A Saúde e o Direito V Conferência: Questões Éticas, Jurídicas e de Saúde Escola Superior de Saúde do Algarve, 3 de Novembro de 2016 joão vaz rodrigues | [email protected] professor auxiliar UÉv. | associado do CDBM|FDUC | Associação Lusófona de Direito da Saúde :ALDIS | Conselho de Ética do INSA Ricardo Jorge e da SCME | Vogal CSM | advogado (vrcpsc – advogados) A Saúde e o direito 2016, FARO MESA 2: ;Morte medicamente assistida, Eutanásia, Distanásia PELA HORA DA MORTE 2.ª Mesa Redonda: 14/01/2011 Obstinação: Os desafios Ética & Técnica Título da Conferência: Pela Hora da Morte… ist João Vaz Rodrigues (Universidade de Évora) Comentadores: Barros Veloso (OMAna Gonilho (OA) Obstinação médica: existe um percurso até à Distanásia? A medicina visa a manutenção ou recuperação da saúde, i.e., a obtenção das condições físico-psíquicas prévias… Neste sentido, a boa prática da medicina constitui – literalmente - uma intervenção no curso da ortotanásia. As questões deste tema centram-se no peso a conferir à dignidade, e, consequentemente, à autonomia da pessoa humana. Hipócrates Faz tudo ocultando ao doente a maioria das coisas (...) distrai a sua atenção. Anima-o sem lhe mostrar nada do que se vai passar nem do seu estado actual... – Sobre a decência. Benjamin Cardozo em 1914 no NY Court of Appeals um caso (Schloendorff v.º NY Hospital): A estória: Mary S. fez-se internar no NY Hospital e consentiu expressa e exclusivamente numa intervenção para diagnosticar se um tumor era ou não maligno, desautorizando mais do que isso. O médico abriu, analisou o tumor, diagnosticou-o como maligno e removeu-o… A decisão do Juiz Benjamin Cardozo é referenciada na História do Direito da Medicina e do Consentimento esclarecido • Qualquer ser humano, adulto e mentalmente são, tem o direito de determinar o que deve ser feito com o seu corpo; e o cirurgião que realize uma intervenção sem o consentimento do paciente pratica um dano pelo qual é responsável. • Assim é, excepto em casos de emergência em que o paciente esteja inconsciente ou em que seja necessário operar antes de obter o respectivo consentimento… o PACIENTE: Art. 25.º, n.º 1, CRP: a integridade moral e física das pessoas é inviolável. Art. 70.º, n.º 1, CCiv: a lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral. Todavia... 15 A autonomia individual, não sendo ilimitada e absoluta, não se reduz, no campo da medicina, a um conjunto de direitos e de deveres meramente contratuais... A relação médica é uma relação livre e paritária? AG P AG AG P P AG AG AG P Existe «obrigatoriedade» da intervenção, cf. art. 10.º, n.º 2: dever de garante; e art. 284.º, do Cód Penal (recusa de médico): «O médico que recusar o auxílio da sua profissão em caso de perigo para a vida ou de perigo grave para a integridade física de outra pessoa, que não possa ser removido de outra maneira, é punido com pena de prisão até 5 anos. dfb Art. 150.º do Código Penal 1 - As intervenções e os tratamentos que, segundo o estado dos conhecimentos e da experiência da medicina, se mostrarem indicados e forem levados a cabo, de acordo com as leges artis, por um médico ou por outra pessoa legalmente autorizada, com intenção de prevenir, diagnosticar, debelar ou minorar doença, sofrimento, lesão ou fadiga corporal, ou perturbação mental, não se consideram ofensa à integridade física. 2 – (…) Artigo 150.º Intervenções e tratamentos médico-cirúrgicos Ac. TRC de 26-02-2014 : 1. São elementos constitutivos do crime de intervenções e tratamentos médico-cirúrgicos com violação das leges artis:[tipo objectivo]. - A realização de intervenção ou tratamento por médico ou outra pessoa legalmente autorizada, com propósito curativo, e com violação das leges artis; - A criação de perigo para a vida ou perigo de grave ofensa para o corpo ou para a saúde, em consequência da inobservância das leges artis; [tipo subjectivo] - O dolo, o conhecimento e vontade de praticar o facto [que deverá abranger todos os elementos do tipo objectivo] Art. 133.º Código Penal (homicídio privilegiado): Quem matar outra pessoa dominado por compreensível emoção violenta, compaixão, desespero ou motivo de relevante valor social ou moral, que diminuam sensivelmente a sua culpa, é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos. Artigo 133.º Homicídio privilegiado Código Penal: Art. 134.º (Homicídio a pedido da vítima) 1 - Quem matar outra pessoa determinado por pedido sério, instante e expresso que ela lhe tenha feito é punido com pena de prisão até 3 anos. 2 - A tentativa é punível. Artigo 134.