Disciplina: Fundamentos Sócio-Históricos da

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Disciplina: Fundamentos Sócio-Históricos da Educação
Prof. Dra. Maria do Socorro Xavier Batista.
Curso de Licenciatura em Matemática – UFPBVIRTUAL
[email protected]
Ambiente Virtual de Aprendizagem: Moodle www.ead.ufpb.br
Site da UFPBVIRTUAL www.virtual.ufpb.br
Site do curso www.mat.ufpb.br/ead
Telefone UFPBVIRTUAL (83) 3216 7257
Carga horária: 60 horas
Créditos: 04
Ementa
Estudo da contribuição das ciências sociais e humanas para a compreensão do fenômeno educativo e
sua aplicação no processo de formação do educador.
Descrição
Nesta disciplina teremos oportunidade de refletir sobre a educação e suas inter-relações com a
sociedade. Em sua ementa esta disciplina se propõe ao estudo da contribuição das ciências sociais e humanas
para a compreensão do fenômeno educativo e sua aplicação no processo de formação do educador. As
disciplinas Sociologia e História dispõem de um conjunto de proposições desses campos do saber e podem
fornecer os fundamentos ou os princípios básicos dessas áreas de conhecimentos no sentido de fornecer o
apoio, ou os subsídios para se entender a Educação como um fenômeno social e histórico e, com isso,
contribuir para que o educador compreenda sua ação educativa como um processo que sofre determinações e
influências do contexto social e histórico.
Objetivos
Propiciar ao estudante do Curso de Matemática o acesso e a aquisição de conhecimentos sobre
os fundamentos sociais e históricos da educação;
Analisar a educação como um fenômeno que ocorre no tempo, no espaço e na rede complexa das
relações sociais que tecem a história das sociedades humanas;
Conhecer as dimensões sociais e históricas do processo educativo no Brasil
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Unidades Temáticas Integradas
Unidade I:
•
Unidade II:
•
•
Unidade III:
•
•
Unidade IV:
•
Unidade V:
•
Unidade VI:
•
Unidade VII
•
Fundamentos Sócio-Históricos na Formação do Educador
Importância dos conhecimentos sócio-históricos na formação do educador
Conhecimento Científico, Sociedade e Educação
A sociedade e a educação como objeto de estudo científico
A ciência e os diferentes tipos de conhecimentos
A Ciência da Sociedade na Visão do Positivismo
O Positivismo de Auguste Comte
A ciência Social segundo o positivismo de Émile Durkheim
Sociedade na Visão de Émile Durkheim
Sociedade na Visão de Émile Durkheim
Educação na Visão Positivista de Émile Durkheim
A educação segundo o positivismo de Durkheim
Influência do Positivismo na Educação Brasileira
Tendências Pedagógicas Liberais na prática escolar
Sociedade no Paradigma do Materialismo Histórico Dialético
A sociedade capitalista segundo o materialismo de Karl Marx
Unidade VIII A Educação e a Escola na Perspectiva do Materialismo
•
•
Unidade IX
•
A educação e a escola como Aparelho Ideológico na sociedade capitalista
Educação e hegemonia no pensamento de Antonio Gramsci
A Influência do Marxismo na Educação Brasileira
Tendências Pedagógicas Progressistas
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Unidade I: Fundamentos Sócio-Históricos na Formação do Educador
1. - Situando a Temática
A educação é uma prática eminentemente social que faz parte de todas as sociedades e em todos os
tempos históricos os homens desenvolveram formas de educação adequadas ao seu desenvolvimento social,
econômico, político e cultural. A educação, como área de conhecimento científico, é essencialmente
interdisciplinar e, portanto, aglutina contribuições de vários campos de conhecimentos, especialmente das
Ciências Humanas. Nesse sentido, as disciplinas Sociologia e História da Educação trazem uma contribuição
como fundamento da ciência da educação possibilitando um olhar sociológico e histórico sobre o fato
educativo, contribuindo para entender as dinâmicas sociais que interferem e definem as formas e as práticas
educativas, as políticas educativas e os processos pedagógicos que são adotados e como o fenômeno
educativo tem sido efetivado nos diversos contextos históricos. Além disso, os conteúdos de tais disciplinas
no currículo dos cursos de formação de educadores contribuem para a compreensão da realidade educacional
no contexto da sociedade brasileira.
2. - Problematizando a Temática
A Importância dos conhecimentos sócio-históricos na formação do educador é indiscutível, pois
possibilita-lhe entender o universo social e histórico dos processos educativos, desperta-lhe o olhar para os
problemas sociais que envolvem o ato educativo. Tanto a Sociologia quanto a História contribuem para
situar a dinâmica da sociedade, as relações de poder que interferem na educação, orientar a formação
humana dos sujeitos na perspectiva do contexto social e histórico em que vivem. Também pode ser relevante
para se entender as dimensões sociais, culturais e políticas da matemática e da educação matemática.
A reflexão sociológica sobre a matemática já possibilitou a criação de um campo de Sociologia da
Matemática, como apresenta Antonio Miguel (2005, p.3). “A expressão matemática parece ter sido
empregada, pela primeira vez, na década de 40 do século XX, mais precisamente em um artigo de autoria do
historiador da matemática Dirk J. Struik, publicado, em 1942, na revista Science and Society, sob o título
“On the sociology of mathematics”.
Explicita-se assim a necessidade da reflexão histórica e sociológica na formação do educador, até
mesmo no campo do ensino de Matemática.
3. - Conhecendo a Temática
Diversos autores (TURA, 2001; SILVA, 2003; SOUZA, 2003) discutem o papel da Sociologia da
Educação (SE) para uma compreensão crítica da realidade social, política, econômica e cultural na qual a
escola e a educação estão inseridas e contribui para uma formação de educadores com uma visão crítica que
possa formar indivíduos para compreenderem e transformarem a realidade onde vivem. Barcelos salienta
aspectos da SE na formação para a emancipação como base para outras disciplinas.
Na perspectiva de um currículo emancipador, a Sociologia da Eucação torna-se vital para
provocar uma discussão científica, que faça uma interpretação competente, sistemática e
orgânica da realidade, que possa permitir que as demais disciplinas de um curso de formação de
magistério, como as didáticas, possam apontar para saídas de um projeto educacional formador
de cidadania.
A Sociologia, como um campo de conhecimento científico tem contribuído para outras áreas de
conhecimento como a educação. Desde sua chegada no Brasil, nos anos 1920, que ela está presente nos
currículos escolares, inicialmente na educação secundária e na escola normal e em seguida nos cursos
superiores, especialmente nos cursos de formação de educadoras(es). Hoje a Sociologia faz parte dos
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currículos de quase todas as áreas profissionais, tendo em vista que ela contribui para se entender a vida
social em todos os setores.
A importância dessa disciplina na formação da pessoa é definida tanto na LDB 9.394/1996, quanto
nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), no artigo 10, inciso I, parágrafo 2º, diz que: “As propostas
pedagógicas das escolas deverão assegurar tratamento interdisciplinar e contextualizado para (...)
Conhecimentos de Filosofia e Sociologia necessários ao exercício da cidadania”. Sua contribuição para a
formação da cidadania é reconhecida nas orientações dos PCNs (Ensino Médio, volume 4, na página 11)
quando afirma que "o objetivo foi afirmar que conhecimentos dessas (...) disciplinas são indispensáveis à
formação básica do cidadão, seja no que diz respeito aos principais conceitos e métodos com que operam,
seja no que diz respeito a situações concretas do cotidiano social". A inserção dessa disciplina numa política
curricular, embora não tenha ainda sido concretizada em todas as escolas de ensino médio, mostra como ela é
importante para o desenvolvimento de uma compreensão social da realidade.
A educação, entendida como uma prática social que busca formar indivíduos para a vida em
sociedade, deve proporcionar uma visão que lhes permita uma compreensão da sociedade em todas as suas
dimensões. Para tanto se torna necessário um currículo que, em seus conteúdos e em suas práticas, possibilite
uma problematização e reflexão crítica das relações sociais, das relações de poder existentes na sociedade,
pois, como discute Bernstein, citado por Forquin (1993, p.85). " O modo como uma sociedade seleciona,
classifica, distribui, transmite e avalia os saberes destinados ao ensino reflete a distribuição do poder em seu
interior e a maneira pela qual aí se encontra assegurado o controle social dos comportamentos individuais".
Embora o campo de conhecimento da Sociologia não garanta por si o compromisso de promover
uma educação crítica transformadora, por sua especificidade de analisar a sociedade sob o prisma de vários
olhares que as diversas perspectivas analíticas ensejam, já possibilita uma ampliação da compreensão da
realidade social e da educação como um fenômeno fundamental na transmissão da herança cultural, dos
modos de vida, das ideologias, na formação para o trabalho que guarda uma estreita relação com a realidade
em cada contexto histórico. Daí a importância dessa disciplina no currículo dos cursos de formação de
educadores.
Alguns autores destacados da Sociologia como Durkheim, Manheim, Parsons e Merton incluíram a
educação entre seus objetos de pesquisa e de reflexão teórica. Entre os marxistas destacam-se Althusser e
Gramsci. No Brasil, Florestan Fernandes e Fernando Azevedo foram expoentes que tiveram a educação
como foco de suas preocupações. A Sociologia, ao chegar ao Brasil, se desenvolveu no campo da Educação,
nos cursos de nível médio e superior de formação de educadores e tem sido profícua a produção sociológica
com foco nos procesos educativos e nas políticas educativas.
A importância dessa disciplina na formação geral do indivíduo é tão reconhecida que vários
educadores vêm realizando um movimento em defesa da inclusão da Sociologia no ensino médio, por
entender, na percepção de Sarandy, (2001, p. 2) que ela contribui para o desenvolvimento da pessoa.
O conhecimento sociológico certamente beneficiará nosso educando na medida em
que lhe permitirá uma análise mais acurada da realidade que o cerca e na qual está
inserido. Mais que isto, a Sociologia constitui contribuição decisiva para a formação
da pessoa humana, já que nega o individualismo e demonstra claramente nossa
dependência em relação ao todo, isto é, à sociedade na qual estamos inseridos.
Até em campos de conhecimento como na área de saúde e no ensino de matemática, a Sociologia
está sendo incluída como disciplina a ser estudada e como fundamento e reflexão, como é o caso de Miguel
(2005, p. 137) que incorpora uma Sociologia da Educação Matemática, caminhando junta com campos
emergentes de investigação em história e filosofia, que participariam juntas, de forma crítica e qualificadora,
na formação inicial e continuada de professores de matemática.
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Unidade II: Conhecimento Científico, Sociedade e Educação
1. - Situando a Temática
Conhecer a realidade natural ou social sempre foi uma necessidade do homem para que pudesse
dominar e viver em comunhão com a natureza e com os outros homens da comunidade onde está situado. A
partir de suas experiências, os homens, nos diferentes contextos, desenvolveram meios ou tipos de
conhecimento e formas de registrá-los. O conhecimento científico é apenas um tipo.
2. - Problematizando da Temática
O ser humano como ser de cultura, ao longo de seu processo de formação, está sempre produzindo
conhecimentos, que são resultantes das experiências de vida, também ao longo da história tem desenvolvido
formas de registrar e repassar os conhecimentos para as gerações seguintes. Os diferentes tipos de
conhecimentos estão associados aos distintos grupos sociais e classes. O saber do senso comum, também
conhecido como saber popular, é conhecimento que resulta das diferentes experiências de vida. Ele, apesar
de ser significativo para as práticas sociais, não é considerado científico. Os conhecimentos científicos só são
adquiridos por aqueles que têm acesso à educação escolar, local privilegiado para sua transmissão.
3. - Conhecendo a Temática
3.1. - A ciência e os diferentes tipos de conhecimentos
Durante a história da humanidade, diferentes formas de conhecer e explicar os fenômenos naturais e
sociais foram desenvolvidas. A Ciência é uma das formas de conhecimento que somente se tornou
predominante a partir do século XIX. Até então diversos tipos de conhecimentos foram enfatizados de
acordo com o contexto social, econômico e geográfico.
Conhecimento Empírico – conhecimento do senso-comum – é o conhecimento obtido ao acaso, após
inúmeras tentativas, ou seja, o conhecimento adquirido através de ações não planejadas.
Conhecimento mítico é aquele caracterizado pelo relato fabuloso de fatos históricos e fenômenos da
natureza com alegorias e através de fantasias resultantes da imaginação. É uma narrativa na qual aparecem
seres e acontecimentos imaginários, que simbolizam forças da natureza, aspectos da vida humana, etc.
Representação de fatos ou personagens reais, exagerada pela imaginação popular, pela tradição, etc.
(Dicionário Aurélio)
Conhecimento religioso ou Teológico – Conhecimento revelado pela fé divina ou crença religiosa.
Não pode, por sua origem, ser confirmado ou negado. Depende da formação moral e das crenças de cada
indivíduo.
Conhecimento filosófico – É fruto do raciocínio e da reflexão humana. É o conhecimento
especulativo sobre fenômenos, gerando conceitos subjetivos. Busca dar sentido aos fenômenos gerais do
universo, ultrapassando os limites formais da ciência.
Conhecimento Científico – É o conhecimento racional, sistemático, exato e verificável da realidade.
Sua origem está nos procedimentos de verificação baseados na metodologia científica. Podemos então dizer
que o Conhecimento Científico: é racional e objetivo; atém-se aos fatos; transcende aos fatos; é analítico;
requer exatidão e clareza; é comunicável; é verificável; depende de investigação metódica; busca e aplica
leis; é explicativo.
Dialogando e Construindo conhecimento
Identifique na sua comunidade pessoas que detenham um saber popular, que não freqüentaram a
escola mas são detentores de conhecimentos práticos.
Pesquise na sua comunidade alguma história que revele um conhecimento mítico.
Reflita com seus colegas sobre os diferentes conhecimentos científicos que vocês já estudaram.
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3.2. - A sociedade e a educação como objetos de estudo científico
O Contexto histórico que possibilitou o surgimento da Sociologia enquanto ciência refere-se aos
séculos XVIII e XIX (1700-1900). Tempo histórico em que ocorreu a desestruturação do feudalismo e, a
partir da primeira revolução industrial, há o avanço e a consolidação do capitalismo como modo de produção
dominante, o que ocasionou mudanças profundas na estrutura econômica, nas formas de produção, nas
classes, na política e no Estado e que historicamente se convencionou como Idade Moderna ou sociedade
moderna.
Essas mudanças ocasionaram intensa agitação social, um desenvolvimento urbano desordenado com
uma população que vivia sob péssimas condições de higiene, saúde, moradia e trabalho. As condições de
trabalho eram bastante precárias e insalubres e impunham aos homens, mulheres e crianças uma jornada de
até dezoito (18) horas de trabalho diárias, o que provocava muitos acidentes de trabalho. Essas condições,
aliadas à falta de direitos no trabalho, estimularam a união e a organização dos operários com lutas e greves
que reivindicavam a melhoria das condições de trabalho. A estrutura da família também sofreu modificações
na hierarquia, no papel da mulher e dos filhos.
