes monetários durante um período suficiente para
que o imposto inflacionário abocanhasse uma parte significativa de suas rendas.
Os trabalhadores que recebem salário mínimo são pagos por semana. Se mantivessem
metade de seus salários semanais em forma de encaixes monetários, a inflação teria de
ser mais de 1.000% ao ano para que o imposto inflacionário fosse superior a 2% de suas
rendas. Na tabela 4, calcula-se o imposto inflacionário e leva-se em consideração que o
saldo monetário médio em carteira depende da periodicidade dos salários recebidos.
Mesmo se os trabalhadores recebessem seus salários no início do mês, a inflação fosse de
1.000% ao ano e mantivessem em carteira durante o mês em média ¼ de seus salários, o
imposto inflacionário devoraria apenas 4% de suas rendas. Esse imposto seria pequeno
quando comparado com a erosão dos salários reais provocada pela inflação. Uma inflação
de 1000% ao ano reduz o salário real médio em 10% em relação ao seu pico (tabela 5).
A implicação desses números é que a inflação é uma forma regressiva de tributação,
porque empobrece as classes médias e aumenta o número de pobres. Mas os que já vivem
abaixo da linha de pobreza não pagam um montante significativo do imposto
inflacionário, porque não carregam moeda por um tempo suficientemente longo para
sofrerem a perda de seu poder aquisitivo. Os 20% mais pobres da população brasileira
recebem 2% da renda nacional. Portanto, não teriam como pagar os 4% do PIB
recolhidos em média como imposto inflacionário sobre os meios de pagamentos pelo
Banco Central e pelos bancos comerciais na época da inflação galopante da década de 80.
18
Ver Cardoso (1998).
25
O Plano Real e seus desafios
Em 1995, apesar da derrubada da inflação e do enorme sucesso e popularidade do Plano
Real, alguns desequilíbrios começaram a despontar. Quando lançado, o Plano Real
assumira o compromisso de controlar os déficits fiscais, mas os ajustes fiscais
empreendidos em 1994 foram logo perdendo a força inicial.
O superávit primário de 5,2% do PIB em 1994 transformou-se num déficit em 1996 e o
desequilíbrio acentuou-se em 1997 (tabela 3). Dentre os fatores que contribuíram para a
transformação do superávit primário em déficit estava o crescimento das despesas de
pessoal resultante do aumento de 43% no pagamento das aposentadorias, decorrente, por
sua vez, do aumento do salário mínimo em maio de 1995, e um crescimento substancial
de “outras despesas”. Em 1998, a NFSP atingiu 7,5% do PIB.
Os desequilíbrios fiscais tornaram-se mais transparentes com o fim da inflação.
Giambiaggi (2002) oferece uma análise detalhada da evolução das contas públicas no
Brasil entre 1995 e 2002 e interpreta o elevado déficit do primeiro período da
administração de Fernando Henrique Cardoso como resultado de uma política
expansionista. Para ele, a principal causa da piora fiscal no primeiro governo Cardoso foi
a deterioração do resultado primário e não apenas do aumento da carga de juros. O gasto
público primário federal total cresceu em termos reais em todos os oito anos dos dois
governos de Fernando Henrique Cardoso a uma média de 6% ao ano, mais do dobro da
taxa de crescimento médio do PIB de 2,4% ao ano.
O aparecimento de quase-déficits nos bancos federais e estaduais agravou os problemas
fiscais. Por exemplo: o Banco do Brasil (fonte tradicional de crédito subsidiado do setor
agrícola) e o Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) lançaram programas de
crédito subsidiado a exportadores em 1996. O Tesouro Nacional precisou capitalizar o
Banco do Brasil com um aporte de R$ 7,9 bilhões (1% do PIB). As transferências
intergovernamentais contribuíram para um aumento do valor total líquido da dívida
26
líquida do setor público, que passou de 30% do PIB em 1995 para 35% do PIB em 1996
(tabela 2).
A partir de 1995, uma dívida crescente financiou o aumento dos gastos do governo. A
combinação do aumento de juros com déficits primários gerou uma dinâmica perversa.19
As taxas reais de juros eram muito mais altas que as de crescimento econômico e
contribuíam para o crescimento explosivo da dívida pública. Na defesa contra ataques
especulativos, que se repetiram em 1995 (crise do México), 1997 (crise asiática) e 1998
(crise russa), o Banco Central teve de recorrer a aumentos das taxas de juros, que
agravaram ainda mais o desequilíbrio fiscal.
Goldfajn e Guardia (2003) simulam o comportamento da dívida e mostram que uma
política de geração de superávits primários de 3,5% do PIB desde 1995, mesmo na
presença de outros fatores adversos, teria mantido a relação dívida/PIB pouco acima de
30% em 2002, em vez dos 55,5% então observados. Mas, na ausência de superávits
primários, uma taxa Selic real média, entre 1994 e 1998, acima de 20% (mais de seis
vezes maior que a taxa média de crescimento no período), levou ao crescimento em bola
de neve da relação dívida/PIB. O colapso do real em 1999 e sua forte depreciação em
2002 viriam agravar ainda mais o peso da dívida.
