ENSINO DE FILOSOFIA – O DESAFIO EM TRANSITAR ENTRE A HISTÓRIA E OS TEMAS DO COTIDIANO HOFFMANN, Mara Lúcia Schuster Bolsista do Capes - PIBID/UNIFRA Acadêmica do Curso de Filosofia – UNIFRA Email: [email protected] SILVA, Leisa Maria Sangoi Bolsista do Capes - PIBID/UNIFRA Professora Supervisora do Subprojeto Filosofia – UNIFRA Email: [email protected] ALVES, Marcos Alexandre Bolsista do Capes - PIBID/UNIFRA Professor Adjunto – UNIFRA Email: [email protected] RESUMO Com o ensino obrigatório da Filosofia, nas escolas de ensino médio, por meio do parecer CNB/CEB 38/2006, cada vez mais questiona-se os conteúdos a serem trabalhados. O presente trabalho visa refletir sobre o ensino de Filosofia, evidenciando a importância de se relacionar a História da Filosofia com temas do cotidiano dos alunos, enquanto conteúdo programático da disciplina, como também que, a sustentação para o debate dos mais variados temas está justamente no pensamento e reflexão dos Filósofos. Após este estudo, realizado através de pesquisa e análise bibliográfica, conclui-se que o grande desafio para o professor é trabalhar com a História da Filosofia sem ficar atrelado a ela, devendo transitar entre a historicidade e os temas do cotidiano. PALAVRAS CHAVE: Conteúdo programático; Ensino Médio; História da Filosofia; Temas. 1. INTRODUÇÃO Acerca da problemática da História da Filosofia estar incluída no conteúdo programático do ensino médio, conforme os PCNs – Parâmetros Curriculares Nacionais, muitos professores encontram dificuldades em trabalhar a História da Filosofia, pois para muitos adolescentes, é algo desnecessário e cansativo, principalmente a releitura dos clássicos. Por tal motivo, “as discussões filosóficas” em salas de aula, muitas vezes, se reduzem a conversas vazias e superficiais sobre um tema qualquer da atualidade sem que as mesmas estejam fundamentadas em teorias filosóficas. Os professores passam a discutir somente assuntos e temas do cotidiano, o que acaba resultando numa ideia equivocada a respeito da Filosofia, uma visão de que a Filosofia se resume em brincadeiras ou diálogo sobre qualquer coisa. Daí a necessidade de retornar textos clássicos para firmar sua identidade, sua atualidade e sentido. É preciso que os alunos tomem consciência da relevância da Filosofia e sua história, para assim terem uma postura adequada em relação à disciplina. Mas para isso, é fundamental que os professores se posicionem, conduzindo o ensino de Filosofia com referências à Filósofos e contextualizando com os temas da atualidade, pois não tem como ensinar Filosofia e filosofar, sem explorar o conteúdo filosófico de quase três séculos de pensamento. 2. DESENVOLVIMENTO Procurando um auxílio para estas questões, vamos mostrar a importância de trabalhar a História da Filosofia e os temas cotidianos, sem negligenciar nenhum deles, conforme o pensamento de Felix Guatari (2007), Giles Deleuze (2007), Maria Lídia Rodrigo (2009), René Silveira (1991) e Silvio Gallo (2009). Conforme as OCNF/2006 – Orientações Curriculares Nacionais – Filosofia, é preciso, no ensino médio, trabalhar a noção de História da Filosofia e assume tal como “fonte adequada de tratamento dos conteúdos filosóficos” (Ibidem,p.17), atribuindo a ela papel necessário e intrínseco à Filosofia. A disciplina de Filosofia, em função de sua história inconstante e de sua, até pouco tempo atrás, condição facultativa nas escolas de ensino médio, sempre enfrentou problemas em relação à construção de sua identidade, de seu papel e de sua elaboração de conteúdos programáticos. A discussão maior quanto aos conteúdos programáticos se dá em relação à História da Filosofia, tanto no que diz respeito a sua participação ou não do plano de estudos, como também uma maneira efetiva de trabalhá-la. Normalmente o programa que inclui a História da Filosofia, apresenta-a de forma mais tradicional, ou seja, em seqüência cronológica dos pensadores, fazendo uma síntese de suas vidas, obras e principais idéias. Fica ao professor a tarefa de selecionar o que pode ser necessário, e se vai utilizar a História da Filosofia como referencial de consulta ou como fim da própria disciplina. Percebemos que a História da Filosofia pode ser abordada e vista por dois ângulos: como um fim em si mesma ou como uma fonte inesgotável de reflexões. Tais problemas colocam a disciplina em uma condição desfavorável diante das demais, e acaba acarretando numa desigualdade entre as escolas, pois cada uma tende a alcançar um fim diferente. Não queremos julgar a forma de como a História da Filosofia é abordada, mas