Nesse contexto, as formas de explicação sobre a natureza e a sociedade buscam superar a influência
da Teologia e da tradição católica, predominante no mundo Feudal, assim como busca se emancipar da
Filosofia e avançam em direção às explicações racionais, base do conhecimento científico, que passa a ser
supervalorizado em detrimento das demais explicações.
Do ponto de vista cultural, tomam impulso alguns movimentos de idéias filosóficas, políticas,
artísticos e culturais que impulsionaram o desenvolvimento de um campo científico acerca da sociedade, tais
como:
Racionalismo – Destaca-se como uma corrente filosófica que indicava o raciocínio, operação mental,
discursiva e lógica, que usa uma ou mais proposições para extrair conclusões se uma ou outra proposição é
verdadeira, falsa ou provável. Define-se pela crença no poder da razão humana de alcançar a verdade.
Segundo essa idéia o conhecimento deixa de ser explicado pela vontade divina em conseqüência da
contemplação e fé e passa a ser encarado como resultado da atividade mental voltada para a realidade
concreta.
Renascimento – Período da história européia (1300 a 1650) marco do final da idade média e do
início da Idade Moderna, no qual ocorreram muitos progressos e incontáveis realizações nas artes, na
literatura e nas ciências. Movimento filosófico, cultural e artístico, baseado na visão laica da sociedade e do
poder, prazer de investigar o mundo. Valorização do homem (Humanismo) e da natureza, em oposição ao
divino e ao sobrenatural, conceitos que haviam impregnado a cultura da Idade Média, teocentrismo. Revive a
antiga cultura greco-romana.
Ilustração – Movimento de exaltação dos valores burgueses, liberalismo econômico.
Iluminismo – Movimento cultural que se desenvolveu na Inglaterra, Holanda e França, nos séculos
XVII e XVIII, baseado nas idéias de liberdade política e econômica, defendidas pela burguesia. Os filósofos
e economistas que difundiam essas idéias julgavam-se propagadores da luz e do conhecimento, sendo, por
isso, chamados de iluministas.
A Ciência se fundamenta na crença de que a razão humana pode explicar a realidade traduzindo-a em
leis. Essa visão racionalista se consolida como uma interpretação dos fenômenos de um ponto de vista
lógico, através de métodos e instrumentos de análise que possibilitam interpretar e explicar a experiência
social, buscando descobrir as relações entre as coisas e as leis que regem o mundo natural e social. A ciência
passa a ser uma investigação sobre a natureza e a sociedade a partir da observação dos fatos, decomposição
em partes (análise) e reordenamento (síntese). Assim, a Sociologia surge como uma tentativa de entender e
explicar a sociedade e as transformações pelas quais ela passa.
Essa forma de conhecimento foi enfatizada pelos europeus para justificar o controle e domínio que
desde o século XVI vinha exercendo sobre os países conquistados e dominados nos continentes americano,
africano e asiático.
Esta forma de se compreender o mundo, isto é, baseada no cientificismo que transforma as
realidades sociais, frutos de uma certa ordem histórica que nunca é absoluta, em verdades
absolutas e incontestáveis porque comprovadas pela ciência, tornou-se em pouco tempo a
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tônica de todo o pensamento do Velho Continente, espalhando-se para diversos campos do
saber (BIRARDI; CASTELANI; BELATTO, 2001).
Tanto na História quanto na Sociologia esse pensamento vincula-se a uma corrente conservadora que
buscava justificar a ordem vigente desde finais da idade média e na idade moderna. Segundo Robert Nisbet
(1986, p.62), essa corrente de pensamento busca "preservar o que está estabelecido, ser contrário à mudança
ou inovação". Ou seja, essa forma de ver a sociedade tem um papel político fundamental, pois busca
justificar a manutenção da ordem estabelecida.
Ao ver de Birardi; Castelani; Belatto (2001, p. 13) esse pensamento conservador e o positivismo
tiveram uma grande influência na ciência histórica.
A objetividade, a minuciosidade, o detalhe e a dedicação impessoal, portanto, são as
grandes lições da escola positivista para o estudo da História no século XIX e no início do
XX. Os historiadores que, nessa época, tentaram provar outras formas de se estudar a
disciplina foram desconsiderados e postos à margem. Numa sociedade européia que
buscava seu próprio desenvolvimento e avançava rumo a grandes descobertas na ciência e
na tecnologia, a cientifização que marcou a época também se espalhou para o campo dos
estudos humanos, reduzindo o papel do profissional desse campo para um mero coletor de
informações. A implicação de opiniões externas aos sentidos dos fatos históricos alterava a
História, na opinião positivista, e eliminava assim sua legitimidade como saber de
importância social.
O positivismo é um pensamento preocupado com a ordem e defensor do progresso da sociedade
capitalista. Portanto essa forma de compreender o fenômeno social e histórico serviu de inspiração para
explicações acerca da sociedade que a influencia até o presente.
Dialogando e Construindo conhecimento
Apresente uma visão do senso comum em relação à palavra razão.
Apresente uma definição de ciência.
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Unidade III: A Ciência da Sociedade na Visão do Positivismo
1. - Situando a Temática
O estudo da sociedade se inclui na área de conhecimento das Ciências Humanas, pois estudam o
comportamento humano, os processos sociais e históricos da humanidade, a cultura de cada povo sob
diferentes prismas desdobrando-se em vários campos científicos como a Sociologia, a História, a Economia,
Antropologia, Psicologia. Cada um desses campos de conhecimento desenvolve diferentes teorias que
representam distintas visões e explicações sobre a sociedade, o objeto de estudo e os métodos de
investigação dessas disciplinas. A Educação também é uma área de saber científico que tem sua
especificidade mas se alimenta dos conhecimentos dessas diferentes ciências que trazem suas contribuições
para o seu desenvolvimento.
2. - Problematizando a Temática
No caso da Sociologia, as visões dos estudiosos ou teóricos dão origem às diferentes tradições
sociológicas ou distintas sociologias. Essas distintas visões refletem as contradições do sistema capitalista e
os interesses antagônicos que as caracterizam. O pensamento sociológico positivista apresenta teorias que
analisam com otimismo o capitalismo e teorias identificadas com os valores e os interesses das classes
hegemônicas, as quais são apresentadas como se fossem representativas do conjunto da sociedade. Essa
corrente sociológica que desenvolveu suas explicações defendendo a ordem instituída pelo capitalismo
representa um pensamento conservador. Essa forma de analisar a sociedade encontrou abrigo no pensamento
positivista, que tinha como um dos seus corolários a preocupação com a ordem e o progresso da sociedade.
3. - Conhecendo a Temática
3.1. - O Positivismo de Auguste Comte
A perspectiva sociológica positivista representa a primeira explicação do homem como ser social
reconhecida como científica. É um paradigma de pensamento que repercute em todas as ciências humanas,
especialmente na Sociologia e na História. Tal pensamento foi desenvolvido por Auguste Comte, o qual
batizou a área de conhecimento sociológico inicialmente como Física Social, para em seguida receber o
nome de Sociologia.
Auguste Comte (1798-1857) foi considerado o fundador da Sociologia. Era
francês nascido em Montpellier, onde fez seus estudos iniciais. Depois estudou em
Paris, na Escola Politécnica, mas retornou a Montpellier onde concluiu seus
estudos na faculdade de medicina. Mas apesar de sua formação politécnica foi um
filósofo, escritor e professor de Matemática. Foi secretário de Saint-Simon
(1760/1825), um dos socialistas utópicos que influenciou sua obra. Suas idéias
abrangeram uma Filosofia da História com sua teoria evolucionista a “A Lei dos
Três Estados”, a Sociologia.
Suas principais obras são Curso de Filosofia Positiva (1830), Sistema de política
positiva (1851-1854); e Catecismo positivista (1852).
Este autor definiu objeto, métodos e aplicações da Sociologia. Ele concebia a sociedade como um
organismo constituído de partes coesas, que funcionam harmonicamente. A Sociedade era vista como um
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corpo social regido por leis naturais invariáveis, independentes da vontade e da ação humana. As leis que
regem a vida social econômica e política seriam do mesmo tipo das leis que regem a natureza, que guardam
uma harmonia entre os diversos sistemas. A harmonia social é semelhante à harmonia da natureza.
Uma das principais obras de Comte foi o “Curso de Filosofia Positiva”, composto de seis volumes,
publicados entre 1830 e 1842. Nessa obra ele desenvolve uma Filosofia Positiva na qual aplica às ciências
sociais os métodos racionais utilizados na Matemática com o objetivo concluir leis que deveriam reger o
funcionamento da sociedade. A ciência assim compreendida tem um papel social. O positivismo tem por
objetivo classificar os fenômenos utilizando leis naturais e invariáveis, através de um estudo rigoroso que
parte do geral ao mais simples buscando alcançar um maior aprofundamento.
Como a Sociologia surge em um contexto em que as ciências da natureza já se encontravam bastante
desenvolvidas, Comte fez uma transposição dos métodos, procedimentos e conceitos utilizados nas ciências
naturais para conhecer a sociedade, o que é chamado de naturismo positivista. O positivismo defendia que
deveria haver objetividade científica garantida pela neutralidade do cientista ao analisar os fatos sociais. Para
tanto os fatos deveriam ser tratados e analisados como coisas. A análise deve ser livre de pré-noções e juízos
de valor, de ideologias políticas, valores morais.
Assim, na constituição da Sociologia enquanto ciência, seu objeto, os métodos de investigação, os
conceitos foram transpostos das ciências físicas e naturais. Essa ciência deveria priorizar a investigação
empírica dos fatos socais – seu objeto de estudo – para transformar em leis. Para tanto, os métodos de
investigação utilizados deveriam envolver a descrição, comparação, classificação e o agrupamento dos fatos
segundo as características exteriores comuns e objetivas.
Comte (1991, p. 9) assim apresenta a necessidade de se criar um campo de conhecimento do social:
Eis a grande, mas evidentemente, única lacuna que se trata de preencher para constituir a
filosofia positiva. Já agora que o espírito humano fundou a física celeste; a física terrestre,
quer mecânica, quer química; a física orgânica, seja vegetal, seja animal, resta-lhe, para
terminar o sistema de observação, fundar a física social. Tal é hoje em várias direções
capitais, a maior e a mais urgente necessidade de nossa inteligência.
Comte explicitava que havia uma lacuna no espírito científico reinante na sua época, na qual a
sociedade era bastante turbulenta na Europa. Pois, apesar de a ciência já se achar bastante desenvolvida em
outras áreas do conhecimento, na sociedade ainda predominavam as explicações filosóficas, teológicas e
metafísicas. Impregnado dos princípios científicos das ciências físicas e naturais, Comte procurou
desenvolver um corpo conceitual e metodológico que possibilitaria a epistemologia1 da ciência da sociedade.
Vejamos algumas idéias de Comte (1991, p. 03-04).
Para explicar convenientemente a verdadeira natureza e o caráter próprio da filosofia positiva, é indispensável ter, de
início, uma visão geral sobre a marcha progressiva do espírito humano, considerado em seu conjunto, pois uma concepção
qualquer só pode ser bem conhecida por sua história.
Estudando assim o desenvolvimento total da inteligência humana em suas diversas esferas de atividade, desde o seu
primeiro vôo mais simples até nossos dias, creio ter descoberto uma grande lei fundamental, a que se sujeita por uma
necessidade invariável, e que me parece poder ser solidamente estabelecida, quer na base de provas racionais fornecidas pelo
conhecimento de nossa organização, quer na base de verificações históricas resultantes dum exame do passado. Essa lei consiste
em que cada uma de nossas concepções principais, cada ramo de nossos conhecimentos, passa sucessivamente por três estados
históricos diferentes: estado teológico ou fictício, estado metafísico ou abstrato, estado científico ou positivo. Em outros termos,
o espírito humano, por sua natureza, emprega, sucessivamente, em cada uma de suas investigações, três modos de filosofar,
cujo caráter é essencialmente diferente e mesmo radicalmente oposto: primeiro, o método teológico, em seguida o método
metafísico, finalmente, o método positivo. Daí três sortes de filosofia, ou de sistemas gerais de concepções sobre o conjunto de
1
A etimologia da palavra Epistemologia se origina do grego epistéme, que significa 'ciência'; 'conhecimento', + -o- + logia que significa teoria] S. f. 1. Conjunto de conhecimentos que têm por objeto o conhecimento científico, visando a
explicar os seus condicionamentos (sejam eles técnicos, históricos, ou sociais, sejam lógicos, matemáticos, ou
lingüísticos), sistematizar as suas relações, esclarecer os seus vínculos, e avaliar os seus resultados e aplicações. [Cf.
teoria do conhecimento e metodologia (2).] (Dicionário Aurélio eletrônico). Epistemologia pode designar tanto uma teoria
geral do conhecimento, vinculada à filosofia, quanto uma disciplina que tem por objeto de investigação a ciência.
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fenômenos, que se excluem mutuamente: a primeira é o ponto de partida necessário da inteligência humana; a terceira, seu
estado fixo e definitivo: a segunda, unicamente destinada a servir de transição.
No estado teológico, o espírito humano, dirigindo essencialmente suas investigações para a natureza íntima dos seres,
as causas primeiras e finais de todos os efeitos que o tocam, numa palavra, para os conhecimentos absolutos, apresenta os
fenômenos como produzidos pela ação direta e contínua de agentes sobrenaturais mais ou menos numerosos, cuja intervenção
arbitrária explica todas as anomalias aparentes do universo.
No estado metafísico, o espírito humano, que no fundo nada mais é do que simples modificação geral do primeiro, os
agentes sobrenaturais são substituídos por forças abstratas, verdadeiras entidades (abstrações personificadas) inerentes aos
diversos seres do mundo, e concebidas como capazes de engendrar por elas próprias todos os fenômenos observados, cuja
experiência consiste, então, em determinar para cada um uma entidade correspondente.
Enfim, no estado positivo, o espírito humano, reconhecendo a impossibilidade de se obter noções absolutas, renuncia
a procurar a origem e o destino do universo, a conhecer as causas íntimas dos fenômenos, para preocupar-se unicamente em
descobrir, graças ao uso bem combinado do raciocínio e da observação, suas leis efetivas, a saber, suas relações
invariáveis de sucessão e de similitude. A explicação dos fatos, reduzida então a seus termos reais, se resume de agora em
diante na ligação estabelecida entre os diversos fenômenos particulares e alguns fatos gerais, cujo número o progresso da
ciência tende cada vez mais a diminuir.
Essa visão histórica, filosófica e sociológica de Comte adota uma perspectiva evolucionista e
determinista da história e fornece as bases para um corrente da historiografia que vê a história de forma
linear, como uma sucessão de fatos e datas importantes, do ponto de vista dos vencedores das classes
dominantes. Os fatos históricos devem ser comprovados empiricamente pelo uso de documentos.