º Homicídio a pedido da vítima Código Penal: Art. 135.º (Incitamento ou ajuda ao suicídio) 1 - Quem incitar outra pessoa a suicidar-se, ou lhe prestar ajuda para esse fim, é punido com pena de prisão até 3 anos, se o suicídio vier efectivamente a ser tentado ou a consumar-se. 2 - Se a pessoa incitada ou a quem se presta ajuda for menor de 16 anos ou tiver, por qualquer motivo, a sua capacidade de valoração ou de determinação sensivelmente diminuída, o agente é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos. Artigo 135.º Incitamento ou ajuda ao suicídio O dissentimento cf. art. 5º, §§ 1.º e 3.º da CDHB «Qualquer intervenção no domínio da saúde apenas pode ser efectuada depois da pessoa em causa dar o seu consentimento de forma livre e esclarecida. (...) A pessoa em causa poderá a qualquer momento revogar livremente o seu consentimento.» • Nada disto é novidade no nosso ordenamento jurídico... Com efeito, desde 1968 que o nosso Estatuto Hospitalar, cf. DL 48 357, de 27/04, previa esta manifestação da autodeterminação do paciente... • A faculdade dos pacientes poderem recusar a assistência médica estava expressamente consignada no art. 80.º, n.º 2, do EH... Dr.ª Isabel Galriça Neto • «Para nós, profissionais que se dedicam aos Cuidados Paliativos, os pedidos de eutanásia são mesmo uma raridade, e demonstra-se que a maioria das pessoas, se devidamente acompanhada, não quer morrer, quer sim viver com Dignidade e com o menor sofrimento possível. É fundamental continuar a esclarecer quais as intervenções ética e clinicamente correctas, recomendadas e legais, que tornam a prática de eutanásia Dr.ª Isabel Galriça Neto (cont.) • poder recusar tratamentos depois de se ser devidamente esclarecido dos resultados das opções em causa, fazer discussões antecipadas de planos e de vontades relativas ao fim de vida, formular testamento vital, aplicar estratégias promotoras da dignidade, promover um controlo sintomático impecável, usar sedação paliativa como medida de última linha, não praticar a obstinação terapêutica. • Quando temos pessoas doentes em situação de desespero, deveremos atentar ao modelo da “relação de ajuda» Dr.ª Isabel Galriça Neto (a fronteira com a assistência no suicídio…) • «Ainda no que concerne ao exercício da autonomia, convém sublinhar que a eutanásia pressupõe a entrega/transferência da autonomia do doente ao médico que avalia o pedido – e que pode rejeitá-lo – e àquele que a pratica, ou seja, neste quadro o doente “perde” afinal a sua autonomia e reforça-se dessa forma o poder médico. • O sofrimento captura a liberdade, distorce a capacidade de decisão e a autonomia, e poderá dizer-se que de certa forma o doente é “abandonado á sua autonomia”, não decidirá de forma esclarecida sobre todas as alternativas terapêuticas de que dispõe e sobre os resultados das mesmas» O raciocínio apagógico… Holanda Lei de 2002 • En los Países Bajos, La eutanasia es el acto deliberado por el cual una persona pone fin a la vida de otra por petición expresa de esta. • (..) Praticada por médico, confirmada por outro; modelo específico de DAV, irreversibilidade, notificação de instâncias médico-forenses (2014 examinaram-se 5 304 casos) Aycke O. A. Smook: Cirujano oncólogo, • Lo que sin duda no es la eutanasia: a) Sedación terminal o paliativa | b) Tratamiento analgésico que pueda acortar la vida | c) Sedación terminal de personas incapaces de expresar su voluntad por sí mismas, p/ ex.º: los neonatos con defectos graves (cf. protocolo de Groningen) o personas en coma irreversible que no han otorgado testamento vital; estos ejemplos no deben entenderse como casos de eutanasia sino de interrupción de un tratamiento inútil | d) La no aplicación de un tratamiento que prolongaría la vida pero que es inefectivo desde el punto de vista médico o que el propio paciente rechaza . Bélgica (Leis de 2002: eutanásia, cuidados paliativos e direitos dos pacientes). Jacqueline Herremans no es una copia de la ley holandesa, pero sigue los mismos principios fundamentales; no se ha modificado el Código Penal (en el que se continúa castigando la eutanasia con carácter general), pero esta ley introduce la despenalización de la eutanasia, situando la petición del paciente en el centro del debate . Bélgica: DAV v.