mostrar que Filosofia não pode se reduzir a uma narração história com datas, nomes e correntes filosóficas. Esta maneira de abordar, além de restringir, torna-se superficial e cansativa, prioriza a informação e deixa de lado a reflexão, não associa a prática à teoria ou vice-versa. Em outras palavras, ensina Filosofia mas não ensina a filosofar. Se, ao ensinarmos filosofia, nos limitarmos a expor figuras e momentos da história da filosofia, estaremos contribuindo para afirmar a Filosofia como peça de museu, como algo que se contempla, se admira, mas se vê a distância, como algo inatingível para nós. Mas, por outro lado, se nos dedicarmos ao ensino da filosofia, buscando o processo do filosofar nos esquecendo do historicamente produzido, perderemos a legitimidade para tal ato. A recusa da tradição (história da filosofia), que é a única maneira de manter viva a história, continuamente e produzindo, só é possível a partir dessa mesma tradição: nada criaremos, se não a tomarmos como ponto de partida (GALLO, 2000, p.179). A História da Filosofia propicia ao aluno compreender os problemas apresentados, tendo estes como base, possibilitam novas problematizações, e não uma história que limita e faz uma sucessão de fatos, mas sim um conjunto de “temas e problemas” que leva o aluno à multiplicidade e à formação de um novo pensamento. É fundamental o convívio dos alunos com os textos filosóficos, pois com a informação obtida farão um exercício reflexivo diante do pensamento de determinado filósofo e seus argumentos, o que vai desenvolver competências lógico-discutivas, tais como problematizar, conceituar e argumentar. Competências que somente serão adquiridas com o envolvimento na História de Filosofia (RODRIGO, 2009). O fazer filosófico não é puramente reflexão desprezada e “solta” num livre exercício onde o professor não se utiliza da História da Filosofia e apenas procura responder as questões atuais “sem recorrer à base histórica da reflexão em tais questões, (...) esquecendo-se de todas as conquistas anteriores naquele campo” (BRASIL, 2006). A reflexão sobre o ensino de Filosofia deve superara a dicotomia famosa de Kant na Crítica Razão Pura, de que “não se pode aprender Filosofia, mas apenas aprender a filosofar” . Ao contrário do pensamento de Kant e de muitos professores, não se aprende a filosofar sem aprender Filosofia, e filosofar está justamente no diálogo com a tradição clássica. Portanto, a História da Filosofia deva estar no programa deve estar no programa do ensino médio, pois esta é imprescritível para o exercício de filosofar (RODRIGO, 2009). A Filosofia é indispensável à formação de cidadãos, e a História da Filosofia faz parte do conjunto necessário para a formação e produção de conhecimento (DE LEUZE, 1988).É preciso que professores e alunos se utilizem dos conceitos criados na História da Filosofia como auxílio na resolução de problemas, para desacomodar questões e para criar novos conceitos filosóficos, pois a especificidade da Filosofia e seu ensino está no movimento vivo e constante de criar conceitos (GALLO, 2000). Diante disso, torna-se necessário uma abordagem cuidadosa da História da Filosofia. Ela não pode ser vista como algo acabado e ultrapassado e sim como algo permanentemente vivo, tendo em vista suas teorias tão bem elaboradas que fazem parte da atualidade e que sempre podem ser retomadas e refletidas, A história da filosofia ganha novo sentido quando, em lugar de apresentar-se como uma crônica do passado, passa a ser solicitada por interrogações postas no presente. A referência aos autores não constitui mera erudição ou um conhecimento pelo conhecimento, mas um recurso precioso e indispensável para pensar as questões que desafiam o homem na contemporaneidade. Esse modo de relacionar-se com a tradição filosófica institui uma reciprocidade ente a história passada e a pesquisa contemporânea, na mediada em que repõe as questões e busca respostas de novo, aqui e agora (RODRIGO,2009, p.51). A Filosofia consiste em investigar e discutir os pensamentos e ideias dos pensadores, sejam eles da antiguidade ou da contemporaneidade, pois em Filosofia não existe teorias ultrapassadas, muito pelo contrário, teorias de períodos passados foram, são e serão atuais independentemente da época, tamanha a sabedoria e profundidade reflexiva. Portanto, nota-se a necessidade de estudar os grandes pensadores, tanto os do passado como os da atualidade, para que não se ande em círculos, discutindo o que já foi discutido, mas sim, se utilizando das teorias já exploradas, para melhor compreender