O positivismo exerceu forte influência no Brasil desde o século XIX, nos âmbitos da academia, na
educação e na política, trazido especialmente pelos filhos das classes abastadas, filhos dos senhores de
engenho e alta cúpula política que enviavam seus filhos para estudar na Europa, especialmente em Portugal e
na França, berço do positivismo. Na política, o positivismo de Comte esteve presente no ideário dos
republicanos, influindo nas ações que levaram à proclamação da República e nos princípios que orientaram o
tipo de governo que apregoava a separação entre igreja e Estado, na formação do estado dividido em três
poderes inclusive compondo o lema da bandeira brasileira “ordem e progresso”, no ordenamento do
casamento civil, e, na educação, impregnou a reforma educacional proposta por Benjamin Constant, um dos
mais influentes positivistas brasileiros.
Nos primeiros anos da República, o Positivismo foi se espalhando de forma silenciosa e
contínua, sem fazer muito barulho, pois não era de seu estilo ser agressivo, duro e violento.
Ao contrário, a doutrina foi se infiltrando entre os militares, os intelectuais, na constituinte,
na imprensa, na literatura, na política e no modo de vida da sociedade (SILVA;
BENVENUTTI; SAID, 2001, p. 12 ).
Políticos, militares, intelectuais, médicos foram adeptos do positivismo tais como: Benjamin
Constant, Miguel Lemos, Teixeira Mendes e Júlio de Castilhos, entre outros. Na política é notória a
influência das idéias positivistas no movimento pela proclamação da república, na maçonaria. Na imprensa,
criou-se, em 1878, uma organização com o intuito de divulgar o Positivismo, a Sociedade Positivista do Rio
de Janeiro, da qual participaram militares, intelectuais e jornalistas da época, como Benjamin Constant,
Miguel Lemos e Teixeira Mendes.
No campo da educação o ideário positivista entrou primeiro na escola secundária que visava à
formação da cultura de elite. Toma corpo especialmente nas Escolas Politécnicas e Escolas Militares. As
escolas militares formavam engenheiros e bacharéis em matemática. O tenente-coronel Benjamin Constant
Botelho de Magalhães, um dos mais acirrados defensores do Positivismo no Brasil, foi um dos professores
da Escola Militar. Posteriormente são introduzidas nas escolas de ciências jurídicas em São Paulo e Recife,
na Faculdade de Medicina na Bahia e nas Escolas Militar e Politécnica no Rio de Janeiro.
Comte, com sua visão hierárquica, estabeleceu uma classificação dos conhecimentos na filosofia
positiva. Por ordem de importância estariam a Matemática, Astronomia, Física, Química, Fisiologia e Física
Social. Na sua compreensão esses conhecimentos representavam “a fórmula enciclopédica que, dentre o
grande número de classificações que comportam as seis ciências fundamentais, é a única logicamente
conforme à hierarquia natural e invariável dos fenômenos”. Sua primazia em relação à Matemática fez com
que ele afirmasse que ela era “o instrumento mais poderoso que o espírito humano pode empregar na
investigação das leis dos fenômenos naturais”.
232
Dialogando e Construindo conhecimento
Para conhecer mais a influência do
positivismo na História da Educação leia
o artigo
Procure conhecer mais sobre o positivismo e reflita
como esse pensamento atuou no campo da
Matemática e do ensino dessa disciplina. Veja o texto
BIRARDI,
Angela;
CASTELANI,
Gláucia Rodrigues; BELATTO, Luiz
Fernando B. O Positivismo Os Annales e
a Nova História. Klepsidra. Revista
virtual de história, edição 7, abril-maio,
2001.
Disponível
em:
http://www.klepsidra.net/klepsidra7/annal
es.html. Acesso em 31/05/2008
VALENTE, Wagner Rodrigues. Positivismo e
matemática escolar dos livros didáticos no advento da
república. Cadernos de Pesquisa, nº 109, p. 201-212,
março/2000 201
SAMANIEGO, Luis Elias Q. O positivismo e as
ciências
físico-matemáticas
no
Brasil.
Cad.Cat.Ens.Fis., v.11,n2: p.105-1114, ago.1994.
3.2. - A ciência Social segundo o positivismo de Émile Durkheim
As idéias de Comte foram seguidas e aprofundadas por Émile Durkheim, autor que pode ser
considerado o fundador da Sociologia da Educação, pois desenvolveu uma análise da Educação como fato
social. Sua explicação científica é compreendida como funcionalista, pois enfatiza a função que cada órgão
ou instituição desempenha, contribuindo para completar o corpo social, formando a integração social.
Sua teoria apresenta uma preocupação com a ordem social em conseqüência das turbulências sociais
apresentadas na sociedade européia no período em que Durkheim realizou suas pesquisas. Em decorrência
das crises econômicas, o desemprego e a miséria entre os trabalhadores provocadas pelo sistema capitalista,
as idéias socialistas avançavam. Durkheim defendia a ordem e o progresso do sistema capitalista e
discordava das teorias socialistas. Frente às crises sociais (patologias sociais) ele propunha uma nova moral
para retomar a harmonia social. Diante da ausência de regras sociais (anomia) ele sugeria normas, regras e
leis que pudessem reger e controlar a conduta dos indivíduos.
Durante vários anos ensinou Filosofia em vários liceus depois passa
a se interessar pela Sociologia. Foi professor universitário e
ministrou aulas de Pedagogia e Ciência Social na Faculté de Lettres
de Bordeaux, de 1887 a 1902, sendo o pioneiro a implantar um
curso de Sociologia numa universidade francesa. Em Paris é
nomeado assistente da cadeira de Ciência da Educação na Sorbonne,
em 1902. Quatro anos após, com a morte do titular, assume esse
cargo. Em 1910 transforma a disciplina de Sociologia em cátedra.
Émile Durkheim (1858-1917) nasceu em Épinal, França.
De família judia, seu pai era rabino e ele próprio teve seu
período de misticismo, tornando-se, porém agnóstico após
a ida para Paris onde fez toda sua formação acadêmica.
Principais obras: Da Divisão Social do Trabalho (1893); Regras do
Método Sociológico (1895); O Suicídio (1897); As Formas
Elementares de Vida Religiosa (1912), Educação e Sociologia,
Sociologia e Filosofia e Lições de Sociologia. Fundou revista
L'Anné Sociologique, que afirmou/consolidou não só o pensamento
sociológico mas Durkheim no mundo inteiro
Segundo ele, a Sociologia é definida como a Ciência das instituições, de sua gênese e de seu
funcionamento. A seu ver, a sociedade tem a estrutura de um sistema sendo um corpo social, semelhante ao
corpo humano composto de vários órgãos que seriam as instituições (Igreja, Estado, Família, Clubes,
Sindicatos) interdependentes, cada órgão desempenha função específica, contribuindo para o funcionamento
harmônico da sociedade.
O Fato social – Objeto de Estudo da Sociologia é definido como “as maneiras de fazer ou de pensar,
(...) suscetíveis de exercer influência coercitiva sobre as consciências particulares. É um fato social toda
maneira de fazer, fixada ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coação exterior; ou ainda que é
geral no conjunto de uma dada sociedade tendo, ao mesmo tempo, uma existência própria, independente das
suas manifestações” (Durkheim, 1978, p. 92).
233
Os fatos sociais e suas características
Quando desempenho minha tarefa de irmão, de marido ou de cidadão, quando executo os compromissos que assumi, eu
cumpro deveres que estão definidos, fora de mim e de meus atos, no direito e nos costumes. Ainda que eles estejam de acordo
com meus sentimentos próprios e que eu sinta interiormente a realidade deles, esta não deixa de ser objetiva; pois não fui eu que
os fiz, mas os recebi pela educação. Aliás, quantas vezes não nos ocorre ignorarmos o detalhe das obrigações que nos incumbem e
precisarmos, para conhecê-las, consultar o Código e seus intérpretes autorizados! Do mesmo modo, as crenças e as práticas de sua
vida religiosa, o fiel as encontrou inteiramente prontas ao nascer; se elas existiam antes dele, é que existem fora dele. O sistema de
signos de que me sirvo para exprimir meu pensamento, o sistema de moedas que emprego para pagar minhas dívidas, os
instrumentos de crédito que utilizo em minhas relações comerciais, as práticas observadas em minha profissão, etc. funcionam
independentemente do uso que faço deles. Que se tomem um a um todos os membros de que é composta a sociedade; o que
precede poderá ser repetido a propósito de cada um deles. Eis aí, portanto, maneiras de agir, de pensar e de sentir que apresentam
essa notável propriedade de existirem fora das consciências individuais.
Esses tipos de conduta ou de pensamento não apenas são exteriores ao indivíduo, como também são dotados de uma força
imperativa e coercitiva em virtude da qual se impõem a ele, quer ele queira, quer não. Certamente, quando me conformo
voluntariamente a ela, essa coerção não se faz ou pouco se faz sentir, sendo inútil. Nem por isso ela deixa de ser um caráter
intrínseco desses fatos, e a prova disso é que ela se afirma tão logo tento resistir. Se tento violar as regras do direito, elas reagem
contra mim para impedir meu ato, se estiver em tempo, ou para anulá-lo e restabelecê-lo em sua forma normal, se tiver sido
efetuado e for reparável, ou para fazer com que eu o expie, se não puder ser reparado de outro modo. Em se tratando de máximas
puramente morais, a consciência pública reprime todo ato que as ofenda através da vigilância que exerce sobre a conduta dos
cidadãos e das penas especiais de que dispõe. Em outros casos, a coerção é menos violenta, mas não deixa de existir. Se não me
submeto às convenções do mundo, se, ao vestir-me, não levo em conta os costumes observados em meu país e em minha classe, o
riso que provoco, o afastamento em relação a mim produzem, embora de maneira mais atenuada, os mesmos efeitos que uma pena
propriamente dita. Ademais, a coerção, mesmo sendo apenas indireta, continua sendo eficaz. Não sou obrigado a falar francês
com meus compatriotas, nem a empregar as moedas legais; mas é impossível agir de outro modo.
Eis, portanto uma ordem de fatos que apresentam características muito especiais: consistem em maneiras de agir, de pensar e
de sentir, exteriores ao indivíduo, e que são dotadas de um poder de coerção em virtude do qual esses fatos se impõem a
ele. Por conseguinte, eles não poderiam se confundir com os fenômenos orgânicos, já que consistem em representações e em
ações; nem com os fenômenos psíquicos, os quais só têm existência na consciência individual e através dela. Esses fatos
constituem, portanto uma espécie nova, e é a eles que deve ser dada e reservada a qualificação de sociais. (DURKHEIM, 1999, p.
2-4)
Dialogando e construindo o conhecimento
Distinga fatos sociais na visão do senso comum e na visão de Durkheim
Destaque as características dos fatos sociais segundo esse autor e dê um exemplo
3.3. - Princípios epistemológicos da Sociologia segundo Durkheim
Como seguidor do positivismo, esse autor definia como um dos princípios do conhecimento
científico a objetividade e a neutralidade científica. Para tanto, os fatos sociais deveriam ser tratados como
coisas. Como ilustra a seguinte afirmação do autor. “No entanto, os fenômenos sociais são coisas e devem
ser tratados como coisas” (DURKHEIM, 1999, p. 28). Para estudar os fatos com rigor e objetividade,
portanto, o cientista social deveria se portar com isenção, não deveria deixar que suas convicções ideológicas
e políticas interferissem na análise do fato social.
É preciso, portanto, considerar os fenômenos sociais em si mesmos, separados dos sujeitos
conscientes que os concebem; é preciso estudá-los de fora, como coisas exteriores, pois é nessa qualidade
que eles se apresentam a nós”. (DURKHEIM, 1999, p. 28).
No que se refere à observação dos fatos sociais, Durkheim destacava como a primeira e mais
importante regra, considerar os fatos sociais como coisas. Para tanto, o pesquisador deveria afastar todas
suas prenoções acerca do fenômeno estudado. (DURKHEIM, 1999, p. 32). Outra regra afirmava que o
sociólogo deveria definir como objeto de investigação “fenômenos que correspondem a uma mesma
definição”, ou seja, ele deveria objetivar os fatos que ele queria estudar. Para que a escolha do objeto de
estudo fosse objetiva seria preciso que exprimisse os fenômenos, não em função de uma idéia do espírito,
mas de propriedades que lhe são inerentes (DURKHEIM, 1999, p.35), ou seja, destacar os atributos ou
características do fato, passíveis de serem observadas. Quanto à definição do objeto de pesquisa ele definia
que fosse “um grupo de fenômenos previamente definidos por certos caracteres exteriores que lhes são
comuns, e compreender na mesma pesquisa todos os que correspondem a essa definição” (DURKHEIM,
234
1999, p.36). Assim, Durkheim afirmava que a ciência, para ser objetiva, deveria se fundamentar em dados
sensíveis para chegar às suas definições e fugir das noções vulgares, ou preconceitos.
235
Unidade IV: A Sociedade na Visão de Émile Durkheim
1. - Situando a Temática
Para entender a sociedade de seu tempo, a Europa do século XIX, esse autor desenvolveu um vasto
campo conceitual e metodológico influenciado pelo avanço das diversas ciências, especialmente as físicas e
naturais. Daí seu pensamento social estar influenciado pelos demais campos científicos, o que o faz usar de
analogias para comparar a sociedade com outros sistemas desenvolvidos nessas ciências.
2. - Problematizando a Temática
Aos olhos dos pensadores europeus do século XIX, o racionalismo era saudado como principal meio
de se chegar ao conhecimento verdadeiro, a euforia com a revolução industrial e as inovações tecnológicas
exaltavam a capacidade do intelecto e as potencialidades do novo modo de produção capitalista de ordem e
progresso. Isso levou Durkheim a pensar com otimismo a sociedade em que viveu.
3. - Conhecendo a Temática
A sociedade é constituída de uma consciência social ou consciência coletiva que é formada pelo
conjunto de conceitos, valores, sentimentos, normas compartilhadas por todos os indivíduos de uma dada
sociedade ou grupo social, considerados corretos e verdadeiros, convertendo-se em leis morais. São as
maneiras próprias de agir e pensar, mitos, lendas, concepções e crenças religiosas. "Conjunto das crenças e
dos sentimentos comuns à média dos membros de uma mesma sociedade forma um sistema determinado que
tem sua vida própria." (Durkheim, 1978, p. 40). Segundo esse autor, o indivíduo em sua vida social
desenvolve duas consciências indivisas: uma individual e outra coletiva.
Há em nós duas consciências uma contém apenas estados que são pessoais a cada um de
nós e nos caracterizam, ao passo que os estados que a outra compreende são comuns a toda
sociedade. A primeira representa apenas nossa personalidade individual; a segunda o tipo
coletivo e, por conseguinte, a sociedade sem a qual ele não existiria. (DURKHEIM, 1995,
p. 79).