A sobrevalorização cambial
A partir de 1994, a liquidez internacional, a queda dos juros nos Estados Unidos e as altas
taxas de juros no Brasil combinaram-se para trazer os capitais que financiaram
desequilíbrios externos crescentes. Entre junho de 1994 e fevereiro de 1995, o real
apreciou-se em torno de 30%. A adoção de um sistema de banda cambial que permitia
uma depreciação nominal e gradativa do real não foi suficiente para reverter a
valorização do real. A balança comercial refletiu a perda de competitividade. O superávit
de US$ 11 bilhões em 1994 passou a um déficit de US$ 3 bilhões em 1995. O déficit em
conta corrente chegou a 4% do PIB em 1997 e os passivos externos líquidos cresceram de
19
Ver, por exemplo, Castelar Pinheiro e outros (2001) e Pastore e Pinotti (1999).
27
forma acentuada, como mostra a figura 13. O país tornou-se, assim, mais vulnerável a
choques externos.
A crise asiática evidenciou a necessidade de ajustes. A depreciação nominal de 8% ao
ano, enquanto a inflação era comparável a níveis internacionais, levou a uma depreciação
real, porém insuficiente para fazer face aos desequilíbrios externos na ausência de ajustes
fiscais. A política monetária tornou-se mais restritiva. A elevação das taxas de juros
afetou de forma negativa o crescimento e as contas públicas.
Apesar da desvalorização em 1997 e 1998, a taxa de câmbio real, no fim de 1998,
continuava sobrevalorizada e nenhuma mudança estrutural ou crescimento antecipado
justificava a valorização. A balança comercial persistia em franca deterioração. Entre
1995 e 1998, a taxa de crescimento das exportações em dólares registrou modestos 4,2%
ao ano em contraste com os 11,3% ao ano entre 1991 e 1994.
A moeda forte prejudicou o setor industrial e provocou um aumento do desemprego. O
governo reagiu canalizando crédito subsidiado para os exportadores através do BNDES e
aprovando legislação para isentar as exportações de impostos indiretos. Nenhuma dessas
medidas foi suficiente para compensar o efeito da sobrevalorização.
O problema da valorização real acumulada é comum a outros programas de estabilização
que utilizam a taxa de câmbio como âncora: no Chile entre 1975 e 1982 (figura 14), no
México entre 1987 e 1993 (figura 15) e na Argentina entre 1990 e 2001 (figura 16). Esses
casos mostram que o uso prolongado da âncora cambial no processo de desinflação cria
sobrevalorização cambial enquanto a taxa de inflação doméstica exceder a soma da
inflação externa com a depreciação cambial. A sobrevalorização é ilustrada nas figuras
14 a 16 pela área compreendida entre o eixo horizontal e a linha que representa a
diferença percentual entre a taxa de inflação e a taxa de depreciação cambial. Para que a
sobrevalorização acumulada desapareça, é preciso que a taxa de depreciação cambial
supere a taxa de inflação por um tempo suficientemente longo para gerar uma área abaixo
do eixo horizontal que compense a área anteriormente acumulada acima desse eixo.
28
Muitas vezes, como no Brasil em 1998 (figura 17), a desvalorização real começa a se
concretizar antes da crise. Mas, como o processo gradual leva tempo e seus efeitos sobre
os desequilíbrios externos demoram a se materializar, a percepção de que o déficit em
conta corrente é insustentável provoca um estancamento dos fluxos de capitais que antes
financiavam a conta corrente deficitária. O resultado é um colapso da moeda.
Durante o período que antecede a crise, mesmo quando a valorização se combina com
reformas fiscais e privatizações, o crescimento da produtividade é insuficiente para
contrabalançar o efeito da valorização cambial. Assim é que as experiências de
sobrevalorização cambial na América Latina terminaram com uma crise do balanço de
pagamentos e forte desvalorização. No Brasil, na segunda metade da década de 1990, as
políticas cambial, fiscal e monetária acabaram por reduzir a poupança nacional e criar
déficits insustentáveis na conta corrente do balanço de pagamentos.
Mesmo cientes de que a sobrevalorização cambial é insustentável, poucos governos
conseguem resistir à tentação de deixar a taxa de câmbio valorizar-se enquanto afluem
recursos para financiar o déficit em conta corrente. O argumento comumente usado é de
que o crescimento da produtividade do setor de bens de consumo é suficiente para
justificar uma valorização real e que o déficit em conta corrente reflete as importações de
bens de capital que gerarão exportações futuras, possibilitando o pagamento dos passivos
acumulados. A dura realidade é que o crescimento da produtividade teria de estar bem
acima do que se poderia imaginar para justificar a valorização cambial observada no
início dos programas de estabilização que usam a âncora cambial sem um forte ajuste
fiscal.
Apesar de o Plano Real ter sobrevivido bem ao choque mexicano no final de 1994, em
meados de 1995 os desafios persistiam. O ajuste fiscal insuficiente continuava a pesar
sobre a política monetária e cambial. A falta de confiança na capacidade do governo em
sustentar a âncora cambial refletiu-se na tendência cada vez mais acentuada de corrigir as
dívidas do setor público pela indexação ao dólar e às taxas de juros pós-fixadas.
29
A crise asiática de 1997 provocou um rápido pânico, mas o verdadeiro solavanco veio
com a crise russa e sua inadimplência. Entre agosto e setembro de 1998, o Brasil perdeu
US$ 30 bilhões de reservas. Ficou claro que a apreciação cambial dos anos anteriores
fora uma falsa solução que adiara os ajustes indispensáveis.