os filósofos e assim poder avançar na discussão (DELEUZE, 2007). Compreender, interpretar os argumentos de textos filosóficos, “dialogar” com os filósofos e produzir argumentos autônomos, é pensar filosoficamente, é saber os problemas filosóficos e poder relacioná-los com os problemas do cotidiano. Cada pensamento filosófico tem uma história, e esta história carrega um contexto, o qual reúne reflexões de outros pensadores incitados a uma nova reflexão a partir da reflexão primeira. Não há verdadeiramente Filosofia sem antes um trabalho com sua história, (...) não é possível fazer filosofia sem recorrer a sua própria história. Dizer que se pode ensinar filosofia apenas pedindo que os alunos pensem e reflitam sobre os problemas que os afligem ou que mais preocupam o homem moderno, sem oferecer-lhes a base teórica para o aprofundamento e a compreensão de tais problemas, e sem recorrer à base histórica da reflexão sobre tais questões, é o mesmo que numa aula de física pedir que os alunos descubram por si mesmos a fórmula da lei da gravitação sem estudar física, esquecendo-se de todas as conquistas anteriores neste campo, omitindo o esforço e o trabalho monumental de Newton. (NASCIMENTO, Milton, apud SILVEIRA, René, Um sentido para o ensino médio, p.142). Trata-se de ciclo de teorias e seus conseqüentes argumentos, que de forma alguma podem ser desconsiderados em um ensino de qualidade, o qual exige uma postura de equidade para não ficar fixo somente no conteúdo da história, nem aos temas modernos, mantendo assim um equilíbrio entre a história e os temas e mantendo uma relação direta e constante com os movimentos do pensamento passado e presente, indispensáveis para um projeto educativo efetivo. 3. CONCLUSÃO No trabalho a ser realizado em sala de aula, o professor deve possuir uma didática eficaz para abordar a História da Filosofia e relacioná-la às temáticas da atualidade. Os temas que circundam a Filosofia jamais estão separados das raízes da Filosofia. Conhecer o que os filósofos clássicos pensavam sobre determinado assunto é essencial para que se tenha uma base de pensamento e um impulso para novos conhecimentos, pois é usufruindo da contribuição histórica que irão encontrar o alicerce para reflexões e discussões. A partir do momento que lemos e refletimos sobre o que Aristóteles pensou sobre política, por exemplo, temos a capacidade de reconhecer as bases teóricas acerca da temática e de nos guiarmos para uma possível conclusão particular, que nos levará a buscar algo novo. Isso proporciona certa autonomia de pensamento, isto é, criamos argumentos e justificativas para defender os temas que nos propõem. Neste caso, percebe-se que não se deve esquecer da Historia da Filosofia, pois ela nos auxilia no momento inicial de criação de novos conceitos. Portanto, considera-se que o modo mais adequado para o ensino médio, quanto a conteúdos programáticos, é mesclar entre Historia da Filosofia, tomada como referência para a discussão de temas filosóficos, e tema de interesse dos alunos, tratados numa abordagem filosófica, desde que o ensino de Filosofia esteja comprometido em levar o educando a problematizar a realidade. O aluno só será capaz de criar conhecimento, novos conceitos e ter autonomia de pensamento, quando for orientado nesta perspectiva de ensino. REFERÊNCIAS: ASPIS, Renata Lima; GALLO, Sílvio. Ensinar Filosofia. São Paulo: Ed. Atta Mídia e Educação, 2009. BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CEB nº 38/2006 de 07 de julho de 2006. Inclusão obrigatória das disciplinas de filosofia e sociologia no currículo do Ensino Médio. Brasília. Agosto de 2006. BRASIL. Ministério da Educação. Orientações curriculares para o Ensino Médio. Ciências Humanas e suas Tecnologias e Conhecimentos de Filosofia. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Brasília, DF, 2006. Vol.3. DELEUZE Gilles; GUATTARI, Félix. O que é a filosofia? Trad. Bento Prado Jr e Alberto Alonso Munõz. São Paulo: Ed.34, 2007. ________. Diferença e Repetição. Trad.Luiz Orlandi; Roberto Machado. Rio de Janeiro: Graal, 1998. PIOVESAN, Américo (org) et al. Filosofia e ensino: em debate. Ijuí: Unijuí, 2002. RENÉ, Silveira. Ensino de Filosofia do Ensino Médio: Em busca de um sentido. 586 F. Dissertação – Mestrado em Educação. Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, 1991. RIBAS, Maria Alice Coelho (org.) et al. Filosofia e ensino: a filosofia na escola. Ijuí: Unijuí, 2005. RODRIGO, Lídia Maria. Filosofia em sala de aula, teoria e pratica para o Ensino Médio. Campinas, SP: Autores Associados, 2009.