Esse sistema de representações e ações representa a "Maneira pela qual o grupo se enxerga a si
mesmo nas relações com os objetos que o afetam" (DURKHEIM, 1995, p.50).
A moral, entendida como um sistema de normas de conduta que prescrevem como o sujeito deve
conduzir-se em determinadas circunstâncias, é destacada como um importante elemento que possibilita a
coesão e a harmonia social. Ou seja, a função da moral social seria de manter a ordem e a harmonia, o
equilíbrio ou Consenso Social. Os fatos morais são fenômenos como os outros; eles consistem em regras de
ação que se reconhecem por certas características distintivas; logo deve ser possível observá-los, descrevêlos, classificá-los e procurar as leis que os expliquem (DURKHEIM, 1995, p. XLIII). A vida social segundo
Durkheim resulta de duas fontes: a similitude das consciências e a divisão do trabalho.
Ele atribui uma importância significativa à divisão do trabalho. Ela apresenta dimensões econômicas,
morais, de integração, coesão social e de solidariedade social. A divisão do trabalho, além de prestar um
serviço econômico, de ter uma utilidade econômica, produz um efeito moral “e sua verdadeira função é criar
entre duas ou várias pessoas um sentimento de solidariedade” (DURKHEIM, 1995, p. 21). A divisão do
trabalho (...) “consiste no estabelecimento de uma ordem social e moral sui generis”. (DURKHEIM, 1995, p.
27).
A harmonia social nas sociedades industriais e organizadas está diretamente ligada à divisão do
trabalho. “O que a caracteriza é que ela consiste numa cooperação que se produz automaticamente, pelo
simples fato de que cada um persegue seus próprios interesses. Basta que cada indivíduo se consagre à
236
função especial para se encontrar, pela força das coisas, solidário aos outros” (DURKHEIM, 1995, p. 185).
Na divisão do trabalho as funções divididas têm o efeito de torná-los solidários (DURKHEIM, 1995, p. 27).
Nas sociedades contemporâneas a divisão do trabalho teria a função de integrar o corpo social,
assegurar sua unidade. Essas sociedades só poderiam se manter em equilíbrio graças à especialização das
tarefas, que a divisão do trabalho é a fonte, se não a única, pelo menos a principal da solidariedade social.
(DURKHEIM, 1995, p. 29).
A divisão do trabalho teria uma função de coesão social e no seu entendimento, em conseqüência, teria um
caráter moral, “porque as necessidades de ordem, de harmonia, de solidariedade social são geralmente tidas
como morais. (DURKHEIM, 1995, p. 30).
Solidariedade Social – é formada pelos laços que unem os membros de um grupo entre si e ao
próprio grupo e tem o componente moral como um dos seus elementos. A solidariedade é um fenômeno
totalmente moral. (DURKHEIM, 1995, p. 31). Fato social, fenômeno moral. Manifesta sua presença por
efeitos sensíveis. "Onde ela é forte, inclina os homens uns em direção aos outros, coloca-os em contato,
multiplica ocasiões de relacionamento." (idem, p. 31). Ele distinguia dois tipos de solidariedade:
A Solidariedade Mecânica ou por similitude, é aquela formada pelas semelhanças que unem os
indivíduos (DURKHEIM, 1995, p. 79). Ela pode ser definida como o "conjunto mais ou menos organizado
de crenças e sentimentos comuns a todos os membros do grupo: é o chamado tipo coletivo." (Durkheim,
1977, p. 30). Ela é mais comum em sociedades mais primitivas. “Existe, portanto, uma estrutura social de
natureza determinada à qual corresponde a solidariedade mecânica. O que a caracteriza é que ela é um
sistema de segmentos homogêneos e semelhantes entre si”. (DURKHEIM, 1995, p. 164).
Solidariedade Orgânica ou da divisão do trabalho – Diferentemente, a solidariedade orgânica se dá
predominantemente em sociedades mais complexas. Essas sociedades “são constituídas por um sistema de
órgãos diferentes, cada um dos quais tem um papel especial e que são formados, eles próprios de partes
diferentes”. Os elementos dessa sociedade são coordenados e subordinados uns aos outros em torno de um
mesmo órgão central, que exerce sobre o resto do organismo uma ação moderadora. (DURKHEIM, 1995, p.
165). Neste tipo social, “os indivíduos não mais são agrupados segundo suas relações de descendência, mas
segundo a natureza particular da atividade social a que se consagram. Seu meio natural e necessário não é
mais o meio natal, mas o meio profissional. Não é mais a consangüinidade, real ou fictícia, que assinala a
posição de cada um, mas a função que ele desempenha” (DURKHEIM, 1995, p. 166). Assim, essa
solidariedade produzida pela divisão do trabalho supõe que os indivíduos sejam diferentes entre si.
(Durkheim, 1977, p.31). Essas duas formas de solidariedade objetivam a coesão social.
237
Unidade V:
A Educação Segundo o Positivismo de Durkheim
1. - Situando a Temática
Nesta unidade vamos conhecer um pouco a visão de Educação de Émile Durkheim, considerado o
fundador da Sociologia da Educação, pois foi o primeiro pensador que fez uma análise sociológica do fato
educativo, seguindo os princípios da análise positivista.
2. - Problematizando a Temática
No livro Educação e Sociologia2 (1967) ele apresenta suas idéias a respeito da educação. No capítulo
I, apresenta a natureza e função da educação. Ele parte da idéia de que o homem é, em sua essência, egoísta e
precisa ser moldado para a vida societária. Egoísmo pessoal é transformado em altruísmo que beneficia a
sociedade. A educação é o meio pelo qual a sociedade se perpetua, através da transmissão de valores morais
que integram os indivíduos à sociedade, exerce papel ativo no processo de reorganização social, quando
ocorre "desintegração moral".
3. - Conhecendo a Temática
Durkheim não acreditava numa educação ideal, perfeita, apropriada a todos os homens
indistintamente, universal e única. Pois pela sua análise social e histórica constatou que ela se apresentava
diferente em cada lugar e contexto histórico buscando atender as necessidades da estrutura da sociedade da
qual ela é parte. “A educação tem variado infinitamente com o tempo e o meio”. “Não existe educação
abstraída das condições de tempo e lugar” (p. 36).
A educação é um fato social e como tal assume as características de todos os fatos sociais, ou seja, a
generalidade, a coercitividade e a exterioridade. O poder de coerção da educação está presente na seguinte
afirmação: “Na verdade, porém, cada sociedade considerada em momento determinado de seu
desenvolvimento, possui um sistema de educação que se impõe aos indivíduos de modo geralmente
irresistível. É uma ilusão acreditar que podemos educar nossos filhos como queremos”. (p. 36-37).
Durkheim compreendia a correlação que a educação estabelecia com as demais instituições sociais e
a influência destas sobre a educação. “Quando se estuda historicamente a maneira pela qual se formaram e se
desenvolveram os sistemas de educação, percebe-se que eles dependem da religião, da organização política,
do grau de desenvolvimento das ciências, do estado das indústrias etc.”(p. 37).
Segundo ele, em toda sociedade o sistema de educação se apresenta sob duplo aspecto: uno e
múltiplo. No aspecto múltiplo ele se apresenta diversificado e especializado para atender aos imperativos das
classes sociais, das necessidades da divisão do trabalho social e das profissões. Também varia de acordo com
o caráter espacial, de acordo com as necessidades das regiões, da cidade e do campo. “A educação assegura a
persistência da diversidade necessária diversificando-se ela própria, e permitindo especializações” (p.41).
No tocante ao aspecto unificador, ela se apresenta sob uma base comum, que serve para consolidar
um conjunto de valores, certas maneiras de conceber o mundo e a vida, hábitos mentais que dão unidade e
coesão social no conjunto dos indivíduos de uma coletividade, transmite os valores, as regras de
comportamentos que garantem a coesão social. A educação serve para inculcar, indistintamente, em todas as
crianças as idéias, sentimentos e práticas, independentemente da categoria social à qual pertençam.
2
Todas as idéias aqui desenvolvidas sobre educação são desse livro, após a citação indicamos somente a
página.
238
“A educação perpetua e reforça, fixando de antemão na alma da criança certas similitudes
essenciais, reclamadas pela vida coletiva”. (p. 41).
“No decurso da história, constituiu-se todo um conjunto de idéias acerca da natureza, sobre a
importância respectiva de nossas diversas faculdades, sobre o direito e sobre o dever, a
sociedade o indivíduo, o progresso, a ciência, a arte, etc. idéias essas que são a base mesma
do espírito nacional. A educação tem por objeto fixar essas idéias na consciência dos
educandos”. (p. 40).
Durkheim assim conceitua a educação: "Educação é a ação exercida pelas gerações adultas sobre as
gerações que não se encontram ainda preparadas para a vida social, tem por objeto suscitar e desenvolver na
criança certo número de estados físicos, intelectuais e morais, reclamados pela sociedade política, no seu
conjunto, e pelo meio especial a que a criança, particularmente, se destine" (p. 41). Nessa perspectiva a
educação é entendida como um ato unilateral onde quem sabe ensina a outrem que não está preparado para a
vida social e política que reclama certos desenvolvimentos físicos, intelectuais e morais. O indivíduo se
educa para a sociedade.
Quanto aos fins e funções sociais da educação, Durkheim defendia que a educação deveria
desempenhar uma função integradora como elemento adaptador e normalizador que contribui na integração
do indivíduo à sociedade. Ele acreditava que o indivíduo é egoísta ao nascer e cabe à educação agregar ao ser
humano uma natureza capaz de vida moral e social. Ou seja, “o fim da educação é constituir o ser social em
cada indivíduo” (p.41). Segundo ele: “A educação tem por objeto superpor, ao ser que somos ao nascer,
individual e associal – um ser inteiramente novo, que ultrapassa a natureza individual”. (p.54). Assim, a
educação deve contribuir para evitar as contradições entre os interesses individuais e coletivos – conflito
básico da sociedade.
Também é função da educação desenvolver no indivíduo a personalidade no tocante ao desempenho
de um papel útil. Ela deve transmitir as complexas e múltiplas aptidões que a vida social supõe, que não se
transmitem por hereditariedade. A seguir apresentamos algumas idéias do autor que explicitam as funções
sociais da educação:
A educação consiste numa socialização metódica das novas gerações. (p.41)
Por intermédio da educação se edifica a ação coletiva que torna o homem realmente humano.
(p.45)
Função coletiva da educação tem por fim adaptar a criança ao meio social para o qual se destina.
(p.47)
A ação exercida pela sociedade, especialmente através da educação, tem por objeto engrandecêlo e torná-lo criatura verdadeiramente humana (p.47)
O Estado, como o cérebro da sociedade, é o responsável por manter a ordem social. Tendo a
Educação uma função coletiva e social, ele não pode ficar alheio a ela, deve exercer influência oferecendo
escolas sem, no entanto, monopolizar deixando uma margem de atuação para a iniciativa privada. “O Estado
não deve necessariamente monopolizar o ensino (...) o progresso escolar seja mais fácil e mais rápido onde
certa margem se deixe à iniciativa privada”. Segundo ele a educação deve estar submetida à fiscalização do
Estado (p. 48).
Cabe ao Estado proteger os princípios comuns em uma dada civilização e é a educação o meio
essencial de transmissão desses princípios. “A despeito de todas as dissidências, há na base de nossa
civilização certo número de princípios que, implícita ou explicitamente, são comuns a todos (...). É função do
Estado proteger esses princípios essenciais, fazê-los ensinar em suas escolas, velar para que não fiquem
ignorados pelas crianças”. (p. 49).
No tocante ao papel e à ação do professor, Durkheim entendia que a educação deveria ser um
trabalho de autoridade, sendo esta o meio essencial da ação educativa. O mestre é a encarnação da autoridade
que é revestida da moral por ele assumida. “A autoridade moral é a qualidade essencial do educador. O
mestre tem de sentir o sentimento da autoridade (...). O mestre é o órgão de uma grande entidade moral; a
sociedade... ele é o intérprete das grandes idéias morais de seu tempo e de sua terra”. (p. 55). Ele entendia a
ação educativa como um ato de autoridade, portanto as relações entre o educador e a criança submetida à sua
influência era assim definida: 1) a criança fica, por condição natural, em estado de passividade; 2) o
ascendente que o mestre possui sobre o discípulo, em razão da superioridade da experiência e cultura, darlhe-á o poder necessário à eficácia de sua atividade (p. 53)
239
O processo educativo deve acontecer de forma sistemática e contínua e deve ocorrer de forma
paciente, buscando objetivos bem determinados, para influenciar profundamente a alma da criança sem se
deixar desviar por incidentes exteriores e circunstâncias adventícias.
Dialogando e construindo o conhecimento
Apresente o duplo aspecto da educação destacados por Durkheim
Destaque as funções sociais da educação.
Faça um comentário crítico sobre o conceito de educação do autor
240
Unidade VI: A Influência do Positivismo na Educação Brasileira
1. - Situando a Temática
A concepção positivista de educação exerceu uma significativa influência na educação brasileira,
especialmente no tocante às práticas pedagógicas adotadas pelos professores, que durante longo tempo
predominou na ação educativa entendida como um ato de autoridade que orientou as relações entre o
educador e a criança no processo de ensino-aprendizagem.
2. - Problematizando a Temática
Esse pensamento sobre educação influenciou a educação escolar e as práticas pedagógicas adotadas
pelos professores em sala de aula. Libâneo (1989, p. 21-35) analisou e classificou as tendências pedagógicas,
ou seja, as práticas educativas, desde os primórdios da escola e especialmente ao longo do século XX,
quando, a partir dos contextos históricos, a escola foi se redefinindo internamente, influenciada pelos fatores
sociais, econômicos, políticos, culturais e ideológicos, e, também sob a influência de teorias psicológicas,
filosóficas, sociológicas e educacionais.
3. - Conhecendo a temática
Segundo Libâneo (1989, p. 21-35) as tendências pedagógicas liberais são conservadoras porque
entendem que o papel da educação é preparar os indivíduos para uma adaptação à vida social e
conseqüentemente para conservar a sociedade. Ela está presente nas escolas desde a consolidação desta
instituição na sociedade capitalista e é conseqüência da doutrina liberal, que entende que a função da
educação escolar é preparar os indivíduos para desempenhar papéis sociais, tendo em vista suas aptidões
individuais. As tendências pedagógicas constituem um conjunto de práticas educativas que concretiza o
trabalho docente. As diferentes tendências recebem influências sócio-políticas e teóricas. O autor destaca
quatro tendências liberais presentes nas escolas brasileiras: Tradicional, Renovada progressivista, Renovada
tecnicista e não-diretiva. Elas apresentam elementos comuns e diferenciados ao considerar o papel da escola,
os conteúdos trabalharão os métodos de ensino, o relacionamento professor-aluno e quanto aos pressupostos
da aprendizagem. Elas se guiam por uma idéia de sociedade como uma soma de indivíduos que devem ser
preparados para a vida social através da educação.