Enquanto o Brasil lutava para defender a moeda frente ao choque externo e às incertezas
da eleição presidencial, o FMI agiu rapidamente na montagem de um pacote de
empréstimo. Em dezembro de 1998, o Brasil firmou um contrato de assistência financeira
de US$ 41,5 bilhões. As contribuições vinham do FMI (US$ 18 bilhões), do Banco
Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (US$ 4,5 bilhões cada um) e de
credores bilaterais (US$ 5 bilhões fornecidos pelos Estados Unidos e US$ 9,5 bilhões
pelos governos europeus). O programa inicial tinha como meta reduzir a NFSP de 7,5%
do PIB para 4,7% em 1999.
O programa foi logo superado pelos acontecimentos. Fugas de capital forçaram a
desvalorização do câmbio. No dia 15 de janeiro de 1999, o real passou a flutuar
livremente e até o final de fevereiro já havia sofrido uma desvalorização de 35%. Após a
queda, a taxa de câmbio real, durante o primeiro semestre de 1999, ficou muito próxima
daquela que vigorara antes da implantação do Plano Real e se estabilizou em torno de R$
1,68/US$ 1 no início de maio de 1999.
A desvalorização criava o risco de uma alta acentuada da inflação, que reduziria as taxas
de juros reais e alimentaria a fuga de capitais. Ao mesmo tempo, tinha um forte impacto
sobre a dívida indexada ao dólar. Nessas circunstâncias, as autoridades monetárias
precisavam conter uma desvalorização continuada e uma espiral inflacionária com um
aumento da taxa de juros.
O acordo entre o Brasil e o FMI, anunciado em março de 1999, tinha dois objetivos
claros: limitar o impacto inflacionário da desvalorização através de aumentos da taxa de
juros e prevenir, através da geração de superávits primários, a explosão da relação
30
dívida/PIB. O acordo reconhecia que o custo dessas políticas seria uma recessão e
calculava uma redução do PIB em 1999 em torno de 3,5%.
O grande problema para o Banco Central era a decisão não só sobre o tamanho do
aumento da taxa de juros em resposta ao choque, mas também seu ajustamento, uma vez
estabilizada a taxa de câmbio. Um aumento pequeno e tardio levaria a um agravamento
da inflação, que poderia destruir a confiança externa. Um aumento muito grande
acarretaria uma recessão muito profunda, com a inflação caindo rapidamente e
contribuindo para um aumento ainda mais forte da taxa de juros real e mais recessão.
Essa combinação agravaria a situação fiscal e reduziria a confiança na capacidade do
governo de honrar sua dívida, além de minar a confiança na decisão do governo de
sustentar uma política monetária apertada. A tarefa das autoridades monetárias era,
portanto, depois do aumento inicial da taxa de juros, negociar um caminho declinante
para a inflação e uma taxa de juros dependente da credibilidade no programa.
Para surpresa de muitos, o Brasil conseguiu superar a crise com extraordinária
velocidade. A taxa de câmbio, que chegara a R$ 2,21/US$ 1 em março de 1999,
recuperou-se em maio do mesmo ano e estabilizou-se em torno de R$ 1,68/US$ 1. A taxa
Selic caiu de 45% em março de 1999 para 23% em maio e a inflação medida pelo índice
nacional de preços ao consumidor passou de uma taxa anual de 16% ao ano em março
para 6% ao ano em abril. O novo regime de taxa flutuante impunha o uso de uma nova
âncora nominal, que acabou surgindo na forma do regime de metas de inflação.
Longe de resvalar numa profunda recessão, a economia cresceu. Para a reviravolta
contribuiu uma boa dose de sorte. A produção agrícola cresceu 18% no primeiro trimestre
de 1999, graças a uma safra recorde, decorrente de boas condições climáticas. Os juros
nos Estados Unidos permaneceram baixos. O apoio externo conferiu credibilidade ao
programa. Os investidores mostraram confiança na combinação das políticas monetária e
fiscal anunciadas pelo governo. A queda do real motivou o congresso a aprovar medidas
importantes: uma reforma parcial do sistema previdenciário anteriormente rejeitada, a
31
elevação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira e a introdução de
medidas para conter gastos dos governos estaduais e municipais.
O setor bancário também representou um papel importante na recuperação. Muitos
bancos haviam previsto a desvalorização e se posicionado de forma a obter lucros com
seus contratos futuros (o grande perdedor foi o Banco do Brasil). Seus ativos e passivos
não estavam descasados, porque mantinham em suas carteiras títulos públicos atrelados
ao dólar. Como não houve default do setor público, os bancos se mantiveram saudáveis.
Portanto, o sistema bancário não pôs em risco o programa de juros altos, como ocorreu na
Ásia em 1997 e no México em 1995, onde a fragilidade do sistema ameaçou o programa
de estabilização.
Por último, a revisão das expectativas de inflação permitiu ao Banco Central reduzir a
taxa Selic seis vezes no prazo de sete semanas sem criar a impressão de que estava
abandonando uma política monetária responsável. A adoção do regime de metas de
inflação deu maior transparência à política monetária e o Brasil chegou a 2000 em grande
forma.
Oito anos depois do Plano Real
A partir de 1999, houve ajustamento fiscal com aumento da carga tributária e contração
dos investimentos. Mas os gastos correntes do governo continuaram a crescer, assim
como a relação dívida pública/PIB.