º pedido presencial • 1 | Eutanasia • 2 | Persona(s) de confianza • 3 | Validez: 5 años • 4 | Situación de no competencia • 5 | Dos testimonios • 6 | Posibilidad de registro por parte del Ayuntamiento . Banco de datos para médicos • 1| Eutanasia solicitada en tiempo presente • 2 | Paciente competente • 3 | Sin limites • 4 | Posibilidad de expresarse • 5 | Sin formalismos, pero por escrito y firmado • 6 | Sin necesidad de registro legal específico. Comunicación al CFCEE Bélgica: 2014, ampliada a menores • No existe un límite de edad concreto pero sí la noción de capacidad de discernimiento • Solo es aplicable a menores con pronóstico de muerte a corto plazo • Solo es aplicable a los sufrimientos físicos • Solo puede llevarse a cabo con el consentimiento de los padres • Se excluye la posibilidad de una declaración de voluntades anticipadas • La capacidad de discernimiento debe ser evaluada por un psiquiatra pediátrico o un psicólogo . Bélgica: declarações recebidas desde 09/2002 na Comissão Federal de Controlo e Avaliação da Eutanásia. 2003 259 2004 349 2005 393 2006 429 2007 495 2008 704 2009 822 2010 953 2011 1133 2012 1432 2013 1807 2014 1928 Luxemburgo: • Lei de 16 março de 2009 (Ministério da Saúde L – 2935 Luxemburgo) despenaliza a eutanásia e o suicídio assistido para sofrimentos físicos e psíquicos insuportáveis, incuráveis e irreversíveis. • Com referência a 2013 e 2014, verificaram-se 15 casos de morte assistida (Relatório da Comissão Nacional de Controlo e Acompanhamento, entregue no parlamento em Abril de 2015). • Esta Comissão (9 membros) recebe os registos de DAV Luxemburgo, L – 2935, 16/03/2009 • Art. 1°.- Para a aplicação da presente lei, há lugar para entender-se por eutanásia o acto, praticado por um médico, que põe fim intencionalmente à vida de uma pessoa, a pedido expresso e voluntário da dita pessoa. • Por suicídio assistido, há lugar para entender-se o facto de que um médico ajuda intencionalmente uma outra pessoa a suicidarse ou fornece a uma outra pessoa os meios para este fim, isto a pedido expresso e voluntário da dita pessoa Luxemburgo L – 2935, 16/03/2009 • Art. 14.- Foi introduzido no Código Penal uma alteração ao artigo 397-1: • «Art. 397-1.- Não cai no campo de aplicação da presente secção o facto de um médico atender a um pedido de eutanásia ou de suicídio assistido no respeito das condições de fundo visadas na lei de 16 de Março de 2009 acerca da eutanásia e do suicídio assistido. » Suiça: um caso original • O art. 115.º do Cód penal prevê que o auxílio ao suicídio só é punível se for por motivo egoísta… • Lei de Saúde Pública, de 27 de Maio de 1985 art. 27 d| (Directrizes de 2013: requerimento, instrução por equipa médica, esclarecimento, alternativas, resiliência… tratando-se de transtorno mental, psiquiatra). • Comissão de acompanhamento (10 representantes institucionais) Suiça: Tribunal Federal, 3/11/2006 • Confirmó que todo ser humano capaz de discernimiento –incluso si sufre problemas psíquicos– tiene el derecho, garantizado por la Constitución y el Convenio Europeo de Derechos Humanos (CEDH), de decidir la forma y el momento de su propia muerte . • .Sin embargo, el Tribunal Federal subraya que no existe un derecho al acompañamiento para la persona que desea morir. Además, señala que el suicidio asistido para una persona con problemas psíquicos es delicado y que la evaluación de este tipo de casos exige necesariamente un informe detallado de un médico psiquiatra . Suiça: inscrição em Associação reconhecida EXIT: 20 507 membros Ano/gente • 2006 65 • 2002 35 • 2007 66 • 2003 48 • 2008 75 • 2004 42 • 2009 69 • 2005 54 • 2010 91 • 2011 111 • 2012 144 • 2013 155 • 2014 175 Que tal pensarmos em critérios abstractos de incapacidade físicas habilitantes de decisões radicais? • • Critérios de incapacidade (permite analogias): • a dependência física… • a incapacidade permanente p/ realizar algumas actividades quotidianas essenciais como: • i| vestir-se e despir-se; ii| levantar-se, sentar-se e deitar-se; iii| comer; iv| actos básicos de higiene; v| deslocar-se; vi| surdez ou cegueira irreversíveis. O internamento compulsivo em um lar não é equivalente ao tratamento médicocirúrgico arbitrário? Cf. art. 156.º do Cód Penal Obrigado • joão vaz rodrigues | [email protected] professor auxiliar UÉv. | associado do CDBM|FDUC | Associação Lusófona de Direito da Saúde :ALDIS | Conselho de Ética do INSA Ricardo Jorge e da SCME | Vogal CSM | advogado (vrcpsc – advogados) • Rua de Burgos, 3.º, 2.º, 7000-863 Évora • Telef. 266745754 • Bibliografia 1. PRINCIPIOS DE BIOÉTICA LAICA, Javier Sádaba, open access patrocinada por el Máster en Bioética y Derecho UB www.bioeticayderecho.ub.edu/master 2. AA.VV: Cadernos da Fundación Victor Griffols, 41, 2016.