A seguir apresentamos uma síntese das quatro tendências pedagógicas liberais classificadas por Libâneo
(1989, p. 21-35) destacando os aspectos: fins da educação escolar, conteúdo, relacionamento professoraluno, métodos de ensino e aos pressupostos da aprendizagem.
Tendências Pedagógicas Liberais na prática escolar
1) TRADICIONAL
−
−
−
−
−
−
Valoriza ensino humanístico, universalista, de cultura geral, os êxitos e fracassos são imputados ao indivíduo,
O papel da escola na preparação intelectual e moral dos alunos para assumir posição na sociedade
Conteúdo – conhecimentos e valores acumulados pela sociedade, repassado como algo acabado e inquestionável,
separado das experiências dos alunos.
Métodos – exposição verbal da matéria e/ou demonstração, feitas pelo professor
Relacionamento professor-aluno – predomina autoridade do professor, função do professor dominar e repassar
conteúdo, num clima de ordem, disciplina e obediência,
Pressupostos da aprendizagem – programas devem ser repassados numa progressão lógica, estabelecida pelo
adulto, aprendizagem receptiva e mecânica. A retenção dos conteúdos é garantida pela repetição de exercícios
sistemáticos. A avaliação se dá por exercícios, provas escritas e orais e trabalhos de casa.
241
2) RENOVADA PROGRESSIVISTA
−
−
−
−
−
−
Papel da escola - adequar as necessidades individuais ao meio social, deve retratar a vida.
Representantes: Dewey, Montessori, Decroly.
Conteúdos de ensino – estabelecidos em função de experiências que o sujeito vivencia frente a desafios cognitivos
e situações problemáticas. Valoriza processos mentais e habilidades cognitivas. Aprender a aprender, processo de
aquisição do saber é mais importante.
Métodos de Ensino – experimentos, pesquisas, estudo do meio natural, trabalho em grupo.
Relacionamento professor-aluno – educação centrada no aluno, professor especialista em garantir relacionamento
pessoal e autêntico.
Pressupostos da aprendizagem – motivação e auto-avaliação, desenvolvimento do "eu".
3) RENOVADA TECNICISTA
−
−
−
−
−
A escola funciona como modeladora do comportamento humano, através de técnicas específicas, emprega a
tecnologia comportamental. A pesquisa científica, a tecnologia educacional, a análise experimental do
comportamento.
Conteúdos de ensino – informações e princípios científicos, estabelecidos por especialistas, material instrucional,
módulos de ensino, dispositivos audiovisuais.
Métodos de Ensino – importância da tecnologia educacional, aplicação sistemática de princípios científicos
comportamentais e tecnológicos a problemas educacionais, instrução programada, audiovisuais, laboratórios.
Relacionamento professor-aluno – professor administra as condições de transmissão da matéria, o aluno recebe,
aprende e fixa informações. Comunicação professor-aluno tem sentido exclusivamente técnico.
Pressupostos da aprendizagem – aprender é modificação do desempenho, ensino é um processo de
condicionamento através do reforço das respostas que se quer obter. Enfoque diretivo do ensino centrado no
controle das condições que cercam quem aprende.
4) LIBERAL RENOVADA NÃO-DIRETIVA
−
−
−
−
Papel da escola – preocupa-se mais com problemas psicológicos do que com pedagógicos e sociais, favorece ao
aluno clima de autodesenvolvimento e realização pessoal.
Conteúdos de ensino – ênfase nos processos de desenvolvimento das relações e da comunicação, facilita aos
estudantes os meios para buscarem por si mesmos os conhecimentos.
Métodos de ensino – facilitação da aprendizagem através de técnicas de sensibilização onde sentimentos de cada
pessoa possam ser expostos sem ameaças, com vistas a melhorar relacionamento interpessoal.
Relacionamento professor-aluno – educação centrada no aluno, visando formar sua personalidade, através de
vivência de experiências significativas. Professor especialista em relações humanas, não deve intervir para evitar
inibir a aprendizagem.
Dialogando e construindo o conhecimento
Leia o capítulo que apresenta as tendências
pedagógicas do livro A pedagogia crítico-social
dos conteúdos.
LIBÂNEO,
José
Carlos.
Democratização
da
escola
pública.
A
Estabeleça pontos comuns e diferentes nas
tendências pedagógicas liberais.
Compare as práticas educativas por você
vivenciadas com as tendências pedagógicas
liberais apresentadas pelo autor.
pedagogia crítico-social dos conteúdos. São
Paulo. Loyola. 1989.
O pensamento positivista também influenciou a educação matemática, como salientam Motta e
Brolezzi (2006, p.16).
A Matemática, na ordenação das ciências criadas por Comte, é o ponto de partida da
educação científica, a primeira ciência a atingir o estado positivo por possuir leis com
aplicação universal e ser a mais simples e geral de todas as ciências. Ao mesmo tempo, o
método experimental-matemático é o único aceito pela pesquisa positivista, pela expectativa
242
de garantir a neutralidade e a objetividade do conhecimento, o rigor do conhecimento e a
racionalidade técnica. O positivismo de Comte prega uma educação científica que seja a base
para o desenvolvimento das ciências especializadas, com a finalidade de se garantir a
previsão das necessidades humanas e a equivalência entre ciência e progresso, tendo como
único valor o conhecimento objetivo.
Comte (1973, p.44-5) afirmou que: “(...) a ciência matemática deve, pois, constituir o verdadeiro
ponto de partida de toda educação científica racional, seja geral, seja especial, o que explica o uso universal
que se estabeleceu desde há muito tempo a esse propósito, duma maneira empírica, embora não tenha
primitivamente outra causa que sua maior ancianidade relativa”.
As reformas do ensino que ocorreram no Brasil no período republicano, sob a direção de Benjamin
Constant, seguiram os princípios do positivismo através do Decreto n. 981 de 8 de novembro de 1890. O
currículo do ensino secundário, da então escola modelo da capital, o Ginásio Nacional (Colégio de Pedro II),
é reformulado passando a incluir as ciências da hierarquia positivista com ênfase na matemática e eliminando
disciplinas como Filosofia e Retórica que são substituídas pela Astronomia e Sociologia Moral.
Dialogando e Construindo conhecimento
Pesquise sobre a história do positivismo
no Brasil.
SILVA, Alexsandro; BENVENUTTI, Ana
Gilda; SAID, Fábio M. Visões do
Positivismo no Brasil. 2001. Disponível
em: http://www.geocities.com/
positivismonobrasil/. Acesso em:
20/06/2008
243
Veja a influência do positivismo nas reformas
do ensino no Brasil.
GENNARI, Emilio. Um breve passeio pela
História da Educação. Revista Espaço
Acadêmico, nº 29, 2003. Disponível em:
http://www.espacoacademico.com.br/
029/29cgennari.htm. Acesso em 31/05/2008
Unidade VII: Sociedade e Educação no Paradigma do Materialismo Histórico
Dialético
1. - Situando o tema
Nesta unidade veremos um outro paradigma explicativo da sociedade capitalista que caracteriza-se
pela crítica contundente que faz ao modo de produção capitalista, pois analisa as contradições que ele gera,
pelos problemas que causa à natureza e critica a exploração dos homens sobre os homens a partir da
propriedade privada que determina o processo de divisão e apropriação da riqueza na sociedade.
2. - Problematizando a Temática
Esse paradigma teórico fundamenta-se no Materialismo Histórico Dialético, teoria desenvolvida por
Karl Marx, abrangente conjunto de idéias envolvendo Filosofia, Política, Sociologia e o pensamento
revolucionário. Apesar de ter analisado a sociedade no mesmo contexto histórico que Durkheim, as reflexões
desses autores adotam prismas diferentes. Enquanto este priorizou um foco de análise centrada nas questões
morais e evidenciava a necessidade de fortalecer a consciência coletiva em busca da harmonia social, Marx
priorizou a análise das contradições oriundas das condições materiais, as quais determinavam os problemas
sociais daquele século XIX, marcado pela revolução industrial que impulsionou o desenvolvimento urbano
acelerado, com grandes contingentes populacionais saindo do campo em busca de emprego e de
sobrevivência. Neste contexto as condições de trabalho eram precárias, marcadas por longas jornadas,
ambientes de trabalho insalubres, baixos salários. Diante desse quadro, Marx buscou compreender a estrutura
econômica, social, política e ideológica, para descobrir os meandros dos processos de produção e de
exploração do trabalho.
3. - Conhecendo a Temática
Além de explicar a sociedade, interessava a Marx contribuir para a transformação social, daí ele ter
desenvolvido uma teoria revolucionária que apontava para a construção de uma sociedade socialista, na qual
não haveria exploração dos trabalhadores, onde a distribuição de riquezas fosse eqüitativa e onde reinava a
igualdade.
Karl Marx – (1818-1883), alemão. Estudou na universidade de Berlim (1836), Direito,
História e Filosofia, num período marcado pela influência das idéias liberais, da Revolução
francesa, do racionalismo e do idealismo. No inicio foi influenciado pela Filosofia Idealista
de Hegel, Georg Wilhelm Fridrich (1770-1831). Filosofia espiritualista – concepção idealista
do mundo concebe a matéria como produto da idéia. Para ele o Estado, a Religião, a Filosofia
eram manifestações de Deus, o Absoluto.
Marx tentou seguir a carreira acadêmica na universidade, mas seu pensamento crítico não era
aceito pelo poder dominante e ele passa a se dedicar ao jornalismo, no jornal "Gazeta
Renana", que concentrava os intelectuais. Suas idéias incomodavam os dominantes da época
e o jornal foi interditado em janeiro de 1843, continuou escrevendo em jornais de
trabalhadores e seus artigos adotavam uma linha crítica-socialista e por isso foi expulso da
França em janeiro de 1845. Envolvido com os problemas da classe trabalhadora, em 1864,
participou ativamente da fundação da "Associação Internacional dos Operários", que mais
tarde receberia o nome de 1ª Internacional. Em 1848, Marx e Engels publicaram o
"Manifesto do Partido Comunista", no qual desenvolvem a teoria revolucionária.
Friedrich Engels – amigo e co-autor de várias obras de Marx
Suas principais obras: Manuscritos econômico-filosóficos (1844), A ideologia Alemã (1845),
A miséria da Filosofia (1847), O manifesto Comunista (1848), O 18 Brumário de Napoleão
Bonaparte (1857), O capital (1867).
244
Ele escreveu várias obras, mas na principal delas, O capital, propunha fazer uma crítica da economia
política que contribuísse para que todas as pessoas, especialmente os trabalhadores e não apenas os
estudiosos da economia, da política e da sociedade entendessem melhor a sociedade. Sua preocupação era
instrumentalizar a classe trabalhadora para lutar para transformar a sociedade. As idéias de Marx
influenciaram a organização e a luta dos trabalhadores do mundo todo e contribuíram para mudanças radicais
na história política, econômica e social da humanidade. Suas propostas socialistas serviram de guia para
revoluções e estruturação de sociedades socialistas, no século XX.
Na visão marxista de ciência, os fenômenos humanos são compreendidos como sociais e históricos,
expressão e resultado de contradições sociais, de lutas e conflitos sociopolíticos, determinados pelas relações
econômicas, baseadas na exploração do trabalho da maioria, pela minoria de uma sociedade.
Sua teoria materialista da história nega o primado das idéias na vida social, a práxis (ação-reflexãoação) humana é centrada na produção e reprodução da vida social. O Materialismo histórico dialético pensa o
trabalho como elemento fundamental na transformação da natureza, na mediação das relações sociais, na
sociabilidade e na história humana. Uma vez que o primeiro ato histórico é a produção da existência humana.
Ou o modo pelo qual os homens produzem seus meios de vida. Esta concepção da história consiste em expor
o processo real de produção, partindo da produção material da vida imediata; e em conceber a forma de
intercâmbio conectada a este modo de produção e por ele engendrada (ou seja, a sociedade civil nas suas
diferentes fases), como o fundamento de toda a história (...) (MARX e ENGELS, 1993, p. 55).
A obra de Marx e Engels, ''A Ideologia Alemã“ de 1847, expõe os princípios do materialismo
histórico e do socialismo científico e faz uma crítica geral à filosofia especulativa.
“... a existência de um primeiro pressuposto de toda a existência humana e, portanto, de toda a história, a saber,
que os homens devem estar em condições de poder viver a fim de ‘fazer história’. Mas, para viver, é necessário
antes de mais beber, comer, ter um teto onde se abrigar, vestir-se, etc. O primeiro ato histórico é, pois a
produção dos meios que permitem satisfazer essas necessidades, a produção da própria vida material; trata-se
de um fato histórico, de umas condições fundamentais de toda história, que é necessário, tanto hoje como há
milhares de anos, executar dia a dia, hora a hora, a fim de manter os homens vivos" (MARX e ENGELS, 1993,
p. 39).
No materialismo, a dialética é um método de conhecimento da realidade e processo do movimento
histórico que considera a Natureza: a) como um todo coerente em que os fenômenos se condicionam
reciprocamente; b) como um estado de mudança e de movimento; c) como lugar onde o processo de
crescimento das mudanças quantitativas gera, por acumulação e por saltos, mutações de ordem qualitativa; d)
como a sede das contradições internas, seus fenômenos tendo um lado positivo e o outro negativo, um
passado e um futuro, o que provoca a luta das tendências contrárias que gera ao progresso (Japiassú e
Marcondes, 1996, p.71).
O Método Dialético privilegia a pesquisa historiográfica concreta, em oposição à reflexão abstrata. O
método do materialismo em Marx, processo do movimento histórico que considera a realidade sócioeconômica de uma determinada época como um todo articulado, marcado por contradições, entre as quais a
da luta de classes.
As características da dialética são: a) o princípio da totalidade – afirma que todos os fenômenos se
relacionam, há uma ação recíproca e uma conexão universal, ou seja, tudo se relaciona, todos os fenômenos
são interligados e interdependentes; b) princípio do movimento – tudo se transforma, há um desenvolvimento
incessante; c) mudança qualitativa – mudança de qualidade resultante das mudanças quantitativas; d)
princípio de contradição – entende que em todos os fenômenos há uma luta dos contrários – motor de
transformação. A contradição é interna, essência do movimento. Há uma unidade dos contrários – dois
termos se opõem – unidade indissociável, um não existe sem o outro. Marx, no pósfácio de O capital,
respondendo aos críticos assim define seu método (O capital, 1975, p. 10).
Definindo o que ele chama o meu método de investigação com tanta justeza, e, no que respeita à
aplicação que dele fiz, com tanta benevolência, o que definiu o autor, se não o método dialético?