Em 2002, a percepção dos riscos de uma dívida grande combinou-se à incerteza do ano
eleitoral e ao aperto da liquidez internacional para gerar mais uma crise. A discussão em
torno da escolha das políticas monetárias e fiscais em 2002 mostrou claramente que o fim
da inflação no Brasil ainda depende de uma solução para os desequilíbrios fiscais.
Blanchard (2004) e Fávero-Giavazzi (2004) advertem que a adoção de metas de inflação
pode trazer mais prejuízos do que benefícios no caso de o Banco Central não poder
controlar de fato a inflação. Os dois trabalhos mostram que o risco de crédito é o canal
32
através do qual choques financeiros externos podem empurrar uma economia emergente
a um regime de dominância fiscal, em particular se uma dívida pública denominada em
dólares interage com a volatilidade externa para criar mais um canal de instabilidade.
A política monetária pode falhar se um choque aumentar a expectativa de inflação e o
Banco Central elevar a taxa de juros real, o que provocaria um aumento da dívida
pública. Se a política fiscal não se altera, o risco-país aumenta, a taxa de câmbio
deprecia-se e a dívida cresce ainda mais. A depreciação cambial também aumenta a
inflação e as expectativas de inflação, provocando um novo aumento da taxa Selic. Esse
círculo vicioso é representado no braço esquerdo da figura 18.
O Brasil encontrava-se perto dessa armadilha em 2002. A razão para a percepção de um
risco de default em 2002 não foi um aumento da taxa de juros real, mas a incerteza
política combinada à restrição de liquidez que se seguiu ao escândalo da empresa Enron
nos Estados Unidos. Se as taxas de juros reais tivessem subido durante o segundo
semestre de 2002, a combinação de um aumento da taxa de juros real com uma dívida
elevada poderia ter causado um desastre que, contudo, não chegou a se materializar.
A política monetária não foi muito apertada. O Banco Central não tentou atingir a meta
de inflação. Evitou, assim, que a economia mergulhasse no círculo vicioso descrito na
figura 18. Em 2003, com o aumento do risco-Brasil, medido pelo índice EMBI+, a taxa
de câmbio real depreciou-se e a parcela da dívida indexada ao dólar na dívida total
aumentou. A relação dívida líquida/PIB atingiu um pico de 63% em meados do ano. Mas
o declínio da taxa Selic real reduziu essa relação para 56% do PIB no final de 2002.
Percebendo a dificuldade de rolar a dívida, o Banco Central amortizou-a parcialmente
com impressão monetária. Parte desse dinheiro voltou ao mercado do overnight,
reduzindo a maturidade da dívida. Parte transformou-se em dólares e o país passou a
contribuir para a depreciação do câmbio. Outra parte transformou-se em depósitos à vista,
contribuindo para o aumento da senhoriagem, já que o Banco Central aumentou as
reservas compulsórias dos bancos comerciais no segundo semestre de 2002.
33
Entre maio e outubro de 2002, o Banco Central adiou um aumento da taxa de juros. Parte
do mercado financeiro temia que, com mais da metade da dívida pública indexada à taxa
de juros, o Banco Central monetizasse parte da dívida ao manter a taxa Selic baixa e
deixar a inflação subir. O medo do default pela inflação explica em parte a fuga da dívida
indexada à taxa Selic em favor de ativos externos e da dívida de prazo muito curto
indexada ao câmbio. As taxas de juros implícitas nos swaps de 360 dias entre dívida
indexada e não indexada aumentaram bem acima da taxa Selic, indicando tanto o medo
de default quanto a expectativa de inflação em alta.
Quando o Banco Central resolveu apertar a política monetária, entre o final de 2002 e
junho de 2003, a situação já estava sofrendo uma reviravolta. Vale a pena notar a
reversão de expectativas operada pelo Partido dos Trabalhadores (PT) no governo, em
contraste com o PT na oposição. A crise de confiança de 2002, gerada por 20 anos de
pregação incendiária, foi desarmada pelo PT no governo, que, com a Carta aos
Brasileiros, anunciou a nomeação para presidente do Banco Central de Henrique
Meirelles em Washington, aderiu a uma meta fiscal mais apertada do que a requerida
pelo FMI e aprovou mais uma reforma da previdência. O aumento de tributação, um dos
elementos de desarme da crise, fazia parte de um quadro mais amplo de reversão de
expectativas e de uma nova aliança política, que afastou a esquerda radical do governo.
Depois da eleição presidencial, o anúncio de uma política fiscal mais apertada coincidiu
com uma maior liquidez internacional. O risco-país declinou e a taxa de câmbio começou
a apreciar-se. Ao mesmo tempo, a inflação cedeu e as taxas de juros reais tornaram-se
altamente positivas. O Banco Central manteve-as altas até sentir mais confiança na
convergência das expectativas de inflação em direção à meta. A combinação da taxa de
juros alta e da política fiscal mais restritiva resultou na estagnação do PIB em 2003 e a
relação dívida/PIB aumentou (tabela 2).
O comportamento do PIB é crítico para a dinâmica da dívida. Mesmo que o efeito da taxa
de juros sobre a demanda não seja muito forte, a combinação de juros altos com aperto
34
fiscal o é, como o foi em 2003. Se o efeito multiplicador do aumento do superávit
primário sobre o PIB é igual a um, o aumento do superávit reduz a dívida e o PIB na
mesma proporção. Assim, a dinâmica da dívida só é favorável em duas circunstâncias.
Primeiro, se o aumento do superávit primário induz a confiança que permite reduzir a
taxa de juros real. Segundo, se um choque positivo dos termos de intercâmbio induz o
crescimento do PIB, mesmo na presença de políticas macroeconômicas restritivas.
Conclusões
Este capítulo contou a história da inflação brasileira desde a época do encilhamento –
especulação bolsista nos primeiros anos da República – quando um excesso de crédito e a
ausência da disciplina de um Banco Central geraram uma explosão inflacionária. Mas,
mesmo quem aprendeu com Milton Friedman que sem dinheiro não há inflação, sabe que
no curto prazo as oscilações da inflação resultam do nível de atividade, dos choques de
oferta, das variações do câmbio e das expectativas. Essas oscilações cíclicas se dão em
torno de uma inflação mais pertinaz, cuja raiz é um desequilíbrio fiscal permanente. No
Brasil, entre 1958 e 1964, essa taxa de inflação persistente superava 40% ao ano. Entre
1976 e 1978, os 60%. Na segunda metade da década de 1980, mais de 1.000% ao ano.
Inércia, excesso de demanda e choques de oferta à parte, a inflação aumentava porque
uma retumbante expansão monetária se combinava à NFSP para criar uma dinâmica
perversa. A inflação ajudava a transferir recursos para o financiamento do déficit fiscal. E
reconciliava no orçamento público as demandas de diferentes setores, pois reduzia os
gastos reais correspondentes a promessas de recursos nominais não indexados.
Durante os anos de megainflação, os fluxos de capital estancaram-se. O Brasil declarara
uma moratória em 1987, que só foi renegociada em 1992. Com a solução da moratória, a
redução das taxas de juros nos EUA e o aumento da liquidez internacional, as entradas
anuais de capital passaram a 2% do PIB entre 1992 e 1994. Fluxos de capitais abundantes
permitiram o uso da âncora cambial no Plano Real. A partir de então, a inflação
convergiu para um dígito, mas a situação fiscal continuou desequilibrada. Em 1998-99 e
2002, incertezas eleitorais e redução de liquidez externa forçaram a depreciação do
35
câmbio e aumentaram a dívida indexada ao dólar. Levantou-se a suspeita de que o
governo não poderia honrar a dívida, o que tornaria a política monetária perversa: um
aumento da taxa de juros real geraria medo de moratória, depreciação cambial e mais
inflação. Era o fantasma da dominância fiscal a assombrar o Brasil.
Aumentos de impostos afugentaram o fantasma e trouxeram a economia de volta à
normalidade monetária. Mas a dívida, a desconfiança e a taxa de juros continuaram altas
e sem solução. Projetam-se para 2004 uma NFSP de 3% do PIB e uma taxa de inflação
abaixo de 8% ao ano. Mas essa NFSP baixa resulta em parte do ciclo econômico e pode
durar pouco. Além disso, como ainda é positiva, aumenta a dívida. A dívida alta gera a
expectativa de que parte dela venha a ser monetizada no futuro. Essa expectativa se
reflete, por sua vez, na expectativa de inflação.
A política monetária funciona, pois um aumento da taxa de juros real age sobre a inflação
através de diferentes canais. Sinaliza o compromisso com a inflação baixa e, portanto,
reduz as expectativas inflacionárias. Aprecia o câmbio e, portanto, reduz custos. Esfria a
demanda e, portanto, freia os salários. Os custos dessa política, entretanto, são
intoleráveis, porque o principal impacto de um aumento da Selic é sobre a dívida pública,
o que agrava o desequilíbrio fiscal.
Um corte dos gastos do governo, mantida a Selic, teria efeitos benéficos sobre a inflação.
E, de quebra, evitaria a piora das contas fiscais provocada pelo efeito do aumento da
Selic no serviço da dívida. Para reduzir a inflação numa economia que sofre de dívida
alta, é melhor cortar os gastos do governo do que aumentar a taxa de juros.
O modelo desenvolvido neste capítulo sugere que o mecanismo de financiamento
inflacionário dos déficits fiscais teve um papel-chave na inflação brasileira da década de
1980 até 1994 e que a taxa de inflação não era indeterminada, como se apregoou em
modelos que representaram a inflação brasileira como um random walk. O fracasso dos
programas heterodoxos, que faziam a inflação desaparecer durante os períodos de
congelamento para retornar com força redobrada quando estes eram suspensos, apontava
36
para a existência de mecanismos de perpetuação da inflação que iam além da pura inércia
e da aleatoriedade dos choques.
O Plano Real restabeleceu a normalidade de taxas inflacionárias de um dígito, porém bem
mais elevadas que as taxas de inflação no resto do mundo. Como a dívida é alta, o
ajustamento fiscal ainda não foi suficiente para permitir uma redução das taxas de juros.
Em 2004, o contexto internacional favorável e um choque positivo dos termos de
intercâmbio permitiram à economia crescer cerca de 5%, mas o país continua preso aos
dilemas da dívida e dos juros altos. A verdade é que não existe solução para a inflação
crônica e os juros altos que não passe por um ajuste fiscal. Esse, por sua vez, exige um
corte dos gastos correntes, dos subsídios e das renúncias fiscais.