Certamente, o processo de exposição deve distinguir-se formalmente do processo de investigação.
Cabe à investigação apropriar-se da matéria em todos os seus pormenores, analisar as diversas
formas do seu desenvolvimento e descobrir a sua relação íntima. É somente depois de concluída
esta tarefa que o movimento real pode ser exposto no seu conjunto. Se se conseguir chegar a esse
ponto, de tal modo que a vida da matéria se reflita na sua reprodução ideal, isso pode levar a
acreditar numa construção a priori.
245
O meu método dialético não só difere, pela sua base, do método hegeliano, mas é exatamente o seu
oposto. Para Hegel, o movimento do pensamento, que ele personifica com o nome de Idéia, é o
demiurgo da realidade, que não é senão a forma fenomenal da Idéia. Para mim, pelo contrário, o
movimento do pensamento é apenas o reflexo do movimento real, transposto e traduzido no
cérebro do homem.
4. - A sociedade capitalista segundo o materialismo
Marx analisou a sociedade capitalista tomando como referência a base material, ele a definia como a
sociedade da mercadoria, que são todos os objetos, produtos e serviços destinados ao mercado, onde se dá a
troca de mercadorias, que é a compra e venda de produtos no mercado. “A riqueza das sociedades em que
domina o modo de produção capitalista apresenta-se como uma ‘imensa acumulação de mercadorias’. A
análise da mercadoria, forma elementar desta riqueza, será, por conseguinte, o ponto de partida da nossa
investigação (19.., p. O capital)¨.
As formas de expressar e falar dessa realidade concreta, as representações na visão de Marx (1993, p.
11) são resultantes da materialidade concreta da vida. “A produção de idéias, de representações e da
consciência está em primeiro lugar direta e intimamente ligada à atividade material e ao comércio material
dos homens; é a linguagem da vida real”.
Os pensamentos da classe dominante são também, em todas as épocas, os pensamentos dominantes, ou
seja, a classe que tem o poder material dominante numa sociedade é também a potência dominante
espiritual. A classe que dispõe dos meios de produção material dispõe igualmente dos meios de
produção intelectual; de tal modo que o pensamento daqueles a quem são recusados os meios de
produção intelectual está submetido igualmente à classe dominante. Os pensamentos dominantes são
apenas a expressão ideal das relações materiais dominantes concebidas sob a forma de idéias e,
portanto, a expressão das relações que fazem de uma classe a classe dominante; dizendo de outro modo,
são as idéias e, portanto, a expressão das relações que fazem de uma classe a classe dominante; dizendo
de outro modo, são as idéias do seu domínio” (MARX e ENGELS, 1993, p. 55-56).
Esse sistema de produção ou modo de produção é composto de uma base ou Infra-estrutura que é a
estrutura econômica, considerada por Marx como fundamental ou determinante sobre as outras dimensões da
vida social, e uma superestrutura que se subdivide em: Jurídica – todo aparato legal, leis, tribunais e prisões;
política – poder legislativo, sistema político, governo e Ideológica – Idéias, formas de pensar e instituições
encarregadas de sua produção e transmissão (meios de comunicação, escolas, sindicatos, igrejas).
Nesse modo de produção a propriedade privada é uma categoria jurídica e econômica, fonte de toda
exploração e da divisão da sociedade em classes. As classes Sociais são determinadas pela propriedade dos
meios de produção e definidas como: burguesia, formada pelos proprietários dos meios de produção e a
classe trabalhadora, também chamada de Proletariado – despossuída da riqueza e por isso vende sua força de
trabalho para garantir a sobrevivência.
O capitalismo desenvolve as forças produtivas, formadas pelos meios de produção que correspondem
às matérias primas e instrumentos (objetos materiais que intervêm no processo de trabalho) mais a Força de
trabalho que corresponde à energia despendida pelo trabalhador no processo de trabalho. O trabalho é
categoria central da análise marxista, "atividade produtiva, de um determinado tipo, que visa a um objetivo
determinado" (O capital, 1975, p. cap.1).
O resultado geral a que cheguei e que, uma vez obtido, serviu de fio condutor aos meus estudos, pode
resumir-se assim: na produção social da sua vida, os homens contraem determinadas relações necessárias
e independentes da sua vontade, relações de produção que correspondem a uma determinada fase de
desenvolvimento das suas forças produtivas materiais. O conjunto dessas relações de produção forma a
estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se levanta a superestrutura jurídica e política e
à qual correspondem determinadas formas de consciência social. O modo de produção da vida material
condiciona o processo da vida social, política e espiritual em geral. Não é a consciência do homem que
determina o seu ser, mas, pelo contrário, o seu ser social é que determina a sua consciência. Ao chegar a
uma determinada fase de desenvolvimento, as forças produtivas materiais da sociedade se chocam com as
relações de produção existentes, ou, o que não é senão a sua expressão jurídica, com as relações de
propriedade dentro das quais se desenvolveram até ali. De formas de desenvolvimento das forças
produtivas, estas relações se convertem em obstáculos a elas. E se abre, assim, uma época de revolução
246
social. Ao mudar a base econômica, revoluciona-se, mais ou menos rapidamente, toda a imensa
superestrutura erigida sobre ela. Quando se estudam essas revoluções, é preciso distinguir sempre entre as
mudanças materiais ocorridas nas condições econômicas de produção e que podem ser apreciadas com a
exatidão própria das ciências naturais, e as formas jurídicas, políticas, religiosas, artísticas ou filosóficas,
numa palavra, as formas ideológicas em que os homens adquirem consciência desse conflito e lutam para
resolvê-lo. E do mesmo modo que não podemos julgar um indivíduo pelo que ele pensa de si mesmo, não
podemos tampouco julgar estas épocas de revolução pela sua consciência, mas, pelo contrário, é
necessário explicar esta consciência pelas contradições da vida material, pelo conflito existente entre as
forças produtivas sociais e as relações de produção. Nenhuma formação social desaparece antes que se
desenvolvam todas as forças produtivas que ela contém, e jamais aparecem relações de produção novas e
mais altas antes de amadurecerem no seio da própria sociedade antiga as condições materiais para a sua
existência. Por isso, a humanidade se propõe sempre apenas os objetivos que pode alcançar, pois, bem
vistas as coisas, vemos sempre, que esses objetivos só brotam quando já existem ou, pelo menos, estão
em gestação as condições materiais para a sua realização. Podemos designar como outras tantas épocas
de progresso, na formação econômica da sociedade, o modo de produção asiático, o antigo, o feudal e o
moderno burguês. As relações burguesas de produção são a última forma antagônica do processo social
de produção, antagônica, não no sentido de um antagonismo individual, mas de um antagonismo que
provém das condições sociais de vida dos indivíduos. As forças produtivas, porém, que se desenvolvem
no selo da sociedade burguesa criam, ao mesmo tempo, as condições materiais para a solução desse
antagonismo. Com esta formação social se encerra, portanto, a pré-história da sociedade humana.
(MARX, Karl. Prefácio à "Contribuição à Crítica da Economia Política”).
Marx também estudou a divisão do trabalho, porém, diferentemente de Durkheim, não enfatizou a
solidariedade orgânica resultante dessa divisão. Ele percebeu o conflito que a origina, pois que ela resulta
dos interesses de uma classe, aquela detentora dos meios de produção. Marx identifica no capitalismo que a
divisão social do trabalho abrange três aspectos: 1) a divisão entre os setores de produção (produção
agrícola, industrial e serviços); 2) entre o trabalho intelectual e o manual; e 3) a divisão técnica do trabalho,
que é a especialização do trabalho no interior de uma empresa.
A divisão do trabalho numa nação obriga em primeiro lugar à separação entre o trabalho industrial
e comercial e o trabalho agrícola; e, como conseqüência, à separação entre a cidade e o campo e à
oposição dos seus interesses. O seu desenvolvimento ulterior conduz à separação do trabalho
comercial e do trabalho industrial. Simultaneamente, e devido à divisão de trabalho no interior dos
diferentes ramos, assiste-se ao desenvolvimento de diversas subdivisões entre os indivíduos que
cooperam em trabalhos determinados. A posição de quaisquer destas subdivisões particulares
relativamente às outras é condicionada pelo modo de exploração do trabalho agrícola, industrial e
comercial (patriarcado, escravatura, ordens e classes). O mesmo acontece quando o comércio se
desenvolve entre as diversas nações (MARX e ENGELS, 1993, p. 55-56).
Outro aspecto importante da análise marxista é a explicitação da origem da riqueza e do lucro
produzido no sistema capitalista desvendado pelo conceito de Mais-valia, que corresponde ao tempo de
trabalho suplementar desenvolvido pelo trabalhador na sua jornada diária de trabalho e que é apropriado pelo
capitalista.
Marx identificou que, ao longo da história da humanidade, os homens, de acordo com os diferentes
modos de produção, contraem determinadas relações sociais de produção. Quando essas relações são
determinadas pela propriedade privada elas são de antagonismo, oposição, e são marcadas pela exploração
do trabalho. No capitalismo essas relações são Exploração. Esse aspecto gera interesses contraditórios entre
as classes. Apesar de ambas necessitarem uma da outra, o capitalista precisa do trabalhador para acionar sua
produção e o trabalhador precisa do trabalho e do salário para garantir sua sobrevivência, os interesses se
diferenciam e se contradizem porque o capitalista exige do trabalhador que ele trabalhe a mais do que é
necessário para garantir a sua sobrevivência e paga salários muito baixos, na maioria das vezes, para
possibilitar o acúmulo de riquezas e seu lucro. Essa contradição gera a luta de classes – Proletariado x
Burguesia, que é a contradição fundamental do sistema capitalista, a produção da riqueza é social, produzida
pelo trabalho da classe trabalhadora e a apropriação é privada e concentrada na mão de um pequeno número
de pessoas ou grupos pertencentes à classe dominante.
Marx, no livro Manuscritos econômicos e filosóficos (escrito entre abril e agosto de 1844), explicitou,
através do conceito de Alienação, o processo de alheamento a que o trabalhador é submetido, ao produzir
247
mercadorias, tanto em relação ao produto do seu trabalho quanto às relações de exploração às quais é
submetido. Ao se tornar mercadoria, o trabalhador se torna objeto.
Consideremos, agora, o ato de alienação da atividade humana prática, o trabalho, sob dois aspectos: 1) a
relação do trabalhador com o produto do trabalho como um objeto estranho que o domina. Essa relação
é, ao mesmo tempo, a relação com o mundo exterior sensorial, com os objetos naturais, como um mundo
estranho e hostil; 2) a relação do trabalho como o ato de produção dentro do trabalho. Essa é a relação do
trabalhador com sua própria atividade humana como algo estranho e não pertencente a ele mesmo,
atividade como sofrimento (passividade), vigor como impotência, criação como emasculação, a energia
física e mental pessoal do trabalhador, sua vida pessoal (pois o que é a vida senão atividade?) como uma
atividade voltada contra ele mesmo, independente dele e não pertencente a ele. Isso é auto-alienação, ao
contrário da acima mencionada alienação do objeto.
Assim como o trabalho alienado transforma a atividade livre e dirigida pelo próprio indivíduo em um
meio, também transforma a vida do homem como membro da espécie em um meio de existência física.
A consciência que o homem tem de sua espécie é transformada por meio da alienação, de sorte que a vida
como espécie torna-se apenas um meio para ele.
(3) Então, o trabalho alienado converte a vida do homem como membro da espécie, e também como
propriedade mental da espécie dele, em uma entidade estranha e em um meio para sua existência
individual. Ele aliena o homem de seu próprio corpo, a natureza extrínseca, de sua vida mental e de sua
vida humana.
(4) Uma conseqüência direta da alienação do homem com relação ao produto de seu trabalho, à sua
atividade vital e a sua vida como membro da espécie, é o homem ficar alienado dos outros homens.
Quando o homem se defronta consigo mesmo, também está se defrontando com outros homens (p. 6-7).
Além da dominação material, originada na base material ou infra-estrutura social, que a classe
dominante exerce sobre os trabalhadores ao explorar seu trabalho, esse domínio se estende à superestrutura
com a dominação ideológica.
Os pensamentos da classe dominante são também, em todas as épocas, os pensamentos dominantes, ou
seja, a classe que tem o poder material dominante numa dada sociedade é também a potência dominante
espiritual. A classe que dispõe dos meios de produção material dispõe igualmente dos meios de produção
intelectual, de tal modo que o pensamento daqueles a quem são recusados os meios de produção intelectual
está submetido igualmente à classe dominante. Os pensamentos dominantes são apenas a expressão ideal
das relações materiais dominantes concebidas sob a forma de idéias e, portanto, a expressão das relações
que fazem de uma classe a classe dominante; dizendo de outro modo, são as idéias do seu domínio (MARX
e ENGELS, A ideologia Alemã, p. 20).
Como vimos, a perspectiva analítica de Marx faz uma crítica contundente ao capitalismo, às suas
formas de exploração do trabalho que degradam o ser humano, que provocam desigualdades, entre outras
mazelas, em meio à opulência, à imensa capacidade de produzir produtos, alimentos que poderiam acabar
com a fome da humanidade, no entanto, ao tratar-se de mercadorias, somente tem acesso as pessoas que
dispõem de dinheiro para comprar.
248
Unidade VIII:
A Educação e a Escola na Perspectiva do Materialismo
1. - Situando o tema
A análise da educação na sociedade capitalista, sob a perspectiva marxista, parte da crítica realizada
por Marx da forma como ela se estrutura demarcando uma lógica instrumental que privilegia o lucro, que
quer submeter toda a sociedade aos interesses dos setores hegemônicos.
2. - Problematizando a Temática
Marx não desenvolveu uma teoria sobre a educação, mas sua análise social serviu de inspiração para
vários autores analisarem a educação na sociedade capitalista. O pensamento educacional baseado no
materialismo Histórico analisou a relação entre educação e sociedade, as relações de poder, as classes
sociais, enfatizou a contribuição da educação na reprodução das relações sociais de produção e na
manutenção das relações de poder e de dominação que a classe dominante exerce sobre as classes
dominadas.
3. - Conhecendo a Temática
3.1. - A escola como Aparelho Ideológico de Estado na sociedade capitalista
Entre os estudos sobre educação fundamentados nas idéias de Marx destacam-se o livro do francês
Louis Althusser, Aparelhos ideológicos de Estado: nota sobre os aparelhos ideológicos de Estado, no qual o
autor analisa a educação escolar no sistema capitalista, englobando-a entre as instituições do estado.
A análise desenvolvida pelo pensador francês se propõe a dar continuidade aos estudos de Marx no
tocante à teoria do Estado capitalista, uma vez que ele não se aprofundou nesse tema, assim como também
não o fez em relação à educação. Althusser apresenta o Estado como instrumento político das classes
dominantes com o intuito de garantir as condições de reprodução do sistema. O estado seria formado pelos
Aparelhos de Estado (AE), distinguindo-se os Aparelhos Repressivos e os Aparelhos Ideológicos de
Estado, os quais funcionam ora através da repressão ora através da ideologia.
Os Aparelhos Repressivos de Estado compreendem o governo, a administração, o exército, a polícia,
os tribunais, as prisões e funcionam através da violência. Seu papel é garantir, pela força (física ou não), as
condições políticas de reprodução das relações sociais de produção e de exploração.
Os Aparelhos Ideológicos de Estado (AIE) são Instituições distintas e especializadas tais como: AIE
religioso, AIE familiar, AIE jurídico, AIE político (o sistema político e diferentes partidos), AIE sindical,
AIE de informação (imprensa, rádio, televisão, etc.); AIE cultural (letras, belas artes, esportes etc), as quais
funcionam predominantemente através da ideologia. Em sua maioria não possuem estatuto público, são
instituições privadas e autônomas, podem ser meios e lugares da luta de classes, podem ser assumidas pela
classe dominante, mas podem ser utilizadas pelas classes trabalhadoras como meio de resistência. Dentre
esses aparelhos destaca-se, segundo Althusser, a Escola.
O que são Aparelhos Ideológicos do Estado (AIE)?
Eles não se confundem com o aparelho (repressivo) do Estado. Lembremos que na teoria
marxista, o aparelho de Estado (AE) compreende: o governo, a administração, o exército, a polícia, os
tribunais, as prisões, etc, que constituem o que chamaremos a partir de agora de aparelho repressivo do
Estado. Repressivo indica que o aparelho de Estado em questão “funciona através da violência” - ao
menos em situações limites (pois a repressão administrativa, por exemplo, pode revestir-se de formas
não físicas).
Designamos pelo nome de aparelhos ideológicos do Estado um certo número de realidades que
apresentam-se ao observador imediato sob a forma de instituições distintas e especializadas. Propomos
uma lista empírica que deverá necessariamente ser examinada em detalhe, posta a prova, retificada e
249
remanejada. Com toda a reserva que esta existência acarreta podemos, pelo momento, considerar como
aparelhos ideológicos do Estado as seguintes instituições (a ordem de enumeração não tem nenhum
significado especial):
AIE religioso (o sistema das diferentes Igrejas)
AIE escolar (o sistema das diferentes escolas públicas e privadas)
AIE familiar
AIE jurídico
AIE político (o sistema político, os diferentes partidos)
AIE sindical
AIE de informação (a imprensa, o rádio, a televisão, etc.)
AIE cultural (Letras, Belas Artes, esporte, etc.)
Nós afirmamos: os AIE não se confundem com o Aparelho (repressivo) de Estado. Em que
consiste a diferença?
No primeiro momento podemos observar que existe um Aparelho (repressivo) do Estado,
existe uma pluralidade de Aparelhos Ideológicos do Estado. Supondo a sua Existência, a unidade que
constitui esta pluralidade de AIE não é imediatamente visível.
Num segundo momento, podemos constatar que enquanto que o aparelho (repressor) do
Estado, unificado, pertence inteiramente ao domínio público, a maior parte dos aparelhos ideológicos
do Estado (em sua aparente dispersão) remete ao domínio privado. As igrejas, os partidos, os
sindicatos, as famílias, algumas escolas, a maioria dos jornais, as empresas culturais etc, etc, são
privados.
(...)
Mas vamos ao essencial. O que distingue os AIE do aparelho (repressivo) do Estado é a
seguinte diferença fundamental: o aparelho repressivo do Estado “funciona através da violência” ao
passo que os Aparelhos Ideológicos do Estado “funcionam através da Ideologia”.
ALTHUSER, Louis. Aparelhos Ideológicos de Estado: notas sobre os Aparelhos Ideológicos de
Estado. 9. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1985.p. 67-69.
Segundo Althusser, o Aparelho Ideológico Escolar torna-se a instituição ideológica dominante nas
formações sociais capitalistas vindo a substituir o principal aparelho ideológico do sistema feudal que era a
Igreja Católica. A escola passa a ser um instrumento importante para o estabelecimento da hegemonia
burguesa, assumindo as funções anteriormente assumidas pela igreja. Seu papel é de inculcação da ideologia
dominante, no conjunto dos indivíduos que freqüentam a escola, contribuindo para a reprodução das relações
sociais de exploração (entre explorados e exploradores), ao escamotear, esconder, dissimular as reais
condições de exploração existentes na sociedade. Apresenta-se como neutra, desprovida de ideologia.
A educação contribui para a reprodução da força de trabalho na medida em que seu processo de
reprodução não é exclusivamente econômico, mas social e combina efeitos de reprodução material, de
submissão e de reconhecimento da ordem. A reprodução das relações sociais de produção é em parte
assegurada pela super-estrutura jurídico-política e ideológica, assegurada pelo exercício do poder do Estado
nos Aparelhos de Estado.
A reprodução da força de trabalho se dá essencialmente fora da empresa e é assegurada através do
salário. O valor do salário é determinado social e historicamente pela luta da classe trabalhadora. A
reprodução da força de trabalho é tanto física, material, quanto mental e espiritual e diz respeito à
necessidade, do ponto de vista das classes dominantes, do trabalhador adquirir determinados conhecimentos
necessários ao desenvolvimento do trabalho na empresa capitalista, além do desenvolvimento da submissão
do trabalhador. A reprodução material é a reconstituição física da força de trabalho, a reprodução da
submissão à ideologia dominante se dá basicamente através da reprodução da qualificação da força de
trabalho para o trabalho. Essa qualificação é diversificada conforme as exigências da divisão social-técnica
do trabalho (p. 57). No sistema capitalista a qualificação ocorre, tendencialmente, no sistema escolar e em
outras instituições e menos no sistema produtivo.
250
Segundo Althusser (1985, p. 80), “a submissão é aprendida através da aprendizagem de saberes
contidos na inculcação maciça da ideologia da classe dominante que são reproduzidas, em grande parte, nas
relações de produção de uma formação social capitalista”. (p. 80)
Ao capital torna-se necessário reproduzir tanto a formação para a submissão quanto para a
dominação. “(...) a reprodução da força de trabalho exige, não somente uma reprodução de sua qualificação,
mas, ao mesmo tempo, uma reprodução de sua submissão às normas da ordem vigente, isto é, uma
reprodução da submissão dos operários à ideologia dominante e uma reprodução da capacidade de perfeito
domínio da ideologia dominante por parte dos agentes da exploração e repressão, de modo a que eles
assegurem também pela palavra o predomínio da classe dominante. A escola (e outras instituições do Estado
como Igreja e Exército) ensina o “know-how” mas sob formas que asseguram a submissão à ideologia
dominante ou o domínio de sua ‘prática’ (ALTHUSSER, 1985 p. 58).
Na escola são ensinados conhecimentos e técnicas que são úteis nos postos de trabalho, além de
“‘regras’ de bom comportamento – conveniências que devem ser observadas por todo agente da divisão do
trabalho, conforme o posto que ele esteja destinado a ocupar; as regras de moral e de consciência cívica e
profissional, o que na realidade são regras de respeito à divisão social-técnica do trabalho, regras da ordem
estabelecida pela dominação de classe”. (ALTHUSSER, 1985 p. 58).
Essa visão de Althusser desnudou a idéia que a visão positivista de educação e de escola sempre
definiu como uma atividade e uma instituição neutra. Corroborou a idéia de Marx de que as idéias da classe
dominante são predominantes num dado modo de produção, além de revelar como se dá o processo de
difusão e inculcação das ideologias burguesas e como os alunos, durante todo o seu processo de formação
escolar, passam por um processo de assimilação das idéias e aprendem as regras de submissão necessárias
aos trabalhadores nas relações sociais de produção do capitalismo. Essa perspectiva analítica fez uma crítica
contundente à educação escolar, no entanto, o próprio pensamento progressista depois apontou críticas a esse
pensamento por considerá-lo anti-dialético e determinista, pois o AIE escolar parecia aprisionar o indivíduo
na sua ação reprodutivista da ideologia dominante e não mostrou os conflitos vivenciados no processo
escolar e a capacidade de o indivíduo se rebelar e não se submeter passivamente, ou seja, não viu a
capacidade de resistência dos sujeitos sociais.
3.2. - Educação e hegemonia no pensamento de Antonio Gramsci
Outro autor que pensou a educação a partir do referencial marxista foi Antonio Gramsci - pensador
italiano que destaca a educação como elemento central nas relações de poder e na hegemonia. Em seu
pensamento, destaca a importância das atividades da esfera da superestrutura destacando o saber e a cultura
nas relações sociais de produção e na política.
Antonio Gramsci
Nasceu em Ales, Sardenha, em 23 de janeiro
de 1891. Estudou na Universidade de Turim
conheceu a Federação Juvenil Socialista e
filiou-se em 1914 ao Partido Socialista.
Militante e intelectual em 1921 foi um dos
fundadores do Partido Comunista Italiano do
qual assumiu a direção e foi eleito deputado.
Lutou contra o regime fascista sendo preso em 1926 e condenado a
mais de vinte anos de prisão. Morreu em consequência de uma
tuberculose, em 27 de abril de 1937, em Roma, quatro dias depois de
alcançar a liberdade. Foi na prisão que escreveu sua obra, constando
de Cadernos e Cartas A educação e as questões pedagógicas
estiveram presentes nos seus escritos elaborados na prisão.
A obra de Gramsci é apresentada no Brasil em dez volumes. Os
Cadernos do cárcere, especificamente, compreendem seis volumes:
1) Introdução ao estudo da filosofia. A filosofia de Benedetto Croce;
2) Os intelectuais. O princípio educativo. Jornalismo; 3) Maquiavel.
Notas sobre o Estado e a política; 4) Temas de cultura. Ação
católica. Americanismo e fordismo; 5) O Ressurgimento italiano.
Notas sobre a história da Itália; 6) Literatura. Folclore. Gramática.
Abrange, ainda, dois volumes sobre os Escritos políticos, de 1910 a
1920 e de 1921 a 1926, e dois volumes das Cartas do cárcere.
251
Gramsci é considerado o teórico da superestrutura, pois dedicou parte das suas reflexões a entender o
papel das idéias e da cultura na dominação capitalista. Para ele a dominação se dá primeiramente no âmbito
do poder econômico, onde há o domínio do capital sobre o trabalho. Numa outra dimensão para reproduzir a
dominação econômica busca-se uma dominação político-ideológica, garantida pelo Estado, principal
instância que agencia os interesses da classe dominante. Assim, a dominação se dá por duas situações que
atuam de forma simultânea: interiorização da ideologia dominante pelas classes subalternas que por sua vez
dificulta a formação de uma visão de mundo coerente e homogênea por parte das classes subalternas.
A Ideologia é vista como concepção superestrutural do mundo que “organiza as massas humanas,
forma o terreno sobre o qual os homens se movem, adquirem consciência de sua posição e lutam”. É uma
concepção de mundo que se apresenta na arte, no direito, na atividade econômica, em todas as atividades da
vida individual e coletiva. Manifesta-se como filosofia, religião, senso comum e folclore; num sentido amplo
– concepção particular de um grupo para dar respostas a problemas imediatos e vitais. Para garantir a difusão
da ideologia é preciso uma estrutura ideológica - que agrupa os meios de difusão da ideologia como a igreja,
a escola e os meios de comunicação e um material produzido e distribuído pelas instituições e que reflete a
concepção de mundo de quem o produz.
No modo de produção capitalista, as classes sociais são classificadas como dirigente ou dominante e
subalterna ou dominada. Os interesses conflitantes que permeiam as relações entre essas duas classes faz
com que o Estado assuma dois papéis fundamentais na manutenção da ordem estabelecida: dominação direta
ou comando, que se exprime no estado ou governo, na função de coerção pela força; direção cultural ou
ideológica que agrupa o conjunto das atividades superestruturais. O Estado é compreendido como abarcando
a sociedade política e a sociedade civil, com o objetivo de garantir a hegemonia pela coerção.
Podemos, para o momento, fixar dois grandes ‘níveis’ superestruturais: o primeiro pode ser chamado de
‘sociedade civil’, isto é, o conjunto dos organismos vulgarmente denominados ‘privados’; e o segundo, de
‘sociedade política’ ou do ‘Estado’. Esses dois níveis correspondem, de um lado, à função de ‘hegemonia’,
que os grupos dominantes exercem em toda sociedade; e, de outro, à ‘dominação direta’ ou ao comando, que
é exercido. (Gramsci, apud Carnoy. 1988:92-93).
Em Gramsci o conceito de Hegemonia é fundamental para se compreender as relações de poder no
sistema capitalista. Ele define hegemonia como Poder-direção ou dominação-consenso. Nesse sentido,
dominação e direção coexistem dialeticamente, como pólos de uma mesma relação. A hegemonia é uma ação
que atinge não apenas a estrutura econômica e a organização política da sociedade, mas também age sobre o
modo de pensar, de conhecer, e sobre as orientações ideológicas e culturais.
Hegemonia trata das relações de poder e apresenta-se como força e consenso, dominação e direção,
unidas dialética e historicamente. Seus elementos constitutivos são: direção cultural ou ideológica de uma
classe sobre o conjunto da sociedade; relação de dominação entre dirigentes e dirigidos; dominação direta,
que leva ao consenso. Ela é responsável pela formação de um grupo orgânico e coeso em torno de princípios
e necessidades defendidas pela classe dominante. Para garantir a direção e o consenso são usados os agentes,
os intelectuais e as instituições pedagógicas como a escola, no sentido de mascarar as contradições e reforçar
a hegemonia da classe dominante. A Hegemonia é compreendida como relação pedagógica, como salienta
Jesus (1989, p. 59)
toda relação de hegemonia é necessariamente uma relação pedagógica que se verifica no interior
de uma nação entre as diversas forças que a compõem, mas em todo o campo mundial. Em um
contexto linguístico-cultural a partir da 'prática pedagógica' é aplicada em todas as relações
existentes na sociedade em seu conjunto e em todos os indivíduos com relação aos outros
indivíduos, bem como entre camadas intelectuais, entre governantes e governados, entre elites e
seguidores, entre dirigentes e dirigidos, entre vanguardas e corpo de exército.
Hegemonia como relação dialética representa a supremacia de um grupo social que se manifesta
como dominação e consenso. Dialeticamente há reciprocidade entre relações hegemônicas e pedagógicas,
cada elemento dominante implica o outro como subalterno. Ao mesmo tempo, pela força da resistência, os
subalternos, numa relação de força, disputam espaço de poder e de hegemonia.
Na perspectiva de Gramsci a educação não está imune às contradições da sociedade capitalista. Ela
pode ser um instrumento fundamental na formação de uma hegemonia funcionando como instrumento de
dissimulação, a serviço da classe dominante, assim como também pode revelar à classe dominada as
contradições existentes, permitindo-lhe reagir a todas elas e tentar a contra-hegemonia.