37
Apêndice
Se r é a taxa de juros real, π é a taxa de inflação e α é a fração da taxa de inflação que
corresponde à correção monetária da dívida, o pagamento corrente de juros e correção
monetária da dívida é {[r(t) + α π(t-1)] . D(t-1)}. O governo pode financiar o pagamento
de juros e correção monetária mais o déficit primário, G(t), por um aumento da base
monetária, H(t) – H(t-1), ou por um aumento da dívida, D(t) – D(t-1). Daí a identidade
orçamentária:
G(t) + [r(t) + α π(t-1)] . D(t-1) ≡ [H(t) – H(t-1)] + [D(t) – D(t-1)]
(1.A)
Divida todos os termos acima pelo produto corrente, y(t), e pelo nível de preços
correntes, p(t).
Multiplique os termos D(t-1) e H (t-1) por 1, isto é, por {y(t-1) p(t-1)/ y(t-1) p(t-1)} e, em
seguida, substitua a expressão [p(t)/p(t-1)] por [1 + π(t)] e a expressão [y(t)/y(t-1)] por [1
+ x(t)], onde x é a taxa de crescimento do produto.
Substitua a expressão H(t)/[y(t) p(t)] por h (t), a participação da base no produto.
Substitua a expressão D(t)/[y(t) p(t)] por d (t), a participação da dívida no produto.
Substitua a expressão G(t)/[y(t) p(t)] por g (t), a participação do déficit primário no
produto.
A identidade orçamentária (1.A) pode então ser reescrita como:
g(t) + {[r(t) + α π(t-1)]/[(1+ π(t).(1 + x(t)]} d(t-1) ≡
≡ [h(t) – h(t-1)] + [d(t) – d(t-1)] + ({[(1+ π(t).(1 + x(t)] – 1}/[(1+ π(t).(1 + x(t)]) h(t-1)
+ {{[(1+ π(t).(1 + x(t)] – 1}/[(1+ π(t).(1 + x(t)]} d(t-1)
(2.A)
Colecionando os termos:
g(t) ≡ [h(t) – h(t-1)] + [d(t) – d(t-1)] +
+ {[(1+ π(t).(1 + x(t)] – 1}/[(1+ π(t).(1 + x(t)]) h(t-1) +
38
+ {{[(1+ π(t).(1 + x(t)] – 1 – [r(t) + α π(t-1)]}/[(1+ π(t).(1 + x(t)]} d(t-1)
Supondo-se que a elasticidade da demanda por encaixes reais em relação à renda é
unitária, a participação dos encaixes monetários na renda é uma função inversa da taxa de
inflação:
h(t) = h (π(t))
(3.A)
O estoque de dívida é igual à riqueza menos os encaixes reais:
d(t) = w(t) – h (π(t))
(4.A)
Substitua (3.A) e (4.A) em (2.A).
Assuma, como no modelo inflacionário clássico, cujo propósito é ilustrar a determinação
da taxa de inflação, que a taxa de crescimento do produto, x, e a taxa de juros real, r, são
ambas iguais a zero.
Em steady state, h(t) = h(t-1) e w(t) = w(t-1). Portanto, podemos escrever:
g = [απ/(1 + π)] h(π) + [(1-α)π/(1 + π)]w
(5.A)
Se a correção monetária é imperfeita, α<1. Se a correção monetária excede a taxa de
inflação, α>1.
Se α = 1:
g = [π/(1 + π)] h(π)
(6.A)
Nesse caso, o imposto inflacionário sobre a dívida corresponde ao pagamento da correção
monetária sobre a dívida e o imposto inflacionário sobre os encaixes reais financia o
déficit primário.
39
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43
Tabela 1
Desvios do PIB em relação ao produto potencial e taxa de inflação
Médias no período
Brasil, 1951-2002
Período
Desvio do PIB* Taxa de inflação**
(%)
(% ao ano)
1951 – 57
-0.7
16
1958 – 64
2.0
52
1965 – 73
-2.2
24
1974 – 81
1.3
59
1982 – 85
-1.7
196
1986 – 89
1.7
906
1990 - 1994 -1.4
1328
1995 - 2002 0.4
13
* Média no período da diferença entre o logaritmo do PIB observado e o logaritmo
do PIB potencial estimado pela metodologia de suavização da série histórica do PIB
através do uso do filtro de Hodrick-Prescott (com λ = 100).
** Média no período da taxa de variação do IGP-DI ao ano.
Fonte: Ipeadata e elaboração do autor.
44
Tabela 2
Relação dívida líquida do setor público/PIB
Brasil, 1981-2003
(Porcentagem)
Ano
Série 1
1981
1982
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
29.5
45.5
55.4
56.9
43.9
46.7
62.7
88.7
35.7
52.7
57.3
65.2
24.5
28.0
30.7
33.2
38.0
46.3
49.0
51.1
57.3
59.2
Série 2
Série 3
26.7
32.4
51.4
55.5
52
49.1
49.6
47
40.2
41
36.8
37.1
32.2
30
30.6
33.3
34.3
41.7
48.7
48.8
52.6
55.5
58.7
A série 1 corresponde à participação no PIB da média da dívida nominal líquida do setor
público em dezembro corrente e em dezembro do ano anterior. A série da dívida nominal
encontra-se disponível no Ipeadata e a fonte são os boletins do Banco Central.
A série 2 corresponde à dívida líquida do setor público em final do período, série não
revista, disponível em números antigos do Boletim do Banco Central.
A série 3 é a dívida líquida do setor público como porcentagem do PIB, revista e
disponível no site do Banco Central do Brasil.