252
Como a hegemonia compreende não somente as relações econômicas e políticas, é por meio da
educação que se busca obtê-la. Assim, a hegemonia e a contra-hegemonia exigem um desempenho
pedagógico mantenedor-reformador da relação total de poder, de acordo com a situação histórica. Portanto a
educação escolar atua na hegemonia e na contra-hegemonia, assume um papel como instrumento na
formação da consciência importante para a dominação e hegemonia burguesa e para a contra-hegemonia para a formação crítica e da consciência política da classe dominada.
Gramsci defendia uma escola socialista como força imprescindível para a libertação da classe
dominada. Ele acreditava que nenhuma mudança real de estrutura seria possível sem a escola. Ele defendia
uma Escola Única ou Unitária que englobasse cultura geral, humanística, formativa, que equilibrasse o
desenvolvimento da capacidade de trabalhar manualmente (tecnicamente, industrialmente) e o
desenvolvimento da capacidade de trabalho intelectual.
Como em todo pensamento educacional socialista, Gramsci acreditava no trabalho como princípio
educativo. Ele discute essa questão no livro Intelectuais e a Organização da Cultura, "Para a Investigação do
Princípio Educativo", Gramsci (1989, p. 129-130). Ele apresenta o conceito de trabalho e sua importância
educativa na formação humana:
O conceito e o fato do trabalho (da atividade teórico-prática ) é o princípio educativo imanente à escola
elementar, já que a ordem social e estatal (direitos e deveres) é introduzida e identificada na ordem natural do
trabalho. Logo, o que é possível adquirir da escola elementar são 'os primeiros elementos de uma intuição do
mundo liberta de toda magia ou bruxaria, que fornece o ponto de partida para o posterior desenvolvimento de
uma concepção histórico-dialética do mundo, para a compreensão do movimento e do devenir, para a
valorização da soma de esforços e de sacrifícios que o presente custou ao passado e que o futuro custa ao
presente, para a concepção da atualidade como síntese do passado, de todas as gerações passadas, que se
projeta no futuro (p. 1989, 130).
Outro conceito importante discutido por Gramsci foi o de sociedade civil, que ele entendia como
local onde se processa a hegemonia, composta pela sociedade civil e pela sociedade política ou Estado. Foi
definida como "conjunto dos organismos, vulgarmente ditos privados, que correspondem à função de
hegemonia que o grupo dominante exerce em toda a sociedade. Situada na superestrutura, a sociedade civil é
formada por uma rede de funções educativas e ideológicas, responsável pelas atividades diretivas da
sociedade.
Em toda sociedade existem os Intelectuais Orgânicos, que são pessoas que criam e difundem as
ideologias orgânicas, ou seja, ideologias vinculadas a uma classe ou grupo social. Segundo Gramsci os
intelectuais orgânicos diferem dos intelectuais tradicionais caracterizados pelo acúmulo de conhecimentos
eruditos e científicos. Eles são associados às suas posições políticas. São, portanto, pessoas ou grupos
vinculados às diferentes classes sociais. Eles exercem funções teóricas e práticas no seio da sociedade civil e
da sociedade política. Constituem elo mediador entre a classe social que representam e a consciência de
classe. Agem na classe dominante, como agentes dissimuladores da ideologia. Na classe subalterna, ajudam
a construir um "discurso crítico que intencione a elevação das consciências dominadas e destrua
pseudoconcreticidade das representações da falsa consciência". A ação-reflexão que desenvolvem funciona
como articuladora entre infra-estrutura e superestrutura, posto que procuram produzir e difundir idéias sobre
o modo de funcionamento da sociedade. Eles podem atuar como funcionários da superestrutura, nas
instituições culturais da sociedade civil, entre as quais a escola.
Os intelectuais orgânicos atuam conforme a classe à qual se aliam. Junto à classe dominante eles
buscam legitimar o domínio, manipulando os meios de comunicação, a propaganda, a educação e a política.
Buscam, através de meios de persuasão, acabar a contestação e fazendo parecer normal a dominação.
Quando são ligados às classes populares lutam pela superação de uma hegemonia por outra. Representa um
aliado, um companheiro, um teórico, uma força organicamente ligada aos trabalhadores em luta pela contrahegemonia. Atuam no sentido de preparar as bases da contra-hegemonia, desenvolvendo uma consciência de
classe, criando uma nova cultura, como pressuposto para uma nova sociedade, procurando limitar o poder de
coesão da hegemonia burguesa.
A influência do pensamento marxista ou do materialismo histórico e dialético foi marcante entre os
educadores socialistas. Muito embora o pensamento socialista sobre educação se origine do pensamento
socialista em suas diversas vertentes, tais como: a) o Socialismo utópico, que representa as idéias socialistas
que compreende o período da revolução industrial até a publicação do Manifesto Comunista e que foi
denominado por Marx de socialismo utópico. Os principais divulgadores dessa idéias foram: Fourier, Owen,
253
Cabet, Saint-Simon. Eles pregavam Comunidades socialistas de caráter utópico, visando educar para uma
utopia socialista, dentro do capitalismo. Defendiam uma passagem não violenta, pacífica, essencialmente na
base da convicção e pelo exemplo de novas comunidades harmoniosas fundamentadas na cooperação e na
fraternal união de seus membros. b) o socialismo científico abrange o período que vai da publicação do
“Manifesto Comunista” à ascensão de Stalin. Seus representantes são: Marx e Engels, Lênin, Krupskaia e
Makarenko. Karl Marx e Friedrich Engels no “Manifesto Comunista” de 1848 fizeram uma síntese sobre a
distinção entre socialismo utópico e socialismo científico. c) o socialismo investigativo: são considerados os
pesquisadores desde Gramsci e os marxistas contemporâneos, como Vygotski e Pistrak.
Entre os Princípios da Pedagogia Socialista destacam-se: a relação instrução-trabalho, que combina
ensino e trabalho produtivo com educação física e intelectual, também entendido o trabalho como princípio
educativo; escola-política e escola-herança cultural; alternância tempo escola profissional e outros na fábrica.
A partir de Marx, o trabalho produtivo passou a ser o fundamento principal da pedagogia socialista.
As idéias de Marx e dos socialistas fundamentaram o pensamento educacional socialista,
especialmente naqueles que foram educadores nos países socialistas e desenvolveram suas idéias a partir do
referencial e da prática educativa que vivenciaram. Entre eles destacam-se Anton Makarenko e Pistrak.
O educador socialista Makarenko (1986, p. 28-29) entendia a educação como processo mais amplo
do que a educação escolar. Defendia uma formação integral e uma educação politécnica. Por isso a escola
deveria ser organizada de acordo com os princípios da instrução geral e do trabalho.
“Estou convencido de que o objetivo da nossa educação consiste não só formar um indivíduo
criador, um indivíduo cidadão capaz de participar com a maior eficiência na construção do
Estado. Nós devemos formar uma pessoa que seja feliz.”
Ele defendia a organização coletiva da escola, através de um processo de autogestão envolvendo alunos,
professores e todo o corpo técnico, através de coletivos.
A escola deve ser uma coletividade unida em que estão organizados todos os processos
educativos e cada membro desta coletividade deve sentir a sua dependência em relação a
ela, à coletividade, deve ser fiel aos interesses dela, defendê-los e, sobretudo apreciá-los.
(MAKARENKO, 1986, p. 66).
Pistrak foi outro educador socialista que desenvolveu suas idéias na União Soviética Socialista.
Sobressai-se sua obra Fundamentos da Escola do Trabalho, de 1924. Segundo Tratemberg (2003, p. 2)
Pistrak entendia a Escola do Trabalho
como um instrumento que capacite o homem a compreender seu papel na luta internacional
contra o capitalismo, o espaço ocupado pela classe trabalhadora nessa luta e o papel de cada
adolescente, para que cada um saiba, no seu espaço, travar a luta contra as velhas estruturas.
A Escola do Trabalho fundamenta-se no estudo das relações do homem com a realidade atual
e na auto-organização dos alunos.
A base fundamental da educação deve ser o trabalho vinculado à realidade social concreta, ao
trabalho social, como uma atividade socialmente útil. Ele, assim como Makarenko, estruturava a escola a
partir da organização de coletivos, da auto-organização dos estudantes, que deveria ser coletiva, autônoma,
criativa e participativa. O currículo, segundo esse autor, deveria se organizar por sistemas de complexos
temáticos.
254
Unidade IX: A Influência do Marxismo na Educação Brasileira
1. - Situando a temática
O pensamento marxista chegou na educação brasileira inicialmente pelo viés do socialismo libertário
das idéias anarquistas com os trabalhadores imigrantes no século XIX onde entra em cena uma concepção
socialista de educação que os levou a implantarem escolas para os trabalhadores ligadas aos sindicatos.
Também as idéias marxistas influenciaram algumas das Tendências pedagógicas classificadas por Libâneo
de progressistas.
2. - Conhecendo a Temática
Tendências Pedagógicas Progressistas
As tendências pedagógicas que se inspiram no pensamento crítico marxista se baseiam numa análise
crítica da realidade social e da escola, afirmam que a educação tem finalidades sócio-políticas e apontam que
a educação tem uma contribuição no processo de transformação social e superação das desigualdades.
Segundo Libâneo, essas tendências são: Libertadora, Libertária e Crítico-social dos Conteúdos.
Pedagogia Libertadora
Origina-se do pensamento educacional de Paulo Freire, educador pernambucano, professor da UFPE,
que nos anos de 1960 desenvolveu uma experiência de educação e alfabetização de jovens e adultos e expôs
suas idéias no livro Pedagogia do Oprimido, expressão que posteriormente ficou conhecida como Educação
Popular. Teve início em práticas educativas fora da escola, não-formais, nos movimentos sociais e populares,
nos sindicatos, associações de bairros, a partir dos centros de cultura popular, em Recife, nos anos 1960.
Pode ser também adotada na escola.
Papel da escola e da educação
-
Educação libertadora questiona a realidade das relações sociais e dos homens com a natureza, visando uma
transformação.
Objetivo é a compreensão, pelo aluno, da realidade do seu cotidiano para levar a uma prática transformadora
da sociedade
Questionar a realidade social de opressão e exploração
Eixo central é educação e política
Conteúdos
-
Temas Geradores, extraídos da problematização da prática de vida, a partir do saber popular
Textos devem ser elaborados pelo grupo
Métodos de ensino
-
Grupo de discussão a quem cabe autogerir a aprendizagem que utiliza o debate,
o diálogo é o método básico
incentiva a formação de conselhos populares com o objetivo de resgatar a cultura popular
passos da aprendizagem – codificação/decodificação de temas, problematizados através do diálogo,
a realidade vivida é discutida até chegar-se a um nível mais crítico da realidade vivida
Debates, diálogos e discussões, assembléias
Relacionamento professor-aluno
-
relacionamento horizontal, professor e alunos são sujeitos do conhecimento
professor é um animador e deve ter identidade com os alunos e sua realidade
255
Pressupostos da aprendizagem
-
aprender é um ato de conhecimento crítico da realidade
motivação se dá a partir da situação–problema que deve ser decodificada
Manifestação na prática escolar
-
movimentos populares, sindicatos, experiências individuais de professores em salas de aula do ensino regular,
especialmente em cidades como Porto Alegre/RS, Icapuí/CE.
Representantes
-
Paulo Freire, criador e divulgador, Moacir Gadotti, divulgador.
II Progressista Libertária
Papel da Escola
-
-
Autogestão é o conteúdo e o método
recusa qualquer forma de poder ou de autoridade.
Pedagogia Institucional – forma de resistência contra a burocracia como instrumento da ação dominadora do
Estado que impede a autonomia da escola (defendida por Michel Lobrot, Pedagogia Institucional, la escuela
hacia la autogestión.)
transformação da personalidade do aluno numa perspectiva libertária e augestionária
Introduzir modificações na estrutura da instituição escolar, a partir da participação grupal que pode se dar
através de assembléias, conselhos
Criar grupos augestionários, associações, escolas augestionárias, cooperativas
Implantar relações.
Conteúdos de ensino
-
Conhecimento resulta das experiências vividas pelo grupo, especialmente aqueles resultantes de participação
crítica – descoberta de respostas às necessidades e interesses manifestos pelo grupo
Matérias de conteúdos específicos não são o conteúdo principal.
Métodos de Ensino
-
-
vivência grupal de augestão
grupos se organizam de modo a que todos possam participar
Relação professor-aluno
-
desiguais e diferentes, mas professor se põe a serviço do aluno
grupo tem responsabilidade sobre a participação dos alunos no grupo
professor função de "conselheiro" e de instrutor-monitor à disposição do grupo
Pressupostos da Aprendizagem
-
Ênfase na aprendizagem informal, através do grupo e a negação da repressão.
Representantes
- Maurício Tratemberg e Miguel Gonzales Arroyo
256
III Pedagogia Crítico-Social Dos Conteúdos
Papel da escola/objetivos
-
difusão de conteúdo, indissociáveis da realidade social
valorização da escola como instrumento de apropriação do saber pela classe trabalhadora
contribuir para a democratização da sociedade pela eliminação da seletividade
preparação do aluno para o mundo, fornecedo-lhes conteúdos para uma participação ativa na sociedade.
passagem do saber ao engajamento político – competência técnica e compromisso político.
Conteúdos de ensino
-
conteúdos culturais universais produzidos pela sociedade reavaliados face a realidade social e que tenham
significado para o aluno e seja ligado a sua realidade, proporcionando análise crítica.
Métodos de ensino
-
relação direta com a experiência do aluno
relaciona a prática vivida pelos alunos com os conteúdos propostos pelo professor,
conteúdos são expostos pelo professor,
da ação à compreensão, da compreensão à ação – unidade teoria-prática
Relacionamento professor-aluno
-
professor mediador entre conteúdo e a prática, orientador,
aluno – participação ativa
Pressupostos da aprendizagem
-
aprender e desenvolver a capacidade de processar informações e lidar com estímulos do ambiente, organizando
os dados disponíveis da experiência
aprendizagem significativa
interação conteúdo-realidade
Manifestação na prática escolar
-
através da prática de professores da rede escolar pública identificados com essa pedagogia
Representantes
-
-
pioneiro educador russo Makarenko;
Bernard Chalot, Manacorda, George Snyders
No Brasil, Dermeval Saviani, José Carlos Libâneo
As idéias marxistas influenciaram as reflexões sobre o Brasil. Destaca-se como um dos pioneiros Prado
Junior com sua obra Evolução política do Brasil, de 1933, na qual faz uma consistente análise da formação
social, econômica e política do Brasil.
No campo educacional destaca-se, nos anos trinta, como um dos primeiros a publicar uma obra sob a
influência marxista, Paschoal Lemme, um educador que escreve educação de adultos e organiza cursos para
operários no Distrito Federal. (PRAXEDES, 2002, p. 2).
3. - Referências
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