45
Tabela 3
Necessidade de financiamento do setor público (NFSP)
Porcentagem do PIB
Déficit primário*
Juros
do
setor NFSP
público
1994
-5,2
32,2
27,0
1995
-0,27
7,54
7,27
1996
0,09
5,77
5,86
1997
0,97
5,10
6,07
1998
-0,02
7,49
7,47
1999
-3,21
8,97
5,76
2000
-3,45
7,08
3,63
2001
-3,63
7,21
3,58
2002
-3,89
8,48
4,59
2003
-4,37
9,58
5,22
2004 (12 meses até -4,81
7,68
2,87
outubro)
Déficit primário*: sinal negativo indica um superávit.
Fonte: Banco Central do Brasil.
46
Tabela 4
Taxa de inflação e imposto inflacionário
Porcentagem no período e porcentagem da renda
Taxa de inflação Taxa de inflação Imposto
anual
diária
Imposto
Imposto
inflacionário em inflacionário em inflacionário em
% da renda
% da renda
% da renda
Cenário 1
Cenário 2
Cenário 3
10
0,026
0,09
0,10
0,20
30
0,072
0,26
0,27
0,54
50
0,111
0,40
0,42
0,83
100
0,190
0,67
0,70
1,40
200
0,301
1,07
1,09
2,19
300
0,381
1,34
1,36
2,73
400
0,442
1,55
1,57
3,14
500
0,492
1,73
1,73
3,47
1.000
0,659
2,30
2,26
4,53
2.000
0,838
2,90
2,80
5,60
3.000
0,945
3,26
3,11
6,22
4.000
1,023
3,51
3,33
6,65
Notas: O imposto inflacionário como porcentagem da renda é calculado como
(π/(1+π)).(m/y), onde π é a taxa de inflação, m são os encaixes monetários, incluindo
depósitos à vista, e y é a renda.
O cenário 1 supõe que os salários são pagos semanalmente e que os trabalhadores
mantêm metade do salário em forma de encaixes monetários.
O cenário 2 supõe que os salários são pagos mensalmente e que os trabalhadores
mantêm um oitavo do salário em forma de encaixes monetários.
O cenário 3 supõe que os salários são pagos mensalmente e que os trabalhadores
mantêm um quarto do salário em forma de encaixes monetários.
47
Tabela 5
Erosão dos salários por causa da inflação
Taxa de inflação
Diferença percentual entre o salário real
(% ao ano)
médio e o salário reajustado no pico com
indexação mensal e inflação constante
100
3
500
7
1.000
10
4.000
15
48
Figura 1
Taxa de inflação
(Porcentagem ao ano)
Brasil, 1871-1913
30
25
20
15
10
5
0
-5
-10
-15
Fonte: Catão, 1992.
1913
1911
1909
1907
1905
1903
1901
1899
1897
1895
1893
1891
1889
1887
1885
1883
1881
1879
1877
1875
1873
1871
-20
49
Figura 2
EXPECTATIVAS DE CÂMBIO E EXPECTATIVAS DE INFLAÇÃO 2002
R$/US$
EM %
14,00
3,80
12,51
Coeficientes de Correlação:
- Exp. Câmbio X Exp. Inflação: 0,91
12,50
3,52
11,00
3,30
Expectativa de
câmbio
9,50
3,06
2,87
8,14
8,00
2,80
6,50
2,55
2,53
5,56
5,14
2,30
2,03
3,77
2,00
3,20
5,00
4,75
3,99
2,29
Expectativa de
inflação
3,50
dez-02
nov-02
set-02
out-02
jul-02
ago-02
jun-02
abr-02
mai-02
mar-02
jan-02
fev-02
dez-01
nov-01
set-01
out-01
jul-01
ago-01
jun-01
abr-01
mai-01
mar-01
jan-01
fev-01
dez-00
nov-00
set-00
out-00
2,00
ago-00
1,80
FONTE: BACEN
ELABORAÇÃO: BRADESCO
Fonte: Banco Central do Brasil, elaboração do departamento de pesquisa do Banco
Bradesco.
50
Figura 3
EXPECTATIVAS DE CÂMBIO E EXPECTATIVAS DE INFLAÇÃO 2003
R$/US$
15,00
13,50
12,48
3,70
12,00
Expectativa de
câmbio
3,30
3,20
9,02
2,97
10,50
9,67
9,65
9,20
9,00
3,02
2,96
7,50
2,81
2,70
2,63
6,00
5,50
4,50
4,09
2,32
4,03
2,20
Coeficientes de Correlação:
- Exp. Câmbio X Exp. Inflação: 0,88
3,02
3,00
Expectativa de
inflação
1,50
dez-03
nov-03
set-03
out-03
jul-03
ago-03
jun-03
abr-03
mai-03
jan-03
fev-03
dez-02
nov-02
set-02
out-02
jul-02
ago-02
jun-02
abr-02
mai-02
jan-02
fev-02
dez-01
nov-01
set-01
out-01
jul-01
ago-01
jun-01
0,00
abr-01
1,70
FONTE: BACEN
ELABORAÇÃO: BRADESCO
Fonte: Banco Central do Brasil, elaboração do departamento de pesquisa do Banco
Bradesco.
Fonte: Ipeadata.
LOG(PIB)
LOG(Potencial)
2003
2001
1999
1997
1995
1993
1991
1989
1987
1985
1983
1981
1979
1977
1975
1973
1971
1969
1967
1965
1963
1961
1959
1957
1955
1953
1951
1949
1947
51
Figura 4
PIB observado e potencial
2.1
1.9
1.7
1.5
1.3
1.1
0.9
52
Figura 5
Taxa de crescimento anual do PIB e do produto potencial
Brasil, 1948-2004
15.0%
10.0%
5.0%
0.0%
-5.0%
Taxa PIB
Taxa Potencial
Fonte: Ipeadata. Produto potencial obtido com filtro HP.
2004
2002
2000
1998
1996
1994
1992
1990
1988
1986
1984
1982
1980
1978
1976
1974
1972
1970
1968
1966
1964
1962
1960
1958
1956
1954
1952
1950
1948
-10.0%
53
Déficit e Senhoriagem como % do PIB
Figura 6
Déficit
Senhoriagem
0
0
0.5
1
1.5
2
Inflação
2.5
3
3.5
54
Déficit e Senhoriagem como % do PIB
Figura 7
Déficit
Senhoriagem
0
0.5
1
1.5
2
-0.05
Inflação
2.5
3
3.5
55
Figura 8
Medidas da dívida líquida do setor público como porcentagem do PIB
Brasil, 1982-2003
100.0
90.0
80.0
70.0
60.0
50.0
40.0
30.0
20.0
10.0
Série 1
Fonte: Tabela 2.
Série 2
2003
2002
2001
2000
1999
1998
1997
1996
1995
1994
1993
1992
1991
1990
1989
1988
1987
1986
1985
1984
1983
1982
0.0
56
Figura 9
Necessidade de financiamento do setor público e
acréscimos à dívida líquida do setor
Brasil, 1983-2003
Porcentagem do PIB
90
80
70
60
50
40
30
20
10
Financiamento
03
02
20
01
20
00
20
98
99
20
19
97
19
96
19
95
19
94
19
92
93
19
19
91
19
90
19
89
19
87
88
19
19
86
19
85
19
84
19
19
19
83
0
Déficit
Nota: Financiamento da NFSP por aumentos da média anual da dívida líquida,
incluindo aumentos da base monetária.
Fonte: Ipeadata.
57
Deficit e Financiamento
Figura 10
0
-0.02
Inflação
Déficit e Financiamento
58
Figura 11
0
0
Inflação
59
Figura 12
Necessidade de financiamento do setor público e inflação
4
3.5
3
Log (Inflação)
2.5
2
1.5
1
0.5
0
0
10
20
30
40
50
NFSP/PIB
Fonte: Ipeadata.
60
70
80
90
60
Figura 13
Acumulação de passivos externos líquidos antes do colapso do real
Brasil, 1953-1997
200000
Período 1:
Capital
Externo Ausente
Período 3:
Capital
Em fuga
Período 2:
Capital Externo Em
Excesso
Período 4:
Novo
Excesso
l
150000
50000
-50000
Ano
1997
1996
1994
1995
1993
1992
1991
1990
1989
1988
1987
1986
1985
1984
1983
1982
1981
1980
1979
1978
1977
1976
1975
1974
1973
1972
1971
1970
1969
1968
1967
1966
1965
1964
1963
1962
1961
1960
1959
1958
1957
1956
1955
1954
0
1953
Milhões de Dólares
100000
61
Figura 14
Diferença percentual entre a taxa de inflação e a taxa de depreciação cambial
Chile, 1978-1985
Chile
40
30
20
10
0
-10
-20
-30
-40
Fonte: International Monetary Fund.
1985
1984
1983
1982
1981
1980
1979
1978
-50
62
Figura 15
Diferença percentual entre a taxa de inflação e a taxa de depreciação cambial
México, 1990-1995
Mexico
30
20
10
0
1990
1991
1992
-10
-20
-30
-40
-50
Fonte: International Monetary Fund.
1993
1994
1995
63
Figura 16
Diferença percentual entre a taxa de inflação e a taxa de depreciação cambial
Argentina, 1990-2002
Argentina
200
150
100
50
0
-50
Fonte: International Monetary Fund
2002
2001
2000
1999
1998
1997
1996
1995
1994
1993
1992
1991
1990
-100
64
Figura 17
Diferença percentual entre a taxa de inflação e a taxa de depreciação cambial
Brasil, 1994-1998
Brasil
80
60
40
20
0
1994
-20
-40
-60
-80
-100
Fonte: Ipeadata.
1995
1996
1997
1998
1999
65
Figura 18
A dinamica dos juros e do cambio
Duas historias antagonicas
Incerteza leva aa fuga de capital
e aa desvalorizacao do real
BC Aumenta a Selic
em resposta
ao efeito inflacionario
da desvalorizacao do real
Efeito do diferencial de taxas de juros
menor que
efeito do aumento da divida sobre risco-pais:
fluxo de capital externo cai
Efeito do diferencial de taxas de juros
maior que
efeito do aumento da divida sobre o risco-pais:
fluxo de capital externo aumenta
O real se desvaloriza
O real aprecia
Impacto da desvalorizacao sobre
a divida domina o efeito sobre
as exportacoes. Capital foge.
O real volta a se desvalorizar
Impacto da apreciacao sobre
a divida supera o efeito
negativo sobre exportacoes
O capital externo retorna.
Circulo Vicioso
Restricao monetaria atua tambem
sobre expectativas e atividade.
BC restabelece
confianca na meta de inflacao.
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